Processo nº 1003984-54.2021.8.11.0002
ID: 341296761
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1003984-54.2021.8.11.0002
Data de Disponibilização:
04/08/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEXANDRE PINTO LIBERATTI
OAB/MT XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003984-54.2021.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). R…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003984-54.2021.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), JUNIOR RIBEIRO DE MAGALHAES - CPF: 879.968.041-68 (APELANTE), JOSE WEVERSON DA SILVA LIMA - CPF: 057.032.111-58 (APELANTE), RAFAEL DE ANUNCIACAO SILVA - CPF: 044.418.331-05 (APELANTE), JOACIR RIBEIRO DE MAGALHAES - CPF: 779.982.601-06 (APELANTE), RAFAEL RIBEIRO MAGALHAES - CPF: 054.371.621-03 (APELANTE), A SAÚDE PÚBLICA (VÍTIMA), PAULO GIOVANNI RONDON MONGE DOS SANTOS - CPF: 891.383.411-15 (TERCEIRO INTERESSADO), ANDERSON RODRIGO SILVA DE ANDRADE - CPF: 016.914.861-08 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), RAFAEL DE ANUNCIACAO SILVA - CPF: 044.418.331-05 (APELADO), RAFAEL RIBEIRO MAGALHAES - CPF: 054.371.621-03 (APELADO), ALEXANDRE PINTO LIBERATTI - CPF: 795.077.949-72 (ADVOGADO), ALEXANDRE PINTO LIBERATTI - CPF: 795.077.949-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – SENTENÇA CONDENATÓRIA – RECURSO DEFENSIVO - PRELIMINAR DE NULIDADE POR ILEGALIDADE NA ABORDAGEM POLICIAL – INVIABILIDADE – FUNDADA SUSPEITA CONFIGURADA – INFORMAÇÃO DETALHADA SOBRE INDIVÍDUO EM MOTOCICLETA AZUL TRANSPORTANDO DROGAS – SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA – MÉRITO – PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO – IMPOSSIBILIDADE – CIRCUNSTÂNCIAS DA APREENSÃO E CONFISSÃO DE TRANSPORTE DE DROGA PARA TERCEIRA PESSOA – CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO – RECURSO DESPROVIDO. Havendo informações prévias detalhadas sobre características específicas do suspeito (motociclista em veículo azul) e da conduta criminosa (transporte de drogas), configura-se a fundada suspeita que autoriza a abordagem policial, nos termos do art. 244 do CPP. Inviável a desclassificação para o delito de porte para consumo pessoal quando o próprio acusado confessa que transportava expressiva quantidade de maconha (450g) com a finalidade de entregá-la a terceiro, ainda que alegue como motivação a obtenção de favores sexuais, pois a destinação a outrem caracteriza o crime de tráfico de drogas. EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – ABSOLVIÇÃO – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – PRETENDIDA CONDENAÇÃO – VIABILIDADE - PROVAS SUFICIENTES DA AUTORIA E MATERIALIDADE – PALAVRA DOS POLICIAIS CORROBORADA PELO CONJUNTO PROBATÓRIO – DELAÇÃO DO CORRÉU CONFIRMADA POR ELEMENTOS EXTERNOS – APREENSÃO DE PORÇÕES DE ENTORPECENTES DISPENSADAS PELO APELADO DURANTE FUGA – COMPROVADA PROPRIEDADE DA SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE – CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE – PENA SUBSTITUIDA POR RESTRITIVA DE DIREITOS – RECURSO PROVIDO. A absolvição por insuficiência probatória não se sustenta quando as provas dos autos, analisadas em conjunto, demonstram a autoria delitiva com segurança jurídica suficiente para embasar um decreto condenatório. Embora a delação de corréu, isoladamente considerada, não seja suficiente para embasar condenação, quando corroborada por outros elementos de prova, como depoimento coerente dos policiais e apreensão de entorpecentes dispensados durante a fuga, constitui conjunto probatório apto a fundamentar o juízo condenatório. A dispensa de entorpecentes durante a fuga ao avistar policiais, aliada à apreensão de objetos relacionados ao tráfico na residência do réu, constitui forte indicativo da prática do crime de tráfico de drogas. R E L A T Ó R I O Trata-se de Recursos de Apelação Criminal interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e pela defesa de RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Várzea Grande/MT que julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA às penas de 05 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 500 (quinhentos) dias-multa pela prática do crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006), absolvendo o corréu RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Em suas razões recursais, a defesa de RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA arguiu, preliminarmente, a nulidade da prova por violação ao art. 157 do CPP, alegando que a abordagem policial foi baseada unicamente em denúncia anônima, sem fundadas razões para a busca pessoal. No mérito, pleiteia a desclassificação da conduta para o delito de porte para consumo pessoal (art. 28 da Lei nº 11.343/06), sustentando que o apelante é mero usuário e que a quantidade de droga encontrada, isoladamente, não caracteriza tráfico. Por seu turno, o Ministério Público pugna pela reforma da sentença para condenar RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES pelo crime de tráfico de drogas, argumentando que há provas suficientes de sua autoria delitiva, evidenciada pela apreensão de drogas em sua residência, pelo fato de ter dispensado porções de maconha durante a fuga ao avistar os policiais, além da indicação feita pelo corréu RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO. Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso da defesa de RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA, enquanto a defesa de RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES pugnou pelo desprovimento do recurso ministerial. Nesta instância, a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do eminente Procurador de Justiça Amarildo Cesar Fachone, em parecer fundamentado, opina pelo provimento do recurso ministerial e desprovimento do recurso defensivo, sintetizando a seguinte ementa: “RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA PARCIALMENTE CONDENATÓRIA – TRÁFICO DE DROGAS. 1. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL: 1.1. ALMEJADA A CONDENAÇÃO DO RÉU RAFAEL RIBEIRO PELA PRÁTICA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS – POSSIBILIDADE – PROVAS INDUBITÁVEIS DE QUE O RÉU PERPETROU O CRIME EM TELA, MORMENTE PELA PALAVRA DOS POLICIAIS MILITARES, EM SEDE JUDICIAL – 2. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA: 2.1. PRETENDIDA A NULIDADE POR ILEGALIDADE NA ABORDAGEM PESSOAL E APREENSÃO DA DROGA – IMPOSSIBILIDADE – FUNDADAS SUPEITAS DA VENDA DE ENTORPECENTES PELO RÉU, QUE AO SER ABORDADO EM VIA PÚBLICA NA POSSE DE 450G DE MACONHA, AFIRMOU QUE A DROGA FOI ADQUIRIDA COM O CORRÉU, INDICANDO, AINDA, O ENDEREÇO DELE – 2.2. PRETENDIDA A DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA – IMPOSSIBILIDADE – CONDUTA DO RÉU AMOLDASSE AO TRÁFICO DE DROGAS, BEM COMO EM SEU PRÓPRIO INTERROGATÓRIO, O RÉU DISSE QUE VENDERIA O ENTORPECENTE À UMA PESSOA CHAMADA RITA E ESTA LHE PAGARIA EM FAVORES SEXUAIS, O QUE CARACTERIZA O COMÉRCIO ILEGAL DE ENTORPECENTES. PARECER PELO PROVIMENTO DO RECURSO MINISTERIAL E DESPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO.” É o relatório. V O T O R E L A T O R DO RECURSO DEFENSIVO - DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA PROVA Inicialmente, passo à análise da preliminar de nulidade da prova suscitada pela defesa de RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA, que alega ter sido a abordagem policial realizada sem fundadas suspeitas, baseada apenas em denúncia anônima. A alegação não merece prosperar. Transcrevo a sentença na parte que a alude: Da regularidade da abordagem inicial. Esclareça-se que, em princípio havia elementos objetivos seguros e racionais que justificaram a abordagem policial inicial, visto que, de posse de informações da ocorrência do tráfico de drogas realizado no bairro Canelas, as quais indicavam que um indivíduo, conduzindo uma motocicleta de cor azul, estaria transportando drogas, policiais militares em sua função constitucional de policiamento ostensivo (art. 144, § 5º da Constituição Federal), em estrito cumprimento do dever legal, em rondas de averiguação, visualizaram o indivíduo (Rafael Anunciação) com as características apontadas. Realizada a abordagem e durante revista pessoal, localizou-se em sua posse, um tablete de substância análoga à maconha. Consta dos autos que, ao ser indagado, informou que transportava o entorpecente e que a droga seria de propriedade do “Rafa”, levando os policiais até a residência do mesmo, onde pegou o entorpecente. Nota-se que as circunstâncias antecedentes evidenciam (informações anônimas ricas em detalhes, somadas a cor e modelo do veículo e bairro em que ocorria o tráfico) de modo satisfatório os motivos que justificaram a referida diligência. Nesse sentido é a jurisprudência do STJ (AgRg no HABEAS CORPUS Nº 741.190 – SP, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 24 de maio de 2022). Frise-se que o art. 240 e 244 do CPP exige fundada suspeita para a efetiva realização da medida invasiva da busca pessoal ou veicular. A mera abordagem é ato administrativo e não implica, por si, em busca. No caso houve, primeiramente a abordagem, ocasião em que houve questionamento ao réu e, então, ele confirmou que portava os entorpecentes. Também a continuidade das investigações é lídima, não apresentando máculas, já que se deu mediante informações que foram repassadas pelo primeiro abordado. Não é outro o entendimento do STJ: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. INVASÃO DE DOMICÍLIO. DENÚNCIA ANÔNIMA. NÃO OCORRÊNCIA. INFORMAÇÃO DE MENOR APREENDIDO. SITUAÇÃO DE FLAGRANTE. 2. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA. NÃO APLICAÇÃO. INDICAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. 3. ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL. REGIME MAIS GRAVOSO DEVIDAMENTE MOTIVADO. 4. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O ingresso no domicílio do paciente não ocorreu em razão mera denúncia anônima, mas sim em razão de informações obtidas com menor apreendido em flagrante delito, que informou que a droga seria do paciente e que no seu imóvel haveria mais droga. Dessa forma, não há se falar em ausência de justa causa, porquanto caracterizada situação de flagrante delito. (AgRg no HABEAS CORPUS Nº 813061 - SP -2023/0107222-7. RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA) Ademais, a presença de justa causa para abordagem inicial e a apreensão das drogas decorrente desta diligência, aliada a evasão do codenunciado Rafael Magalhães, com a dispensa de entorpecentes ao solo (44,32g de maconha), em decorrência da chegada dos agentes estatais em sua residência, justifica igualmente o ingresso domiciliar subsequente, já que ali ficou estabelecida a situação de flagrância delitiva, conforme prevê a Constituição Federal, não havendo nenhum vício na apreensão do restante do material entorpecente. Portanto, pelos elementos angariados nos autos e, em consonância com o entendimento jurisprudencial, há de se considerar que as buscas estão devidamente amparadas por uma justa causa e, por conseguinte, as provas angariadas são lícitas. (ID287436426) Conforme se depreende dos autos, a abordagem policial que culminou na prisão do recorrente não se deu de forma arbitrária ou abusiva. Os agentes policiais receberam informações detalhadas sobre um indivíduo que estaria transportando drogas em uma motocicleta de cor azul no bairro Canelas, em Várzea Grande/MT. Tais informações, aliadas à constatação visual da presença do apelante em motocicleta com as mesmas características descritas, configuraram a fundada suspeita exigida pelo art. 244 do Código de Processo Penal para autorizar a busca pessoal. Como é sabido, o crime de tráfico de drogas, por sua própria natureza permanente, possibilita a abordagem e prisão em flagrante a qualquer momento, independentemente de mandado judicial, quando presente a fundada suspeita. No mesmo sentido, coleciono o seguinte julgado da jurisprudência deste E.Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – ART.33 DA LEI 11.343/2006 – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PRELIMINAR – NULIDADE DO INGRESSO DOMICILIAR – IMPOSSIBILIDADE - FUNDADA SUSPEITA EVIDENCIADA – CRIME DE CARATER PERMANENTE - APREENSÃO DE ARMAS E ENTORPECENTES - PRECEDENTE STF (AGRV NO HC 940195/SC) – MÉRITO – DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART.28 – INVIABILIDADE – AUTORIA E MATERIALIDADE EVIDENCIADAS – DEPOIMENTO FIRME E COESO DOS AGENTES POLICIAIS – DOSIMETRIA – AFASTAMENTO DAS CIRCUNSTANCIAS NEGATIVADAS – SEM INTERESSE RECURSAL – TRAFICO PREVILEGIADO –INVIABILIDADE – NÃO PREENCHE OS REQUISITOS DISPOSTOS NO §4º DO ART.33 DEDICAÇÃO AS ATIVIDADES DELITIVAS DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA– SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO O crime de tráfico de drogas, por sua natureza permanente, dispensa o mandado judicial para ingresso domiciliar, desde que existam fundadas razões de que a atividade criminosa esteja sendo realizada no local, conforme entendimento do STF e STJ. No caso, a atitude suspeita do adolescente e a sua fuga para o interior da residência, além da apreensão de drogas e dinheiro no local, caracterizam a presença de fundadas razões que justificaram o ingresso policial. (AGRV NO HC 940195/SC) Impossível se mostra a desclassificação do crime de tráfico de entorpecentes para a conduta descrita no artigo 28 da Lei Antidrogas, pois, o conjunto probatório é suficiente para comprovar a materialidade e a autoria delitiva do crime de tráfico de drogas, sendo desnecessária a efetiva mercancia para caracterizar o delito. O réu não preenche um dos requisitos de admissibilidade para a concessão do benefício disposto no §4º do art.33 da lei 11.343/2006, considerando que os autos evidenciam a dedicação a atividades criminosas de uma organização criminosa ou seja, uma facção. (N.U 1002288-67.2020.8.11.0050, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 16/04/2025, Publicado no DJE 16/04/2025) Nesse contexto, não se exige que os policiais tenham presenciado prévia e efetivamente a prática do crime para que se legitime a intervenção. A fundada suspeita, baseada em elementos concretos que indiquem a possível prática criminosa - como ocorreu no presente caso -, é suficiente para legitimar a abordagem policial, a qual, ressalte-se, resultou na descoberta de quantidade expressiva de entorpecentes (450g de maconha) em poder do apelante. Ademais, a denúncia anônima, por si só, não é ilícita ou ilegal como meio de obtenção de informações sobre possíveis práticas criminosas. O que não se admite é que, baseada exclusivamente em delação apócrifa, sem qualquer diligência complementar ou elemento de confirmação, seja determinada medida invasiva à esfera de direitos do cidadão. No caso em exame, os policiais, ao receberem a informação anônima, não procederam imediatamente à invasão de domicílio ou à busca pessoal. Realizaram diligências preliminares de averiguação, que culminaram na localização do suspeito com as características descritas, o que reforçou a suspeita inicial e justificou a abordagem. Corroborando esse entendimento, o policial Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos, ouvido em juízo, declarou que o apelante foi abordado após ser avistado pilotando motocicleta azul, conforme as características repassadas, demonstrando que a abordagem não foi aleatória, mas sim baseada em fundada suspeita. Portanto, rejeito a preliminar de nulidade da prova suscitada pela defesa. MÉRITO – RECURSO DEFENSIVO – DA DESCLASSIFICAÇÃO No mérito, o apelante RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA pleiteia a desclassificação da conduta para o crime de porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei nº 11.343/06). O pleito não merece acolhimento. A sentença foi prolatada nos seguintes termos: Então, analisaremos a questão em conjunto com o mérito. A materialidade do crime de tráfico em questão, encontra-se muito bem definida pelo boletim de ocorrência nº 2021.14796 (ID. nº 48541852), auto de exibição e apreensão (ID. nº 48541875), auto de constatação (ID. nº 48541874), qual apresentou resultado POSITIVO para a presença de Cannabis sativa L (MACONHA). A autoria com relação ao acusado Rafael Anunciação é inconteste. Nesse diapasão, percorrendo a trajetória processual, importante registrar que o processado admitiu, ainda que de forma qualificada, a autoria do crime de tráfico de drogas, quando inquirido em Juízo. Com relação aos fatos, o denunciado Rafael Anunciação contou que uma mulher, nominada de Rita, entrou em contato, pedindo para que ele lavasse entorpecente para ela em troca de sexo. Disse que ela pediu 300g de MACONHA. Narrou que pegou o entorpecente com um traficante e, ao chegar no local, se deparou com a polícia. Afirmou que os policiais se passaram pela mulher e solicitaram a droga, a fim de que fosse preso (mídia ID nº 90441083). Antes de adentrar nas razões de convencimento do Juízo, necessário tecer algumas considerações, especialmente no tocante a alegação de flagrante preparado. Na tentativa de alcançar a impunidade, o processado sustenta que o flagrante foi preparado pelos policiais militares que efetuaram sua prisão, argumentando que estes teriam se passado pela mulher que solicitou a droga. A pretensão, entretanto, não merece acolhimento. Isso porque, da própria fala do acusado, extrai-se contradições. Indagado pelo Juízo, o processado afirmou já ter se relacionado com a referida pessoa, consignando que havia saído com esta, em outra oportunidade, informando, inclusive, que compartilharam droga na ocasião. Ora, se a mulher de fato existe e, conforme mencionado pelo próprio réu, já se encontraram em outra oportunidade, como poderiam os policiais terem se passado pela mesma e armado a situação de flagrância?! Destaca-se que o acusado não arrolou a referida pessoa como testemunha ou até mesmo apresentou “print” da conversação mantida, a fim de consubstanciar a versão apresentada. Ainda, no tocante a alegação do acusado de que os policiais armaram, consigno que a comprovação do alegado incumbe a quem o fizer (CPP, art. 156), de modo que caberia ao réu comprovar a versão por ele levantada para afastar a autoria delitiva, inexistindo elementos concretos que demonstrem o alegado, não merece guarida a tese de que os policiais armaram o flagrante, simplesmente, para incriminá-lo. Nesse sentido, colaciono o entendimento do E. Tribunal de Justiça de Mato Grosso, in verbis: “APELAÇÃO CRIMINAL – ART. 33, C/C O ART. 40, INCISO III, DA LEI N. 11.343/2006 – ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006 – IMPOSSIBILIDADE – AUTORIA E MATERIALIDADE ESTAMPADAS NO CONJUNTO PROBATÓRIO – TRAFICÂNCIA CARACTERIZADA – CRIME COMETIDO NAS IMEDIAÇÕES DO CAMPO DE FUTEBOL DO BAIRRO – CAUSA DE AUMENTO DE PENA EVIDENCIADA – REGIME FECHADO JUSTIFICADO NA REINCIDÊNCIA DO RÉU – FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA – RECURSO DESPROVIDO, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. Descabe falar em absolvição ou em desclassificação quando as provas convergem no sentido de que o réu cometeu o crime de tráfico de drogas que lhe foi imputado na denúncia. “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal” (INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 101532/2015 Disponibilizado no DJE Edição nº 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017). “A mera alegação defensiva, por si só, não é suficiente para considerar que a droga foi "plantada" pelos policiais. Também não é suficiente para demonstrar quaisquer ilegalidades na conduta dos agentes públicos. Na hipótese, a defesa não produziu nenhuma prova capaz de elidir as declarações prestadas pelos referidos policiais militares, ficando restrita a meras e inférteis alegações. Isto posto, não há motivos para se desconsiderar o testemunho por eles prestados” (TJ/MT, N.U 0019060-83.2015.8.11.0055). “Se “demonstrado que a comercialização de drogas pelo acusado ocorria nas imediações do campo de futebol do bairro, comumente frequentado para atividades recreativas e desportivas” (PGJ, Parecer nº 002285-008/2021), a majorante tráfico de drogas nas imediações de espaço de práticas esportivas (Lei nº 11.343/06, art. 40, III) - deve ser preservada” (TJ/MT, N.U 1004866-90.2021.8.11.0042). “A reincidência permite o cumprimento de pena inicial no regime fechado, ainda que a reprimenda seja inferior a 8 (oito) anos de reclusão” (TJ/MT, N.U 1019288-56.2022.8.11.0003). (N.U 1013598-26.2022.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 30/01/2024, Publicado no DJE 02/02/2024)”. (Grifos nosso)”. Em arremate, ressalta-se que que o depoimento dos agentes policiais colhidos sob o crivo do contraditório merece credibilidade, máxime quando em harmonia com os elementos constantes dos autos, constituindo-se, assim, elementos aptos a respaldar a condenação. Nesse sentido é a jurisprudência do Col. Supremo Tribunal Federal: “[...] o valor do depoimento testemunhal de servidores públicos – especialmente quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório – reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal” (HC nº 74.608-0/SP, rel. Min. Celso de Mello). Com tais considerações, afasta-se a alegação de flagrante forjado, passando à análise do conjunto probatório. Pois bem. Consoante já consignado, pelos elementos que permeiam os autos, tem-se que autoria restou devidamente demonstrada, recaindo na pessoa do acusado. Esse entendimento encontra respaldo nas declarações harmônicas e coesas prestadas em Juízo pelo policial militar Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos e na confissão, mesmo que qualificada, da pessoa acusada. A policial militar Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos, ao ser inquirido, foi categórico ao afirmar que o processado Rafael Anunciação foi preso em flagrante quando transportava o entorpecente. Disse que, na oportunidade, atribuiu a propriedade do entorpecente ao coacusado Rafael Magalhães. Detalhando a abordagem, contou que o Rafael Anunciação, indicou o local onde pegou o entorpecente, no bairro Costa Verde e, ao chegar na residência apontada, percebeu o réu Rafael Magalhães fugiu pelos fundos, adentrando um matagal, não sendo possível persegui-lo, por ausência de tempo hábil. Consignou que foi solicitado apoio do canil, para varredura no matagal, mas, apesar do forte odor de entorpecente, nada foi localizado. Relatou que foi localizado na residência materiais para embalo e consumo de drogas e que os moradores teriam atribuído ao denunciado Rafael Magalhães a propriedade dos mencionados objetos (mídia ID n° 90441083). A testemunha Anderson Rodrigo Silva de Andrade, por sua vez, não se recordou dos fatos, contudo, ratificou as declarações prestadas na fase inquisitorial (mídia ID n° 90441083). Essa é a prova oral carreada nos autos. Nota-se que o interrogatório da pessoa acusada está cheio de incongruências, de modo que é perceptível sua tentativa de se eximir de sua responsabilidade penal. Nesse ponto, anota-se a divergência nas informações prestadas pelo acusado, que consignou que a suposta mulher teria solicitado 300g do entorpecente, contudo, consigo foi apreendido um tablete com aproximadamente 450g, consoante termo de apreensão no ID. nº 48541875. Nesse ponto, ressalta-se que o processado afirma ter adquirido e transportado o entorpecente, com a finalidade de entregá-lo a terceiro, em troca de recebimento de vantagem, qual seja, favores sexuais (ID. nº 90441083). Portanto, as circunstâncias em que ocorreram a apreensão da droga, aliado a confissão do acusado, formam um conjunto probatório seguro e harmonioso a demonstrar a prática delitiva por parte do acusado. Diante do exposto, uma vez que os fatos restaram devidamente esclarecidos no feito, a condenação é medida impositiva. Igual entendimento não se aplica ao codenunciado Rafael Magalhães, posto que não foram reunidos elementos suficientes a fim de revelar a autoria do crime imputado ao acusado, nos moldes capitulados na exordial acusatória e ratificado pelo MPE nas alegações finais. O acusado não foi preso em flagrante e nem ouvido na fase inquisitorial. Em Juízo, o réu Rafael Magalhães negou a propriedade do entorpecente e afirmou não manter qualquer vínculo com o codenunciado Rafael Anunciação, conhecendo-o tão somente de “vista”. Disse também que se evadiu da abordagem policial porque pensou que os agentes tivessem ido até o local, acionados por pela genitora do seu filho, em razão de pensão alimentícia, posto que discutiram na data anterior (mídia ID n° 90441083). Pois bem. Nota-se que, segundo informado pelos policiais que efetuaram a prisão em flagrante do codenunciado, o mesmo fez uma delação com relação a conduta do processado Rafael Magalhães, como sendo o fornecedor do entorpecente. Contudo, o codenunciado, tanto em sede policial quanto em Juízo, não confirmou a delação e não há nos autos qualquer outro elemento de prova que revela a veracidade dessa delação. No que tange a delação, esta deve seguir regras, que estão devidamente delineadas no bojo da Lei 12.850/13, além, é claro, de se encontrar de forma esparsa por várias legislações. Mas, basicamente, a delação de corréu não equivale à prova, propriamente dita, sendo, sim, um meio para a obtenção de prova, valendo mencionar que a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem aceitado a delação de corréu como meio de prova somente quando confirmada por algum outro elemento. Veja-se que no caso dos autos, a única coisa que implica o acusado foi a delação feita pelo corréu no momento em que foi abordado pelos policiais militares. Com exceção dessa delação, nada mais há nos autos que implique o acusado. Até mesmo a prova judicializada não pode ser considerada prova de culpa do réu, já que o que realmente se provou, foi que o codenunciado delatou o ora acusado e não a veracidade de tal delação. Ademais, registre-se que, a respeito da força probatória de uma delação isolada, a Lei 12.850/2013, que trata da colaboração premiada, é clara ao dispor no § 16 do art. 4º que: “§ 16 Nenhuma das seguintes medidas será decretada ou proferida com fundamento apenas nas declarações do colaborador: III - sentença condenatória”. E é tão somente isso que se tem, uma delação sem qualquer lastro ou confirmação. Observe-se, uma delação não é prova, mas pode ser meio para sua obtenção, entretanto nas investigações nada se fez para se obter outras provas, com base na delação. Veja-se que a prova produzida sob o crivo do contraditório menciona apenas a versão apresentada por um dos policiais militares que efetuaram a prisão em flagrante de Rafael Anunciação. Embora a referida testemunha tenha sido devidamente compromissada e ouvida sob o crivo do contraditório, a verdade é que a origem da informação é eivada de limitações. Repise-se, a fala do policial só indica ou revela que realmente Rafael Anunciação delatou Rafael Magalhães, mas não a veracidade do teor da delação. Desse modo, considerando a fragilidade dos depoimentos prestados na fase judicial e, ainda, a negativa de autoria sustentada pelo acusado, não há como prosperar a procedência da denúncia, sob pena de incorrer no risco de chancelar possível erro investigativo. Portanto, afigura-se presente a razoável dúvida acerca da dinâmica dos fatos, não existindo provas robustas e incisivas, ou mesmo, suficientemente confiáveis, nos autos que autorizem a condenação. Neste ponto é importante lembrar que o sistema processual penal brasileiro adota o método de valoração de provas chamado de “persuasão racional”, no qual deve o magistrado decidir a causa com base em seu livre convencimento, desde que fundamentado pelos elementos colacionados aos autos, sendo que o decreto condenatório não pode se basear em meras conjecturas e probabilidades, uma vez que a probabilidade não se traduz em certeza, militando a dúvida em favor do réu em obediência ao princípio “in dubio pro reo”. Ora, já é por demais sabido que um dos princípios basilares do processo penal assevera que a prova para condenação deve ser certa, baseada em dados objetivos e indiscutíveis, que evidenciem o delito, a autoria e a culpa. A condenação exige a certeza e não basta, sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente em torno da existência de certa realidade. Que a alta probabilidade não basta é o que ensina Walter Street, em sua notável monografia ‘In dubio pro reo’, 1962, p. 19 (‘Eine noch so grosse Wahrscheinkichelkeit genügt nicht’). O objetivo primeiro da prova é formar a convicção do juiz, mas esta deve se constituir num juízo de certeza, consistente, repita-se, em dados objetivos de justificação. Se ausentes, corre-se o risco de, no lugar da certeza, termos a simples crença. Portanto, diante da consagração em nosso direito positivo do princípio “in dúbio pro reo” e o anêmico conjunto probatório, no caso trazido à tela Judiciária, preponderou a dúvida acerca da autoria delitiva e o decreto absolutório nos moldes do art. 386, inciso V do CPP é medida imperativa. Do art. 59 do Código Penal c/c art. 42 da Lei antidrogas. Reza o artigo em questão que a natureza e a quantidade da droga servirão de critério de recrudescimento da pena base e de modo diferenciado, já que preponderam sobre os demais elementos. No caso dos autos, não há que se valorar fortemente nem a quantidade e tampouco a natureza da droga. Em relação ao art. 33, §4º da Lei de Drogas, é assegurado ao acusado primário, de bons antecedentes, que não se dedique às atividades criminosas e nem integra organização criminosa, a redução da pena de 1/6 a 2/3. No caso em comento, a minorante não é cabível, tendo em vista que o acusado ostenta condenação criminal irrecorrível, pelo crime de furto, nos autos 0007585-27.2017.8.11.0002, que transitou em julgado em 25/11/2019, cuja execução tramita perante o GR/SEEU nº 2000548-81.2020.8.11.0042, consoante consulta realizada no Sistema Eletrônico de Execução Unificado - SEEU, razão pela qual afasta-se a minorante do §4º do art. 33 da Lei de Drogas. Anota-se que ainda não decorreu, para ambos os acusados, o período de reabilitação ou depuração da reincidência, nos termos do art. 64, I, do CP. Da sucumbência. Como se sabe a sucumbência em sede de juízo criminal é decorrência da própria condenação, conforme reza o artigo 804 do Código de Processo Penal. Ainda, como é cediço, sentenças judiciais são executadas integralmente e, no caso de sentenças criminais, o juízo que a executa é o da Vara de Execuções Penais, não sendo aconselhável que haja dois juízos de execução para os seus termos. E mais, com relação às custas, mormente naqueles feitos de réus beneficiados pela justiça gratuita, tem prevalecido o entendimento de que deve haver condenação, mas sua execução ou cobrança fica suspensa e condicionada ao efetivo restabelecimento do patrimônio do condenado. Ou seja, somente no caso de constatação de sua pujança financeira é que poderá ser exigido o adimplemento, persistindo a dívida até que seja alcançada pela prescrição. Então, se sua cobrança ficar a cargo do juízo do conhecimento, tal fator caracterizará um insuperável empecilho para o arquivamento do processo, o que não é indicado, mormente em tempos de cobranças correicionais. Ademais, ainda que tal incumbência ficasse a cargo do juiz do conhecimento, seria contraproducente reavivar o processo já findo, de tempos em tempos, para aferir a eventual mudança do patrimônio do condenado, até que se extinga definitivamente o débito. Ao contrário, no juízo da execução, tal inconveniente não ocorre. Em primeiro lugar, porque o executivo de pena não será arquivado até que se a cumpra. Em segundo lugar, é corriqueiro que se analise tal processo a fim de verificar a possibilidade de progressão de regime, oportunidade em que se pode verificar também a possibilidade de pagamento das custas. Esse é o posicionamento do STJ: [STJ: AgRg no AREsp n. 254.330/MG. Quinta Turma. Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Data de Julgamento: 19/03/2013, DJe: 25/03/2013]. Nesse sentido tem decidido o TJMT: (Ap 76425/2018, DES. MARCOS MACHADO, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 18/12/2018, publicado no DJE 22/01/2019) e (Ap 54728/2018, DES. PAULO DA CUNHA, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 12/02/2019, publicado no DJE 15/02/2019). (ID287436426) A materialidade do delito está comprovada pelo auto de apreensão, auto de constatação preliminar e laudo pericial definitivo, que atestou tratar-se de 450g (quatrocentos e cinquenta gramas) de Cannabis sativa L (maconha). Quanto à autoria, esta restou igualmente comprovada, inclusive pelo próprio apelante, que confessou, em seu interrogatório judicial, que foi flagrado na posse do tablete de maconha. Sua única divergência em relação à acusação foi quanto à finalidade da posse, alegando que teria adquirido o entorpecente a pedido de uma mulher chamada "Rita", em troca de favores sexuais. Ocorre que, mesmo aceitando-se como verdadeira a versão apresentada pelo réu, ainda assim estaria configurado o crime de tráfico de drogas, e não o mero porte para consumo pessoal. Isso porque, consoante previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, constitui crime de tráfico de drogas, dentre outras condutas, transportar, trazer consigo ou entregar a consumo, ainda que gratuitamente, substância entorpecente. Nesse sentido, o próprio apelante admitiu estar transportando expressiva quantidade de maconha (450g) com a finalidade de entregá-la a terceira pessoa, ainda que alegue como motivação a obtenção de favores sexuais. Tal circunstância, por si só, configura o tipo penal do tráfico, pois a substância não se destinava ao seu consumo pessoal, mas sim à entrega a outrem. Ademais, a quantidade apreendida - 450g de maconha - é incompatível com a alegação de porte para consumo pessoal, sobretudo quando considerada a dinâmica dos fatos e a confissão do réu de que a droga se destinava a terceira pessoa. Corroborando a prática do crime de tráfico, tem-se o depoimento firme e coeso do policial Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos, que confirmou em juízo as circunstâncias da apreensão da droga. Tal depoimento, conforme pacífica jurisprudência, possui valor probante e, no presente caso, encontra-se em harmonia com os demais elementos de convicção produzidos nos autos. Portanto, não há como acolher o pleito desclassificatório, estando correta a sentença que condenou o apelante pelo crime de tráfico de drogas. DO RECURSO MINISTERIAL Passo à análise do recurso interposto pelo Ministério Público, que visa à condenação de RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES pelo crime de tráfico de drogas. O recurso merece provimento. A sentença absolutória baseou-se, fundamentalmente, na premissa de que a única prova contra o réu RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES seria a delação do corréu RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA, o que, sem elementos de corroboração, seria insuficiente para fundamentar uma condenação criminal. De fato, a delação de corréu, isoladamente considerada, não constitui elemento probatório suficiente para embasar um decreto condenatório, conforme orientação consolidada na jurisprudência dos Tribunais Superiores e expressa no art. 4º, §16, III, da Lei nº 12.850/2013. Ocorre que, no presente caso, ao contrário do que concluiu o juízo singular, a delação do corréu não é o único elemento de prova a incriminar o apelado RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES. Existem outros elementos probatórios que, analisados em conjunto, formam um quadro de certeza suficiente para embasar uma condenação pelo crime de tráfico de drogas. Primeiramente, cabe destacar que a abordagem policial na residência de RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES não se deu de forma aleatória, mas sim mediante indicação precisa do local pelo corréu RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA, que informou ter adquirido a droga naquele endereço. Ao chegarem ao local indicado, os policiais testemunharam o exato momento em que RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES, ao perceber a presença da viatura policial, empreendeu fuga pelos fundos da residência, adentrando um matagal e dispensando objetos durante a fuga. Conforme relatado pelo policial Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos, ouvido em juízo, foram encontradas no caminho da fuga 03 (três) porções de maconha, totalizando 42,17g (quarenta e dois gramas e dezessete centigramas) do mesmo entorpecente apreendido com o corréu. A conduta de empreender fuga e dispensar entorpecentes ao avistar policiais é comportamento típico de quem pratica o crime de tráfico, constituindo forte indício da autoria delitiva. Não é crível a alegação de que o apelado fugiu por temer ser preso por dívida de pensão alimentícia, pois, além de se tratar de explicação notoriamente inverossímil - uma vez que a prisão civil por alimentos não é executada dessa maneira -, tal versão não explica o fato de ter dispensado porções de maconha durante a fuga. Ademais, durante buscas realizadas na residência, foram encontrados 02 (dois) pratos, 01 (uma) colher e 01 (uma) faca com resquícios de droga, além de 02 (dois) tubos de plástico filme e 01 (um) carretel de linha, objetos comumente utilizados no fracionamento e preparação de drogas para venda. Esses materiais, associados às circunstâncias da fuga e à apreensão das porções de maconha, constituem conjunto probatório suficiente para demonstrar a prática do crime de tráfico. O depoimento do policial Paulo Giovanni Rondon Monge dos Santos é claro ao afirmar que os moradores da residência atribuíram ao apelado RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES a propriedade dos objetos relacionados ao tráfico encontrados no local. Ademais, segundo o relatório policial juntado aos autos, diligências complementares realizadas por policiais civis constataram que ambos os réus "são comparsas na venda de entorpecente no bairro e região [...] que os suspeitos moram em bairros diferentes, mas se reúnem em diversos pontos da cidade de Várzea Grande/MT, para praticar a venda de drogas". Outro elemento relevante é o testemunho do tio do apelado, JOACIR RIBEIRO DE MAGALHÃES, que declarou em sede policial "que sempre desconfiou que seu sobrinho RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES era traficante de droga". Embora tal declaração, por si só, não seja suficiente para fundamentar uma condenação, quando analisada em conjunto com os demais elementos probatórios, reforça a conclusão de que o apelado estava envolvido com o tráfico de drogas. Portanto, diferentemente do que concluiu o juízo a quo, existe um conjunto probatório sólido e coeso a demonstrar a autoria delitiva por parte de RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES, não se limitando à mera delação do corréu. A dispensa de drogas durante a fuga, a apreensão de objetos relacionados ao tráfico em sua residência, as declarações dos policiais e as diligências complementares formam um quadro probatório suficiente para embasar uma condenação pelo crime de tráfico de drogas. Assim é o entendimento jurisprudencial do TJMT: “APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – TRAFICO ILÍCITO DE DROGAS – RECURSO DA DEFESA – NULIDADE DA ABORDAGEM POLICIAL PRETEXTADA – INOCORRÊNCIA – FUNDADA SUSPEITA DEMONSTRADA– LEGALIDADE DA MEDIDA – PRECEDENTES STJ [Nº. HC 230232 -DJE DE 20/12/2023] – ABSOLVIÇÃO DO CRIME POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – IMPOSSIBILIDADE – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS EM HARMONIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DO CONTEXTO PROBATÓRIO – ENUNCIADO ORIENTATIVO N. 8 DO TJMT – LAUDO DE CONSTATAÇÃO DE DROGAS – MACONHA, COCAÍNA E QUANTIA EM DINHEIRO – CONTEXTO DE TRAFICÂNCIA– CRIME CLASSIFICADO COMO DE AÇÃO MÚLTIPLA OU MISTO ALTERNATIVO – ENUNCIADO ORIENTATIVO N.07 DO TJMT – CONDENAÇÃO MANTIDA– DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME PREVISTO NO ‘CAPUT’ DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006 PARA O DELITO DE POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL [ART. 28 DO MESMO DIPLOMA LEGAL] – INVIABILIDADE – CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE NÃO EVIDENCIADA NOS AUTOS – ENUNCIADO ORIENTATIVO N. 3 DO TJMT – SENTENÇA PRESERVADA – RECURSO DESPROVIDO. Se a prova angariada no curso da instrução revela-se como a necessária e suficiente para comprovar a autoria e a materialidade do delito de tráfico de drogas, a condenação é medida que se impõe. O Enunciado Orientativo nº.8 do TJMT: “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneas para sustentar a condenação criminal”. O Enunciado Orientativo nº. 7 do TJMT:“O delito de tráfico de drogas, previsto no art. 33 da Lei n. 11.343/2006, é classificado como de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas. ” As drogas apreendidas, não apenas por sua quantidade, mas também por sua natureza e pela forma de acondicionamento, se destinavam a mercancia, razão pela qual o cotejo probatório objetivado nos autos não comporta a tese da desclassificação defensiva. O Enunciado Orientativo 3 do TJMT:“A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. (N.U 0004145-26.2020.8.11.0064, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 09/07/2024, Publicado no DJE 12/07/2024)(n.n) Nesse contexto, merece provimento o recurso ministerial para condenar RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES nas sanções do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. DA DOSIMETRIA Passo à dosimetria da pena do réu RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES, observando o sistema trifásico adotado pelo Código Penal (art. 68). Na primeira fase, analisando as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal e no art. 42 da Lei nº 11.343/06, verifico que: A culpabilidade do agente não extrapola os limites do tipo penal. Não há nos autos registro de antecedentes criminais que possam ser considerados desfavoráveis. A conduta social e a personalidade do agente não foram objeto de prova nos autos, razão pela qual deixo de valorá-las. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal, qual seja, o lucro fácil. As circunstâncias e consequências não extrapolam o tipo penal. O comportamento da vítima não se aplica ao caso, por se tratar de crime vago. Quanto à natureza e quantidade da droga, previstas no art. 42 da Lei nº 11.343/06 como preponderantes sobre as demais circunstâncias, verifico que foram apreendidas 03 (três) porções de maconha, pesando 42,17g (quarenta e dois gramas e dezessete centigramas), quantidade que não se mostra expressiva a ponto de justificar a elevação da pena-base. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes a serem consideradas, mantendo-se a pena intermediária em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na terceira fase, verifico a possibilidade de aplicação da causa de diminuição de pena prevista no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06, uma vez que o réu é primário, de bons antecedentes, não se dedica a atividades criminosas nem integra organização criminosa, conforme elementos constantes dos autos. Considerando a quantidade de droga apreendida (42,17g de maconha), as circunstâncias do crime e o grau de envolvimento do agente, aplico a fração de 2/3 (dois terços) de redução, resultando na pena definitiva de 01(um) ano, 08(oito) meses como o pagamento de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multas. Fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, considerando a situação econômica do réu. Estabeleço o regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do art. 33, §2º, "c", do Código Penal, em razão da quantidade de pena aplicada. Destarte, atendidos os requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, previsto no artigo 44 da Lei Material Penal, aplico, de ofício, duas penas restritivas de direito, cabendo ao Juízo das Execuções sua efetivação e fiscalização: a primeira consistente na prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, nos termos do artigo 46 do Código Penal, a segunda na limitação de finais de semana, na forma do artigo 48 do Código Penal. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, REJEITO a preliminar de nulidade da prova suscitada pela defesa de RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA; DESPROVEJO o recurso interposto por RAFAEL DE ANUNCIAÇÃO SILVA, mantendo sua condenação nos termos da sentença recorrida; PROVEJO o recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO para CONDENAR o réu RAFAEL RIBEIRO MAGALHÃES nas sanções do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, à pena de 01 (um) ano, 08 (oito) meses como o pagamento de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multas. Atendidos os requisitos contidos nos incisos I, II e III do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritiva de direito nos termos do art. 44, §2º, do Código Penal consistente em prestação de serviços à comunidade (art. 43, inciso IV, do Código Penal) e limitação do fim de semana (art. 43, inciso VI, do Código Penal). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 29/07/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear