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Processo nº 8001157-93.2023.8.05.0277

ID: 319998758

Tribunal: TJBA Órgão: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COM. DE XIQUE-XIQUE Classe: AçãO CIVIL COLETIVA Nº Processo: 8001157-93.2023.8.05.0277

Data de Disponibilização: 09/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DIOGO SANTIAGO DA COSTA

Intimação

Advogados:

DIOGO SANTIAGO DA COSTA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA em desfavor de MUNICIPIO DE XIQUE-XIQUE e SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO. Na inicial o … SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA em desfavor de MUNICIPIO DE XIQUE-XIQUE e SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO. Na inicial o Ministério Público relata, em síntese, análises realizadas na água distribuída pelos requeridos concluiu pela presença da bactéria ESCHERICHIA COLI, bem como da ORGANOLÉPTICA. Ademais, os padrões de turbidez foram considerados insatisfatórios. Os exames são claros em demonstrar que a água estava imprópria para consumo humano. Embora os requeridos tenham sido notificados, novas análises realizadas em 2021 concluíram que a água distribuída aos munícipes de Xique-Xique ainda está em desconformidade com o que foi determinado no Programa de Vigilância da Qualidade da Água. Requer, por isso, a procedência da presente ação para condenar os demandados ao pagamento de 13.000.000,00 (treze milhões reais) a título de danos morais coletivos. A requerida apresentou contestação (ID 423775322) na qual alegou, em preliminares: a inépcia da petição inicial e a impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, alegou que sempre realizou o controle da qualidade da água, ainda que sem a publicidade dos registros comprobatórios. Ainda de acordo com a parte demandada, há uma atuação regular no sentido da manutenção e do aperfeiçoamento do sistema, dentro das limitações do parco orçamento público. Em outro ponto, afirmou que os valores pleiteados a título de indenização por danos morais são exorbitantes. Após se insurgir contra o pedido de indenização por danos morais coletivos, alegou que eventual indenização deveria ser fixada com proporcionalidade e razoabilidade. Ao final, pugnou pela improcedência do pleito ministerial. O Ministério Público apresentou réplica no documento de ID 427167217. Intimadas para que especificassem as provas que pretendiam produzir, o Ministério Público afirmou que a provas são documentais, enquanto a parte requerida não se manifestou. É o que importa relatar. DECIDO. Analisando detidamente o processo, vislumbro que não há necessidade de dilação probatória, visto que a questão restou plenamente esclarecida no processo por meio das provas já produzidas. Assim, o feito comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil. Em preliminar, a parte requerida alegou a inépcia da petição inicial. Sem razão a demandada, pois a inicial atende ao quanto estabelecido nos artigos 319 e 320 do CPC. Na segunda preliminar, a parte requerida alegou a impossibilidade jurídica do pedido em razão de causa de pedir genérica, não individualizada. Todavia, razão não assiste à parte requerida. A impossibilidade jurídica do pedido ocorre quando o ordenamento jurídico não admite, em nenhuma hipótese, a providência jurisdicional pleiteada. No presente caso, verifica-se que o pedido formulado encontra respaldo no ordenamento jurídico, sendo possível, em tese, a sua apreciação pelo Poder Judiciário. Ademais, a alegação de causa de pedir genérica refere-se, na verdade, à eventual inépcia da petição inicial, matéria diversa da impossibilidade jurídica do pedido. Passo à análise do mérito. De acordo com a regra estabelecida pelo artigo 373 do Código de Processo Civil, incumbe ao autor a prova do fato constitutivo de seu direito, enquanto ao réu compete a prova quanto à inexistência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. No caso em apreço, o Ministério Público conseguiu demonstrar, através de análises técnicas, que a água fornecida pela parte requerida persistia em uma condição inadequada para o consumo humano, mesmo após reiteradas notificações e inspeções realizadas em diferentes momentos. Por outro lado, a parte demandada, em sua defesa, buscou transferir a responsabilidade para gestões anteriores, apontando limitações orçamentárias como barreiras para a realização de melhorias. Além disso, alegou que o sistema de abastecimento se encontrava adequado, embora não tenha apresentado provas concretas ou registros que corroborassem tal afirmação. O dano moral coletivo é um instituto jurídico que visa proteger interesses transindividuais, ou seja, aqueles que transcendem o interesse individual de uma pessoa e afetam uma coletividade ou determinado grupo social. Trata-se de uma lesão que atinge valores essenciais compartilhados por uma comunidade, como a dignidade humana, o meio ambiente equilibrado, a saúde pública, ou mesmo a confiança em determinados serviços ou instituições. Este tipo de dano não se restringe a prejuízos materiais ou patrimoniais, mas engloba abalos de ordem imaterial, relacionados a valores éticos, sociais e morais que permeiam a vida em sociedade. A sua reparação, geralmente por meio de indenizações pecuniárias, tem um caráter não apenas compensatório, mas também pedagógico e dissuasivo, buscando evitar que práticas similares venham a ocorrer no futuro. No caso em tela, o Ministério Público narra que a qualidade da água fornecida pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto do município de Xique-Xique apresentava sérias irregularidades, incluindo a presença de Escherichia coli e padrões de turbidez insatisfatórios, tornando a água imprópria para o consumo humano. Essa situação foi confirmada por análises técnicas realizadas antes e durante o curso da ação, evidenciando a negligência dos requeridos no controle e melhoria do sistema de abastecimento. A falta de qualidade na água fornecida viola o direito básico da coletividade a um consumo seguro e à saúde pública. O acesso à água potável é indispensável à dignidade da pessoa humana e sua ausência afeta diretamente a comunidade como um todo. A precariedade na qualidade da água não afeta apenas indivíduos isolados, mas toda a população atendida pelo sistema. Trata-se, portanto, de uma violação de direitos transindividuais, passível de defesa coletiva. No contexto da presente ação, restou devidamente comprovado o dano moral coletivo, pela violação de direitos fundamentais da coletividade e pela negligência dos requeridos em assegurar um serviço público de qualidade. Neste diapasão: Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Luciano de Castro Campos (1ª TCRC) - F:() 1ª TURMA DA CÂMARA REGIONAL DE CARUARU APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000157-73.2017.8 .17.2670 APELANTE: COMPANHIA PERNAMBUCANA DE SANEAMENTO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO JUÍZO DE ORIGEM: 1ª Vara Cível da Comarca de Gravatá RELATOR:DES. LUCIANO DE CASTRO CAMPOS EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE ÁGUA IMPRÓPRIA PARA CONSUMO. IRREGULARIDADES NA QUALIDADE DA ÁGUA E FALHAS NO MONITORAMENTO. CONTAMINAÇÃO POR COLIFORMES TOTAIS. PRESENÇA DE ESCHERICHIA COLI. AUSÊNCIA DE COLETAS OBRIGATÓRIAS. VIOLAÇÃO AO DIREITO À SAÚDE E AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANOS MORAIS COLETIVOS CONFIGURADOS. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROVIMENTO PARCIAL. 1. O fornecimento de água potável, como serviço público essencial, deve observar os padrões legais de qualidade previstos na Portaria nº 2.914/11 do Ministério da Saúde e o direito básico do consumidor à prestação de serviço adequado, eficiente e seguro, conforme o art. 22 da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). 2. A ausência de controle rigoroso sobre a qualidade da água, aliada à contaminação bacteriológica por coliformes totais e Escherichia coli e à insuficiência de coletas periódicas, compromete a segurança sanitária da população, configurando negligência na prestação do serviço. 3.Os danos morais coletivos estão configurados pela violação de direitos transindividuais e pelo abalo à confiança da coletividade nos serviços essenciais, sendo medida pedagógica a imposição de sanção pecuniária. 4.Considerando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, o quantum indenizatório arbitrado em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) deve ser reduzido para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), valor que atende à função reparatória e preventiva da condenação, equilibrando a extensão do dano e a capacidade econômica da concessionária. 5.Recurso parcialmente provido para reduzir o valor da indenização por danos morais coletivos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0000157-73.2017.8.17 .2670, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru, à unanimidade, em DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação tão somente para reduzir o valor da indenização por danos morais coletivos para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), mantendo-se os demais termos da sentença, na conformidade do relatório e dos votos proferidos neste julgamento. Caruaru, data da assinatura eletrônica. Des. Luciano de Castro Campos Relator Nº 08 (TJ-PE - Apelação Cível: 00001577320178172670, Relator.: LUCIANO DE CASTRO CAMPOS, Data de Julgamento: 04/12/2024, Gabinete do Des. Luciano de Castro Campos (1ª TCRC)). EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MUNICÍPIO DE CARMO DO RIO CLARO. FORNECIMENTO DE ÁGUA IMPRÓPRIA PARA O CONSUMO. COPASA. REPARAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS COLETIVOS. DEVIDOS. MAJORAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS INDIVIDUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. - Nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição da Republica de 1988, a responsabilidade da Administração Pública e, consequentemente, das concessionárias de serviço público, é objetiva, sob a modalidade do risco administrativo, a despeito de alegação e demonstração nos autos que a ocorrência de fenômeno natural, consistente no aumento de algas azuis no manancial de abastecimento, tenha ensejado a tomada de providências específicas no tratamento da água, ocasionando utilização de produtos químicos em quantidade superior à comumente utilizada - Enquanto concessionária do serviço de abastecimento de água no Estado de Minas Gerais, a requerida tem a responsabilidade de distribuir água em condições de uso à população, ficando também sob sua responsabilidade a adoção de procedimentos para o tratamento da água de forma a conferir-lhe potabilidade - Conforme decidido pelo c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1502967/RS, "O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano que não se identifica com os tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico), mas com a violação injusta e intolerável de valores fundamentais titularizados pela coletividade (grupos, classes ou categorias de pessoas) . Tem a função de: a) proporcionar uma reparação indireta à lesão de um direito extrapatrimonial da coletividade; b) sancionar o ofensor; e c) inibir condutas ofensivas a esses direitos transindividuais" - A quantificação do dano moral coletivo deve dar-se com prudente arbítrio, para que não haja enriquecimento à custa do empobrecimento alheio, tampouco atribuição em valor irrisório - Indevida a condenação em danos materiais e morais aos consumidores, individualmente considerados, tendo em vista a ausência de produção de prova específica nesse sentido - Primeiro apelo parcialmente provido e segundo apelo desprovido. (v.v.) EMENTA: ABASTECIMENTO DE ÁGUA CONTAMINADA. EXCESSO DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS. DANOS MORAIS COLETIVOS. FIXAÇÃO DO VALOR - Em se tratando de indenização por dano moral, cabe ao juiz determinar o seu valor, definindo-lhe os parâmetros e fixando o montante de acordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. - O MM . Juiz, a meu ver, ao arbitrar o montante da indenização pelos danos morais coletivos (ou sociais), atendeu a esses parâmetros. (TJ-MG - AC: 00083418020138130144 Carmo do Rio Claro, Relator.: Des.(a) Moacyr Lobato, Data de Julgamento: 16/05/2019, 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 21/05/2019) A quantificação de indenizações por danos morais coletivos deve observar critérios de proporcionalidade e razoabilidade. Esses princípios asseguram que o valor arbitrado seja adequado à extensão do dano causado e à capacidade econômica do infrator, evitando, ao mesmo tempo, montantes irrisórios ou excessivos. Entre os fatores considerados estão: a gravidade do dano, o impacto social e a relevância dos direitos violados e a capacidade econômica do infrator. Atendendo a tais critérios, razoável fixar a indenização em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), valor que reflete a gravidade da violação e sua repercussão na coletividade, ao mesmo tempo em que respeita os princípios de proporcionalidade e razoabilidade. Esse valor é capaz de cumprir sua função reparatória e dissuasiva sem comprometer de forma irremediável a situação econômica do infrator ou a continuidade dos serviços públicos essenciais. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a presente Ação Civil Pública, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR os requeridos, solidariamente, ao pagamento do importe de R$ 50.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais coletivos, com juros, desde a citação e correção monetária, desde o presente arbitramento. Fixo o IPCA como índice de correção monetária e os juros de mora conforme a taxa Selic, observada a dedução do IPCA enquanto os encargos tiverem termos iniciais distintos; a partir do momento em que correção monetária e juros de mora passem a incidir simultaneamente, aplica-se a Selic integral, vedada sua cumulação com outros índices, nos termos dos arts. 389 e 406 do Código Civil, com redação dada pela Lei nº 14.905/2024. Sem custas, em razão da isenção da parte demanda. Sem honorários sucumbenciais, por se tratar de ação ajuizada pelo Ministério Público. Expedientes necessários. Xique-Xique, data da assinatura digital. LAÍZA CAMPOS DE CARVALHO Juíza de Direito

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Processo nº 0000977-68.2013.8.10.0038

ID: 276560648

Tribunal: TJMA Órgão: 7ª Câmara Cível Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000977-68.2013.8.10.0038

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

VIACAO BRANCA DO LESTE TRANSPORTE URBANO LTDA - ME

Acórdão (expediente)

Advogados:

JUAREZ RODRIGUES TARAO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

GABINETE DO DES. GERVÁSIO PROTÁSIO DOS SANTOS JÚNIOR APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000977-68.2013.8.10.0038 SESSÃO VIRTUAL DA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL DE 13 A 20 DE MAIO DE 2025 Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL… GABINETE DO DES. GERVÁSIO PROTÁSIO DOS SANTOS JÚNIOR APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000977-68.2013.8.10.0038 SESSÃO VIRTUAL DA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL DE 13 A 20 DE MAIO DE 2025 Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Promotor: FÁBIO HENRIQUE MEIRELLES MENDES 1ª Apelada: VIAÇÃO BRANCA DO LESTE TRANSPORTE URBANO LTDA. Advogado: JUAREZ RODRIGUES TARÃO (OAB/DF 8166; OAB/MA 6100-A) 2º Apelado: ESTADO DO MARANHÃO Procurador: DANIEL BLUME PEREIRA DE ALMEIDA Órgão Julgador: SÉTIMA CÂMARA CÍVEL Relator: Des. GERVÁSIO PROTÁSIO DOS SANTOS JÚNIOR DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRANSPORTE INTERMUNICIPAL. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. PERDA DA CONCESSÃO. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL COLETIVO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação interposta em face da sentença que julgou improcedente a ação civil pública de origem, tendo em vista a inutilidade da imposição de obrigação de fazer a empresa que não atua mais no serviço de transporte, e com lastro na ausência de danos morais coletivos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) examinar o interesse processual em face da perda da concessão do serviço de transporte coletivo pela empresa apelada; e (ii) avaliar a existência de dano moral coletivo passível de indenização. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A perda da concessão do serviço de transporte coletivo, ainda que posteriormente à data indicada na sentença, torna inócua a imposição de obrigação de fazer à empresa que não mais atua na linha intermunicipal versada na lide. 4. A jurisprudência do STJ orienta que o dano moral coletivo depende da demonstração de lesão grave a valores fundamentais da sociedade, de maneira injusta e intolerável, o que não foi evidenciado no caso concreto. 5. O Termo de Ajustamento de Conduta firmado na hipótese – o qual é dotado de força executiva - previu mecanismos para assegurar o cumprimento das obrigações pactuadas à época, incluindo penalidades em caso de descumprimento, mais um motivo a infirmar o pleito ministerial. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Apelo conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. A perda da concessão do serviço de transporte intermunicipal, pela apelada, torna inócua a imposição de obrigação de fazer, configurando a ausência superveniente de interesse; 2. O dano moral coletivo apenas se configura quando há grave ofensa a valores fundamentais da sociedade, o que não restou demonstrado no caso”. _____________ Dispositivos relevantes citados: Lei 7.347/1985, art. 5º, §6º; CPC/2015, art. 485, VI. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023; STJ, AgInt no AREsp n. 1.330.516/RN, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 17/4/2023; STJ, REsp n. 1.742.149/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/4/2019. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos de Apelação Cível nº 0000977-68.2013.8.10.0038, “unanimemente a Sétima Câmara Cível negou provimento ao recurso interposto, nos termos do voto do Desembargador Relator”. Votaram os Senhores Desembargadores GERVÁSIO PROTÁSIO DOS SANTOS JÚNIOR, MÁRCIA CRISTINA COELHO CHAVES e RAIMUNDO JOSÉ BARROS DE SOUSA. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. RITA DE CÁSSIA MAIA BAPTISTA. São Luís/MA, data do sistema. GERVÁSIO Protásio dos SANTOS Júnior Desembargador Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Estadual em face da sentença (ID 15591312 pág. 32) proferida pelo MM Juiz de Direito da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa, Dr. Glender Malheiros Guimarães, que, nos autos da Ação Civil Pública proposta contra Viação Branca do Leste e Estado do Maranhão, julgou improcedente a ação de origem, sob o fundamento de que a empresa ré não detém mais a exploração do serviço na linha intermunicipal Imperatriz-João Lisboa, tornando inviável a obrigação de fazer pretendida. Em suas razões recursais (ID 15591312 pág. 39), o apelante aduziu a reforma da sentença vergastada, uma vez que a 1ª recorrida somente perdeu definitivamente a concessão do transporte em 2015, tendo firmado o Termo de Ajustamento de Conduta no ano de 2010. Enfatizou, ainda, o período de descumprimento das obrigações quanto ao serviço de transporte intermunicipal, perdurando o dever de reparação dos danos morais coletivos. Após tecer outros argumentos, requereu o provimento do apelo, com a reforma da sentença nos pontos abordados. A intimação efetuada no Primeiro Grau para apresentação de contrarrazões (ID 15591313 pág. 3) foi realizada em nome do advogado antigo da 1ª recorrida, que já renunciou ao mandato (ID’s 15591313 págs. 2/3 e 15591312 pág. 6). Esse aspecto foi observado pelo Procurador Francisco das Chagas Barros de Sousa, que requereu a realização de nova intimação em nome do atual patrono (ID 15591313 pág. 33). Atendida a referida providência (ID 43238441), doravante em nome do causídico atualmente constituído pela apelada, não houve apresentação de contrarrazões. O Estado do Maranhão, por seu turno, aduziu o desinteresse no oferecimento de contrarrazões, uma vez que a matéria debatida diz respeito somente à empresa apelada (ID 15591313 pág. 12). No ID 37994384, foi proferido parecer ministerial de mérito, ocasião em que o Dr. Danilo José de Castro Ferreira se pronunciou pelo conhecimento e provimento do reclamo. É o que cabia relatar. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido. O cerne da matéria tratada nos autos consiste na apuração do descumprimento, por parte da empresa recorrida, dos horários e itinerários relativos ao transporte coletivo intermunicipal na linha João Lisboa-Imperatriz, sendo desatendido, também, o regramento pertinente à gratuidade do transporte de idosos e de pessoas com deficiência. Na sentença, o juiz singular destacou a ausência de utilidade e necessidade do provimento buscado, uma vez que, nos termos do ofício enviado pela Agência Estadual de Transporte e Mobilidade Urbana, houve a perda da concessão do serviço desde 09/01/2009, o qual passou a ser prestado por outra empresa. O magistrado salientou, outrossim, a não configuração do dano moral coletivo. À luz desse panorama, não há como acolher a irresignação do apelante, pois, mesmo que a perda da concessão tenha se dado em data distinta daquela indicada na sentença (em 2015, conforme aduziu o Parquet), houve, do mesmo modo, a perda superveniente do interesse processual, sendo inócua a imposição da obrigação de fazer a empresa que não atua mais no serviço. Noutro giro, o recorrente não demonstrou em que medida os danos morais coletivos rejeitados na sentença estariam presentes. Apenas salientou que, no período da concessão, os serviços foram executados de forma precária à população. No entanto, tal argumento não suplanta a conclusão do magistrado a quo, que asseverou, acertadamente, que “a própria situação fática da empresa – que perdeu a concessão e encontra-se imersa em dívidas – revela uma incompetência em sua administração, e não uma má-fé, o que é corroborado com o cumprimento parcial das obrigações constantes do acordo judicial levado a efeito nos autos do processo nº 299-87.2012.8.10.0038, motivo pelo qual não tenho como demonstrados os danos morais coletivos” (ID 15591312 pág. 35). Registre-se, por oportuno, que houve o devido sancionamento da apelada na via administrativa, corroborado pela perda da concessão. Acerca da não configuração dos danos em apreço, merece registro a orientação firmada pelo STJ, que propugna o arbitramento de indenização somente em hipóteses de mácula a valores fundamentais da sociedade: Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "se, por um lado, o dano moral coletivo não está relacionado a atributos da pessoa humana e se configura in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral, de outro, somente ficará caracterizado se ocorrer uma lesão a valores fundamentais da sociedade e se essa vulneração ocorrer de forma injusta e intolerável (REsp 1502967/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018)”. (AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 3/11/2023.) - ementa parcial. O dano moral coletivo somente se configurará se houver grave ofensa à moralidade pública, objetivamente considerada, causando lesão a valores fundamentais da sociedade e transbordando da tolerabilidade. A violação aos interesses transindividuais deve ocorrer de maneira inescusável e injusta, percebida dentro de uma apreciação predominantemente objetiva, de modo a não trivializar, banalizar a configuração do aludido dano moral coletivo. (AgInt no AREsp n. 1.330.516/RN, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 3/5/2023.) - ementa parcial. De mais a mais, o fim último pretendido com a presente ação (melhoria do serviço e punição pecuniária à apelada) está albergado pelo Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 22/10/2010, conforme ID 15591300 pág. 15. Nesse compromisso, a recorrida assumiu diversas obrigações, entre elas o cumprimento de horários e itinerários (cláusula segunda) e a garantia da gratuidade do serviço a idosos (cláusula sexta). Foi prevista, ainda, a incidência de multa no caso de descumprimento das medidas, nos termos da cláusula décima segunda. Assim, observando que o aludido TAC é dotado de força executiva plena (art. 5º, §6º da Lei 7.347/1985), e que houve o encerramento da prestação do serviço pela recorrida, o entendimento manifestado no comando sentencial merece chancela. Ilustrando o presente entendimento, o julgado adiante colacionado endossa a falta de utilidade do pronunciamento almejado: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. (...). 1. Apelação interposta contra sentença que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, em razão da ausência de interesse de agir do autor. A demanda versa sobre o descumprimento de obrigação de fazer já reconhecida em título executivo judicial proveniente de acórdão proferido nos autos do processo n. 0720567-98.2017.8.07.0016, tramitado perante o 4º Juizado Especial Cível de Brasília. 2. Questão em discussão: Verificar a existência de interesse de agir para o ajuizamento de nova ação de conhecimento diante de título executivo judicial já existente. 3. O interesse de agir, enquanto condição da ação, exige adequação e utilidade do processo para alcançar o provimento jurisdicional pleiteado. No caso, a via eleita mostrou-se inadequada, pois o descumprimento de obrigação de fazer já imposta em título executivo judicial deve ser alegado e executado nos próprios autos do processo originário, conforme o artigo 52, inciso V, da lei n. 9.099/1995. 4. A extinção do processo sem resolução de mérito é medida correta diante da ausência de utilidade e necessidade da nova demanda, uma vez que o autor possui meio processual adequado para a satisfação do direito reconhecido no título executivo judicial. 5. (…) 6. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS FIXADOS. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. (TJDFT, Acórdão 1961502, 0732378-56.2024.8.07.0001, Relator(a): JOSÉ FIRMO REIS SOUB, 8ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 04/02/2025, publicado no DJe: 11/02/2025.). Outrossim, o referido TAC goza da presunção de legitimidade, conforme orienta a jurisprudência do STJ: TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA AMBIENTAL 5. Ao contrário do que defende o recorrido, não se está diante de obrigações incertas e inexpressivas estabelecidas em "suposto título executivo extrajudicial", pois elas decorrem de Termo de Ajustamento de Conduta legitimamente constituído e com força executiva plena. Trata-se de título que - como ocorre com qualquer negócio jurídico, em especial com os de salvaguarda do interesse da sociedade - deve ser leal, cabal e pontualmente cumprido. Mais do que mero contrato entre particulares, representativo de obrigações de natureza disponível, o Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Parquet encarna documento público de gênese legal que, nessa qualidade, goza de robusta presunção de legitimidade, veracidade e validade, nos termos do art. 5º, § 6º, da Lei 7.347/1985 ("Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial"). (REsp n. 1.742.149/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/4/2019, DJe de 18/6/2019.) - ementa parcial. Cabe o registro de que, embora a sentença tenha se referido à carência de ação por ausência de interesse-utilidade da via manejada (o que remeteria à extinção sem resolução do mérito), deve ser mantido o decreto de improcedência em face da expressa rejeição ao pedido de danos morais coletivos. Portanto, o julgado singular deve ser confirmado, uma vez que o compromisso de outrora previu mecanismos para a sua efetividade futura em prol dos interesses dos administrados (inclusive com multa), e não foram apurados elementos de prova quanto ao dano moral coletivo. Perdura a dissonância com o entendimento do Parquet, que opinou pelo provimento do recurso, com lastro na argumentação do apelante. Do exposto, e em desacordo com o parecer ministerial, conheço do recurso para NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo inalterada a sentença em todos os seus termos. É como voto. São Luís/MA, data do sistema. GERVÁSIO Protásio dos SANTOS Júnior Desembargador Relator

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Processo nº 1000462-52.2018.4.01.4200

ID: 280166858

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000462-52.2018.4.01.4200

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BOA VISTA ENERGIA LTDA

Acórdão

Advogados:

EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS

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HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA

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PABLO RAMON DA SILVA MACIEL

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CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE

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THIAGO PIRES DE MELO

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FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA

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SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE

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ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público F… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:Boa Vista Energia Ltda e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS - RR142-A, SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE - RR344-A, FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA - RR114-A, THIAGO PIRES DE MELO - RR938-A, CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE - RR937-A, PABLO RAMON DA SILVA MACIEL - RR861-A, HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA - RR262-A e EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS - RR1752-A RELATOR(A):ALEXANDRE MACHADO VASCONCELOS PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000462-52.2018.4.01.4200 RELATÓRIO O Exmo. Sr. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE (Relator Convocado): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara da Seção Judiciária de Roraima que julgou improcedente os pedidos formulados na ação civil pública ajuizada em face de Roraima Energia S/A (sucessora de Boa Vista Energia S/A), que visavam assegurar à comunidade indígena Anaro, no Município de Amajari/RR, o fornecimento regular e permanente de energia elétrica, bem como a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. Em suas razões de apelação, o MPF alegou a ocorrência de omissão por parte da concessionária, afirmando que não ficou demonstrado o planejamento ou a priorização para atendimento da comunidade indígena Anaro, tampouco teria sido disponibilizada qualquer solução paliativa, como o fornecimento de geradores. Invocou a responsabilidade da ré com base na Resolução nº 223/2003 da ANEEL, e sua legitimidade, tendo em vista a concessão de poder público e a titularidade de exploração do serviço de distribuição de energia elétrica, nos termos das Leis 9.074/1995 e 8.987/1995. Argumentou que a essencialidade do serviço público justifica a atuação jurisdicional para sanar omissão estatal prolongada e inconstitucional. Pugnou, ainda, pelo reconhecimento do dano moral coletivo e pela concessão de tutela provisória. Em contrarrazões, a Roraima Energia S/A defendeu a ausência de omissão e de legitimidade para atuar de forma autônoma na seleção das comunidades a serem atendidas pelo Programa Luz Para Todos, sustentando que tais decisões cabem ao Ministério de Minas e Energia, por meio do Comitê Gestor do programa. Argumentou que forneceu um motor gerador à comunidade e que eventual fornecimento integral de energia encontra-se inviabilizado por limitações técnicas e orçamentárias. Alegou a impossibilidade de intervenção judicial nas políticas públicas, diante do respeito à separação de poderes e ao princípio da reserva do possível. Sustentou a inexistência de dando moral coletivo e pugnou pela manutenção da sentença. O Ministério Público Federal, na condição de fiscal da lei, manifestou-se pelo provimento da apelação. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000462-52.2018.4.01.4200 VOTO O Exmo. Sr. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE (Relator Convocado): Pretende o MPF assegurar acesso regular e permanente à energia elétrica à comunidade indígena Anaro, localizada no Município de Amajari/RR. Sustentou a recorrente a omissão do poder público e da concessionária no fornecimento de acesso regular e permanente a serviço essencial e defendeu ser justificada a intervenção judicial, no caso, invocando a necessidade de proteção à dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais das comunidades indígenas afetadas pela ausência de fornecimento do serviço de energia elétrica. A exploração dos serviços e a instalação de energia elétrica é atividade que compete à União, podendo ela atuar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão (art. 21, XII, “b”, da CF/1988). A distribuição de energia elétrica, serviço público essencial de competência da União, é executada por meio de concessão ou permissão a entes privados submetidos à regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. A Lei 8.987/1995 dispõe sobre o regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos previstos no art. 175 da Constituição Federal de 1988, ao passo que a Lei 9.074/1995 estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões, permissões e autorizações de serviços públicos, tratando especificamente das concessões de exploração de serviços e instalações de energia elétrica nos arts. 4º a 18. A Lei 10.438/2002, ao dispor sobre a expansão da oferta de energia elétrica emergencial e sobre a universalização do serviço público de energia elétrica, fixou regra segundo a qual, no estabelecimento das metas de universalização do uso de energia, a ANEEL fixaria para cada concessionária e permissionária do serviço de distribuição, áreas progressivamente crescentes em torno das redes de distribuição, e áreas progressivamente descrescentes em redes de tensão definidas. Confira-se a redação da norma em questão: Art. 14. No estabelecimento das metas de universalização do uso da energia elétrica, a Aneel fixará, para cada concessionária e permissionária de serviço público de distribuição de energia elétrica: I - áreas, progressivamente crescentes, em torno das redes de distribuição, no interior das quais o atendimento em tensão inferior a 2,3kV, ainda que necessária a extensão de rede primária de tensão inferior ou igual a 138kV, e carga instalada na unidade consumidora de até 50kW, será sem ônus de qualquer espécie para o solicitante que possuir característica de enquadramento no Grupo B, excetuado o subgrupo iluminação pública, e que ainda não for atendido com energia elétrica pela distribuidora local; (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) II - áreas, progressivamente decrescentes, no interior das quais o atendimento em tensão inferior a 2,3kV, ainda que necessária a extensão de rede primária de tensão inferior ou igual a 138kV, e carga instalada na unidade consumidora de até 50kW, poderá ser diferido pela concessionária ou permissionária para horizontes temporais preestabelecidos pela ANEEL, quando o solicitante do serviço, que possuir característica de enquadramento no Grupo B, excetuado o subgrupo iluminação pública, e que ainda não for atendido com energia elétrica pela distribuidora local, será atendido sem ônus de qualquer espécie. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 1o O atendimento dos pedidos de nova ligação ou aumento de carga dos consumidores que não se enquadram nos termos dos incisos I e II deste artigo, será realizado à custa da concessionária ou permissionária, conforme regulamento específico a ser estabelecido pela ANEEL, que deverá ser submetido a Audiência Pública. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 2o É facultado ao consumidor de qualquer classe contribuir para o seu atendimento, com vistas em compensar a diferença verificada entre o custo total do atendimento e o limite a ser estabelecido no § 1o. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 3o Na regulamentação do § 1o deste artigo, a ANEEL levará em conta as características da carga atendida, a rentabilidade do investimento, a capacidade econômica e financeira do distribuidor local, a preservação da modicidade tarifária e as desigualdades regionais. (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) § 4o Na regulamentação deste artigo, a ANEEL levará em conta, dentre outros fatores, a taxa de atendimento da concessionária ou permissionária, considerada no global e desagregada por Município e a capacidade técnica, econômica e financeira necessárias ao atendimento das metas de universalização. (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) § 5o A ANEEL também estabelecerá procedimentos para que o consumidor localizado nas áreas referidas no inciso II do caput possa antecipar seu atendimento, financiando ou executando, em parte ou no todo, as obras necessárias, devendo esse valor lhe ser restituído pela concessionária ou permissionária após a carência de prazo igual ao que seria necessário para obter sua ligação sem ônus. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 6o Para as áreas atendidas por cooperativas de eletrificação rural serão consideradas as mesmas metas estabelecidas, quando for o caso, para as concessionárias ou permissionárias de serviço público de energia elétrica, onde esteja localizada a respectiva cooperativa de eletrificação rural, conforme regulamentação da ANEEL. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 7o O financiamento de que trata o § 5o deste artigo, quando realizado por órgãos públicos, inclusive da administração indireta, a exceção dos aportes a fundo perdido, visando a universalização do serviço, serão igualmente restituídos pela concessionária ou permissionária, ou se for o caso, cooperativa de eletrificação rural, devendo a ANEEL disciplinar o prazo de carência quando o fornecimento for em áreas com prazos de diferimento distintos. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 8o O cumprimento das metas de universalização será verificado pela ANEEL, em periodicidade no máximo igual ao estabelecido nos contratos de concessão para cada revisão tarifária, devendo os desvios repercutir no resultado da revisão mediante metodologia a ser publicada. § 9o A ANEEL tornará públicas, anualmente, as metas de universalização do serviço público de energia elétrica. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 10. Não fixadas as áreas referidas nos incisos I e II do caput no prazo de um ano contado da publicação desta Lei e até que sejam fixadas, a obrigação de as concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica atenderem aos pedidos de ligação sem qualquer espécie ou tipo de ônus para o solicitante aplicar-se-á a toda a área concedida ou permitida. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 11. A partir de 31 de julho de 2002 e até que entre em vigor a sistemática de atendimento por área, as concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica atenderão, obrigatoriamente e sem qualquer ônus para o consumidor, ao pedido de ligação cujo fornecimento possa ser realizado mediante a extensão de rede em tensão secundária de distribuição, ainda que seja necessário realizar reforço ou melhoramento na rede primária. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 12. No processo de universalização dos serviços públicos de energia elétrica no meio rural, serão priorizados os municípios com índice de atendimento aos domicílios inferior a oitenta e cinco por cento, calculados com base nos dados do Censo 2000 do IBGE, podendo ser subvencionada parcela dos investimentos com recurso da Reserva Global de Reversão, instituída pela Lei no 5.655, de 20 de maio de 1971 e da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, de que trata o art. 13 desta Lei, nos termos da regulamentação. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 13. O Poder Executivo estabelecerá diretrizes específicas que criem as condições, os critérios e os procedimentos para a atribuição da subvenção econômica às concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica e, se for o caso, cooperativas de eletrificação rural e para a fiscalização da sua aplicação nos municípios beneficiados. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 14. Para o atendimento dos pedidos de nova ligação de unidade consumidora rural em Municípios cuja universalização já seja considerada atingida, a Aneel deverá regular os prazos, as condições e os procedimentos para essas ligações, observado o seguinte: (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) I - o solicitante deverá apresentar documento, com data, que comprove a propriedade ou a posse do imóvel, observado que a Aneel poderá tratar situações excepcionais mediante justificativa; e (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) II - a distribuidora poderá, no caso de assentamento ou ocupação irregular com predominância de população de baixa renda, realizar o atendimento temporário da unidade consumidora, com necessária solicitação ou anuência expressa do poder público competente. (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) A Resolução ANEEL 223/2003, vigente à época, estabeleceu as condições para a elaboração dos Planos de Universalização de Energia Elétrica visando ao atendimento de novas unidades consumidoras e definindo concessionária e permissionária de distribuição de energia elétrica com agente titular da concessão ou permissão federal para explorar o serviço público de distribuição de energia elétrica. A Resolução ANEEL 223/2023 atribuiu às concessionárias a obrigação de identificar as comunidades não atendidas e de incluir suas demandas nos respectivos planos de universalização, com a devida previsão de investimentos. A concessionária é responsável por realizar a ligação para a unidade consumidora, conforme previsto nos arts. 3º e 4º da referida norma. Essa norma também prevê que a concessionária encaminhará à ANEEL a estimativa global, ano a ano, dos investimentos necessários para a implementação dos programas anuais no plano de universalização de energia elétrica. Confira-se o teor do art. 9º da citada norma: Art. 9º Por ocasião do envio dos Planos de Universalização, a concessionária poderá encaminhar à ANEEL, em documento independente, a estimativa global, ano a ano, dos investimentos necessários para a implementação dos respectivos Programas Anuais. Diante disso, sendo a parte recorrida executora do plano de universalização do fornecimento de energia elétrica, é de se reconhecer que detém legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. O Programa Luz para Todos foi instituído pelo Decreto 4.873/2003, destinado a disponibilizar, até o ano de 2008, o atendimento em energia elétrica à parcela da população do meio rural brasileiro que ainda não possuía acesso a esse serviço público. Findo o prazo inicialmente fixado nessa norma, a execução do projeto foi prorrogada até 2011 e, posteriormente, até 2022. Note-se que o Decreto 11.628/2023, que atualmente dispõe sobre o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica – Luz para Todos, prevê, entre seus objetivos, a democratização do acesso e uso da energia elétrica á população rural, por meio de extensão de redes de distribuição de energia elétrica, e em regiões remotas da Amazônia Legal, por meio de sistemas isolados de geração de energia elétrica (art. 2º, inciso I). Outro importante objetivo do Programa é a valorização e o respeito à cultura dos povos indígenas, de modo a priorizar o seu atendimento pelo Programa (art. 2º, inciso IV). As comunidades indígenas são reconhecidas como beneficiárias do Programa Luz para Todos (art. 3º, IV do Decreto 11.628/2023), havendo previsão de duração do Programa até 31 de dezembro de 2025 para o atendimento à população residente em regiões remotas da Amazônia Legal (art. 17 do Decreto 11.628/2023), como é o caso da comunidade indígena Anaro. No caso, embora tenha a concessionária alegado que a comunidade indígena Anaro não teria sido incluída no plano de execução da terceira etapa do Programa Luz para Todos em razão de limitações orçamentárias e da distância em relação à rede existente, nota-se que houve grande descompasso entre a situação da comunidade e a execução da política pública. A prova dos autos demonstra que, mesmo instada a adotar providências para a distribuição de energia elétrica na comunidade indígena Anaro, a demandada apresentou justificativas genéricas, sem ter comprovado a adoção de providências mínimas, como a instalação de geradores. Não houve qualquer demonstração pela demandada de adoção de planejamento voltado para a priorização no atendimento da comunidade indígena em causa. Além disso, a concessionária poderia ter encaminhado a estimativa de investimentos necessários à implementação dos serviços de energia elétrica, conforme preceitua o art. 9º da Resolução ANEEL 223/2003, mas se limitou a alegar o encarecimento da instalação em decorrência da distância da comunidade como obstáculo para a implementação do serviço. A alegação da recorrida de que caberia exclusivamente ao Comitê Gestor do Programa “Luz para Todos” decidir sobre o atendimento à comunidade Anaro não a exime de suas obrigações constitucionais e legais. O fornecimento de energia elétrica é considerado serviço essencial, sendo certo que a injustificada falta de energia elétrica é passível de vulnerar o princípio da dignidade da pessoa humana, na medida em que a ausência desse serviço impacta em outros serviços básicos, como saúde, educação e abastecimento de água. A recorrida apontou impedimento ao fornecimento do serviço de energia elétrica, alegando a distância da comunidade e a existência de orçamento limitado. Ao que consta dos autos, desde 2013 a comunidade Anaro aguarda o fornecimento desse serviço essencial. Observa-se que a concessionária sequer adotou medidas paliativas, como a disponibilização de gerador elétrico com capacidade para atender a demanda das 16 famílias da comunidade em questão. Durante o período superior a seis anos, a concessionária limitou-se a apresentar justificativas pela impossibilidade de interligação energética da comunidade indígena pelo programa Luz para Todos, sem demonstrar a aprovação de qualquer medida concreta para atenuar a situação. Ficou demonstrada, no caso, a inércia da parte apelada em atuar no sentido de realizar a interligação energética da comunidade indígena Anaro, ou de adotar medida paliativa, como a disponibilização de geradores. Ficou constatada, portanto, a omissão da concessionária no cumprimento da obrigação de fornecimento de energia elétrica à comunidade indígena, a demandar a intervenção do Judiciário. A questão trazida à análise não envolve a substituição, pelo Judiciário, do planejamento do Poder Executivo na execução de políticas públicas, mas a atuação no sentido de garantir a efetivação de direito fundamental. Com efeito, a negativa reiterada e prolongada, sem a adoção de qualquer medida eficaz, caracteriza omissão estatal que viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade de acesso e universalidade de serviço público essencial. A jurisprudência consolidada do STF tem admitido a intervenção do Judiciário em casos de omissão ou falha na implementação de políticas públicas, nas situações em que ficar demonstrada lesão ou ameaça de lesão a direitos fundamentais. Nesse sentido, confira-se: Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Ação civil pública. Direito dos remanescentes das comunidades de quilombo. Demarcação de terras. Razoável duração do processo administrativo. Estipulação de prazo para conclusão. Intervenção do Poder Judiciário. Possibilidade. Ausência de violação do princípio da separação dos poderes. Legislação infraconstitucional. Ofensa reflexa. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. 2. O recurso extraordinário não se presta para a análise de matéria infraconstitucional, tampouco para o reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF. 3. Agravo regimental não provido. 4. É inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85). (ARE 1387572 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 03-11-2022, Processo Eletrônico DJe-242 DIVULG 29-11-2022 PUBLIC 30-11-2022) A tutela jurisdicional aqui buscada tem por finalidade a garantia de condições existenciais mínimas à comunidade indígena Anaro e está fundamentada no princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado na Constituição Federal (art. 1º, III, da CF/1988). Não compete ao Judiciário determinar a implementação de políticas públicas voltadas ao fornecimento de serviço essencial a comunidades indígenas. No entanto, admite-se excepcionalmente a atuação do Poder Judiciário caso demonstrada a mora injustificada do gestor público na adoção das medidas necessárias à implementação da proteção dos direitos fundamentais, como o fornecimento de energia elétrica às comunidades indígenas. O Superior Tribunal de Justiça também já manifestou sobre o tema, decidindo que o Judiciário pode, em condições excepcionais, determinar que a Administração Pública adote as medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação de poderes e da reserva do possível. Confira-se: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMUNIDADE INDÍGENA. PODER JUDICIÁRIO. FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL . PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DE PODERES E DA RESERVA DO POSSÍVEL. AFRONTA. INEXISTÊNCIA. 1. A jurisprudência desta Corte Superior, na trilha do Supremo Tribunal Federal, firmou-se no sentido de que o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes e da reserva do possível. Precedentes. 2. Hipótese em que, nos autos de ação civil pública proposta com o objetivo de tornar efetivo o fornecimento de água potável a população indígena, ficou constatado no acórdão recorrido a existência de "omissão relevante do Estado (réus) na adoção de medidas necessárias ao fornecimento de água potável, e suprir uma das necessidade mais básicas do ser humano, a fim de conceder condições dignas de sobrevivência aos brasileiros que integram a comunidade indígena". 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.108.655/CE, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 11/3/2024, DJe de 2/4/2024) Nessa situação, é cabível a intervenção do Judiciário para sanar a omissão prolongada da concessionária de energia elétrica, no sentido de garantir à comunidade indígena Anaro o direito de acesso à energia elétrica. Ressalte-se que a teoria da reserva do possível não pode ser invocada como justificativa genérica para a omissão estatal na efetivação dos direitos fundamentais. Quanto ao tema, o STF já decidiu que a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada pelo Poder Público com o propósito de frustrar ou de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição e encontra limitação na garantia constitucional do mínimo existencial que representa emanação direta do postulado da dignidade da pessoa humana. A noção de mínimo existencial compreende prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, de modo a assegurar o direito a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, como, entre outros, o direito à moradia (ARE 639.337 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 23-8-2011, 2ª T, DJE de 15-9-2011). Não cabe a invocação da reserva do possível como fundamento para que o Estado se furte ao adimplemento de obrigações expressamente previstas no texto constitucional, tampouco “quando o Estado se omite na promoção de direitos constitucionalmente garantidos” (ARE 1269451 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 15-09-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-190 DIVULG 22-09-2021 PUBLIC 23-09-2021). Registre-se que o TRF da 4ª Região recentemente reconheceu a possibilidade de interferência do Judiciário para assegurar o direito dos indígenas ao fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que referido serviço é indispensável para garantir a segurança e o bem-estar da população atendida. Confira-se a ementa do julgado em questão: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÃO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DIREITO INDÍGENA. ILUMINAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. POSSIBILIDADE DE INTERFERÊNCIA DO JUDICIÁRIO EM CASOS EXCEPCIONAIS PARA GARANTIR DIREITOS FUNDAMENTAIS. OMISSÃO ESTATAL. MOROSIDADE. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA. 1. Conforme entendimento do STF o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. (RE 908680 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 07-04-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-093 DIVULG 04-05-2017 PUBLIC 05-05-2017). 2. A iluminação pública é indispensável à segurança e ao bem-estar da população, à preservação de logradouros públicos e à promoção do desenvolvimento humano e social das cidades. Trata-se de direito assegurado a todos os que habitam a zona urbana, cabendo ao município oferecer o serviço à população em seu território (CF/88, arts. 30, 149-A e 182, c/c Estatuto das Cidades). 3. De acordo com o Estatuto do Índio, os direitos assegurados por lei se estendem aos silvícolas e às comunidades indígenas nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros (Lei 6.001/1973, art. 1º, parágrafo único, e art. 2º). 4. A ausência de demarcação da terra indígena e a pendência de ação de reintegração de posse envolvendo a área em que está a aldeia não servem, por si sós, de justificativa para que o Poder Público negue a oferta de serviço essencial e impeça a fruição de direitos individuais e sociais da comunidade indígena. 5. Comprovadas a omissão estatal na prestação do serviço e a resistência do Município de Guaíra em ofertá-lo à aldeia por longa data, justifica-se a intervenção judicial para assegurar o direito dos indígenas à segurança, ao desenvolvimento e à proteção de seus bens (CF/88, art. 231). 6. Apelação desprovida. Sentença mantida. (TRF4, AC 5002022-62.2018.4.04.7017, 12ª Turma, Relator Desembargador Federal Luiz Antonio Bonat, julgado em 18/09/2024, publicado em 27/09/2024) Por outro lado, quanto ao pedido de indenização por danos morais coletivos, entende-se que não deve ser provida a apelação nesse ponto. A Lei 7.437/1985 prevê o cabimento de ação civil pública para responsabilização por dano moral ou material causados a qualquer interesse difuso ou coletivo (art. 1º, IV). Além disso, o STJ reconheceu a possibilidade de condenação em danos morais coletivos em sede de ação civil pública (AgInt no REsp 1.342.846/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 26/3/2019). No entanto, é preciso aferir adequadamente os requisitos necessários para a configuração do dano moral coletivo, para que não ocorra desvirtuamento ou banalização de sua utilização. Embora reconhecida a omissão administrativa no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a caracterização do dano moral coletivo requer a demonstração de conduta ilícita qualificada, com repercussão negativa significativa sobre valores relevantes para a coletividade atingida, o que não ficou suficiente demonstrado na situação dos autos. Para a caracterização do dano moral coletivo não é suficiente a infração à lei; é essencial que o ato praticado atinja alto grau de reprovabilidade e, em razão de sua gravidade e repercussão, afete relevantes valores sociais do grupo considerado. Conforme entendimento firmado pelo STJ, o dano moral coletivo se configura in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou efetivo abalo moral. Por outro lado, somente é caracterizado o dano moral coletivo nas hipóteses em que configurada lesão a valores fundamentais da sociedade de forma injusta e intolerável. Nesse sentido: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA N. 283/STF. DANO MORAL COLETIVO. LESÃO A VALORES FUNDAMENTAIS. NÃO OCORRÊNCIA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS E INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. FALTA DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA. SÚMULA N. 284 DO STF. DECISÃO MANTIDA. 1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/2015 quando a Corte local pronunciou-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. Ausente o enfrentamento da matéria pelo acórdão recorrido, inviável o conhecimento do recurso especial, por falta de prequestionamento. Incidência das Súmulas n. 282 e 356 do STF. 3. O recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido suficiente para mantê-lo não deve ser admitido, a teor da Súmula n. 283/STF. 4. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "se, por um lado, o dano moral coletivo não está relacionado a atributos da pessoa humana e se configura in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral, de outro, somente ficará caracterizado se ocorrer uma lesão a valores fundamentais da sociedade e se essa vulneração ocorrer de forma injusta e intolerável" (REsp 1502967/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018). 5. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem interpretação de cláusulas contratuais e revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmulas n. 5 e 7 do STJ). 6. É firme a orientação do STJ de que a impertinência temática do dispositivo legal apontado como ofendido resulta na deficiência das razões do recurso especial, fazendo incidir a Súmula n. 284 do STF. 7. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 3/11/2023) AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA. PRÓTESES, ÓRTESES E MATERIAIS LIGADOS A ATOS CIRÚRGICOS. CONTRATOS ANTIGOS E NÃO ADAPTADOS. RESTRIÇÃO CONTRATUAL. ABUSIVIDADE. DANO MORAL COLETIVO. OCORRÊNCIA. CONDUTA DESARRAZOADA. CLÁUSULA ILÍCITA. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL PACÍFICO À ÉPOCA. PREJUÍZO À COLETIVIDADE DE IDOSOS. MAGNITUDE DA LESÃO. CONFIGURAÇÃO. 1. O dano moral coletivo, compreendido como o resultado de uma lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade, se dá quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva (arts. 1º da Lei nº 7.347/1985, 6º, VI, do CDC e 944 do CC, bem como Enunciado nº 456 da V Jornada de Direito Civil). 2. Não basta a mera infringência à lei ou ao contrato para a caracterização do dano moral coletivo. É essencial que o ato antijurídico praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo primordial de valores sociais. Com efeito, para não haver o seu desvirtuamento, a banalização deve ser evitada. 3. A jurisprudência pacífica deste Tribunal Superior, desde longa data, sempre foi no sentido de se mostrar abusiva, com base no CDC, a cláusula restritiva de plano de saúde, ainda que não adaptado, ou seja, contrato antigo (anterior à Lei nº 9.656/1998), que prevê o não custeio de prótese, órtese ou material diretamente ligado ao procedimento cirúrgico ao qual se submete o consumidor. 4. Na hipótese, aplicando-se a legislação consumerista, não havia dúvida jurídica razoável quanto à abusividade da negativa de cobertura de órteses e próteses ligadas a ato cirúrgico nos contratos de assistência à saúde anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998, de forma que a operadora, ao ter optado pela restrição contratual, ainda mais em se tratando de consumidores com saúde fragilizada, boa parte idosos, incorreu em prática socialmente execrável, atingindo, de modo injustificável, a esfera moral da comunidade. 5. Caracteriza-se o dano moral coletivo quando houve intenção deliberada da demandada em violar o ordenamento jurídico com vistas a obter lucros predatórios em detrimento dos interesses transindividuais dos usuários de plano de saúde. 6. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.819.070/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 15/5/2024) A despeito da evidente omissão no fornecimento de serviço essencial à comunidade indígena, não ficou caracterizado o dando moral coletivo, tendo em vista a relativa complexidade ao procedimento em causa, que, entre outras questões, demanda a elaboração de uma estimativa global, a ser enviada à ANEEL, dos investimentos necessários para implementação dos programas anuais necessários à implementação dos planos de universalização de energia elétrica. O reconhecimento da mora administrativa pelo Judiciário, por si só, não implica a configuração dos requisitos caracterizadores do dano moral coletivo. Diante disso, configurada a omissão da concessionária no atendimento de serviço público essencial a comunidade que faz juz à priorização no atendimento do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica – Luz para Todos, entende-se que a apelação deve ser parcialmente provida, para assegurar o fornecimento de energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro. RAZÕES PELAS QUAIS se dá parcial provimento à apelação para, reformando a sentença, condenar a pare ré a implementar o fornecimento regular e permanente de energia elétrica à comunidade indígena Anaro, no Município de Amajari/RR, no prazo de 90 (noventa) dias. Sem condenação em honorários advocatícios, em razão do disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO: Boa Vista Energia Ltda e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS - RR142-A, SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE - RR344-A, FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA - RR114-A, THIAGO PIRES DE MELO - RR938-A, CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE - RR937-A, PABLO RAMON DA SILVA MACIEL - RR861-A, HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA - RR262-A e EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS - RR1752-A EMENTA CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PROGRAMA LUZ PARA TODOS. COMUNIDADE INDÍGENA ANARO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. DIREITO FUNDAMENTAL. CONDUTA OMISSIVA DA CONCESSIONÁRIA. POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO JUDICIAL. DANO MORAL COLETIVO. NÃO CONFIGURAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos em ação civil pública que buscava assegurar o fornecimento regular e permanente de energia elétrica à comunidade indígena Anaro, e a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. 2. A distribuição de energia elétrica é serviço público essencial, de competência da União, que o executa por meio de concessão ou permissão, regida pelas Leis nº 8.987/1995 e 9.074/1995, e normatizada por resoluções da ANEEL, inclusive no que se refere ao plano de universalização do acesso a esse serviço. 3. A concessionária de serviço público detém responsabilidade na elaboração e execução dos planos de universalização de energia elétrica, conforme previsto na resolução ANEEL nº 223/2003, com a obrigação de identificar comunidades não atendidas e estimar os investimentos necessários. 4. A concessionária de serviço público, ainda que submetida à coordenação do programa federal "Luz Para Todos", detém responsabilidades autônomas de planejamento e execução de ações voltadas à universalização do serviço, conforme previsto em normas regulamentares da ANEEL, não podendo eximir-se da obrigação de adotar providências mínimas para suprir a demanda local provisoriamente, como a instalação de geradores. 5. A omissão da concessionária de energia elétrica em adotar medidas eficazes e concretas para garantir o acesso à energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro justifica a intervenção do Judiciário para assegurar a prestação de serviço público essencial diretamente vinculado à dignidade da pessoa humana e à efetividade de direitos fundamentais. 6. A alegação de limitações técnicas e orçamentárias não afasta a responsabilidade da concessionária, especialmente diante da previsão legal de priorização de comunidades indígenas nos planos de expansão do Programa Luz para Todos, conforme previsto no Decreto nº 11.628/2023. 7. Conforme entendimento firmado pelo STF, em situações excepcionais pode o Judiciário atuar no sentido de determinar à Administração Pública a adoção de medidas para assegurar o cumprimento de direitos reconhecidos constitucionalmente como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação dos poderes (ARE 1387572 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 03-11-2022, Processo Eletrônico Dje-242 Divulg 29-11-2022 Public 30-11-2022). 8. O reconhecimento da mora administrativa pelo Judiciário, por si só, não impõe a caracterização do dano moral coletivo. 9. Somente é caracterizado o dano moral coletivo nas hipóteses em que configurada lesão a valores fundamentais da sociedade de forma injusta e intolerável, o que não ficou demonstrado no caso (Precedentes do STJ: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018 e AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 3/11/2023). 10. Apelação parcialmente provida para condenar a ré à obrigação de fazer consubstanciada na implementação do fornecimento regular e permanente de energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro. Mantida a improcedência do pedido de dano moral coletivo. 11. Sem condenação em honorários advocatícios, em razão do disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985. ACÓRDÃO Decide a Quinta Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. Brasília-DF, na data do julgamento. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE Relator Convocado

