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Processo nº 0001192-91.2024.8.26.0562

ID: 337645455

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Santos - Vara de Acidentes do Trabalho e do Juizado Especial da Fazenda Pública Classe: CUMPRIMENTO DE SENTENçA Nº Processo: 0001192-91.2024.8.26.0562

Data de Disponibilização: 30/07/2025

Polo Ativo:

CARLOS ALBERTO DA SILVA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WAGNER JOSÉ DE SOUZA GATTO

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GYSELE GOMES DE CARVALHO MURARO

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Processo 0001192-91.2024.8.26.0562 (processo principal 1003322-71.2023.8.26.0562) - Cumprimento de sentença - Adicional de Horas Extras - Carlos Alberto da Silva - Vistos. Trata-se de cumprimento de … Processo 0001192-91.2024.8.26.0562 (processo principal 1003322-71.2023.8.26.0562) - Cumprimento de sentença - Adicional de Horas Extras - Carlos Alberto da Silva - Vistos. Trata-se de cumprimento de sentença. Após a apostila, a parte exequente apresentou a planilha de cálculos para início da obrigação de pagar, todavia, a referida planilha não relacionou os valores que foram considerados para apontar o total indicado mês a mês, de modo a permitir a constatação da pertinência dos totais parciais. A situação foi verificada em diversos processos, pelo que tem sido determinada a apresentação dos comprovantes de pagamento das prestações vencidas no curso do processo, bem como nova planilha da qual constem todos os valores postulados, não apenas os totais encontrados pela exequente. A providência é importante, pela necessidade de comprovação dos valores considerados para apuração desses totais parciais, indicados mês a mês, para a devida verificação da liquidez do crédito buscado, pelo fato das parcelas vincendas não terem sido comprovadas no curso do processo de conhecimento e ainda em respeito à indisponibilidade dos direitos fazendários. A providência é simples porque ambas as partes dispõem dos documentos necessários para indicação dos valores constantes dos holerites, de modo que não haverá necessidade de cálculos complexos ou diversos do que deveriam ter sido efetuados pelas partes justamente para a elaboração da planilha. A providência é pertinente porque foram verificadas discrepâncias em processos nos quais, após o cumprimento da decisão que determinou a apresentação de holerites e de nova planilha com descriminação dos valores considerados mês a mês para indicação dos totais parciais, o valor total apurado foi inferior ao valor inicial e, o que causa maior surpresa, na segunda planilha foi considerado período de apuração mais extenso, com termo final mais distante do que aquele apontado na planilha inicial. Foi o que ocorreu, por exemplo, nos autos 00096xx-xx.2023 (a parte exequente apresentou planilha relacionando em uma coluna os valores totais devidos a cada mês (de maio/2017 a julho/2023 - sem indicar quais verbas somadas levaram esses totais - seguida de colunas indicando atualização monetária e juros de mora, encontrando crédito total). A Municipalidade apresentou cálculo considerando apenas os valores totais parciais, mês a mês, e impugnou o valor dos juros de mora, também sem explicar como os totais parciais foram encontrados. Ambas as contas tiveram como termo final o mês de outubro de 2023. Após decisão negando efeito suspensivo ao agravo manejado contra a decisão deste Juízo que determinou a apresentação de holerites das prestações vencidas no curso do processo e de planilha explicativa dos valores que ensejaram os totais parciais, a parte exequente cumpriu a decisão deste Juízo, juntou nova planilha, e nela apresentou crédito de valor inferior ao anterior. Destaca-se que o valor bruto inicial (indicado antes do atendimento da decisão recorrida) foi inferior ao crédito bruto apurado após o atendimento da decisão, o que é curioso, porquanto a primeira planilha teve como termo final de atualização o mês de outubro de 2023, e a segunda, apresentada em atendimento à decisão recorrida, teve termo final em fevereiro de 2025. A mesma situação foi verificada nos autos 00090xx-xx-2023: após cumprimento da decisão que determinou a juntada de nova planilha e holerites das prestações vencidas no curso do processo, a parte exequente apresentou valor bruto do crédito atualizado em valor inferior ao anterior, sendo que na primeira conta, de valor superior, a atualização encerrou-se em setembro de 2023 e na segunda conta, de valor menor, o termo final de atualização foi fevereiro de 2025. Tudo a justificar a adoção das providências apontadas na fase de cumprimento de sentença. A propósito, destacam-se V. Acórdãos proferidos em agravos de instrumento que confirmaram a pertinência da decisão deste Juízo, sempre tendo em vista a indisponibilidade dos direitos fazendários e o respeito à coisa julgada, tanto em casos nos quais o ente público foi inerte e não ofereceu impugnação, como em casos nos quais apenas reproduziu os totais parciais indicados pela parte exequente sem comprovação de como foram apurados. Nesse sentido: AGRAVO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORO DE SANTOS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CONCORDÂNCIA DO EXEQUENTE COM OS CÁLCULOS APRESENTADOS PELA EXECUTADA. DISPENSA DE NOVA PLANILHA E DOCUMENTOS. RECURSO IMPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que determinou à parte exequente a juntada de holerites e a apresentação de nova planilha de cálculo, apesar da concordância expressa da exequente com os valores apurados pela Fazenda Pública. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em determinar se, diante da concordância expressa do exequente com os cálculos apresentados pela Fazenda Pública, é necessária a reapresentação de nova planilha de cálculo e documentos adicionais para a homologação dos valores. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A concordância expressa do credor com os cálculos da Fazenda Pública não torna desnecessária a exigência de nova planilha e documentos. 4. A decisão agravada apontou erro, incongruência ou falta de informação nos cálculos apresentados em outros processos, razão pela qual a determinação de reapresentação de documentos não se mostra infundada. 5. A exigência imposta pela decisão recorrida não viola os princípios da celeridade e da economia processual, fundamentais nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, uma vez que se mostra pertinente ao correto cumprimento de sentença. 6. Mudança de entendimento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso improvido. Tese de julgamento: 1. A concordância do credor com os cálculos apresentados pela executada não dispensa a necessidade de nova planilha de cálculo e documentos adicionais. 2. A exigência imposta pela decisão recorrida não viola os princípios da celeridade e da economia processual, fundamentais nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, uma vez que se mostra pertinente ao correto cumprimento de sentença. Jurisprudência relevante citada: TJSP; Agravo de Instrumento 0103453-17.2025.8.26.9061; Relator (a): Isabel Cristina Alonso Bezerra Zara - Colégio Recursal; Órgão Julgador: 3ª Turma Recursal de Fazenda Pública; Foro de Santos - Vara de Acidentes do Trabalho e do Juizado Especial da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 08/05/2025; Data de Registro: 08/05/2025 (Agravo de Instrumento nº 0103486-07.2025.8.26.9061, 3ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, v. u., Relator Juiz Dimitrios Zarvos Varellis, j. em 14 de maio de 2025 - grifo nosso). No mesmo sentido, foram improvidos por votação unânime os agravos de instrumento que discutiram a mesma questão perante a e. Quarta Turma Recursal da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, integrada pelos MM. Juízes FÁBIO FRESCA, LUÍS GUSTAVO DA SILVA PIRES e ROGÉRIO DANNA CHAIB: AGRAVO DE INSTRUMENTO. Cumprimento de sentença. Decisão que indeferiu a homologação de cálculos e determinou a apresentação de nova planilha, com juntada de demonstrativos de vencimentos. Manutenção. Questões que demandam acurada análise probatória. Vedação contida na Lei nº 8.437/1992 Decisão mantida. Recurso não provido. Agravo de Instrumento nº 0102160-12.2025.8.26.9061, 4ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, v. u., Relator Juiz Rogério Danna Chaib, j. em 28 de abril de 2025). AGRAVO DE INSTRUMENTO. Cumprimento de sentença. Decisão que indeferiu a homologação de cálculos e determinou a apresentação de nova planilha, com juntada de demonstrativos de vencimentos. Manutenção. Questões que demandam acurada análise probatória. Vedação contida na Lei nº 8.437/1992 Decisão mantida. Recurso não provido. (Agravo de Instrumento nº 0102160-12.2025.8.26.9061, 4ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, v. u., Relator Juiz Rogério Danna Chaib, j. em 28 de abril de 2025). AGRAVO DE INSTRUMENTO - Decisão que determinou que a Exequente apresentasse nova planilha de cálculos, indicando detalhadamente os valores que entendes devidos, em observância aos limites da coisa julgada - Determinação em consonância com o art. 534, CPC Ausência de ônus excessivo ao Exequente - Decisão mantida - Recurso desprovido (Agravo de Instrumento nº 0101059-37.2025.8.26.9061, 4ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator Juiz Luís Gustavo da Silva Pires, v.u., j. em 4 de março de 2025). AGRAVO DE INSTRUMENTO Cumprimento de sentença - Insurgência contra decisão que determinou a juntada de planilha de débito contendo informações detalhadas Necessidade de análise dos parâmetros fixados no título executivo judicial Cálculos de baixa complexidade Possibilidade de cumprimento pelo exequente Decisão mantida por seus próprios fundamentos - Recurso desprovido (Agravo de Instrumento nº 0103741-62.2025.8.26.9061, 4ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, v.u., Relator Juiz Luís Gustavo da Silva Pires, j. 03 de abril de 2025). AGRAVO DE INSTRUMENTO - Decisão que determinou que a Exequente apresentasse nova planilha de cálculos, indicando detalhadamente os valores que entendes devidos, em observância aos limites da coisa julgada - Determinação em consonância com o art. 534, CPC Ausência de ônus excessivo ao Exequente - Decisão mantida - Recurso desprovido (Agravo de Instrumento nº 0103461- 91.2025.8.26.9061, 4ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, v.u., Relator Juiz Luís Gustavo da Silva Pires, j. em 03 de abril de 2025). No mesmo sentido: Agravos de Instrumento números 0103568-38.2025.8.26.9061; 0103751-09.2025.8.26.9061; 0103730-33.2025.8.26.9061; 0103657-61.2025.8.26.9061; 0103608-20.2025.8.26.9061; 0103486-07.2025.8.26.9061; 0102245-95.2025.8.26.9061; 0103756-71.2025.8.26.9061; 0102287-47.2025.8.26.9601; 0102062-27.2025.8.26.9601; 0102233-81.2025.8.26.9601; 0101015-18.2025.8.26.9601; 0101098-34.2025.8.26.9601; 0100907-86.2025.8.26.9601. Nesse contexto, necessária a definição do crédito buscado. É preciso destacar que ambas as partes devem observar que o cumprimento de sentença está restrito ao que foi decidido nos autos principais, o que obriga as partes a observar rigorosamente os parâmetros estabelecidos para a composição do crédito, por força da coisa julgada. Destarte, a despeito de eventual manifestação do ente público no sentido de concordar com o cálculo da parte exequente, ou mesmo no caso de não se manifestar, ou quando apresenta impugnação ao cálculo da parte exequente, com o qual esta vem a anuir, ainda assim, os limites estabelecidos pela coisa julgada deverão ser sempre respeitados. Por certo que a parte exequente tem direito a receber não apenas os valores vencidos (e não prescritos) indicados no momento da propositura da ação, como também os valores vencidos durante o trâmite do processo, além de juros e correção monetária sobre ambos, anotada a renúncia às prestações vencidas não relacionadas anteriormente. Não se ignora que essa renúncia está autorizada pela lei e irá prevalecer quando do cumprimento da sentença, no sentido de que a planilha observará o mesmo parâmetro inicial (com desconsideração de parte das prestações vencidas em relação à data do ajuizamento da causa e não indicadas para composição do crédito apurado na planilha que instruiu a petição inicial). De igual modo, as prestações que se vencerem no curso do processo também devem ser relacionadas, considerando os valores efetivamente recebidos, não prevalecendo eventual estimativa adotada para as doze prestações vincendas na planilha que deve instruir a petição inicial, porquanto apenas reproduzem o último valor recebido. Para além do debate sobre a correta apuração de correção monetária e juros de mora, de rigor que as diferenças relacionadas como devidas estejam claramente identificadas na nova planilha que instrui o pedido no incidente de cumprimento de sentença. Estabelecidas essas premissas, e à vista dos limites impostos pela coisa julgada, a parte exequente deverá: I- juntar os holerites correspondentes às prestações vincendas que, é claro, à época não foram juntados no processo de conhecimento; II- apresentar nova planilha de cálculo, que aponte em colunas separadas: II.a - os valores singelos recebidos e indicados na fase de conhecimento deverão ser apontados em colunas individualizadas, mês a mês, a saber, para as seguintes informações: a) "data" (mês e ano da prestação); b) "vencimento"; c) "horas realizadas 50% e 100%"; d) "valores pagos por horas realizadas 50% e 100%"; e) "valores corretos 50% e 100%"; f) "valores singelos do(s) (tipo(s) de gratificação, de acordo com o que foi estabelecido no título judicial transitado em julgado"; g) "o valor da gratificação objeto de recálculo que foi pago", h) "o valor da gratificação objeto de recálculo que é efetivamente devido em razão do recálculo", i) "a diferença singela apurada", j) "o valor atualizado dessa diferença" (anotando-se: os índices de correção deverão ser nominalmente identificados e mensalmente apontados), em colunas distintas, "atualização monetária - termo inicial" e "atualização monetária - termo final"; l) os juros de mora, m) "diferença total devida - valor final atualizado e acrescido de juros moratórios". II.b. - no caso de haver prestações vencidas no curso do processo (até efetiva implementação do recálculo e pagamento regular pelo ente público), a parte exequente deverá relacionar todas elas, pelo real valor que foi pago pela parte executada, com o devido comprovante desse pagamento (uma vez que no caso de indicação de doze prestações vincendas em planilha apresentada na fase de conhecimento há reprodução do valor da última prestação vencida na data do ajuizamento da ação). II.c. o índice de atualização monetária utilizado deverá ser identificado (por exemplo, IPCA-e, taxa SELIC), nos exatos termos estabelecidos pelo título judicial (sentença ou Acórdão transitado em julgado), e o valor do índice utilizado na operação deverá ser relacionado mês a mês (a saber, o do mês do vencimento da parcela e o do mês da elaboração do cálculo), assim como os juros de mora deverão ser identificados e aplicados segundo a legislação vigente: I- até 08/12/2021, aqueles definidos pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, j. 20/09/2017 (repercussão geral), a saber, (a) em relações jurídicas não tributárias, os juros de mora devem seguir o índice de caderneta de poupança e a correção monetária, o índice do IPCA-E, e (b), em relações jurídicas tributárias, os juros de mora devem seguir o índice aplicado pela Fazenda na cobrança de seus créditos tributários e, não havendo previsão legal, a taxa de 1% ao mês (art. 161, § 1º, do CTN) e a correção monetária, desde que não incluída no índice aplicado anteriormente (a exemplo da SELIC, que afasta a acumulação com outros índices - Tema nº 905/STJ), o índice do IPCA-E; e II- a partir de 09/12/2021, os juros de mora e a correção monetária serão aplicados de acordo com a Emenda Constitucional nº 113/2021, a saber: nos termos do art. 3° da EC nº 113/21, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. No primeiro caso, o termo inicial da incidência da correção monetária é o do pagamento devido (ou indevido no caso de repetição de indébito tributário); e o termo inicial dos juros de mora é a citação nas relações jurídicas não tributárias, consoante art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação da Lei nº 11.960/09, e o trânsito em julgado no caso das relações jurídicas tributárias (art. 167, parágrafo único, CTN). No segundo caso (quando se tratar de verba devida posteriormente à entrada em vigor da EC nº 113/2021), o termo inicial de aplicação da SELIC é o do pagamento devido (ou indevido no caso de repetição de indébito), com a ressalva para as relações jurídicas tributárias, caso em que a SELIC deverá ser aplicada a partir do trânsito em julgado (art. 167, parágrafo único, CTN), aplicando-se apenas o índice de correção monetária do IPCA-E até então. III. Em relação às diferenças devidas, a parte exequente deverá destacar o valor dos descontos de contribuição previdenciária e assistencial, além de suposta retenção do imposto sobre a renda, a teor do artigo 35 da Resolução CNJ nº 303, de dezembro de 2019, convindo, porém, remarcar que a base de cálculo e alíquotas aplicáveis serão as vigentes à época em que os pagamentos deveriam ter sido realizados (cf. TJSP, AI n. 0232892-61.2012, rel. des. Peiretti de Godoy). Anota-se incorreção no cálculo apresentado, que não atendeu ao Comunicado 04/2024 da DEPRE, que descontinuou a Tabela EC 113/2021 (somente a tabela, não os índices), em razão de indevida capitalização de juros, ao dispor: Os percentuais mensais da taxa SELIC aplicada para o mês seguinte deverão ser somados pelo número de meses correspondente ao período de atualização do cálculo e o valor resultante da somatória deverá ser aplicado uma única vez sobre o valor a ser atualizado, observando-se que no período a que alude o § 5º do artigo 100 da Constituição Federal a atualização deverá ser feita pelos índices do IPCA-E, conforme disposto no art. 21, § 5º, da Resolução CNJ nº 303/2019. Logo, primeiro deve ser utilizado a tabela do IPCA-E até dezembro/2021 (índice IPCA-E de dezembro/2021 de 76,77775) para, somente então, ser aplicado o resultado da somatória dos percentuais mensais da SELIC. Comunicado 04/2024 DEPRE: _https://api.tjsp.jus.br/Handlers/Handler/FileFetch.ashx?codigo=156386_. Tabela Resolução CNJ nº 303/19 / IPCA-E: _https://www.aasp.org.br/produtos-servicos/indices-economicos/indices-judiciais/tabela-resolucao-cnj-no-303-2019-ipca-e/_). Percentuais mensais da taxa SELIC: _https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/pagamentos-e-parcelamentos/taxa-de-juros-selicSelicmensalmente_)". Para mais, a parte exequente deverá promover a juntada do comprovante de publicação do percentual acumulado da SELIC, resultante da somatória dos percentuais mensais da taxa SELIC pela Receita Federal do Brasil, nos exatos termo do Comunicado 04/024 da DEPRE (https://api.tjsp.jus.br/Handlers/Handler/FileFetch.ashx?codigo=156386) - tabela em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/pagamentos-e-parcelamentos/taxa-de-juros-selicSelicmensalmente. A planilha apresentada neste cumprimento de sentença não observou esses parâmetros, o que impede a homologação pretendida. Intime-se a parte exequente para cumprir integralmente todos os itens apontados. Prazo: quinze dias. Intime-se. - ADV: GYSELE GOMES DE CARVALHO MURARO (OAB 257659/SP), WAGNER JOSÉ DE SOUZA GATTO (OAB 160180/SP)

