Processo nº 1004056-08.2025.8.11.0000
ID: 298372942
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1004056-08.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1004056-08.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Violação dos Princípios Admin…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1004056-08.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Violação dos Princípios Administrativos, Subsídios, Nulidade de ato administrativo] Relator: Des(a). DEOSDETE CRUZ JUNIOR Turma Julgadora: [DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] Parte(s): [MUNICIPIO DE GLORIA D OESTE - CNPJ: 37.464.955/0001-00 (AGRAVANTE), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (AGRAVADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), JANAINA NEVES PEREIRA - CPF: 007.721.422-62 (ADVOGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), NILTON DOS SANTOS - CPF: 009.930.228-47 (TERCEIRO INTERESSADO), JOSE RODRIGUES - CPF: 536.145.001-44 (TERCEIRO INTERESSADO), JAIR RODRIGUES DA SILVA - CPF: 523.391.141-87 (TERCEIRO INTERESSADO), EDISON MARTINS DOS SANTOS FILHO - CPF: 839.797.511-04 (TERCEIRO INTERESSADO), ADRIANO JOSE DOS SANTOS - CPF: 882.510.631-91 (TERCEIRO INTERESSADO), DAIANE DA SILVA TEODORO - CPF: 025.502.771-04 (TERCEIRO INTERESSADO), EDIMAR TEIXEIRA RAMOS - CPF: 841.652.601-00 (TERCEIRO INTERESSADO), JORGE SEBASTIAO - CPF: 416.031.091-53 (TERCEIRO INTERESSADO), SEBASTIAO SERGIO PAULANI - CPF: 109.406.368-16 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR DEOSDETE CRUZ JÚNIOR, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA E 2ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO. E M E N T A DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO POPULAR. FIXAÇÃO DE SUBSÍDIOS DE VEREADORES. LEI MUNICIPAL EDITADA EM PERÍODO VEDADO. ART. 21, II, DA LC Nº 101/2000. ATO NORMATIVO DE EFEITOS CONCRETOS. SUSPENSÃO DA NORMA. AUTONOMIA MUNICIPAL RELATIVIZADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória que, em sede de ação popular, suspendeu liminarmente os efeitos da Lei Municipal nº 768/2024, a qual fixou novos subsídios aos vereadores e ao presidente da Câmara de Glória D’Oeste para a legislatura 2025/2028, por afronta à moralidade administrativa e à Lei de Responsabilidade Fiscal. II. Questão em discussão 2. A controvérsia envolve as seguintes questões: (i) saber se a ação popular é via adequada para controle de legalidade de ato legislativo municipal de efeitos concretos; e (ii) saber se a edição da Lei nº 768/2024, em período vedado pela LC nº 101/2000, caracteriza nulidade do ato normativo por aumento de despesa com pessoal nos 180 dias finais da legislatura. III. Razões de decidir 3. A jurisprudência do STJ admite a utilização da ação popular para impugnar atos normativos de efeitos concretos, quando evidenciada a lesividade ao patrimônio público ou à moralidade administrativa. 4. A edição da norma em período vedado pelo art. 21, II, da LC nº 101/2000 enseja sua nulidade de pleno direito, ainda que seus efeitos financeiros sejam projetados para legislatura futura. 5. A autonomia municipal, embora assegurada pela CF/1988, deve se harmonizar com os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e responsabilidade fiscal. 6. A decisão liminar impugnada encontra-se devidamente fundamentada e atendeu aos requisitos do art. 300 do CPC, evidenciando a plausibilidade do direito alegado e o risco de dano irreparável ao erário. IV. Dispositivo e tese 7. Agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: “1. A ação popular é via adequada para impugnação de lei municipal de efeitos concretos que configure aumento indevido de despesa com pessoal. 2. É nulo o ato normativo municipal que majora subsídios de agentes políticos nos 180 dias finais do mandato, por violação ao art. 21, II, da LC nº 101/2000, independentemente de seus efeitos financeiros ocorrerem em legislatura posterior.”. R E L A T Ó R I O Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Glória D’Oeste contra decisão interlocutória proferida nos autos da Ação Popular n. 1000990-51.2024.8.11.0098, em trâmite na Vara Única da Comarca de Porto Esperidião, ajuizada por Yann Dieggo Souza Timotheo de Almeida e Warllans Wagner Xavier Souza. A ação originária visa à declaração de nulidade da Lei Municipal n. 768/2024, que fixou novos subsídios aos vereadores e ao presidente da Câmara Municipal para a legislatura de 2025/2028, alegando-se violação aos princípios constitucionais da moralidade administrativa, impessoalidade e à Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000). A decisão agravada deferiu o pedido de tutela provisória de urgência, determinando a suspensão dos efeitos da Lei Municipal n. 768/2024, restabelecendo, por