Processo nº 1026096-07.2023.8.11.0015
ID: 336821728
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1026096-07.2023.8.11.0015
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIEGO GUTIERREZ DE MELO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1026096-07.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Interpretação / Revisão…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1026096-07.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Interpretação / Revisão de Contrato, Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [DURCELINA DA SILVA SOARES - CPF: 257.291.521-91 (APELANTE), RAFAEL CARDIAS CHIOGNA - CPF: 067.425.296-95 (ADVOGADO), FASIPE CENTRO EDUCACIONAL LTDA - ME - CNPJ: 07.939.776/0001-10 (APELADO), DIEGO GUTIERREZ DE MELO - CPF: 905.736.761-00 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO. FIES. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE COBRANÇA DISCRIMINATÓRIA. ISONOMIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação declaratória de nulidade contratual c/c revisão contratual, repetição de indébito e indenização por danos moral e material ajuizada por estudante beneficiária do FIES contra instituição de ensino superior. II. Questão em discussão Questões em discussão: (i) saber se houve prática discriminatória na cobrança de mensalidades entre alunos financiados pelo FIES e alunos pagantes diretos; (ii) e saber se há direito à repetição de indébito e à indenização por danos material e moral. III. Razões de decidir A parte autora não apresentou prova robusta de cobrança diferenciada e discriminatória entre alunos financiados e não financiados. Os documentos demonstram que os alunos do FIES também se beneficiavam de descontos. Incumbia à autora comprovar que recebeu tratamento discriminatório por parte da instituição de ensino e que esta concedia descontos a alunos que pagavam diretamente suas mensalidades, ônus do qual não se desincumbiu, não comprovando o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, CPC). IV. Dispositivo e tese Apelação cível conhecida e desprovida. Tese de julgamento: “1. A existência de valores distintos em razão da modalidade de pagamento não caracteriza, por si só, violação ao princípio da isonomia, notadamente quando os descontos são estendidos a alunos optantes do financiamento estudantil. 2. Ausente prova de que os descontos foram efetivamente concedidos de forma desigual, não há que se falar em tratamento discriminatório, devolução em dobro de valores, ou indenização por dano material ou moral.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, inc. VIII, e 14; CPC, arts. 55, 373, I e 99, §3º; Lei nº 10.260/2001, arts. 4º, §4º e §5º. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC nº 1017957-66.2023.8.11.0015, Rel. Des. Antonia Siqueira Gonçalves, j. 24.02.2025; TJMT, RAC nº 1010650-63.2024.8.11.0003, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 09.05.2025. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Durcelina da Silva Soares contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop, que nos autos da ação declaratória de nulidade c/c revisão contratual, repetição de indébito e indenização por dano moral e material, em desfavor de FASIPE Centro Educacional Ltda. – ME, julgou improcedente os pedidos deduzidos na inicial, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixado em 10% sobre o valor da causa, ficando a exigibilidade suspensa em razão da justiça gratuita concedida. Inconformada, recorre a autora, ora apelante, sustentando que a instituição de ensino praticou conduta discriminatória ao não conceder à recorrente os mesmos descontos aplicados a outros alunos, notadamente aos que não são beneficiários do programa FIES, em especial sua colega indicada como paradigma, cuja comprovação documental foi anexada aos autos. Afirma, ainda, que a sentença deixou de apreciar diversos pedidos deduzidos na inicial, como a exibição de documentos contratuais e financeiros, e os pleitos relativos aos danos materiais e moral. Segue apontando que o juízo de origem fundamentou a decisão aplicando indevidamente a Lei nº 13.455/2017 de forma retroativa e que a legislação aplicável ao caso é o art. 4º, §4º, da Lei nº 10.260/2001, que veda expressamente a prática de valores diferenciados em prejuízo de estudantes financiados pelo FIES. Sustenta, ainda, que a sentença afastou de forma indevida a inversão do ônus da prova, e que mesmo diante de indícios robustos de cobrança desigual, o juízo impôs à consumidora o ônus de comprovar fato de difícil acesso. Requer, ao final, pela reforma total da sentença, com a