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Processo nº 1010987-27.2025.8.11.0000

ID: 299843713

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1010987-27.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

ITAU UNIBANCO S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010987-27.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Contratos Bancários, Recuperação judicial… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010987-27.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Contratos Bancários, Recuperação judicial e Falência] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), CAIO ALMEIDA SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA - CNPJ: 42.360.039/0001-60 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS - CPF: 135.107.208-06 (ADVOGADO), ITAU UNIBANCO S.A. - CNPJ: 60.701.190/0001-04 (AGRAVANTE), F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA - CNPJ: 21.474.921/0001-66 (AGRAVADO), MARCO AURELIO MESTRE MEDEIROS - CPF: 025.388.801-81 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECLARAÇÃO DE ESSENCIALIDADE DE BENS MÓVEIS. VEÍCULOS GRAVADOS COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. STAY PERIOD. ART. 49, §3º, DA LEI 11.101/2005. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Cuiabá que, nos autos da Recuperação Judicial, declarou a essencialidade dos bens móveis listados, vedando o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens pelo prazo do stay period. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se a declaração de essencialidade dos bens móveis, especialmente veículos de transporte rodoviário de cargas gravados com cláusula de alienação fiduciária, foi devidamente fundamentada e se encontra em conformidade com os dispositivos legais que regem a recuperação judicial, notadamente os artigos 47 e 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005. III. Razões de decidir 3. A legislação falimentar brasileira consagra o princípio da preservação da empresa como vetor principiológico, objetivando assegurar a manutenção da fonte produtiva, dos empregos e da circulação de riquezas, elementos indissociáveis do interesse público subjacente ao regime recuperacional. 4. A decisão agravada fundamentou-se em elementos objetivos constantes do laudo de constatação prévia elaborado por profissional nomeado judicialmente, verificando-se que os bens listados, notadamente os veículos de transporte, integram a estrutura operacional da empresa cuja atividade principal é o transporte rodoviário de cargas. 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite que, em hipóteses nas quais o nexo entre os bens e a atividade empresarial seja evidente, é legítima a conclusão judicial pela essencialidade, mesmo sem laudo pericial específico, com base nos elementos constantes dos autos. 6. A blindagem temporária conferida pela decisão não resulta em expropriação ou nulificação da garantia fiduciária, mas apenas em sua suspensão provisória, condicionada à análise ulterior do plano de recuperação judicial e à deliberação da assembleia de credores. 7. A interpretação sistemática e finalística do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, em consonância com o art. 6º, § 7º, da mesma lei, permite a mitigação dos efeitos da alienação fiduciária quando demonstrada a essencialidade do bem à manutenção da atividade econômica, ainda que de forma provisória. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. Tese de julgamento: "A declaração de essencialidade de bens móveis gravados com alienação fiduciária é legítima quando fundamentada em elementos objetivos que demonstrem sua indispensabilidade à atividade empresarial, observando-se o princípio da preservação da empresa durante o stay period da recuperação judicial." Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 6º, § 7º, 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2.002.041/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 18/05/2023; STJ, AgInt no REsp 1.475.258/MS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20/02/2018; TJ-MT, AI nº 1031257-09.2024.8.11.0000, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ O. OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, interposto por ITAÚ UNIBANCO S.A. contra a decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que nos autos da Recuperação Judicial nº 100332231.2025.8.11.0041, proposta por F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, declarou a essencialidade dos bens listados no id. 181877818, ficando vedado o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens, pelo mesmo prazo do stay period. O agravante alega, em síntese, ausência de comprovação da essencialidade dos bens alienados fiduciariamente, bem como que a declaração de essencialidade foi genérica, sem análise individualizada. Aponta, ainda, que o crédito fiduciário não se sujeita à recuperação judicial e que a decisão agravada desprestigia o sistema de garantias. Pugna pela concessão de efeito suspensivo para determinar que a Administradora Judicial realize análise minuciosa e individualizada dos bens listados, demonstrando sua essencialidade à atividade da recuperanda. Alternativamente, requer que seja dado provimento ao agravo para determinar que a Administradora Judicial realize a análise minuciosa, detalhada e individualizada, com a descrição completa dos detalhes da utilização de cada um dos bens listados no Id. 181877818, confirmando os efeitos que anteciparam a possível concessão da tutela recursal almejada. Recolhimento do preparo consta em id. 279400877. Foi indeferido o pedido de tutela recursal (Id. 279487866). Apresentadas contrarrazões, nas quais a agravada sustenta, em síntese, a pertinência do reconhecimento da essencialidade dos bens para a continuidade de suas atividades econômicas, e a consonância da decisão com os princípios que regem a recuperação judicial, notadamente o da preservação da empresa (art. 47 da Lei n.º 11.101/2005), requerendo o desprovimento do recurso de agravo de instrumento (id. 282137896). A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso aviado, mantendo-se inalterada a decisão agravada (id. 288028392). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ O. OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação de tutela recursal, interposto pelo ITAU UNIBANCO S.A., em face de decisão proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de Cuiabá que, nos autos da Recuperação Judicial n.º 1003322-31.2025.8.11.0041 proposta por F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, declarou a essencialidade dos bens listados (ID 181877818), ficando vedado o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens, pelo mesmo prazo do stay period. O recurso deve ser conhecido, uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade recursal. Na origem, a agravada, F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, conhecida pelo seu nome de fantasia “Myrakha Transportes”, ajuizou pedido de recuperação judicial, no qual pleiteou, dentre outras providências, o reconhecimento da essencialidade dos bens móveis descritos no documento de Id. 181877818, os quais, segundo sua argumentação, seriam indispensáveis à continuidade de suas atividades empresariais, notadamente no ramo de transporte rodoviário de cargas. O juízo de origem, ao deferir o processamento da recuperação judicial, reconheceu a essencialidade dos bens listados, deferindo a suspensão dos atos de constrição, inclusive em relação aos veículos gravados com cláusula de alienação fiduciária, nos termos do art. 6º, § 7º, da Lei n.º 11.101/2005, alterada pela Lei n.º 14.112/2020. Alega o recorrente que tal reconhecimento se deu de forma genérica e desprovida da devida fundamentação técnica, o que violaria não apenas o regime jurídico das garantias fiduciárias (art. 49, § 3º, da Lei n.º 11.101/2005), mas também os princípios da legalidade, da segurança jurídica e da função social do crédito. Todavia, razão não lhe assiste. De início, cumpre registrar que a preservação da empresa, nos termos do art. 47 da Lei n.º 11.101/2005, constitui o vetor principiológico da legislação falimentar brasileira. O referido dispositivo consagra a função social da atividade empresarial como eixo estruturante da recuperação judicial, objetivando assegurar a manutenção da fonte produtiva, dos empregos e da circulação de riquezas, elementos indissociáveis do interesse público subjacente ao regime recuperacional. No presente caso, conforme se extrai dos autos, a decisão agravada fundamentou-se não apenas na declaração unilateral da parte autora, mas também em elementos objetivos constantes do laudo de constatação prévia elaborado por profissional nomeado judicialmente (Id. 184513943), no qual se verificou que os bens listados, notadamente os veículos de transporte (carretas basculantes), integram a estrutura operacional da empresa, cuja atividade principal é o transporte rodoviário de cargas, o que, aliás, restou corroborado pela documentação contábil e societária e fotografias dos bens acostada à inicial. Ainda que se reconheça a exigência jurisprudencial de análise individualizada dos bens, tal exigência não pode ser levada ao extremo da inviabilização do provimento jurisdicional célere e eficaz, sobretudo quando a comprovação da essencialidade resulta evidente da natureza dos bens em relação à atividade da empresa. Nesse sentido, reiterados precedentes do STJ têm admitido que, em hipóteses em que o nexo entre os bens e a atividade empresarial seja evidente, é legítima a conclusão judicial pela essencialidade, mesmo sem laudo pericial específico, com base nos elementos constantes dos autos. A decisão pondera a função econômica dos bens e a viabilidade da atividade empresarial, destacando a possibilidade de aferição da essencialidade por outros meios probatórios. (AgInt no AREsp 2.002.041/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 18/05/2023). O argumento de que a empresa agravada atua em outros ramos além do transporte não afasta, por si só, a relevância dos bens móveis indicados. A diversificação da atividade econômica não conduz à presunção de dispensabilidade dos bens que compõem o núcleo da operação logística da recuperanda, especialmente quando se trata de frotas de caminhões, que são naturalmente essenciais ao transporte de cargas. Ademais, ao contrário do sustentado pelo agravante, a blindagem temporária conferida pela decisão agravada não resulta em expropriação ou nulificação da garantia fiduciária, mas apenas em sua suspensão provisória, condicionada à análise ulterior do plano de recuperação judicial e à deliberação da assembleia de credores. Trata-se de providência legítima, de caráter cautelar, cuja finalidade é assegurar a viabilidade do processo recuperacional durante sua fase inicial. Com efeito, a interpretação sistemática e finalística do art. 49, § 3º, da Lei n.º 11.101/2005, em consonância com o art. 6º, § 7º, da mesma lei, permite a mitigação dos efeitos da alienação fiduciária quando demonstrada a essencialidade do bem à manutenção da atividade econômica, ainda que de forma provisória, sendo essa a diretriz predominante na jurisprudência dos Tribunais Superiores. É mister registrar que os veículos tidos como essenciais se enquadram perfeitamente no conceito de bens de capital, porquanto trata-se de bem utilizado no processo produtivo da empresa recuperanda, cujas características essenciais são: bem corpóreo (móvel ou imóvel), que se encontra na propriedade do devedor, e, sobretudo, que não seja perecível nem consumível, de modo que possa ser entregue ao titular da propriedade fiduciária, caso persista a inadimplência. Ademais, destaca-se, que o juízo de origem detém a prerrogativa legal e técnica para conduzir a fase de verificação da viabilidade econômica do soerguimento empresarial, inclusive quanto à definição de quais bens devem ser preservados para esse fim, inclusive a suspensão de atos de constrição, durante o prazo previsto no artigo 6°, § 4°, da Lei n. 11.101/2005. Nesse sentido é o entendimento desse Eg. Tribunal de Justiça, verbis: “DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE PROVISÓRIA DE BENS COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. RESTRIÇÃO TEMPORÁRIA AO DIREITO DO CREDOR. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. Caso em exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que manteve provisoriamente a posse dos veículos de frota de empresa de transportes, incluindo aqueles com alienação fiduciária, impedindo sua apreensão durante o stay period. O agravante sustenta que os bens não integram o patrimônio da recuperanda (art. 49, § 3º, da LRF), que a essencialidade foi reconhecida sem análise individualizada e que parte da frota foi cedida a terceiros, afastando sua indispensabilidade. A agravada alega que os veículos são essenciais à sua atividade, conforme perícia técnica e parecer do Administrador Judicial, e que a decisão recorrida condicionou a permanência definitiva da frota à vistoria para verificar sua utilização efetiva. II. Questão em discussão 4. Discute-se a possibilidade de manutenção da posse dos bens gravados com alienação fiduciária pela recuperanda, sob a alegação de essencialidade provisória, bem como a compatibilidade dessa medida com o direito do credor fiduciário de retomada dos bens. III. Razões de decidir 5. O Superior Tribunal de Justiça reconhece a possibilidade de restrição temporária ao direito do credor fiduciário quando os bens forem essenciais à atividade da empresa em recuperação (AgInt no REsp 1.475.258/MS). 6. A decisão agravada fundamentou-se em três pontos principais: (i) manutenção da decisão pelo TJMT no AI nº 1009533-46.2024.8.11.0000; (ii) confirmação da essencialidade dos bens pelo Administrador Judicial; (iii) presunção de essencialidade dos caminhões para empresas de transporte. 7. O juízo de origem determinou diligências para verificar in loco a utilização dos bens, reforçando o caráter provisório da decisão e afastando eventual supressão de instância. 8. O art. 49, § 3º, da LRF deve ser interpretado em harmonia com o princípio da preservação da empresa (art. 47 da LRF), especialmente em setores nos quais determinados bens são inerentes à atividade empresarial. 9. O risco de deterioração dos bens não afasta, por si só, a declaração de essencialidade, cabendo ao juízo recuperacional adotar medidas para resguardar os direitos do credor fiduciário. IV. Dispositivo e tese 10. Agravo de instrumento desprovido, mantendo-se a decisão que declarou provisoriamente a essencialidade dos bens, até que o juízo de primeiro grau conclua a análise individualizada dos veículos. Tese de julgamento: “A essencialidade de bens gravados com alienação fiduciária pode ser reconhecida provisoriamente no curso da recuperação judicial, desde que fundamentada em elementos concretos e sujeita à revisão pelo juízo recuperacional.” Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1475258/MS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20.02.2018.” (N.U 1031257-09.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 02/04/2025). (grifo nosso) “DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE DE BENS. DECLARAÇÃO DE ESSENCIALIDADE MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de revogação da declaração de essencialidade dos caminhões adquiridos recentemente pela agravada. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar a legitimidade da declaração de essencialidade dos bens móveis para o desenvolvimento das atividades essenciais da empresa em recuperação, e se a alienação fiduciária sobre tais bens permite a retomada pelo credor, durante o prazo de suspensão das execuções. III. Razões de decidir 3. Conforme o art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, o credor fiduciário tem o direito de propriedade sobre o bem, porém, é vedada a retirada de bens essenciais à atividade produtiva da empresa durante o "stay period", considerando a finalidade de preservação da função social da empresa em recuperação. 4. Os elementos constantes dos autos, incluindo laudo prévio e registros fotográficos, comprovam a utilização dos caminhões na cadeia logística agrícola, sendo reconhecida sua indispensabilidade para o escoamento de produtos, justificando-se a declaração de essencialidade. 5. A jurisprudência do STJ e deste tribunal reforça que a avaliação sobre a essencialidade de bens à continuidade das operações da empresa em recuperação deve ser realizada pelo juízo da recuperação, preservando o desenvolvimento da atividade produtiva e os interesses dos credores. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "A retirada de bens móveis essenciais ao desenvolvimento da atividade produtiva da empresa em recuperação judicial é vedada ao credor fiduciário durante o prazo de suspensão das execuções, em observância à preservação da função social da empresa." ______________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, AI nº 1013168-69.2023.8.11.0000.” (N.U 1032206-33.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/02/2025, Publicado no DJE 21/02/2025). (grifo nosso) “RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – PRODUTOR RURAL - DEVEDOR FIDUCIÁRIO EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL – ARTIGO 49, § 3º, DA LEI Nº 11.101/2005 – STAY PERIOD - MAQUINÁRIOS AGRÍCOLAS - PRESERVAÇÃO DA EMPRESA – VISTORIA IN LOCO PELO ADMINISTRADOR JUDICIAL – CONSTATAÇÃO DA ESSENCIALIDADE DOS BENS - DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. 1. O credor, proprietário fiduciário de bens móveis, não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial (artigo 49, § 3º da Lei nº 11.101 /05). Todavia, constatado que os maquinários agrícolas dados em garantia são essenciais para o exercício da atividade do grupo recuperando, pertinente a manutenção da declaração de essencialidade no stay period, muito mais ainda quando o Administrador Judicial realizou vistoria in loco, realizando um levantamento individual e pormenorizado de cada bem. 2. Recurso desprovido.” (N.U 1027181-39.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025). (grifo nosso) “DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE DOS BENS. IMPEDIMENTO DE RETIRADA DURANTE O STAY PERIOD. ART. 49, §3º, DA LEI 11.101/2005. PARECER DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo BANCO BRADESCO S.A. contra decisão do Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que declarou a essencialidade dos bens das devedoras B.A. DA CUNHA (empresa) e BENEDITO ANTONIO DA CUNHA (produtor rural), impedindo sua retirada durante o período de stay period. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em verificar se os bens listados pelas recuperandas são essenciais à manutenção da atividade empresarial e se podem ser protegidos contra a retirada pelo credor fiduciário no curso da recuperação judicial, conforme o art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005. III. Razões de decidir 3. A recuperação judicial visa à preservação da empresa e à manutenção da atividade econômica, conforme o art. 47 da Lei 11.101/2005. 4. O Administrador Judicial realizou vistoria in loco e elaborou parecer circunstanciado, atestando a essencialidade dos bens listados pelas recuperandas, os quais são indispensáveis à continuidade da atividade produtiva. 5. O art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005 estabelece que, durante o stay period, não se permite a retirada dos bens de capital essenciais à atividade empresarial, ainda que alienados fiduciariamente. 6. A jurisprudência do STJ consolidou entendimento no sentido de que cabe ao Juízo da Recuperação Judicial exercer o controle sobre a essencialidade dos bens e a manutenção da posse pelo devedor enquanto perdurar o período de blindagem. 7. A decisão agravada encontra amparo na legislação e na jurisprudência, inexistindo ilegalidade ou manifesta abusividade que justifique sua reforma. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "A retirada de bens de capital essenciais à atividade produtiva do devedor é vedada durante o stay period da recuperação judicial, conforme o art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005, cabendo ao Juízo da Recuperação a aferição da essencialidade." (N.U 1032045-23.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/03/2025, Publicado no DJE 01/04/2025). (grifo nosso) Desta maneira, atento às especificidades da situação fática e aos documentos anexos aos autos principais, entendo que não restaram configurados motivos que justifiquem a reforma da decisão agravada. Diante do exposto, em consonância com o Parecer Ministerial, CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE provimento, mantendo inalterados os termos da decisão agravada. Por se tratar de recurso contra decisão interlocutória sem prévia fixação de honorários em primeira instância, deixo de condenar a parte agravante ao pagamento das verbas sucumbenciais. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1010987-27.2025.8.11.0000

ID: 299843714

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1010987-27.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA

Acórdão

Advogados:

MARCO AURELIO MESTRE MEDEIROS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010987-27.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Contratos Bancários, Recuperação judicial… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010987-27.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Contratos Bancários, Recuperação judicial e Falência] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), CAIO ALMEIDA SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA - CNPJ: 42.360.039/0001-60 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS - CPF: 135.107.208-06 (ADVOGADO), ITAU UNIBANCO S.A. - CNPJ: 60.701.190/0001-04 (AGRAVANTE), F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA - CNPJ: 21.474.921/0001-66 (AGRAVADO), MARCO AURELIO MESTRE MEDEIROS - CPF: 025.388.801-81 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECLARAÇÃO DE ESSENCIALIDADE DE BENS MÓVEIS. VEÍCULOS GRAVADOS COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. STAY PERIOD. ART. 49, §3º, DA LEI 11.101/2005. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Cuiabá que, nos autos da Recuperação Judicial, declarou a essencialidade dos bens móveis listados, vedando o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens pelo prazo do stay period. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se a declaração de essencialidade dos bens móveis, especialmente veículos de transporte rodoviário de cargas gravados com cláusula de alienação fiduciária, foi devidamente fundamentada e se encontra em conformidade com os dispositivos legais que regem a recuperação judicial, notadamente os artigos 47 e 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005. III. Razões de decidir 3. A legislação falimentar brasileira consagra o princípio da preservação da empresa como vetor principiológico, objetivando assegurar a manutenção da fonte produtiva, dos empregos e da circulação de riquezas, elementos indissociáveis do interesse público subjacente ao regime recuperacional. 4. A decisão agravada fundamentou-se em elementos objetivos constantes do laudo de constatação prévia elaborado por profissional nomeado judicialmente, verificando-se que os bens listados, notadamente os veículos de transporte, integram a estrutura operacional da empresa cuja atividade principal é o transporte rodoviário de cargas. 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite que, em hipóteses nas quais o nexo entre os bens e a atividade empresarial seja evidente, é legítima a conclusão judicial pela essencialidade, mesmo sem laudo pericial específico, com base nos elementos constantes dos autos. 6. A blindagem temporária conferida pela decisão não resulta em expropriação ou nulificação da garantia fiduciária, mas apenas em sua suspensão provisória, condicionada à análise ulterior do plano de recuperação judicial e à deliberação da assembleia de credores. 7. A interpretação sistemática e finalística do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, em consonância com o art. 6º, § 7º, da mesma lei, permite a mitigação dos efeitos da alienação fiduciária quando demonstrada a essencialidade do bem à manutenção da atividade econômica, ainda que de forma provisória. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. Tese de julgamento: "A declaração de essencialidade de bens móveis gravados com alienação fiduciária é legítima quando fundamentada em elementos objetivos que demonstrem sua indispensabilidade à atividade empresarial, observando-se o princípio da preservação da empresa durante o stay period da recuperação judicial." Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 6º, § 7º, 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2.002.041/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 18/05/2023; STJ, AgInt no REsp 1.475.258/MS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20/02/2018; TJ-MT, AI nº 1031257-09.2024.8.11.0000, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ O. OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, interposto por ITAÚ UNIBANCO S.A. contra a decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que nos autos da Recuperação Judicial nº 100332231.2025.8.11.0041, proposta por F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, declarou a essencialidade dos bens listados no id. 181877818, ficando vedado o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens, pelo mesmo prazo do stay period. O agravante alega, em síntese, ausência de comprovação da essencialidade dos bens alienados fiduciariamente, bem como que a declaração de essencialidade foi genérica, sem análise individualizada. Aponta, ainda, que o crédito fiduciário não se sujeita à recuperação judicial e que a decisão agravada desprestigia o sistema de garantias. Pugna pela concessão de efeito suspensivo para determinar que a Administradora Judicial realize análise minuciosa e individualizada dos bens listados, demonstrando sua essencialidade à atividade da recuperanda. Alternativamente, requer que seja dado provimento ao agravo para determinar que a Administradora Judicial realize a análise minuciosa, detalhada e individualizada, com a descrição completa dos detalhes da utilização de cada um dos bens listados no Id. 181877818, confirmando os efeitos que anteciparam a possível concessão da tutela recursal almejada. Recolhimento do preparo consta em id. 279400877. Foi indeferido o pedido de tutela recursal (Id. 279487866). Apresentadas contrarrazões, nas quais a agravada sustenta, em síntese, a pertinência do reconhecimento da essencialidade dos bens para a continuidade de suas atividades econômicas, e a consonância da decisão com os princípios que regem a recuperação judicial, notadamente o da preservação da empresa (art. 47 da Lei n.º 11.101/2005), requerendo o desprovimento do recurso de agravo de instrumento (id. 282137896). A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso aviado, mantendo-se inalterada a decisão agravada (id. 288028392). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ O. OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação de tutela recursal, interposto pelo ITAU UNIBANCO S.A., em face de decisão proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de Cuiabá que, nos autos da Recuperação Judicial n.º 1003322-31.2025.8.11.0041 proposta por F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, declarou a essencialidade dos bens listados (ID 181877818), ficando vedado o arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre estes bens, pelo mesmo prazo do stay period. O recurso deve ser conhecido, uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade recursal. Na origem, a agravada, F. I. N. ORSO HOTEL E TRANSPORTES LTDA, conhecida pelo seu nome de fantasia “Myrakha Transportes”, ajuizou pedido de recuperação judicial, no qual pleiteou, dentre outras providências, o reconhecimento da essencialidade dos bens móveis descritos no documento de Id. 181877818, os quais, segundo sua argumentação, seriam indispensáveis à continuidade de suas atividades empresariais, notadamente no ramo de transporte rodoviário de cargas. O juízo de origem, ao deferir o processamento da recuperação judicial, reconheceu a essencialidade dos bens listados, deferindo a suspensão dos atos de constrição, inclusive em relação aos veículos gravados com cláusula de alienação fiduciária, nos termos do art. 6º, § 7º, da Lei n.º 11.101/2005, alterada pela Lei n.º 14.112/2020. Alega o recorrente que tal reconhecimento se deu de forma genérica e desprovida da devida fundamentação técnica, o que violaria não apenas o regime jurídico das garantias fiduciárias (art. 49, § 3º, da Lei n.º 11.101/2005), mas também os princípios da legalidade, da segurança jurídica e da função social do crédito. Todavia, razão não lhe assiste. De início, cumpre registrar que a preservação da empresa, nos termos do art. 47 da Lei n.º 11.101/2005, constitui o vetor principiológico da legislação falimentar brasileira. O referido dispositivo consagra a função social da atividade empresarial como eixo estruturante da recuperação judicial, objetivando assegurar a manutenção da fonte produtiva, dos empregos e da circulação de riquezas, elementos indissociáveis do interesse público subjacente ao regime recuperacional. No presente caso, conforme se extrai dos autos, a decisão agravada fundamentou-se não apenas na declaração unilateral da parte autora, mas também em elementos objetivos constantes do laudo de constatação prévia elaborado por profissional nomeado judicialmente (Id. 184513943), no qual se verificou que os bens listados, notadamente os veículos de transporte (carretas basculantes), integram a estrutura operacional da empresa, cuja atividade principal é o transporte rodoviário de cargas, o que, aliás, restou corroborado pela documentação contábil e societária e fotografias dos bens acostada à inicial. Ainda que se reconheça a exigência jurisprudencial de análise individualizada dos bens, tal exigência não pode ser levada ao extremo da inviabilização do provimento jurisdicional célere e eficaz, sobretudo quando a comprovação da essencialidade resulta evidente da natureza dos bens em relação à atividade da empresa. Nesse sentido, reiterados precedentes do STJ têm admitido que, em hipóteses em que o nexo entre os bens e a atividade empresarial seja evidente, é legítima a conclusão judicial pela essencialidade, mesmo sem laudo pericial específico, com base nos elementos constantes dos autos. A decisão pondera a função econômica dos bens e a viabilidade da atividade empresarial, destacando a possibilidade de aferição da essencialidade por outros meios probatórios. (AgInt no AREsp 2.002.041/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 18/05/2023). O argumento de que a empresa agravada atua em outros ramos além do transporte não afasta, por si só, a relevância dos bens móveis indicados. A diversificação da atividade econômica não conduz à presunção de dispensabilidade dos bens que compõem o núcleo da operação logística da recuperanda, especialmente quando se trata de frotas de caminhões, que são naturalmente essenciais ao transporte de cargas. Ademais, ao contrário do sustentado pelo agravante, a blindagem temporária conferida pela decisão agravada não resulta em expropriação ou nulificação da garantia fiduciária, mas apenas em sua suspensão provisória, condicionada à análise ulterior do plano de recuperação judicial e à deliberação da assembleia de credores. Trata-se de providência legítima, de caráter cautelar, cuja finalidade é assegurar a viabilidade do processo recuperacional durante sua fase inicial. Com efeito, a interpretação sistemática e finalística do art. 49, § 3º, da Lei n.º 11.101/2005, em consonância com o art. 6º, § 7º, da mesma lei, permite a mitigação dos efeitos da alienação fiduciária quando demonstrada a essencialidade do bem à manutenção da atividade econômica, ainda que de forma provisória, sendo essa a diretriz predominante na jurisprudência dos Tribunais Superiores. É mister registrar que os veículos tidos como essenciais se enquadram perfeitamente no conceito de bens de capital, porquanto trata-se de bem utilizado no processo produtivo da empresa recuperanda, cujas características essenciais são: bem corpóreo (móvel ou imóvel), que se encontra na propriedade do devedor, e, sobretudo, que não seja perecível nem consumível, de modo que possa ser entregue ao titular da propriedade fiduciária, caso persista a inadimplência. Ademais, destaca-se, que o juízo de origem detém a prerrogativa legal e técnica para conduzir a fase de verificação da viabilidade econômica do soerguimento empresarial, inclusive quanto à definição de quais bens devem ser preservados para esse fim, inclusive a suspensão de atos de constrição, durante o prazo previsto no artigo 6°, § 4°, da Lei n. 11.101/2005. Nesse sentido é o entendimento desse Eg. Tribunal de Justiça, verbis: “DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE PROVISÓRIA DE BENS COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. RESTRIÇÃO TEMPORÁRIA AO DIREITO DO CREDOR. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. Caso em exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que manteve provisoriamente a posse dos veículos de frota de empresa de transportes, incluindo aqueles com alienação fiduciária, impedindo sua apreensão durante o stay period. O agravante sustenta que os bens não integram o patrimônio da recuperanda (art. 49, § 3º, da LRF), que a essencialidade foi reconhecida sem análise individualizada e que parte da frota foi cedida a terceiros, afastando sua indispensabilidade. A agravada alega que os veículos são essenciais à sua atividade, conforme perícia técnica e parecer do Administrador Judicial, e que a decisão recorrida condicionou a permanência definitiva da frota à vistoria para verificar sua utilização efetiva. II. Questão em discussão 4. Discute-se a possibilidade de manutenção da posse dos bens gravados com alienação fiduciária pela recuperanda, sob a alegação de essencialidade provisória, bem como a compatibilidade dessa medida com o direito do credor fiduciário de retomada dos bens. III. Razões de decidir 5. O Superior Tribunal de Justiça reconhece a possibilidade de restrição temporária ao direito do credor fiduciário quando os bens forem essenciais à atividade da empresa em recuperação (AgInt no REsp 1.475.258/MS). 6. A decisão agravada fundamentou-se em três pontos principais: (i) manutenção da decisão pelo TJMT no AI nº 1009533-46.2024.8.11.0000; (ii) confirmação da essencialidade dos bens pelo Administrador Judicial; (iii) presunção de essencialidade dos caminhões para empresas de transporte. 7. O juízo de origem determinou diligências para verificar in loco a utilização dos bens, reforçando o caráter provisório da decisão e afastando eventual supressão de instância. 8. O art. 49, § 3º, da LRF deve ser interpretado em harmonia com o princípio da preservação da empresa (art. 47 da LRF), especialmente em setores nos quais determinados bens são inerentes à atividade empresarial. 9. O risco de deterioração dos bens não afasta, por si só, a declaração de essencialidade, cabendo ao juízo recuperacional adotar medidas para resguardar os direitos do credor fiduciário. IV. Dispositivo e tese 10. Agravo de instrumento desprovido, mantendo-se a decisão que declarou provisoriamente a essencialidade dos bens, até que o juízo de primeiro grau conclua a análise individualizada dos veículos. Tese de julgamento: “A essencialidade de bens gravados com alienação fiduciária pode ser reconhecida provisoriamente no curso da recuperação judicial, desde que fundamentada em elementos concretos e sujeita à revisão pelo juízo recuperacional.” Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1475258/MS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20.02.2018.” (N.U 1031257-09.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 02/04/2025). (grifo nosso) “DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE DE BENS. DECLARAÇÃO DE ESSENCIALIDADE MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de revogação da declaração de essencialidade dos caminhões adquiridos recentemente pela agravada. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar a legitimidade da declaração de essencialidade dos bens móveis para o desenvolvimento das atividades essenciais da empresa em recuperação, e se a alienação fiduciária sobre tais bens permite a retomada pelo credor, durante o prazo de suspensão das execuções. III. Razões de decidir 3. Conforme o art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, o credor fiduciário tem o direito de propriedade sobre o bem, porém, é vedada a retirada de bens essenciais à atividade produtiva da empresa durante o "stay period", considerando a finalidade de preservação da função social da empresa em recuperação. 4. Os elementos constantes dos autos, incluindo laudo prévio e registros fotográficos, comprovam a utilização dos caminhões na cadeia logística agrícola, sendo reconhecida sua indispensabilidade para o escoamento de produtos, justificando-se a declaração de essencialidade. 5. A jurisprudência do STJ e deste tribunal reforça que a avaliação sobre a essencialidade de bens à continuidade das operações da empresa em recuperação deve ser realizada pelo juízo da recuperação, preservando o desenvolvimento da atividade produtiva e os interesses dos credores. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "A retirada de bens móveis essenciais ao desenvolvimento da atividade produtiva da empresa em recuperação judicial é vedada ao credor fiduciário durante o prazo de suspensão das execuções, em observância à preservação da função social da empresa." ______________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 49, § 3º. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, AI nº 1013168-69.2023.8.11.0000.” (N.U 1032206-33.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/02/2025, Publicado no DJE 21/02/2025). (grifo nosso) “RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – PRODUTOR RURAL - DEVEDOR FIDUCIÁRIO EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL – ARTIGO 49, § 3º, DA LEI Nº 11.101/2005 – STAY PERIOD - MAQUINÁRIOS AGRÍCOLAS - PRESERVAÇÃO DA EMPRESA – VISTORIA IN LOCO PELO ADMINISTRADOR JUDICIAL – CONSTATAÇÃO DA ESSENCIALIDADE DOS BENS - DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. 1. O credor, proprietário fiduciário de bens móveis, não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial (artigo 49, § 3º da Lei nº 11.101 /05). Todavia, constatado que os maquinários agrícolas dados em garantia são essenciais para o exercício da atividade do grupo recuperando, pertinente a manutenção da declaração de essencialidade no stay period, muito mais ainda quando o Administrador Judicial realizou vistoria in loco, realizando um levantamento individual e pormenorizado de cada bem. 2. Recurso desprovido.” (N.U 1027181-39.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025). (grifo nosso) “DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ESSENCIALIDADE DOS BENS. IMPEDIMENTO DE RETIRADA DURANTE O STAY PERIOD. ART. 49, §3º, DA LEI 11.101/2005. PARECER DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo BANCO BRADESCO S.A. contra decisão do Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que declarou a essencialidade dos bens das devedoras B.A. DA CUNHA (empresa) e BENEDITO ANTONIO DA CUNHA (produtor rural), impedindo sua retirada durante o período de stay period. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em verificar se os bens listados pelas recuperandas são essenciais à manutenção da atividade empresarial e se podem ser protegidos contra a retirada pelo credor fiduciário no curso da recuperação judicial, conforme o art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005. III. Razões de decidir 3. A recuperação judicial visa à preservação da empresa e à manutenção da atividade econômica, conforme o art. 47 da Lei 11.101/2005. 4. O Administrador Judicial realizou vistoria in loco e elaborou parecer circunstanciado, atestando a essencialidade dos bens listados pelas recuperandas, os quais são indispensáveis à continuidade da atividade produtiva. 5. O art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005 estabelece que, durante o stay period, não se permite a retirada dos bens de capital essenciais à atividade empresarial, ainda que alienados fiduciariamente. 6. A jurisprudência do STJ consolidou entendimento no sentido de que cabe ao Juízo da Recuperação Judicial exercer o controle sobre a essencialidade dos bens e a manutenção da posse pelo devedor enquanto perdurar o período de blindagem. 7. A decisão agravada encontra amparo na legislação e na jurisprudência, inexistindo ilegalidade ou manifesta abusividade que justifique sua reforma. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "A retirada de bens de capital essenciais à atividade produtiva do devedor é vedada durante o stay period da recuperação judicial, conforme o art. 49, §3º, da Lei 11.101/2005, cabendo ao Juízo da Recuperação a aferição da essencialidade." (N.U 1032045-23.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/03/2025, Publicado no DJE 01/04/2025). (grifo nosso) Desta maneira, atento às especificidades da situação fática e aos documentos anexos aos autos principais, entendo que não restaram configurados motivos que justifiquem a reforma da decisão agravada. Diante do exposto, em consonância com o Parecer Ministerial, CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE provimento, mantendo inalterados os termos da decisão agravada. Por se tratar de recurso contra decisão interlocutória sem prévia fixação de honorários em primeira instância, deixo de condenar a parte agravante ao pagamento das verbas sucumbenciais. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1003322-04.2020.8.11.0042

ID: 261348923

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1003322-04.2020.8.11.0042

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

ANTONIO APARECIDO GOMES NETO JHEMESON VIEIRA GUIMARAES TIAGO ARAUJO DOS SANTOS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RODRIGO ARARIPE DE ABREU E LIMA

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RODOLFO ROCHA ALVES MARQUES DE SOUZA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

NADESKA CALMON FREITAS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003322-04.2020.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a P… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003322-04.2020.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins] Relator: Des(a). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO Turma Julgadora: [DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), JHEMESON VIEIRA GUIMARAES - CPF: 042.057.721-14 (APELANTE), NADESKA CALMON FREITAS - CPF: 502.482.601-97 (ADVOGADO), ALANA CAROLINA OLIVEIRA CARNEIRO - CPF: 054.702.231-08 (ADVOGADO), ANTONIO APARECIDO GOMES NETO - CPF: 046.382.991-30 (APELANTE), RODOLFO ROCHA ALVES MARQUES DE SOUZA - CPF: 059.394.341-42 (ADVOGADO), NASLA CASTRILLON ASCHAR - CPF: 706.756.861-72 (ADVOGADO), MATHEUS LIRA REIS - CPF: 031.526.311-38 (ADVOGADO), TIAGO ARAUJO DOS SANTOS - CPF: 040.047.641-06 (APELANTE), RODRIGO ARARIPE DE ABREU E LIMA - CPF: 002.161.524-10 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PLEITO ABSOLUTÓRIO. DESCLASSIFICAÇÃO. CESSÃO DE LOCAL PARA TRÁFICO. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO. DEPOIMENTOS POLICIAIS COERENTES. RECURSOS DESPROVIDOS. I. Caso em exame: Apelações criminais interpostas contra sentença que condenou os réus pela prática dos crimes previstos no art. 33, caput (dois primeiros) e art. 33, § 1º, III (terceiro) da Lei 11.343/2006, por terem sido flagrados com expressiva quantidade de drogas em festa rave, bem como por ceder local para o tráfico. II. Questão em discussão: A questão consiste em verificar: (i) se há provas suficientes para manutenção da condenação dos réus por tráfico de drogas; (ii) se é cabível a desclassificação para o delito de uso pessoal; e (iii) se o organizador do evento tinha conhecimento e dado anuência com o tráfico no local. III. Razões de decidir: 1. A materialidade e autoria do tráfico de drogas estão comprovadas pela apreensão de significativa quantidade e variedade de entorpecentes, bem como pelos depoimentos coerentes dos policiais militares. 2. A quantidade expressiva de drogas apreendidas (6 porções de cocaína e 18 comprimidos de ecstasy com um réu; 50 comprimidos de ecstasy e uma porção de cocaína com outro) e o contexto dos fatos afastam a tese de uso pessoal. 3. O organizador do evento cedeu conscientemente o local para o tráfico, tendo sido apreendidas diversas porções de drogas espalhadas pelo ambiente, em contexto típico de comercialização. IV. Dispositivo e tese: Recursos desprovidos. Tese de julgamento: "1. Os depoimentos de policiais, quando coerentes e harmônicos com as demais provas dos autos, são idôneos para fundamentar a condenação por tráfico de drogas. 2. A mera alegação de condição de usuário, desacompanhada de elementos probatórios, não é suficiente para a desclassificação do crime de tráfico para uso pessoal”. Dispositivos relevantes citados: Lei 11.343/2006, arts. 28, 33 caput e § 1º, III; CP, art. 29. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Enunciado Criminal 8; TJMT, Enunciado Criminal 7; TJMT, Enunciado Criminal 3 (IUJ 101532/2015). R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Tratam-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por JHEMESON VIEIRA GUIMARÃES, TIAGO ARAÚJO DOS SANTOS e ANTONIO APARECIDO GOMES NETO, contra sentença prolatada pelo Juízo da 9ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá (MT), que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando os apelantes TIAGO e JHEMESON pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, e o apelante ANTONIO pela prática do crime previsto no art. 33, § 1º, inciso III, da mesma Lei, em concurso de pessoas, nos termos do art. 29 do Código Penal (Id. 262566938 – p. 846-877). JHEMESON VIEIRA GUIMARÃES e TIAGO ARAÚJO DOS SANTOS foram condenados à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, além do pagamento de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa. O regime inicial fixado para o cumprimento da pena privativa de liberdade foi o aberto. Entretanto, considerando o preenchimento dos requisitos legais, o Juízo procedeu asubstituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44, do Código Penal (Id. 262566938 – p. 846-877). O corréu ANTONIO APARECIDO GOMES NETO foi condenado à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa. Da mesma forma dos demais, regime inicial fixado para o cumprimento da pena privativa de liberdade foi o aberto e considerando o preenchimento dos requisitos legais, o Juízo procedeu a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44, do Código Penal (Id. 262566938 – p. 846-877). Inconformados, os apelantes manifestaram o desejo em recorrer da sentença condenatória. Por meio de sua defesa, Tiago e Jhemeson pugnaram por sua absolvição, nos termos do art. 386, inc. IV, do CPP. Não sendo o caso, subsidiariamente os recorrentes requerem a desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 28, da Lei n. 11.343/06, sendo que Tiago ainda pugna pela fixação da pena no mínimo legal, a aplicação da causa de diminuição da pena do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006) e, por fim, a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos (Id. 265905790 – p. 929-946). Já Antônio pugnou por sua absolvição, nos termos do art. 389, inc. IV e VII, do CPP (Id. 268797269 – p. 950-954 e Id. 269084275 – p. 955-962). Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou pelo desprovimento dos recursos de apelação, a fim de manter a condenação prolatada para os apelantes (Id. 272237865 – p. 964-977; Id. 275690859 – p. 979-993). O parecer da d. Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Procurador de Justiça Gill Rosa Fechtner, é pelo conhecimento em parte do recurso do réu Tiago e, no mérito, pelo desprovimento dos apelos defensivos dos recorrentes, mantendo incólume a sentença de primeiro grau (Id. 263491788). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Tratam-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por JHEMESON VIEIRA GUIMARÃES, TIAGO ARAÚJO DOS SANTOS e ANTONIO APARECIDO GOMES NETO, contra sentença prolatada pelo Juízo da 9ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá (MT), que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando os apelantes TIAGO e JHEMESON pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, e o apelante ANTONIO pela prática do crime previsto no art. 33, § 1º, inciso III, da mesma lei. Como consignado em relatório, além de pugnar por sua absolvição e desclassificação da conduta, de forma subsidiária o apelante Tiago pugnou pela fixação da pena no mínimo legal, a aplicação da causa de diminuição da pena do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006) e, por fim, pela conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Ocorre que, no caso concreto, que não subsiste interesse recursal quanto aos pleitos subsidiários formulados pelo apelanteTiago, porquantotodos foram integralmente acolhidos na sentença prolatada pelo Juízo de origem, a qual fixou a pena no mínimo legal, reconheceu e aplicou a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 — com redução de 2/3 —, estabeleceu o regime inicial aberto e procedeu a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Dessa forma, resta evidenciada a ausência do interesse recursal quanto a tais tópicos, razão pela qualconhece-se parcialmente do recurso de Tiago,apenas no tocante aos pedidos de absolvição e desclassificação da conduta. Quanto aos pleitos recursais formulados por Jhemeson e Antônio, presentes os seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos apelos defensivos. Passo à análise. Do pleito de absolvição dos acusados Jhemeson e Tiago pela prática do delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06: Em suas razões, Tiago sustenta que não praticou o crime de tráfico de drogas, requerendo sua absolvição por ausência de provas. Alega que a droga foi encontrada no interior de seu veículo, na posse de seu companheiro que assumiu ser usuário e declarou que os entorpecentes eram destinados ao uso recreativo do casal. Defende, ainda, que exerce atividade profissional lícita como engenheiro civil e DJ, tendo sido contratado apenas para se apresentar musicalmente na festa em que os fatos ocorreram, sem qualquer vínculo com a organização do evento ou com a venda de substâncias ilícitas. Alega que não foram apreendidos com ele elementos típicos da mercancia de drogas, como dinheiro fracionado ou instrumentos de tráfico, e que os depoimentos dos policiais militares são contraditórios e frágeis, havendo dúvidas substanciais sobre a autoria delitiva. Já a defesa de Jhemeson sustenta quenão há provas suficientespara a condenação por tráfico de drogas, pleiteando suaabsolviçãocom base no princípio in dubio pro reo, ou, de forma subsidiária, adesclassificação da conduta para o art. 28, da Lei n. 11.343/06. Argumenta quenão houve flagrante de comercialização, que adroga encontrada estava em quantidade compatível com uso pessoale quenenhuma testemunha o viu traficando. Alega, ainda, que os entorpecentes espalhados no local da festanão podem ser atribuídos a ele, em razão do grande número de pessoas presentes. Não assiste razão aos recorrentes. A materialidade encontra-se devidamente comprovada por meio do Auto de Prisão em Flagrante Delito (Id. 262565897); Boletim de Ocorrência (Id. 262565897– p. 13-17); Termos de Depoimentos (Id. 262565897 – p. 18-23); Auto de Apreensão (Id. 262565897 – p. 28); Termo de Entrega (Id. 262565897 – p. 31-32); Laudo Pericial (Id. 262565897 – p. 34-39); Termo de Qualificação, Vida Pregressa e Interrogatório (Id. 262565897 – p. 40-42; p. 48-50), além das declarações colhidas em ambas as fases. Ao contrário das alegações defensivas, as provas produzidas nos autos durante a fase inquisitorial e ratificadas na instrução criminal são suficientes para comprovação da autoria delitiva, especialmente os depoimentos dos policiais militares que realizaram o flagrante. Em seu depoimento, o Capitão da Polícia Militar, Leonel Avelino Corbbelini Neto, afirmou que a abordagem e apreensão das substâncias entorpecentes ocorreu em razão de uma denúncia recebida pela Agência Local de Inteligência. – ALI, em que relatava a ocorrência de aglomeração indevida de pessoas durante a pandemia da COVID-19 com possível consumo e venda de entorpecentes. Afirmou que, na ocasião, ao realizarem a abordagem dos réus Tiago e Jhemeson, encontraram entre seus pertences as substâncias entorpecentes e, apesar de em juízo declarar não se recordar da quantidade, ratificou os termos do boletim de ocorrência afirmando que, naquela oportunidade, houve a individualização e indicação da quantidade de entorpecentes de que cada um estava portando. Em razão da testemunha ratificar os termos do Boletim de Ocorrência e para melhor compreensão, colaciono os termos constantes no referido documento: (...) Com o suspeito Jhemeson Vieira Magalhães foram encontradas uma porção de uma substância análoga a cocaína e cinquenta comprimidos de uma substância análoga a ecstazy; Que com o suspeito Tiago foram encontradas seis porções de substância análoga à cocaína e 18 (dezoito) comprimidos de uma substância análoga à ecstazy (Id. 262565897 – p. 16). Corroborando as declarações do Capitão, tem-se o depoimento do policial militar Jair Gonçalves Júnior. Vejamos: Que ao todo foram conduzidas 3 pessoas para delegacia, o responsável pelo evento e mais dois que detinham grande quantidade e que poderia configurar o tráfico desses entorpecentes. Que esses dois estavam com grande quantidade. Que as outras pessoas que foram abordadas não eram essas pessoas, que essas outras estavam com pouco e aí foi dado tratamento de usuário. Que os outros dois, pelo menos um, era de fora, não era nem do deste Estado (...) (Id. 262566923). Não obstante os réus sustentarem, em suas defesas, que as substâncias entorpecentes apreendidas se destinavam exclusivamente ao consumo pessoal — sendo que, no caso deTiago, afirma tratar-se também de entorpecentes pertencentes ao seu companheiro, que igualmente se encontrava na festa —, tal alegaçãonão se sustenta diante dos elementos objetivos constantes dos autos. Conforme bem consignado pelo Juízo de origem, aquantidade expressiva de comprimidos apreendidosem poder dos acusados revelaindícios contundentes em sentido contrário à versão defensiva de uso pessoal. No caso do apelanteTiago Araújo dos Santos, a apreensão de 6 porções de cocaína e 20 comprimidos de ecstasyexcede, de forma relevante, os parâmetros usualmente admitidos como compatíveis com o consumo próprio. Situação semelhante se verifica em relação ao corréu Jhemeson Vieira Guimarães, em cuja posse foram encontradas 1 porção de substância análoga à cocaína e 50 comprimidos de ecstasy, quantitativo ainda mais elevado, reforçando o juízo de tipicidade penal quanto à prática do tráfico de drogas Os depoimentos colhidos em juízo pelas testemunhas de defesa — notadamenteJúlio Cesar Santos Morais,Ubiracy Teixeira da Silva FilhoeMauro Carvalho de Oliveira— além do informante Vilmondes Rodrigues Fagundes, companheiro do réu Tiago,não se mostram suficientes para desconstituir a materialidade e a autoria delitiva atribuída aos recorrentes, sobretudo diante das inconsistências e contradições internas dos relatos. Embora todos afirmem não ter presenciado atos de comercialização de drogas durante a festa, tais declarações se mostraramem dissonância com o acervo probatório constante dos autos, especialmente diante dasignificativa quantidade e diversidade de substâncias entorpecentes apreendidas no local do evento, conforme termo de apreensão regularmente juntado aos autos (Id. 262565897 – p. 28). No local da festa, além dos entorpecentes encontrados com Tiago e Jhemeson, foram localizadas 50 porções de substância análoga à cocaína, 70 comprimidos de ecstasy, uma porção de maconha e duas porções de MD, além de uma máquina de cartão de crédito. Tais afirmações evidenciam a fragilidade dos elementos trazidos pela defesa, revelando um esforço discursivo para dissociar os acusados da prática de tráfico. A exemplo disso, tem-se o fato de que própria testemunha Ubiracy Teixeira da Silva Filho reconheceu, ao ser inquirido, quenão teria como afirmar se havia ou não venda e uso de drogas, poisas luzes estavam apagadas e quecaso alguém estivesse fazendo uso ou comercializando, provavelmente o faria de forma discreta e reservada. Vejamos: (...) Que igual eu falei, as luzes estavam apagadas, né? E quando eu cheguei, assim, a um certo horário, as pessoas estavam, como de costume, bebendo suas bebidas. Que pelo menos na minha frente eu não vi ninguém explicitamente usando porque eu acho que até que é uma coisa, assim, muito agressiva, né? Que as pessoas que utilizam, acredito eu, que elas vão fazer isso de forma mais ponderada, né? Mais reservada, né (...) (Id. 262566921). Destaco que apesar de os acusados negarem a prática do tráfico de drogas ao longo da instrução criminal, ascircunstâncias em que se deu o crime afastam, de forma inequívoca, a tese defensiva de absolvição. Repiso que foram apreendidas quantidades expressivas e variadas de substâncias entorpecentes, consistentes emseis porções de substância análoga à cocaína e vinte comprimidos de ecstasy com o acusado Tiago, bem comocinquenta comprimidos de ecstasy e uma porção de cocaína com o corréu Jhemeson, em umevento de grande porte, com cerca de 250 pessoas, conforme confirmado em juízo. Trata-se deambiente propício à mercancia, conforme reconhecido, inclusive, por testemunhas de defesa, que afirmaram que todo mundo ali só tomava bala e que ouso de drogas era comum nesse tipo de festa. De outro lado, têm-se osdepoimentos dos policiais militares responsáveis pela abordagem e prisão em flagrante dos acusados, os quais se apresentaramcoerentes, harmônicos e convergentes ao longo de toda a instrução criminal, ratificando fielmente as informações inicialmente prestadas perante a autoridade policial. Em juízo confirmaram a apreensão de quantidade considerável de substâncias entorpecentes, individualizadas na posse dos réus, especialmente com Tiago Araújo dos Santos e Jhemeson Vieira Guimarães, circunstância que confere elevada credibilidade aos relatos dos agentes públicos e reforça a veracidade da dinâmica fática narrada na denúncia. Os relatos dos agentes públicos, colhidos sob o crivo do contraditório, são dotados de presunção de veracidade, sobretudo quando coerentes entre si e em harmonia com os demais elementos de prova. A abordagem policial foi motivada, tendo sido os réus flagrados na posse de substâncias entorpecentes. O tráfico de drogas é crime de natureza permanente e de ação múltipla. Embora a comercialização da droga não seja um elemento obrigatório do crime, o que caracteriza o tráfico é a intenção do agente de transferir ou colocar a droga na posse de usuários, conforme descrito em qualquer um dos 18 verbos do artigo 33, da Lei n. 11.343/2006, entre os quais trazer consigo e guardar, como no presente caso. Ademais, ressalto que o depoimento dos Policiais Militares tem grande importância como prova no tráfico de drogas e sua credibilidade não deve ser diminuída apenas por causa de sua função, a menos que haja indícios concretos que possam desaboná-lo, o que não foi demonstrado neste caso. Acerca do assunto, a colenda Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste e. Tribunal aprovou, no bojo do Incidente de Uniformização de Jurisprudência n. 101532/2015, o Enunciado Orientativo n. 8, cuja redação dispõe que os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal. Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que os depoimentos dos agentes policiais, colhidos sob o crivo do contraditório, merecem credibilidade como elementos de convicção, máxime quando em harmonia com os elementos constantes dos autos (HC 262.582/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016). Portanto, inviável a absolvição dos acusados. Do pleito de desclassificação da conduta do réu Tiago e Jhemeson para aquela prevista no art. 28, caput, da Lei n. 11.343/06: No que tange ao pedido de desclassificação para o delito previsto no artigo 28, da Lei n. 11.343/06, cumpre destacar que a condição de usuário não exclui, por si só, a prática do tráfico de drogas, sendo comum que o agente, para sustentar seu vício, também atue na comercialização de entorpecentes. A mera alegação de uso pessoal é insuficiente para desconstituir o crime tipificado no artigo 33 da referida lei, especialmente quando os elementos probatórios evidenciam o contrário. No caso em apreço, a negativa de autoria pelos apelantes não se sustenta, uma vez que a prova colhida no inquérito policial foi ratificada em juízo e encontra-se em harmonia com os demais elementos constantes dos autos. Em posse dos acusados foram apreendidas quantidade e variedade de drogas, quais sejam, 06 (seis) porções de cocaína e 18 comprimidos de ecstasy com Tiago, bem comocinquenta comprimidos de ecstasy e uma porção de cocaína com o corréu Jhemeson (Id. 262565897 – p. 28). Destaca-se que aação policial que resultou na prisão em flagrante do recorrente decorreu de diligência regular motivada por denúncia anônima, a qual informava a ocorrência deaglomeração irregular durante o período de restrições impostas pela pandemia da COVID-19, bem como apossível comercialização de entorpecentesno interior do evento. No local, ospoliciais militares responsáveis pela ocorrência confirmaram, de forma firme, coesa e harmônica, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, aapreensão de expressiva quantidade e variedade de substâncias entorpecentes com os réus, o que incluicomprimidos de ecstasy e porções de cocaína. Ademais, embora tenham buscado justificar suas condutas sob a alegação de uso pessoal, esta tese que, no entanto, se mostra isolada, dissociada do conjunto probatório e absolutamente inverossímil, especialmente diante da quantidade significativa das substâncias apreendidas e do contexto em que se encontrava — uma festa rave com centenas de pessoas, ou seja, ambiente notoriamente propício à prática de tráfico velado. Repiso que os depoimentos das testemunhas de defesa, embora afirmem conhecer os recorrentes e neguem ter visto praticando qualquer ato de traficância, também revelam desconhecimento quanto a aspectos relevantes da vida pessoal dos acusados, notadamente ao afirmarem não terem visto os acusados fazendo uso de substâncias entorpecentes. Vejamos o depoimento de Júlio Séder, um dos participantes do evento: Que não sabe dizer se os denunciados eram usuários de entorpecentes. Que nunca viu eles usando também. Que eu sempre, quando via eles na festa, era só para curtir, dançar, né? Mas, usando, eu nunca vi (Id. 262566922). Tal circunstância evidencia que os testemunhos foram prestados com base em vínculos sociais superficiais, desprovidos de conhecimento íntimo ou contínuo sobre os hábitos dos réus, não sendo, por isso, suficientes para sustentar a tese de que os réus se tratam de meros usuários. Ressalte-se, ainda, que a única declaração que atribui ao réu Tiago a condição de usuário de entorpecentes parte de seu companheiro Vilmondes Rodrigues Fagundes, o qual foi ouvido em juízo na qualidade de informante, justamente por possuir interesse direto no desfecho do processo, tratando-se, portanto, de relato isolado nos autos. Assim, diante da coerência dos relatos dos policiais, inexistem elementos que permitam afastar a credibilidade dos depoimentos prestados pelos agentes públicos. Nessa esteira de pensar, o enunciado n. 3, da TCCR/TJMT dispõe que a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n. 101532/2015, Disponibilizado no DJe Edição n. 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017). Com efeito, é cediço que tanto no crime de tráfico de drogas como no delito de porte para uso, semelhantes são os verbos nucleares dispostos nos artigos 28 e 33, da Lei n. 11.343/06, residindo a diferenciação entre as condutas apenas quanto à finalidade específica do agente em relação à substância, depreendendo-se da prova em qual tipo penal a conduta do acusado irá se subsumir. Na essência, os depoimentos seguros e coerentes dos agentes policiais, prestados sob o crivo do contraditório, são idôneos para sustentar a condenação criminal (TJMT, Enunciado Criminal 8) por tráfico de drogas, o qual classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas (TJMT, Enunciado Criminal 7). A propósito, segue entendimento jurisprudencial: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE –AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS – DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES – VALIDADE – DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGA PARA CONSUMO PESSOAL – NÃO CABIMENTO – DESTINAÇÃO MERCANTIL COMPROVADA. - Comprovadas a autoria e a materialidade delitivas por meio das provas produzidas nos autos, deve ser rejeitada a tese absolutória -A palavra de policiais é elemento de prova a ser valorizado, conferindo maior robustez ao conjunto probatório, sobretudo quando em absoluta consonância com as circunstâncias do crime -Não é cabível a desclassificação do delito de tráfico de drogas para o delito de porte de drogas para consumo pessoal se a situação fática demonstra a finalidade mercantil. (TJMG - APR: 10450160001571001, Rel. Maurício Pinto Ferreira, 8ª Câmara Criminal, j. em 27/10/2022, Data de Publicação: 27/10/2022) (grifos meus). APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - CONDENAÇÃO - RECURSO DA DEFESA - ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME PARA USO - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS - DEPOIMENTO DOS AGENTES POLICIAIS EM CONSONÂNCIA COM AS CIRCUNSTÂNCIAS FACTUAIS - PRISÃO EM FLAGRANTE - CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE NÃO IMPEDE A PRÁTICA DO TRÁFICO - RECURSO DESPROVIDO. As provas colhidas nos autos, em especial depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante, em harmonia com as circunstâncias do caso concreto, são elementos suficientes para se revelar a existência do crime previsto no art. 33 da Lei 11.343/06, sendo impossível falar em absolvição ou desclassificação para uso próprio. (TJMT - 1003384-10.2021.8.11.0042, Rel. Des. JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Terceira Câmara Criminal, j. em 25/01/2023, Data de Publicação: 31/01/2023) (grifos meus). É certo que não há obstáculo para que a mesma pessoa possa ser tanto usuária quanto traficante de entorpecentes, uma vez que, em muitos casos, a traficante utiliza os lucros obtidos com a venda de drogas para sustentar seu próprio vício. Dessa forma, no presente caso estando plenamente comprovadas a autoria e a materialidade do crime de tráfico de entorpecentes, é incabível a desclassificação da conduta dos acusados para o artigo 28, da Lei de Drogas. Do pleito de absolvição do acusado Antônio Aparecido Gomes Neto pela prática do crime previsto no art. 33, § 1º, inciso III, da Lei n. 11.343/06: Em suas razões, a defesa sustenta a ausência de dolodo apelante, sustentando que esteapenas organizava uma festa de aniversárioem uma chácara alugada,sem ter conhecimento ou anuência com qualquer atividade relacionada ao tráfico de drogas. Entretanto, não lhe assiste razão. Os elementos colhidos nos autos revelam de forma clara e segura que o apelante, embora não tenha sido flagrado com entorpecentes em sua posse direta,efetivamente cedeu o imóvel em que se realizou a festa para o tráfico ilícito de drogas, preenchendo integralmente o tipo penal descrito no art. 33, § 1º, inciso III, da Lei Antidrogas. As provas demonstraram, indene de dúvidas, que a festa foi realizada em um imóvelalugado e coordenado diretamente por Antônio, o qualadmitiu ter organizado o evento, promovendo estrutura de portaria com controle de acesso, cobrança de ingresso e contratação de DJ, elementos que afastam qualquer alegação de evento meramente privado ou despretensioso. Os policiais militares responsáveis pela diligência — especialmente oCapitão Leonel Avelino Corbbelini Neto— foram uníssonos em relatar, com firmeza e coerência, que Antônio se apresentou como o organizador do evento, e que, no local, foramapreendidas expressivas quantidades de entorpecentes, não apenas com os corréus, mas tambémespalhadas por diversos pontos da residência, tais como mesas, gavetas e no chão, em fracionamento típico de comercialização. Como consignado anteriormente, além dos entorpecentes apreendidos com os corréus, foram encontradas 60 porções de cocaína, 70 comprimidos de ecstasy, uma porção de maconha, duas porções de MD, entre outros materiais como máquina de cartão e simulacro de arma de fogo, sem que fosse possível identificar a posse individual de tais substâncias. O policial militar Jair Gonçalves Júnior, sob o crivo do contraditório, reforçou os elementos colhidos na fase inquisitorial e confirmou amaterialidade e o contexto fático compatível com a cessão do local para o tráfico de drogas.Ele relatou que, durante a abordagem policial, constatou-se a existência dequantidade significativa de drogas espalhadas pelo local, como se extrai de sua própria fala: acredito que todo mundo pegou o que tinha no bolso e saiu jogando no chão o que demonstra queos presentes estavam, em sua maioria, em posse de substâncias entorpecentes, com total liberdade de circulação e consumo (Id. 262566923). Ao ser questionado sobre a ciência de Antônio acerca da traficância, o policial Jair, embora tenha ponderado não poder afirmar categoricamente a intenção subjetiva do acusado, ressaltou que, pela quantidade que tinha lá dentro, era possível que ele tivesse conhecimento, pois as coisas pareciam estar muito às claras, o que reforça a presunção lógica de que, na condição de organizador do evento, o réu consentiu com a utilização do local para fins ilícitos (Id. 262566923). Não se sustenta, ainda, eventual alegação defensiva de que o apelanteAntônio Aparecido Gomes Netoteriaproibido ou coibido o ingresso de substâncias entorpecentes no local da festa, de modo a afastar sua responsabilidade. Isso porqueas próprias testemunhas de defesa, presentes no evento, reconheceram a habitualidade do uso de drogas em festas dessa natureza. Vejamos o depoimento de Júlio Séder, um dos participantes do evento: Que não sabe dizer se os denunciados eram usuários de entorpecentes. Que nunca viu eles usando também. Que eu sempre, quando via eles na festa, era só para curtir, dançar, né? Mas, usando, eu nunca vi. Que as pessoas estavam cheirando alguma coisa, só que eu não sei dizer o que era (Id. 262566922). As provas produzidas nos autos afastam qualquer tese de repressão ou fiscalização por parte do organizador, pois a quantidade de substâncias encontrada no local — tanto com frequentadores quanto dispersa em áreas comuns — revela que o uso e a circulação de entorpecentesnão só eram previsíveis, como tolerados, sendo absolutamente incompatível com a tese de ignorância por parte daquele queplanejou, divulgou, organizou e executou o evento, demonstrando claraanuência e consentimento com o tráfico ilícito no interior do imóvel sob sua responsabilidade. Portanto, o dolo está plenamente evidenciado, na medida em que Antônio, ciente da possibilidade de comercialização de drogas no local,não apenas permaneceu inerte, como continuou a fomentar a realização da festa, mantendo estrutura funcional ao evento, contribuindo, assim, de formaconsciente e voluntária para a viabilização da prática criminosa pelos demais envolvidos. As alegações de que Antônio desconhecia o tráfico restam isoladas, sendo refutadaspor testemunhos técnicos e imparciais, em especial dos agentes de segurança pública. Como já consignado quando da análise das teses defensivas dos demais corréus, o depoimento dos Policiais Militares tem grande importância como prova no tráfico de drogas e sua credibilidade não deve ser diminuída apenas por causa de sua função, a menos que haja indícios concretos que possam desaboná-lo, o que não foi demonstrado neste caso. No caso dos autos, asdeclarações prestadas pelos policiais militares responsáveis pela diligência e pelas prisões em flagrante se mostraram absolutamente harmônicas, coerentes e convergentes, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, reforçando a credibilidade da atuação policial e a regularidade da abordagem. Nessa esteira de pensar, repiso que o Enunciado Orientativo n. 8 da TCCR/TJMT dispõe que os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal. Diante desse quadro,sem maiores delongas, não prospera o pleito absolutório formulado pela defesa do acusado Antônio Aparecido Gomes Neto, sobretudo porque os relatos dos agentes públicos, desprovidos de qualquer interesse pessoal,convergem no sentido de confirmar a condição de organizador do eventoe suaanuência com a utilização do local para a prática do tráfico de drogas, nos moldes exigidos pelo art. 33, § 1º, inciso III, da Lei n. 11.343/2006. Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos por Jhemeson Vieira Guimarães, Antônio Aparecido Gomes Neto e Tiago Araújo dos Santos, mantendo incólume a sentença condenatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025

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