Processo nº 1036165-20.2023.8.11.0041
ID: 320224467
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1036165-20.2023.8.11.0041
Data de Disponibilização:
09/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HUDSON ROQUE BOBATO SCHMITT
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1036165-20.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Seguro] Relator: Des…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1036165-20.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Seguro] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [IONICE CARVALHO DE CAMPOS WICHOCKI - CPF: 285.240.711-68 (APELADO), HUDSON ROQUE BOBATO SCHMITT - CPF: 728.575.601-68 (ADVOGADO), BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS - CNPJ: 28.196.889/0001-43 (APELANTE), CAROLINA SILVA LOPES - CPF: 135.428.737-13 (ADVOGADO), DANIEL MATIAS SCHMITT SILVA - CPF: 052.266.017-78 (ADVOGADO), ANNA GABRIELLE GARCIA VELOSO - CPF: 124.264.607-84 (ADVOGADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0001-91 (APELANTE), EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA - CPF: 135.207.888-02 (ADVOGADO), RAMANE PEREIRA DA SILVA PASSOS - CPF: 135.156.647-42 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA. EXCLUSÃO DE COBERTURA POR EMBRIAGUEZ DO SEGURADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 620 DO STJ. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO ESTIPULANTE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPGM ATÉ A ENTRADA EM VIGOR DA LEI N.º 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME: Apelações cíveis interpostas, separadamente, por Banco do Brasil S/A e Brasilseg Companhia de Seguros S/A contra sentença proferida nos autos de Ação de Cobrança de Indenização Securitária c/c Pedido de Indenização por Dano Moral, ajuizada por Ionice Carvalho de Campos Wichocki, em razão da negativa de pagamento da indenização decorrente de seguro de vida contratado por seu esposo, falecido em acidente automobilístico. A sentença de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando as rés ao pagamento da indenização securitária no valor de R$ 522.620,68, acrescido de juros pela taxa SELIC e correção monetária pelo IGP-M. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há quatro questões em discussão: (i) definir se o Banco do Brasil S/A possui legitimidade passiva para figurar no polo da ação securitária; (ii) estabelecer se a embriaguez do segurado afasta o dever da seguradora de pagar a indenização contratada; (iii) determinar se há cerceamento de defesa pela ausência de produção de provas complementares na fase instrutória; (iv) definir o índice que deverá ser aplicado para a correção monetária. III. RAZÕES DE DECIDIR: O Banco do Brasil S/A integra o mesmo grupo econômico da seguradora e figura como estipulante da apólice contratada, auferindo benefícios da relação de consumo, motivo pelo qual responde solidariamente pelos danos decorrentes da negativa indevida de cobertura. A negativa de cobertura com fundamento exclusivo na embriaguez do segurado contraria a Súmula 620 do STJ, segundo a qual a embriaguez não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista no contrato de seguro de vida. A interpretação contratual em seguros de vida deve respeitar a função social e a boa-fé objetiva, vedando cláusulas restritivas que esvaziem o propósito do contrato, especialmente aquelas que busquem afastar a cobertura sem demonstração inequívoca de má-fé ou nexo causal direto. A jurisprudência do STJ e a Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB nº 08/2007 reiteram que é vedada a exclusão de cobertura securitária em razão de embriaguez do segurado em contratos de seguro de vida. O juízo de primeiro grau fundamentou a desnecessidade de produção de novas provas na suficiência dos elementos dos autos, em conformidade com o art. 370 do CPC, inexistindo cerceamento de defesa. Deve ser aplicado IGPM como índice de correção monetária até a data da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024 quando passará a incidir unicamente a taxa SELIC, para os juros de mora e correção monetária. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: O banco estipulante de seguro de vida responde solidariamente com a seguradora quando integra a cadeia de consumo e aufere vantagem da relação contratual. A embriaguez do segurado não afasta o dever de indenizar da seguradora em contrato de seguro de vida, conforme dispõe a Súmula 620 do STJ. Não configura cerceamento de defesa a não realização de novas provas quando os autos já contêm elementos suficientes à formação do convencimento judicial. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, arts. 757, 768 e 406, §1º; CDC, arts. 6º, VIII, 14 e 3º, §2º; CPC, arts. 370 e 85, §11. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 620; STJ, AgInt no AREsp n. 2.273.935/MT, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 13/05/2024; STJ, REsp n. 1.999.624/PR, rel. Min. Raul Araújo, Segunda Seção, j. 28/09/2022; TJMT, Apelação Cível n. 1000640-24.2021.8.11.0048, rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 20/03/2024; TJMT, Apelação Cível n. 1014182-62.2023.8.11.0041, rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 30/04/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de Apelação Cível interpostos, separadamente, por BANCO DO BRASIL S/A e BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS S/A, contra a sentença proferida pela MM.ª Juíza da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, Dr.ª Sinii Savana Bosse Saboia Ribeiro, que, nos autos da Ação de Cobrança de Indenização Securitária c/c Pedido de Indenização por Dano Moral, deu parcial procedência aos pedidos contidos na inicial para condenar as rés ao pagamento da indenização securitária devida à parte autora, no valor de R$ 522.620,68 (quinhentos e vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais e sessenta e oito centavos), que deverá ser acrescido de juros de mora pela aplicação da SELIC (art. 406, §1º, do CC), e correção pelo IGP-M (previsão contratual), a contar data da negativa de pagamento do seguro. Inconformado, o BANCO DO BRASIL S/A sustenta a sua ilegitimidade passiva sob o fundamento de que atuou apenas como estipulante/corretor da apólice de seguro, não sendo parte contratualmente responsável pelo pagamento da indenização securitária. Por consequência, pleiteia a sua exclusão da condenação solidária imposta em primeiro grau, afirmando que a responsabilidade deve recair exclusivamente sobre a seguradora Brasilseg Companhia de Seguros S/A. Subsidiariamente, na hipótese de não acolhimento da preliminar, requer o acolhimento do recurso para que sejam julgados totalmente improcedentes os pedidos iniciais, alegando que a negativa de cobertura foi legítima, pois o segurado conduzia veículo sob efeito de álcool no momento do acidente, o que configuraria hipótese de exclusão expressa na apólice, com base no artigo 768 do Código Civil. Afirma inexistir ato ilícito ou falha na prestação do serviço por parte do banco, o que afastaria o dever de indenizar por danos morais. Defende, também, a impossibilidade de inversão do ônus da prova quanto ao dano moral, por ausência dos pressupostos do artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Ao final, pleiteia, caso mantida a condenação, a redistribuição dos ônus sucumbenciais, com a responsabilização exclusiva da parte autora. Por sua vez, a BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS S/A sustenta, de forma preliminar, que a sentença deixou de enfrentar as teses de defesa expressamente apresentadas em contestação e em manifestação sobre as provas, especialmente a alegação de que a embriaguez do segurado no momento do acidente de trânsito teria agravado intencionalmente o risco coberto, o que, à luz do artigo 768 do Código Civil, resultaria na perda do direito à cobertura securitária. Alega que tal conduta configura infração ao artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, sendo um ato ilícito autônomo, não enfrentado pela jurisprudência que deu origem à Súmula 620 do STJ, e, por isso, propõe a superação (overruling) da referida súmula, diante da relevância do nexo causal entre a embriaguez e o sinistro. Aduz que houve cerceamento de defesa, visto que o juízo de origem julgou antecipadamente a lide sem oportunizar a produção de provas complementares e sem enfrentar as argumentações centrais da defesa. No mérito, além de reiterar os documentos e laudos que comprovariam o estado de embriaguez do segurado e a dinâmica do acidente, a seguradora destaca decisões recentes de tribunais estaduais que reconhecem a possibilidade de exclusão de cobertura securitária em casos de agravamento intencional do risco quando comprovado o nexo entre a conduta ilícita e o sinistro. Ademais, a apelante BRASILSEG impugna o critério de atualização monetária adotado na sentença, alegando que é indevida a cumulação da taxa SELIC (que já compreende juros e correção monetária) com o índice IGP-M, sob pena de incidência de dupla correção monetária. Com essas considerações requer o provimento do recurso para a anulação da sentença, por cerceamento de defesa, ou, alternativamente, sua reforma para julgar improcedente o pedido indenizatório, reconhecendo a perda do direito à cobertura securitária por agravamento intencional do risco. Por fim, almeja também o afastamento da cumulação dos índices de atualização (SELIC e IGP-M). Preparos devidamente recolhidos (ID’s 2924494020 e 292449405). Devidamente intimada, a apelada apresentou contrarrazões requerendo o desprovimento de ambos os recursos (ID’s 292449407 e 292449408). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R VOTOS - PRELIMINARES EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Inicialmente, o BANCO DO BRASIL S/A sustenta a sua ilegitimidade passiva sob o fundamento de que atuou apenas como estipulante/corretor da apólice de seguro, não sendo parte contratualmente responsável pelo pagamento da indenização securitária. Sem razão, contudo. No caso em apreço, denota-se que os documentos trazidos aos autos não deixam dúvida de que a contratação da apólice do seguro de vida junto à BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS está atrelado aos serviços prestados pela instituição financeira, que integra o mesmo grupo econômico da subsidiária, inclusive com o contrato timbrado em seu nome. Assim, a tese de ausência de solidariedade não se sustenta, visto que a instituição financeira integra a cadeia de consumo, subtraindo vantagens dessa relação e, portanto, deve responder conjuntamente com a Seguradora por eventuais danos sofridos pelo consumidor. Nesse sentido: “AÇÃO DE COBRANÇA - SEGURO DE VIDA - INVALIDEZ PERMANENTE POR ACIDENTE - PRELIMINARES – ILEGITIMIDADE PASSIVA – EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO - PRESCRIÇÃO ÂNUA - INOCORRÊNCIA – REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – SUSPENSÃO PRAZO PRESCRICIONAL – PENDÊNCIA DE DECISÃO DEFINITIVA - CERCEAMENTO DE DEFESA – PERÍCIA REALIZADA PELO INSS – CONCESSÃO DE AUXILIO-ACIDENTE – PRESUNÇÃO RELATIVA – IMPRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA MÉDICA – SENTENÇA ANULADA – RECURSO PROVIDO. É parte legítima para figurar no polo passivo da ação em que se busca o cumprimento do contrato de seguro a instituição financeira em que o seguro estava atrelado aos serviços prestados. (...) (N.U 1000640-24.2021.8.11.0048, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/03/2024, Publicado no DJE 24/03/2024) (g.n.) “APELAÇÃO – AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO DE VIDA – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E FALTA DE INTERESSE DE AGIR – REJEIÇÃO – MÉRITO – MORTE ACIDENTAL – RECUSA NO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA SOB A JUSTIFICATIVA DE CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIROS – ÔNUS QUE A SEGURADORA NÃO SE DESINCUMBIU – ART 373, I CPC – NEGATIVA INJUSTIFICADA – ILEGALIDADE – DEVER DE PAGAR O CAPITAL SEGURADO – AUSÊNCIA DE BENEFICIÁRIO NA APÓLICE DE SEGURO – GENITORA QUE COMPROVA SER LEGÍTIMA HERDEIRA NA ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA – PREQUESTIONAMENTO – REJEIÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Não há falar-se em ilegitimidade passiva, se comprovado que a seguradora pertence ao mesmo grupo econômico da instituição financeira que entabulou contrato, objeto da demanda. (...) (N.U 1014182-62.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2024, Publicado no DJE 03/05/2024) (g.n.) Ultrapassada essa questão, ainda em sede preliminar, a apelante BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS afirma que a sentença deve ser anulada em razão de suposto cerceamento de defesa, visto que o juízo de origem julgou antecipadamente a lide sem oportunizar a produção de provas complementares e sem enfrentar as argumentações centrais da defesa. De fato, o juízo a quo julgou antecipadamente a lide, fundamentando seu entendimento na desnecessidade de instrução processual, à vista da existência de provas suficientes ao provimento de mérito, e nessa toada, após afastar as questões preliminares, reconheceu o direito da apelada ao recebimento da indenização securitária. Contudo, não justificou o édito sentencial na ausência de provas trazidas pela Seguradora acerca da existência ou não de embriaguez no momento do acidente, mas sim no entendimento consolidado no Enunciado 620 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo o qual “A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”. Ademais, ressalta-se que o magistrado é o destinatário das provas e a ele compete a valoração das provas úteis ao seu convencimento (art. 370 do Código de Processo Civil). Logo, a instrução probatória se encontra condicionada não só à possibilidade jurídica da prova, como também ao interesse e à relevância de sua produção, razão pela qual cabe ao juiz indeferir aquelas que se apresentem inúteis e impertinentes. Em razão disso, REJEITO as preliminares arguidas. VOTO - MÉRITO EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Cinge-se dos autos que IONICE CARVALHO DE CAMPOS WICHOCKI ajuizou Ação de Cobrança de Indenização Securitária c/c Pedido de Indenização por Dano Moral em desfavor do BANCO DO BRASIL S/A e BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS S/A, relatando que seu esposo, Osmar Alceu Wichocki, falecido em 31/10/2022, era segurado de apólice de seguro de vida que previa coberturas para morte natural, morte acidental e invalidez. Afirmou que em razão do óbito decorrente de um acidente automobilístico, requereu a indenização securitária, contudo, teve seu pedido negado sob a justificativa de que o segurado agravou intencionalmente o risco ao conduzir veículo sob efeito de álcool. Asseverou que a seguradora não comprovou que a embriaguez foi a causa determinante do acidente, considerando especialmente as condições climáticas adversas e a obstrução parcial da via no momento do sinistro, razão pela qual requereu o pagamento da indenização securitária no valor de R$ 522.620,68, conforme disposto na Apólice n° 12114, além de R$ 10.000,00 por danos morais. Após regular processamento do feito, a Magistrada condutora do feito julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando as requeridas ao pagamento de indenização securitária no importe de R$ 522.620,68 (quinhentos e vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais e sessenta e oito centavos). Eis o teor da sentença impugnada: “(...) O caso deve ser analisado à luz do código consumerista, que prestigia a teoria da responsabilidade objetiva, segundo a qual é desnecessária para a caracterização do dever reparatório a comprovação da culpa do agente, ficando o consumidor responsável, apenas, em demonstrar a efetiva ocorrência do dano e do nexo causal, nos termos do art. 14 da Lei nº 8.078/90: (...) Assim, a isenção de indenizar somente ocorrerá se o fornecedor, de produtos ou de serviços, provar que não colocou o produto no mercado (art. 12, § 3º, I), ou que mesmo tendo colocado o produto no mercado ou fornecido o serviço, não existe o defeito apontado (art. 12, § 3º, II e 14, § 3º, I), ou ainda, que o dano decorrente se deu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 12, § 3º, III e 14, § 3º, II). O artigo757doCódigo Civil dispõe que: Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Para a doutrina o seguro é o contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determinada indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado negociam as consequências econômicas do risco, mediante a obrigação do segurador de repará-las. Sem delongas. É incontroversa a existência de relação jurídica entre as partes, segundo Apólice 12114 colacionada no arquivo de id. 129876687. Como justificativa da negativa da cobertura, a ré alegou que “o exame de dosagem alcoólica realizado resultou positivo, e que tal condição contribuiu para a ocorrência do acidente, o que caracteriza o agravamento do risco.” Logo,a questão nuclear a ser analisada consiste em verificar se a comprovada embriaguez do segurado no momento do acidente automobilístico, por si só, autoriza a negativa da cobertura securitária, ou se, para tanto, é necessária a demonstração do nexo de causalidade entre o estado de embriaguez e a ocorrência do sinistro. Quanto ao tema, o pacífico entendimento do Superior Tribunal de Justiça considera abusiva a exclusão de cobertura securitária, em seguro de vida, para sinistro ocorrido em decorrência de embriaguez ao volante, mesmo que esta tenha sido a causa determinante da morte do segurado, ou seja, mesmo tendo havido nexo de causalidade entre a ingestão de bebida alcoólica e o acidente que vitimou o segurado. Confira-se ainda a súmula 620 do STJ: “A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”. (...) Desse modo, não há que se falar de exclusão de cobertura, com a negativa de pagamento da indenização pela Seguradora, eis que verificada a ocorrência de morte acidental. Acerca do pedido de indenização por danos materiais, verifica-se que o contrato de seguro em questão (Apólice nº 12114), conforme consta no Certificado Individual anexado aos autos, prevê expressamente a cumulação de coberturas em caso de morte acidental. A proposta contratada estabelece "Morte Natural = Capital Básico Segurado" e "Morte Acidental = O dobro do Capital Básico Segurado", vide id. 129876682, totalizando R$ 522.620,68, valor que deverá ser pago pela ré à parte autora. Quanto ao dano moral, deve-se observar que é aquele que lesiona a esfera personalíssima das pessoas violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente. Maria Helena Diniz assevera que o dano moral é uma lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade. (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 7: Responsabilidade Civil, 17ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2003.). Segundo Silvio Venosa, dano moral é o prejuízo que afeta o animo psíquico, moral e intelectual da vítima. ( In Direito Civil. Responsabilidade Civil. Quarta edição. Ed. Atlas 2004). Na hipótese apresentada, não se vislumbra a sua ocorrência, já que o descumprimento contratual, por si só, não é capaz de caracterizar o dano, uma vez que suas consequências normais se traduzem em aborrecimentos insuscetíveis de acarretar interferências à esfera extrapatrimonial. (...) Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Ionice Carvalho de Campos Wichocki, em desfavor de Brasilseg Companhia de Seguros S.A. e Banco do Brasil S.A., para condenar as rés ao pagamento da indenização securitária devida à parte autora, no valor de R$ 522.620,68 (quinhentos e vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais e sessenta e oito centavos), que deverá ser acrescido de juros de mora pela aplicação da SELIC (art. 406, §1º, do CC), e correção pelo IGP-M (previsão contratual), a contar data da negativa de pagamento do seguro”. Inconformadas, as apelantes sustentam que a negativa da indenização securitária se deu corretamente, considerando a incidência da cláusula que isenta a seguradora de responsabilidade nos casos em que há agravamento do risco pelo segurado. Pois bem. A presente lide versa sobre contrato de seguro, devendo ser apreciada à luz do Código de Defesa do Consumidor, na medida em que se trata de relação de consumo, nos termos do art. 3º, § 2º do CDC, aplicando-se também a inversão do ônus da prova nos termos do art. 6º, inciso VIII, do mesmo diploma legal. No caso sub judice, é fato incontroverso que o segurado falecido aderiu ao contrato de seguro de vida em 27.08.2008, o qual contava como coberturas contratadas a morte natural ou acidental, indenizações especiais por morte por acidente, invalidez permanente total ou parcial por acidente e doença terminal. Também restou incontroverso que o veículo conduzido pelo segurado colidiu com uma carreta que estava parada na faixa de rodagem, em razão de manifestação que ocorria no “Trevo do Lagarto” e que, de acordo com o Laudo Pericial n.º 3.15.2022.90051-01, o exame de alcoolemia/toxicológica no sangue apresentou resultado positivo para a presença de etanol “na concentração de 21,15dg/l (vinte e um decigramas e quinze miligramas por litro)”. Contudo, para além de não ter restado demonstrado que o acidente ocorreu devido ao estado de embriaguez do condutor – o que, frise-se, não teria conclusão diversa caso fosse deferida prova para expedição de ofício ao DETRAN com o objetivo de analisar multas pretéritas do falecido, ou realização de novo exame toxicológico – a Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB nº 08/2007 dispõe que nos contratos de seguro de vida, a indenização é devida mesmo em casos de atos praticados pelo segurado em estado de embriaguez, insanidade mental ou sob efeito de substâncias tóxicas. Veja-se: “1) Nos Seguros de Pessoas e Seguro de Danos, é VEDADA A EXCLUSÃO DE COBERTURA na hipótese de 'sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas'; 2) Excepcionalmente, nos Seguros de Danos cujo bem segurado seja um VEÍCULO, é ADMITIDA A EXCLUSÃO DE COBERTURA para 'danos ocorridos quando verificado que o VEÍCULO SEGURADO foi conduzido por pessoa embriagada ou drogada, desde que a seguradora comprove que o sinistro ocorreu devido ao estado de embriaguez do condutor.” Essa orientação reflete o caráter protetivo do contrato de seguro de vida, afastando cláusulas excludentes de cobertura que desvirtuem a finalidade do contrato. No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça já consolidou o entendimento no Enunciado da Súmula 620 de que “a embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”, orientação que vem sendo reiteradamente seguida em julgados posteriores: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CAUSA DO SINISTRO. EMBRIAGUEZ DO SEGURADO. MORTE ACIDENTAL. AGRAVAMENTO DO RISCO. DESCARACTERIZAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR DA SEGURADORA. ESPÉCIE SECURITÁRIA. COBERTURA AMPLA. CLÁUSULA DE EXCLUSÃO. ABUSIVIDADE. SÚMULA Nº 620/STJ. INCIDÊNCIA. 1. No contrato de seguro de vida, ocorrendo o sinistro morte do segurado e inexistente a má-fé dele (a exemplo da sonegação de informações sobre eventual estado de saúde precário - doenças preexistentes - quando do preenchimento do questionário de risco) ou o suicídio no prazo de carência, a indenização securitária deve ser paga ao beneficiário, visto que a cobertura neste ramo é ampla. Inteligência da Súmula nº 620/STJ. 2. No seguro de vida, é vedada a exclusão de cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas (art. 26 da Circular SUSEP nº 667/2022 e Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB n° 08/2007). 3. As cláusulas restritivas do dever de indenizar no contrato de seguro de vida são mais raras, porquanto não podem esvaziar a finalidade do contrato, sendo da essência do seguro de vida um permanente e contínuo agravamento do risco segurado. 4. Agravo interno não provido.” (AgInt no AREsp n. 2.273.935/MT, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 15/5/2024) (g.n.) “RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA ACIDENTE DE TRÂNSITO. MORTE DO CONDUTOR SEGURADO. EMBRIAGUEZ. NEGATIVA DE COBERTURA PELA SEGURADORA. ALEGAÇÃO DE AGRAVAMENTO DE RISCO. INGESTÃO DE BEBIDA ALCOÓLICA. SÚMULA 620/STJ. CONFIRMAÇÃO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. A jurisprudência desta Corte e a do egrégio Supremo Tribunal Federal, firmada ainda sob a vigência do Código Civil de 1916 e mantida sob a vigência do novo Código Civil, é consolidada no sentido de que o seguro de vida cobre até mesmo os casos de suicídio, desde que não tenha havido premeditação (Súmulas 61/STJ e 105/STF). 