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Processo nº 1000462-52.2018.4.01.4200

ID: 280166862

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000462-52.2018.4.01.4200

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BOA VISTA ENERGIA LTDA

Acórdão

Advogados:

EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS

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HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA

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PABLO RAMON DA SILVA MACIEL

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CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE

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THIAGO PIRES DE MELO

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FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA

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SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE

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ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público F… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:Boa Vista Energia Ltda e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS - RR142-A, SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE - RR344-A, FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA - RR114-A, THIAGO PIRES DE MELO - RR938-A, CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE - RR937-A, PABLO RAMON DA SILVA MACIEL - RR861-A, HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA - RR262-A e EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS - RR1752-A RELATOR(A):ALEXANDRE MACHADO VASCONCELOS PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000462-52.2018.4.01.4200 RELATÓRIO O Exmo. Sr. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE (Relator Convocado): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara da Seção Judiciária de Roraima que julgou improcedente os pedidos formulados na ação civil pública ajuizada em face de Roraima Energia S/A (sucessora de Boa Vista Energia S/A), que visavam assegurar à comunidade indígena Anaro, no Município de Amajari/RR, o fornecimento regular e permanente de energia elétrica, bem como a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. Em suas razões de apelação, o MPF alegou a ocorrência de omissão por parte da concessionária, afirmando que não ficou demonstrado o planejamento ou a priorização para atendimento da comunidade indígena Anaro, tampouco teria sido disponibilizada qualquer solução paliativa, como o fornecimento de geradores. Invocou a responsabilidade da ré com base na Resolução nº 223/2003 da ANEEL, e sua legitimidade, tendo em vista a concessão de poder público e a titularidade de exploração do serviço de distribuição de energia elétrica, nos termos das Leis 9.074/1995 e 8.987/1995. Argumentou que a essencialidade do serviço público justifica a atuação jurisdicional para sanar omissão estatal prolongada e inconstitucional. Pugnou, ainda, pelo reconhecimento do dano moral coletivo e pela concessão de tutela provisória. Em contrarrazões, a Roraima Energia S/A defendeu a ausência de omissão e de legitimidade para atuar de forma autônoma na seleção das comunidades a serem atendidas pelo Programa Luz Para Todos, sustentando que tais decisões cabem ao Ministério de Minas e Energia, por meio do Comitê Gestor do programa. Argumentou que forneceu um motor gerador à comunidade e que eventual fornecimento integral de energia encontra-se inviabilizado por limitações técnicas e orçamentárias. Alegou a impossibilidade de intervenção judicial nas políticas públicas, diante do respeito à separação de poderes e ao princípio da reserva do possível. Sustentou a inexistência de dando moral coletivo e pugnou pela manutenção da sentença. O Ministério Público Federal, na condição de fiscal da lei, manifestou-se pelo provimento da apelação. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000462-52.2018.4.01.4200 VOTO O Exmo. Sr. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE (Relator Convocado): Pretende o MPF assegurar acesso regular e permanente à energia elétrica à comunidade indígena Anaro, localizada no Município de Amajari/RR. Sustentou a recorrente a omissão do poder público e da concessionária no fornecimento de acesso regular e permanente a serviço essencial e defendeu ser justificada a intervenção judicial, no caso, invocando a necessidade de proteção à dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais das comunidades indígenas afetadas pela ausência de fornecimento do serviço de energia elétrica. A exploração dos serviços e a instalação de energia elétrica é atividade que compete à União, podendo ela atuar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão (art. 21, XII, “b”, da CF/1988). A distribuição de energia elétrica, serviço público essencial de competência da União, é executada por meio de concessão ou permissão a entes privados submetidos à regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. A Lei 8.987/1995 dispõe sobre o regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos previstos no art. 175 da Constituição Federal de 1988, ao passo que a Lei 9.074/1995 estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões, permissões e autorizações de serviços públicos, tratando especificamente das concessões de exploração de serviços e instalações de energia elétrica nos arts. 4º a 18. A Lei 10.438/2002, ao dispor sobre a expansão da oferta de energia elétrica emergencial e sobre a universalização do serviço público de energia elétrica, fixou regra segundo a qual, no estabelecimento das metas de universalização do uso de energia, a ANEEL fixaria para cada concessionária e permissionária do serviço de distribuição, áreas progressivamente crescentes em torno das redes de distribuição, e áreas progressivamente descrescentes em redes de tensão definidas. Confira-se a redação da norma em questão: Art. 14. No estabelecimento das metas de universalização do uso da energia elétrica, a Aneel fixará, para cada concessionária e permissionária de serviço público de distribuição de energia elétrica: I - áreas, progressivamente crescentes, em torno das redes de distribuição, no interior das quais o atendimento em tensão inferior a 2,3kV, ainda que necessária a extensão de rede primária de tensão inferior ou igual a 138kV, e carga instalada na unidade consumidora de até 50kW, será sem ônus de qualquer espécie para o solicitante que possuir característica de enquadramento no Grupo B, excetuado o subgrupo iluminação pública, e que ainda não for atendido com energia elétrica pela distribuidora local; (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) II - áreas, progressivamente decrescentes, no interior das quais o atendimento em tensão inferior a 2,3kV, ainda que necessária a extensão de rede primária de tensão inferior ou igual a 138kV, e carga instalada na unidade consumidora de até 50kW, poderá ser diferido pela concessionária ou permissionária para horizontes temporais preestabelecidos pela ANEEL, quando o solicitante do serviço, que possuir característica de enquadramento no Grupo B, excetuado o subgrupo iluminação pública, e que ainda não for atendido com energia elétrica pela distribuidora local, será atendido sem ônus de qualquer espécie. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 1o O atendimento dos pedidos de nova ligação ou aumento de carga dos consumidores que não se enquadram nos termos dos incisos I e II deste artigo, será realizado à custa da concessionária ou permissionária, conforme regulamento específico a ser estabelecido pela ANEEL, que deverá ser submetido a Audiência Pública. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 2o É facultado ao consumidor de qualquer classe contribuir para o seu atendimento, com vistas em compensar a diferença verificada entre o custo total do atendimento e o limite a ser estabelecido no § 1o. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 3o Na regulamentação do § 1o deste artigo, a ANEEL levará em conta as características da carga atendida, a rentabilidade do investimento, a capacidade econômica e financeira do distribuidor local, a preservação da modicidade tarifária e as desigualdades regionais. (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) § 4o Na regulamentação deste artigo, a ANEEL levará em conta, dentre outros fatores, a taxa de atendimento da concessionária ou permissionária, considerada no global e desagregada por Município e a capacidade técnica, econômica e financeira necessárias ao atendimento das metas de universalização. (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) § 5o A ANEEL também estabelecerá procedimentos para que o consumidor localizado nas áreas referidas no inciso II do caput possa antecipar seu atendimento, financiando ou executando, em parte ou no todo, as obras necessárias, devendo esse valor lhe ser restituído pela concessionária ou permissionária após a carência de prazo igual ao que seria necessário para obter sua ligação sem ônus. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 6o Para as áreas atendidas por cooperativas de eletrificação rural serão consideradas as mesmas metas estabelecidas, quando for o caso, para as concessionárias ou permissionárias de serviço público de energia elétrica, onde esteja localizada a respectiva cooperativa de eletrificação rural, conforme regulamentação da ANEEL. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 7o O financiamento de que trata o § 5o deste artigo, quando realizado por órgãos públicos, inclusive da administração indireta, a exceção dos aportes a fundo perdido, visando a universalização do serviço, serão igualmente restituídos pela concessionária ou permissionária, ou se for o caso, cooperativa de eletrificação rural, devendo a ANEEL disciplinar o prazo de carência quando o fornecimento for em áreas com prazos de diferimento distintos. (Redação dada pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 8o O cumprimento das metas de universalização será verificado pela ANEEL, em periodicidade no máximo igual ao estabelecido nos contratos de concessão para cada revisão tarifária, devendo os desvios repercutir no resultado da revisão mediante metodologia a ser publicada. § 9o A ANEEL tornará públicas, anualmente, as metas de universalização do serviço público de energia elétrica. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 10. Não fixadas as áreas referidas nos incisos I e II do caput no prazo de um ano contado da publicação desta Lei e até que sejam fixadas, a obrigação de as concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica atenderem aos pedidos de ligação sem qualquer espécie ou tipo de ônus para o solicitante aplicar-se-á a toda a área concedida ou permitida. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 11. A partir de 31 de julho de 2002 e até que entre em vigor a sistemática de atendimento por área, as concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica atenderão, obrigatoriamente e sem qualquer ônus para o consumidor, ao pedido de ligação cujo fornecimento possa ser realizado mediante a extensão de rede em tensão secundária de distribuição, ainda que seja necessário realizar reforço ou melhoramento na rede primária. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 12. No processo de universalização dos serviços públicos de energia elétrica no meio rural, serão priorizados os municípios com índice de atendimento aos domicílios inferior a oitenta e cinco por cento, calculados com base nos dados do Censo 2000 do IBGE, podendo ser subvencionada parcela dos investimentos com recurso da Reserva Global de Reversão, instituída pela Lei no 5.655, de 20 de maio de 1971 e da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, de que trata o art. 13 desta Lei, nos termos da regulamentação. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 13. O Poder Executivo estabelecerá diretrizes específicas que criem as condições, os critérios e os procedimentos para a atribuição da subvenção econômica às concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica e, se for o caso, cooperativas de eletrificação rural e para a fiscalização da sua aplicação nos municípios beneficiados. (Incluído pela Lei nº 10.762, de 11.11.2003) § 14. Para o atendimento dos pedidos de nova ligação de unidade consumidora rural em Municípios cuja universalização já seja considerada atingida, a Aneel deverá regular os prazos, as condições e os procedimentos para essas ligações, observado o seguinte: (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) I - o solicitante deverá apresentar documento, com data, que comprove a propriedade ou a posse do imóvel, observado que a Aneel poderá tratar situações excepcionais mediante justificativa; e (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) II - a distribuidora poderá, no caso de assentamento ou ocupação irregular com predominância de população de baixa renda, realizar o atendimento temporário da unidade consumidora, com necessária solicitação ou anuência expressa do poder público competente. (Incluído pela Lei nº 14.514, de 2022) A Resolução ANEEL 223/2003, vigente à época, estabeleceu as condições para a elaboração dos Planos de Universalização de Energia Elétrica visando ao atendimento de novas unidades consumidoras e definindo concessionária e permissionária de distribuição de energia elétrica com agente titular da concessão ou permissão federal para explorar o serviço público de distribuição de energia elétrica. A Resolução ANEEL 223/2023 atribuiu às concessionárias a obrigação de identificar as comunidades não atendidas e de incluir suas demandas nos respectivos planos de universalização, com a devida previsão de investimentos. A concessionária é responsável por realizar a ligação para a unidade consumidora, conforme previsto nos arts. 3º e 4º da referida norma. Essa norma também prevê que a concessionária encaminhará à ANEEL a estimativa global, ano a ano, dos investimentos necessários para a implementação dos programas anuais no plano de universalização de energia elétrica. Confira-se o teor do art. 9º da citada norma: Art. 9º Por ocasião do envio dos Planos de Universalização, a concessionária poderá encaminhar à ANEEL, em documento independente, a estimativa global, ano a ano, dos investimentos necessários para a implementação dos respectivos Programas Anuais. Diante disso, sendo a parte recorrida executora do plano de universalização do fornecimento de energia elétrica, é de se reconhecer que detém legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. O Programa Luz para Todos foi instituído pelo Decreto 4.873/2003, destinado a disponibilizar, até o ano de 2008, o atendimento em energia elétrica à parcela da população do meio rural brasileiro que ainda não possuía acesso a esse serviço público. Findo o prazo inicialmente fixado nessa norma, a execução do projeto foi prorrogada até 2011 e, posteriormente, até 2022. Note-se que o Decreto 11.628/2023, que atualmente dispõe sobre o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica – Luz para Todos, prevê, entre seus objetivos, a democratização do acesso e uso da energia elétrica á população rural, por meio de extensão de redes de distribuição de energia elétrica, e em regiões remotas da Amazônia Legal, por meio de sistemas isolados de geração de energia elétrica (art. 2º, inciso I). Outro importante objetivo do Programa é a valorização e o respeito à cultura dos povos indígenas, de modo a priorizar o seu atendimento pelo Programa (art. 2º, inciso IV). As comunidades indígenas são reconhecidas como beneficiárias do Programa Luz para Todos (art. 3º, IV do Decreto 11.628/2023), havendo previsão de duração do Programa até 31 de dezembro de 2025 para o atendimento à população residente em regiões remotas da Amazônia Legal (art. 17 do Decreto 11.628/2023), como é o caso da comunidade indígena Anaro. No caso, embora tenha a concessionária alegado que a comunidade indígena Anaro não teria sido incluída no plano de execução da terceira etapa do Programa Luz para Todos em razão de limitações orçamentárias e da distância em relação à rede existente, nota-se que houve grande descompasso entre a situação da comunidade e a execução da política pública. A prova dos autos demonstra que, mesmo instada a adotar providências para a distribuição de energia elétrica na comunidade indígena Anaro, a demandada apresentou justificativas genéricas, sem ter comprovado a adoção de providências mínimas, como a instalação de geradores. Não houve qualquer demonstração pela demandada de adoção de planejamento voltado para a priorização no atendimento da comunidade indígena em causa. Além disso, a concessionária poderia ter encaminhado a estimativa de investimentos necessários à implementação dos serviços de energia elétrica, conforme preceitua o art. 9º da Resolução ANEEL 223/2003, mas se limitou a alegar o encarecimento da instalação em decorrência da distância da comunidade como obstáculo para a implementação do serviço. A alegação da recorrida de que caberia exclusivamente ao Comitê Gestor do Programa “Luz para Todos” decidir sobre o atendimento à comunidade Anaro não a exime de suas obrigações constitucionais e legais. O fornecimento de energia elétrica é considerado serviço essencial, sendo certo que a injustificada falta de energia elétrica é passível de vulnerar o princípio da dignidade da pessoa humana, na medida em que a ausência desse serviço impacta em outros serviços básicos, como saúde, educação e abastecimento de água. A recorrida apontou impedimento ao fornecimento do serviço de energia elétrica, alegando a distância da comunidade e a existência de orçamento limitado. Ao que consta dos autos, desde 2013 a comunidade Anaro aguarda o fornecimento desse serviço essencial. Observa-se que a concessionária sequer adotou medidas paliativas, como a disponibilização de gerador elétrico com capacidade para atender a demanda das 16 famílias da comunidade em questão. Durante o período superior a seis anos, a concessionária limitou-se a apresentar justificativas pela impossibilidade de interligação energética da comunidade indígena pelo programa Luz para Todos, sem demonstrar a aprovação de qualquer medida concreta para atenuar a situação. Ficou demonstrada, no caso, a inércia da parte apelada em atuar no sentido de realizar a interligação energética da comunidade indígena Anaro, ou de adotar medida paliativa, como a disponibilização de geradores. Ficou constatada, portanto, a omissão da concessionária no cumprimento da obrigação de fornecimento de energia elétrica à comunidade indígena, a demandar a intervenção do Judiciário. A questão trazida à análise não envolve a substituição, pelo Judiciário, do planejamento do Poder Executivo na execução de políticas públicas, mas a atuação no sentido de garantir a efetivação de direito fundamental. Com efeito, a negativa reiterada e prolongada, sem a adoção de qualquer medida eficaz, caracteriza omissão estatal que viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade de acesso e universalidade de serviço público essencial. A jurisprudência consolidada do STF tem admitido a intervenção do Judiciário em casos de omissão ou falha na implementação de políticas públicas, nas situações em que ficar demonstrada lesão ou ameaça de lesão a direitos fundamentais. Nesse sentido, confira-se: Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Ação civil pública. Direito dos remanescentes das comunidades de quilombo. Demarcação de terras. Razoável duração do processo administrativo. Estipulação de prazo para conclusão. Intervenção do Poder Judiciário. Possibilidade. Ausência de violação do princípio da separação dos poderes. Legislação infraconstitucional. Ofensa reflexa. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. 2. O recurso extraordinário não se presta para a análise de matéria infraconstitucional, tampouco para o reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF. 3. Agravo regimental não provido. 4. É inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85). (ARE 1387572 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 03-11-2022, Processo Eletrônico DJe-242 DIVULG 29-11-2022 PUBLIC 30-11-2022) A tutela jurisdicional aqui buscada tem por finalidade a garantia de condições existenciais mínimas à comunidade indígena Anaro e está fundamentada no princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado na Constituição Federal (art. 1º, III, da CF/1988). Não compete ao Judiciário determinar a implementação de políticas públicas voltadas ao fornecimento de serviço essencial a comunidades indígenas. No entanto, admite-se excepcionalmente a atuação do Poder Judiciário caso demonstrada a mora injustificada do gestor público na adoção das medidas necessárias à implementação da proteção dos direitos fundamentais, como o fornecimento de energia elétrica às comunidades indígenas. O Superior Tribunal de Justiça também já manifestou sobre o tema, decidindo que o Judiciário pode, em condições excepcionais, determinar que a Administração Pública adote as medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação de poderes e da reserva do possível. Confira-se: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMUNIDADE INDÍGENA. PODER JUDICIÁRIO. FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL . PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DE PODERES E DA RESERVA DO POSSÍVEL. AFRONTA. INEXISTÊNCIA. 1. A jurisprudência desta Corte Superior, na trilha do Supremo Tribunal Federal, firmou-se no sentido de que o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes e da reserva do possível. Precedentes. 2. Hipótese em que, nos autos de ação civil pública proposta com o objetivo de tornar efetivo o fornecimento de água potável a população indígena, ficou constatado no acórdão recorrido a existência de "omissão relevante do Estado (réus) na adoção de medidas necessárias ao fornecimento de água potável, e suprir uma das necessidade mais básicas do ser humano, a fim de conceder condições dignas de sobrevivência aos brasileiros que integram a comunidade indígena". 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.108.655/CE, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 11/3/2024, DJe de 2/4/2024) Nessa situação, é cabível a intervenção do Judiciário para sanar a omissão prolongada da concessionária de energia elétrica, no sentido de garantir à comunidade indígena Anaro o direito de acesso à energia elétrica. Ressalte-se que a teoria da reserva do possível não pode ser invocada como justificativa genérica para a omissão estatal na efetivação dos direitos fundamentais. Quanto ao tema, o STF já decidiu que a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada pelo Poder Público com o propósito de frustrar ou de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição e encontra limitação na garantia constitucional do mínimo existencial que representa emanação direta do postulado da dignidade da pessoa humana. A noção de mínimo existencial compreende prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, de modo a assegurar o direito a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, como, entre outros, o direito à moradia (ARE 639.337 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 23-8-2011, 2ª T, DJE de 15-9-2011). Não cabe a invocação da reserva do possível como fundamento para que o Estado se furte ao adimplemento de obrigações expressamente previstas no texto constitucional, tampouco “quando o Estado se omite na promoção de direitos constitucionalmente garantidos” (ARE 1269451 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 15-09-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-190 DIVULG 22-09-2021 PUBLIC 23-09-2021). Registre-se que o TRF da 4ª Região recentemente reconheceu a possibilidade de interferência do Judiciário para assegurar o direito dos indígenas ao fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que referido serviço é indispensável para garantir a segurança e o bem-estar da população atendida. Confira-se a ementa do julgado em questão: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÃO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DIREITO INDÍGENA. ILUMINAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. POSSIBILIDADE DE INTERFERÊNCIA DO JUDICIÁRIO EM CASOS EXCEPCIONAIS PARA GARANTIR DIREITOS FUNDAMENTAIS. OMISSÃO ESTATAL. MOROSIDADE. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA. 1. Conforme entendimento do STF o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. (RE 908680 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 07-04-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-093 DIVULG 04-05-2017 PUBLIC 05-05-2017). 2. A iluminação pública é indispensável à segurança e ao bem-estar da população, à preservação de logradouros públicos e à promoção do desenvolvimento humano e social das cidades. Trata-se de direito assegurado a todos os que habitam a zona urbana, cabendo ao município oferecer o serviço à população em seu território (CF/88, arts. 30, 149-A e 182, c/c Estatuto das Cidades). 3. De acordo com o Estatuto do Índio, os direitos assegurados por lei se estendem aos silvícolas e às comunidades indígenas nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros (Lei 6.001/1973, art. 1º, parágrafo único, e art. 2º). 4. A ausência de demarcação da terra indígena e a pendência de ação de reintegração de posse envolvendo a área em que está a aldeia não servem, por si sós, de justificativa para que o Poder Público negue a oferta de serviço essencial e impeça a fruição de direitos individuais e sociais da comunidade indígena. 5. Comprovadas a omissão estatal na prestação do serviço e a resistência do Município de Guaíra em ofertá-lo à aldeia por longa data, justifica-se a intervenção judicial para assegurar o direito dos indígenas à segurança, ao desenvolvimento e à proteção de seus bens (CF/88, art. 231). 6. Apelação desprovida. Sentença mantida. (TRF4, AC 5002022-62.2018.4.04.7017, 12ª Turma, Relator Desembargador Federal Luiz Antonio Bonat, julgado em 18/09/2024, publicado em 27/09/2024) Por outro lado, quanto ao pedido de indenização por danos morais coletivos, entende-se que não deve ser provida a apelação nesse ponto. A Lei 7.437/1985 prevê o cabimento de ação civil pública para responsabilização por dano moral ou material causados a qualquer interesse difuso ou coletivo (art. 1º, IV). Além disso, o STJ reconheceu a possibilidade de condenação em danos morais coletivos em sede de ação civil pública (AgInt no REsp 1.342.846/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 26/3/2019). No entanto, é preciso aferir adequadamente os requisitos necessários para a configuração do dano moral coletivo, para que não ocorra desvirtuamento ou banalização de sua utilização. Embora reconhecida a omissão administrativa no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a caracterização do dano moral coletivo requer a demonstração de conduta ilícita qualificada, com repercussão negativa significativa sobre valores relevantes para a coletividade atingida, o que não ficou suficiente demonstrado na situação dos autos. Para a caracterização do dano moral coletivo não é suficiente a infração à lei; é essencial que o ato praticado atinja alto grau de reprovabilidade e, em razão de sua gravidade e repercussão, afete relevantes valores sociais do grupo considerado. Conforme entendimento firmado pelo STJ, o dano moral coletivo se configura in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou efetivo abalo moral. Por outro lado, somente é caracterizado o dano moral coletivo nas hipóteses em que configurada lesão a valores fundamentais da sociedade de forma injusta e intolerável. Nesse sentido: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA N. 283/STF. DANO MORAL COLETIVO. LESÃO A VALORES FUNDAMENTAIS. NÃO OCORRÊNCIA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS E INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. FALTA DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA. SÚMULA N. 284 DO STF. DECISÃO MANTIDA. 1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/2015 quando a Corte local pronunciou-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. Ausente o enfrentamento da matéria pelo acórdão recorrido, inviável o conhecimento do recurso especial, por falta de prequestionamento. Incidência das Súmulas n. 282 e 356 do STF. 3. O recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido suficiente para mantê-lo não deve ser admitido, a teor da Súmula n. 283/STF. 4. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "se, por um lado, o dano moral coletivo não está relacionado a atributos da pessoa humana e se configura in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral, de outro, somente ficará caracterizado se ocorrer uma lesão a valores fundamentais da sociedade e se essa vulneração ocorrer de forma injusta e intolerável" (REsp 1502967/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018). 5. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem interpretação de cláusulas contratuais e revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmulas n. 5 e 7 do STJ). 6. É firme a orientação do STJ de que a impertinência temática do dispositivo legal apontado como ofendido resulta na deficiência das razões do recurso especial, fazendo incidir a Súmula n. 284 do STF. 7. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 3/11/2023) AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA. PRÓTESES, ÓRTESES E MATERIAIS LIGADOS A ATOS CIRÚRGICOS. CONTRATOS ANTIGOS E NÃO ADAPTADOS. RESTRIÇÃO CONTRATUAL. ABUSIVIDADE. DANO MORAL COLETIVO. OCORRÊNCIA. CONDUTA DESARRAZOADA. CLÁUSULA ILÍCITA. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL PACÍFICO À ÉPOCA. PREJUÍZO À COLETIVIDADE DE IDOSOS. MAGNITUDE DA LESÃO. CONFIGURAÇÃO. 1. O dano moral coletivo, compreendido como o resultado de uma lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade, se dá quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva (arts. 1º da Lei nº 7.347/1985, 6º, VI, do CDC e 944 do CC, bem como Enunciado nº 456 da V Jornada de Direito Civil). 2. Não basta a mera infringência à lei ou ao contrato para a caracterização do dano moral coletivo. É essencial que o ato antijurídico praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo primordial de valores sociais. Com efeito, para não haver o seu desvirtuamento, a banalização deve ser evitada. 3. A jurisprudência pacífica deste Tribunal Superior, desde longa data, sempre foi no sentido de se mostrar abusiva, com base no CDC, a cláusula restritiva de plano de saúde, ainda que não adaptado, ou seja, contrato antigo (anterior à Lei nº 9.656/1998), que prevê o não custeio de prótese, órtese ou material diretamente ligado ao procedimento cirúrgico ao qual se submete o consumidor. 4. Na hipótese, aplicando-se a legislação consumerista, não havia dúvida jurídica razoável quanto à abusividade da negativa de cobertura de órteses e próteses ligadas a ato cirúrgico nos contratos de assistência à saúde anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998, de forma que a operadora, ao ter optado pela restrição contratual, ainda mais em se tratando de consumidores com saúde fragilizada, boa parte idosos, incorreu em prática socialmente execrável, atingindo, de modo injustificável, a esfera moral da comunidade. 5. Caracteriza-se o dano moral coletivo quando houve intenção deliberada da demandada em violar o ordenamento jurídico com vistas a obter lucros predatórios em detrimento dos interesses transindividuais dos usuários de plano de saúde. 6. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.819.070/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 15/5/2024) A despeito da evidente omissão no fornecimento de serviço essencial à comunidade indígena, não ficou caracterizado o dando moral coletivo, tendo em vista a relativa complexidade ao procedimento em causa, que, entre outras questões, demanda a elaboração de uma estimativa global, a ser enviada à ANEEL, dos investimentos necessários para implementação dos programas anuais necessários à implementação dos planos de universalização de energia elétrica. O reconhecimento da mora administrativa pelo Judiciário, por si só, não implica a configuração dos requisitos caracterizadores do dano moral coletivo. Diante disso, configurada a omissão da concessionária no atendimento de serviço público essencial a comunidade que faz juz à priorização no atendimento do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica – Luz para Todos, entende-se que a apelação deve ser parcialmente provida, para assegurar o fornecimento de energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro. RAZÕES PELAS QUAIS se dá parcial provimento à apelação para, reformando a sentença, condenar a pare ré a implementar o fornecimento regular e permanente de energia elétrica à comunidade indígena Anaro, no Município de Amajari/RR, no prazo de 90 (noventa) dias. Sem condenação em honorários advocatícios, em razão do disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 15 - DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE VASCONCELOS PROCESSO: 1000462-52.2018.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000462-52.2018.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO: Boa Vista Energia Ltda e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ITALO DIDEROT PESSOA REBOUCAS - RR142-A, SARASSELE CHAVES RIBEIRO FREIRE - RR344-A, FRANCISCO DAS CHAGAS BATISTA - RR114-A, THIAGO PIRES DE MELO - RR938-A, CLAYTON SILVA ALBUQUERQUE - RR937-A, PABLO RAMON DA SILVA MACIEL - RR861-A, HELAINE MAISE DE MORAES FRANCA - RR262-A e EDUARDO JOSE CUNHA MORAIS - RR1752-A EMENTA CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PROGRAMA LUZ PARA TODOS. COMUNIDADE INDÍGENA ANARO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. DIREITO FUNDAMENTAL. CONDUTA OMISSIVA DA CONCESSIONÁRIA. POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO JUDICIAL. DANO MORAL COLETIVO. NÃO CONFIGURAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos em ação civil pública que buscava assegurar o fornecimento regular e permanente de energia elétrica à comunidade indígena Anaro, e a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. 2. A distribuição de energia elétrica é serviço público essencial, de competência da União, que o executa por meio de concessão ou permissão, regida pelas Leis nº 8.987/1995 e 9.074/1995, e normatizada por resoluções da ANEEL, inclusive no que se refere ao plano de universalização do acesso a esse serviço. 3. A concessionária de serviço público detém responsabilidade na elaboração e execução dos planos de universalização de energia elétrica, conforme previsto na resolução ANEEL nº 223/2003, com a obrigação de identificar comunidades não atendidas e estimar os investimentos necessários. 4. A concessionária de serviço público, ainda que submetida à coordenação do programa federal "Luz Para Todos", detém responsabilidades autônomas de planejamento e execução de ações voltadas à universalização do serviço, conforme previsto em normas regulamentares da ANEEL, não podendo eximir-se da obrigação de adotar providências mínimas para suprir a demanda local provisoriamente, como a instalação de geradores. 5. A omissão da concessionária de energia elétrica em adotar medidas eficazes e concretas para garantir o acesso à energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro justifica a intervenção do Judiciário para assegurar a prestação de serviço público essencial diretamente vinculado à dignidade da pessoa humana e à efetividade de direitos fundamentais. 6. A alegação de limitações técnicas e orçamentárias não afasta a responsabilidade da concessionária, especialmente diante da previsão legal de priorização de comunidades indígenas nos planos de expansão do Programa Luz para Todos, conforme previsto no Decreto nº 11.628/2023. 7. Conforme entendimento firmado pelo STF, em situações excepcionais pode o Judiciário atuar no sentido de determinar à Administração Pública a adoção de medidas para assegurar o cumprimento de direitos reconhecidos constitucionalmente como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação dos poderes (ARE 1387572 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 03-11-2022, Processo Eletrônico Dje-242 Divulg 29-11-2022 Public 30-11-2022). 8. O reconhecimento da mora administrativa pelo Judiciário, por si só, não impõe a caracterização do dano moral coletivo. 9. Somente é caracterizado o dano moral coletivo nas hipóteses em que configurada lesão a valores fundamentais da sociedade de forma injusta e intolerável, o que não ficou demonstrado no caso (Precedentes do STJ: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018 e AgInt no AREsp n. 2.214.901/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 3/11/2023). 10. Apelação parcialmente provida para condenar a ré à obrigação de fazer consubstanciada na implementação do fornecimento regular e permanente de energia elétrica à Comunidade Indígena Anaro. Mantida a improcedência do pedido de dano moral coletivo. 11. Sem condenação em honorários advocatícios, em razão do disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985. ACÓRDÃO Decide a Quinta Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. Brasília-DF, na data do julgamento. Juiz Federal ALYSSON MAIA FONTENELE Relator Convocado

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Processo nº 0001878-24.2023.8.16.0101

ID: 281391678

Tribunal: TJPR Órgão: Juizado Especial Criminal de Jandaia do Sul Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0001878-24.2023.8.16.0101

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANDREZA KARINI FERREIRA DA SILVA CAMILA MANHONI DA SILVA

Conclusão

Advogados:

BRUNO CALIXTO OLIVATO

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LILIANE MILANO SILVA CHIMENTÃO

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CAMILA MANHONI DA SILVA

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Clementino S. Puppi, 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fon… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Clementino S. Puppi, 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0001878-24.2023.8.16.0101 Processo: 0001878-24.2023.8.16.0101 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Sumaríssimo Assunto Principal: Ameaça Data da Infração: 28/05/2023 Vítima(s): ESTADO DO PARANA Réu(s): ANDREZA KARINI FERREIRA DA SILVA CAMILA MANHONI DA SILVA SENTENÇA 1. RELATÓRIO O relatório é dispensável (Lei nº. 9.099/1995, art. 81, § 3º). 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos estão em ordem. Não há nulidade ou preliminar a ser considerada, eis que se encontram presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Passo a analisar a materialidade e autoria do fato narrado na denúncia, bem como os elementos analíticos do delito. Infere-se dos autos que no dia 28 de maio de 2023, por volta das 01h30, na Praça do Café, n. 196, Centro, no estabelecimento comercial denominado Lanchonete da Lourdes, nesta cidade e Comarca de Jandaia do Sul/PR, a acusada CAMILA MANHONI DA SILVA, agindo com consciência e vontade, desobedeceu à ordem legal de funcionário público, ao avançar contra Andreza Karini Ferreira da Silva, tentando pegar seu celular, enquanto a equipe policial, composta por Matheus Henrique Lima dos Santos e Juliano de Tomasi, determinava que esta parasse, sendo necessário fazer uso de força física e algemas para contê-la (cf. Boletim de Ocorrência n. 2023/596030 – seq. 8.1). A materialidade ficou comprovada pelo boletim de ocorrência (seq. 8.1). A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria, conforme passo a demonstrar. A testemunha Matheus Henrique Lima dos Santos, policial militar, ao ser inquirido em fase processual (seq. 89.1), confirmou a ocorrência dos fatos envolvendo a acusada. Reparem: “(...) A gente foi acionado para ir até essa lanchonete onde a Andreza tinha dito que, ela não sabia dizer se tinha perdido a bolsa dela ou se teriam furtado. Chegando lá, encontramos ela, ela estava visivelmente embriagada e ela estava discutindo com a outra pessoa da ocorrência. Elas duas estavam discutindo lá dentro, e a dona do estabelecimento pediu para que tirássemos as duas de lá porque estava atrapalhando o comércio. Fomos lá fora, e o sistema de fazer boletins estava congestionado e teve uma pequena demora. Nisso Andreza começou a discutir com a outra parte e começou a filmá-la. A outra que também estava visivelmente embriagada e alterou os ânimos e nisso a polícia teve que conter as duas, foi necessário utilização da algema para resguardar a integridade das duas. Com isso, as duas foram encaminhadas até a Delegacia, e durante esse percurso as duas ficaram ameaçando uma a outra (…)”. Neste mesmo sentido foi o testemunho do policial militar Juliano de Tomasi em audiência de caráter instrutório (seq. 89.2): “(...) A solicitante foi a outra parte envolvida. No momento elas já haviam discutido no interior da lanchonete e a proprietária pediu para que a gente atendesse à ocorrência do lado de fora, as duas partes apresentavam sinal de embriaguez, final de festa provavelmente. No momento em que a gente foi fazer o boletim de ocorrência, nosso sistema apresentou algumas falhas técnicas e o atendimento começou a demorar um pouco. Antes da gente perguntar se alguém queria representar contra a outra parte, por um possível termo circunstanciado ou algo parecido, houve essa situação. A solicitante, se não me engano era Andreza, começou a filmar, ficou falando coisas que estavam provocando a Camila. A gente tentou manter as duas afastadas, mas a Camila foi para cima dela para tentar tirar o celular, e não teve outra alternativa que não usar força com as duas e conduzir para a Delegacia. Eu até entendo a provocação da Andreza, no entanto, a Camila, conheço ela da Delegacia de Polícia Civil, se não me engano ela trabalhou lá um tempo, sei que é uma pessoa esclarecida, até formada em direito, se não me engano, ela deveria ter acatado a orientação e ter permanecido afastada, esperado a gente terminar o procedimento de forma correta. Ela realmente não obedeceu quando pedimos para que elas permanecessem afastadas e não continuassem a briga. Ela estava embriagada suficientemente para perder o controle, estava em pé, não estava cambaleando, estava alterada e nervosa”. A ré foi declarada revel, nos termos do artigo 367 do Código de Processo Penal, pois não se fez presente mesmo após ter sido citada e intimada para participar da solenidade de caráter instrutório (seq. 33.1). Pois bem. Os policiais militares foram categóricos em afirmar que a ré desobedeceu a ordem de emanada por eles, tendo avançado contra a pessoa de Andreza Karini Ferreira da Silva e tentado, deste modo, pegar o celular que estava em uma das mãos dela. Em que pese a defesa tenha alegado ausência do dolo específico na conduta da ré, tal tese não merece ser acatada, em vista de não terem os policiais qualquer motivo para incriminá-la ou prejudicá-la. Ao contrário, o militar Juliano de Tomasi enfatizou que a ré é uma pessoa instruída e que, inclusive, laborou em repartição pública policial, sendo de seu conhecimento o que poderia e não poderia fazer. Ademais, a tese de ausência de dolo específico não foi comprovada pela defesa. Oportuno colacionar os seguintes julgados: APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE. ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. CONDENAÇÃO PELOS DELITOS DE DESOBEDIÊNCIA E DE DESACATO (ARTIGOS 330 E 331 DO CÓDIGO PENAL). INSURGÊNCIA DEFENSIVA. PRELIMINAR MINISTERIAL EM SEDE DE CONTRARRAZÕES. ALEGADA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR AFASTADA. PLEITO DEFENSIVO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA E AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS. DOLO ESPECÍFICO VERIFICADO. DEPOIMENTOS DO AGENTE POLICIAL COERENTE E DOTADO DE FÉ PÚBLICA. DECLARAÇÕES DA RÉ INCONSONANTES ENTRE SI. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0001054-96.2021.8.16.0081 - Faxinal - Rel.: DESEMBARGADOR KENNEDY JOSUE GRECA DE MATTOS - J. 12.05.2025). (g.n.) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA (ART. 330 DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEFESA. ALEGADA AUSÊNCIA DE DOLO. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS POR MEIO DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONTIDOS NOS AUTOS. ELEMENTO SUBJETIVO COMPROVADO. ACUSADO QUE DESOBEDECEU À ORDEM DE CESSAR AS AGRESSÕES CONTRA SEU IRMÃO. DEPOIMENTOS UNÍSSONOS DOS POLICIAIS MILITARES QUE ATENDERAM À OCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA TURMA RECURSAL E DO STJ. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 6ª Turma Recursal dos Juizados Especiais - 0001360-80.2021.8.16.0173 - Umuarama - Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO VANESSA VILLELA DE BIASSIO - J. 12.05.2025). (g.n.) A arguição de que o estado de embriaguez da ré seria capaz de eximi-la de responsabilidade também não possui guarida, notadamente porque apesar da alusão acerca da suposta ebriedade a que estava ela acometida no momento de sua conduta delituosa, é certo que tal circunstância não elide a sua imputabilidade penal. O Código Penal estabelece que a embriaguez voluntária ou culposa não concede a redução ou isenção de pena, mas tão somente quando a intoxicação e o consequente estado de inconsciência e incapacidade de determinação são oriundos de caso fortuito ou força maior. Em que pese reste induvidoso do caderno processual que a acusada estaria embriagada, estava plenamente consciente do que estava fazendo, tratando-se de embriaguez voluntária que não exime a responsabilização pela prática delituosa (CP., art. 28, inc. II), não tendo restado comprovado tratar-se de pessoa dependente e que necessitaria de acompanhamento médico, tampouco a ausência de capacidade de entendimento e autodeterminação de sua parte. Nesta senda, colho os seguintes escólios: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. APELAÇÃO. RETRATAÇÃO DA VÍTIMA QUANTO AO DELITO DE AMEAÇA (ART. 147, CAPUT, CP) EM AUDIÊNCIA PRELIMINAR.CONDENAÇÃO POR LESÃO CORPORAL (ART. 129, § 9.º, CP). RÉU CONDENADO À PENA DE TRÊS (3) MESES DE DETENÇÃO, EM REGIME ABERTO. RECURSO DA DEFESA. 1) PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. LEGITIMA DEFESA. APLICAÇÃO DO AXIOMA DO IN DUBIO PRO REO. DESACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. PALAVRA DA VÍTIMA EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS PRODUZIDAS NOS AUTOS. 2) PLEITO VISANDO À ABSOLVIÇÃO AO ARGUMENTO DE AUSÊNCIA DE DOLO ANTE A EMBRIAGUEZ. INVIABILIDADE.EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO EXCLUI A IMPUTABILIDADE PENAL.INTELIGÊNCIA DO ART. 28. INC. II, DO CÓDIGO PENAL.CONDENAÇÃO MANTIDA. 3) PLEITO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS À DEFENSORA NOMEADA. DESACOLHIMENTO. MONTANTE DE R$ 1.500,00 (UM MIL E QUINHENTOS REAIS) FIXADO PELO MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU QUE ABRANGE A INTERPOSIÇÃO DO PRESENTE APELO. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 1ª C.Criminal - AC - 1673982-3 - Wenceslau Braz - Rel.: Miguel Kfouri Neto - Unânime - J. 29.06.2017) (g.n.) AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. SUFICIÊNCIA DE PROVAS. Tipicidade. Eventual embriaguez voluntária não exclui a imputabilidade penal. Manutenção da condenação. Intimidação proferida pelo réu contra mulher com quem namorava à época. Ação baseada no gênero. Vulnerabilidade caracterizada, decorrente da própria condição de mulher. Incidência da Lei nº 11.340/06. Inteligência dos artigos 5º e 7º da Lei nº 11.340/2006 e entendimento jurisprudencial. Pena-base. Exasperação indevida. Retorno ao piso. Agravante do art. 61, II, f, do CP. Aumento mínimo. Manutenção. Regime mais brando. Adequação. Sursis. Cabimento. Parcial provimento ao recurso. (TJSP; ACr 0005690-56.2018.8.26.0009; Ac. 13602377; São Paulo; Décima Segunda Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Heitor Donizete de Oliveira; Julg. 06/05/2020; DJESP 02/06/2020; Pág. 2849). (g.n.) PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. VIAS DE FATO E AMEAÇA. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DOLO COMPROVADO. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. IRRELEVÂNCIA. Conquanto a contravenção penal de vias de fato exija, para a sua caracterização, o elemento subjetivo referente ao dolo específico de ofender ou produzir um mal físico ao ofendido, o estado de ira ou de embriaguez do agente não descaracteriza o dolo da conduta. O delito de ameaça se consuma com a simples promessa, e consequente intimidação da vítima, de causar mal injusto e grave, tratando-se de crime formal que não exige resultado naturalístico. A embriaguez voluntária, por si só, não tem o condão de excluir a imputabilidade do agente ou de lhe garantir uma redução de pena. (TJMG; APCR 0002197-25.2019.8.13.0518; Poços de Caldas; Quarta Câmara Criminal; Rel. Des. Júlio Cezar Guttierrez; Julg. 06/05/2020; DJEMG 28/05/2020). (g.n.) APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PRÁTICA DO DELITO DE AMEAÇA. CONDUTA DESCRITA NO ART. 147, DO CPB NO ÂMBITO DA LEI Nº 11.340/06. PRELIMINAR. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. AUSÊNCIA DE DOLO. QUESTÃO DE MÉRITO. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE DOLO OU INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A embriaguez voluntária ou culposa, pelo álcool ou qualquer outra substância, não exclui a culpabilidade, visto que o agente, ao se colocar em estado de embriaguez estava consciente e, ainda que sob efeito de substância que limita o discernimento, age com a intenção de provocar o resultado lesivo, de tal modo que a análise da imputabilidade é transferida para momento anterior à prática delitiva. 2. Estando comprovada nos autos a prática do delito de ameaça contra esposa, e presentes os requisitos para condenação, a manutenção da sentença condenatória é medida que se impõe, não havendo que se falar em ausência de provas acerca da autoria. 3. Uma vez que se trata de recurso em face de condenação pela prática de crime de ameaça à pessoa, não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por reprimendas restritivas de direitos. (TJMG; APCR 0016794-25.2017.8.13.0241; Esmeraldas; Primeira Câmara Criminal; Relª Desª Kárin Emmerich; Julg. 05/05/2020; DJEMG 18/05/2020). (g.n.) Do contexto fático, é possível extrair que os policiais foram acionados para atender uma ocorrência envolvendo a ré e a pessoa de ANDREZA, ambas em aparente estado de embriaguez, que discutiam no interior de um estabelecimento comercial, e a proprietária os acionou porque o entrevero incomodava os demais clientes, bem como o bom andamento de suas atividades comerciais. Assim que chegaram, contiveram ambas. Contudo, em razão de uma instabilidade no sistema policial destinado à lavratura de ocorrências, CAMILA e Andreza continuaram a discutir e CAMILA, mesmo após ter recebido a ordem para não avançar contra Andreza o fez, a fim de evitar que ela continuasse a produzir imagens em vídeo com o aparelho telefone celular, tendo tentado tomá-lo. Asseveraram, ainda, que estava a ré sob efeito de álcool, mas apesar de ter apresentado alguns sinais, estava completamente consciente do que fazia. Em que pese a defesa tenha se insurgido contra a prova testemunhal, ao afirmar que há apenas os depoimentos unilaterais dos policiais como prova do fato, é bom que se diga que o valor do depoimento testemunhal de policiais, especialmente quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório da ampla defesa, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-los apenas pelo fato de emanar de agentes estatais incumbidos por dever de ofício da repressão penal. Em abono: APELAÇÃO CRIMINAL. Embriaguez ao volante e Resistência. Artigo 306 da Lei nº 9.503/97 e artigo 329, do Código Penal. Absolvição. Impossibilidade. Autoria e materialidade comprovadas. Prova testemunhal comprovando a embriaguez. Admissibilidade. Inteligência do §2º do referido dispositivo. Palavra dos policiais atestando os delitos. Validade. Réu que, embora tente afirmar que sua conduta não é criminosa, confessou ter ingerido bebida alcoólica antes de dirigir. Insubsistente a alegação de insuficiência probatória ou de atipicidade das condutas. Condenação acertada e mantida. Dosimetria. Reprimenda aplicada de forma adequada. Suspensão do direito de conduzir veículo automotor. APELO NÃO PROVIDO. (TJSP; ACr 0002048-92.2015.8.26.0587; Ac. 13378562; São Sebastião; Nona Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Silmar Fernandes; Julg. 05/03/2020; DJESP 10/03/2020; Pág. 3193). (g.n.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RESISTÊNCIA. LESÃO CORPORAL LEVE. ORDEM LEGAL. MANDADO DE PRISÃO EM ABERTO. VIOLÊNCIA CONTRA POLICIAL MILITAR. LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO. MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO CRIME CULPOSO. DOLO COMPROVADO. IMPOSSIBILIDADE. VERACIDADE. DEPOIMENTO. AGENTE PÚBLICO. DOSIMETRIA DA PENA. EXCLUSÃO. VALORAÇÃO NEGATIVA. CONDUTA SOCIAL. FICHA CRIMINAL. QUANTIDADE DE AUMENTO. PRIMEIRA FASE. CRITÉRIO DE UM OITAVO. TERMO MÉDIO. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. PREVISÃO LEGAL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Ficou demonstrado nos autos que o denunciado resistiu, mediante violência, à execução de ordem legal, ofendendo a integridade corporal de um dos policiais militares responsáveis pelo cumprimento do mandado prisional, não havendo que se falar em resistência passiva ou crime de lesão corporal culposo. 2. A palavra do agente público quando atua no desempenho de suas funções possui presunção de legitimidade e veracidade. No caso dos autos, os policiais militares, tanto na fase extrajudicial como na fase judicial, sob o crivo do contraditório, afirmaram que o réu resistiu à ordem legal de prisão, desferindo socos e chutes, oportunidade em que lesionou a mão de um deles, o que foi comprovado por laudo de exame de corpo de delito. 3. Não obstante o réu possua múltiplos registros criminais, inclusive com trânsito em julgado, de acordo com o posicionamento do c. Superior Tribunal de Justiça, a existência de condenações anteriores não se presta a fundamentar a exasperação da pena-base no tocante à conduta social e personalidade do acusado. Logo, com mais razão a valoração negativa da conduta social fundamentada na ficha criminal do acusado. 4. Em relação ao quantum de aumento, na primeira fase da dosimetria da pena, a jurisprudência deste e. Tribunal de Justiça tem recomendado a utilização do critério de 1/8 (um oitavo) sobre a diferença entre o máximo e o mínimo da pena em abstrato para a majoração da pena-base por cada circunstância judicial desfavorável. 5. Apesar do mesmo contexto fático em que foram praticados os crimes de resistência e de lesão corporal, não há que se cogitar concurso formal de crimes, ante o disposto no § 2º do art. 329 do Código Penal, o qual prevê que o agente responde não só pela resistência como também pela violência cometida, atraindo, assim, a incidência do concurso material de crimes. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJDF; APR 00017.98-40.2018.8.07.0019; Ac. 122.6699; Primeira Turma Criminal; Rel. Des. Carlos Pires Soares Neto; Julg. 23/01/2020; Publ. PJe 03/02/2020). (g.n.) Assim, restou devidamente comprovada a ocorrência do crime de desobediência, tal como narrado na proemial acusatória. A conduta praticada pela acusada subsome-se, portanto, à norma abstratamente prevista no artigo 330 do Código Penal. O fato é antijurídico, posto que verberado pela lei penal e não foram alegadas e nem se encontram provadas nenhuma das excludentes de ilicitude dentre aquelas elencadas no artigo 23 Código Penal. Ao tempo do fato a acusada era imputável, tinha robusta consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa. Portanto, a conduta praticada pelo acusado configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece repressão estatal. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva Estatal a fim de CONDENAR a ré CAMILA MANHONI DA SILVA como incursa nas sanções do artigo 330 do Código Penal. Condeno, ainda, a sentenciada ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade da sentenciada - aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) - revelou-se normal à espécie delitiva pela qual foi denunciada. A sentenciada, nos moldes de Súmula nº. 444 do STJ[1], não registra antecedentes criminais (seq. 90.1). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social[2]. Os motivos do crime foram comuns à espécie delitiva. As consequências e circunstâncias não prejudicam a sentenciada. Não há se falar em comportamento vitimológico in casu. 4.2. Pena base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixo a pena base em 15 (quinze) dias de detenção e 10 (dez) dias-multa. 4.3. Circunstâncias legais Não incidem circunstâncias agravantes (CP., art. 61) e/ou atenuantes (CP., art. 65) capazes de influir na pena. 4.4. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem. 4.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima, fica a pena da sentenciada estabelecida em 15 DIAS DE DETENÇÃO E 10 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, em decorrência da ausência de informações acerca da condição financeira da sentenciada (CP., art. 49, § 1º). 4.6. Regime inicial de cumprimento da pena Considerando a quantidade da pena aplicada, as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e o disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME ABERTO[3], com fulcro no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal c/c. artigos 112, inciso I e 115, ambos da Lei nº. 7.210/1984, observadas as seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 20h00min na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 20h00min dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, observadas as deliberações constantes da Portaria nº. 20/2024 desta Vara Judicial e Anexos. 4.7. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Analisando os requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, previstos nos artigos 43 e 44, ambos do Código Penal, concluo que a aplicação de pena restritiva de direitos, no presente caso, mostra-se como a medida mais socialmente recomendável. Destarte, substituo a pena privativa de liberdade por UMA pena restritiva de direitos consistente em: prestação pecuniária no valor de um salário mínimo vigente (R$ 1518,00), em conformidade com o parâmetro fixado no artigo 45, § 2º, do Código Penal, que deverá ser revertida em proveito da conta única do Juízo (CP, art. 45, § 1º). Saliento que a aplicação da pena restritiva de direitos acima fixada prestigia com maior intensidade o caráter de reeducação da pena, dando a pessoa condenada a possibilidade de assistência à entidade que se volta para trabalho social, e via de consequência, maior responsabilidade e comprometimento com a comunidade local. Ressalto que a pena há muito não é mais vista pelo seu caráter retributivo, mas sim pela possibilidade de readequação social que é um de seus principiais escopos. A pena restritiva de direito ora imposta converter-se-á em privativa de liberdade pelo tempo da pena aplicada, caso sobrevenha à sentenciada condenação por crime a pena privativa de liberdade, desde que não suspensa, ou caso ocorra descumprimento injustificado das penas restritivas de direitos aqui aplicadas, nos exatos termos do artigo 45 do Código Penal. A audiência de advertência será designada oportunamente, na qual deverá comparecer a sentenciada para manifestar-se sobre a concordância com as condições ora impostas. Incabível a suspensão condicional da pena (CP, art. 77, inc. III). 5. DISPOSIÇÕES FINAIS 5.1. Honorários Advocatícios Considerando o trabalho desenvolvido pela defensora dativa, condeno o Estado do Paraná ao pagamento de R$ 900,00 (novecentos reais) de honorários advocatícios à Drª. Liliane Milano Silva Chimentão, inscrita na OAB/PR nº. 93.676, com fulcro no artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal e na Tabela de Honorários Advocacia Dativa (Resolução Conjunta nº. 06/2024 – PGE/SEFA, Anexo I, Advocacia Criminal, Item “1.”, Subitem “1.12.”), em virtude do zelo profissional, do número de atos processuais praticados (seq. 106.1), da combatividade, e os conhecimentos técnicos trazidos aos autos que foram relevantes ao julgamento da causa. Expeça-se certidões de honorários advocatícios em favor da i. causídica, intimando-a na sequência. 5.2. Prisão preventiva e medidas cautelares diversas da prisão Não se encontram presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva (CPP., arts. 312 e 387, § 1º), em virtude da fixação do regime aberto, bem como por ter a sentenciada respondido a todo processo em liberdade. Ademais, desnecessária a imposição de medidas cautelares diversas da prisão esculpidas no artigo 319 do Código de Processo Penal, por assim justificarem as circunstâncias judiciais da sentenciada, a gravidade do fato e por inexistir informação de que voltou a delinquir. 5.3. Destinação de bens apreendidos e da fiança Não há bens apreendidos e nem fiança recolhida nos autos. 5.4. Reparação de danos Em que pese a existência de pedido de fixação de danos morais coletivos causados pela infração, deduzido na vestibular acusatória (seq. 20, pág. 02) e reforçado em alegação finais apresentadas pelo Ministério Público, não há como acolher a referida pretensão, razão pela qual deixo de fixa-los (CPP., art. 387, inc. IV). Explico. É cediço que o dano moral coletivo se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e desde que fique demonstrado que a conduta agride, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva, dispensando-se a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. No caso concreto, pudemos vislumbrar que a sentenciada desobedeceu a uma ordem emanada por um dos militares que atendiam a ocorrência e, logo após, foi detida e encaminhada para a Delegacia de Polícia Civil, cessando a prática do ato ilícito. Diante disso, verifica-se que não há elementos que permitam dizer que a conduta da sentenciada tenha atributos de gravidade e intolerabilidade exacerbadas, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. Acerca do tema, colho os seguintes escólios jurisprudenciais: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO - ABSOLVIÇÃO NA ORIGEM - RECURSO MINISTERIAL - PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÃO NECESSÁRIA - PROVAS SUFICIENTES - POSSE DE MUNIÇÕES - CRIME MATERIALMENTE TÍPICO - MUNIÇÕES DE CALIBRE 9MM - USO PERMITIDO - DESCLASSIFICAÇÃO - MINORANTE DO TRÁFICO - NÃO CABIMENTO - REGIME ABERTO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - DESCABIMENTO - DANOS MORAIS COLETIVOS - FIXAÇÃO - INVIABILIDADE. 1. No caso de o telefone ser apreendido durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, em que há autorização judicial prévia para a prospecção de bens de interesse criminalístico, não há óbice para se acessar o seu conteúdo já armazenado, porquanto necessário às investigações, sendo prescindível nova autorização judicial para análise dos dados neles constantes. 2. Comprovado que as drogas e as munições apreendidas eram de propriedade dos réus, e que os entorpecentes não se destinavam unicamente ao consumo pessoal, deve ser a sentença absolutória reformada, para condenação de ambos pelos crimes previstos no art. 33 da Lei 11.343/06 e no Estatuto do Desarmamento. 3. Os acusados devem ser condenados também pelo delito descrito no art. 35 da Lei 11.343/06, na medida em que suficientemente comprovado o efetivo vínculo associativo entre eles, voltado à prática da traficância, e não apenas a existência de mero concurso de pessoas. 4. O delito de posse ilegal de munições é crime de mera conduta e de perigo abstrato, sendo bastante para a sua caracterização a simples prática de uma das condutas previstas no tipo penal, sem necessidade da efetiva exposição de outrem a risco, o qual é presumido. 5. Tendo em vista que as munições 9mm passaram a ser de calibre permitido, consoante Decreto 9.847, de 25 de junho de 2019 e Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, faz-se necessária a rec lassificação benéfica e condenação dos acusados pelo crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03 (e não no art. 16 da mesma lei). 6. Integrando os agentes organização criminosa e, ainda, sendo um deles reincidente, inviável a aplicação da causa de diminuição descrita no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 7. Fixadas as penas corporais em patamares acima de 04 (quatro) anos, não se mostra possível a fixação do regime prisional aberto, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. 8. Embora o sujeito passivo dos delitos em espécie seja a coletividade, ante a ausência de dispositivo legal de exata correlação, para efeitos penais, a falta de determinação e individualização da pessoa do ofendido (a que se refere o artigo 387, IV, CPP), afasta o cabimento da fixação, pelo juízo criminal, dos danos morais (coletivos) causados pelos réus. V.V. 1. Se os indícios que balizam o envolvimento de um dos recorrentes com substâncias entorpecentes e munição não restaram confirmados no decorrer da instrução probatória, ante a inexistência de prova suficiente a fundamentar um decreto condenatório, a absolvição daquele é medida que se impõe, notadamente em observância ao princípio "in dubio pro reo". 2. Não havendo provas suficientes a demonstrar a existência de uma estrutura permanente e organizada dedicada à venda de drogas, não resta configurado o crime disposto no artigo 35 da Lei Antidrogas. (TJ-MG - APR: 10687190008320001 Timóteo, Relator: Paulo Calmon Nogueira da Gama, Data de Julgamento: 22/09/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 24/09/2021). (g.n.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. ESTACIONAR VEÍCULO EM VAGA RESERVADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INFRINGÊNCIA A VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE OU ATRIBUTOS DA GRAVIDADE E INTOLERABILIDADE. MERA INFRINGÊNCIA À LEI DE TRÂNSITO. I - Na origem, trata-se de ação civil pública visando à condenação do réu, condutor de veículo automotor, ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência. II - A ação foi extinta, sem resolução de mérito, em razão da falta de interesse processual e ausência de respaldo legal para a pretensão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, manteve a sentença. III - O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano, independente de atributos da pessoa humana (dor, sofrimento etc.), e que se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e fique demonstrado que a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva. Preenchidos esses requisitos, o dano configura-se in re ipsa, dispensando, portanto, a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. IV - No caso, o pedido veiculado na exordial é de condenação do réu condutor de veículo automotor ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência; ausentes peculiaridades do caso, como reincidência ou maior desvalor na conduta da pessoa natural. Em casos tais, esta Segunda Turma não tem acolhido a pretensão condenatória, considerando a ausência de elementos que, não obstante a relevância da tutela coletiva dos direitos da pessoa com deficiência ou idosa, evidenciem que a conduta agrida, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade. Precedentes: AgInt no AREsp 1826143/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1/10/2021; AgInt no AREsp 1820258/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021; AgInt no AREsp 1758510/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021. V - Assim, na hipótese em exame, não há como afastar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a conduta em tela tenha infringido valores fundamentais da sociedade ou que possua atributos da gravidade e intolerabilidade. O caso trata, pois, de mera infringência à lei de trânsito, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. A propósito: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018. VI - Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (STJ - AREsp: 1927324 SP 2021/0199195-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022). (g.n.) Com base no exposto, inviável a condenação da sentenciada ao pagamento de danos morais coletivos. 5.5. Intimação da vítima Não há vítima, em razão da natureza do delito pelo qual foi denunciada. 5.6. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 1) procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 824, inciso VIII, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 2) expeça-se e remeta-se a guia de recolhimento definitiva da condenada, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso a sentenciada não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formará autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios à vara que estiver procedendo à execução (Resolução nº. 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 3) remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo das custas e da pena de multa; 4) intime-se a sentenciada para o recolhimento do valor das custas processuais e pena de multa devidas, no prazo de 10 (dez) dias, acompanhado o mandado das respectivas guias (Instrução Normativa nº 65/2021, art. 1º, observadas as alterações promovidas pela IN nº. 77/2021); 5) comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. JOÃO GUSTAVO RODRIGUES STOLSIS Juiz de Direito [1] Súmula nº. 444 do STJ: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. [2] Informativo 702 – Tema Repetitivo nº. 1077: “Condenações criminais transitadas em julgado, não utilizadas para caracterizar a reincidência, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente” (STJ. REsp 1.794.854-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021). [3] Súmula nº. 440 do STJ: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”.

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Ministério Público Do Estado Do Paraná x Hudson Junior Brant Goline

ID: 256913157

Tribunal: TJPR Órgão: Vara Criminal de Jandaia do Sul Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0001147-91.2024.8.16.0101

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

MINISTéRIO PúBLICO DO ESTADO DO PARANá

Polo Passivo:

HUDSON JUNIOR BRANT GOLINE

Conclusão

Advogados:

GABRIELA VIZEL GOMES

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fo… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0001147-91.2024.8.16.0101 Processo: 0001147-91.2024.8.16.0101 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Falso testemunho ou falsa perícia Data da Infração: 01/12/2023 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Réu(s): HUDSON JUNIOR BRANT GOLINE SENTENÇA 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em face de HUDSON JUNIOR BRANT GOLINE, qualificado no seq. 9.1, como incurso nas sanções do artigo 342, §1º, do Código Penal, combinado com o artigo 61, inciso I, do Código Penal, por pretensa prática do seguinte fato delituoso: “Em 01 de dezembro de 2023, por volta das 11h00min, no Salão do Júri do Fórum da Comarca de Jandaia do Sul, situado na Rua Plácido Caldas, nº 536, centro, neste município e Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado HUDSON JUNIOR BRANT GOLINE, reincidente em crime doloso1, agindo com consciência e vontade, com o intuito de beneficiar o réu Matheus Garcia da Silva, fez afirmação falsa como testemunha em processo judicial, prestando declarações inverídicas nos autos da Ação Penal nº 2307-25.2022.8.16.0101, especificamente ao assumir a autoria do homicídio de Danilo Xavier Abrantes, pelo qual Matheus estava sendo julgado, divergindo substancialmente de seu interrogatório nos autos da Ação Penal nº 480- 42.2023.8.16.0101, ocorrido em 28 de fevereiro de 2024, quando declarou que assumiu a autoria do homicídio porque estava sendo ameaçado por Matheus (conforme interrogatório de mov. 391.3, 04min34seg, autos nº 480- 42.2023.8.16.0101). O crime foi cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, já que o objetivo, ao assumir falsamente a autoria do crime de homicídio que vitimou Danilo Xavier Abrantes, era convencer o júri a absolver o réu Matheus Garcia da Silva. ” A denúncia foi recebida em 28.03.2024 (seq. 14.1). O réu foi citado em 03.05.2024 (seq. 27.1) e apresentou resposta à acusação através da Defensoria Pública (seq. 33.1). A fase instrutória ocorreu de forma regular, conforme se infere do seq. 56.1. Na ocasião procedeu-se à inquirição do informante Matheus Garcia da Silva, arrolado em comum pela acusação e pela defesa. Por fim, constatou-se a ausência do réu, embora intimado, motivo pelo qual foi decretada sua revelia. O Ministério Público, em suas alegações finais de seq. 60.1, pugnou a procedência total da pretensão punitiva para o fim de condenar o réu pela prática da infração penal descrita na inicial acusatória por entender comprovadas a autoria e materialidade delitiva. Na dosimetria da pena postulou pela fixação da pena-base acima do mínimo legal, na primeira etapa, diante da existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Na segunda etapa indicou a incidência da circunstância agravante da reincidência, mas a inexistência de circunstâncias atenuantes capazes de incidir na pena. Chegado na terceira etapa, apontou a existência de causas de aumento da pena prevista no §1º do art. 342 do CP., e a inexistência de causas de diminuição da pena a serem consideradas. No que tange ao regime para início de cumprimento da reprimenda, recomendou o fechado e quanto ao cabimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito ou a suspensão condicional da pena, evidenciou serem incabíveis tais benefícios. Por fim, demandou a condenação do acusado ao pagamento de danos morais coletivos. A defesa, por sua vez, apresentou seus memoriais (seq. 64.1) e na oportunidade requereu: “(...) a) a absolvição do acusado conforme narrado nos itens 2.1 e 2.1; b) subsidiariamente, em caso de condenação: b.1. a fixação da pena base no mínimo legal, diante da inexistência de circunstâncias judiciais desfavoráveis; b.2. o reconhecimento da inconvencionalidade da circunstância judicial dos maus antecedentes e da circunstância agravante da reincidência; b.3. a fixação do regime semiaberto para cumprimento inicial da pena; c) a concessão dos benefícios da justiça gratuita e do pedido de isenção ao paga mento de custas e multas processuais (item 3); d) o indeferimento do pedido de fixação valor a título de danos morais coletivos (item 4).”. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos estão em ordem. Não há nulidade ou preliminar a serem consideradas, eis que se encontram presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Passo a analisar a materialidade e autoria do fato narrado na denúncia, bem como os elementos analíticos do delito. A materialidade do delito restou comprovada por meio da comunicação de procedimento investigatório criminal (seq. 1.1), portaria de instauração do procedimento investigatório criminal (seq. 1.3), pelo depoimento prestado pelo réu em Plenário do Tribunal do Júri nos autos nº 2307-25.2022.8.16.0101 (seq. 8.2), pelo interrogatório do réu prestado em Juízo nos autos nº 480-42.2023.8.16.0101 (mov. 8.8) e pelos depoimentos colhidos em fase processual. A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria do delito pelo réu, conforme passo a expor. O réu Hudson Junior Brant Goline foi intimado para esclarecer o fato em Juízo, mas não compareceu ao ato solene, tendo sido decretada sua revelia (seq. 56.1). Nos autos de ação penal nº 480-42.2023.8.16.0101 o acusado confessou a prática delitiva do falso testemunho, afirmando que assumiu o homicídio ora apurado por estar sendo ameaçado na penitenciária (seq. 8.8). Em suas palavras: “(...) Que sempre frequentava a casa do JOSÉ; Que são amigos; Que na data dos fatos foi até a casa de JOSÉ; Que lá todo mundo usa drogas, vai um monte de usuário lá; Que neste dia estava lá bebendo e usando drogas; Que a vítima já estava lá também, bebendo; Que chegou meio bêbado também; Que começou a discussão umas duas horas da manhã; Que a discussão começou na casa dele; Que a briga começou através do JOSÉ ROBERTO; Que a vítima que levou a facada foi para cima do réu também; Que ai lutaram, a briga foi feia; Que foi uma briga entre drogados na verdade; Que todos eram usuários de droga; Que JOSÉ ROBERTO bateu nele também deu umas pauladas nele também; Que a vítima estava com uma faca na mão; Que a vítima chegou a esfaquear o dedo do réu; Que para se defender, pegou a faca da vítima e a faca entrou nele; Que foi isso o que aconteceu; Que na casa estava o JOSÉ ROBERTO e os outros que não conhece {…}; Que essa história de droga não tem nada a ver; Que todos estavam usando droga; Que já chegou lá com droga {…}; Que nunca respondeu por homicídio. Eu pedi atenção do meu advogado pois estou sendo ameaçado aqui dentro por causa disso aí (ter assumido o homicídio no último júri). O cara que me arrolou como testemunha queria que eu assumisse algo que eu não fiz, eu tive que sair da cela que estava com ele porque ele me bateu. Eu pedi atenção de um dos senhores, eu queria sair disso aí. Estou sendo protegido pela polícia aqui dentro; (...)” (g.n.) Agora, vejamos que nos autos de Ação Penal nº 2307-25.2022.8.16.0101, em Plenário do Júri, o acusado prestou falso testemunho, assumindo indevidamente a autoria do delito apurado naquela ocasião (seq. 8.2): “(...) quem matou fui eu. Ele estava me devendo dinheiro de drogas e estava me ameaçando. Eu vim fazer meu papel de homem. Eu conheci através da Andreia. Posteriormente, encontrei Matheus depois que eu estava preso, e ele me falou que tinha caído preso, e eu falei que ia fazer meu papel de homem, não ia deixar ele ser incriminado por uma coisa que eu fiz. Sou de Marialva. A vítima comprava drogas minhas, eu não tinha um ponto certo, mas passava essas drogas lá. Eu estava de carro. Eu cheguei na cidade para cobrar uns que estavam me devendo, e eu sai depois atrás do Danilo, fiquei um pouco na cidade, e depois achei ele. Eu avistei ele e já desci do carro, ele já estava me ameaçando. Hoje eu estou vindo livremente falar, estou fazendo isso porque não posso prejudicar uma pessoa. A investigação não chegou a mim. Meu carro era vermelho bordô. Eu cometi o crime e fui para Cambira na casa do meu avô. Eu já conhecia Danilo. Fazia tempo que a vítima estava devendo para mim. Ele me ameaçava, falou de ameaçar minha filha, antes dele do que eu, antes a mulher dele chorar do que a minha. Minha prática criminosa era vender, mexia com carro e armas também. Estou preso por conta de uma tentativa de homicídio, essa tentativa eu não assumo. [Q: quantos homicídios o senhor já cometeu e assumiu?] R: esse vai ser o primeiro. A arma que eu usei para o crime era do Matheus, era uma nove milímetros. Eu peguei essa arma trinta dias ou quarenta dias antes de eu cometer o crime, eu mexia com esse negócio de armas, o Matheus estava vendendo o carro dele para mim e ofereceu a arma. O Matheus deixou a arma comigo, na minha confiança, e eu usei para o homicídio. Depois do homicídio eu entreguei a arma para ele três dias depois, mas não comentei sobre o homicídio com ele. Tenho condenações por 155. ” O informante Matheus Garcia da Silva, ao ser ouvido em juízo (seq. 55.1), relatou o seguinte: “(...) O que ele falou no júri é realmente aquilo lá, mas quero ver ele provar que eu ameacei ele. Eu não obriguei ele a ir ao júri e assumir a autoria do homicídio para me inocentar. Não tivemos desentendimentos depois do dia do júri. Quando estávamos na casa de custódia de Maringá não tivemos desentendimentos. ” Pois bem. Em Plenário do Júri, nos autos nº 2307-25.2022.8.16.0101, o acusado assumiu a autoria de um homicídio, apresentando uma narrativa detalhada dos supostos fatos, na qual afirmava ter matado a vítima por dívidas relacionadas ao tráfico de drogas, inclusive mencionando características do crime, como a arma utilizada e o motivo pessoal. Contudo, tal narrativa foi posteriormente desmentida pelo próprio réu, que, ao ser interrogado judicialmente nos autos nº 480-42.2023.8.16.0101, declarou que apenas assumiu a autoria do homicídio em razão de ameaças sofridas no ambiente carcerário, mais precisamente por parte de outro detento, o qual o teria coagido a isentar-se da responsabilidade do crime. Tais declarações, prestadas em juízo, reforçam a conclusão de que o réu praticou o crime de falso testemunho, ao mentir deliberadamente em Plenário do Júri, com o claro propósito de alterar a verdade dos fatos e beneficiar terceiros, falseando a realidade fática, para induzir o Conselho de Sentença a erro. O próprio acusado reconheceu a falsidade de suas declarações anteriores, ao afirmar que mentiu sob coação, revelando que sua intenção era inocentar outro réu e proteger sua integridade física diante das ameaças sofridas. O depoimento do informante Matheus também contribui para a elucidação dos fatos. Matheus negou ter ameaçado o acusado e afirmou que não houve desentendimentos após o julgamento. Sua fala, ao mesmo tempo em que busca negar a coação, não afasta a existência do falso testemunho, uma vez que o réu já havia admitido que faltou com a verdade no julgamento anterior, prestando uma versão inventada dos fatos, o que constitui, por si só, a consumação do delito previsto no art. 342 do Código Penal. Outro ponto que reforça a configuração do delito de falso testemunho é o fato de que, nos autos do Tribunal do Júri em que o acusado inicialmente assumiu a autoria do homicídio, o réu do processo em questão foi condenado pelo Conselho de Sentença (seq. 8.7), o qual deliberou expressamente o cometimento de falso testemunho pelo acusado Hudson Junior Brant Goline. Ou seja, os jurados, após ouvirem as versões apresentadas em plenário, inclusive a confissão falsa do ora acusado, entenderam que houve tentativa de induzi-los a erro por meio de um falso testemunho, o que foi registrado formalmente nos quesitos votados e acolhidos por maioria (seq. 8.4). Esse posicionamento do Conselho de Sentença revela não apenas a ineficácia da tentativa de manipulação do julgamento, mas também serve como elemento probatório adicional da falsidade das declarações prestadas pelo acusado. Ao reconhecerem que o verdadeiro réu buscou se beneficiar da falsa confissão do acusado, os jurados indicaram de forma implícita, mas inequívoca, que entenderam haver ali uma conduta dolosa e criminosa de alteração da verdade, corroborando o juízo condenatório ora proposto. Trata-se, portanto, de mais um dado objetivo que comprova que a mentira deliberadamente sustentada pelo acusado em plenário teve o potencial de influenciar a convicção dos jurados e, assim, comprometer a higidez do processo penal. Importa destacar que o crime de falso testemunho é formal e se consuma com a simples conduta de mentir ou calar a verdade como testemunha, perito, tradutor ou intérprete em processo judicial. No caso em análise, a confissão do acusado no processo posterior, aliada ao teor do seu depoimento no julgamento original e ao restante das provas produzidas, é suficiente para comprovar que houve efetiva alteração proposital da verdade com potencial de influenciar o desfecho da causa penal. Vejamos a jurisprudência: PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. FALSO TESTEMUNHO. PLEITO DE RESTABELECIMENTO DA CONDENAÇÃO. TIPICIDADE DE CONDUTA. CRIME DE NATUREZA FORMAL. DESNECESSIDADE DE REEXAME DO ARCABOUÇO FÁTICO-PROBATÓRIO. I - No caso, as condutas dos réus foram devidamente delineadas pela Corte de origem, sendo incontroversas, portanto, não sendo necessário o reexame das provas dos autos. II - Da leitura dos excertos do acórdão vergastado, verifico que o entendimento esposado pelo Tribunal de origem se encontra em desacordo com a orientação jurisprudencial desta eg. Corte Superior no sentido de que "o crime de falso testemunho é de natureza formal, consumando-se no momento da afirmação falsa a respeito de fato juridicamente relevante, aperfeiçoando-se quando encerrado o depoimento" (AgRg no REsp. n. 1.269.635/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 23/9/2013). Como constou da decisão agravada, é irrelevante aferir a eventual potencialidade lesiva do falso testemunho ou o seu grau de influência no convencimento do julgador do processo principal. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg nos EDcl no REsp: 1905647 SP 2020/0302091-9, Data de Julgamento: 07/02/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/02/2023) HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. CRIME DE FALSO TESTEMUNHO. TEORIA SUBJETIVA. MOMENTO CONSUMATIVO. DELITO FORMAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A falsidade necessária à configuração do crime tipificado no artigo 342 do Código Penal deve ser aferida do contraste entre o depoimento prestado e a ciência da testemunha de que as informações por ela expostas não coadunam com o conhecimento dos fatos de que é possuidora (teoria subjetiva). 3. "O crime de falso testemunho é de natureza formal, consumando-se no momento da afirmação falsa a respeito de fato juridicamente relevante, aperfeiçoando-se quando encerrado o depoimento" (AgRg no REsp. n. 1.269 .635/MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, 23/9/2013). 4. Habeas corpus não conhecido. (STJ - HC: 315456 SP 2015/0022078-1, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 01/09/2016, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/09/2016) Ainda, a conduta do acusado se amolda perfeitamente à hipótese prevista no §1º do art. 342 do Código Penal, uma vez que o falso testemunho foi prestado com o claro objetivo de produzir prova destinada a influenciar o resultado de processo penal. Ao assumir falsamente a autoria de um homicídio em sede de julgamento perante o Tribunal do Júri, o réu buscou deliberadamente beneficiar o verdadeiro autor do crime, tentando afastar a responsabilidade penal deste e induzir o Conselho de Sentença a erro. Trata-se de situação em que o falso testemunho foi utilizado como instrumento de manipulação da verdade dos fatos em um processo penal em curso, razão pela qual é cabível o aumento de pena previsto no dispositivo legal mencionado. Ademais, não há nos autos nenhum indício de que o réu tenha agido sob erro ou ignorância quanto à veracidade dos fatos declarados, tampouco se identifica circunstância que justifique sua conduta, afastando qualquer excludente de culpabilidade ou ilicitude. Ao contrário, fica evidente que o réu agiu de forma consciente e voluntária, com pleno conhecimento da falsidade das informações que prestava. A alegação posterior de que foi coagido não ficou comprovada nos autos. A defesa não foi capaz de comprovar que o réu estava sob ameaça, coação ou estado de necessidade, ônus que lhe cabia (CP., art. 156). A alegação defensiva de que a ausência de instauração de inquérito policial comprometeria a validade da persecução penal não merece prosperar. O inquérito policial possui natureza meramente informativa, sendo sua instauração prescindível quando o titular da ação penal dispõe de elementos suficientes para o oferecimento da denúncia. Havendo substrato mínimo de autoria e materialidade nos autos, a formalidade do inquérito pode ser dispensada, sem que isso implique nulidade ou afaste a legitimidade da ação penal. Portanto, a suficiência probatória para o prosseguimento da ação penal independe da existência de investigação formalizada por inquérito policial, bastando que os elementos constantes dos autos demonstrem de forma razoável a plausibilidade da acusação. Vejamos o que diz o STJ: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIMES DO ART. 334-A, § 1º, II E IV, DO CÓDIGO PENAL, E ART. 56, CAPUT, DA LEI N. 9.605/1998. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. INQUÉRITO POLICIAL. CONCLUSÃO. PRESCINDIBILIDADE. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL . ALEGADA AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE. EXISTÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. I - O trancamento da ação penal constitui medida excepcional, justificada apenas quando comprovadas, de plano, sem necessidade de análise aprofundada de fatos e provas, a atipicidade da conduta, a presença de causa de extinção de punibilidade, ou a ausência de indícios mínimos de autoria ou prova de materialidade. Precedentes. II - É entendimento assente nesta Corte de Justiça que o inquérito policial serve, precipuamente, para a colheita de elementos informativos para subsidiar o Parquet no oferecimento da denúncia. Se o titular da ação penal dispõe de substrato mínimo necessário para iniciar a persecução penal em documentos diversos, o inquérito policial se mostra dispensável, não havendo nulidade no oferecimento da inicial acusatória, antes de concluído o procedimento investigatório. III - A propositura da ação penal exige tão somente a presença de indícios mínimos e suficientes de autoria, não sendo exigida a certeza, que somente será comprovada ou afastada durante a instrução probatória, prevalecendo, na fase de oferecimento da denúncia o princípio in dubio pro societate. IV - Considerando que o laudo pericial de química forense, concluído após o oferecimento da denúncia, atestou que "o material apreendido é de composição compatível com gasolina venezuelana", corroborando a existência de indícios da prática do crime de contrabando de combustível, afasta-se a alegação de ausência de indícios necessários para a instauração da ação penal. Recurso ordinário desprovido. (STJ - RHC: XXXXX RR XXXXX/XXXXX-7, Relator.: Ministro FELIX FISCHER, Data de Julgamento: 16/10/2018, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/10/2018) A conduta perpetrada pelo acusado, portanto, se subsome perfeitamente à norma abstratamente prevista no artigo 342, § 1º, do Código Penal. O réu agiu com dolo, com plena consciência de que sua conduta era ilícita. Não há causas nos autos capazes de excluir a ilicitude da conduta ou mesmo a culpabilidade desta. Ao tempo dos fatos o réu era maior de idade e dele era esperada conduta totalmente diversa da praticada. A conduta praticada pelo réu, portanto, manifesta-se típica, antijurídica e culpável, sendo merecedor de reprimenda estatal. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado para o fim de CONDENAR o réu HUDSON JUNIOR BRANT GOLINE como incurso nas sanções do artigo 342, § 1º, do Código Penal. Condeno o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. Deixo de analisar o pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita por não ser esse o Juízo competente para tanto. Senão vejamos: PENAL E PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. PRELIMINARES. 1) PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. NÃO CONHECIMENTO. 2) SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REVISÃO CRIMINAL SEM EFEITO SUSPENSIVO. REJEITADA. 3) PRISÃO DOMICILIAR. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. NÃO CONHECIMENTO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DIANTE DE DEPOIMENTO COMPROVADAMENTE FALSO (ART. 621, INC. II, DO CPP). IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS DA ALEGAÇÃO. 01. Condenado à pena de 12 (doze) anos de reclusão em regime fechado, pela prática do crime previsto no art. 217-A, c/c art. 226, inciso II, todos do Código Penal Brasileiro (CPB). 02. Inicialmente, quanto ao pedido de isenção de custas processuais com concessão da justiça gratuita, tem-se que sua análise compete ao juízo das execuções, não devendo o pleito ser conhecido por este e. Tribunal. (...). (TJCE; RevCr 0620002-02.2020.8.06.0000; Seção Criminal; Rel. Des. Mário Parente Teófilo Neto; DJCE 08/07/2020; Pág. 197). (g.n.) 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade do sentenciado – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se proporcional à espécie. O sentenciado, nos moldes de Súmula nº. 444 do STJ[1], registra antecedentes criminais (seq. 57.1), pois foi condenado nos autos nº 0026084-97.2022.8.16.0017 por delito cometido em 10/12/2022 e transitado em julgado em 10/12/2024. Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e conduta social[2]. Os motivos dos crimes foram comuns à espécie delitiva em apreço. As circunstâncias do crime não prejudicam o sentenciado. As consequências do crime não merecem majoração. O comportamento da vítima não contribuiu para a prática do fato, filiando-se ao entendimento de que esta circunstância somente pode ser valorada para amenizar a situação do sentenciado (STJ, AgRg no REsp 1245072, DJe 28/05/2013). Assim, tenho por desinfluente ao caso. 4.2. Pena-Base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, em especial, os antecedentes criminais, fixo a pena-base em 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 27 dias-multa, equivalente a aproximadamente 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre a pena máxima e mínima cominada ao delito. 4.3. Circunstâncias legais Incide a circunstância agravante da reincidência (CP., art. 61, inc. I), pois o sentenciado registra diversas condenações, tratando-se de acusado multirreincidente. Seguem algumas de suas condenações anteriores: autos de AP nº. 0003617-11.2014.8.16.0113, por fato ocorrido em 06/09/2014 e trânsito em julgado em 09/03/2020, autos nº 0003661-30.2014.8.16.0113 por delito praticado em 30/08/2014 e trânsito em julgado em 29/08/2019, autos nº 0001178-90.2015.8.16.0113 por fato ocorrido em 11/02/2015 e trânsito em julgado em 08/02/2019 (seq. 100.1) e autos nº 0001738-32.2015.8.16.0113 por delito praticado em 23/06/2012 e trânsito em julgado em 17/07/2019. Não incidem circunstâncias atenuantes. Diante disso, agravo a pena do sentenciado em 1/6. 4.4. Causas de aumento e diminuição da pena Configurada a causa de aumento de pena esculpida no artigo 342, §1º, do Código Penal, eis que o delito foi cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, motivo pelo qual aumento a pena em 1/6. Inexistem causas de diminuição a serem consideradas, previstas na parte geral ou especial do Código Penal. 4.5. Pena definitiva Obedecidos aos parâmetros dispostos no artigo 68 do Código Penal, o sentenciado fica definitivamente condenado à pena de 03 ANOS E 22 DIAS DE RECLUSÃO E 37 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 do salário mínimo em virtude de informação acerca de sua atual condição financeira. 4.6. Regime de cumprimento da pena e detração Assim, em vista da quantidade da pena aplicada, das circunstâncias judiciais, da multirreincidência do sentenciado, do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo o REGIME FECHADO[3] para início de cumprimento da reprimenda, com fundamento no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 35 do mesmo diploma legal. 4.7. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal (inc. I, II e III), assim como a concessão da suspensão condicional da pena (CP., art. 77, inc. I e II), pois o sentenciado não preenche os requisitos subjetivos e objetivos para tanto. 5. DELIBERAÇÕES FINAIS 5.1. Da prisão preventiva e das medidas cautelares diversas da prisão Não estão presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva (CP., art. 312 e ss. e CPP., art. 387, § 1º), em razão de ter o sentenciado respondido a todo o processo em liberdade. Desnecessária, igualmente, a imposição de medidas cautelares diversas da prisão (CPP., art. 319), por assim justificarem as circunstâncias judiciais do sentenciado e em vista da gravidade do delito. 5.2. Destinação dos bens apreendidos e da fiança Não há bens apreendidos ou fiança recolhida nos autos. 5.4. Reparação de danos Em que pese a existência de pedido de fixação de danos morais causados pela infração, deduzido na vestibular acusatória e reforçado em alegação finais apresentadas pelo Ministério Público, não há como acolher a referida pretensão, razão pela qual deixo de fixa-los (CPP., art. 387, inc. IV). Explico. É cediço que o dano moral coletivo se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e desde que fique demonstrado que a conduta agride, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva, dispensando-se a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. No caso concreto pudemos vislumbrar que o sentenciado prestou falso testemunho e as circunstâncias dos delitos não foram anormais ou desconexas daquilo que se é considerado habitual nesta espécie delitiva, além de não ter influenciado negativamente os jurados no julgamento da causa. Diante disso, verifica-se que não há elementos que permitam dizer que a conduta do sentenciado tenha atributos de gravidade e intolerabilidade exacerbadas, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. Acerca do tema, colho os seguintes escólios jurisprudenciais: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO - ABSOLVIÇÃO NA ORIGEM - RECURSO MINISTERIAL - PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÃO NECESSÁRIA - PROVAS SUFICIENTES - POSSE DE MUNIÇÕES - CRIME MATERIALMENTE TÍPICO - MUNIÇÕES DE CALIBRE 9MM - USO PERMITIDO - DESCLASSIFICAÇÃO - MINORANTE DO TRÁFICO - NÃO CABIMENTO - REGIME ABERTO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - DESCABIMENTO - DANOS MORAIS COLETIVOS - FIXAÇÃO - INVIABILIDADE. 1. No caso de o telefone ser apreendido durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, em que há autorização judicial prévia para a prospecção de bens de interesse criminalístico, não há óbice para se acessar o seu conteúdo já armazenado, porquanto necessário às investigações, sendo prescindível nova autorização judicial para análise dos dados neles constantes. 2. Comprovado que as drogas e as munições apreendidas eram de propriedade dos réus, e que os entorpecentes não se destinavam unicamente ao consumo pessoal, deve ser a sentença absolutória reformada, para condenação de ambos pelos crimes previstos no art. 33 da Lei 11.343/06 e no Estatuto do Desarmamento. 3. Os acusados devem ser condenados também pelo delito descrito no art. 35 da Lei 11.343/06, na medida em que suficientemente comprovado o efetivo vínculo associativo entre eles, voltado à prática da traficância, e não apenas a existência de mero concurso de pessoas. 4. O delito de posse ilegal de munições é crime de mera conduta e de perigo abstrato, sendo bastante para a sua caracterização a simples prática de uma das condutas previstas no tipo penal, sem necessidade da efetiva exposição de outrem a risco, o qual é presumido. 5. Tendo em vista que as munições 9mm passaram a ser de calibre permitido, consoante Decreto 9.847, de 25 de junho de 2019 e Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, faz-se necessária a rec lassificação benéfica e condenação dos acusados pelo crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03 (e não no art. 16 da mesma lei). 6. Integrando os agentes organização criminosa e, ainda, sendo um deles reincidente, inviável a aplicação da causa de diminuição descrita no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 7. Fixadas as penas corporais em patamares acima de 04 (quatro) anos, não se mostra possível a fixação do regime prisional aberto, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. 8. Embora o sujeito passivo dos delitos em espécie seja a coletividade, ante a ausência de dispositivo legal de exata correlação, para efeitos penais, a falta de determinação e individualização da pessoa do ofendido (a que se refere o artigo 387, IV, CPP), afasta o cabimento da fixação, pelo juízo criminal, dos danos morais (coletivos) causados pelos réus. V.V. 1. Se os indícios que balizam o envolvimento de um dos recorrentes com substâncias entorpecentes e munição não restaram confirmados no decorrer da instrução probatória, ante a inexistência de prova suficiente a fundamentar um decreto condenatório, a absolvição daquele é medida que se impõe, notadamente em observância ao princípio "in dubio pro reo". 2. Não havendo provas suficientes a demonstrar a existência de uma estrutura permanente e organizada dedicada à venda de drogas, não resta configurado o crime disposto no artigo 35 da Lei Antidrogas. (TJ-MG - APR: 10687190008320001 Timóteo, Relator: Paulo Calmon Nogueira da Gama, Data de Julgamento: 22/09/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 24/09/2021). (g.n.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. ESTACIONAR VEÍCULO EM VAGA RESERVADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INFRINGÊNCIA A VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE OU ATRIBUTOS DA GRAVIDADE E INTOLERABILIDADE. MERA INFRINGÊNCIA À LEI DE TRÂNSITO. I - Na origem, trata-se de ação civil pública visando à condenação do réu, condutor de veículo automotor, ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência. II - A ação foi extinta, sem resolução de mérito, em razão da falta de interesse processual e ausência de respaldo legal para a pretensão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, manteve a sentença. III - O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano, independente de atributos da pessoa humana (dor, sofrimento etc.), e que se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e fique demonstrado que a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva. Preenchidos esses requisitos, o dano configura-se in re ipsa, dispensando, portanto, a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. IV - No caso, o pedido veiculado na exordial é de condenação do réu condutor de veículo automotor ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência; ausentes peculiaridades do caso, como reincidência ou maior desvalor na conduta da pessoa natural. Em casos tais, esta Segunda Turma não tem acolhido a pretensão condenatória, considerando a ausência de elementos que, não obstante a relevância da tutela coletiva dos direitos da pessoa com deficiência ou idosa, evidenciem que a conduta agrida, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade. Precedentes: AgInt no AREsp 1826143/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1/10/2021; AgInt no AREsp 1820258/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021; AgInt no AREsp 1758510/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021. V - Assim, na hipótese em exame, não há como afastar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a conduta em tela tenha infringido valores fundamentais da sociedade ou que possua atributos da gravidade e intolerabilidade. O caso trata, pois, de mera infringência à lei de trânsito, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. A propósito: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018. VI - Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (STJ - AREsp: 1927324 SP 2021/0199195-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022). (g.n.) Com base no exposto, inviável a condenação do sentenciado ao pagamento de danos morais coletivos. 5.5. Intimação da vítima Não há vítima individual no delito. 5.6. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 1) procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 824, inciso VIII, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 2) expeça-se e remeta-se a guia de execução definitiva do réu condenado, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso o réu não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formará autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios à vara que estiver procedendo à execução (Resolução nº. 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 3) remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo das custas e da pena de multa; 4) intime-se o sentenciado para o recolhimento dos valores das custas processuais e da pena de multa devidas, no prazo de 10 (dez) dias, acompanhado o mandado das respectivas guias (Instrução Normativa nº 65/2021, arts. 1º e 2º, observadas as alterações promovidas pela IN nº. 77/2021); 5) comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. João Gustavo Rodrigues Stolsis Juiz de Direito [1] Súmula nº. 444 do STJ: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. [2] Informativo 702 – Tema Repetitivo nº. 1077: “Condenações criminais transitadas em julgado, não utilizadas para caracterizar a reincidência, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente” (STJ. REsp 1.794.854-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021). [3] Súmula nº. 440 do STJ: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”.

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Ministério Público Do Estado Do Paraná x Jurandir Alves De Lima

ID: 323891897

Tribunal: TJPR Órgão: Juizado Especial Criminal de Jandaia do Sul Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0002741-77.2023.8.16.0101

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

MINISTéRIO PúBLICO DO ESTADO DO PARANá

Polo Passivo:

JURANDIR ALVES DE LIMA

Conclusão

Advogados:

JULIO CEZAR DE OLIVEIRA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Clementino S. Puppi, 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fon… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Clementino S. Puppi, 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0002741-77.2023.8.16.0101 Processo: 0002741-77.2023.8.16.0101 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Sumaríssimo Assunto Principal: Outros Atos Contra o Meio Ambiente Data da Infração: 21/07/2022 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): A JUSTIÇA PUBLICA Réu(s): JURANDIR ALVES DE LIMA SENTENÇA 1. RELATÓRIO O relatório é dispensável (Lei nº. 9.099/1995, art. 81, § 3º). 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos estão em ordem. Não há nulidade ou qualquer preliminar a ser considerada com relação ao acusado, eis que se encontram presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Passo a analisar a materialidade e autoria dos fatos narrados na denúncia, bem como, os elementos analíticos do delito. Narra a proemial acusatória que no dia 21 de julho de 2022, por volta das 10h15min, na Rua Maria Tereza, s/n, Centro, na cidade de São Pedro do Ivaí, Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado JURANDIR ALVES DE LIMA, agindo com consciência e vontade, fez funcionar, em parte de território nacional, serviço potencialmente poluidor, consistente no depósito de produtos perigosos, disposição incorreta de resíduos sólidos de diversas classes, gerando a possibilidade de ocasionar proliferação de vetores, vazamento de óleos e graxas, geração e vazamento de chorume, poluição por metais pesados e agrotóxicos, sem autorização dos órgãos ambientais competentes1 (cf. auto de infração ambiental n. 132214 – mov. 1.2). A materialidade do delito consubstancia-se no auto de infração ambiental n. 132214 (seq. 1.2), Relatório Conclusivo de Infração Ambiental (seq. 1.7) e relatório fotográfico (seq. 1.4/5/6). A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria delitiva, conforme passo a expor. O réu JURANDIR ALVES DE LIMA foi interrogado em Juízo (seq. 118.4), ocasião em que negou a prática delitiva, afirmando que os fatos que lhe são desfavoráveis não ocorreram da forma narrada na denúncia, apresentado, então, a sua versão dos fatos. Em suas palavras: “(…) que os fatos não como estão relatando. Que não havia pessoas trabalhando para ele. Que o material que estava na calçada estava ali para ser retirado. Que não havia mau cheiro. Que havia somente material reciclável e ferro. Que não havia agrotóxicos, bateria e etc. que não havia material derramado no chão. Que não havia licença (...)”. A testemunha MAURÍLLIO VILLA, agente do Instituto Água e Terra, foi ouvido em fase processual (seq. 118.3) e, na ocasião, asseverou: “(...) que estiveram no barracão para atender uma denúncia. Que o local estava cheio de entulhos, de material não reciclável de um senhor que estava causando uma poluição muito grande ali. Que havia muita reclamação de que havia muita rato, barata dentro desse barracão e os vizinhos e o próprio município também já estava preocupado com isso. Que fizeram a autuação porque ele não tinha autorização para instalar lá a empresa desse tipo de material (...); que era localizado na área urbana (...); que tinha de tudo lá, bateria, tambor de óleo, vários materiais que não poderiam estar ali(...); que tivemos informações dos vizinhos (...); que tinha cheiro forte; que quase não conseguiu entrar lá dentro porque o cheiro era muito forte. Que, para quem trabalhava lá dentro lá, era um trabalho insalubre (...); o Mateus estava junto e, se não me falha a memória, a Glauce; então, quem fez as fotos foram eles? Sim; Acompanhei a foto; Certo. Tudo o que tinha lá foi fotografado? sim. Tudo que tinha. Você não, não filmou, não foi filmagem, né? Foi foto, né? De repente você não pega tudo (...); quando tem esses produtos, por exemplo, um tambor ou alguma coisa, vocês fazem foto também? Fazemos, sim, quando ele está... Fazemos fotos; então, ele tem que estar bem acondicionado, né? Tem que estar em tambor, esse tambor tem que estar, tem que ter um piso adequado para que ele, para que ele não possa contaminar o solo (...)”. Neste mesmo sentido foi o relato do técnico do Instituto Água e Terra MATHEUS MEINCHEIM GODINHO quando de sua inquirição em fase instrutória (seq. 118.2). Reparem: “(...) que era residente do IAT na época dos fatos. Que foi uma denúncia interna. Que foi acompanhar a vistoria junto ao técnico. Que tinha muito lixo no galpão. Que Jurandir estava lá junto com alguns moradores de rua. Que Jurandir não tinha licença para a atividade. Que autuaram Jurandir. Que tinha muito resíduo de diversos tipos. Que tinha bateria, pneu, entre outros. Que não se lembra se constatou algum vazamento (…); que era uma área urbana, bem no meio da cidade (…); que se lembra da grande quantidade de resíduos dentro do galpão(...); que ele e a Glaucia fizeram as fotos do local; que no local tinha ferragens, pneus e recicláveis (...)” (g.n.) Por fim, a testemunha GLAUCIA CRISTINA FELDHAUS, agente do Instituto Água e Terra, ao ser ouvida em audiência de caráter instrutório (seq. 118.3), relatou que: “(...) A gente recebeu a denúncia se deslocou para São Pedro do Ivaí. Que chegando lá, a gente realmente viu que tinha muita disposição de resíduos dentro da área urbana. Que inclusive dentro de, se não me engano, acho que eram dois barracões que não tinha nem possibilidade de entrar, de tanto lixo que estava acumulado, e também tinha pro lado de fora (…); que vimos vários resíduos. Que ali não é o local apropriado. Que o correto, na verdade, era o município recolher aquele resíduo e encaminhar pro transbordo, para reciclagem. Que o réu, como pessoa autônoma, estava recolhendo esse lixo e estava depositando naqueles barracões. Que vimos algumas embalagens de óleo usado, de bateria, restos de material reciclagem, eu não me lembro bem porque já faz três anos, mas eu me lembro de algumas coisas (...); que era uma grande quantidade de resíduos que os barracões não comportavam, e que estavam sendo alojados na parte de fora. Que esse acúmulo aumenta a circulação de rato, barata e tudo mais (...); eu entendo que o que a gente constatou talvez já possa considerar como algum tipo de impacto, porque daí ele traz risco à saúde pública, né? E aí a lei de crimes ambientais, a política também trata disso, né? (...); óleo, graxa, metais pesados, agrotóxico, você viu depositado no chão ali? Embalagens de óleo usado eu lembro de ter visto sim (...); então, tinha um barracão do lado direito e um do lado esquerdo. Se não me engano, o que eu vi a bateria era do lado direito. E ela, acho que estava para o lado de fora. Já as embalagens de óleo usado estavam para o lado de dentro do barracão. Não, não me lembro mesmo. Eu bem que gostaria de lembrar com exatidão. Até porque nem fui eu que tirei as fotos.” (g.n.) Compulsando os autos verifica-se que, em atendimento a diversas denúncias recebidas, a equipe do Instituto Água e Terra deslocou-se até o local onde situava o galpão do réu, onde supostamente ocorria atividade potencialmente poluidora, consistente no acúmulo de resíduos em área urbana, sem a devida autorização por órgãos ambientais competentes. Em decorrência do fato, a equipe do Instituto realizou vistoria na aludida propriedade e constatou que o local era um galpão, de ambiente totalmente insalubre, situada dentro do perímetro urbano – em meio a diversas residências – e sem qualquer estrutura para comportar as exigências que a atividade demanda. De acordo com o auto de infração ambiental (seq. 1.2) e com o relatório fotográfico (seq. 1.4/5/6), constatou-se a presença de diversos dejetos poluentes no local, configurando depósito de materiais recicláveis e de produtos perigosos – inclusive chegando até a via pública por falta de espaço –, além de automóveis de propriedade do réu estarem estacionados na via pública, carregados com esses materiais. A prova contida nos autos evidencia a autoria delituosa por parte do acusado ao armazenar resíduos potencialmente poluidores, sem autorização e sem a adoção das cautelas devidas, podendo ter causado a contaminação do solo, do ar e da água. Sobre este ponto, conveniente frisar que o delito plasmado no artigo 60 da Lei nº. 9.605/1998[1] é de mera conduta e de perigo abstrato, isto é, não demanda resultado naturalístico para que reste configurado. Em outras palavras, a prova da poluição para que a conduta do agente seja enquadrada na referida espécie delituosa é prescindível, bastando que seja exercida a atividade ao arrepio da lei, sem a devida licença ambiental para tanto. O Superior Tribunal de Justiça, através de sua 5ª Turma, quando do julgamento do Recurso em Habeas Corpus nº. 89.461/AM em 17.05.2018, já se manifestou neste sentido: “(...) VII – O crime previsto no art. 60 da Lei n. 9.605/98 é de perigo abstrato, do qual não se exige prova do dano ambiental, sendo certo que a conduta ilícita se configura com a mera inobservância ou descumprimento da norma, pois o dispositivo em questão pune a conduta do agente que pratica atividades potencialmente poluidoras, sem licença ambiental”. Nesta mesma esteira: EMENTA PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 60 DA LEI 9.605/98. FAZER FUNCIONAR SERVIÇOS POTENCIALMENTE POLUIDORES, CONTRARIANDO AS NORMAS LEGAIS E REGULAMENTARES PERTINENTES. DESPEJO DE ESGOTO DIRETAMENTE NO RIO URUGUAI. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. AFASTADA A TESE DEFENSIVA DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. 1. O delito tipificado no art. 60 da Lei nº 9.605/98 é de ação múltipla, com caráter permanente, em especial no que toca à ação de "fazer funcionar", além do que também é considerado crime de perigo, dizendo respeito à atividade potencialmente poluidora, ou seja, suscetível de causar poluição, sem a devida licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou ainda, contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes, e cujo escopo é a proteção do meio ambiente. 2. Em se tratando de crime de mera conduta, independe da ocorrência de resultado naturalístico para sua configuração. 3. Não é demais mencionar que o art. 225 da CRFB/88 eleva à proteção ambiental o direito de todos "ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". Nesse contexto, tem-se que o conjunto normativo ambiental, para quaisquer empreendimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, deve ser rigorosamente cumprido, mostrando-se imprescindível, portanto, tanto a outorga de direito de uso dos recursos hídricos quanto o licenciamento ambiental. 4. Também resta afastada a alegação de que as soluções de esgoto sanitário eram de incumbência dos próprios moradores, pois, a partir do momento em que a CORSAN assumiu o sistema de águas do município de Iraí, atraiu para si a responsabilidade tanto do abastecimento como do sistema sanitário de esgoto. Nesse sentido, inclusive, foram as declarações do preposto da ré em audiência. 5. No que tange ao dolo, o contexto fático-probatório é robusto e seguro em apontar que a estatal tinha pleno conhecimento da necessidade da outorga e licença ambiental, além de se tratar de informação que poderia alcançar. Situação que ficou evidenciada na medida em que verificado que a Companhia de Saneamento já havia requerido e obtido da Agência Nacional de Águas outras outorgas do uso de recursos hídricos, inclusive para lançamento de efluentes no Rio Uruguai, como foi o caso no município de São Borja/RS (1-OUT6, fl. 58). 6. Houve, portanto, dolo, considerando que a ré tinha consciência da conduta que praticava e vontade para alcançar o fim pretendido. 7. Sendo assim, estando comprovadas a materialidade e a autoria delitiva, não havendo causa que exclua o crime ou isente a ré de pena, impõe-se a condenação da acusada. 8. Em se tratando de fato típico, antijurídico e culpável (com os devidos ajustes por ser pessoa jurídica), a ré deve ser condenada nas penas do art. 60 da Lei 9.605/98. 9. Por fim, com relação à dosimetria da pena, a defesa pede o afastamento da agravante prevista no art. 15, II, p, da Lei 9.605/98, sob argumento de que a CORSAN não se constitui em pessoa jurídica mantida por verbas públicas. 10. O argumento não se sustenta. A CORSAN é sociedade de economia, sendo, portanto, constituída em parte de capital público. Assim, correto o reconhecimento da circunstância agravante, de modo que o apelo da ré merece desprovimento. (TRF-4 - ACR: 50000398620184047127 RS 5000039-86.2018.4.04.7127, Relator: ANDREI PITTEN VELLOSO, Data de Julgamento: 28/01/2020, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS). (g.n.) JECrime - CRIME AMBIENTAL - ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA - FALTA LICENÇA - ART. 60, LEI FEDERAL N. 9.605/98 - CRIME DE PERIGO - CONDENAÇÃO. 1- O crime do art. 60 da Lei Federal n. 9.605/98 é crime formal de mera conduta não exigindo para a sua configuração resultado efetivo. 2- Custas de lei. (TJSC, Apelação n. 0015004-88.2015.8.24.0008, de Blumenau, rel. Emanuel Schenkel do Amaral e Silva, Segunda Turma de Recursos - Blumenau, j. 14-11-2017). (TJ-SC - Apelação: 0015004-88.2015.8.24.0008, Relator: Emanuel Schenkel do Amaral e Silva, Data de Julgamento: 14/11/2017, Segunda Turma de Recursos - Blumenau). (g.n.) Ademais, é tipo penal em branco heterogêneo, porquanto necessita de complementação para maiores esclarecimentos acerca do que seriam consideradas obras ou serviços potencialmente poluidores e tal resposta está sedimentada em normativas emitidas pelos órgãos ambientais competentes[2]. No caso em testilha a complementação normativa está encartada nas Resoluções do CONSEMA (nº. 01/2004) e na do CONAMA (nº. 237/1997), bem como no Decreto nº. 99.274/1990 e nas Leis nº. 6.938/1981 e 12.651/2012 (Código Florestal), as quais dispõem, também, sobre os trâmites indispensáveis para o exercício de atividades potencialmente poluidoras. Importa destacar que o art. 5º da Lei da Estadual n. 12.493 /1999 dispõe que os resíduos devem ser acondicionados em local adequado e destinados em conformidade com as exigências do IAT. In Verbis: “Art. 5 Os resíduos sólidos deverão sofrer acondicionamento, transporte, tratamento e disposição final adequados, atendendo as normas aplicáveis da Associação Brasileira de Normas Técnicas-ABNT e as condições, respeitadas as demais estabelecidas pelo Instituto Ambiental do Paraná-IAP normas legais vigentes." Da conduta perpetrada pelo acusado conclui-se não remanescer dúvida quanto à configuração da espécie delitiva em apreço. Isso porque o plexo probatório é farto e possui o condão de demonstrar que o réu fez funcionar, em parte do território nacional, estabelecimento potencialmente poluidor, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, traduzido nos depoimentos harmônicos e coesos dos agentes e nas várias fotografias que ilustram o feito. Oportuno ponderar que o depoimento dos agentes ambientais constituem meio probatório idôneo para o fim do deslinde da criminalidade. E no mais não existem elementos que gerem descrédito ou suspeitas em suas alegações. Em abono: APELAÇÃO CRIME – CRIME AMBIENTAL – ARTIGO 56, CAPUT, DA LEI Nº. 9.605/98 – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA. 1) PLEITO ABSOLUTÓRIO, ANTE A AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL – DESPROVIMENTO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADA – CONFISSÃO DO APELANTE QUE NÃO SE MOSTRA ISOLADA NOS AUTOS – PALAVRA TESTEMUNHAL (FISCAL ESTADUAL) QUE CONFIRMA A PRÁTICA DELITIVA – VALIDADE – MEIO IDÔNEO DE PROVA – PRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA – CRIME DE PERIGO ABSTRATO – PRECEDENTES DESTA CORTE ALIADO AO ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – CONDENAÇÃO MANTIDA. 2) PLEITO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – DESPROVIMENTO – CRIME FORMAL E DE PERIGO ABSTRATO - RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM DELITOS AMBIENTAIS QUE DEVE OCORRER DE FORMA CAUTELOSA E EXCEPCIONAL, ESPECIALMENTE POR SE TRATAR A PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE DE DIREITO FUNDAMENTAL CONFERIDO À COLETIVIDADE. 3) DOSIMETRIA – PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA DEFINITIVA PARA O MÍNIMO LEGAL – DESPROVIMENTO – APELANTE QUE, EM JUÍZO, AFIRMA QUE COMPRAVA SULFATO DE COBRA, COLOCAVA EM EMBALAGENS E VENDIA – OBTENÇÃO DE VANTAGEM FINANCEIRA DEVIDAMENTE DEMONSTRADA – INCIDÊNCIA DA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 15, INCISO II, ALÍNEA ‘A’, DA LEI DE CRIME AMBIENTAIS QUE SE IMPÕE – MANUTENÇÃO DA PENA DEFINITIVA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0002037-10.2018.8.16.0111 - Manoel Ribas - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU MAURO BLEY PEREIRA JUNIOR - J. 08.02.2021) (g.n.) Sobre a alegação de que não há laudo pericial do dano ambiental, consigna-se que o referido meio de prova se torna prescindível quando há outras que suprem a sua falta, o que é o caso dos autos. A jurisprudência já se manifestou neste sentido: APELAÇÃO CRIME – CRIME AMBIENTAL – ARTIGO 38-A, DA LEI Nº. 9.605/98 – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA. 1) PLEITO ABSOLUTÓRIO, ANTE A AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL – DESPROVIMENTO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADA – DEPOIMENTO TESTEMUNHAL (POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL) QUE CONFIRMA A PRÁTICA DELITIVA – VALIDADE – MEIO IDÔNEO DE PROVA – PRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA – BOLETIM DE OCORRÊNCIA, FOTOGRAFIAS E DEMAIS DOCUMENTOS, QUE SUPREM A NECESSIDADE DE LAUDO – PRECEDENTES DESTA CORTE - CONDENAÇÃO MANTIDA - 2) DOSIMETRIA – PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL RELATIVA À CULPABILIDADE – PROVIMENTO – FUNDAMENTAÇÃO UTILIZADA PELO JUÍZO DE ORIGEM QUE MOSTRA-SE INERENTE AO TIPO PENAL – NECESSIDADE DE REFORMA – PENA RECALCULADA – PENA FIXADA EM SEU MÍNIMO LEGAL - 3) REGIME – JUÍZO DE ORIGEM QUE FIXOU O REGIME INICIAL SEMIABERTO, TENDO EM VISTA A PRESENÇA DE 01 (UMA) CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL – NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO, ANTE O AFASTAMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL RELATIVA À CULPABILIDADE – FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL ABERTO - 4) PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS - EM RAZÃO DA FIXAÇÃO DA PENA NO MÍNIMO LEGAL, MANUTENÇÃO DA PENA RESTRITIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E REFORMA DA SENTENÇA PARA EXCLUIR A PENA RESTRITIVA DE DIREITO CONSISTENTE EM PRESTAÇÃO PECUNIÁRIARECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0000693-74.2018.8.16.0149 - Salto do Lontra - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU MAURO BLEY PEREIRA JUNIOR - J. 14.10.2021). (g.n.) APELAÇÃO CRIME. CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO DELITO PREVISTO NO ARTIGO 38-A DA LEI 9.605/98. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS PELO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRESCINDIBILIDADE DO LAUDO PERICIAL. OCORRÊNCIA DO DELITO COMPROVADA PELOS DOCUMENTOS ASSINADOS PELA POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL E CORROBORADOS PELA PROVA TESTEMUNHAL E PELA CONFISSÃO DO ACUSADO. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE CULPOSA. IMPOSSIBILIDADE. DOLO DEMONSTRADO. REDUÇÃO, DE OFÍCIO, DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO PARA JUSTIFICAR O ARBITRAMENTO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0002442-69.2017.8.16.0147 - Rio Branco do Sul - Rel.: DESEMBARGADOR MARIO HELTON JORGE - J. 04.10.2021). (g.n.) A prova material do delito, como já mencionado, se encontra ancorada no auto de infração ambiental e relatório fotográfico lavrados pelos agentes do Instituto, que se somam aos depoimentos testemunhais acima transcritos, o que afasta a pretensão defensiva de absolvição por ausência de provas. Não obstante, ainda que se trate de um tipo penal classificado como de mera conduta e de perigo abstrato, isso não significa que a poluição do meio ambiente não ocorreu. Ao contrário, das imagens fotográficas registradas pelos agentes evidenciam a contaminação do local. Ademais, os relatos das testemunhas confirmam que o ambiente exalava odor extremamente forte, a ponto de impossibilitar a permanência no local, caracterizando, de forma inequívoca, grave poluição ambiental. Neste ínterim: APELAÇÃO. CRIME AMBIENTAL. ART. 54, § 2º, V, DA LEI Nº 9.605/98. ART. 60 DA LEI Nº 9.605/98. PROVAS DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE. TIPICIDADE DEMONSTRADA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA PRESERVADA. 1. A partir das provas produzidas, inexiste dúvida de que o réu causou poluição mediante lançamento de resíduos sólidos diretamente no solo, em desacordo com as exigências estabelecidas em lei ou regulamentos, bem como que fez funcionar atividade potencialmente poluidora no local. Réu que, em juízo, confessou a autoria delitiva, o que se amolda ao depoimento dos policiais militares ouvidos em juízo e à prova pericial. 2. Segundo parâmetros definidos pela jurisprudência, há atipicidade material, por conta da insignificância, quando houver mínima ofensividade na conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressiva lesão jurídica provocada. Precedentes. No presente caso, não se vislumbra a mínima ofensividade da conduta desenvolvida ou a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Princípio da insignificância inaplicável à espécie. 3. Compete ao Juízo da origem definir a pena adequada ao caso, comportando alteração, em grau de recurso, apenas em situações em que se constatar fundamentação deficiente ou viciada, contrariedade à lei ou preceito constitucional, ou desproporcionalidade no quantum aplicado. Pena mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-RS - APR: 50354701820188210001 RS, Relator: Julio Cesar Finger, Data de Julgamento: 24/11/2021, Quarta Câmara Criminal, Data de Publicação: 01/12/2021). (g.n.) ACORDAM OS INTEGRANTES DA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. EMENTA: APELAÇÃO CRIME - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DOS CRIMES DOS ARTIGOS 56 E 60 DA LEI 9605/98 (atividades lesivas ao meio ambiente)- INEXISTÊNCIA DE NULIDADE NA REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO - APELANTES QUE NÃO CUMPRIRAM COM TODAS AS CONDIÇÕES ACORDADAS - INICIAR PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO NO IAP NÃO EQUIVALE A OBTER A LICENÇA AMBIENTAL CONDICIONADA - OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO E DA AMPLA DEFESA - CRIMES PERMANENTES EM QUE O PRAZO PRESCRICIONAL APENAS SE VERIFICA APÓS CESSADOS OS SEUS EFEITOS - NÃO OBSERVÂNCIA DAS NORMAS LEGAIS E REGULAMENTARES - DANO AMBIENTAL E DOLO COMPROVADOS - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1551039-1 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Central de Maringá - Rel.: Roberto De Vicente - Unânime - - J. 09.03.2017). (TJ-PR - APL: 15510391 PR 1551039-1 (Acórdão), Relator: Roberto De Vicente, Data de Julgamento: 09/03/2017, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: DJ: 1998 28/03/2017). (g.n.) É notório, além de tudo, que não foi dada a correta destinação aos resíduos sólidos, já que há registros fotográficos de que esse material ficava exposto por toda a extensão do imóvel, do terreno urbano e até mesmo da calçada, chegando à via pública. Assim, o auto de infração ambiental n° 132214 (seq. 1.2), corroborado pelo depoimento de servidor do Instituto Água e Terra (IAT), com conhecimento técnico acerca do descarte de resíduos sólidos, constitui prova segura e suficiente da materialidade delitiva. Quanto a alegação de que o acusado desconhecia que necessitava de licença ambiental para exercer sua atividade, é imperioso ressaltar que é um dever de todos buscar se informar acerca de todas as exigências dos órgãos municipais, estaduais e federais para funcionamento. Atualmente há ferramentas na internet que facilitam uma busca completa sobre os mais variados temos. Os sites governamentais são alimentados com muita eficiência, principalmente os relacionados ao meio ambiente. Com isso, é impossível o acolhimento das pretensões defensivas. Logo, diante da robustez do conteúdo probante colacionado ao feito, a condenação é medida que se impõe. Em abono: APELAÇÃO CRIME. CRIME AMBIENTAL. ARTIGOS 38- A; 40 E 45 DA LEI 9.605/98. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. ALEGAÇÃO PRELIMINAR DE AMBOS OS RECORRENTES DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DE TODOS OS DELITOS. INOCORRÊNCIA. NÃO ULTRAPASSADO LAPSO TEMPORAL DE 4 ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E A PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DO APELANTE 1 POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA.IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTO DAS TESTEMUNHAS E INTERROGATÓRIO DOS ACUSADOS QUE DEMONSTRAM A AUTORIA INDUBITÁVEL DOS APELANTES. MATERIALIDADE E AUTORIA CONCLUSIVAS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA DE OFÍCIO: ABSOLVIÇÃO DE AMBOS OS RÉUS POR ATIPICIDADE DA CONDUTA PREVISTA NO ARTIGO 45 DA LEI 9.605/98. CORTE DE SESSENTA E Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Crime nº 1715273-12CINCO PINHEIROS DO PARANÁ. NORMA PENAL EM BRANCO. INEXISTÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO/DEFINIÇÃO PRÉVIA DE MADEIRA DE LEI. NÃO DEMONSTRAÇÃO, ADEMAIS, DA FINALIDADE DE EXPLORAÇÃO DA ATIVIDADE.ALTERAÇÃO DO REGIME DO APELANTE 2 PARA O ABERTO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS QUANTO AOS CRIMES REMANESCENTES.AFASTAMENTO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS CONSISTENTE NA PROIBIÇÃO DE FREQUENTAR DETERMINADOS LUGARES COMO CONDIÇÃO DOS REGIMES IMPOSTOS AOS APENADOS, INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 493, DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO E, DE OFÍCIO, ABSOLVIDOS OS APELANTES QUANTO AO DELITO PREVISTO NO ARTIGO 45 DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS; ALTERADO O REGIME INICIAL DO APELANTE 2 PARA O ABERTO E, POR FIM, AFASTADA A PENA RESTRITIVA DE DIREITOS DE PROIBIÇÃO DE FREQUENTAR DETERMINADOS LOCAIS COMO CONDIÇÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DAS PENAS DOS RECORRENTES. (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1715273-1 - Mallet - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU MARCEL GUIMARÃES ROTOLI DE MACEDO - Unânime - J. 16.08.2018). (g.n.) A conduta do réu, portanto, amolda-se perfeitamente ao artigo 60, caput, da Lei nº. 9.605/1998. Agiu, dessa forma, com dolo, com plena consciência de que sua conduta era indevida. Não há causa de justificação a ser reconhecida capaz de excluir a ilicitude da conduta. Por outro lado, ao tempo do fato, o acusado era imputável, tinha robusta consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível conduta diversa da praticada. Portanto, a conduta praticada pelo acusado configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece a repressão estatal. Ressalto que não milita em favor dele causa alguma de isenção de pena. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado a fim de CONDENAR o acusado JURANDIR ALVES DE LIMA como incurso nas sanções do artigo 60, caput, da Lei nº. 9.605/1998. Condeno o sentenciado ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade do sentenciado revelou-se normal a espécie delitiva. O sentenciado, nos moldes do verbete sumulado nº. 444 da Corte Superior de Justiça[3], registra antecedentes criminais (seq. 120.1), eis que condenado na Ação Penal n. 0000024-78.2005.8.16.0051, tendo a sentença transitado em julgado em 11/02/2009, com o cumprimento integral da pena em 16/05/2011. Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social[4]. O motivo do crime foi normal à espécie do delito. As circunstâncias e consequências não ultrapassam aquilo que já constitui desvalor do tipo penal, já que a forma de execução do crime foi normal ao delito disposto no artigo 60 da Lei nº. 9.605/1998. Não há se falar em comportamento da vítima, tendo em vista a natureza do delito. 4.2. Pena Base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal e artigo 6º da Lei nº. 9.605/1998, notadamente, os antecedentes criminais, fixo a pena-base em 01 mês e 18 dias de detenção e 20 dias-multa. A aplicação cumulativa das penas se justifica, ante a gravidade da conduta praticada ao meio ambiente, apta a constituir atingir as finalidades da pena, de repressão pela conduta praticada e prevenção por novos delitos. 4.3. Circunstâncias legais Inexistem atenuantes e agravantes a serem consideradas. 4.4. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem. 4.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima, fica a pena do sentenciado definitivamente estabelecida em 01 MÊS E 18 DIAS DE DETENÇÃO E 20 DIAS-MULTA, na proporção de R$ 200,00 para cada dia-multa, ante a condição financeira do acusado revelada em seu interrogatório judicial (R$ 6.000,00 de renda mensal). 4.6. Regime inicial de cumprimento de pena Assim, em vista da quantidade da pena aplicada, as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e o disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME ABERTO[6], com fulcro no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal, c/c. artigo 115 da Lei nº. 7.210/1984, observadas as seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 21h00min na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 21h00min dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, na forma prevista na Portaria 20/2024 desta Vara Judicial. 4.7. Substituição e suspensão da pena Cabível a substituição da pena por UMA restritiva de direitos ante a presença dos requisitos do artigo 44 do Código Penal. Assim, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) a ser revertida em favor do Fundo Estadual do Meio Ambiente. O valor da penalidade é compatível com a remuneração mensal do acusado e a prevenção e repressão do delito. Incabível a suspensão da pena na forma do art. 77, III, do CP. 5. DISPOSIÇÕES FINAIS 5.1. Da prisão preventiva e das medidas cautelares diversas da prisão Não se encontram presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva (CPP., arts. 312 e 387, § 1º), haja vista a fixação do regime aberto para cumprimento inicial da reprimenda imposta e por ter o sentenciado respondido a todo o processo em liberdade. Do mesmo modo, desnecessária a fixação de medidas cautelares diversas da prisão, por assim justificar a gravidade do delito e as circunstâncias judiciais do sentenciado. 5.2. Destinação dos bens apreendidos e da fiança Não há apreendidos a serem destinados e nem fiança recolhida nos autos. 5.3. Reparação de danos Deixo de fixar valor mínimo para a reparação dos danos morais coletivos causados pela infração (CPP., art. 387, inc. IV e Lei nº. 9.605/1998, art. 20), ainda que tenha sido deduzido pedido na inicial acusatória (seq. 14.1, pág. 02), pelos motivos que passo a expor. É cediço que o dano moral coletivo se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e desde que fique demonstrado que a conduta agride, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva, dispensando-se a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. No caso concreto, pudemos vislumbrar que o sentenciado praticava atividade potencialmente poluidora. No entanto, não há elementos capazes de mensurar ou indicar a extensão dos prejuízos causados ao meio ambiente. Diante disso, verifica-se que não há elementos que permitam dizer que a conduta do sentenciado tenha atributos de gravidade e intolerabilidade exacerbadas, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. Acerca do tema, colho os seguintes escólios jurisprudenciais: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO - ABSOLVIÇÃO NA ORIGEM - RECURSO MINISTERIAL - PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÃO NECESSÁRIA - PROVAS SUFICIENTES - POSSE DE MUNIÇÕES - CRIME MATERIALMENTE TÍPICO - MUNIÇÕES DE CALIBRE 9MM - USO PERMITIDO - DESCLASSIFICAÇÃO - MINORANTE DO TRÁFICO - NÃO CABIMENTO - REGIME ABERTO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - DESCABIMENTO - DANOS MORAIS COLETIVOS - FIXAÇÃO - INVIABILIDADE. 1. No caso de o telefone ser apreendido durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, em que há autorização judicial prévia para a prospecção de bens de interesse criminalístico, não há óbice para se acessar o seu conteúdo já armazenado, porquanto necessário às investigações, sendo prescindível nova autorização judicial para análise dos dados neles constantes. 2. Comprovado que as drogas e as munições apreendidas eram de propriedade dos réus, e que os entorpecentes não se destinavam unicamente ao consumo pessoal, deve ser a sentença absolutória reformada, para condenação de ambos pelos crimes previstos no art. 33 da Lei 11.343/06 e no Estatuto do Desarmamento. 3. Os acusados devem ser condenados também pelo delito descrito no art. 35 da Lei 11.343/06, na medida em que suficientemente comprovado o efetivo vínculo associativo entre eles, voltado à prática da traficância, e não apenas a existência de mero concurso de pessoas. 4. O delito de posse ilegal de munições é crime de mera conduta e de perigo abstrato, sendo bastante para a sua caracterização a simples prática de uma das condutas previstas no tipo penal, sem necessidade da efetiva exposição de outrem a risco, o qual é presumido. 5. Tendo em vista que as munições 9mm passaram a ser de calibre permitido, consoante Decreto 9.847, de 25 de junho de 2019 e Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, faz-se necessária a rec lassificação benéfica e condenação dos acusados pelo crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03 (e não no art. 16 da mesma lei). 6. Integrando os agentes organização criminosa e, ainda, sendo um deles reincidente, inviável a aplicação da causa de diminuição descrita no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 7. Fixadas as penas corporais em patamares acima de 04 (quatro) anos, não se mostra possível a fixação do regime prisional aberto, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. 8. Embora o sujeito passivo dos delitos em espécie seja a coletividade, ante a ausência de dispositivo legal de exata correlação, para efeitos penais, a falta de determinação e individualização da pessoa do ofendido (a que se refere o artigo 387, IV, CPP), afasta o cabimento da fixação, pelo juízo criminal, dos danos morais (coletivos) causados pelos réus. V.V. 1. Se os indícios que balizam o envolvimento de um dos recorrentes com substâncias entorpecentes e munição não restaram confirmados no decorrer da instrução probatória, ante a inexistência de prova suficiente a fundamentar um decreto condenatório, a absolvição daquele é medida que se impõe, notadamente em observância ao princípio "in dubio pro reo". 2. Não havendo provas suficientes a demonstrar a existência de uma estrutura permanente e organizada dedicada à venda de drogas, não resta configurado o crime disposto no artigo 35 da Lei Antidrogas. (TJ-MG - APR: 10687190008320001 Timóteo, Relator: Paulo Calmon Nogueira da Gama, Data de Julgamento: 22/09/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 24/09/2021). (g.n.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. ESTACIONAR VEÍCULO EM VAGA RESERVADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INFRINGÊNCIA A VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE OU ATRIBUTOS DA GRAVIDADE E INTOLERABILIDADE. MERA INFRINGÊNCIA À LEI DE TRÂNSITO. I - Na origem, trata-se de ação civil pública visando à condenação do réu, condutor de veículo automotor, ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência. II - A ação foi extinta, sem resolução de mérito, em razão da falta de interesse processual e ausência de respaldo legal para a pretensão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, manteve a sentença. III - O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano, independente de atributos da pessoa humana (dor, sofrimento etc.), e que se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e fique demonstrado que a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva. Preenchidos esses requisitos, o dano configura-se in re ipsa, dispensando, portanto, a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. IV - No caso, o pedido veiculado na exordial é de condenação do réu condutor de veículo automotor ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência; ausentes peculiaridades do caso, como reincidência ou maior desvalor na conduta da pessoa natural. Em casos tais, esta Segunda Turma não tem acolhido a pretensão condenatória, considerando a ausência de elementos que, não obstante a relevância da tutela coletiva dos direitos da pessoa com deficiência ou idosa, evidenciem que a conduta agrida, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade. Precedentes: AgInt no AREsp 1826143/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1/10/2021; AgInt no AREsp 1820258/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021; AgInt no AREsp 1758510/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021. V - Assim, na hipótese em exame, não há como afastar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a conduta em tela tenha infringido valores fundamentais da sociedade ou que possua atributos da gravidade e intolerabilidade. O caso trata, pois, de mera infringência à lei de trânsito, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. A propósito: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018. VI - Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (STJ - AREsp: 1927324 SP 2021/0199195-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022). (g.n.) Com base no exposto, inviável a condenação do sentenciado ao pagamento de danos morais coletivos. 5.4. Intimação da vítima Não há vítima em vista da espécie do delito pelo qual foi condenado. 5.5. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 1) procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 824, inciso VIII, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 2) expeça-se e remeta-se a guia de recolhimento definitiva do réu condenado, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso o sentenciado não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formará autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios à vara que estiver procedendo à execução (Resolução nº 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 3) remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo das custas e da pena de multa; 4) intime-se o sentenciado para o recolhimento do valor das custas processuais e da pena de multa devidas, no prazo de 10 (dez) dias, acompanhado o mandado das respectivas guias (Instrução Normativa nº 65/2021, art. 1º, observadas as alterações promovidas pela IN nº. 77/2021); 5) comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. João Gustavo Rodrigues Stolsis Juiz de Direito [1] “Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes”. [2] RECURSO CRIME. DELITO AMBIENTAL. ARTIGO 60 DA LEI 9.605/98. NORMA PENAL EM BRANCO. FUNCIONAMENTO DE SERVIÇO POTENCIALMENTE POLUIDOR (FÁBRICA DE ESQUADRIAS E MÓVEIS), SEM LICENÇA DA AUTORIDADE AMBIENTAL COMPETENTE. CONDUTA TÍPICA, PORQUE PREVISTA A EXIGIBILIDADE DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO ANEXO I DA RESOLUÇÃO 237 DO CONAMA. (...). (TJ-RS - RC: 71003955655 RS, Relator: Edson Jorge Cechet, Data de Julgamento: 22/10/2012, Turma Recursal Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 23/10/2012). (g.n.) [3] Súmula nº. 444 do STJ: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. [4] Informativo 702 – Tema Repetitivo nº. 1077: “Condenações criminais transitadas em julgado, não utilizadas para caracterizar a reincidência, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente” (STJ. REsp 1.794.854-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021).

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Ministério Público Do Estado Do Paraná x Elias Felipe De Moura

ID: 308131505

Tribunal: TJPR Órgão: Vara Criminal de Jandaia do Sul Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0000675-56.2025.8.16.0101

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

MINISTéRIO PúBLICO DO ESTADO DO PARANá

Polo Passivo:

ELIAS FELIPE DE MOURA

Conclusão

Advogados:

GABRIELA VIZEL GOMES

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fo… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0000675-56.2025.8.16.0101 Processo: 0000675-56.2025.8.16.0101 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Crimes do Sistema Nacional de Armas Data da Infração: 02/03/2025 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): ESTADO DO PARANÁ Réu(s): ELIAS FELIPE DE MOURA SENTENÇA 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em face de ELIAS FELIPE DE MOURA, qualificado no seq. 38.1, em que lhe foi imputada a prática dos crimes previstos no artigo 14, caput, da Lei nº 10.826/2003 (1ª Conduta) e no artigo 180, caput, do Código Penal (2ª Conduta), ambas combinadas com o artigo 61, inciso I, do Código Penal, na forma do artigo 69, caput, do Código Penal, por pretensa prática dos seguintes fatos delituosos: “1ª Conduta – Porte ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, agravado pela reincidência Em 02 de março de 2025, por volta das 01h50min, na Avenida Paraná, nº 560, Centro, no município de Kaloré/PR, nesta Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado ELIAS FELIPE DE MOURA, reincidente em crime doloso, agindo com consciência e vontade, portava arma de fogo e munições de uso permitido, a saber, 01 (um) revolver marca Taurus, calibre .38, nº de série 147431, e 06 (seis) munições intactas, calibre .38 (conforme auto de exibição e apreensão de mov. 1.11), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, vez que não possuía autorização da autoridade competente para a posse e o porte dos referidos artefatos. 2ª Conduta – Receptação agravada pela reincidência Em data inicial não precisada, mas certo é que até o dia 02 de março de 2025, por volta das 01h50min, na Avenida Paraná, nº 560, Centro, no município de Kaloré/PR, nesta Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado ELIAS FELIPE DE MOURA, reincidente em crime doloso, agindo com consciência e vontade, adquiriu, recebeu e conduziu, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime anterior, na medida em que conduzia em via pública a motocicleta Honda NXR150 BROS, ano de fabricação 2014, cor vermelha, placas AYF8403/PR, avaliada em R$ 12.586,00 (doze mil, quinhentos e oitenta e seis reais) (conforme auto de exibição e apreensão de mov. 1.11 e auto de avaliação de mov. 36.2), de propriedade de Fernando Missias da Silva, produto de crime de furto ocorrido em data de 16/08/2024 em Marialva/PR (conforme Boletim de Ocorrência nº 2024/1017804 - mov. 1.16). ” O auto de prisão em flagrante delito foi regularmente homologado (seq. 11.1) e, após, foi convertida a prisão em flagrante em prisão preventiva (seq. 17.1). A denúncia foi ofertada em 06/03/2025 (seq. 38.1), tendo sido recebida em 07/03/2025 (seq. 48.1), ocasião em que foi mantida sua prisão preventiva. O réu foi devidamente citado (seq. 64.1-2) e ofereceu resposta à acusação por negativa geral (seq. 74.1) por intermédio da Defensoria Pública. A instrução ocorreu de forma regular, conforme se verifica na seq. 107.1, ocasião em que foram inquiridas a testemunha Carlos Eduardo Euzébio Rodrigues (seq. 108.1), arrolada na denúncia e a informante Adriana Aparecida de Moura (seq. 108.2), arrolada na defesa preliminar. Ao final, procedeu-se ao interrogatório do acusado (seq. 108.3). O Ministério Público, em suas alegações finais de seq. 112.1, pugnou a procedência da pretensão punitiva para o fim de condenar o réu pela prática dos crimes esculpidos na denúncia, por entender comprovadas a autoria e materialidade delitiva. Na dosimetria da pena postulou pela fixação da pena-base acima do mínimo legal, na primeira etapa, diante da existência de circunstância judicial desfavorável. Na segunda etapa indicou a incidência da circunstância atenuante da confissão espontânea, somente quanto ao crime de porte ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, bem como da agravante da reincidência. Chegado na terceira etapa, apontou a inexistência de causas de aumento e/ou diminuição capazes de incidir na pena. Quanto ao regime inicial para cumprimento da reprimenda, demandou a fixação do fechado. Pontuou não ser cabível a conversão da pena privativa de liberdade em restritivas de direitos por preencher o réu os requisitos subjetivos para tanto, assim como a suspensão condicional da pena. Ao fim, pleiteou a condenação do acusado ao pagamento de danos morais em favor da coletividade, no montante de R$ 3.000,00 (três mil reais). A defesa técnica, por seu turno, apresentou alegações finais no seq. 116.1 e requereu: “(...) a) a absolvição do acusado, com fulcro no art. 386, inciso VI, do Código de Processo Penal, por força da inexigibilidade de conduta diversa, ou, subsidiariamente, pelo reconhecimento da legítima defesa putativa, ante o fundado receio de agressão iminente; b) absolvição nos termos do art. 386, III e VII, do CPP em relação ao crime de receptação; c ) subsidiariamente, a desclassificação para a modalidade culposa do delito, prevista no §3º do art. 180 do Código Penal, com aplicação da pena mínima e possibilidade de substituição por pena restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do Código Penal; d) em caso de condenação, o que se admite apenas para argumentar, requer: d.1) a fixação da pena-base no mínimo legal; d.2) o afastamento da valoração negativa da conduta social e maus antecedentes, a fim de que a pena-base seja fixada no mínimo legal; d.3) o reconhecimento e a devida aplicação da atenuante da confissão espontânea, com a consequente redução da pena-base; d.4) o afastamento da agravante da reincidência, por ausência de elementos concretos que justifiquem sua incidência de forma proporcional e justa; d.5) alternativamente, caso mantida, que seja integralmente compensada com a atenuante da confissão espontânea, sem aumento de pena na segunda fase da dosimetria. d.6) considerando o “quantum” de pena que possivelmente será aplicado em caso de condenação, o acusado faça jus ao regime aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal; d.7) que não seja fixado o regime inicial fechado com base exclusivamente na reincidência, por ausência de fundamentação concreta idônea; d.8) subsidiariamente, caso o juízo entenda que a reincidência é motivo suficiente para agravar o regime prisional, o que se admite apenas para efeito de argumentação, requer-se que seja fixado o regime semiaberto; d.9) o reconhecimento e a concessão da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, com a adoção das medidas alternativas que melhor se adequem às condições pessoais do acusado; e) o indeferimento do pedido de fixação valor a título de danos coletivos; f) a concessão da justiça gratuita ao acusado, nos termos do art. 98 e seguintes do Código de Processo Civil.” Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos estão em ordem. Não há nulidade ou preliminar a ser considerada, eis que se encontram presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Passo a analisar a materialidade e autoria dos fatos narrados na denúncia, bem como os elementos analíticos dos delitos. A prova oral foi produzida tanto na fase policial, quanto na fase judicial. Em Juízo foram ouvidas a testemunha Carlos Eduardo Euzébio Rodrigues (seq. 108.1) e a informante Adriana Aparecida de Moura (seq. 108.2), tendo sido o réu interrogado ao final (seq. 108.3), estando os depoimentos transcritos abaixo para melhor análise. A testemunha Carlos Eduardo Euzébio Rodrigues, policial militar, foi ouvida em fase judicial (seq. 108.1), ocasião em que descreveu as nuances do fato criminoso, relatando o seguinte: “(...) A equipe estava em patrulhamento, salvo engano era uma festa na cidade, e no momento foi possível observar uma motocicleta com o Elias, e estava sem retrovisor, totalmente alterada. Diante da fundada suspeita, optamos por realizar a abordagem, momento em que o Elias desce da motocicleta e assume estar armado. E equipe em revista retirou a arma dele, verificamos que a motocicleta estava com alerta de roubo ou furto, e diante das circunstâncias conduzimos ele para a delegacia. A arma era um revólver 38., a motocicleta era uma Bros e é uma moto muito negociada no mercado. Ele relatou que a arma seria para defesa pessoal. Ele não falou nada acerca da motocicleta. Salvo engano, o acusado se identificou como sendo de Jandaia. ” Seu relato foi condizente com o depoimento prestado em fase preliminar (seq. 1.8). O outro policial militar, Sr. Anderson Sobiecki Lino, foi ouvido somente na Delegacia de Polícia (seq. 1.9), ocasião em que relatou o seguinte: “(...) A equipe estava em patrulhamento na cidade de Kaloré e visualizou um indivíduo em uma motocicleta Honda Bros, de cor branca e chamou a atenção de que a mesma estava sem retrovisores. Resolvemos abordar o condutor e de imediato ele obedeceu a ordem de parada. Em revista pessoal, ele portava um revólver 38, com seis munições intactas. Checado via sistema SESP, a motocicleta possuía alerta de furto. A condução do abordado foi tranquila. ” A informante Adriana Aparecida de Moura, mãe do acusado, quando ouvida em fase judicial (seq. 108.2), assim declarou: “(...) sou mãe do Elias. Antes de Elias ser preso ele estava trabalhando, não era registrado. Ele trabalhava com internet. Elias estava sofrendo ameaças, não sei o porquê das ameaças. Essa motocicleta não estava em casa, não sei a origem dela, ele não guardava em casa, fiquei sabendo quando ele foi preso, ele não tinha motocicleta, ele morava comigo. ” Por fim, o acusado Elias Felipe de Moura, interrogado em sede policial (seq. 1.12), se defendeu da seguinte maneira: “(...) eu tinha a arma por conta de problemas pessoais, não ia cometer crime nenhum, porque eu trabalho com instalação de fibra óptica. Comprei essa arma porque no passado me envolvi com umas pessoas, e essas pessoas me ameaçaram. Comprei essa arma na região de Maringá. Paguei R$4.000,00 (quatro mil reais). ” Quando ouvido em juízo (seq. 108.3), reiterou o que foi dito anteriormente. Observem: “(...) eu comprei essa arma faz seis dias, mas eu estava sofrendo ameaças desde 2021, teve um crime de homicídio em 2021 em Jandaia mas eu fui absolvido, o processo foi extinto, mas por parte de familiares e integrantes de facção, eu fui ameaçado de morte. Desse tempo de 2021 a 2024 eu fiquei preso porque devia um tráfico, eu paguei quase todo o tráfico preso. Em 2024 eu saí da cadeia e no começo do ano estava tranquilo, e chegou para o mês de outubro, novembro, começou a sair gente da cadeia e eu comecei a receber certas ameaças. Um dia eu estava no bar, fui comprar cigarro para trabalhar e o carro chegou em mim e falou que eu precisava morrer, baseado nesse homicídio que aconteceu. Outro dia eu cheguei em casa depois do serviço, às 18 o cara veio com um deboche falando: “ue, você está vivo ainda?”. Eu fiquei perturbado, eu falei para a minha mãe, deixei avisado. Eu estava há um ano na rua, nunca sofri uma abordagem policial, eu estava trabalhando. As pessoas que me ameaçaram lá fora estão aqui hoje na cadeia, por isso eu comprei esse revólver. Eu sofri tiros, me deram três tiros. Quanto à moto, comprei em 26 de fevereiro, e no dia 02 de março eu fui preso, eu entrei nos grupos de feiras de ruas. Por ser uma moto bonita, e por ter um preço acessível, sou de família humilde, não tenho condições, eu achei favorável, e eu estava conhecendo uma pessoa de Kaloré, por isso eu estava lá naquele dia. Fui até Marialva, conversei com o cara, ele falou da moto, mandou foto, falou que queria R$1.500,00 (mil e quinhentos reais,) ele falou que a moto não tinha acerto e também não era roubada, eu peguei a moto e abasteci ela em Marialva e vim para Jandaia, na minha casa, fiquei lá. No dia 02 de março eu fui para Kaloré, eu estava conhecendo uma pessoa lá, eu ia de ônibus, mas nesse dia eu fui com a moto, quando eu estava voltando para Jandaia eu me deparei com a polícia. No momento eu me entreguei, falei que estava armado. Eu estava sofrendo essas ameaças desde 2021, desde depois daquela morte. Eu saí no dia 9 de fevereiro de 2024 da PEM, o homicídio foi em Jandaia, eu estava de tornozeleira e ficou provado que não fui eu, não me recordo do nome da vítima, tratavam ele como Trovador. Quanto ao valor da moto, não achei o valor desproporcional, porque sou leigo nessa parte. Eu não tinha habilitação, nunca tive uma moto. ” Essa foi a prova oral produzida. 2.1. Crime de porte ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido (1º fato) A materialidade delitiva está comprovada no auto de prisão em flagrante (seq. 1.5), Boletim de Ocorrência (seq. 1.6), auto de exibição e apreensão (seq. 1.11), laudo de eficiência em arma de fogo e munição (seq. 91.2), e por meio dos depoimentos colhidos em ambas as fases. A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria. Analisando o plexo probatório é imperioso concluir que o réu ELIAS, em data de 02 de março de 2025, na Avenida Paraná, nº 560, Centro, no município de Kaloré/PR, nesta Comarca de Jandaia do Sul/PR, com consciência e vontade, portava arma de fogo e munições de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, consistentes em 01 (um) revolver marca Taurus, calibre .38, nº de série 147431, e 06 (seis) munições intactas, calibre .38 (auto de exibição e apreensão de seq. 1.11), as quais se mostraram eficientes para fins de disparos (cf. laudo de eficiência em arma de fogo e munição de seq. 91.2). Os policiais militares responsáveis por atender a ocorrência envolvendo o réu foram contundentes em afirmar que ele realmente portava os artefatos bélicos consigo quando da abordagem e que alegava que o porte seria para sua defesa pessoal. Oportuno ponderar, outrossim, que os depoimentos de policiais constituem meio probatório idôneo para o fim do deslinde da criminalidade, principalmente pelo fato de que a estes é atribuída a confiança estatal. E, no mais, não existem elementos que gerem descrédito ou suspeitas em suas alegações. Sobre o assunto a jurisprudência já se manifestou: APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE RECEPTAÇÃO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES. VALIDADE. CIÊNCIA DA ORIGEM ESPÚRIA DO BEM. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE CULPOSA. NÃO CABIMENTO. Afasta-se o pleito de absolvição por insuficiência de provas quando a materialidade e a autoria delitivas estão suficientemente comprovadas nos autos. A palavra de policiais é elemento de prova a ser valorizado, conferindo maior robustez ao conjunto probatório, sobretudo quando em absoluta consonância com as circunstâncias do crime. Inviável o acolhimento do pleito absolutório e desclassificatório para a modalidade culposa quando há nos autos provas da materialidade e autoria delitivas, bem como da ciência do agente quanto à origem espúria do objeto apreendido, evidenciando o seu dolo direto. DESPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO. (TJ-RJ - APL: 01288812620198190001 202205011253, Relator: Des(a). JOAQUIM DOMINGOS DE ALMEIDA NETO, Data de Julgamento: 18/08/2022, SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 22/08/2022). (g.n.) Apelação Crime. Crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/03). Rogo absolutório por ausência de provas. Não acolhimento. Provas firmes e robustas nos autos. Depoimentos dos policiais militares em conformidade com os demais elementos de prova. Aduzida ineficiência da arma de fogo, ante a ausência de teste de disparo. Não acolhimento. Exame de prestabilidade realizado. Crime de mera conduta e de perigo abstrato. Presunção de ofensa ao bem jurídico declarada com a prática de um dos verbos nucleares do tipo delitivo. Recurso desprovido. Tanto o porte quanto a posse de arma de fogo, acessórios e munições são crimes de mera conduta e de perigo abstrato, repise-se, bastando a incidência em qualquer dos verbos nucleares do tipo para sua configuração, e que dispensam, inclusive, a produção de laudo pericial com fins de atestar sua potencialidade. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0004187-47.2010.8.16.0174 - União da Vitória - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - J. 21.03.2022). (TJ-PR - APL: 00041874720108160174 União da Vitória 0004187-47.2010.8.16.0174 (Acórdão), Relator: José Mauricio Pinto de Almeida, Data de Julgamento: 21/03/2022, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 25/03/2022). (g.n.) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE LESÃO CORPORAL E EVASÃO MEDIANTE VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE DEMONSTRAM A AUTORIA E MATERIALIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA QUE MERECE ESPECIAL RELEVÂNCIA, SOBRETUDO QUANDO EM CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVA. PALAVRAS DOS POLICIAIS COERENTES E HARMÔNICAS COM OS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. FÉ PÚBLICA. PROVAS CONTUNDENTES. PEDIDO DE INSENÇÃO DE CUSTAS. NÃO CONHECIDO. JUÍZO DA EXECUÇÃO COMPETENTE PARA ANALISAR A SITUAÇÃO ECONÔMICA DO ACUSADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ATUAÇÃO EM SEGUNDO GRAU. ARBITRAMENTO. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 1ª C.Criminal - 0001831-60.2018.8.16.0122 - Ortigueira - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU MARCEL GUIMARÃES ROTOLI DE MACEDO - J. 22.05.2022). (g.n.) PROCESSUAL PENAL. PENAL. TESTEMUNHA POLICIAL. PROVA: EXAME. I. - O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento no sentido de que não há irregularidade no fato de o policial que participou das diligências ser ouvido como testemunha. Ademais, o só fato de a testemunha ser policial não revela suspeição ou impedimento. II. - Não é admissível, no processo de habeas corpus, o exame aprofundado da prova. III. - H.C. indeferido. (STF. 2ª Turma, HC 76.557/RJ, Rel. Min. Carlos Velloso, julg. 04.08.98, DJ 02.02.2001, p. 73). O próprio acusado confessou o porte irregular da arma de fogo e das munições, alegando que estava sendo ameaçado desde 2021 e que, por se sentir amedrontado, adquiriu o artefato para se proteger. Consigna-se, ainda, que o auto de exibição e apreensão (seq. 1.11) atesta que o réu ELIAS portava um revólver, calibre 38, numeração de série 147431 e 06 (seis) munições intactas de mesmo calibre. O laudo de exame de arma de fogo e munições do seq. 91.2 atestou a potencialidade lesiva tanto da arma de fogo quanto das munições apreendidas, as quais foram todas deflagradas quando da realização do referido documento. O crime previsto no artigo 14 da Lei nº. 10.826/2003 é de perigo abstrato, sendo prescindível a comprovação da ocorrência de perigo concreto para a sua caracterização. Nesse sentido é o posicionamento jurisprudencial. Senão vejamos: APELAÇÃO. CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ART. 14 DA LEI 10.826/2003. AUTORIA E MATERIALIDADE INCONTROVERSAS. ARMA DESMUNICIADA. FATO QUE NÃO AFASTA A TIPICIDADE DA CONDUTA. POTENCIAL LESIVO MEDIATO SUBSISTENTE. DESPROPORCIONALIDADE DA TESE DE ATIPICIDADE, UMA VEZ QUE O LEGISLADOR SANCIONA NO MESMO TIPO LEGAL CONDUTAS IMEDIATAMENTE MENOS GRAVOSAS COMO O PORTE DE MUNIÇÃO E DE ACESSÓRIOS. PRECEDENTES NOS TRIBUNAIS SUPERIORES QUE NÃO AFASTAM A TIPICIDADE DO PORTE DE ARMA DESMUNICIADA. HIPÓTESE, CONTUDO, EM QUE LAUDO PERICIAL ATESTOU A ABSOLUTA INEFICIÊNCIA DA ARMA. LESIVIDADE. 1. Em substituição ao Desembargador Valter Ressel. TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal nº 900.020-0INOCORRENTE. SENTENÇA REFORMADA PARA O FIM DE ALTERAR O FUNDAMENTO DA ABSOLVIÇÃO.RECURSO PROVIDO. 1. O fato de a arma estar desmuniciada não descaracteriza o crime de porte ilegal de arma de fogo, pois tal circunstância apenas afasta o perigo imediato, mas não o mediato representado pela arma pois basta ela ser municiada para prontamente reaver seu poder lesivo. Ademais, o legislador incriminou não apenas a conduta de possuir-portar arma de fogo, mas também munição e acessórios que possuem isoladamente menor poder vulnerante. Logo, mostra-se desproporcional apenar a posse e/ou porte destes últimos e não a de arma de fogo, muito mais gravosa. 2. Comprovado pericialmente que a arma apreendida em poder do acusado era absolutamente ineficaz para efetuar disparos, resta descaracterizado o crime de porte de arma de fogo, pois afastado o potencial lesivo da conduta tanto imediato quanto mediato. (TJPR - 2ª C. Criminal - AC 900020-0 - Cascavel - Rel.: Lilian Romero - Unânime - J. 22.11.2012). (g.n.) APELAÇÃO CRIMINAL. TRANSPORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEMONSTRADAS. ESTADO DE NECESSIDADE. INOCORRENTE. TIPICIDADE RECONHECIDA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. DOSIMETRIA ADEQUADA. REPRIMENDA PROPORCIONAL. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. O ministério público denunciou Jose Sena Hora dos Santos, pela prática do delito descrito no art. 14, da Lei n. 10.826/ 2003, sob a acusação de que: […] no dia 08 de abril de 2013, na cidade de Cristópolis/BA, o denunciado transportava a arma de fogo, tipo revólver, marca taurus, calibre 38, código de série 1635637, municiado com quatro cartuchos intactos (laudo de fls. 16/17), em desacordo com determinação legal. II. As evidências constantes dos autos revelam que o acusado transportava ilegalmente arma de fogo de uso permitido, conduta que resta emoldurada pelo artigo 14, da Lei n. 10.826/2003. Materialidade e autoria demonstradas. III. O transporte ilegal de arma de fogo de uso permitido, ao argumento de que estaria sendo constantemente ameaçado, revela-se absolutamente inadequado ao preenchimento dos requisitos do estado de necessidade, consideradas as normas de regência incidentes na espécie, sobretudo o estatuto do desarmamento. IV igualmente frágil o discurso da defesa ao derredor de uma suposta falta de tipicidade material, ao argumento da ausência de risco ou dano provocado pela conduta do apelante. O art. 14, da Lei n. 10.826/2003, encerra a previsão de delito de mera conduta, perigo abstrato, e que se consuma com a simples conjugação de qualquer dos seus núcleos verbais. Assim, a circunstância de que alguém possa vir a sofrer dano ou experimentar perigo é presumida no próprio tipo. V. A reprimenda aplicada se apresenta aderente aos parâmetros legais, decorrentes de uma dosimetria adequada e proporcional em sentido estrito, ensejando a pena definitiva fixada no mínimo legal, em regime aberto, comutada em restritiva de direitos e fixação de multa. Revela-se, pois, inviável a redução da pena para aquém do mínimo legal, considerado o obstáculo na Súmula n.º 231 - STJ. Sentença que não merece reforma. Recurso desprovido. APC. 0304745-15.2013.8.05.0022 barreiras relator: Des. Eserval Rocha. (TJBA; AP 0304745-15.2013.8.05.0022; Salvador; Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Eserval Rocha; Julg. 03/07/2018; DJBA 23/07/2018; Pág. 771). (g.n.) APELAÇÃO CRIMINAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. USURPAÇÃO DA FUNÇÃO INVESTIGATIVA DA POLÍCIA JUDICIÁRIA PELA POLÍCIA MILITAR. INOCORRÊNCIAS. PRELIMINARES REJEITADAS. RECURSO MINISTERIAL. PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO PELO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ACUSADOS DELSON E ROSA MARIA). AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A CONFIGURAÇÃO DO DELITO. ABSOLVIÇÕES MANTIDAS. RECURSOS DEFENSIVOS. TRÁFICO DE DROGAS EM ASSOCIAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS MILITARES. CREDIBILIDADE. CONDENAÇÕES MANTIDAS. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE LESIVIDADE AO BEM JURÍDICO TUTELADO. IMPOSSIBILIDADE. PENAS-BASE. MANUTENÇÃO. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA MENORIDADE RELATIVA. INVIABILIDADE. CAUSA DE REDUÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. INAPLICABILIDADE. CAUSA DE AUMENTO PELA CAUSA PREVISTA NO ARTIGO 40, V, DA LEI Nº 11.343/06 CONFIGURADA. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. MODIFICAÇÃO DO REGIME CARCERÁRIO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO. IMPOSSIBILIDADES. DETRAÇÃO PENAL. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO DO PAGAMENTO. EXAME PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. 1. Inexistindo qualquer comprovação de prejuízo à defesa, não há falar-se em nulidade, conforme determinação contida no artigo 563 do Código de Processo Penal. 2. Por serem os crimes de tráfico de drogas e posse ilegal de munições de uso permitido delitos permanentes, não se faz necessário o mandado de busca e apreensão para se adentrar na casa onde está sendo a ação realizada. Não há falar-se em violação de domicílio. 3. A exordial acusatória contém todos os requisitos previstos no artigo 41, do Código de Processo Penal, retratando o modo como foi praticado o fato e possibilitando o exercício da ampla defesa. 4. O tráfico de drogas é um crime de ações múltiplas e natureza clandestina. Nesse sentido, não ocorre a usurpação da função investigativa da polícia judiciária se a polícia militar prende em flagrante o agente e encaminha-o a polícia federal para que se proceda as devidas investigações, estando no exercício da atribuição de repressão à criminalidade. 5. O crime de associação para o tráfico depende de um ajuste prévio de duas ou mais pessoas, com vínculo duradouro e ação coesa, com a finalidade de praticarem tráfico ilícito de substância entorpecente, o que não restou provado. 6. Encontrando a acusação apoio no conjunto probatório amealhado, que comprova a materialidade e a autoria do crime de tráfico de drogas, há de ser confirmada a sentença condenatória. 7. A associação a outras pessoas para praticar a conduta prevista no artigo 33, da Lei Antidrogas, configura o crime previsto no artigo 35, da referida Lei. 8. O porte de munições, intactas e eficientes para ofender a integridade física de outrem, atesta a potencialidade lesiva ao bem jurídico tutelado, o que conduz à comprovação de tipicidade material, não podendo se falar em absolvição. 9. O delito descrito no artigo 16 da Lei nº 10.826/2003 é formal e de perigo abstrato, prescindindo-se da demonstração do efetivo perigo no caso concreto para a sua configuração, de forma que a simples posse de arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido caracteriza o delito. 10. As penas-base fixadas de modo suficiente e eficiente para a prevenção e repressão do crime bem como para a reeducação do infrator não devem ser modificadas. 11. Não se reconhece a atenuante da menoridade relativa, pois o apelante era maior de 21 (vinte e um) anos de idade à época do cometimento do delito. 12. Configurada a associação para o tráfico de drogas, afasta-se a possibilidade de reconhecimento da causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. 13. Incide a causa de aumento prevista no artigo 40, VI, da Lei nº 11.343/06, porque a prática dos crimes de tráfico ilícito de drogas. (TJMG; APCR 0012271-77.2018.8.13.0194; Coronel Fabriciano; Terceira Câmara Criminal; Rel. Des. Antônio Carlos Cruvinel; Julg. 16/07/2019; DJEMG 23/07/2019). (g.n.) Importante ressaltar, outrossim, que o princípio da insignificância não possui incidência ao caso sub judice, já que a quantidade de munições apreendidas não era ínfima e estavam acompanhadas da arma de referência. É bem verdade que o Supremo Tribunal Federal passou a admitir a incidência do princípio da insignificância a casos excepcionalíssimos nos quais há apreensão de PEQUENA quantidade de munições e desde que desacompanhadas da arma de referência, o que não é o caso dos autos. Atentemo-nos para trecho da decisão proferida pelo STF acerca do tema, quando do julgamento do RHC 143.449/MS, em 26.09.2017: “Não é possível vislumbrar, nas circunstâncias, situação que exponha o corpo social a perigo, uma vez que a única munição apreendida, guardada na residência do acusado e desacompanhada de arma de fogo, por si só, é incapaz de provocar qualquer lesão à incolumidade pública”. Em abono: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DE DOIS RECURSOS. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE E DA PRECLUSÃO CONSUMATIVA. CRIME DE POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. ÍNFIMA QUANTIDADE DE MUNIÇÕES. CONTEXTO DA PRÁTICA DE OUTRO CRIME. NÃO COMPROVAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. 1. A interposição de dois recursos pela mesma parte contra o mesmo ato judicial inviabiliza a análise do protocolizado por último, por força do princípio da unirrecorribilidade e da preclusão consumativa. 2. Os delitos de porte de armas e de munição de uso permitido ou restrito, tipificados nos arts. 12 e 16 da Lei n. 10.826/2003, são crimes de mera conduta e de perigo abstrato, em que se presume a potencialidade lesiva, sendo inaplicável o princípio da insignificância independentemente da quantidade apreendida (AgRg no REsp n. 1.682.315/RJ). 3. Aplica-se, no entanto, o princípio da insignificância quando apreendida ínfima quantidade de munições (duas), desacompanhas de meio hábil para deflagrá-las. 4. Afasta-se a aplicação do princípio da insignificância quando a pequena quantidade de munição for apreendida em contexto da prática de outro crime, circunstância suficiente para demonstrar a lesividade da conduta. 5. Não comprovadas a autoria e a materialidade de crime ocorrente no contexto de apreensão de ínfima quantidade de munições, aplica-se o princípio da insignificância. 6. Agravo regimental de fls. 555-559 não conhecido. Agravo regimental de fls. 548-553 desprovido. (STJ. AgRg no AREsp 1803778/GO, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 10/05/2022, DJe 13/05/2022). (g.n.) Convém destacar que a tese defensiva de que o réu cometeu o delito sob excludente de ilicitude (inexigibilidade de conduta diversa e legítima defesa putativa) não merece acolhimento. Isso porque não se comprovou nos autos a veracidade da informação de que estava sendo ameaçado, ônus que lhe cabia (CPP., art. 156). Deste modo a conduta perpetrada pelo acusado amolda-se perfeitamente ao disposto no artigo 14 da Lei nº. 10.826/2003, pois portava arma de fogo e munições sem autorização para tanto e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. O fato é antijurídico, posto que verberado pela lei penal e não foram alegadas e nem se encontram provadas, nenhuma das excludentes de ilicitude dentre aquelas elencadas no artigo 23 do Código Penal. Ao tempo do fato o acusado era imputável, tinha robusta consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa. Portanto, a conduta praticada pelo acusado configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece a repressão estatal. 2.2. Crime de receptação (2º fato) A materialidade delitiva está comprovada no auto de prisão em flagrante (seq. 1.5), Boletins de Ocorrência (seq. 1.16), auto de exibição e apreensão (seq. 1.11), auto de avaliação indireta (seq. 36.2), auto de entrega (mov. 99.1) e por meio dos depoimentos colhidos em ambas as fases. A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria. Os policiais militares ouvidos em ambas as fases relataram que encontraram a motocicleta com marcas de adulteração junto com o acusado. Após a abordagem verificaram que ela estava com alerta de furto, não tendo o réu mencionado nada acerca desse fato. O referido dispositivo penal tutela o patrimônio alheio, sendo que para sua configuração exige-se a existência do ato de receptar (elemento objetivo) e o conhecimento da origem criminosa do bem (elemento subjetivo). Denota-se que a motocicleta furtada foi apreendida com o réu, estando cheia de avarias, tendo réu alegado em seu interrogatório que a adquiriu por um preço abaixo do valor de mercado. As circunstâncias da apreensão indicam o dolo do agente na prática delitiva. Sobre esse ponto, é importante mencionar que a versão por ele apresentada não se mostra crível e é desacompanhada de elementos probatórios que gerem verossimilhança em suas alegações. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. ORIGEM LÍCITA DOS BENS. ÔNUS PROBATÓRIO DA DEFESA. ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO. INCURSÃO EM MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS E MULTA. IMPOSSIBILIDADE. 1. No crime de receptação, se o bem tiver sido apreendido em poder do agente, "caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova" (AgRg no AREsp n. 1.843.726/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 16/8/2021). 2. Demonstradas autoria e materialidade pelas instâncias a quo, soberanas em matéria fático-probatória, não cabe a esta Corte Superior infirmar seu entendimento para fins de absolvição ou mesmo desclassificação, "na medida em que tal análise não se limita a critérios estritamente objetivos, exigindo incursão na seara probatória dos autos" ( AgRg no HC n. 682.283/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 20/9/2021). 3. Consoante a jurisprudência do STJ, quando o preceito secundário do tipo penal cominar pena de multa cumulada a pena corporal, não se mostra socialmente recomendável a comutação da pena reclusiva pela multa substitutiva prevista no art. 44, § 2.º, 2.ª parte, do Código Penal, pois "a pena restritiva de direitos de prestação pecuniária, de índole reparadora, melhor atenderá ao caráter ressocializador da reprimenda, podendo inclusive ser convertida em pena corporal, se descumprida" (HC n. 416.530/SP, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 19/12/2017). 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 754955 SC 2022/0211102-1, Relator.: JESUÍNO RISSATO, Data de Julgamento: 29/05/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/06/2023) (g.n.) EMENTA PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECEPTAÇÃO. ALEGADA OFENSA AO ART. 180, CAPUT, DO CP E AO ART. 386, VII, DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. APREENSÃO DO BEM NA POSSE DA ACUSADA. ÔNUS DA DEFESA DE COMPROVAR A ORIGEM LÍCITA DO OBJETO. ALTERAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A conclusão das instâncias ordinárias está em sintonia com a jurisprudência consolidada desta Corte, segundo a qual, no crime de receptação, se o bem for apreendido em poder do acusado, cabe à defesa apresentar prova de sua origem lícita ou de sua conduta culposa, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova (HC n. 433.679/RS, de minha Relatoria, Quinta Turma, julgado em 6/3/2018, REPDJe de 17/04/2018, DJe de 12/3/2018). 2. Ademais, para desconstituir o entendimento firmado pelo Tribunal de origem, a fim de absolver a acusada do delito de receptação, seria necessário o revolvimento do conjunto de fatos e provas, procedimento vedado na via especial, conforme o teor da Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no AREsp: 2523731 TO 2023/0448868-0, Relator.: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 06/08/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/08/2024) (g.n.) Portanto, a negativa de autoria do acusado, em razão de não saber que a motocicleta era produto de um crime, não merece ser acolhida (CPP., art. 156). Ressalta-se que as avarias e irregularidades da motocicleta, além do preço abaixo do valor do mercado, são circunstâncias que indicam que o réu sabia da origem do bem. Deste modo a conduta perpetrada pelo acusado amolda-se perfeitamente ao disposto no artigo 180, caput, do Código Penal, pois adquiriu, recebeu e conduziu coisa que sabia ser produto de crime, eis que a motocicleta furtada foi apreendida em sua posse. O fato é antijurídico, posto que verberado pela lei penal e não foram alegadas e nem se encontram provadas, nenhuma das excludentes de ilicitude dentre aquelas elencadas no artigo 23 do Código Penal. Ao tempo do fato o acusado era imputável, tinha robusta consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa. Portanto, a conduta praticada pelo acusado configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece a repressão estatal. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado a fim de CONDENAR o réu ELIAS FELIPE DE MOURA como incurso nas sanções do artigo 14, caput, da Lei nº 10.826/2003 (1ª Conduta) e no artigo 180, caput, do Código Penal (2ª Conduta) c.c. o art. 69 do Código Penal. Condeno o sentenciado, também, ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. Deixo de analisar o pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita por não ser esse o Juízo competente para tanto. Senão vejamos: PENAL E PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. PRELIMINARES. 1) PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. NÃO CONHECIMENTO. 2) SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REVISÃO CRIMINAL SEM EFEITO SUSPENSIVO. REJEITADA. 3) PRISÃO DOMICILIAR. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. NÃO CONHECIMENTO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DIANTE DE DEPOIMENTO COMPROVADAMENTE FALSO (ART. 621, INC. II, DO CPP). IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS DA ALEGAÇÃO. 01. Condenado à pena de 12 (doze) anos de reclusão em regime fechado, pela prática do crime previsto no art. 217-A, c/c art. 226, inciso II, todos do Código Penal Brasileiro (CPB). 02. Inicialmente, quanto ao pedido de isenção de custas processuais com concessão da justiça gratuita, tem-se que sua análise compete ao juízo das execuções, não devendo o pleito ser conhecido por este e. Tribunal. (...). (TJCE; RevCr 0620002-02.2020.8.06.0000; Seção Criminal; Rel. Des. Mário Parente Teófilo Neto; DJCE 08/07/2020; Pág. 197). (g.n.) 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1. Delito de porte ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido (1º fato) 4.1.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade do sentenciado – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se normal à espécie delitiva pela qual foi denunciado. O sentenciado, nos termos da Súmula nº. 444 do Superior Tribunal de Justiça, registra antecedentes criminais (seq. 109.1), pois foi condenado com sentença transitada em julgado nos autos 0001664-04.2021.8.16.0101 (seq. 109). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social. Os motivos do crime foram comuns à espécie delitiva. As consequências foram normais, nada que mereça majoração. As circunstâncias não prejudicam o sentenciado. O comportamento da vítima não contribuiu com os fatos, filiando-me ao entendimento de que esta circunstância somente pode ser valorada para amenizar a situação do sentenciado (STJ, AgRg no REsp 1245072, DJe 28/05/2013). Assim, tenho por desinfluente ao caso. 4.1.2. Pena-base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, em especial, os antecedentes do réu, fixo a pena-base em 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 27 dias-multa, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em razão da condição financeira do acusado, sendo a exasperação equivalente a 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre a pena máxima e mínima cominada ao delito. 4.1.3. Circunstâncias legais Incide a circunstância agravante da reincidência insculpida no artigo 61, inciso III, alínea “d”, do CP., eis que o réu foi condenado nos autos nº 0002722-76.2020.8.16.0101, por delito praticado em 30/07/2020 e trânsito em julgado em 19/07/2022. Lado outro, incide a circunstância atenuante da confissão espontânea (CP., art. 65, inc. III, “d”), eis que confessou o porte da arma de fogo. Veja que restaram configuradas uma circunstância agravante e uma atenuante igualmente preponderantes. Diante disso, em casos em que há a presença de uma circunstância que agrave e de outra que atenua, sendo ambas de mesmo valor, a compensação entre elas é medida impositiva. Assim, em vista do exposto, COMPENSO a circunstância agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea, mantendo a pena-base inalterada. 4.1.4. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem causas de aumento e/ou diminuição de pena, previstas na parte geral ou especial do Código Penal. 4.1.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima fica a pena do sentenciado estabelecida em 02 ANOS E 03 MESES DE RECLUSÃO E 27 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em razão da condição financeira do acusado. 4.1.6. Regime inicial de cumprimento da pena Considerando a reincidência do sentenciado, as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME SEMIABERTO, com fundamento no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 35 do mesmo diploma legal. 4.1.7. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição da pena por restritiva de direitos, por não preencher o sentenciado os requisitos para tanto (CP., art. 44, incisos II e III). Incabível também a suspensão condicional da pena (CP., art. 77, inciso I e II). 4.2. Delito de receptação (2º fato) 4.2.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade do sentenciado – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se normal à espécie delitiva pela qual foi denunciado. O sentenciado, nos termos da Súmula nº. 444 do Superior Tribunal de Justiça, registra antecedentes criminais (seq. 109.1), pois foi condenado com sentença transitada em julgado nos autos 0001664-04.2021.8.16.0101 (seq. 109). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social. Os motivos do crime foram comuns à espécie delitiva. As consequências foram normais, nada que mereça majoração. As circunstâncias não prejudicam o sentenciado. O comportamento da vítima não contribuiu com os fatos, filiando-me ao entendimento de que esta circunstância somente pode ser valorada para amenizar a situação do sentenciado (STJ, AgRg no REsp 1245072, DJe 28/05/2013). Assim, tenho por desinfluente ao caso. 4.2.2. Pena-base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, em especial, os antecedentes criminais, fixo a pena-base em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 17 dias-multa, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em razão da condição financeira do acusado, sendo a exasperação equivalente a aproximadamente 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre a pena máxima e mínima cominada ao delito. 4.2.3. Circunstâncias legais Incide a circunstância agravante da reincidência insculpida no artigo 61, inciso III, alínea “d”, do CP., eis que o réu foi condenado nos autos nº 0002722-76.2020.8.16.0101, por delito praticado em 30/07/2020 e trânsito em julgado em 19/07/2022, razão pela qual agravo a pena em 1/6 (um sexto). Inexistem circunstâncias atenuantes (CP., art. 61). 4.2.4. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem causas de aumento e/ou diminuição de pena, previstas na parte geral ou especial do Código Penal. 4.2.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima fica a pena do sentenciado estabelecida em 01 ANO, 07 MESES E 07 DIAS DE RECLUSÃO E 20 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em razão da condição financeira do acusado. 4.2.6. Regime inicial de cumprimento da pena Considerando a reincidência do sentenciado, as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME SEMIABERTO, com fundamento no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 35 do mesmo diploma legal. 4.2.7. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição da pena por restritiva de direitos, por não preencher o sentenciado os requisitos para tanto (CP., art. 44, incisos II e III). Incabível também a suspensão condicional da pena (CP., art. 77, inciso I e II). 4.3. Concurso Material Aplica-se ao caso o concurso material de crimes previsto no artigo 69 do Código Penal, pois o agente, mediante duas ações praticou dois crimes diversos. Assim, somadas as penas fica o réu definitivamente condenado à pena de 03 ANOS, 10 MESES E 07 DIAS DE RECLUSÃO E 47 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em razão da condição financeira do acusado. 4.3.1. Regime inicial de cumprimento de pena e detração penal Deixo consignado que o sentenciado permaneceu preso cautelarmente por 116 dias, razão pela qual DECLARO detraída essa quantia de tempo de sua pena. Considerando o que resta a cumprir, a reincidência, as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME SEMIABERTO, com fundamento no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 35 do mesmo diploma legal. 4.3.2. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e suspensão condicional da pena Inviável a substituição da pena por restritiva de direitos, por não preencher o sentenciado os requisitos para tanto (CP., art. 44, incisos II e III). Incabível também a suspensão condicional da pena (CP., art. 77, inciso I e II). 5. DELIBERAÇÕES FINAIS 5.1. Da prisão preventiva e das medidas cautelares diversas da prisão Diante da fixação do regime semiaberto, imperiosa a revogação da segregação cautelar para ambos os sentenciados. Sobre este ponto, impende destacar que o Supremo Tribunal Federal recentemente decidiu que a manutenção da prisão preventiva é incompatível com a fixação do regime inicial semiaberto fixado em sentença penal condenatória, por violar os princípios da proporcionalidade e presunção de inocência. Vejamos o entendimento da jurisprudência neste sentido: APELAÇÃO CRIME. FURTO QUALIFICADO. ARTIGO 155, § 1º E § 4º, IV, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DO RÉU. PEDIDO PARA CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIMENTO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. ALEGADA FALTA DE PROVAS DA PRÁTICA DELITIVA. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS. DEPOIMENTO DA VÍTIMAS EM CONSONÂNCIA COM AS DECLARAÇÕES DOS POLICIAIS MILITARES E CORROBORADOS PELAS DEMAIS PROVAS. VALIDADE E RELEVÂNCIA DO DEPOIMENTO DO AGENTE PÚBLICO. PEDIDO PARA RECONHECIMENTO DA INIMPUTABILIDADE DO RECORRENTE E PARA A INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. NÃO ACOLHIMENTO. DEPENDÊNCIA QUÍMICA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE A CONDIÇÃO DO ACUSADO COMPROMETEU O DISCERNIMENTO ACERCA DO CARÁTER ILÍCITO DA SUA CONDUTA OU DE SE AUTODETERMINAR. FALTA DE PROVA PERICIAL. CONSUMO VOLUNTÁRIO DO ENTORPECENTE. IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAR A QUALIFICADORA DO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. IMAGENS FOTOGRÁFICAS E PALAVRA DA VÍTIMA. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. TRATAMENTO MÉDICO. RÉU CONDENADO EM REGIME SEMIABERTO. DE OFÍCIO, NECESSIDADE DE COMPATIBILIZAÇÃO DA CUSTÓDIA COM O REGIME DETERMINADO NA CONDENAÇÃO. DEFERIDO A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS A DEFENSORA DATIVA PELA ATUAÇÃO EM SEGUNDO GRAU. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDO, NÃO PROVIDO, DE OFÍCIO, COMPATIBILIZAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO EM FAVOR DO RECORRENTE. (TJPR - 3a Câmara Criminal - 0032205-66.2021.8.16.0021 - Cascavel - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ CARLOS DALACQUA - J. 10.10.2022). (g.n.) Todavia, entendo necessária a imposição de medidas cautelares diversas da prisão (CPP., art. 319) em razão destas não imporem uma restrição tão grave à liberdade individual do sentenciado e serem necessárias para se assegurar a aplicação da lei penal. Devem ser impostas as medidas cautelares plasmadas no artigo 319, incisos V e IX, do Código de Processo Penal, como forma de garantir a aplicação da lei penal, bem como para evitar a fuga do distrito da culpa. Assim, adequada a fixação do monitoramento eletrônico ao caso, por se tratar de medida necessária ao momento processual. Ressalta-se que a imposição da medida cautelar de monitoração eletrônica é compatível com a fixação do regime inicial semiaberto, pois a vigilância pelos órgãos oficiais sobre sua conduta será́ contínua quando não implantado em unidade penal de cumprimento da pena. Por conseguinte, nesse interregno de tempo, até que inicie o efetivo cumprimento da pena imposta, a imposição das medidas cautelares supracitadas se justifica. A propósito: HABEAS CORPUS CRIME – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LESÃO CORPORAL E AMEAÇA – PROFERIDA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA DECIDINDO PELO REGIME SEMIABERTO PARA O INÍCIO DO CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA-PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA – INSURGÊNCIA DA DEFESA – ALEGAÇÃO DE QUE A MANUTENÇÃO DO CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME MAIS GRAVOSO QUE O FIXADO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA FERE O PRINCÍPIO DA HOMOGENEIDADE COROLÁRIO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE – PLEITO PELA REVOGAÇÃO DA MEDIDA EXTREMA– CONCESSÃO -MANUTENÇÃO DA PRISÃO DO ACUSADO QUE SE APRESENTA MANIFESTAMENTE DESPROPORCIONAL NESTE MOMENTO PROCESUAL - MEDIDA CAUTELAR DE MONITORAÇÃO ELETRÔNICA DESCRITA NO ARTIGO 319 INCISO IX DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL APLICADA EM SEDE LIMINAR QUE SE MOSTRA SUFICIENTE NA ESPÉCIE - ORDEM CONCEDIDA. (TJPR - 1a Câmara Criminal - 0032653- 05.2021.8.16.0000 - Cornélio Procópio - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU BENJAMIM ACÁCIO DE MOURA E COSTA - J. 08.08.2021). (g.n.) HABEAS CORPUS. ART. 33, CAPUT, E ART. 35, CAPUT, DA LEI 11.343/06, ART. 12, CAPUT, DA LEI 10.826/03, ART. 330, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL, E ART. 309, CAPUT, DA LEI 9503/97. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA INCOMPATIBILIDADE DO REGIME INICIAL PARA CUMPRIMENTO DE PENA FIXADO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA – SEMIABERTO - COM A MANUTENÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR DE MONITORAÇÃO ELETRÔNICA. QUESTÃO DEVIDAMENTE APRECIADA PELO JUÍZO A QUO. CONHECIMENTO. FIXAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO NÃO CONFLITA NEM MESMO COM A MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA (MEDIDA MAIS GRAVOSA), E TAMPOUCO HÁ QUE SE FALAR EM INCOMPATIBILIDADE ENTRE O REGIME MENCIONADO E A SUBMISSÃO DA SENTENCIADA AO MONITORAMENTO ELETRÔNICO. COMPATIBILIDADE. PRECEDENTES. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA. (TJPR - 4a Câmara Criminal - 0039568- 70.2021.8.16.0000 - Catanduvas - Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU DILMARI HELENA KESSLER - J. 26.07.2021). (g.n.) Ante o exposto, nos termos dos artigos 282 e 316, ambos do Código de Processo Penal, REVOGO a PRISÃO PREVENTIVA do sentenciado ELIAS FELIPE DE MOURA, impondo-lhes as medidas cautelares previstas no artigo 319, incisos V e IX, da Lei Penal Adjetiva, quais sejam: a) Monitoramento eletrônico, pelo prazo de 150 (cento e cinquenta dias) dias, ao qual se estabelece as seguintes condições: I – Não sair da comarca em que reside sem prévia autorização do juiz competente; II – Recolher-se à sua residência às 21 horas, lá permanecendo até 06h do dia seguinte; III – Recolher-se à sua residência ininterruptamente durante os domingos e feriados; IV – Não retirar ou permitir que retirem a tornozeleira eletrônica; V – Não danificar ou permitir que danifiquem a tornozeleira eletrônica ou qualquer acessório que a acompanhe; VI – Recarregar todos os dias de forma integral o aparelho; VII – Comparecer ao local indiciado para manutenção do aparelho sempre que solicitado; VIII – Dirigir-se em local aberto, sempre que o sistema informar alerta luminoso de cor azul; IX – Obedecer a todas as orientações da Central de Monitoramento, devendo entrar em contato em caso de dúvida sobre o alerta, sendo que estes corresponderão: Alerta vibratório e luminoso roxo/rosa – ligar para a Central; Alerta vibratório e luminoso vermelho duplo – carregar a bateria; Alerta de som – ligar para a Central; Luz verde ou azul – tudo está correto. O decurso do prazo de 150 (cento e cinquenta) dias, por si só, NÃO autoriza a retirada da tornozeleira eletrônica. Isso poderá ocorrer apenas mediante decisão judicial motivada acerca da necessidade ou não de prorrogação do prazo. Assim, decorrido o prazo, certifique-se e dê-se vista ao Ministério Público, com urgência, intimando-se a defesa para manifestação em sequência e, por fim, retorne concluso para deliberação. 5.1.1. Expeça-se alvará de soltura e mandado de monitoração eletrônica, se por outro motivo não estiver preso. 5.1.2. Intime-se o sentenciado, por mandado, para que compareça a um dos Postos Avançados de Monitoração Eletrônica para a instalação do equipamento eletrônico, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de decretação de sua prisão, bem como para que seja admoestado das condições da presente decisão. Intime-o, ainda, de que o descumprimento de qualquer das condições constantes dessa decisão, dos deveres previstos no artigo 3º da IN nº. 44/2021 e de que a prática de novo crime poderá acarretar a decretação de prisão preventiva (art. 282, § 4º, do Código de Processo Penal). 5.2. Destinação dos bens apreendidos e da fiança Não há bens apreendidos ou fiança recolhida nos autos. 5.3. Reparação de danos Em que pese a existência de pedido de fixação de danos morais causados pela infração, deduzido na vestibular acusatória e reforçado em alegação finais apresentadas pelo Ministério Público, não há como acolher a referida pretensão, razão pela qual deixo de fixa-los (CPP., art. 387, inc. IV). Explico. É cediço que o dano moral coletivo se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e desde que fique demonstrado que a conduta agride, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva, dispensando-se a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. No caso concreto, pudemos vislumbrar que o sentenciado portou ilegalmente arma de fogo e adquiriu produto de crime, sendo que as circunstâncias dos delitos não foram anormais ou desconexas daquilo que se é considerado habitual nesta espécie delitiva. Diante disso, verifica-se que não há elementos que permitam dizer que a conduta do sentenciado tenha atributos de gravidade e intolerabilidade exacerbadas, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. Acerca do tema, colho os seguintes escólios jurisprudenciais: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO - ABSOLVIÇÃO NA ORIGEM - RECURSO MINISTERIAL - PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÃO NECESSÁRIA - PROVAS SUFICIENTES - POSSE DE MUNIÇÕES - CRIME MATERIALMENTE TÍPICO - MUNIÇÕES DE CALIBRE 9MM - USO PERMITIDO - DESCLASSIFICAÇÃO - MINORANTE DO TRÁFICO - NÃO CABIMENTO - REGIME ABERTO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - DESCABIMENTO - DANOS MORAIS COLETIVOS - FIXAÇÃO - INVIABILIDADE. 1. No caso de o telefone ser apreendido durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, em que há autorização judicial prévia para a prospecção de bens de interesse criminalístico, não há óbice para se acessar o seu conteúdo já armazenado, porquanto necessário às investigações, sendo prescindível nova autorização judicial para análise dos dados neles constantes. 2. Comprovado que as drogas e as munições apreendidas eram de propriedade dos réus, e que os entorpecentes não se destinavam unicamente ao consumo pessoal, deve ser a sentença absolutória reformada, para condenação de ambos pelos crimes previstos no art. 33 da Lei 11.343/06 e no Estatuto do Desarmamento. 3. Os acusados devem ser condenados também pelo delito descrito no art. 35 da Lei 11.343/06, na medida em que suficientemente comprovado o efetivo vínculo associativo entre eles, voltado à prática da traficância, e não apenas a existência de mero concurso de pessoas. 4. O delito de posse ilegal de munições é crime de mera conduta e de perigo abstrato, sendo bastante para a sua caracterização a simples prática de uma das condutas previstas no tipo penal, sem necessidade da efetiva exposição de outrem a risco, o qual é presumido. 5. Tendo em vista que as munições 9mm passaram a ser de calibre permitido, consoante Decreto 9.847, de 25 de junho de 2019 e Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, faz-se necessária a rec lassificação benéfica e condenação dos acusados pelo crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03 (e não no art. 16 da mesma lei). 6. Integrando os agentes organização criminosa e, ainda, sendo um deles reincidente, inviável a aplicação da causa de diminuição descrita no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 7. Fixadas as penas corporais em patamares acima de 04 (quatro) anos, não se mostra possível a fixação do regime prisional aberto, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. 8. Embora o sujeito passivo dos delitos em espécie seja a coletividade, ante a ausência de dispositivo legal de exata correlação, para efeitos penais, a falta de determinação e individualização da pessoa do ofendido (a que se refere o artigo 387, IV, CPP), afasta o cabimento da fixação, pelo juízo criminal, dos danos morais (coletivos) causados pelos réus. V.V. 1. Se os indícios que balizam o envolvimento de um dos recorrentes com substâncias entorpecentes e munição não restaram confirmados no decorrer da instrução probatória, ante a inexistência de prova suficiente a fundamentar um decreto condenatório, a absolvição daquele é medida que se impõe, notadamente em observância ao princípio "in dubio pro reo". 2. Não havendo provas suficientes a demonstrar a existência de uma estrutura permanente e organizada dedicada à venda de drogas, não resta configurado o crime disposto no artigo 35 da Lei Antidrogas. (TJ-MG - APR: 10687190008320001 Timóteo, Relator: Paulo Calmon Nogueira da Gama, Data de Julgamento: 22/09/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 24/09/2021). (g.n.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. ESTACIONAR VEÍCULO EM VAGA RESERVADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INFRINGÊNCIA A VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE OU ATRIBUTOS DA GRAVIDADE E INTOLERABILIDADE. MERA INFRINGÊNCIA À LEI DE TRÂNSITO. I - Na origem, trata-se de ação civil pública visando à condenação do réu, condutor de veículo automotor, ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência. II - A ação foi extinta, sem resolução de mérito, em razão da falta de interesse processual e ausência de respaldo legal para a pretensão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, manteve a sentença. III - O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano, independente de atributos da pessoa humana (dor, sofrimento etc.), e que se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e fique demonstrado que a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva. Preenchidos esses requisitos, o dano configura-se in re ipsa, dispensando, portanto, a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. IV - No caso, o pedido veiculado na exordial é de condenação do réu condutor de veículo automotor ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência; ausentes peculiaridades do caso, como reincidência ou maior desvalor na conduta da pessoa natural. Em casos tais, esta Segunda Turma não tem acolhido a pretensão condenatória, considerando a ausência de elementos que, não obstante a relevância da tutela coletiva dos direitos da pessoa com deficiência ou idosa, evidenciem que a conduta agrida, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade. Precedentes: AgInt no AREsp 1826143/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1/10/2021; AgInt no AREsp 1820258/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021; AgInt no AREsp 1758510/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021. V - Assim, na hipótese em exame, não há como afastar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a conduta em tela tenha infringido valores fundamentais da sociedade ou que possua atributos da gravidade e intolerabilidade. O caso trata, pois, de mera infringência à lei de trânsito, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. A propósito: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018. VI - Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (STJ - AREsp: 1927324 SP 2021/0199195-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022). (g.n.) Com base no exposto, inviável a condenação do sentenciado ao pagamento de danos morais coletivos. 5.4. Intimação da vítima A Secretaria deverá observar o artigo 809, caput e parágrafo único, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça, in verbis: “Publicada a sentença, a vítima, se houver, será comunicada da parte dispositiva e informada sobre o código de acesso ao processo, por mandado ou no balcão da secretaria. Parágrafo único. A comunicação da vítima poderá ser feita por meio eletrônico, com encaminhamento do arquivo integral da sentença e da chave de acesso ao processo”. 5.5. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 1) procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 824, inciso VIII, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 2) expeça-se e remeta-se a guia de execução definitiva do réu condenado, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso o réu não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formará autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios à vara que estiver procedendo à execução (Resolução nº. 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 3) remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo das custas e da pena de multa; 4) intime-se o sentenciado para o recolhimento dos valores das custas processuais e da pena de multa devidas, no prazo de 10 (dez) dias, acompanhado o mandado das respectivas guias (Instrução Normativa nº 65/2021, art. 1º e 2º, observadas as alterações promovidas pela IN nº. 77/2021); 5) comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. João Gustavo Rodrigues Stolsis Juiz de Direito

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Processo nº 0004995-23.2023.8.16.0101

ID: 294265341

Tribunal: TJPR Órgão: Vara Criminal de Jandaia do Sul Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0004995-23.2023.8.16.0101

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE

Conclusão

Advogados:

ANDRÉ LUIZ GUERINO DA SILVA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fo… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0004995-23.2023.8.16.0101 SENTENÇA 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em face de ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE, qualificado no mov. 31.1, como incurso nas sanções do artigo 306, caput, da Lei 9.503/1997 (Fato 01) e artigo 309, caput, da Lei 9.503/1997 (Fato 02), na forma do art. 69, do Código Penal, por pretensa prática dos fatos descritos no mov. 31.1. Vejamos: FATO 01 “No dia 19 de dezembro de 2023, por volta das 23h34min, em via pública, na Rua dos Patriotas, em frente ao numeral 534, Centro, neste Município e Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE, com consciência e vontade, conduzia o veículo automotor VW/GOL, placas AKJ5027, com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, conforme teste de alcoolemia de mov. 1.10, que constatou concentração alcoólica de 0,56 mg/L (miligrama por litro alveolar)” FATO 02 “Nas mesmas condições de tempo e local dos fatos anteriores, o denunciado ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE, com consciência e vontade, conduziu o veículo automotor VW/GOL, placas AKJ-5027, em via pública, sem a devida permissão ou habilitação para dirigir, gerando perigo concreto de dano, inclusive ocasionou um acidente de trânsito, na medida em que colidiu com o veículo VW/T-Cross, placas SDS-3C35, conforme boletim de ocorrência de mov. 2023/1448435. ” Ocorreu a prisão em flagrante (mov. 1.3), a qual foi homologada, nos termos da decisão de mov. 8.1. O Ministério Público se manifestou pela homologação da prisão em flagrante e concessão de liberdade provisória (mov. 11.1). O Juízo constatou que o acusado havia praticado crime similar em data pretérita, no entanto, apesar de ter recebido a liberdade provisória nos autos do referido processo (autos nº 0000299- 51.2022.8.16.0109), cometeu o crime que ora se imputa, demonstrando descaso com a justiça. Diante destes motivos, decretou a prisão preventiva do acusado (mov. 14.1). O custodiado constituiu defensor (mov. 19.1/2) e, ao mov. 21.1/2, pleiteou a revogação da prisão preventiva, com o que anuiu o Ministério Público (mov. 29.1). O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do acusado em 24/12/2023 (mov. 31.1), sendo recebida no dia 26/12/2023 (mov. 33.1). O acusado foi regularmente citado (mov. 76.2) e apresentou resposta à acusação através do seu patrono (mov. 81.1). Sobreveio decisão revogando a prisão preventiva e concedendo liberdade provisória. Ademais, não se tratando de hipótese de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução (mov. 88.1). Expedição de alvará de soltura (mov. 89.1). O réu apresentou petição informando o interesse em utilizar a prova emprestada dos autos nº 0000400-88.2022.8.16.0109, em vez de instaurar novo processo de incidente de insanidade mental (mov. 102.1). Audiência de instrução e julgamento realizada no dia 12/03/2025 (mov. 140.1). Na ocasião foi inquirida as testemunhas Sérgio de Oliveira Chipil (mov. 141.1) e Anderson Sobiecki Lino (mov. 141.2). Ao final, foi realizado o interrogatório do réu Endreu Kennedy Gomes Trindade (mov. 141.3). Encerrada a instrução processual com a juntada da certidão atualizada dos antecedentes criminais do acusado emitida pelo Sistema Oráculo (mov. 142.1) O Ministério Público, em sede de alegações finais (mov. 145.1), pugnou pela procedência total da pretensão punitiva para o fim de condenar o réu pela prática dos crimes esculpidos nos artigos 306 e 309, ambos do Código de Trânsito Brasileiro, combinado com o artigo 69, ambos do Código Penal, por entender comprovadas a autoria e materialidade delitiva. Na dosimetria da pena, na primeira etapa, diante da existência de 01 (uma) circunstância judicial desfavorável, com relação às consequências do crime, postulou pela fixação da pena-base acima do mínimo legal. Na segunda etapa, indicou a ausência de circunstâncias agravantes e atenuantes a serem consideradas. Chegado na terceira etapa, apontou a inexistência de causas de aumento e/ou diminuição da pena. Requereu a aplicação do regime inicial aberto e destacou a impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito diante de circunstância judicial desfavorável. No entanto, apontou a possibilidade da suspensão condicional da pena. Por fim, postulou pela fixação de danos no valor de R$ 5.000,00. De igual modo, a Defesa apresentou alegações finais (mov. 154.1). Preliminarmente apontou a inimputabilidade do acusado, pugnando pela sua absolvição, nos termos do artigo 386, VI, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente pugnou pela absolvição com base no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, bem como a possibilidade de este responder em prisão domiciliar ou de responder em liberdade em eventual condenação. Por fim, requereu a gratuidade de justiça, ante a hipossuficiência do acusado. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de denúncia em face de ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE com incurso nas sanções dos artigos 306 e 309, caput, da Lei 9.503/1997, na forma do artigo 69 do Código Penal. 2.1. Preliminares 2.1.1. Da inimputabilidade A defesa apontou a inimputabilidade penal do acusado com fundamento no artigo 26 do Código Penal, sustentando a sua incapacidade diante da alegação de dependência química. Como fundamento, apresentou documentação de internação do réu (mov. 124.2), bem como um processo de interdição, sob autos nº 0000407-80.2022.8.16.0109. Contudo, tal alegação não encontra respaldo nos autos. Apesar de ter mencionado suposta dependência química e a existência de ação de interdição em curso, nenhum elemento técnico idôneo foi juntado aos autos principais que demonstre, de forma inequívoca, que o acusado, no momento dos fatos, estava inteiramente incapaz de compreender a ilicitude da sua conduta ou de se determinar de acordo com esse entendimento. O Superior Tribunal de Justiça têm firmado o entendimento de que a simples menção a processo de interdição ou dependência química não basta para a instauração automática do incidente de insanidade mental. Desse modo, é indispensável a existência de indícios concretos de anomalia psíquica relevante, aptos a gerar dúvida razoável sobre a higidez mental do réu, o que não foi evidenciado nos autos. Sobre o dispositivo legal em questão, veja-se: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CÁRCERE PRIVADO. PLEITO DEFENSIVO DE REALIZAÇÃO DE EXAME TOXICOLÓGICO PARA AFERIÇÃO DE INIMPUTABILIDADE OU SEMI-IMPUTABILIDADE DO PACIENTE. INDEFERIMENTO . NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. MODIFICAÇÃO DAS CONCLUSÕES DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE . REEXAME FÁTICO/PROBATÓRIO DOS AUTOS. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A realização do exame de insanidade mental não é automática ou obrigatória, devendo existir dúvida razoável acerca da higidez mental do acusado para o seu deferimento . 2. A alegação de dependência química de substâncias entorpecentes por parte do réu não implica obrigatoriedade de realização do exame toxicológico, ficando a análise de sua necessidade dentro do âmbito de discricionariedade motivada do Magistrado. 3. No caso, as instâncias ordinárias firmaram entendimento no sentido de que não existiriam provas no caderno processual ou ao menos indícios, de que o réu, ao tempo da infração, tivesse a capacidade de autodeterminação comprometida, de maneira que não se fazia útil o exame toxicológico . Para modificar tal conclusão, seria necessário o aprofundado reexame do acervo probatório da ação penal, providência que, sabidamente, é inviável na via estreita do habeas corpus. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no HC: 895926 GO 2024/0073083-1, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 13/05/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. RECEPTAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA PORQUE NÃO HOUVE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. PERÍCIA NÃO REQUERIDA PELA DEFESA. INEXISTÊNCIA DE DÚVIDAS SOBRE A HIGIDEZ MENTAL DO RÉU. CONCLUSÃO QUE NÃO PODE SER INFIRMADA NA VIA ELEITA, DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. AGRAVO DESPROVIDO . 1. A negativa de instauração do incidente de sanidade mental foi devidamente motivada, pois as instâncias ordinárias entenderam que não havia indícios aptos a demonstrar dúvida concreta acerca da integridade mental do Acusado. Afinal: "O mero fato do réu ser usuário de drogas não justifica a realização do incidente de insanidade mental" (STJ, AgRg no AgRg no AREsp n. 1 .103.859/TO, relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 5/2/2019, DJe de 13/3/2019). 2. Nos termos do art . 400, § 1.º, do Código de Processo Penal, o Juiz pode indeferir a produção de provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Desse modo, para se "chegar a uma conclusão diversa da exposta pelo Juízo processante, que entendeu, de forma motivada, que as provas requeridas e indeferidas eram prescindíveis, seria necessário a incursão no arcabouço fático e probatório dos autos principais, procedimento incabível na via eleita" ( AgRg no RHC 108.706/MG, Rel . Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 01/10/2019). 3. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no RHC: 182047 GO 2023/0191910-3, Relator.: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 28/08/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/08/2023) DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL E DEPENDÊNCIA TOXICOLÓGICA. NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA . AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. Caso em exame1 . Trata-se de apelação criminal defensiva em face de decisão interlocutória mista que indeferiu o pedido de instauração de incidente de insanidade mental requerido a pessoa denunciada nos crimes do artigo 35, caput (primeiro fato), artigo 33, caput (segundo fato), artigo 33, § 1º, inciso I (terceiro fato) e artigo 34, todos da Lei n. 11.343/2006.2 . A acusada foi absolvida em sentença prolatada nos autos de ação penal, subsistindo interesse, pela defesa técnica, no julgamento do presente recurso ante a interposição de recurso pelo órgão ministerial. II. Questão em discussão 3. A defesa técnica põe em discussão temas diversos no almejo de seu interesse, a saber: a) nulidade da decisão devido ao cerceamento de defesa; b) determinação da instauração do incidente de dependência química-toxicológica; c) prequestionamento da matéria arguida; e d) reconhecimento de error in judicando defronte à omissão, pelo julgador singular, na análise dos elementos concretos colacionados aos autos, designadamente os laudos médicos colacionados no feito . III. Razões de decidir 4. Ausente fundada dúvida sobre a higidez mental do requerente, não incorre em cerceamento de defesa a decisão que indefere o pedido de instauração de incidente de insanidade mental e dependência toxicológica, sendo o magistrado o destinatário da prova – artigo 400, § 1º, do Código de Processo Penal. 5 . Por outro lado, confere-se a nulidade arguida com fundamento na pretensão subsidiária relativa à existência de omissão, pelo julgador singular, na análise dos elementos do caso. 6. Sabe-se que é válida a fundamentação per relationem nas decisões judiciais. A técnica, contudo, exige tratamento satisfatório mínimo da matéria pelo julgador, com menção, ainda que sucinta e objetiva, de argumentação própria a par da ponderação do caso concreto .7. Não houve adoção de nenhuma argumentação própria e concreta acerca do (a) tema proposto pela defesa, (b) sobre os documentos médicos colacionados nos autos ou mesmo (c) a respeito da manifestação exarada pelo Ministério Público, senão para referendá-la in totum.7.1 . Também não se trata, a hipótese dos autos, de situação na qual o magistrado, por exemplo, prorroga medida que autoriza interceptação telefônica ou decide pela manutenção da prisão cautelar, limitando-se à menção dos termos da deliberação anterior (fundamentação per relationem a partir de pronunciamentos sucessivos, na qual se faz alusão à motivação do decisório inaugural).7.2. Tem-se, tão somente, referência às alegações do órgão acusador, sem qualquer transcrição ou menção ao que se entendeu como de maior relevância no pronunciamento, a ensejar, invariavelmente, a nulidade da decisão por ausência de fundamentação . IV. Dispositivo8. Recurso conhecido e provido, com comunicação ao Juízo de origem. (TJ-PR 00038228620248160146 Rio Negro, Relator.: cristiane tereza willy ferrari, Data de Julgamento: 20/02/2025, 5ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 21/02/2025) Ademais, o acusado prestou interrogatório, em sede de Inquérito Policial, de forma lúcida e coerente, por meio de mídia áudio visual (mov. 1.12), demonstrando ser capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, o que reforça a ausência de qualquer incapacidade mental manifesta. Sendo assim, diante da ausência de elementos probatórios mínimos a indicar a inimputabilidade, a preliminar deve ser rejeitada de plano, com o regular prosseguimento do julgamento de mérito. Ex positis, REJEITO a nulidade arguida. Não havendo outras preliminares a serem apreciadas, passo à análise do mérito. 2.2. Conjunto probatório O policial Sérgio de Oliveira Chipil relatou em Juízo (mov. 141.1) em suas palavras: “Me recordo dessa ocorrência. Eu estava de serviço no município de Jandaia do Sul, quando chegou solicitação para a gente atender um acidente de trânsito, em que um Gol havia colidido com um TCross. O Gol era conduzido pelo Endreu e veio a esbarrar nesse outro veículo. A equipe chegou no local e constatou que o mesmo estava com fala desconexa, com odor de bebida alcoólica, apresentava sinais de embriaguez. Devido ao fato, a equipe encaminhou ele à companhia de Polícia de Jandaia do Sul, onde foi feito o teste do etilômetro, e neste teste ficou identificado que o mesmo estava passando do limite permitido. Foi dado voz de prisão e o mesmo foi encaminhado para a Delegacia de Jandaia do Sul. Não me recordo se ele era habilitado. Eu confirmo o que estiver apontado em relação a isso no Boletim de Ocorrência. Fazem alguns anos do fato. Quem solicitou a equipe foi uma equipe da ROTAM, que viu a ocorrência, e como a minha equipe é titular da área eu fui juntamente com o soldado Sobiecki, e foi feito o atendimento desse acidente e constatada a embriaguez. O relato prestado em fase preliminar, por meio de mídia áudio visual, reproduz, em essência, o conteúdo acima alinhavado (mov. 1.5). De igual modo, o policial militar Anderson Sobiecki Lino relatou perante a autoridade judicial (mov. 141.2): “Essa ocorrência de direção perigosa se iniciou com a equipe da Rotam de Apucarana, e nós assumimos de início. O senhor Endreu no dia estava embriagado, com seu Gol e acabou esbarrando num veículo de uma moradora de Jandaia do Sul. Eu e meu parceiro cabo Chipil fomos até o local e demos seguimento aos procedimentos cabíveis. O teste do etilômetro acusou embriaguez e foi feita a apreensão do veículo dele, pois tinham débitos. A equipe da Rotam nos acionou porque somos a equipe diária, nós que atendemos esse tipo de ocorrência. A Rotam nos acionou depois do acidente, eles chegaram primeiro no local. Não me recordo se o acusado tinha habilitação. O relato prestado em Delegacia, por meio de mídia áudio visual, guarda semelhança com o acima transcrito. (mov. 1.7). Interrogado em fase pré-processual, o réu Endreu Kennedy Gomes Trindade (mov. 1.11/12) relatou: “Para evitar um acidente eu não aceitei o carro, eu acertei um poste. Deu uma ralada no outro carro, quando eu fui tirar o carro, acabou raspando. Quem teria causado o acidente foi o condutor do T-Cross, porque ela não deu seta para virar. Com relação a ingestão de bebida alcoólica, eu estava consciente. Eu não tirei CNH ainda porque não tive oportunidade.” Em audiência manifestou interesse em permanecer em silêncio (mov. 141.3) Essa foi a prova oral produzida. 2.2.1. Do crime do art. 306, caput, da Lei nº 9.503/1997 (FATO 01) A materialidade delitiva encontra-se comprovada no auto de prisão e flagrante (mov. 1.3), boletim de ocorrência (mov. 1.8), teste do etilômetro (mov. 1.10) e na prova oral coletada perante as Autoridades Policial e Judiciária. A autoria delituosa é certa e recai sobre a pessoa do acusado. Os depoimentos dos policiais Sérgio de Oliveira Chipil (mov. 141.1) e Anderson Sobiecki Lino (mov. 141.2), são coerentes ao relatarem que foram chamados pela equipe da ROTAM para atender a um acidente de trânsito envolvendo dois veículos, um VW/Gol, conduzido por Endreu, e um VW/T-Cross. Segundo informaram, ao chegarem ao local constataram que o motorista do Gol não possuía habilitação e que o automóvel apresentava pendências de licenciamento. Além disso, observaram que o acusado apresentava evidentes sinais de embriaguez, o que foi confirmado posteriormente por meio do teste do etilômetro, cujo resultado acusou teor alcoólico acima do permitido (mov. 1.10): “… A equipe chegou no local e constatou que o mesmo estava com fala desconexa, com odor de bebida alcoólica, apresentava sinais de embriaguez …“ (mov. 141.1) “… O teste do etilômetro acusou embriaguez e foi feita a apreensão do veículo dele, pois tinham débitos…” (mov. 141.2). Importante destacar que tais depoimentos foram prestados sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, sendo uníssonos, coerentes e em consonância com os demais elementos constantes dos autos. Como bem sedimentado pela jurisprudência, as palavras de agentes públicos no exercício regular de sua função gozam de fé pública, ainda mais quando não existem elementos que gerem descrédito ou suspeitas em suas alegações. Sobre o assunto, a jurisprudência: APELAÇÃO CRIMINAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306 DO CTB). PROCEDÊNCIA. APELO DA DEFESA. 1. Pretensão absolutória. Impossibilidade. Provas suficientes a demonstrar a autoria e materialidade delitivas. Crime praticado na vigência da Lei nº 12.760/2012. Perigo abstrato. Possibilidade de aferição da embriaguez por outros meios de prova. Auto de constatação de sinais. Testemunho de policiais. Validade e relevância. 2. Apenamento. Afastamento, de ofício, da pena substitutiva na modalidade prestação pecuniária (art. 43, I, do cp). Aplicação de prestação de serviços à comunidade. Inteligência do art. 312-a, da Lei nº 9.503/97 (código de trânsito), alterado pela Lei nº 13.281/2016. Recurso desprovido, com afastamento, ex officio, da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na modalidade prestação pecuniária, alterando-a para prestação de serviços à comunidade. 21. O conjunto probatório revela a autoria e materialidade do delito de embriaguez ao volante, sendo cogente a manutenção da sentença condenatória pela prática do delito tipificado no artigo 306 do código de trânsito. 2. A Lei nº 12.760/12 modificou o artigo 306 do código de trânsito brasileiro, a fim de dispor ser despicienda a avaliação realizada para atestar a gradação alcóolica, acrescentando ser viável a verificação da embriaguez mediante vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova, de modo a corroborar a alteração da capacidade psicomotora. No caso em apreço, praticado o delito na vigência da última modificação normativa, fato ocorrido em 12.12.2013, torna-se possível apurar o estado de embriaguez da acusada por outros meios de prova em direito admitidos (...) (stj. 6ª t, RHC 49.296- RJ, relª ministra Maria thereza de Assis moura, julg. 04.12.2014, dje 17.12.2014).3. Pela simples leitura dos relatos lançados pelos policiais, percebe-se a autenticidade de suas afirmações, além da coerência entre as mesmas, restando, à vista disso, aptas a apontar a autoria e materialidade delitivas, bem como da alteração da capacidade psicomotora do agente. 4. O artigo 312-a, da Lei nº 9.503/97 (código de trânsito), alterado pela Lei nº 13.281/2016, estabelece que a substituição da pena corporal deve ser realizada pela prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas. 3 (TJPR; ApCr 1613114-7; Curitiba; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Luis Carlos Xavier; Julg. 07/02/2019; DJPR 26/02/2019; Pág. 55) APELAÇÃO CRIME. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ARTIGO 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DO RÉU. 1. Alegada ausência de robustez probatória. Impossibilidade. Provas suficientes a demonstrar a autoria e materialidade delitivas. Crime praticado na vigência da Lei nº 12.760/2012. Validade da prova testemunhal que atesta a ocorrência do delito. Possibilidade de aferição da embriaguez por outros meios de prova. Validade e relevância do testemunho dos agentes policiais. 2. Pleito de compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência. Análise prejudicada. Equívoco da decisão de primeiro grau. Inexistência de reincidência. Aplicação da atenuante da confissão espontânea. Pena privativa de liberdade fixada no mínimo legal. Alteração ex officio apelação crime nº 1.738.783-02do regime prisional inicial. Substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. 3. Pleito de reconhecimento da inconstitucionalidade do instituto da reincidência. Inocorrência. 4. Prequestionamento da matéria. Recurso parcialmente provido, e nesta extensão, negado provimento, com alteração, de ofício, da pena privativa de liberdade, do regime prisional inicial, substituindo a privativa de liberdade por restritiva de direitos. 1. O conjunto probatório revela a autoria e materialidade do delito de embriaguez ao volante, sendo, portanto, cogente a manutenção da sentença pela prática do delito tipificado no artigo 306 do código de trânsito. 2. Ante a inexistência da reincidência e da presença da confissão espontânea extrajudicial, impõe-se alterar, de ofício, a pena privativa de liberdade para o mínimo legal, o regime prisional inicial, fixando pena restritiva de direitos. 3. (...) o Supremo Tribunal Federal admite o agravamento da pena em razão da reincidência, não entendendo haver ilegalidade ou inconstitucionalidade a ser reconhecida. 3. Habeas corpus conhecido em parte e, nessa extensão, denegado. (stf. HC: 108331 RS, Rel. Min. Cármen lúcia, j.em 20/05/2014, primeira turma, p. Em 13.06.2014) 4. Dá-se por prequestionada a matéria. Apelação crime nº 1.738.783-03 (TJPR; ApCr 1738783-0; Curitiba; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Luis Carlos Xavier; Julg. 05/04/2018; DJPR 22/05/2018; Pág. 230). O próprio réu, em sede de interrogatório na fase indiciária (mov. 1.11), confirmou ter ingerido bebida alcoólica, afirmando que estava “consciente” no momento da condução do veículo. Posteriormente, permaneceu em silêncio em Juízo (mov. 141.3), o que, embora um direito constitucional, não afasta os demais elementos de prova que corroboram a imputação penal. Nos termos do artigo 306 do referido diploma, para a caracterização do crime de embriaguez ao volante, exige-se a comprovação de que o condutor estava com concentração de álcool no sangue igual ou superior a 6 decigramas por litro, ou no ar alveolar igual ou superior a 0,3 miligrama por litro, ou ainda, a demonstração de sinais que indiquem alteração na sua capacidade psicomotora, conforme regulamentação do CONTRAN e como dispõe o inciso II do § 1° do art. 306, do CTB. No presente caso, a presença de tais elementos ficou evidenciada não apenas pelo resultado do teste de etilômetro (mov. 1.10), que aferiu o índice de 0,56 mg/L, mas também pelos relatos convergentes dos policiais militares e pelo próprio teor da confissão do acusado em sede policial. Tais provas demonstram, de forma segura, que o réu conduzia veículo automotor sob a influência de álcool, preenchendo-se, assim, os requisitos do tipo penal em questão. Acerca do tema, o entendimento jurisprudencial: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA AFASTADA . CRIME DE PERIGO ABSTRATO. RECURSO IMPROVIDO. 1. "O crime previsto no art . 306 do Código de Trânsito Brasileiro é de perigo abstrato, sendo suficiente, para a sua caracterização, que o condutor do veículo esteja com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou outra substância entorpecente, dispensada a demonstração da potencialidade lesiva da conduta" ( AgRg no REsp n. 1.854.277/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 25/8/2020, DJe de 31/8/2020) . 2. A inicial acusatória destacou que "o denunciado [...] foi encaminhado a 18ª DP para realização de exame pericial, oportunidade em que o exame clínico prévio constatou 'alteração da capacidade psicomotora pelo álcool'", não sendo necessário que a denúncia especifique qual teria sido a alteração psicomotora observada, uma vez que indicou o laudo médico que apontou a existência de alteração. 3. Recurso improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1896278 RJ 2020/0243547-3, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 06/03/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/03/2023) PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE . ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL - ANPP. DENÚNCIA RECEBIDA. DESCABIMENTO. RECUSA DA REALIZAÇÃO DO TESTE DE ALCOOLEMIA . VERIFICAÇÃO POR OUTROS MEIOS. EXAME CLÍNICO E DEPOIMENTO DOS POLICIAIS. POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que o acordo de não persecução penal, introduzido pela Lei n. 13.964/2019, no art . 28-A do CPP, não pode retroagir às ações penais cuja denúncia já tenha sido recebida até sua entrada em vigor, como ocorre na presente hipótese. 2. Esta Corte consolidou o entendimento de que, no crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, é admitida a comprovação da embriaguez por vídeo, testemunhos, exame clínico, perícia ou outros meios de prova em direito admitidos, na hipótese de recusa ao teste de alcoolemia. 3. No caso dos autos, além do exame clínico, houve a constatação da embriaguez pelos policiais envolvidos na ocorrência, circunstância que, por si só, comprova a prática criminosa. 4. Agravo regimental desprovido . (STJ - AgRg no AREsp: 2219532 GO 2022/0308782-8, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 20/06/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/06/2023) Portanto, resta demonstrada a alteração da capacidade psicomotora do acusado em razão do consumo de álcool, situação que configura, de forma inequívoca, o tipo penal descrito no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro. Ademais, a alegação defensiva de possível inimputabilidade não encontra amparo nos autos, uma vez que não foi produzido qualquer laudo médico ou prova técnica idônea que indique ausência de discernimento do réu ao tempo do fato. Ao contrário, sua conduta revela-se consciente e voluntária, inclusive pela tentativa de justificar sua direção e o acidente. Assim, diante da robustez do conjunto probatório, não pairam dúvidas quanto à autoria e materialidade delitiva, impondo-se a condenação do acusado pela prática do crime de embriaguez ao volante, previsto no artigo 306, caput, da Lei nº. 9.503/97. Não há causa de justificação a ser reconhecida capaz de excluir a ilicitude da conduta. Por outro lado, ao tempo do fato, o acusado era imputável, tinha consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa da praticada. Portanto, a conduta praticada configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece a repressão estatal. Ressalto, finalmente, que não milita em favor dele causa alguma de isenção de pena. 2.2.2. Crime do artigo 309, caput, da Lei nº. 9.503/97 (2º FATO) A materialidade delitiva encontra-se comprovada no auto de prisão e flagrante (mov. 1.3), boletim de ocorrência (mov. 1.8) e na prova oral coletada perante as Autoridades Policial e Judiciária. A autoria também é certa e recai sobre a pessoa do réu. Em sede policial (mov. 1.12), o acusado confessou que dirigia seu veículo sem habilitação: “Eu não tirei CNH ainda porque não tive oportunidade.” Tal confissão encontra amparo nas declarações prestadas pelos policiais militares que atenderam à ocorrência, os quais foram uníssonos ao afirmarem que o réu não apresentou qualquer documento que o habilitasse à condução de veículo automotor no momento dos fatos. Além disso, ressaltaram que o acusado conduzia o automóvel em estado de embriaguez, o que, por si só, já representa uma circunstância de elevado risco à segurança viária. De igual modo, oportuno ponderar que os depoimentos de policiais militares constituem meio probatório idôneo para o fim do deslinde da criminalidade, principalmente pelo fato de que a estes é atribuída a confiança estatal. E no mais, não existem elementos que gerem descrédito ou suspeitas em suas alegações. Sobre o assunto a jurisprudência já se manifestou: APELAÇÃO CRIMINAL. PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE. ART. 65 DO DECRETO-LEI Nº 3.688/41. LESÃO CORPORAL TENTADA. ART. 129, §9º, NA FORMA DO ART. 14, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. CRIMES DE TRÂNSITO. ARTS. 306 E 309, AMBOS DA LEI Nº 9.503/97. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. INVIÁVEL A APLICAÇÃO DE INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. APENAMENTO RATIFICADO. 1. Comprovada a existência dos fatos (perturbação da tranquilidade e tentativa de lesão corporal) e recaindo a autoria sobre a pessoa do acusado, descabe aventar fragilidade probatória para fins condenatórios. Nos crimes praticados no âmbito doméstico, a palavra da vítima assume especial relevância, merecendo ser considerada como prova apta a embasar o juízo condenatório (especialmente quando amparada pelos demais depoimentos colhidos). 2. Existência dos fatos (embriaguez ao volante e dirigir veículo automotor sem habilitação) e autoria devidamente comprovadas nos autos. Palavra dos policiais demonstrando tanto a alteração da capacidade psicomotora (comprovada também pelo teste do etilômetro) quanto o perigo de dano (demonstrado também pela documentação do Detran). Condenação confirmada. 3. Inviável a aplicação de internação compulsória, eis que ausente previsão legal. Demais disso, já havia sido determinado que o réu comprovasse documentalmente a sua submissão a tratamento contra alcoolismo, o que não foi cumprido. 4. Não há qualquer reparo a ser feito na dosimetria da pena, eis que fixada em respeito aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como de acordo com as peculiaridades do caso concreto (não sendo objeto de insurgência da defesa). RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. (TJRS; ACr 204414-23.2018.8.21.7000; Caxias do Sul; Quinta Câmara Criminal; Relª Desª Lizete Andreis Sebben; Julg. 27/03/2019; DJERS 10/04/2019). Ademais, conforme entendimento pacífico da jurisprudência, o tipo penal previsto no artigo 309 do CTB exige, além da condução de veículo sem habilitação, a demonstração de perigo concreto de dano, o que está caracterizado no presente caso pelo fato de o réu, não habilitado, ter se envolvido em acidente de trânsito em via pública, sob efeito de álcool, colidindo com outro veículo (T-Cross), conforme registrado no boletim de ocorrência (mov. 1.8) e corroborado pela prova testemunhal. Sobre o tema veja-se a jurisprudência: PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PENAL. ARTIGOS 306 E 309, AMBOS DA LEI N . 9.503/1997 ( CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - CTB). POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO ENTRE OS REFERIDOS DELITOS. PROCESSOS EM ANDAMENTO COM RECURSO ESPECIAL VERSANDO SOBRE IDÊNTICA QUESTÃO DE DIREITO . SUSPENSÃO. RECURSO ESPECIAL AFETADO PARA JULGAMENTO PELA TERCEIRA SEÇÃO SOB RITO DOS REPETITIVOS. 1. Delimitação da controvérsia: "possibilidade de aplicação do instituto da consunção aos crimes de embriaguez ao volante (art . 306 do CTB) e o de condução der veículo automotor sem a devida permissão para dirigir ou habilitação (art. 309 do CTB)". 2. Suspensão dos processos nos quais interpostos recursos especiais que versem sobre idêntica questão de direito, estejam eles nos Tribunais de origem ou nesta Corte; 3 . Afetação do recurso especial ao rito previsto nos artigos 1.036 ao 1.041, todos do Código de Processo Civil - CPC, e 256 ao 256-X, todos do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ. (STJ - ProAfR no REsp: 2050957 SP 2023/0038010-7, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 12/09/2023, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 22/09/2023) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIMES DE TRÂNSITO. ARTIGOS 306 E 309 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - CTB . DIRIGIR SEM HABILITAÇÃO. CRIME DE PERIGO CONCRETO. HIPÓTESE DOS AUTOS. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE . TESTE DO BAFÔMETRO. REALIZAÇÃO VOLUNTÁRIA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA . INCIDÊNCIA DO ÓBICE DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INVIABILIDADE . CONDUTAS AUTÔNOMAS. SÚMULA N. 83/STJ. SUBSTITUIÇÃO DA PENA . MEDIDA NÃO RECOMENDADA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVADA A SIMILITUDE FÁTICA. DEFENSOR DATIVO . HONORÁRIOS. PEDIDO. FORMULAÇÃO NA ORIGEM. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE PROVIDO . 1. "Nos termos dos precedentes desta Corte, o crime tipificado no art. 309 do Código de Trânsito Brasileiro é de perigo concreto, sendo necessária a ocorrência de perigo real ou concreto, diante da exigência contida no próprio texto do dispositivo" (AgRg no AREsp 1.027 .420/SE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 14/3/2017, DJe de 22/3/2017), como na presente hipótese, diante da ocorrência do perigo concreto. Assim, descabido o acolhimento do pedido de absolvição, embora a decisão por mim proferida tenha se referido à conduta como sendo de perigo abstrato, o que não é o caso, segundo a orientação jurisprudencial desta Corte. 2 . Submetido o réu voluntariamente ao teste do bafômetro, afasta-se a alegação de nulidade na realização do exame. Incide o óbice do enunciado n. 7 da Súmula do STJ, porquanto a análise da matéria não prescinde do revolvimento do conteúdo fático-probatório reunido nos autos. 3 . Em relação ao princípio da consunção, incidente o verbete n. 83 da Súmula desta Corte, pois o v. aresto recorrido está em harmonia com a jurisprudência deste Superior Tribunal. É inviável o reconhecimento da consunção no tocante aos delitos previstos nos arts . 306 e 309 do CTB, quando um não constitui meio para a execução do outro, mas sim infração penal autônoma. 4. Inviabilizado o recurso especial pela alínea c do permissivo constitucional, pois não comprovada a similitude fática entre o aresto recorrido e os trazidos à colação, nos termos dos arts. 1 .029, § 1º, do Código de Processo Civil/2015 - CPC e 255, § 1º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ. 5. Esta Corte tem se posicionado no sentido de que os honorários do defensor dativo são de responsabilidade do Estado, nos termos do art. 22, § 1º, da Lei n . 8.906/1994, devendo o pedido de arbitramento ser formulado na origem. Precedentes. 6 . Agravo regimental parcialmente provido. (STJ - AgRg no AgRg no AREsp: 1556343 SC 2019/0233027-4, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 06/10/2020, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/10/2020) Do conjunto probatório, colhe-se a manifesta imprudência do acusado, que, mesmo sem habilitação, conduzia veículo automotor sob efeito de álcool, durante o período noturno, em via pública, vindo inclusive a colidir com outro automóvel, circunstância que evidencia o perigo concreto de dano à segurança viária. Sob este enfoque, tem-se que o condutor deve ter habilidade e pleno conhecimento das cautelas necessárias que deve adotar para trafegar em vias públicas ou rodovias. Por isso é indispensável que se passe por todo o processo de aprendizagem que culminará na concessão da licença para conduzir determinados meios de transporte. É bom lembrar que cada meio de transporte possui suas peculiaridades, as quais devem ser repassadas por profissional capacitado aos interessados em aprender como dirigir cada uma deles. É exatamente por esse motivo que as CNHs são divididas em categorias. Diante desse contexto, não há como afastar a conclusão de que as provas reunidas nos autos comprovam, de forma conjunta, a materialidade e a autoria delitiva, além de evidenciar a previsibilidade do resultado e o nexo causal entre a conduta imprudente de ENDREU, que dirigia embriagado e sem habilitação, e os riscos concretos gerados à segurança viária, consubstanciados na colisão com outro veículo. A conduta praticada pelo acusado, portanto, subsume-se, perfeitamente, ao tipo penal incriminador descrito no artigo 309, da Lei nº. 9.503/97, sendo, portanto, típica. Não há causa de justificação a ser reconhecida capaz de excluir a ilicitude da conduta. Por outro lado, ao tempo do fato, o acusado era imputável, tinha robusta consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa da praticada. Portanto, a conduta praticada configura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual merece a repressão estatal. Ressalto que não milita em favor dele causa alguma de isenção de pena. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva Estatal, a fim de CONDENAR o réu ENDREU KENNEDY GOMES TRINDADE como incurso nas sanções dos artigos 306, caput e 309, caput, ambos da Lei n°. 9.503/97, observada a regra do artigo 69, do Código Penal. Condeno o sentenciado, ainda, ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. Deixo de analisar o pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita por não ser esse o Juízo competente para tanto. Em abono: PENAL E PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. PRELIMINARES. 1) PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. NÃO CONHECIMENTO. 2) SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REVISÃO CRIMINAL SEM EFEITO SUSPENSIVO. REJEITADA. 3) PRISÃO DOMICILIAR. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. NÃO CONHECIMENTO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DIANTE DE DEPOIMENTO COMPROVADAMENTE FALSO (ART. 621, INC. II, DO CPP). IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS DA ALEGAÇÃO. 01. Condenado à pena de 12 (doze) anos de reclusão em regime fechado, pela prática do crime previsto no art. 217-A, c/c art. 226, inciso II, todos do Código Penal Brasileiro (CPB). 02. Inicialmente, quanto ao pedido de isenção de custas processuais com concessão da justiça gratuita, tem-se que sua análise compete ao juízo das execuções, não devendo o pleito ser conhecido por este e. Tribunal. (...). (TJCE; RevCr 0620002-02.2020.8.06.0000; Seção Criminal; Rel. Des. Mário Parente Teófilo Neto; DJCE 08/07/2020; Pág. 197). (g.n.) 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1. Artigo 306, caput, da Lei nº. 9.503/97 4.1.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se normal à espécie delitiva. O sentenciado, nos moldes da Súmula nº. 444 do STJ, não registra antecedentes criminais (mov. 142.1). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social. Os motivos do crime foram comuns à espécie delitiva em apreço. As circunstâncias do crime não prejudicam o réu. As consequências do crime foram graves, uma vez que o réu, ao dirigir sem a devida permissão/habilitação, ocasionou acidente de trânsito, conforme registrado no boletim de ocorrência (mov. 1.8). Não há se falar em comportamento vitimológico in casu. 4.1.2. Pena base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que dos oito critérios legais para a fixação da pena-base um deles foi valorado de forma desfavorável, referente às consequências do crime, razão pela qual fixo a pena-base em 09 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção e 13 dias-multa. 4.1.3. Circunstâncias legais Não há incidência de circunstâncias agravantes previstas no artigos 61 do Código Penal. Há incidência da confissão espontânea no caso concreto (art. 65, III, d, do CP), tendo em vista ter sido considerada na fundamentação (Enunciado 545 do STJ). Por essas razões, deve ser atenuada a pena base anteriormente definida em 1/6, fixando-se a pena intermediária em 08 (oito) meses e 04 (quatro) dias de detenção e 12 dias-multa. 4.1.4. Causas de aumento e diminuição da pena Não existem. 4.1.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima, fica a pena do acusado estabelecida em 08 (OITO) MESES E 04 (QUATRO) DIAS DE DETENÇÃO E 12 DIAS-MULTA. Com fundamento no art. 49, § 1º do Código Penal, fixo o valor do dia multa em 1/30 do maior salário mínimo vigente na época dos fatos. 4.1.6. Proibição de obter a permissão para dirigir Considerando que o réu Endreu Kennedy Gomes Trindade não possui habilitação para conduzir veículo automotor, conforme declarado por ele próprio em fase indiciária (mov. 1.11/12), aplico-lhe a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, com previsto no preceito secundário do tipo penal, pelo prazo de 01 (um) ano, observando-se o art. 293, § 2°, do CTB. O prazo é adequado diante das circunstâncias do caso concreto, especialmente considerando a prática de dois crimes de trânsito em concurso material (arts. 306 e 309 do CTB) e a existência de uma circunstância judicial desfavorável, o que demonstra a gravidade da conduta e a necessidade de imposição da medida. 4.1.7. Regime inicial de cumprimento da pena e Detração Assim, em vista da quantidade da pena aplicada, das circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME ABERTO com fulcro no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal c/c. artigo 115 da Lei nº. 7.210/1984, observado o cumprimento das seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 21h00min na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 21h00min dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, na forma prevista na Portaria 20/2024 desta Vara Judicial. Considerando que eventual detração (ar. 387,§ 2°, do CPP) operada nestes autos não teria o condão de alterar o regime de cumprimento de pena fixado, deixo de aplicá-la. 4.1.8. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal, eis que recai sobre o réu circunstância judicial desfavorável, quanto às consequências do crime. Cabível a suspensão da pena (CP., art. 77), no entanto, deixo de aplicá-la por ser menos benéfica ao sentenciado, a julgar pelo quantum da pena fixado. 4.2. Artigo 309, caput, da Lei nº. 9.503/97 4.2.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se normal à espécie delitiva. O sentenciado, nos moldes de Súmula nº. 444 do STJ, não registra antecedentes criminais (mov. 142.1). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social. Os motivos do crime foram comuns à espécie delitiva em apreço. As circunstâncias do crime não prejudicam o réu. As consequências do crime foram graves, uma vez que o réu, ao dirigir sob efeito de álcool, ocasionou acidente de trânsito, conforme registrado no boletim de ocorrência (mov. 1.8). Não há se falar em comportamento vitimológico in casu. 4.2.2. Pena base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que dos oito critérios legais para a fixação da pena-base um deles foi valorado de forma desfavorável, referente as consequências do crime, razão pela qual fixo a pena-base em 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção. 4.2.3. Circunstâncias legais Não há incidência de circunstâncias agravantes previstas no artigos 61 do Código Penal. Há incidência da confissão espontânea no caso concreto (art. 65, III, d, do CP), tendo em vista ter sido considerada na fundamentação (Enunciado 545 do STJ). Por essas razões, deve ser atenuada a pena base anteriormente definida, fixando-se a pena intermediária em 06 (seis) meses de detenção, vez que limitada ao mínimo legal (Enunciado 231 do STJ). 4.2.4. Causas de aumento e diminuição da pena Não existem. 4.2.5. Pena Definitiva Feitas as considerações acima, fica a pena do acusado estabelecida em 06 (SEIS) MESES DE DETENÇÃO. 4.2.6. Regime inicial de cumprimento da pena e Detração Assim, em vista da quantidade da pena aplicada, das circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME ABERTO com fulcro no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal c/c. artigo 115 da Lei nº. 7.210/1984, observado o cumprimento das seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 21h00min na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 21h00min dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, na forma prevista na Portaria 20/2024 desta Vara Judicial. Considerando que eventual detração (ar. 387,§ 2°, do CPP) operada nestes autos não teria o condão de alterar o regime de cumprimento de pena fixado, deixo de aplicá-la. 4.1.7. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal, eis que recaí sobre o acusado circunstância judicial desfavorável, quanto às consequências do crime. Cabível a suspensão da pena (CP., art. 77), no entanto, deixo de aplicá-la por ser menos benéfica ao sentenciado, a julgar pelo quantum da pena fixado. 4.3. Concurso material de crimes Configuradas as regras previstas nos artigos 69 do Código Penal, pois o réu, mediante duas condutas, praticou dois crimes. Realizado o somatório das penas dos crimes dos artigos 306 (08 (OITO) MESES E 04 (QUATRO) DIAS DE DETENÇÃO E 12 DIAS-MULTA) e 309 (06 (SEIS) MESES DE DETENÇÃO), ambos da Lei n°. 9.503/97, em obediência ao disposto no artigo 69 do CP, fica a pena final do acusado estabelecida em 01 (UM) ANO 02 (DOIS) MESES E 04 (QUATRO) DIAS DE DETENÇÃO E 12 DIAS-MULTA), esta na proporção de 1/30 do salário mínimo nacional vigente à época do fato, em virtude da condição financeira do acusado. 4.3.1. Regime inicial de cumprimento de pena e detração Assim, em vista da quantidade da pena aplicada, das circunstâncias do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o REGIME ABERTO com fulcro no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal c/c. artigo 115 da Lei nº. 7.210/1984, observado o cumprimento das seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 21h00min na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 21h00min dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, na forma prevista na Portaria 20/2024 desta Vara Judicial. Considerando que eventual detração (ar. 387,§ 2°, do CPP) operada nestes autos não teria o condão de alterar o regime de cumprimento de pena fixado, deixo de aplicá-la. 4.3.2. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Inviável a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal, eis que recaí sobre o acusado circunstância judicial desfavorável, quanto às consequências do crime. Cabível a suspensão da pena (CP., art. 77), no entanto, deixo de aplicá-la por ser menos benéfica ao sentenciado, a julgar pelo quantum da pena fixado. 5. DISPOSIÇÕES FINAIS 5.1. Direito de apelar em liberdade Concedo ao réu o direito de apelar em liberdade, pois não se encontram presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva (CPP, art. 387, § 1º) nem para fixação de outras medidas cautelares. 5.3. Destinação de bens apreendidos e da fiança Não há bens apreendidos e nem fiança recolhida nos autos. 5.4. Reparação de danos Em que pese a existência de pedido de fixação de danos materiais ou morais causados pela infração, deduzido na vestibular acusatória (mov. 31.1) e reforçado em alegações finais apresentadas pelo Ministério Público, não há como acolher a referida pretensão, razão pela qual deixo de fixa-los (CPP., art. 387, inc. IV). Explico. É cediço que o dano moral coletivo se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e desde que fique demonstrado que a conduta agride, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva, dispensando-se a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. No caso concreto, pudemos vislumbrar que o sentenciado não agiu com dolo específico de violar valores fundamentais da coletividade ao praticar as condutas descritas nos artigos 306 e 309 da Lei 9.503/1997, tampouco houve demonstração inequívoca de que tais condutas tenham repercutido de forma negativa na ordem pública ou na moral social em grau suficiente para caracterizar um abalo à consciência ética coletiva. Diante disso, verifica-se que não há elementos que permitam dizer que a conduta do sentenciado tenha atributos de gravidade e intolerabilidade exacerbadas, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. Acerca do tema, colho os seguintes escólios jurisprudenciais: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO - ABSOLVIÇÃO NA ORIGEM - RECURSO MINISTERIAL - PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÃO NECESSÁRIA - PROVAS SUFICIENTES - POSSE DE MUNIÇÕES - CRIME MATERIALMENTE TÍPICO - MUNIÇÕES DE CALIBRE 9MM - USO PERMITIDO - DESCLASSIFICAÇÃO - MINORANTE DO TRÁFICO - NÃO CABIMENTO - REGIME ABERTO E SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - DESCABIMENTO - DANOS MORAIS COLETIVOS - FIXAÇÃO - INVIABILIDADE. 1. No caso de o telefone ser apreendido durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, em que há autorização judicial prévia para a prospecção de bens de interesse criminalístico, não há óbice para se acessar o seu conteúdo já armazenado, porquanto necessário às investigações, sendo prescindível nova autorização judicial para análise dos dados neles constantes. 2. Comprovado que as drogas e as munições apreendidas eram de propriedade dos réus, e que os entorpecentes não se destinavam unicamente ao consumo pessoal, deve ser a sentença absolutória reformada, para condenação de ambos pelos crimes previstos no art. 33 da Lei 11.343/06 e no Estatuto do Desarmamento. 3. Os acusados devem ser condenados também pelo delito descrito no art. 35 da Lei 11.343/06, na medida em que suficientemente comprovado o efetivo vínculo associativo entre eles, voltado à prática da traficância, e não apenas a existência de mero concurso de pessoas. 4. O delito de posse ilegal de munições é crime de mera conduta e de perigo abstrato, sendo bastante para a sua caracterização a simples prática de uma das condutas previstas no tipo penal, sem necessidade da efetiva exposição de outrem a risco, o qual é presumido. 5. Tendo em vista que as munições 9mm passaram a ser de calibre permitido, consoante Decreto 9.847, de 25 de junho de 2019 e Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, faz-se necessária a rec lassificação benéfica e condenação dos acusados pelo crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03 (e não no art. 16 da mesma lei). 6. Integrando os agentes organização criminosa e, ainda, sendo um deles reincidente, inviável a aplicação da causa de diminuição descrita no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 7. Fixadas as penas corporais em patamares acima de 04 (quatro) anos, não se mostra possível a fixação do regime prisional aberto, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. 8. Embora o sujeito passivo dos delitos em espécie seja a coletividade, ante a ausência de dispositivo legal de exata correlação, para efeitos penais, a falta de determinação e individualização da pessoa do ofendido (a que se refere o artigo 387, IV, CPP), afasta o cabimento da fixação, pelo juízo criminal, dos danos morais (coletivos) causados pelos réus. V.V. 1. Se os indícios que balizam o envolvimento de um dos recorrentes com substâncias entorpecentes e munição não restaram confirmados no decorrer da instrução probatória, ante a inexistência de prova suficiente a fundamentar um decreto condenatório, a absolvição daquele é medida que se impõe, notadamente em observância ao princípio "in dubio pro reo". 2. Não havendo provas suficientes a demonstrar a existência de uma estrutura permanente e organizada dedicada à venda de drogas, não resta configurado o crime disposto no artigo 35 da Lei Antidrogas. (TJ-MG - APR: 10687190008320001 Timóteo, Relator: Paulo Calmon Nogueira da Gama, Data de Julgamento: 22/09/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 24/09/2021). (g.n.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. ESTACIONAR VEÍCULO EM VAGA RESERVADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INFRINGÊNCIA A VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE OU ATRIBUTOS DA GRAVIDADE E INTOLERABILIDADE. MERA INFRINGÊNCIA À LEI DE TRÂNSITO. I - Na origem, trata-se de ação civil pública visando à condenação do réu, condutor de veículo automotor, ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência. II - A ação foi extinta, sem resolução de mérito, em razão da falta de interesse processual e ausência de respaldo legal para a pretensão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, manteve a sentença. III - O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano, independente de atributos da pessoa humana (dor, sofrimento etc.), e que se configura nos casos em que há lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e fique demonstrado que a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores fundamentais da sociedade, causando repulsa e indignação na consciência coletiva. Preenchidos esses requisitos, o dano configura-se in re ipsa, dispensando, portanto, a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. IV - No caso, o pedido veiculado na exordial é de condenação do réu condutor de veículo automotor ao pagamento de compensação por dano moral coletivo, em razão de ter estacionado em vaga reservada à pessoa com deficiência; ausentes peculiaridades do caso, como reincidência ou maior desvalor na conduta da pessoa natural. Em casos tais, esta Segunda Turma não tem acolhido a pretensão condenatória, considerando a ausência de elementos que, não obstante a relevância da tutela coletiva dos direitos da pessoa com deficiência ou idosa, evidenciem que a conduta agrida, de modo intolerável, os valores fundamentais da sociedade. Precedentes: AgInt no AREsp 1826143/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1/10/2021; AgInt no AREsp 1820258/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021; AgInt no AREsp 1758510/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 31/5/2021, DJe 2/6/2021. V - Assim, na hipótese em exame, não há como afastar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a conduta em tela tenha infringido valores fundamentais da sociedade ou que possua atributos da gravidade e intolerabilidade. O caso trata, pois, de mera infringência à lei de trânsito, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo. A propósito: REsp 1502967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018. VI - Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (STJ - AREsp: 1927324 SP 2021/0199195-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022). (g.n.) Com base no exposto, INDEFIRO o pedido de condenação do sentenciado ao pagamento de danos morais coletivos. 6. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 6.1. Procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 602, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 6.2. Expeça-se e remeta-se a guia de execução definitiva do réu condenado, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso o réu não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formará autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios à vara que estiver procedendo à execução (Resolução nº 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 6.3. Remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo da custa e da pena de multa; 6.4. Intime-se o réu condenado para o recolhimento do valor das custas processuais devidas e da pena de multa, no prazo de 30 (trinta) dias, acompanhados das respectivas guias; 6.5. Comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do art. 15, III, da Constituição Federal. 6.6. Tendo em vista que o condenado não possui Permissão para Dirigir ou Carteira Nacional de Habilitação, intime-se-o da imposição da penalidade de proibição de obter a habilitação para conduzir veículo automotor pelo prazo de 01 (um) ano, nos termos do artigo 292, §1º, do Código de Trânsito Brasileiro. Comunique-se a penalidade ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) e ao DETRAN, para fins de registro e controle, conforme dispõe o Ofício Circular nº 46/2016. 7. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. 8. Oportunamente, arquivem-se. Jandaia do Sul, datado e assinado digitalmente. Arthur Souza Quintanilha Da Silva Juiz Substituto

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Ministerio Publico Do Trabalho x Consórcio De Saúde Dos Municípios Do Oeste Do Paraná - Consamu

ID: 257715651

Tribunal: TJPR Órgão: Vara da Fazenda Pública de Cascavel Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 0023693-60.2022.8.16.0021

Data de Disponibilização: 16/04/2025

Polo Ativo:

MINISTERIO PUBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

CONSóRCIO DE SAúDE DOS MUNICíPIOS DO OESTE DO PARANá - CONSAMU

Conclusão

Advogados:

FERNANDA PADILHA BOEIRA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Vistos e examinados estes autos de “ Ação Civil Pública” n°. 023693- 60.2022.8.16.0021 ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho contra o Consórcio Intermunicipal Samu Oeste, já qualificados. 1. R… Vistos e examinados estes autos de “ Ação Civil Pública” n°. 023693- 60.2022.8.16.0021 ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho contra o Consórcio Intermunicipal Samu Oeste, já qualificados. 1. RELATÓRIO Ministério Público do Trabalho, inicialmente, ajuizou “AÇÃO CIVIL PÚBLICA” em face do Consórcio Intermunicipal SAMU OESTE, alegando, em síntese, que: em ação fiscal iniciada em dezembro de 2016 e concluída em abril de 2019, teria sido constatado que o réu estaria descumprindo a cota de pessoas com deficiência prevista na Lei nº 8.213/91; em razão da reincidência no não atendimento do comando legal, foi lavrado o auto de infração nº 21.667.594-9; em novembro de 2018, o réu contava com 656 (seiscentos e cinquenta e seis) empregados, sendo apenas 1 (um) com deficiência; o percentual para a implementação da cota de pessoas com deficiência naquele momento era de 4% (quatro por cento), o que equivali a 27 (vinte e sete) trabalhadores; em agosto de 2019, haveria um déficit de 28 (vinte e oito) trabalhadores para o preenchimento total da cota; o réu, em se tratando de consórcio público, estaria obrigado a realizar concurso público para a contratação de empregados com reserva de 5% (cinco por cento) das vagas para candidatos com deficiência; ainda, por se tratar de pessoa jurídica de direito privado que se submete ao regime celetista, o réu estaria obrigado a observar a cota mínima prevista na Lei nº 8.213/91; o concurso público regido pelo edital nº 04/2016 garantiria 5% (cinco por cento) das vagas para pessoas com deficiência, mas a maior parte seria destinada ao cadastro de reserva, havendo previsão de que quando o número de vagas for inferior a cinco, não seria possível a reserva de vagas para cotistas; assim, o cumprimento da Lei nº 8.213/91 seria prejudicado; o réu teria se negado a firmar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a resolução do caso; a Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, obrigaria os signatários a atingir metas de participação plena de pessoas com deficiência na vida social e no desenvolvimento com igualdade; o objetivo seria garantir a oportunidade de inserção no mercadoregular de trabalho das pessoas com deficiência e assegurar vias adequadas de reabilitação profissional; o acesso ao trabalho seria uma importante forma de combate à exclusão social e promoção de dignidade de pessoas com deficiência; “sem a existência do sistema de cotas e de todos os demais meios de proteção ao trabalho das pessoas com deficiência, seria muito difícil a inserção dessas pessoas no mercado de trabalho e, consequentemente, a concretização do direito à igualdade”; a Administração Pública seria o setor que menos cumpriria a obrigação de reserva de vagas; o Decreto nº 9.508/2019 estabeleceria o dever de as empresas públicas observarem o disposto no art. 93 da Lei nº 8.213/91; as pessoas com deficiência possuiriam direito de reserva de 5% (cinco por cento) das vagas em concursos públicos; no concurso público regido pelo Edital nº 04/2019, houve previsão de reserva de 5% (cinco por cento) das vagas, “sendo que no item 4.1.2 consta que quando o número de vagas é inferior a 5 (cinco) não será possível reserva de vaga imediata para candidatos portadores de deficiência”; tal circunstância estaria dificultando a nomeação de candidatos com deficiência; as vagas do cadastro de reserva seriam pulverizadas em diversos municípios da área de abrangência do réu, o que dificultaria a nomeação de mais de cinco candidatos por localidade; seria possível aplicar, analogicamente, o percentual de 20% (vinte por cento) para a reserva de vagas, previsto na Lei nº 8.112/90, até a implementação da cota legal; o réu não teria dado publicidade suficiente sobre a realização dos concursos; a dispensa de empregado integrante da cota legal somente poderia ocorrer após a contratação de substituto em condições semelhantes; objetivaria impedir que a infração à ordem jurídica continue a se repetir, a título de tutela inibitória; a conduta do réu teria causado dano social que deveria ser reparado, de forma preventiva-pedagógica e não apenas punitiva, no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser destinado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador ou instituição semelhante. Ao final, requereu a procedência da pretensão deduzida para compelir o réu a reservar 20% (vinte por cento) das vagas para pessoas com deficiência nos editais de concurso, com efetiva divulgação, a convocar e nomear tais candidatos de forma prioritária, bem como condená-lo ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Juntou documentos (eventos 1.5/1.9). Pelo r. despacho do evento 1.11, foi determinada citação do réu.Citado, o réu apresentou contestação no evento 1.19, brandindo, preliminarmente, a incompetência da Justiça do Trabalho, a falta de interesse processual e legitimidade ativa, bem como a limitação territorial dos efeitos da sentença. No mérito, sustentou, em resumo, que: observaria as regras de direito público para a admissão de servidores, devendo atuar conforme o princípio da legalidade estrita; não possuiria ampla liberdade para contratar pessoas com deficiência em razão da forma de ingresso dos empregados, bem como porque “não são todos os cargos que possuem a condição de aglutinar pessoas classificadas como PCD”; não poderia descumprir preceitos constitucionais a pretexto de cumprir outros; poderia ser compelido a utilizar nova forma de provimento das vagas, por meio de lista alternativa regional ou ato assemelhado, mas não poderia ser penalizado pelo descumprimento de um lei pelo qual não teria responsabilidade; a maior parte de seus profissionais, por exigência do serviço, deveriam possuir curso superior ou técnico, carteira nacional de habilitação na categoria “D” e curso para condutores de veículos de emergência, o que restringiria ainda mais o acesso a pessoas com deficiência; não poderia ser responsabilizado por um fenômeno social; daria ampla publicidade aos editais de concurso; não seria aplicável a vedação à dispensa de empregado com deficiência nos moldes pleiteados pelo autor; não seria devida a condenação de indenização por dano moral coletivo. Por fim, requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (eventos 1.15/1.18 e 1.20/1.50). O autor apresentou impugnação à contestação no evento 1.53. Instados sobre a dilação probatória (evento 1.54), o réu pugnou pela produção de prova oral (eventos 1.56 e 1.60), enquanto o autor manifestou desinteresse na produção de outras provas (evento 1.57). Pelo r. despacho do evento 1.61, foi determinada a intimação das partes para se manifestarem sobre o Tema 992 do Supremo Tribunal Federal, relativo acompetência para julgamento do feito, o que foi cumprido no evento 1.63 pelo réu e 1.64 pelo autor. Por meio da r. decisão do evento 1.65, foi determinada a remessa dos autos a esta Vara da Fazenda Pública da Comarca de Cascavel/PR. Pelos v. acórdãos dos eventos 1.72 e 1.87, a r. decisão do evento 1.65 foi mantida. Novamente instados sobre a dilação probatória (evento 7.1), o réu alegou desinteresse na produção de outras provas (evento 14.1), enquanto o autor requereu a designação de audiência de conciliação (evento 17.1), o que foi deferido pela decisão do evento 24.1. Na data aprazada, as partes pugnaram pela suspensão do processo pelo prazo de 30 (trinta) dias para a realização de levantamento de dados pelo réu, o que foi cumprido nos eventos 45.1/45.22, tendo o autor se manifestado a respeito no evento 48.1. Por meio do despacho do evento 51.1, foi anunciado o julgamento antecipado. Pelo despacho do evento 65.1, o julgamento foi convertido em diligências para oportunizar a manifestação do Ministério Público do Trabalho, o que foi cumprido no evento 72.1. Após, vieram os autos conclusos para sentença. É o breve relato do necessário.2. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de “AÇÃO CIVIL PÚBLICA” ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho contra o Consórcio Intermunicipal SAMU OESTE, por meio da qual objetiva compelir o réu a garantir a contratação legal mínima de pessoas com deficiência, bem como condená-lo ao pagamento de indenização por dano moral coletivo decorrente da inobservância das disposições legais nesse particular. Inicialmente, impõe-se a análise das preliminares de falta de interesse e de legitimidade ativa, bem como de extensão territorial dos efeitos da presente, brandidas pelo réu em sua contestação (evento 1.19). Da falta de interesse e legitimidade ativa Em sua defesa, o réu aventou que os direitos supostamente violados, nos termos da inicial, possuiriam natureza individual indisponível, de modo que o autor não possuiria interesse e legitimidade para defende-los por meio de ação coletiva. Todavia, tal alegação não pode ser acolhida. Com efeito, registre-se que a legitimidade ad causam decorre de um desdobramento da ideia da utilidade do provimento jurisdicional pedido, sendo que é parte legítima para exercer o direito de ação aquele que se afirma titular de determinado direito ou possui autorização legal para atuar em favor do titular, devendo figurar no polo passivo (réu) aquele a quem caiba o cumprimento de obrigação decorrente dessa pretensão.No presente caso, não há que se falar em natureza individual disponível da pretensão deduzida na inicial, pois o direito ao trabalho com igualdade das pessoas com deficiência possui caráter notoriamente difuso, transcendendo os interesses dos empregados do CONSAMU de ou eventuais candidatos à admissão, nos termos do art. 81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. De fato, interessa a toda a coletividade a garantia e efetivação desse direito social, considerando que se trata de medida apta a realizar a dignidade da pessoa humana e contribuir com a construção de uma sociedade justa e solidária, com a redução de desigualdades sociais e promoção do bem comum sem qualquer preconceito, o que constitui fundamento e objetivos fundamentais da República (art. 1º, inciso III 1 e art. 3º, incisos I, III e IV 2 , da Constituição Federal), além de dar concretude a compromisso internacional decorrente da promulgação interna da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto nº 6.949/2009) que possui status de emenda constitucional 3 . Assim, em se tratando de interesse difuso (ou coletivo latu sensu), o Ministério Público possui legitimidade para promover a defesa respectiva, nos termos dos arts. 82, inciso I 4 , do Código de Defesa do Consumidor e 5º, inciso I 5 , da Lei nº 7.347/85. 1 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana; 2 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 3 Constituição Federal, art. 5º, § 3º: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. 4 Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995) I - o Ministério Público, 5 Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).Por outro lado, destaque-se que o interesse de agir é composto pelo binômio necessidade-utilidade (ou para alguns necessidade-adequação), sendo a necessidade compreendida como a imprescindibilidade de a parte invocar o Poder Judiciário para ver tutelado seu interesse e a utilidade como a escolha do meio útil (adequado) ao que se busca com o aforamento da demanda. No presente caso, não há que se falar em falta de interesse por parte do Ministério Público, na medida em que a via eleita se revela adequada para os fins objetivados, bem como necessária, considerando a alegação de que o réu não estaria cumprindo as disposições legais relativas à contratação de número mínimo de empregados com deficiência, sendo a ordem judicial medida apta a reverter a situação de ilegalidade, se constatada após a resolução do mérito. Portanto, de rigor a rejeição das preliminares aventadas nesse particular. Da extensão territorial dos efeitos da sentença Melhor sorte não assiste ao réu ao pugnar pela limitação territorial dos efeitos da sentença a ser proferida na presente à Comarca de Cascavel/PR, com fulcro no art. 16 6 da Lei nº 7.347/85, pois tal dispositivo legal foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. A esse respeito, no julgamento do RE nº 1.101.937/SP, submetido ao Tema 1075 de repercussão geral, foi fixada a seguinte tese: 6 Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova."I - É inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo repristinada sua redação original. II - Em se tratando de ação civil pública de efeitos nacionais ou regionais, a competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor). III - Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional ou regional e fixada a competência nos termos do item II, firma-se a prevenção do juízo que primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de todas as demandas conexas" (Plenário. Rel.: Min. Alexandre de Moraes. DJ: 08/04/2021) (grifei). A redação original do mencionado dispositivo legal, repristinada pelo Supremo Tribunal Federal, preceitua que “a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, exceto se a ação for julgada improcedente por deficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova”, não havendo previsão de limitação territorial, como pretende o réu. Conseguintemente, impõe-se a rejeição da preliminar de limitação territorial dos efeitos da sentença. Mérito Do exame dos autos, extrai-se que a controvérsia reside na aventada responsabilidade do réu pelo descumprimento do dever legal contratação de percentual mínimo de empregados com deficiência, com observância dos parâmetros estabelecidos pelo art. 93 7 da Lei nº 7 Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção: I - até 200 empregados...........................................................................................2%; II - de 201 a 500.....................................................................................................3%; III - de 501 a 1.000.................................................................................................4%; IV - de 1.001 em diante. ........................................................................................5%.8.213/1991, o que daria ensejo à condenação do réu à adoção das medidas necessárias para a reversão desse quadro, bem como ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. Entrementes, a inobservância do dispositivo legal em comento é incontroversa, tendo em vista que confessada pelo réu em contestação (evento 1.19, p. 9), sob a justificativa de que a necessidade de contratação de pessoal por meio de concurso público inviabilizaria a admissão de empregados com deficiência em percentual mínimo. A respeito do tema, destaque-se que a pessoa com deficiência goza de especial proteção do Estado. Nas palavras no Min. Dias Toffoli, “a ordem constitucional brasileira, inaugurada em 1988, trouxe desde seus escritos originais a preocupação com a proteção das pessoas portadoras de necessidades especiais, construindo políticas e diretrizes de inserção nas diversas áreas sociais e econômicas da comunidade (trabalho privado, serviço público, previdência e assistência social)” 8 . Nessa linha de intelecção, a Constituição Federal estabeleceu o direito ao trabalho da pessoa com deficiência e a proibição de qualquer discriminação relativa ao salário ou aos critérios de admissão (art. 7º, inciso XXXI 9 ). O art. 37, inciso VIII, da Constituição Federal, por sua vez, assegurou a reserva de vagas em concursos públicos para as pessoas com deficiência, consagrando cláusula de proteção que viabilizou a política de ações afirmativas em favor de tais pessoas, senão vejamos: “ a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão”. 8 ADI 903, rel. min. Dias Toffoli, j. 22-5-2013, P, DJE de 7-2-2014. 9 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;Aos comandos constitucionais, soma-se, ainda, a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York), incorporada à legislação nacional com status de emenda constitucional porque aprovada conforme o procedimento do § 3º do art. 5º da Constituição Federal 10 , a qual, especialmente sobre o direito ao trabalho, assim dispõe: “ Artigo 4 1.Os Estados Partes se comprometem a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência. Para tanto, os Estados Partes se comprometem a: a) Adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção; (...) Artigo 27 1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Esse direito abrange o direito à oportunidade de se manter com um trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível a pessoas com deficiência. Os Estados Partes salvaguardarão e promoverão a realização do direito ao trabalho, inclusive daqueles que tiverem adquirido uma deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas, incluídas na legislação, com o fim de, entre outros: (...) e) Promover oportunidades de emprego e ascensão profissional para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, bem como assistência na procura, obtenção e manutenção do emprego e no retorno ao emprego; (...) g) Empregar pessoas com deficiência no setor público;”(grifei). 10 Art. 5º. (...) § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.Posteriormente, foi editada a Lei nº 13.146/2015, conhecida como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência ou Estatuto da Pessoa com Deficiência, a qual trata do direito ao trabalho dessas pessoas a partir do art. 34 11 . Todo esse arcabouço normativo legitima a instituição e a implementação, pelo poder público, de mecanismos compensatórios destinados a corrigir as desvantagens sociais que afetam essas pessoas, visando propiciar-lhes maior grau de integração e a viabilizar a sua efetiva participação, em condições de igualdade, na vida econômica, social e cultural. Nesse sentido, o Decreto nº 9.508/2018 e a Lei nº 8.112/90 estabeleceram o percentual mínimo e máximo da reserva de vagas às pessoas com deficiência em concursos públicos. Confira-se: Decreto nº 9.508/2018. “Art. 1º Fica assegurado à pessoa com deficiência o direito de se inscrever, no âmbito da administração pública federal direta e indireta e em igualdade de oportunidade com os demais candidatos, nas seguintes seleções: I - em concurso público para o provimento de cargos efetivos e de empregos públicos; e (...) § 1º Ficam reservadas às pessoas com deficiência, no mínimo, cinco por cento das vagas oferecidas para o provimento de cargos efetivos e para a contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, no âmbito da administração pública federal direta e indireta” (grifei). Lei nº 8.112/90: “Art. 5º São requisitos básicos para investidura em cargo público: § 2º Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis 11 Art. 34. A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. § 1º As pessoas jurídicas de direito público, privado ou de qualquer natureza são obrigadas a garantir ambientes de trabalho acessíveis e inclusivos.com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso” (grifei). Registre-se que o Decreto em questão revogou o art. 37 do de nº 3.298/99, o qual tratava do mesmo percentual mínimo e está previsto nos editais de concurso promovidos pelo CONSAMU (cf. eventos 1.27, p. 1; 1.33, p. 15; 45.4, p. 3). Assim, para promover o acesso das pessoas com deficiência ao trabalho, as entidades da Administração Pública, tais como o réu, devem reservar entre 5% (cinco por cento) e 20% (vinte por cento) das vagas disponibilizadas em concursos públicos para esse grupo, tendo sido demonstrado nos autos que o percentual mínimo é garantido pelo CONSAMU, como demonstram os editais anexados nos eventos 1.20/1.44 e 45.4/45.22. Todavia, tal conduta não se revelou suficiente para o cumprimento de outra obrigação legal, relativa ao preenchimento de, no mínimo, 5% (cinco por cento) dos cargos de trabalho por pessoas com deficiência (art. 93, inciso IV, da Lei nº 8.213/1991), considerando que o total de empregados informado em 2022 era de 1.179 (mil, cento e setenta e nove), enquanto apenas dois eram pessoas com deficiência (evento 17.2). Nesse tocante, se a satisfação de um dever legal – reserva de vagas em concurso público em percentual mínimo – não é suficiente para o atendimento de outra obrigação de natureza equivalente, é necessário que o ente público adote as medidas adequadas e disponíveis para a resolução do problema, tendo em vista os compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil e as disposições constitucionais relacionadas ao tema e destacadas alhures. Com efeito, não se pode admitir que a adoção de critérios mínimos de reserva de vagas em concursos públicos pelo réu, tão somente, caracterize tentativa suficientede atendimento às disposições legais sobre o número de empregados com deficiência, ainda que se considere que o estabelecimento do percentual (entre 5% e 20%) se trate de medida discricionária, pois a discricionariedade da Administração Pública deve se pautar na legalidade e convergir com as garantias e direitos fundamentais. Outrossim, é oportuno registrar que o réu não comprovou e nem sequer alegou que teria atuado de forma exaustiva para o preenchimento do número mínimo de cargos por pessoas com deficiência, pois os documentos anexados aos autos não possuem informações sobre a convocação de candidatos inscritos na reserva legal e eventual desistência posterior, o que poderia demonstrar, a princípio, que o estabelecimento de cota de 5% (cinco por cento) seria suficiente para o atendimento das disposições da Lei nº 8.213/91, mas que, por razões alheias à vontade da Administração, tal cumprimento restaria impossibilitado. Não há, ademais, comprovação de que, mesmo que observada a reserva legal máxima em concursos públicos (20%), a quantidade de candidatos inscritos como pessoas com deficiência não seria suficiente para o preenchimento de ao menos 5% (cinco) por cento do total de cargos do CONSAMU, ônus que lhe incumbia por força do art. 373, inciso II 12 , do Código de Processo Civil e que, a princípio, poderia fulminar a pretensão deduzida pelo autor, conforme o entendimento da Justiça do Trabalho nos seguintes precedentes: AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO. MULTA. RESERVA DE VAGAS PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E REABILITADOS NO QUADRO DE PESSOAL. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. A regra prevista no art. 93 da Lei n.º 8.213/1991, segundo a qual deve haver reserva de vagas para pessoas com deficiência e reabilitados nas empresas com 100 ou mais empregados, aplica-se indubitavelmente às empresas estatais. No entanto, como integrantes da Administração Pública Indireta, essas empresas 12 Art. 373. O ônus da prova incumbe: II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.devem observar a exigência de concurso público para investidura nos cargos vagos (art. 37, II da CRFB) e o princípio da legalidade administrativa. Assim, uma vez demonstrado que houve nos editais dos certames a reserva de vagas para PCD's/reabilitados e, contudo, o número de aprovados é ínfimo, não pode a empresa ser penalizada por descumprimento da cota do art. 93 da Lei n.º 8.213/1991, visto que a inobservância do percentual mínimo estabelecido ocorre por razões alheias à sua vontade. Desse modo, necessária a anulação do auto de infração, como bem entendeu o Juízo de origem. Recurso ordinário da ré desprovido. (TRT – 9ª Região – ROT 0001212-02.2021.5.09.0016. 3ª Turma. Rel.: Eduardo Milleo Baracat. DJ: 14/06/2023) (grifei). AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NÃO ATENDIMENTO DO PERCENTUAL MÍNIMO DE EMPREGADOS COM DEFICIÊNCIA OU REABILITADOS PREVISTO NO ARTIGO 93 DA LEI Nº 8.213/91. DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA ADOÇÃO DE TODAS AS MEDIDAS NECESSÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO. (...)Depreende-se do acórdão regional que a empresa logrou comprovar a adoção de todas as medidas cabíveis para preencher as cotas destinadas às pessoas com deficiência física ou reabilitadas, nos termos do artigo 93 da Lei nº 8.213/91, entretanto não conseguiu preencher o percentual mínimo de reserva legal. Assim, não há como puni-la pelo não preenchimento da totalidade das cotas estabelecidas. Não se pode penalizar a empresa que buscou, embora sem êxito, preencher a cota prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/91. A aplicação do citado dispositivo não pode se distanciar do princípio da razoabilidade, notadamente quando demonstrada a dificuldade de encontrar profissionais com deficiência e habilitados para o preenchimento do cargo. (...) (TST - RR-485-83.2010.5.09.0095, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DJ 22/11/2019) (grifei). Portanto, não havendo demonstração, por parte do réu, de que o número de inscritos ou de aprovados nos certames por si promovidos não seria suficiente para o preenchimento do número mínimo de cargos destinados às pessoas com deficiência, como nos precedentes em destaque, impõe-se a adoção das medidas pertinentes para a superação de tal irregularidade.A esse respeito, revela-se proporcional e razoável o acolhimento do pedido formulado pelo autor no tocante ao estabelecimento de reserva de 20% (vinte por cento) das vagas para pessoas com deficiência nos próximos concursos públicos realizados pelo réu. De fato, essa medida é necessária para o fim objetivado, considerando o não atendimento do art. 93 da Lei nº 8.213/1991, bem como aparentemente adequada para tal desiderato, pois pode permitir que mais pessoas com deficiência se inscrevam nos certames, atraídas pelo percentual mais elevado da reserva de vagas, aumentando, consequentemente, o número de aprovados na referida cota. Ademais, a adoção desse critério não traria prejuízo à Administração Pública, considerando que possui respaldo legal (art. 5º, § 2º da Lei nº 8.112/1991) e não caracteriza ônus desproporcional ou apto a influenciar a forma de admissão de empregados – continuará a se dar por meio de concurso público – ou o gasto com pessoal, pois a contratação dependerá do surgimento de vagas. Nesse sentido, também é pertinente a determinação de contratação prioritária de pessoas com deficiência até que seja atingido o percentual mínimo da Lei nº 8.213/1991, desde que seja observada a compatibilidade entre as limitações do empregado e as funções a serem exercidas, sem prejuízo de eventuais adaptações razoáveis pela Administração Pública (art. 3º, inciso VI 13 , da Lei nº 13.146/2015). 13 Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se: VI - adaptações razoáveis: adaptações, modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que a pessoa com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais;Em caso semelhante, guardadas as devidas proporções, já decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª região: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 93 DA LEI 8.213/91. CUMPRIMENTO DO PERCENTUAL MÍNIMO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NOS QUADROS DO RÉU. ENTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA X PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. Nos termos do artigo 93 da Lei 8.213/91, a empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5%(cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência, habilitadas, nas proporções correspondentes. Essa regra é extraída de postulados fundamentais, em especial do princípio da dignidade da pessoa humana, que também é norma jurídica positivada no ordenamento constitucional que, por ser dotada de eficácia e aplicabilidade imediata, vincula tanto o Estado como os particulares. Nesses termos, eventual conflito entre o princípio da dignidade de pessoa humana e o princípio da legalidade deverá ser analisado à luz da "Teoria da Colisão" criada pelo jus-filósofo alemão Robert Alexy, a exigir a adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito sobre a decisão que será adotada no caso concreto. Assim, em respeito ao previsto no artigo 1º, III, da CR/88 e na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao ordenamento doméstico com status de norma constitucional, bem como o disposto na Lei n.º 7.853/89 e na Lei n.º 13.146/15, exsurge o dever de a reclamada nomear os candidatos PCD's aprovados no concurso regido pelo Edital 01/2015, até que seja cumprido o percentual previsto no artigo 93 da Lei 8.213/91 (...) não podendo o réu nomear e dar posse a candidatos da lista geral (seja em relação ao concurso em comento, seja em novo concurso) até que seja completado o percentual mínimo de nomeações de candidatos com deficiência (...). (TRT – 17ª Região - 0000086-70.2017.5.17.0003 RO. 3ª Turma. Rel.: Carlos Henrique Bezerra Leite. DJ: 11/12/2017) (grifei).De outro viés, não há que se falar, ao menos por ora, em fixação de multa pelo descumprimento dessas obrigações, o que deve ser objeto de eventual cumprimento de sentença, desde que comprovada a recalcitrância do réu. Registre-se, por fim, que as medidas ora determinadas devem ser adotadas até que seja alcançado o número mínimo de empregados com deficiência, o que não afasta o dever do ente público de, posteriormente, continuar estabelecendo a reserva de vagas em seus certames no importe de 5% (cinco por cento) a 20% (vinte por cento), com observância dos §§ 3º e 4º do art. 1º 14 do Decreto nº 9.508/2018. Igualmente inviável, por outro lado, ao menos por ora, a condenação do réu à obrigação de fazer consistente na divulgação de editais de concurso em canais de mídia e na contratação de pessoa com deficiência quando houver demissão de empregado integrante da cota legal, pois não há nos autos indícios mínimos de falha na publicidade dos certames e de que o § 1º do art. 93 15 da Lei nº 8.213/91 estaria sendo descumprido pelo CONSAMU. Conseguintemente, de rigor a condenação do réu à observância da reserva de vagas para pessoas com deficiências em seus próximos concursos públicos em patamar máximo (20% das vagas), bem como à contratação prioritária de candidatos inscritos na referida 14 Art. 1º Fica assegurado à pessoa com deficiência o direito de se inscrever, no âmbito da administração pública federal direta e indireta e em igualdade de oportunidade com os demais candidatos, nas seguintes seleções: § 3º Na hipótese de o quantitativo a que se referem os § 1º e § 2º resultar em número fracionado, este será aumentado para o primeiro número inteiro subsequente. § 4º A reserva do percentual de vagas a que se referem os § 1º e § 2º observará as seguintes disposições: I - na hipótese de concurso público ou de processo seletivo regionalizado ou estruturado por especialidade, o percentual mínimo de reserva será aplicado ao total das vagas do edital, ressalvados os casos em que seja demonstrado que a aplicação regionalizada ou por especialidade não implicará em redução do número de vagas destinadas às pessoas com deficiência; e 15 1º A dispensa de pessoa com deficiência ou de beneficiário reabilitado da Previdência Social ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias e a dispensa imotivada em contrato por prazo indeterminado somente poderão ocorrer após a contratação de outro trabalhador com deficiência ou beneficiário reabilitado da Previdência Social.cota, a fim de dar concretude à ação afirmativa prevista no art. 93 da Lei nº 8.213/1991, aos compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil e contribuir com a realização da dignidade da pessoa humana, redução das desigualdades sociais, promoção do bem comum e construção de uma sociedade justa e solidária (arts. 1º, III; 3º, I, III e IV, da CF). Por outro lado, no tocante à responsabilidade civil, consigne-se que a interpretação conjunta dos artigos 186 e 927 do Código Civil impõe a conclusão de que aquele que causar dano a outrem é obrigado a repará-lo, senão vejamos: “ Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. “ Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Da análise do texto legal dos dispositivos supracitados, extraem-se três elementos essenciais à caracterização da responsabilidade civil, quais sejam, a comprovação dos danos, da culpa e do nexo de causalidade. Sobre a culpa, tem-se que o ato contrário à ordem jurídica que viole direito subjetivo privado é uma infração e induz à responsabilidade civil. Havendo deliberada violação, tem-se caracterizado o dolo. Se o desrespeito a um dever preexistente ocorrer de forma involuntária, caracteriza-se a culpa. Em ambos os casos, configura-se o ato ilícito, o qual gera a obrigação de indenizar, medida pelo prejuízo causado. No tocante ao dano, tem-se que, sem a sua prova, ninguém pode ser responsabilizado civilmente. O dano pode ser material (sentido estrito), ou simplesmente moral, ou seja, sem repercussão na órbita financeira do ofendido (sentido amplo).O nexo causal, por sua vez, refere-se à relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano experimentado pela vítima. Se a vítima experimentar um dano, mas não se evidenciar que o mesmo resultou do comportamento ou da atitude do réu, o pedido de indenização, formulado por aquela, deverá ser julgado improcedente. Sem a coexistência dessa trilogia, portanto, não há como se cogitar de obrigação indenizatória. A responsabilidade extracontratual do Estado, apesar de suas peculiaridades, também não se afasta muito do acima exposto, uma vez que, como ensina Maria Sylvia Di Pietro, “corresponde à obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou ilícitos, imputáveis aos agentes públicos” 16 . Contudo, enquanto o Código Civil Brasileiro adotou como teoria preponderante a “teoria da culpa”, a Constituição Federal em seu artigo 37, §6º, em relação à responsabilidade do Estado, consagrou, como regra, a “teoria do risco”, que serve de fundamento para a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos, “in verbis”: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, 16 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 639.causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (grifei). Assim, havendo prática de conduta omissiva específica pelo réu – deixar de adotar as medidas pertinentes e disponíveis para a contratação de empregados com deficiência em patamar mínimo legal –, impõe-se a aplicação da responsabilidade objetiva. Nesse sentido, guardadas as devidas proporções, vale destacar o seguinte precedente: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALUNO ESPECIAL. AUTISMO. REDE PÚBLICA DE ENSINO. RESPONSABILIDADE CIVIL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. NEXO DE CAUSALIDADE AFASTADO. (...) 2. A responsabilidade civil do Estado por danos causados por seus agentes a terceiros, seja em razão da conduta comissiva ou omissiva, na forma do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, aplicando-se a teoria do risco administrativo, necessita da ocorrência do dano sofrido pelo administrado e o nexo de causalidade entre o eventus damni e a conduta estatal. 3. No caso, o aluno portador de autismo infantil pleitea a responsabilização civil do Distrito Federal por danos morais por conduta omissiva consistente na inobservância de recomendação constante em relatório médico de que o matriculasse em Classe Especial com turma que contivesse no máximo 5 (cinco) alunos. Atribui a esta omissão, e ao fato de estar frequentando turma de Integração Inversa, que estava sob o comando de professora substituta sem qualificação profissional ou aptidão para atuar com alunos com necessidades especiais, o infortúnio de crise de agressividade que resultou em lesões na professora substituta. (...) (TJDFT - 0711551- 46.2019.8.07.0018, Relator(a): Arquibaldo Carneiro Portela, 6ª Turma Cível, DJ: 27/01/2021, DJe: 18/02/2021) (grifei).Destarte, a análise da pretensão relativa à indenização por dano moral coletivo depende da comprovação de omissão ilícita e seu nexo de causalidade com o aventado prejuízo. No presente caso, como destacado alhures, é incontroverso o não atendimento das disposições do art. 93 da Lei nº 8.213/1991 no tocante à contratação de empregados com deficiência pelo réu em patamar mínimo. Também é insofismável que o requerido, mesmo ciente da situação irregular, não tomou as medidas legais disponíveis para a superação desse quadro, considerando que a reserva de 5% (cinco por cento) das vagas nos editais de concurso público não se revelou suficiente para alcançar o número mínimo de empregados com deficiência. Nesse tocante, como também já foi consignado na presente, o réu dispunha de alternativa para incentivar o aumento da participação, aprovação e contratação de pessoas com deficiência, a exemplo do estabelecimento de reserva de vagas em percentual maior, observando o teto legal de 20% (vinte por cento), pois tal medida possui respaldo normativo. Ressalte-se que a prova documental anexada pelo réu não foi suficiente nem para demonstrar o preenchimento de 5% (cinco por cento) das vagas dispostas em cada edital, considerando que as listas de inscritos e aprovados não diferenciou os candidatos cotistas daqueles que participaram da ampla concorrência (cf. evento 1.22, p. 12/17/ 1.23/1.24), impedindo, portanto, a conclusão de que os editais foram observados nesse particular. Desse modo, tal postura do réu contribuiu para a perpetuação de um estado de coisas discriminatório, na medida em que se mostrou apta a dificultar o ingresso de pessoas com deficiência nos cargos ofertados pela empresa pública, em prejuízo do direito ao trabalho desse grupo vulnerável.Portanto, tendo sido evidenciado que o réu deixou de contratar pessoas com deficiência de acordo com os parâmetros previstos na Lei nº 8.213/1991 no período aventado na inicial (a partir de 2015 – evento 1.5, p. 7/8), bem como que não tomou as providências pertinentes e disponíveis para a tentativa de resolução da irregularidade, impõe-se a responsabilização objetivada pela parte autora. A esse respeito, a jurisprudência: “(...) II - AGRAVO DE INSTRUMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. PROVIMENTO. DANO MORAL COLETIVO. OMISSÃO NA CONTRATAÇÃO DE PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA. Diante de potencial violação do art. 5º, X, da Constituição Federal, merece processamento o recurso de revista, na via do art. 896, "c", da CLT. Agravo de instrumento conhecido e provido. III - RECURSO DE REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014. DANO MORAL COLETIVO. OMISSÃO NA CONTRATAÇÃO DE PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA. 1. A Constituição Federal, em seu art. 7º, XXXI, conferiu especial relevância à inclusão da pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho. 2. Ressalte-se que a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência conclama os Estados a promoverem o emprego de portadores com deficiência no setor privado, mediante políticas e medidas apropriadas, que poderão incluir programas de ação afirmativa, incentivos e outras medidas. 3. A Lei nº 8.213/91, desde a sua redação original, cuidou em estabelecer, no art. 93, a obrigação de empresas, cooperativas, associações e entidades de qualquer natureza ou finalidade de preencher parte de seus cargos com reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, o que foi descumprido pela empresa. 4. Diante desse quadro, tem-se que a desobediência do empregador à imposição de contratação de pessoas portadoras de deficiência ofende toda a população, por caracterizar prática discriminatória, rechaçada pela Constituição Federal. 5. Tratando-se de lesão que viola bem jurídico indiscutivelmente caro a toda a sociedade, surge o dever deindenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP). 6. Frise-se que, na linha da teoria do "danum in re ipsa", não se exige que o dano moral seja demonstrado. Ele decorre, inexoravelmente, da gravidade do fato ofensivo que, no caso, restou materializado pelo descumprimento de norma que visa à inserção das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - ARR - 920-07.2013.5.09.0013, Rel: Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, DJ: 19/10/2016. DEJT 21/10/2016) (grifei). Destarte, de rigor a análise do dano moral coletivo aventado. Do dano moral coletivo De acordo com o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, a indenização por danos morais é perfeitamente possível, uma vez que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. A esse respeito, o dano moral coletivo possui peculiaridades que o diferem da ofensa a direito da personalidade individual, pois para sua configuração se exige que a violação antijurídica seja expressiva, evidente e grave a interesses e valores da sociedade ou de uma determinada comunidade, grupo, categoria ou classe, a exemplo dos ora substituídos, nos termos do art. 81, II 17 , do CDC. 17 Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: (...) II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;Nas palavras de XISTO TIAGO DE MEDEIROS 18 , o dano moral transindividual “corresponde à lesão injusta e intolerável a interesses difusos ou direitos titularizados pela coletividade (considerada como um todo ou em qualquer de suas expressões – grupos, classes ou categoriais de pessoas), os quais possuem natureza extrapatrimonial, refletindo valores e bens fundamentais para a sociedade”. Sobre o tema, também leciona CARLOS ALBERTO BITTAR FILHO 19 : “ (...) quando se fala em dano moral coletivo, está se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto material”. No presente caso, é insofismável que os atos praticados pelo requerido prejudicaram o exercício do direito ao trabalho das pessoas com deficiência, inviabilizando, especialmente, o acesso a cargos e empregos públicos que deve ser incentivado pelo Poder Público e possui respaldo convencional e constitucional. De outro norte, impende destacar que o dano moral coletivo é presumido, sendo despicienda a comprovação concreta sobre quem foram as pessoas individualmente afetadas pelo ato ilícito. A esse respeito, guardadas as devidas proporções, a jurisprudência: Apelação. Ação civil pública. Adequação de espaços públicos. Acessibilidade. Dano moral coletivo. Desnecessidade de abalo 18 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. São Paulo: LTr. 2. ed. 2007. p. 137. 19 BITTAR FILHO. Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. In: Revista do Direito do Consumidor, n. 12. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 55psíquico. Ofensa injustificada e intolerável aos valores fundamentais da sociedade. Constatação. Inexistente. Recurso não provido. O dano moral coletivo prescinde de demonstração de dor/sofrimento e abalo psicológico causado à sociedade e configura-se in re ipsa, objetivando primordialmente a punição exemplar do ofensor e sendo o dinheiro recolhido destinado ao proveito coletivo. (...) (TJRO - 0000446-86.2015.8.22.0002. 2ª C. Especial. Rel.: Des. Roosevelt Queiroz Costa. DJ: 12/03/2019) (grifei). Portanto, nesse particular, a coletividade experimentou prejuízos de ordem extrapatrimonial, que indelevelmente ultrapassam a seara dos meros aborrecimentos, e, ainda que não possam ser integralmente sanados, devem ser objeto da pertinente reparação financeira. Assim, para sopesar o montante indenizatório, impende destacar, inicialmente, que o conceito de indenização significa tornar indene, ou seja, tornar sem dano, buscando-se, portanto, uma prestação que restitua o lesado ao status quo ante, ou seja, a uma posição como se não houvesse ocorrido o dano sofrido. Determina o artigo 944, caput, do Código Civil que a indenização se mede pela extensão do dano, o qual, em caso de dano material não enseja maiores dificuldades, mas no que toca aos ditos danos extrapatrimoniais não confere um critério seguro para arbitramento de montante indenizatório. Diante da dificuldade inerente a tal tarefa, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça já se utilizou de alguns nortes para servirem de parâmetro, os quais serão a seguir brevemente explicitados. Deve, primeiramente, o julgador ater-se aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo que o montante indenizatório fixado não seja tão elevado a ponto de acarretar o enriquecimento ilícito do lesado, e nem tão ínfimo não trazendo a sua satisfação. Para tal desiderato, deve-se verificar a capacidade econômica do agressor em contraposição a do prejudicado. Ainda, a esse respeito, é mister observar a intensidade da culpa ou dolo do agressor, vale dizer, a perniciosidade de sua conduta. Ademais, faz-se necessárioconsiderar eventual reincidência na atuação daquele. Finalmente, além do ressarcimento, deve a indenização possuir um caráter inibitório, com vistas a impedir que seja reiterada a conduta agressiva, de modo que o arbitramento de seu montante deve servir como desestímulo a novas agressões, a exemplo do denominado “punitive exemplary damage” da jurisprudência norte- americana. A esse respeito, extrai-se esclarecedora lição do corpo do acórdão do REsp 615939/RJ (DJ 04.04.2005 p. 314), da lavra do Eminente Min. Castro Filho do Superior Tribunal de Justiça: “(...) Em que pese o grau de subjetivismo que envolve o tema da fixação da reparação, uma vez inexistirem critérios determinados para a quantificação do dano moral, reiteradamente, tem-se pronunciado esta Corte no sentido de que a reparação não pode vir a constituir-se em enriquecimento indevido. Há que ser fixada, porém, em montante que desestimule o ofensor a repetir a falta, aí considerados o grau de culpa das partes envolvidas, bem assim a sua situação econômica, as consequências do evento danoso, tanto de ordem física quanto psicológica, idade da vítima, entre outros critérios recomendados pela doutrina e jurisprudência”. Convém transcrever, a propósito, os ensinamentos de Rui Stoco: “Tratando -se de dano moral, nas hipóteses em que a lei não estabelece os critérios de reparação, impõe-se obediência ao que podemos chamar de "binômio do equilíbrio", cabendo reiterar e insistir que a compensação pela ofensa irrogada não deve ser fonte de enriquecimento sem causa para quem recebe, nem causa da ruína para quem dá. Mas também não pode ser tão apequenada que não sirva de punição e desestímulo ao ofensor, ou tão insignificante que não compense e satisfaça o ofendido, nem o console e contribua para a superação do agravo recebido” 20 . 20 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil do Estado [livro eletrônico]: doutrina e jurisprudência. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. Título I, Capítulo I, Item 6.00.No tocante ao arbitramento do dano moral e a necessidade de lhe conferir um caráter punitivo, o seguinte julgado: “RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DESAPARECIMENTO DE PRESO POLÍTICO – LEI 9.140/95 – VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1. O VALOR DO DANO MORAL TEM SIDO ENFRENTADO NO STJ COM O ESCOPO DE ATENDER A SUA DUPLA FUNÇÃO: REPARAR O DANO BUSCANDO MINIMIZAR A DOR DA VÍTIMA E PUNIR O OFENSOR, PARA QUE NÃO VOLTE A REINCIDIR. 2. Posição jurisprudencial que contorna o óbice da Súmula 7/STJ, pela valoração jurídica da prova. 3. Fixação de valor que não observa regra fixa, oscilando de acordo com os contornos fáticos e circunstanciais. 4. O valor da indenização, a título de danos materiais, deve ser obedecer às diretrizes traçadas pela Lei 9.140/95. 5. Recurso especial provido.” (STJ - REsp 658547 / CE; Rel. Min. Eliana Calmon – T2 - DJ 18.04.2005 p. 266) (grifei). A respeito do quantum a ser fixado, registre-se que o parâmetro utilizado pela parte autora, com a devida vênia, carece de fundamento e razoabilidade, pois, não obstante a omissão específica do réu já enfrentada na presente, é inegável que houve atendimento de requisito legal mínimo para a contratação de pessoas com deficiência – reserva de ao menos 5% (cinco por cento) das vagas em concurso público –, circunstância que deve ser considerada para o arbitramento do montante indenizatório. Ademais, a fixação de montante vultuoso causaria prejuízo ao erário público e a intenção de compensar a coletividade pelo dano causado acabaria, pela via transversa, por prejudicar a prestação de serviços públicos que igualmente a beneficiam, especialmente na área de proteção à saúde.Nesse sentido, a apuração da quantia indenizatória deve considerar as consequências práticas da decisão, nos termos do art. 20 21 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (LINDB), de modo que a condenação do ente público neste feito com o objetivo de punir o dano verificado não poderia dar ensejo à factível limitação de recursos de outras políticas públicas, em detrimento de outros direitos da coletividade, a fim de que fosse cumprida a ordem judicial. Destarte, o valor da indenização deve ser fixado com equidade e razoabilidade, considerando-se o dano sofrido pela coletividade – prejuízo ao exercício do direito ao trabalho por pessoas com deficiência –, a gravidade da ofensa, a situação econômica das partes – tratando-se o réu de consórcio intermunicipal que notoriamente não conta com orçamento expressivo –, e a reprovabilidade da atuação do requerido, sem que tal circunstância afete seus recurso a ponto de compelir o último a priorizar o cumprimento da ordem judicial em detrimento da garantia de outros direitos em razão da insuficiência de recursos. Sobre o tema, a jurisprudência: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MUNICÍPIO DE CARMO DO RIO CLARO. FORNECIMENTO DE ÁGUA IMPRÓPRIA PARA O CONSUMO. COPASA. REPARAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS COLETIVOS. DEVIDOS. MAJORAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS INDIVIDUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. (...) Conforme decidido pelo c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1502967/RS, "O dano moral coletivo é categoria autônoma de dano que não se identifica com os tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico), mas com a violação injusta e intolerável de valores fundamentais titularizados pela coletividade (grupos, classes ou categorias de pessoas). Tem a função de: a) proporcionar uma 21 Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.reparação indireta à lesão de um direito extrapatrimonial da coletividade; b) sancionar o ofensor; e c) inibir condutas ofensivas a esses direitos transindividuais". - A quantificação do dano moral coletivo deve dar-se com prudente arbítrio, para que não haja enriquecimento à custa do empobrecimento alheio, tampouco atribuição em valor irrisório. - Indevida a condenação em danos materiais e morais aos consumidores, individualmente considerados, tendo em vista a ausência de produção de prova específica nesse sentido. ABASTECIMENTO DE ÁGUA CONTAMINADA. EXCESSO DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS. DANOS MORAIS COLETIVOS. FIXAÇÃO DO VALOR. - Em se tratando de indenização por dano moral, cabe ao juiz determinar o seu valor, definindo-lhe os parâmetros e fixando o montante de acordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. O MM. Juiz, a meu ver, ao arbitrar o montante da indenização pelos danos morais coletivos (ou sociais), atendeu a esses parâmetros (R$ 50.000,00). (TJMG - Apelação Cível. 1.0144.13.000834-1/002, Relator(a): Des.(a) Moacyr Lobato , 5ª C. Cível. DJ: 16/05/2019, publicação da súmula em 21/05/2019) (grifei). Desta feita, revela-se adequada a fixação de montante em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), porque quantia inferior não surtiria os efeitos pretendidos e, por outro lado, a fixação deve-se dar em termos razoáveis, com atenção a realidade da vida, a situação econômica atual e a equivalência do dano e seu ressarcimento. A respeito da destinação dos valores, consigne-se o que dispõe a Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor: “ Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados”. “ Art. 100. Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização devida.Parágrafo único. O produto da indenização devida reverterá para o fundo criado pela Lei n.° 7.347, de 24 de julho de 1985”. Assim, considerando que o Fundo de Amparo ao Trabalhador é gerido pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT) 22 , de rigor o atendimento do pedido formulado nesse particular, para que a indenização seja destinada à referida entidade. Registre-se, por oportuno, que eventual comunicação pública acerca de tal desitnação, necessariamente, ser acompanhada da informação relativa à origem dos valores, isto é, que decorrem da condenação objeto da presente em razão da lesão ao direito ao trabalho das pessoas com deficiência. Dos consectários legais para o dano moral Os juros moratórios deverão incidir na espécie a partir do evento danoso, pois nos termos da Súmula 54 do STJ “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual”. Assim, devem ser aplicados desde a data em que constatado o não atendimento do art. 93 da Lei nº 8.213/91 (janeiro de 2015 – evento 1.5, p. 7/8). Nos termos das teses fixadas no REsp 1.492.221/PR 23 , deve-se aplicar o índice da remuneração oficial da caderneta de poupança, até 08 de dezembro de 2021, quando entrou em vigor a Emenda Constitucional nº 113. 22 Disponível em: https://www.bndes.gov.br/wps/portal/site/home/transparencia/fundos-governamentais/fundo-de- amparo-ao-trabalhador-fat/fat-linha-do-tempo 23 PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃOPor sua vez, a correção monetária deverá observar Taxa SELIC, considerando que se trata de um mecanismo para manter atualizado o valor, evitando, portanto, a corrosão provocada pela desvalorização da moeda, devendo incidir a partir do momento em que foi arbitrada a indenização, ou seja, a partir da presente decisão. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ABERTURA DE CONTA CORRENTE. DOCUMENTAÇÃO FALSA. FORMA DE CORREÇÃO DOS VALORES ARBITRADOS A TÍTULO DE DANOS MORAIS. QUESTÕES NOVAS. OMISSÃO INEXISTENTE. 1. Na indenização por danos morais, o termo inicial da correção monetária é a data em que o valor foi fixado, no caso, a data da prolação do acórdão, nos termos da súmula 362/STJ. 2. O índice de correção monetária a ser adotado é o que reflete a variação de preços ao consumidor, nos termos da iterativa jurisprudência desta Corte (EDcl no Resp 1.077.077/SP). 3. Os juros moratórios, tratando-se de responsabilidade extracontratual, incidem a partir do evento danoso (súmula 54/STJ), no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês na vigência do Código Civil de 1916 e de 1% (um por cento) ao mês na vigência do Código Civil de 2002. (...) 5. Embargos de declaração acolhidos somente para estabelecer a forma de correção dos valores arbitrados a título de danos morais, sem alteração do resultado do julgado.” (STJ – 4ª Turma - EDcl no REsp 671964 / BA - 2004/0109106-7 - Ministro FERNANDO GONÇALVES – d.j. 18.08.2009) (grifei) DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A CONDENAÇÃO JUDICIAL DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. • TESES JURÍDICAS FIXADAS. [...]. 3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação. 3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral. As condenações judiciais de natureza administrativa em geral, sujeitam-se aos seguintes encargos: (...) (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E” (STJ. REsp n. 1.492.221/PR. Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Julgado em 22/02/2018)Assim, posteriormente à data de entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113 (08/12/21), “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente” (grifei). Conseguintemente, de rigor a procedência parcial da pretensão deduzida. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão deduzida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO contra o CONSÓRCIO DE SAÚDE DOS MUNICÍPIOS DO OESTE DO PARANÁ – CONSAMU, nos termos do artigo 487, inciso I 24 , do CPC, extinguindo o feito com resolução do mérito, para o fim de condenar o réu: a) à implementação da reserva de 20% (vinte por cento) das vagas ofertadas nos próximos editais de concurso público a serem por si realizados para pessoas com deficiência, bem como à nomeação prioritária desses candidatos, até que seja atingido o patamar mínimo estabelecido pelo art. 93 da Lei nº 8.213/1991. b) ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), acrescido de juros de mora segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança desde janeiro de 2015 até 08/12/2021, quando deve passar a ser aplicada a 24 Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;Taxa SELIC que abrange tal consectário e a correção monetária, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113, quantia que deve ser destinada exclusivamente ao Fundo de Amparo ao Trabalhador. Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios, porque não caracterizada má-fé, nos termos do art. 18 da Lei 7.347/85 25 . Publique-se. Registre-se. Intime-se. Sentença não sujeita ao reexame necessário, pois não ultrapassado o teto previsto no art. 496, § 3º, inciso III 26 , do Código de Processo Civil. Cumpram-se, no mais, as determinações preconizadas pelo Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado. Cascavel/PR, datado digitalmente. - EDUARDO VILLA COIMBRA CAMPOS Juiz de Direito 25 Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais. 26 Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: § 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

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