Processo nº 5033722-55.2024.8.24.0033
ID: 337634145
Tribunal: TJSC
Órgão: Gab. 01 - 4ª Câmara de Direito Público
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5033722-55.2024.8.24.0033
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5033722-55.2024.8.24.0033/SC
APELANTE
: BERLIM E CUNHA TRANSPORTES LTDA (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A)
: CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN (OAB SC019433)
DESPACHO/DECISÃO
1. Em atenção aos princípios d…
Apelação Nº 5033722-55.2024.8.24.0033/SC
APELANTE
: BERLIM E CUNHA TRANSPORTES LTDA (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A)
: CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN (OAB SC019433)
DESPACHO/DECISÃO
1. Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:
Trata-se de
Mandado de Segurança
impetrado por
BERLIM E CUNHA TRANSPORTES LTDA - EPP
, em desfavor do
GERENTE DA 2ª GERÊNCIA REGIONAL DA FAZENDA ESTADUAL - ESTADO DE SANTA CATARINA - ITAJAÍ
, tendo por objeto:
"[...] d) Seja confirmada a medida liminar, se deferida, concedendo a segurança para reconhecer e assegurar o direito líquido e certo da Impetrante em realizar o credita mento na tributação do ICMS sobre as aquisições de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição, nos fretes iniciados em outros Estados, utilizados em sua frota de veículos no desenvolvimento da atividade fim da impetrante;
e) Seja determinada à Autoridade Impetrada que se abstenha de efetivar lançamentos e/ou medidas restritivas ao direito da Impetrante no assunto objeto da ação, tal como a exigência do estorno proporcional dos créditos relativos à aquisição de insumos aplicados nas prestações do serviço de transporte iniciados em outros Estados;
f) Reconhecido o direito, requer-se a autorização para realizar a compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de ICMS em razão da ilegal proibição, pelo Impetrado, da apropriação dos créditos pleiteados, garantindo-se o direito à escrituração dos créditos dos valores não aproveitados nos 05 (cinco) anos anteriores à impetração do presente mandamus, devidamente atualizados pela Taxa Selic;".
Houve o indeferimento do pleito liminar (
evento 11, DOC1
).
O Impetrado e o Estado de Santa Catarina prestaram informações e pugnaram pela denegação da ordem (
evento 21, DOC1
).
Instado, o representante do Ministério Público, com fulcro no ato 103/2004/PGJ, manifestou-se apenas formalmente (
evento 26, DOC1
).
Vieram os autos conclusos para sentença.
Sobreveio sentença (
evento 28, SENT1
, origem), a qual julgou a lide nos seguintes termos:
Ante o exposto,
RESOLVO
o mérito, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e
DENEGO A SEGURANÇA
pleiteada no presente mandado de Segurança impetrado por BERLIM E CUNHA TRANSPORTES LTDA - EPP, em desfavor do GERENTE DA 2ª GERÊNCIA REGIONAL DA FAZENDA ESTADUAL - ESTADO DE SANTA CATARINA - ITAJAÍ.
Oficie-se à Autoridade Impetrada e o Órgão de Representação Judicial da Pessoa Jurídica Interessada, com cópia, para conhecimento da presente decisão (art. 13 da Lei n. 12.016/09).
Custas finais pela parte Impetrante.
Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei n. 12.016/09 e súmulas 512 do STF e 105 do STJ).
Sentença não sujeita a reexame necessário (art. 14, § 1º, da Lei n. 12.016/09).
Inconformada, a parte impetrante interpôs recurso de apelação (
evento 40, APELAÇÃO1
, origem). Em suas razões, em síntese, asseverou que:
[...] a recusa de um Estado quanto ao crédito relativo ao imposto recolhido para outro é vedada pela Constituição Federal, que traz expressamente o direito de compensar o montante cobrado “pelo mesmo ou outro Estado”, no art. 155, § 2º, inciso I (princípio da não cumulatividade).