conseguinte, os valores previstos nas Leis Municipais anteriores (682/2020 e 684/2020). O Agravante sustenta, em síntese, a inadequação da via eleita (ação popular), por pretender os autores o controle abstrato de constitucionalidade, o que não seria cabível nesse tipo de ação; a legalidade do processo legislativo que culminou na edição da norma impugnada; a observância ao princípio da autonomia municipal (arts. 18 e 30 da Constituição Federal), no que diz respeito à competência para fixação de subsídios dos vereadores; a existência de prejuízo orçamentário e institucional ao Município em razão da decisão agravada. Pugna, ao final, pela concessão de efeito suspensivo ao recurso e pela reforma da decisão liminar. Foram ofertadas contrarrazões pelos agravados, nas quais se sustentou a plena adequação da ação popular ao caso concreto, destacando-se a violação à Lei de Responsabilidade Fiscal e à moralidade administrativa, sobretudo pelo fato de a Lei n. 768/2024 ter sido editada dentro do período de 180 dias antes do término do mandato da atual legislatura, o que comprometeria a higidez do ato normativo. Em parecer ministerial, o douto Procurador de Justiça Edmilson da Costa Pereira manifestou-se pelo desprovimento do agravo, pontuando que a majoração dos subsídios no período vedado pela LRF constitui afronta à norma de regência e aos princípios constitucionais. É o relatório. V O T O R E L A T O R Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Glória D’Oeste contra decisão interlocutória proferida nos autos da Ação Popular n. 1000990-51.2024.8.11.0098, em trâmite na Vara Única da Comarca de Porto Esperidião, ajuizada por Yann Dieggo Souza Timotheo de Almeida e Warllans Wagner Xavier Souza. A ação originária visa à declaração de nulidade da Lei Municipal n. 768/2024, que fixou novos subsídios aos vereadores e ao presidente da Câmara Municipal para a legislatura de 2025/2028, alegando-se violação aos princípios constitucionais da moralidade administrativa, impessoalidade e à Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000). A decisão agravada deferiu o pedido de tutela provisória de urgência, determinando a suspensão dos efeitos da Lei Municipal n. 768/2024, restabelecendo, por conseguinte, os valores previstos nas Leis Municipais anteriores (682/2020 e 684/2020). O Agravante sustenta, em síntese, a inadequação da via eleita (ação popular), por pretender os autores o controle abstrato de constitucionalidade, o que não seria cabível nesse tipo de ação; a legalidade do processo legislativo que culminou na edição da norma impugnada; a observância ao princípio da autonomia municipal (arts. 18 e 30 da Constituição Federal), no que diz respeito à competência para fixação de subsídios dos vereadores; a existência de prejuízo orçamentário e institucional ao Município em razão da decisão agravada. Pugna, ao final, pela concessão de efeito suspensivo ao recurso e pela reforma da decisão liminar. Foram ofertadas contrarrazões pelos agravados, nas quais se sustentou a plena adequação da ação popular ao caso concreto, destacando-se a violação à Lei de Responsabilidade Fiscal e à moralidade administrativa, sobretudo pelo fato de a Lei n. 768/2024 ter sido editada dentro do período de 180 dias antes do término do mandato da atual legislatura, o que comprometeria a higidez do ato normativo. Em parecer ministerial, o douto Procurador de Justiça Edmilson da Costa Pereira manifestou-se pelo desprovimento do agravo, pontuando que a majoração dos subsídios no período vedado pela LRF constitui afronta à norma de regência e aos princípios constitucionais. A controvérsia vertida nos autos diz respeito à legalidade da Lei Municipal n. 768/2024, que promoveu o reajuste dos subsídios dos vereadores e do presidente da Câmara Municipal de Glória D’Oeste para a legislatura de 2025/2028. Trata-se de agravo de instrumento manejado com o escopo de reformar a decisão de primeiro grau que, em sede de ação popular, suspendeu liminarmente os efeitos da norma municipal, por reputar verossímil a ocorrência de lesão à moralidade administrativa e ao erário público. Sustenta o Município agravante, com ênfase, a ilegitimidade da via eleita, sob a tese de que a ação popular não seria meio próprio para controle da constitucionalidade de leis em tese, requerendo, assim, a extinção do feito originário por inadequação da via eleita. Aduz, ainda, que a legislação impugnada foi regularmente aprovada pelo Poder Legislativo local, dentro dos limites constitucionais conferidos à autonomia dos entes federativos. Tais alegações, embora articuladas com veemência, não resistem a uma análise rigorosa à luz do ordenamento jurídico pátrio e da jurisprudência consolidada nos tribunais superiores e neste Egrégio