procedência dos pedidos, condenação da apelada à repetição em dobro dos valores pagos indevidamente e ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 20.000,00. Em contrarrazões, a apelada suscita preliminar de conexão com outras demandas, impugnação à justiça gratuita e ausência de dialeticidade. No mérito, pugna pelo desprovimento do recurso (id 292764202). É o relatório. Inclua-se em pauta. Cuiabá, 23 de julho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Durcelina da Silva Soares move ação declaratória de nulidade c/c revisão contratual, restituição de indébito, indenização por danos moral e material, com pedido de tutela de urgência, em desfavor de FASIPE Centro Educacional Ltda. – ME, objetivando, em síntese, o reconhecimento da nulidade de cláusulas contratuais que, segundo a autora, impuseram condições discriminatórias à sua relação de consumo enquanto estudante do curso de Fisioterapia com financiamento integral pelo FIES, em especial no que concerne à cobrança de mensalidades em valores superiores àqueles praticados com outros alunos do mesmo curso e semestre, que pagavam diretamente à instituição, sem financiamento. Alega, em apertada síntese, que cursou regularmente a graduação em Fisioterapia na instituição ré, sendo contratante do FIES, e somente ao final do curso tomou ciência de que a faculdade aplicava valores distintos aos alunos, beneficiando com descontos significativos aqueles que quitavam as mensalidades com recursos próprios, em prejuízo daqueles com financiamento estudantil. Aduz que tal prática seria vedada pelo §4º do art. 4º da Lei nº 10.260/2001 e pelas portarias normativas do MEC, constituindo violação ao princípio da isonomia e ao direito à informação clara e adequada. Além disso, a autora sustenta que a instituição incluiu disciplinas indevidamente ao final do curso, impedindo sua colação de grau e exigindo o pagamento adicional não previsto inicialmente, o que teria lhe causado prejuízos materiais e emocionais. Ao final requereu a declaração de nulidade de cláusulas contratuais tidas por abusivas, que teriam imposto condições discriminatórias à autora, além da revisão contratual para readequação do montante com a restituição em dobro dos valores que teriam sido pagos indevidamente ao longo do curso, bem como indenização por danos materiais e moral. Após a regular tramitação processual, o douto magistrado a quo julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, por entender que a parte autora não demonstrou, de forma satisfatória, a existência de cláusulas abusivas, tampouco comprovou a alegada diferenciação injustificada entre alunos financiados e não financiados. Aduziu, ainda, que os descontos concedidos pela instituição encontram respaldo jurídico e que não se evidenciou dano moral indenizável. Ao fim, condenou a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixado em 10% sobre o valor da causa, ficando a exigibilidade suspensa em razão da justiça gratuita concedida (id. 292767387). Não concordando com a r. sentença, recorre a autora, ora apelante, sustentando que a instituição de ensino praticou conduta discriminatória ao não conceder à recorrente os mesmos descontos aplicados a outros alunos, notadamente aos que não são beneficiários do programa FIES, em especial sua colega indicada como paradigma, cuja comprovação documental foi anexada aos autos. Afirma, ainda, que a sentença deixou de apreciar diversos pedidos deduzidos na inicial, como a exibição de documentos contratuais e financeiros, e os pleitos relativos aos danos materiais e moral. Segue apontando que o juízo de origem fundamentou a decisão aplicando indevidamente a Lei nº 13.455/2017 de forma retroativa e que a legislação aplicável ao caso é o art. 4º, §4º, da Lei nº 10.260/2001, que veda expressamente a prática de valores diferenciados em prejuízo de estudantes financiados pelo FIES. Sustenta, ainda, que a sentença acabou afastando de forma indevida a inversão do ônus da prova, e que mesmo diante de indícios robustos de cobrança desigual, o juízo impôs à consumidora o ônus de comprovar fato de difícil acesso. Requer, ao final, pela reforma total da sentença, com a procedência dos pedidos, condenação da apelada à repetição em dobro dos valores pagos indevidamente e ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 20.000,00. Pois bem. Inicialmente, cumpre analisar as questões preliminares suscitadas pela recorrida em sede de contrarrazões (id. 292764202). Quanto à alegação de conexão com outros processos ajuizados por ex-alunos da mesma instituição de ensino superior, tenho, com a devida vênia, que não merece prosperar. Nos termos do art. 55, caput e §1º, do Código de Processo Civil, a conexão exige identidade entre o pedido ou a causa de pedir. Logo, no caso dos autos, trata-se de ação calcada em relação contratual específica, celebrada entre a apelante e a instituição de ensino, cujas circunstâncias e documentos são próprios e individualizados, embora se reconheça a similitude temática. Ainda que assim não fosse, não é cabível a rediscussão da preliminar de conexão nas contrarrazões, porquanto a matéria foi analisada e decidida expressamente na decisão saneadora (id. 292767353), sem que a parte tenha interposto o recurso cabível, operando-se a preclusão. Dessa forma, rejeito a preliminar de conexão. Nas contrarrazões, a parte apelada também pleiteia pelo não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade, nos termos do art. 1010, inc. III, do CPC. Sem razão. Basta uma simples leitura das razões recursais (id. 292767398) para constatar que a apelante Durcelina da Silva Soares dirigiu o seu inconformismo contra a r. sentença, sendo de clareza solar que a matéria ventilada na peça recursal guarda relação com a fundamentação do decisum. Logo, afasto a preliminar de ausência de dialeticidade. Por fim, no tocante à alegada ausência dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade de justiça, verifica-se que a parte autora apresentou, além da declaração de hipossuficiência econômica (id. 292766592), outros documentos tais como CTPS, que demonstra estar desempregada, isenção da declaração de imposto de renda e outros (id. 292766589), conforme exige o art. 99, §3º, do CPC, motivo pelo qual o juízo de origem deferiu a concessão do beneficio. A parte recorrida, por sua vez, ao impugnar a gratuidade, não trouxe aos autos qualquer prova concreta capaz de infirmar a declaração da autora ou os documentos apresentados, limitando-se a afirmar, de modo genérico, que esta possui qualificação profissional para exercer atividade remunerada. Dessa forma, rejeito a preliminar de revogação da justiça gratuita. Superadas essas questões, a controvérsia recursal cinge-se à alegada prática discriminatória pela instituição ré em face da parte autora, ora apelante, em razão da cobrança de mensalidades em valores superiores aos aplicados a outros alunos do mesmo curso de Fisioterapia, porém não beneficiários do FIES. Defende a apelante que tal distinção violaria os princípios da isonomia e da boa-fé objetiva, além do art. 4º, §4º, da Lei nº 10.260/2001, sendo indevida a cobrança de valores distintos em razão exclusiva da forma de pagamento. De proêmio, é fato incontroverso que a autora firmou contrato de prestação de serviços educacionais (id. 292766577) para frequentar o curso de Fisioterapia na instituição requerida, além do contrato de financiamento estudantil (FIES) no valor global de 88.725,00, que corresponde ao valor financiado para o primeiro semestre de 2014, no importe de R$ 7.098,00 (sete mil e noventa e oito reais). Ao compulsar os autos, verifica-se, em consonância com o que foi adequadamente delineado na sentença de mérito (id. 255980737), que a parte autora não logrou êxito em demonstrar o tratamento discriminatório que afirma ter sofrido. Explico. Analisando os documentos colacionados pela própria autora, observa-se que não são suficientes para comprovar a alegação de que teria havido cobrança diferenciada e injustificada entre estudantes em situação acadêmica idêntica, sendo identificada a concessão de desconto aos alunos optantes do FIES. A título de exemplo, o documento id. 292766583 revela que no 7º semestre, o valor da semestralidade sem desconto era de R$ 11.924,28 e com desconto era de R$10.368,96. Todavia, para alunos com financiamento estudantil, o valor da semestralidade com desconto para o FIES foi de R$ 9.850,44, com mensalidade mensal de R$ 1.641,74. O mesmo se verifica pelo documento id. 292766583, que demonstra, por exemplo, que a semestralidade do curso no ano de 2016 era de R$ 10.478,28, cujo pagamento com desconto seria de R$ 9.111,54. Todavia, para alunos com financiamento estudantil, o valor da semestralidade com desconto correspondia à R$ 8.655,95, com mensalidade de R$ 1.442,65, de modo que não se pode dizer que a instituição de ensino não ofertava descontos aos alunos optantes do FIES. Não obstante, a autora apresentou documento denominado Recibo de Liquidação, emitido em nome de Ketlyn Caroline Correa da Silva, relativos a mensalidades do primeiro semestre de 2015, cujo valor da mensalidade paga pela aluna seria de R$ 741,43. Contudo, não se pode, com base exclusivamente nesse dado, concluir que esse montante correspondia ao valor integral da mensalidade então vigente, uma vez que não há qualquer elemento indicativo acerca da eventual concessão de benefícios ou programas de incentivo à referida aluna. Além disso, conforme bem observado na r. sentença, o Edital de Renovação de Matrícula do 1º Semestre do Ano Letivo de 2015, é voltado à comunidade discente da instituição, no qual se apresenta uma tabela meramente ilustrativa, identificada expressamente como “exemplo”, com fins meramente informativos, para simular os percentuais de abatimento oferecidos a estudantes que optassem pela matrícula antecipada. A própria redação da tabela destaca, na linha inicial, que os valores não se referem ao preço real dos cursos, mas apenas representam um “exemplo de benefício”, o que invalida a leitura adotada pela autora, segundo a qual haveria uniformização de valores mensais. Nesse ponto, bem destacou o douto magistrado ao asseverar: “Note-se, que o valor integral da semestralidade do curso era de R$ 10.478,28 (dez mil e quatrocentos e setenta e oito reais e vinte e oito centavos), enquanto com desconto, ficaria em 9.111,54 (nove mil cento e onze reais e cinquenta e quatro centavos) e para os alunos detentores do Fies, R$ 8.655,95 (oito mil, seiscentos e cinquenta e cinco reais e noventa e cinco centavos), cuja parcela mensal corresponderia a R$ 1.442,65 (mil e quatrocentos e quarenta e dois reais e cinquenta e cinco centavos). Portanto, diante deste cenário, influi-se, por inferência racional, que a instituição de ensino ofertava o valor com desconto à estudante requerente. A fim de comprovar que a instituição de ensino fazia discriminação entre os estudantes optantes pelo financiamento estudantil e os não optantes, a autora colacionou aos autos o documento constante no evento nº 132571956, denominado “recibo de liquidação”, em que outra aluna efetuou o pagamento do primeiro semestre de 2015, por meio de cheques no valor de R$ 741,43 (setecentos e quarenta e um reais e quarenta e três centavos). Ao esmiuçar o conteúdo do documento, de início, verifica-se que há a informação de que o valor integral da mensalidade naquele período (1º semestre do ano de 2015), era de R$ 1.537,1 (mil e quinhentos reais e trinta e sete centavos). Ou seja, comparando com o valor pago pela autora em período posterior (2º semestre de 2016, acima destacado, de R$ 1.442,65 – ID 119638492), confirma-se que o valor da mensalidade era ofertado com desconto à requerente. Por outro lado, apesar de constar no “recibo de liquidação” o valor mensal de R$ 741,43 (setecentos e quarenta e um reais e quarenta e três centavos), apenas por esse elemento, não é possível afirmar que tal quantia correspondia ao valor integral da mensalidade, pois não há informação se a “aluna paradigma” era detentora de benefícios, tais como FIES, Prouni (que podem ser concedidos parcialmente) ou outros fornecidos pela própria instituição de ensino. Ainda, da análise meticulosa do conjunto de provas produzido no processo, máxime do teor do documento arquivado ao evento nº 132569014, deflui-se que, ao contrário da narrativa da petição inicial, se trata de um edital geral para todos os estudantes da faculdade e a tabela de reajuste constante no referido é um “MODELO/EXEMPLO/SIMULAÇÃO sobre o benefício obtido pelos estudantes que optarem por fazer a matrícula antecipadamente, conforme percentuais indicados nos parágrafos anteriores (4% e 2% de desconto), e não significa que a mensalidade de todos os cursos da faculdade fosse no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), tal como quis inferir a parte autora. Leia-se o termo ‘exemplo’, expressamente constante na primeira linha da tabela: Diante desta moldura, não há prova robusta que evidencie a prática de tratamento discriminatório entre os estudantes optantes pelo financiamento estudantil e outros que efetuavam pagamento com recursos próprios integral ou parcialmente, ônus que incumbia à requerente, que ao ser intimada a especificar provas, optou pelo julgamento antecipado do mérito (ID 163920934).” (id. 292767387). Além disso, com a devida vênia, verifica-se que a sentença não aplicou retroativamente a Lei nº 13.455/2017. O magistrado a quo limitou-se a observar que os descontos ofertados pela instituição de ensino, mesmo antes da entrada em vigor da referida lei, não configuravam, por si só, prática abusiva ou discriminatória, sobretudo por não haver nos autos demonstração de que tais reduções foram direcionadas com o objetivo de prejudicar ou excluir estudantes beneficiários do FIES. Ademais, também não assiste razão à apelante quando invoca o art. 341 do CPC para imputar à parte ré a confissão tácita dos documentos apresentados. Isso porque os documentos colacionados pela autora, por si só, não são aptos a comprovar a alegada prática de discriminação entre estudantes financiados pelo FIES e aqueles que quitavam suas mensalidades com recursos próprios. Ao revés, os elementos demonstram que a instituição de ensino concedia descontos inclusive aos alunos beneficiários do financiamento estudantil, o que, por si só, afasta a tese de diferenciação injustificada, esvaziando a pretensão da apelante nesse ponto. Ora, mister se faz constar que é plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor na espécie, bem como a inversão do ônus da prova, nos termos do seu art. 6º, inc. VIII, tendo em vista a existência de relação de consumo. Por outro lado, também não se desconhece que o art. 14, do CDC, dispõe que a falha da prestação do serviço é de caráter objetivo, somente sendo afastada por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior. Todavia, ainda que haja a aplicação do CDC no caso vertente, com deferimento da inversão do ônus da prova, o certo é que cabe à consumidora provar, mesmo que minimamente, o quanto alegado na inicial, consoante preceitua o art. 373, inc. I, do CPC. Isto porque, o art. 373, inc. I e II, do CPC, preceitua que cabe ao autor comprovar o fato constitutivo de seu direito, determinando que é ônus do réu apresentar provas hábeis a demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito por aquele postulado, verbis: “Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. ” In casu, não há nos autos prova real e capaz de demonstrar que a autora, aluna financiada integralmente pelo FIES, foi submetida a tratamento desigual em relação aos colegas não beneficiários do mesmo programa. O que se observa, na verdade, é que a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I, do CPC. Com efeito, a jurisprudência deste Tribunal tem exigido prova robusta da alegada violação à isonomia em casos dessa natureza, como bem decidido por esta Terceira Câmara de Direito Privado, que deu provimento ao recurso manejado pela FASIPE, ora apelada, para julgar a ação improcedente, veja, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE, REVISÃO CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO C/C DANO MORAL E MATERIAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – PRELIMINARES DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE, CERCEAMENTO DE DEFESA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS – MÉRITO – CURSO SUPERIOR EM FISIOTERAPIA – ALUNA BENEFICIÁRIA DO FIES – ALEGAÇÃO DE TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO – DESCONTO SOBRE O VALOR DA MENSALIDADE CONCEDIDO A ALUNOS QUE PAGAM AS MENSALIDADES COM RECURSOS PRÓPRIOS – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Não há falar em violação ao princípio da dialeticidade, visto que a apelante rebateu os termos da sentença, expondo os motivos para alteração da decisão. Não configura o cerceamento de defesa quando o magistrado entende que as provas coligidas são suficientes à formação de seu convencimento e julga antecipadamente a lide, de modo que se torna desnecessária a dilação probatória. Por envolver relação de consumo, o termo inicial da prescrição inicia-se com o conhecimento da violação do direito, ou seja, quando a autora teve conhecimento da existência do benefício após a conclusão do curso, contados 05 (cinco) anos, nos termos do artigo 27 do CDC. À autora incumbia provar as alegações de que recebeu tratamento discriminatório por parte da requerida e que esta concedia descontos sobre o valor da mensalidade aos alunos que pagavam o curso com recursos próprios, o que não ocorreu. Se não há provas de que os descontos foram efetivamente concedidos aos outros estudantes, não há se falar em tratamento discriminatório e em devolução de valores, logo, a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos é medida que se impõe.” (RAC n.º 1017957-66.2023.8.11.0015, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Antonia Siqueira Goncalves, j. 24.02.2025 – destaquei). De igual modo, a 5ª Câmara de Direito Privado do TJMT, no julgamento da Apelação Cível n.º 1010650-63.2024.8.11.0003, envolvendo a mesma questão, assim decidiu: “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO EDUCACIONAL. DESCONTOS DE PONTUALIDADE. DISCRIMINAÇÃO ENTRE ALUNOS DO FIES E PAGANTES DIRETOS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. RECURSO DESPROVIDO. (...) Tese de julgamento: A ausência de controvérsia fática relevante justifica o julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, I, do CPC. A diferenciação de valores com base na modalidade de pagamento não configura, por si só, prática discriminatória. A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, exige a presença cumulativa da hipossuficiência e da verossimilhança das alegações. A repetição do indébito exige prova de pagamento indevido, o que não se verifica quando ausente a comprovação de valores efetivamente pagos em desconformidade com o contrato. A configuração de dano moral depende da demonstração de conduta ilícita e de prejuízo à esfera extrapatrimonial, o que não se observa na hipótese dos autos.” (RAC n.º 1028804-30.2023.8.11.0015, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, 5ª Câmara de Direito Privado, j. 09.05.2025 - destaquei). Ainda que assim não fosse, de clareza solar que a pretensão da autora é pela repetição de indébito, isto é, busca a devolução do que supostamente teria sido pago indevidamente. Todavia, como visto, a autora nada pagou à IES, de modo que a sua legitimidade ad causam para postular pela restituição dobrada do valor é questionável. Isso porque, a Lei n.º 10.260/2001, tem previsão expressa no art. 4º, §5º, inc. II, quanto aos casos de descumprimento de obrigações ou cobranças irregulares de encargos, de modo que deve a IES ressarcir ao próprio FIES, veja: “Art. 4º São passíveis de financiamento pelo Fies até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes no âmbito do Fundo pelas instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art. 1º em que estejam regularmente matriculados, vedada a cobrança de qualquer valor ou taxa adicional e observado o disposto no art. 4º-B. (...) § 5º O descumprimento das obrigações assumidas nos termos de adesão ao Fies e de participação nos processos seletivos conduzidos pelo Ministério da Educação sujeita as instituições de ensino às seguintes penalidades: (...) II - ressarcimento ao Fies dos encargos educacionais indevidamente cobrados, conforme o disposto no § 4º deste artigo, bem como dos custos efetivamente incorridos pelo agente operador e pelos agentes financeiros na correção dos saldos e fluxos financeiros, retroativamente à data da infração, sem prejuízo do previsto no inciso I deste parágrafo.” Deste modo, a fim de se evitar enriquecimento ilícito, somente aquele que pagou detém legitimidade para postular pelo desconto e reembolso, ou seja, não a autora. Nesse sentido, já decidiu esta Terceira Câmara de Direito Privado: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – FIES – DESCONTO DE PONTUALIDADE EM MENSALIDADES ESCOLARES – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA ENTRE ALUNOS BENEFICIÁRIOS DO FIES E OS PARTICULARES – PRELIMINAR – ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM – ACOLHIDA – EXTINÇÃO DO FEITO – RECURSO DA RÉ PROVIDO – RECURSO DO AUTOR PREJUDICADO. O crédito disponibilizado à instituição de ensino pelo FIES constitui direito autônomo do governo federal e integra o seu patrimônio, e não o patrimônio do aluno. Não sendo o autor responsável pelo pagamento dos valores nos quais pleiteia a restituição, resta apurada a sua ilegitimidade ativa ad causam. (RAC n.º 1004107-03.2019.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. em 31.01.2024).” (RAC n.º 1036995-25.2019.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, minha relatoria, j. 29.07.2024 – destaquei) Com efeito, a análise minuciosa dos autos permite concluir sobre a inexistência de provas robustas a sustentar a tese de tratamento discriminatório entre alunos financiados pelo FIES e os que pagavam suas mensalidades com recursos próprios, além da impossibilidade da autora pleitear a restituição do indébito, na medida que os valores não foram desembolsados por ela, mas sim pelo fundo público financiador. Nesse cenário, a ausência de demonstração de conduta ilícita, de prejuízo material ou moral efetivo, ou mesmo de violação a direito subjetivo da parte autora, conduz, de modo inafastável, à improcedência dos pedidos deduzidos na inicial. Portanto, por estes termos e estribado nessas razões, tenho que a r. sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, estando desprovido o recurso da apelante, majoro a condenação em honorários advocatícios para 12% (doze por cento), atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC, restando a exigibilidade suspensa em razão da gratuidade de justiça. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 23 de julho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025
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