2. Já em consonância com o novo Código Civil, a Segunda Seção desta Corte consolidou seu entendimento para preconizar que "o legislador estabeleceu critério objetivo para regular a matéria, tornando irrelevante a discussão a respeito da premeditação da morte" e que a seguradora não está obrigada a indenizar apenas o suicídio ocorrido dentro dos dois primeiros anos do contrato" (AgRg nos EDcl nos EREsp 1.076.942/PR, Segunda Seção, Rel. p/ acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA). 3. Na mesma esteira, a jurisprudência da eg. Segunda Seção, inclusive arrimada em significativo precedente da eg. Terceira Turma (REsp 1.665.701/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA), assentou que, "com mais razão, a cobertura do contrato de seguro de vida deve abranger os casos de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas, ressalvado o suicídio ocorrido dentro dos dois primeiros anos do contrato" (EREsp 973.725/SP, Relator Ministro LÁZARO GUIMARÃES). 4. Em função do julgamento dos EREsp 973.725/SP, a eg. Segunda Seção editou a Súmula 620/STJ com a seguinte PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001544-43.2023.8.26.0408 -Voto nº 1692 8 redação: "A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida." 5. Recurso especial desprovido.” (REsp n. 1.999.624/PR, relator Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 28/9/2022, DJe de 2/12/2022) (g.n.) Assim, a cobertura para o evento morte é ampla nos contratos de seguro de vida, segundo o STJ, não cabendo a negativa simplesmente pelo fato do segurado estar conduzindo o veículo em estado de embriaguez. A partir dessas considerações, a sentença deve ser mantida no ponto em que reconheceu o direito da autora à indenização securitária nos termos da proposta contratada, a qual estabelece o capital básico segurado para a “morte natural”, e o dobro do capital básico segurando para a “morte acidental”, totalizando o valor de R$ 522.620,68. Por fim, em relação ao índice de correção a ser aplicado na espécie, sem maiores delongas, convém utilizar o IGPM-FGV, conforme expressamente pactuado no contrato de seguro, tendo em vista ser este o índice que melhor reflete a desvalorização da moeda frente à inflação. Quanto ao termo inicial para incidência da correção monetária, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a atualização deve ocorrer a partir da data da contratação do seguro: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973. ALEGAÇÃO GENÉRICA. SÚMULA Nº 284/STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 211/STJ. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INCAPACIDADE. PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. (...) 3. A correção monetária incide desde a data da celebração do contrato até o dia do efetivo pagamento do seguro, pois a apólice deve refletir o valor contratado atualizado. Precedentes. 4. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que, nas ações que buscam o pagamento de indenização securitária, os juros de mora devem incidir a partir da data da citação da seguradora, visto se tratar de eventual ilícito contratual. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ - AgRg no REsp 1328730/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 28/06/2016) (g.n.) “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. 1. A correção monetária incide desde a data da celebração do contrato de seguro de vida até o dia do efetivo pagamento da indenização, pois a apólice deve refletir o valor contratado atualizado. Precedentes. 2. Agravo interno não provido.” (STJ; AgInt no REsp 1715056/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 02/09/2019) (g.n.) A questão inclusive já foi sumulada pela Corte Superior: “Súmula 632 - Nos contratos de seguro regidos pelo Código Civil, a correção monetária sobre a indenização securitária incide a partir da contratação até o efetivo pagamento” Portanto, deve ser aplicado IGPM como índice de correção monetária até a data da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024 quando passará a incidir unicamente a taxa SELIC, para os juros de mora e correção monetária. Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por BANCO DO BRASIL S/A E BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS S/A, tão somente para fixar o IGPM como índice de correção monetária até a data da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, momento em que deverá incidir unicamente a taxa SELIC, para os juros de mora e correção monetária. Inaplicável o art. 85, §11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
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