Tribunal de Justiça. A questão central reside na análise da validade do ato normativo municipal à luz da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), em especial o disposto em seu art. 21, II, que assim dispõe: “Art. 21. É nulo de pleno direito: II - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;” Ora, conforme assente nos autos, a Lei n. 768/2024 foi aprovada em 03 de setembro de 2024, ou seja, em prazo inferior a 180 dias do término do mandato da legislatura vigente, fato incontroverso que, por si, atrai a nulidade do ato normativo, independentemente de sua vigência estar prevista apenas para a legislatura subsequente. É certo que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado que a vedação imposta pela LRF atinge não apenas os efeitos imediatos dos atos administrativos, mas também aqueles cujos reflexos financeiros se projetam para o exercício seguinte, pois o que se busca é preservar a higidez orçamentária da gestão pública e evitar a geração de encargos insustentáveis para os sucessores políticos. Nesse sentido, destaco o seguinte precedente: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. ALÍNEA A. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO CONSIDERADO VIOLADO. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA N. 284 DO STF. CONCLUSÕES DO TRIBUNAL DE ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ. LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. ART. 21, PARÁGRAFO ÚNICO. APLICAÇÃO AOS AGENTES POLÍTICOS. NULIDADE DA EXPEDIÇÃO DE ATO NORMATIVO QUE RESULTOU NO AUMENTO DE DESPESA COM PESSOAL NOS 180 DIAS ANTERIORES AO FINAL DO MANDATO DO TITULAR DO RESPECTIVO PODER. 1. Não se pode conhecer do recurso pela alínea a do permissivo constitucional no que tange à sustentada falta de adequação da ação civil pública para veicular o pedido formulado na inicial. A ausência de indicação do dispositivo considerado violado atrai a aplicação analógica da Súmula n . 284 do STF. 2. Quanto ao apontado desrespeito ao art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 101/00, sob o aspecto (i) da aludida possibilidade de, com base no citado dispositivo, haver aumento de despesas com pessoal no período cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato, bem como (ii) do argumento de que, no presente caso, a fixação dos subsídios dos agentes políticos deu-se em harmonia com o orçamento e aquém dos limites impostos pela lei, a análise de tal questão importaria rever a premissa de fato fixada pelo Tribunal de origem, soberano na avaliação do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que é vedado aos membros do Superior Tribunal de Justiça por sua Súmula n. 7. 3. No mais, note-se que a LC n . 101/00 é expressa ao vedar a mera expedição, nos 180 dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder, de ato que resulte o aumento de despesa com pessoal. 4. Nesse sentido, pouco importa se o resultado do ato somente virá na próxima gestão e, por isso mesmo, não procede o argumento de que o novo subsídio "só foi implantado no mandato subsequente, não no período vedado pela lei". [...] 6. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido. (STJ - REsp: 1170241 MS 2009/0239718-3, Relator.: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 02/12/2010, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2010) Com efeito, a mera possibilidade de impacto financeiro futuro decorrente da edição da norma, ainda que os valores sejam pagos apenas na legislatura seguinte, não afasta a subsunção da conduta legislativa à vedação legal vigente, dado o inequívoco aumento da despesa com pessoal, em descompasso com os parâmetros fiscais e orçamentários. Importa ainda destacar que, ao contrário do que sustenta o agravante, a ação popular não visa, no caso em tela, à declaração de inconstitucionalidade em tese da lei municipal, mas sim à proteção do patrimônio público e à moralidade administrativa diante de ato concreto e específico, consubstanciado na majoração remuneratória indevida em período vedado. A jurisprudência do STJ e desta Corte é clara no sentido de que é cabível a ação popular para controle de legalidade de atos normativos, quando houver lesividade concreta e direta aos bens juridicamente tutelados pela ação popular. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. VIA ELEITA. LEI DE EFEITOS CONCRETOS. POSSIBILIDADE. LESÃO PATRIMONIAL. DESNECESSIDADE. PREFEITO. INICIATIVA E SANÇÃO DA LEI. LEGITIMIDADE PASSIVA. ADVOCACIA PÚBLICA. ATUAÇÃO. RESSARCIMENTO DOS HONORÁRIOS. DECISÃO EXTRA PETITA. TRAMITAÇÃO DO PROJETO DE LEI. DANO. NÃO OCORRÊNCIA. NEXO CAUSAL. CONDUTA DO AGENTE. AUSÊNCIA. [...] 