[...] nota-se a flagrante violação ao princípio da não cumulatividade e do princípio federativo quando um Estado resolve reconhecer como crédito apenas os valores que foram recolhidos em seu favor, pois neste raciocínio, nenhuma transação interestadual, nesse caso, permitiria o direito ao crédito.
[...] ao estabelecer que o ICMS será não-cumulativo, garantindo a compensação com o tributo de mesma espécie cobrado em cada operação, o constituinte deixou claro que este valor poderia ser referente ao “mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.
[...] o princípio da não cumulatividade não deve ter seu alcance restringido por Decreto Estadual ou Lei Estadual, sob pena de inconstitucionalidade.
Uma vez reformada a sentença, no sentido de ser reconhecida a ilegalidade e a inconstitucionalidade demonstradas acima, requer seja acolhido o pedido de compensação dos valores recolhidos indevidamente, e portanto a maior, devidamente corrigidos pela SELIC de acordo com o que dispõe a Súmula 213 do STJ3 , desde as datas dos recolhimentos indevidos até a data da efetiva compensação, em conformidade com o disposto no § 4º, do art. 39, da Lei nº 9.250/95, observado o prazo prescricional de 5 (cinco) anos aplicável (art. 168 do CTN).
Ao final, assim pugnou:
Ante ao exposto, requer:
a) Sejam recebidas, admitidas e processadas as razões deste Recurso de Apelação, determinando-se o seu conhecimento e provimento, a fim de que seja reformada a decisão de primeiro grau, reconhecendo-se o direito líquido e certo da Apelante em realizar o creditamento e a manutenção dos créditos escriturados a título de ICMS sobre as aquisições de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição, nos fretes iniciados em outros Estados, utilizados em sua frota de veículos no desenvolvimento da atividade fim da impetrante, vedando-se a exigência do estorno;
b) Seja determinado que o Apelado se abstenha de efetivar lançamentos e/ou medidas restritivas ao direito da Apelante no assunto objeto da ação, tal como a exigência do estorno proporcional dos créditos relativos à aquisição de insumos aplicados nas prestações do serviço de transporte iniciados em outros Estados;
c) Reconhecer o direito creditório à compensação dos valores recolhidos indevidamente a título de ICMS no quinquênio anterior à distribuição do mandamus, bem como durante o curso do processo, devidamente atualizados pela Taxa Selic;
d) Seja condenada a apelada ao ressarcimento das custas processuais e demais cominações de estilo;
[...].
Contrarrazões ao
evento 45, CONTRAZ1
da origem, nas quais o Estado de Santa Catarina requereu
"o desprovimento do recurso de apelação, com a rejeição integral dos pedidos recursais"
.
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou no sentido do conhecimento e desprovimento do recurso (
evento 13, PARECER1
).
É o relatório.
DECIDO.
2. De plano, ressalto que a matéria debatida no presente recurso conta com precedentes idênticos da jurisprudência, o que autoriza o julgamento monocrático da questão, vez que a
mens legis
do artigo 932, IV e V, do CPC é, justamente, fomentar solução mais breve aos casos em que existente uniformidade no questionamento posto pela via recursal.
Não se olvide, ainda, o disposto no artigo 132, XV e XVI, do RITJSC, o qual permite ao relator julgar monocraticamente o recurso, à vista de "
enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça
".
3. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão por que conheço do recurso.
4. Em suma, a parte impetrante busca a concessão de segurança com vistas à escrituração e compensação de créditos de ICMS sobre aquisições de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição, nos fretes iniciados em outros Estados, utilizados na sua frota de veículos no desenvolvimento da sua atividade fim.
No caso, como visto, o Magistrado sentenciante, embora reconhecendo que a impetrante tem
"direito ao creditamento dos insumos utilizados para o desempenho de suas atividades" -
de transporte de cargas -, entendeu ser caso de denegação da ordem, ao seguinte fundamento:
A parte Impetrante possui direito ao creditamento dos insumos utilizados para o desempenho de suas atividades. Contudo, é necessário analisar que a incidência do ICMS é onde se iniciou a prestação do serviço, conforme consta no art. 4º, V da Lei Estadual n.º 10.297/1996:
Art. 4
º
Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
V – do início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal de qualquer natureza;
O Regimento do ICMS apenas especificou o que está previsto na Lei mencionada anteriormente, sem qualquer violação ao princípio da não cumulatividade do tributo.
RICMS:
Art. 34. Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços:
V - aplicados na prestação de serviço de transporte iniciado em outro Estado;
Neste sentido:
MANDADO DE SEGURANÇA - CREDITAMENTO DE ICMS - TRANSPORTE DE CARGAS - AQUISIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES, PNEUS E OUTROS BENS ADJCENTES - INSUMOS - RACIOCÍNIO, PORÉM, QUE NÃO SE ESTENDE AOS FRETES INICIADOS EM OUTROS ESTADOS - PRECEDENTES DESTE TJSC - SENTENÇA DENEGATÓRIA RATIFICADA.
1. O Tema 10 deste Tribunal de Justiça avaliou a "Possibilidade do creditamento do ICMS, com fundamento na LC nº 87/96, sobre os produtos intermediários que não se integram fisicamente ao produto, mas são bens de consumo do estabelecimento ou do ativo fixo". Na oportunidade, fixou-se tese no sentido de que o aproveitamento do crédito ficava condicionado à comprovação do consumo imediato e integral dos bens, além de sua integração física ao produto final.
A discussão mais ampla concentrava-se na dicotomia entre crédito físico e financeiro, avaliada sob a perspectiva do creditamento de materiais empregados na manufatura de bens.
O raciocínio não se aplica aos prestadores de serviço.
2. O creditamento pela aquisição de combustíveis, pneus, lubrificantes, aditivos e peças de reposição por empresas que atuam no ramo de transporte de cargas era há muito, mesmo antes da Lei 13.790/06 (Pró-Cargas SC), autorizada pela jurisprudência deste Tribunal, que reiteradamente os considerava insumos essenciais para a prestação do serviço.
3. A hipótese, porém, apenas se restringe a fretes iniciados dentro do Estado de Santa Catarina, haja vista previsão regulamentar impossibilitando creditamento integral quanto a serviços de transporte iniciados em outras unidades da federação.
4. Não altera essa linha de raciocínio o julgamento pelo STF quanto à ADI 3.984, rel. Min. Luiz Fux. O julgado paradigma teve em mira a tal norma estadual que instituía benefícios fiscais unilateralmente (nos casos de aquisição de pneus, combustível, lubrificante e peças de reposição da frota), mas esse pensamento não se estende para cá, cuja diferenciação de tratamento está amparada em legislação estadual em vigor (mais precisamente, o RICMS).
5. Recurso desprovido.
(TJSC, Apelação n. 5002162-83.2024.8.24.0037, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 11-02-2025).
Destarte, inexiste direito líquido e certo ao creditamento de insumos nos fretes iniciados em outros Estados.
Cediço, nesta Corte, que, ao dar efetividade ao princípio da não cumulatividade (art. 155 §2º, I, da CRFB), a Lei Complementar n. 87/1996 permite a utilização dos créditos de ICMS provenientes da aquisição de insumos necessários à consecução da atividade-fim da empresa.
Não obstante, na linha de jurisprudência dominante, tem se posicionado este Órgão Fracionário no sentido de que
"O direito ao creditamento do ICMS, incidente sobre a aquisição de produtos intermediários utilizados no processo produtivo, não se estende ao transporte iniciado em outras unidades federativas, uma vez que o crédito deve ser concedido no local onde a tributação de fato aconteceu"
, entendimento este que inclusive é "
amparado por precedentes desta Corte: Apelação n. 5000652-02.2023.8.24.0124, rel. Des. Sandro Jose Neis, Terceira Câmara de Direito Público, j. 25-6-2024; Apelação n. 0017964-60.2010.8.24.0018, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 4-4-2024; Apelação Cível n. 0023928-63.2012.8.24.0018, de Chapecó, rela. Desa. Denise de Souza Luiz Francoski, Quinta Câmara de Direito Público, j. 7-7-2020"
. (TJSC, Agravo interno em Apelação/Remessa Necessária n. 5000657-24.2023.8.24.0124, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Diogo Pítsica, Quarta Câmara de Direito Público, j. 22-08-2024).
A esse respeito, aliás, este Órgão Julgador já confirmou, em sede de Agravo Interno, julgamento monocrático do Exmo. Sr. Des. Diogo Pítsica, cujos fundamentos, que fazem remissão a acórdão de relatoria do eminente Des. Odson Cardoso Filho, adoto
per relationem
, à luz da celeridade e economia processuais, pois bastantes à solução do presente caso:
O âmago da questão consiste em averiguar se o contribuinte detém direito ao creditamento na tributação do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS sobre as aquisições de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição de veículos de sua frota utilizados no desenvolvimento da atividade fim
nos fretes iniciados em outros Estados
.
Não impera, adianto, direito de creditamento do ICMS nos casos de prestação de serviços de transporte de mercadorias iniciada em outra unidade federativa e destinado à mesma unidade ou outra que não o Estado de Catarina.
Recentemente, essa foi a conclusão alcançada por este órgão fracionário ao apreciar situação muito semelhante à presente:
APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA. ICMS. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECLAMOS DE AMBAS AS PARTES.
PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA. JULGAMENTO EXTRA E INFRA PETITA. DEFICIÊNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO. MÁCULAS AFASTADAS.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS. APROVEITAMENTO INTEGRAL DE CRÉDITOS DE ICMS DECORRENTES DA AQUISIÇÃO DE BENS PARA O ATIVO FIXO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA, TENHA SIDO O ESTADO DE SANTA CATARINA BENEFICIADO PELA TRIBUTAÇÃO OU NÃO, COM EFEITOS RETROATIVOS AOS 5 (CINCO) ANOS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. ACOLHIMENTO PARCIAL.
[1]
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE INICIADA EM OUTRA UNIDADE FEDERATIVA
OU NO EXTERIOR
E DESTINADA A SANTA CATARINA OU INICIADA EM OUTRA UNIDADE FEDERATIVA E DESTINADA À MESMA OU À OUTRA UNIDADE FEDERATIVA. LIMITAÇÕES DO REGRAMENTO ESTADUAL AO CREDITAMENTO NA HIPÓTESE EM QUE O ESTADO DE SANTA CATARINA NÃO FIGURA COMO SUJEITO ATIVO DO ICMS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DA QUINTA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DESTE SODALÍCIO.
[2] RESSALVA QUANTO ÀS OPERAÇÕES INICIADAS EM SANTA CATARINA OU EM OUTRA UNIDADE FEDERATIVA E DESTINADAS AO EXTERIOR. ORIENTAÇÃO DITADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANTO À EFICÁCIA PLENA DA NORMA CONSTANTE DO ART. 25, § 1º, DA LC N. 87/1996. DIREITO AO APROVEITAMENTO DOS CRÉDITOS DE ICMS DESDE OS 5 (CINCO) ANOS ANTERIORES À PROPOSITURA DA AÇÃO, DEVIDAMENTE ATUALIZADOS PELA TAXA SELIC. TEMA N. 905 DO STJ E EC N. 113/2021. RECURSO AUTORAL PROVIDO NESSE ASPECTO, COM REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. RECURSO ADESIVO FAZENDÁRIO. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. RECURSOS CONHECIDOS, PARCIALMENTE PROVIDO O APELO DA PARTE AUTORA E INTEGRALMENTE PROVIDO O RECLAMO DO ESTADO.
(TJSC, Apelação n. 0017963-75.2010.8.24.0018, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 4-4-2024).
E, da íntegra do julgado, cito-o como razões de decidir:
O princípio da não cumulatividade do ICMS tem assento constitucional, cabendo, porém, à lei complementar disciplinar o regime de compensação do imposto:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
[...]
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
[...]
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;
[...]
XII - cabe à lei complementar:
[...]
c) disciplinar o regime de compensação do imposto;
E a Lei Kandir (LC n. 87/1996), além de reproduzir em seu art. 19 o teor da previsão constitucional, assim preconiza sobre a compensação do ICMS:
Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.
§ 2º Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.
§ 3º É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I - para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior;
II - para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subseqüente não forem tributadas ou estiverem isentas do imposto,
exceto as destinadas ao exterior
.
[...]
Art. 21.
O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto
de que se tiver creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
I - for objeto de saída ou prestação de serviço não tributada ou isenta, sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada da mercadoria ou da utilização do serviço;
II - for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto;
III - vier a ser utilizada em fim alheio à atividade do estabelecimento;
IV - vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
[...]
§ 2
o
Não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior
ou de operações com o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos.
É com amparo justamente no art. 20, § 3º, I e II, da LC n. 87/1996 que a demandante busca ver reconhecido o seu direito, arguindo tratar-se de rol taxativo de hipóteses de vedação ao creditamento do ICMS, razão pela qual "fora das hipóteses expressamente consignadas no artigo acima, não há razão que impeça a manutenção do crédito de ICMS [ou que determine o seu estorno], porque não pode o ente estatal restringir o alcance da norma federal, a quem coube traçar as diretrizes quanto à compensação do ICMS" (Ev. 59).
Porém, cumpre pontuar que "nos termos do inc. I do art. 24 da Constituição da República,
é concorrente a competência para legislar sobre direito tributário,
inclusive sobre o regime de compensação
do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre prestações de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS" (STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.623/MT, rela. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, j. 16-6-2020; negritei).
No âmbito do Estado de Santa Catarina, é a Lei Estadual n. 10.297/1996 que dispõe sobre o ICMS e acerca do regime de compensação do tributo, reproduzindo, em grande medida, as previsões da LC n. 87/1996:
Art. 22. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
[...]
Art. 27. Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.
Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.
Art. 28. Salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, é vedado o crédito relativo à mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I – para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante for isenta ou não-tributada, exceto quando se tratar de saída para o exterior;
II – para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subseqüente for isenta ou não-tributada, exceto se destinada ao exterior.
[...]
Art. 30. O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que se tiver creditado, sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
I – for objeto de saída ou prestação de serviço isenta ou não-tributada, sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada da mercadoria ou da utilização do serviço;
II – for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante for isenta ou não-tributada, sendo esta circunstância imprevisível por ocasião da sua entrada;
III – vier a ser utilizada em fim alheio à atividade do estabelecimento;
IV – vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
[...]
§ 2º Não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior.
Colhe-se, ademais, do RICMS/SC:
Art. 34. Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços:
I - resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas;
II – com imposto retido na origem em regime de substituição tributária, ressalvadas as hipóteses previstas no art. 23-A do Anexo 3.
III - que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento;
IV - aplicados em atividades sujeitas ao imposto sobre serviços, de competência municipal;
V - aplicados na prestação de serviço de transporte iniciado em outro Estado;
VI – quando o documento fiscal, relativo a operação ou prestação sujeita ao pagamento do imposto por ocasião do fato gerador, vier desacompanhado do respectivo documento de arrecadação.
Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.
Art. 35. Salvo disposição em contrário, é vedado o crédito relativo à mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I - para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante for isenta ou não tributada;
II - para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subseqüente for isenta ou não tributada.
Parágrafo único. Fica assegurado o crédito correspondente às mercadorias ou serviços destinados ao exterior ou com fim específico de exportação, de que tratam o art. 6°, II e seus §§ 1º e 2º.
Art. 36. O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que se tiver creditado, sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
I - for objeto de saída ou prestação de serviço isenta ou não tributada, sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada da mercadoria ou da utilização do serviço;
II - for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante for isenta ou não tributada, sendo esta circunstância imprevisível por ocasião da sua entrada;
III - vier a ser utilizada em fim alheio à atividade do estabelecimento;
IV - vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
§ 1° Não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior ou com fim específico de exportação, de que tratam o art. 6°, II e seus §§ 1º e 2º.
§ 2° Deverão ainda ser estornados, proporcionalmente ao respectivo faturamento, observado o disposto no art. 38, § 1º, os créditos incorridos:
I - na prestação do serviço, por estabelecimentos que praticarem operações e prestações sujeitas ao ICMS e ao imposto sobre serviços, de competência municipal;
II - na prestação de serviço de transporte iniciado em outro Estado.
§ 3º Deverão ser estornados, proporcionalmente ao respectivo faturamento, os créditos previstos no § 8º do art. 29 deste Regulamento incorridos na prestação de serviço de transporte em que o Estado não seja sujeito ativo. (destaquei)
A existência de limitações ao creditamento do ICMS na aquisição de bens para o ativo fixo de prestadoras de serviço de transporte rodoviário de cargas é corroborada pela previsão do art. 265, § 2º, do Anexo VI do RICMS/SC:
Art. 265. Aos estabelecimentos prestadores de serviço de transporte de cargas, sem prejuízo da utilização de outros créditos garantidos pela legislação, é assegurado o direito de se creditar do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada, decorrente de aquisições efetuadas neste Estado, das seguintes mercadorias:
I – lubrificantes, aditivos e outros fluidos;
II – pneus e câmaras de ar; e
III – peças de reposição.
§ 1° O disposto no “caput” somente se aplica em relação ao imposto incidente sobre as mercadorias adquiridas, a partir de 1° de agosto de 2006, para uso em veículo utilizado exclusivamente na prestação de serviço de transporte rodoviário de cargas.
§ 2º O creditamento deverá observar, no que couber, o disposto no Regulamento, Capítulo V, Seções II, III e IV.
§ 3º Deverão ser estornados, proporcionalmente ao respectivo faturamento, os créditos incorridos na prestação de serviço de transporte iniciado em outro Estado, salvo os decorrentes de aquisição de combustível de estabelecimento situado em território catarinense, na hipótese em que o total de créditos efetivos não ultrapasse 60% (sessenta por cento) dos débitos do imposto. (negritei)
O aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens para o ativo fixo, proporcionalmente às operações em que o Estado de Santa Catarina figure como sujeito ativo do tributo, possui, assim, lastro no regramento estadual; o que a acionante busca é o afastamento da aplicação das disposições da Lei Estadual n. 10.297/1996 e, especialmente, do RICMS/SC.
Compreende-se, contudo, que
o creditamento não é direito absoluto e irrestrito, ficando sua possibilidade limitada, no caso, à prestação de serviços de transportes
iniciada
em Santa Catarina,
porque, nessa situação, é este o ente estadual beneficiado pela tributação - isso considerando tanto a previsão da LC n. 87/1996 quanto as disposições da Lei Estadual n. 10.297/1996 sobre o momento do fato gerador e a identificação do sujeito ativo do tributo -, viabilizando, por conseguinte, a compensação.
Ademais, quanto ao direito da autora de creditar-se do ICMS nos casos de prestação de serviços de transporte de mercadorias iniciado em outra unidade federativa e destinado ao exterior, elucido que, neste caso, subsiste direito ao creditamento, conforme posicionamento do STJ (Recurso Especial n. 2.058.455/SC).
Portanto, em consonância à orientação da Corte da Cidadania, a concessão da segurança, nesse aspecto, é medida impositiva, para reconhecer o direito da contribuinte de aproveitar os créditos do ICMS decorrentes da aquisição de bens para o ativo imobilizado na prestação de serviços de transporte rodoviário de cargas com destino ao exterior, que tenha início em outra unidade federativa, com efeitos retroativos aos 5 (cinco) anos anteriores ao ajuizamento da demanda.
Nesse sentir, há recente decisão encartada pela Corte Constitucional, no Tema n. 1.262, em acórdão publicado em 28-8-2023, proclamado nos termos adjacentes:
"Não se mostra admissível a
restituição
administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal".
Aqui, porém, o pedido é voltado exclusivamente à compensação.
Adversamente ao asserido pelo ente federado, a matéria tratada no paradigma refere-se ao instituto da "restituição administrativa", enquanto a presente contenda versa sobre "compensação tributária".
Ambas são hipóteses singulares de extinção da obrigação tributária. A fim de melhor elucidar o enleio e os conceitos que orbitam a matéria, cabível breve exposição de lição doutrinária.
Instrumento legal utilizado pelo contribuinte para recuperar impostos pagos indevidamente, a compensação tributária ocorre a extinção de duas obrigações, cujos credores são, ao mesmo tempo, devedores um do outro (artigos 156, 170 e 170-A, do CTN).
Derradeiramente, o contribuinte detém direito ao creditamento na tributação do ICMS sobre as aquisições de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição de veículos de sua frota utilizados no desenvolvimento da atividade-fim nos fretes iniciados em outros Estados e destinados aos exterior, contudo, nessa mesma situação, não há direito ao creditamento quando os fretes são iniciados em outros Estados e destinados à mesma ou outra unidade federativa.
Conforme preconizam o art. 25 da Lei n. 12.016/2009 e as Súmulas n. 512 do STF e n. 105 do STJ, destaco que não incidem honorários advocatícios e, tampouco, custas, em mandado de segurança.
Evidenciada a jurisprudência dominante desta Corte acerca da matéria, o recurso merece enfrentamento monocrático, com esteio no art. 132 do Regimento Interno do Tribunal catarinense.
(realcei o penúltimo parágrafo).
Por oportuno, destaco que
"A adoção da fundamentação 'per relationem' no acórdão, com a transcrição de sentença ou parecer, em complemento às próprias razões de decidir, é técnica cuja legitimidade jurídico-constitucional é reconhecida há muito pelas Cortes Superiores, entendimento que não sofreu alteração com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil" (Embargos de Declaração n. 0004427-78.2013.8.24.0054/50000, rel. Des. Júlio César M. Ferreira de Melo, j. em 29-9-2016). (TJSC, Embargos de Declaração n. 0006528-23.2013.8.24.0011, de Brusque, rel. Altamiro de Oliveira). [...]"
(TJSC, Apelação n. 0003367-86.2001.8.24.0023, rel. Des. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 6-8-2024).
Por tais razões e tendo em conta a amplitude da controvérsia, concluo que deve ser
concedida em parte a segurança
tão somente para reconhecer o direito da impetrante ao creditamento de ICMS incidente sobre aquisição de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição utilizados na atividade empresarial consistente nos
fretes iniciados em outros Estados e destinados ao mercado exterior
, autorizando, por conseguinte, a compensação tributária dos créditos referentes aos cinco anos anteriores à propositura da ação.
5. Conforme preconizam o artigo 25 da Lei n. 12.016/2009 e as Súmulas n. 512 do STF e n. 105 do STJ, destaco que não incidem honorários advocatícios em mandado de segurança.
Tendo em conta a sucumbência mínima da parte autora e considerando que o Estado de Santa Catarina é isento do recolhimento da taxa de serviços judiciais (LE nº 17.654/2018, art. 7º, I), fica, todavia, condenado a ressarcir os valores que foram adiantados pela parte adversa para o ingresso da presente ação (LE nº 17.654/2018, art. 7º, parágrafo único).
6. Ante o exposto, com fundamento no art. 932, VIII, do CPC e no art. 132, XV e XVI do Regimento Interno desta Corte, conheço do recurso e reformando a sentença,
DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO
, no sentido de:
a)
CONCEDER EM PARTE A SEGURANÇA ALMEJADA
para o fim de reconhecer o direito da impetrante ao creditamento de ICMS sobre aquisição de combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição utilizados na atividade empresarial que consiste nos
fretes iniciados em outros Estados e estritamente destinados ao exterior
, autorizando, assim, a compensação tributária dos créditos referentes aos cinco anos anteriores à propositura da ação;
b) CONDENAR
o Estado de Santa Catarina ao ressarcimento da custas judiciais adiantados pela parte impetrante para o ajuizamento da presente ação.
Intimem-se.
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