3. Esta Corte tem reiterado "a lição do Professor Hely Lopes Meirelles, litteris: O objeto da ação popular é o ato ilegal e lesivo ao patrimônio público. (...) Dentre os atos ilegais e lesivos ao patrimônio público pode estar até mesmo a lei de efeitos concretos, isto é, aquela que já traz em si as conseqüências imediatas de sua atuação (...)"( REsp n. 776.848/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16/12/2008, DJe de 06/08/2009). 4. No caso, a Corte local, nos exatos termos da premissa acima exposta, registrou que "a Lei Municipal nº 15.397/11, ao transformar bem público de uso especial em dominical, autorizando a venda, diante da desafetação, não se revela norma geral e abstrata, mas sim lei de efeitos individual e concreto". [...] 15. Agravo do Município de São Paulo não conhecido. Agravo do particular conhecido, para conhecer em parte do recurso especial e, nessa extensão, dar parcial provimento ao apelo. (STJ - AREsp: 1408660 SP 2018/0317867-1, Data de Julgamento: 16/08/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/08/2022) DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL COM REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR. LEI MUNICIPAL DE EFEITOS CONCRETOS. AUMENTO DE SUBSÍDIO DE AGENTES POLÍTICOS. EDIÇÃO EM PRAZO VEDADO PELA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. VIA ADEQUADA. PROVIMENTO DO RECURSO. RETORNO DOS AUTOS PARA INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. I. Caso em exame 1. Apelação cível e reexame necessário contra sentença que indeferiu a petição inicial da ação popular proposta por cidadãos, extinguindo o feito sem resolução de mérito, ao fundamento de inadequação da via eleita. 2. Ação popular proposta para anular a Lei Municipal nº 13.956/2024, que majorou em 79,5% os subsídios do Prefeito e Vice-Prefeito do Município de Rondonópolis para o mandato 2025/2028, sancionada a apenas 16 dias do fim da legislatura, em violação ao art. 21, p.u., da LC nº 101/2000 (LRF). II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em verificar a adequação da ação popular como instrumento hábil ao controle judicial de ato legislativo de conteúdo concreto, cuja edição viola preceitos da legalidade fiscal e da moralidade administrativa, em especial o art. 21, p.u., da LRF. III. Razões de decidir 4. A ação popular é meio constitucional legítimo para a defesa do patrimônio público, da moralidade administrativa e da legalidade, podendo ser utilizada contra atos normativos concretos e de eficácia imediata, como o que fixa subsídios para agentes políticos identificados. 5. O conteúdo normativo da Lei Municipal nº 13.956/2024 é concreto, possui destinatários definidos e efeitos financeiros diretos, afastando o argumento de que se trata de norma abstrata ou de controle exclusivo por ADI. 6. A edição da norma em período vedado pela LRF compromete sua validade sob a ótica da legalidade estrita, legitimando o controle por meio da ação popular, sem que isso implique afronta à competência do Supremo Tribunal Federal para o controle concentrado de constitucionalidade. 7. A jurisprudência do STF e do TJMT autoriza a impugnação judicial de atos legislativos de efeitos concretos por meio de ação popular, quando presentes indícios de lesividade ao erário e desrespeito à legislação fiscal. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de apelação provido e reexame necessário com retificação da sentença, para cassar a decisão de indeferimento da petição inicial e determinar o regular prosseguimento da ação popular. Tese de julgamento: “1. A ação popular é instrumento processual adequado para impugnar ato normativo municipal de efeitos concretos, cujos destinatários estejam individualizados e que produza impacto direto no erário, desde que evidenciada violação à legalidade fiscal e à moralidade administrativa.” “2. A edição de norma que majora despesa com pessoal nos 180 dias finais de mandato, em afronta ao art. 21, p.u., da LC nº 101/2000, enseja vício de legalidade suficiente a autorizar o controle judicial mediante ação popular.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXXIII; LC nº 101/2000, art. 21, p.u.; L. nº 4.717/1965, arts. 1º, § 1º, e 2º, alíneas “c” e “e”; CPC, art. 485, I e VI. Jurisprudência relevante citada: STF, Rcl nº 664/RJ, Rel. Min. Ellen Gracie, Plenário, j. 15.12.2004; TJMT, AI nº 1003909-79.2025.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Erotides Kneip, j. 20.02.2025.(N.U 1033477-68.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO VIDAL, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 09/04/2025, Publicado no DJE 10/04/2025) DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRAMITAÇÃO DE PROJETOS DE LEI NO PERÍODO VEDADO PELA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. AUMENTO DE DESPESA COM PESSOAL NOS 180 DIAS ANTERIORES AO FINAL DO MANDATO. SUSPENSÃO DOS EFEITOS DOS PROJETOS LEGISLATIVOS. FUNDAMENTO RELEVANTE E NECESSIDADE DE GARANTIR A EFICÁCIA DA MEDIDA EVIDENCIADA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto pelo Município de Peixoto de Azevedo, MT, contra a decisão que deferiu liminar em mandado de segurança, determinando a suspensão da tramitação dos Projetos de Lei Municipais n.º 25/2024, Complementares n.º 08/2024, n.º 09/2024, n.º 10/2024 e n.º 11/2024, os quais versam sobre aumento de despesas com pessoal nos últimos 180 dias do mandato do Prefeito e do Presidente da Câmara Municipal. II. Questão em discussão 2. A controvérsia recursal consiste em definir se a concessão da liminar pelo juízo singular, suspendendo os projetos legislativos, encontra respaldo nos requisitos previstos no art. 7º, III, da Lei n.º 12.016/09, notadamente a relevância do fundamento e o perigo de ineficácia da medida caso concedida apenas ao final. III. Razões de decidir 3. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n.º 101/00, art. 21, II e III) proíbe a criação de despesas com pessoal nos 180 dias anteriores ao término do mandato, tornando nulos de pleno direito os atos que afrontem essa vedação. 4. O deferimento da liminar está baseado na iminência de aprovação dos projetos de lei e na necessidade de resguardar a higidez financeira do ente municipal, evitando compromissos fiscais que onerem gestões futuras. 5. A plausibilidade jurídica da tese invocada e o perigo da demora justificam a medida liminar, prevenindo a consumação de atos potencialmente ilegais com efeitos irreversíveis. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento não provido. Tese de julgamento: "É nulo o ato normativo que implique aumento de despesa com pessoal nos 180 dias anteriores ao fim do mandato do titular do Poder Executivo ou Legislativo, em razão da vedação expressa no art. 21, da Lei de Responsabilidade Fiscal. Para a concessão do efeito suspensivo em mandado de segurança, é imprescindível a presença cumulativa do fumus boni iuris, evidenciado pela incompatibilidade do ato impugnado com as normas de controle fiscal, e do periculum in mora, caracterizado pelo risco de concretização de medidas administrativas potencialmente ilegais antes do julgamento definitivo". Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, LXIX; LC n.º 101/00, art. 21, II e III; Lei n.º 12.016/2009, art. 7º, III. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, AC nº 1000701-05.2017.8.11.0021, Rel. Des. Graciema Ribeiro de Caravellas, j. 11/04/2023; STJ, REsp nº 1.852.629, Rel. Min. Og Fernandes, j. 18/08/2020. (N.U 1035954-73.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 14/04/2025) Registre-se que a decisão agravada fez uma análise sobre a legalidade dos aumentos concedidos, à luz da Lei de Responsabilidade Fiscal, o que, por ora, afasta a alegação de inadequação da via eleita. Neste contexto, o deferimento da tutela de urgência pelo juízo a quo se mostra adequado e fundamentado, uma vez demonstrados os dois pressupostos autorizadores da medida excepcional, a saber, a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora). A permanência dos efeitos da norma poderia consolidar situações jurídicas marcadas por flagrante ilegalidade e gerar ônus irreversível aos cofres públicos. Tampouco merece prosperar o argumento do agravante quanto à suposta afronta ao princípio da autonomia municipal. Como é cediço, a autonomia dos entes federados não se reveste de caráter absoluto, sendo exercida dentro dos limites traçados pela Constituição da República e pelas normas de regência do direito financeiro. A subordinação à Lei de Responsabilidade Fiscal é expressão do princípio da legalidade, que permeia toda a atividade da Administração Pública (art. 37 da CF/88). Ademais, ao contrário do que afirma o agravante, a medida liminar não acarreta irreparabilidade ao erário ou prejuízo irreversível aos agentes políticos, pois eventuais diferenças remuneratórias poderão ser posteriormente pagas, acaso reconhecida a validade da norma ao final da instrução processual. Trata-se, pois, de medida reversível, voltada à proteção do interesse público primário, não havendo que se falar em risco à estabilidade institucional ou financeira do Município. Por fim, observo que a decisão impugnada está amplamente fundamentada, não havendo nulidade ou error in judicando que justifique sua cassação por este Tribunal. Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao agravo de instrumento interposto pelo Município de Glória D’Oeste, mantendo-se incólume a decisão interlocutória que deferiu a liminar, e, em consequência, julgo prejudicado o agravo interno (id. 276621892). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear