Caixa Economica Federal e outros x Caixa Economica Federal e outros
ID: 261910225
Tribunal: TRT7
Órgão: 3ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0001828-94.2023.5.07.0037
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FRANCISCA MARTA OTONI MARINHEIRO RODRIGUES
OAB/CE XXXXXX
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ALLAN DYOGENES DE SA SAMPAIO
OAB/CE XXXXXX
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MARIA CLARA SIMIAO BRILHANTE
OAB/CE XXXXXX
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IGOR OTONI AMORIM
OAB/CE XXXXXX
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MARIA ISADORA FELIX GOMES
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: JOSE ANTONIO PARENTE DA SILVA 0001828-94.2023.5.07.0037 : CAIXA ECONOMICA FEDERAL E OUTROS (1)…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: JOSE ANTONIO PARENTE DA SILVA 0001828-94.2023.5.07.0037 : CAIXA ECONOMICA FEDERAL E OUTROS (1) : FRANCISCA TATHYANA DOS SANTOS E OUTROS (1) EMENTA DIREITO DO TRABALHO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. BASE DE CÁLCULO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO DA MENOR COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA PELA GENITORA. FATO NOVO. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. APLICABILIDADE DA LEI 14.457/2022. EMBARGOS DA RECLAMANTE PROVIDOS. EMBARGOS DA RECLAMADA PARCIALMENTE PROVIDOS, SEM MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO. I. CASO EM EXAME 1. Embargos de declaração opostos pela reclamante e pela reclamada contra acórdão que deferiu redução da jornada de trabalho da reclamante, sem redução salarial, para cuidar de sua filha com transtorno do espectro autista, e majorou os honorários advocatícios sucumbenciais. 2. A reclamante questiona a base de cálculo dos honorários, alegando obscuridade quanto à inexistência de valor a ser liquidado. 3. A reclamada alega fato novo consistente em acordo coletivo de trabalho, que disciplina a redução de jornada para empregados com dependentes com deficiência, bem como omissão quanto à aplicabilidade da Lei nº 14.457/2022 e em relação à demonstração da necessidade de acompanhamento constante da filha pela reclamante. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há quatro questões em discussão: (i) definir a base de cálculo dos honorários advocatícios sucumbenciais em caso de condenação exclusivamente em obrigação de fazer; (ii) estabelecer se acordo coletivo de trabalho posterior à sentença, que disciplina redução de jornada para empregados com dependentes com deficiência, configura fato novo apto a modificar a decisão; (iii) determinar se a Lei nº 14.457/2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres, afasta o direito da reclamante à redução de jornada sem redução salarial; (iiii) esclarecer se a reclamante demonstrou a necessidade de acompanhamento constante da filha com transtorno do espectro autista. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. Em condenação exclusivamente em obrigação de fazer, sem proveito econômico mensurável, os honorários advocatícios devem incidir sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 791-A, caput, da CLT. 6. Acordo coletivo de trabalho celebrado após a sentença configura fato novo, devendo ser analisado para verificar seu impacto na decisão. Entretanto, considerando que o direito à redução de jornada para cuidar de dependente com deficiência configura direito indisponível, o acordo coletivo não afasta o direito da reclamante. 7. Embora a Lei nº 14.457/2022 preveja flexibilização da jornada para empregados com filhos com deficiência, suas disposições não afastam o direito da reclamante à redução de jornada sem redução salarial, em razão da necessidade de garantir a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e a proteção à infância, em consonância com o art. 227 da Constituição Federal, o princípio da adaptação razoável e a jurisprudência do TST e do STF sobre o tema. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Embargos de declaração da reclamante providos para determinar o cálculo dos honorários advocatícios sobre o valor atualizado da causa; Embargos de declaração da reclamada parcialmente providos para suprir omissão, sem alteração do acórdão embargado. Tese de julgamento: 1. Nos casos de condenação exclusivamente em obrigação de fazer, sem proveito econômico mensurável, os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser calculados sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 791-A, caput, da CLT. 2. Acordo coletivo de trabalho posterior à sentença, que disciplina a redução de jornada de trabalho para empregados com dependentes com deficiência, não afasta o direito da empregada à redução da jornada sem redução salarial, em caso de comprovação da necessidade de cuidar de filho com deficiência, se este direito for considerado indisponível. 3. O direito da empregada à redução da jornada de trabalho sem redução salarial para cuidar de filho com deficiência pode ser reconhecido com base em princípios constitucionais (dignidade da pessoa humana, valor social do trabalho, proteção à infância), mesmo havendo legislação específica sobre flexibilização da jornada, caso a legislação seja insuficiente para garantir o interesse superior da criança e a adaptação razoável. Dispositivos relevantes citados: Art. 791-A da CLT; Art. 227 da CF; Lei nº 14.457/2022; Art. 58-A da CLT; Lei nº 13.146/2015; Art. 98, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.112/90. Jurisprudência relevante citada: Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e do Supremo Tribunal Federal sobre redução de jornada de trabalho para cuidar de filho com deficiência, aplicação analógica do art. 98 da Lei 8.112/90, e princípio da adaptação razoável. RELATÓRIO Trata-se de embargos de declaração opostos por FRANCISCA TATHYANA DOS SANTOS e CAIXA ECONÔMICA FEDERAL em face do acórdão proferido pela Terceira Turma deste Regional (Id. 21b2450). A reclamante aponta obscuridade no acórdão em relação à base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência (Id. 6f2fe55). Por sua vez, a reclamada aduz a existência de omissão quanto à aplicabilidade do ACT 2024/2026 e da Lei nº 14.457/2022, bem como em relação à demonstração da necessidade de acompanhamento constante da filha pela reclamante (Id. 61a14d3). Manifestação da parte reclamante sob Id. e384c15. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO 1. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA RECLAMANTE 1.1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, merecem conhecimento os embargos de declaração da reclamante. 1.2. MÉRITO A embargante aponta obscuridade no Acórdão de Id. 21b2450 quanto à base de cálculo dos honorários advocatícios sucumbenciais, argumentando o que segue: "O acórdão embargado deferiu a majoração dos honorários sucumbenciais para o percentual de 15% sobre o valor que resultar a liquidação: (...) Ocorre que há nítida obscuridade na referida decisão. Isso, porque o acórdão julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais formulado pela embargante, determinando ao embargado apenas o cumprimento da obrigação de fazer, consistente na redução da carga horária da embargante em 2 (duas) horas diárias. Assim, não há qualquer valor a ser liquidado que possa servir como base de cálculo para os honorários sucumbenciais, de modo que se faz mister seja sanada a obscuridade (ou erro material, caso assim se entenda), esclarecendo que os honorários sucumbenciais devem incidir sobre o valor da causa." Ao exame. Na sentença de Id. e3b754b, os honorários advocatícios devidos pela reclamada foram fixados em 5% sobre o valor da causa, em razão da sua condenação em reduzir a carga horária da reclamante de 6 horas para 5 horas diárias, sem posterior compensação e sem prejuízo da remuneração da obreira. Não houve deferimento de parcelas pecuniárias. Ao julgar os recursos ordinários, este Colegiado reformou a sentença, para reduzir a jornada de trabalho da reclamante para 4 horas diárias e majorar os honorários de sucumbência para 15%. No entanto, equivocadamente, determinou-se a incidência da verba honorária "sobre o valor que resultar da liquidação do título executivo", portanto deve-se sanar o vício existente no acórdão embargado. Com efeito, consistindo a condenação, unicamente, em obrigação de fazer, em que não é possível estimar proveito econômico, a verba honorária deve ser calculada sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 791-A, caput, da CLT. Confira-se: "Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)." Assim, dá-se provimento aos presentes embargos para, sanando o equívoco, determinar que os honorários advocatícios, a cargo da reclamada, sejam calculados à base de 15% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 791-A, caput, da CLT. 2. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA RECLAMADA 2.1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, merecem conhecimento os embargos de declaração da reclamada. 2.2. MÉRITO 2.2.1. OMISSÃO. FATO NOVO. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO Aduz a embargante a ocorrência de fato novo, informando que, no mês de setembro de 2024, as entidades representativas da categoria bancária (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro - CONTRAF e Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito - CONTEC) celebraram Acordo Coletivo de Trabalho com a Caixa Econômica Federal, que traz regramento específico sobre a redução da jornada de trabalho para empregados com filhos/dependentes com deficiência. Assim, "requer a extinção do presente processo por perda superveniente do objeto diante da carência do interesse processual em requerer a aplicação de legislação em matéria já regulada por negociação coletiva", com base no art. 7º, XXVI, da CF, art. 611-A, da CLT e Tema 1.046 de Repercussão Geral do STF. Sucessivamente, "requer seja reconhecida a validade da regulamentação acima descrita que consagra a adequação setorial negociada e a autonomia privada coletiva, julgando improcedente o pedido de redução de jornada nos termos postulados pela parte autora". Ao exame. Realmente, trata-se de fato novo, visto que ocorreu em setembro de 2024, após a interposição do recurso ordinário pela reclamada, e esta atravessou petição nos autos em novembro de 2024 (Id. f7b4921). O recurso ordinário foi julgado em janeiro de 2025 sem a apreciação do aludido fato, portanto cumpre sanar a omissão. Pois bem. Os ACT's 2024/2026 (vigência 01/09/2024 a 31/08/2026), juntados aos autos pela reclamada (Id. b522186 e 82ce706), estabelecem, nas Cláusulas 65 e 61, condições de trabalho para empregados com dependentes PcD, inclusive com transtorno do espectro autista, da seguinte forma: "Para empregado, na qualidade de pai, mãe ou responsável legal por dependente com deficiência, será concedida mobilidade e/ou redução de sua jornada de trabalho em até 25% das horas diárias, conforme regras estabelecidas em normativo, desde que comprovada a deficiência por atestado/laudo médico ratificado pelo Médico da CAIXA e avaliado por equipe multidisciplinar e mediante comprovação da necessidade de acompanhamento para tratamento durante o horário de trabalho." Contudo, não se acolhe o pedido principal da embargante de "extinção do presente processo por perda superveniente do objeto diante da carência do interesse processual em requerer a aplicação de legislação em matéria já regulada por negociação coletiva", nem o pedido subsidiário no sentido de que seja julgado improcedente o pedido de redução de jornada nos termos postulados pela parte reclamante. E, ao assim decidir, não se está negando a validade das normas coletivas, mas sim considerando o alcance da tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1046, segundo a qual "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Com efeito, o caso dos autos se enquadra na ressalva do STF, por se tratar de direito absolutamente indisponível, respeitante aos cuidados de saúde e de apoio familiar indispensáveis à criança com transtorno do espectro autista. Aliás, resta consignado no acórdão embargado que "a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, associados à função social da propriedade, são princípios que, neste caso, devem ser harmonizados com a necessidade de promover o bem-estar da criança e o apoio familiar indispensável". Com efeito, a Constituição Federal estabelece inúmeras diretrizes e normas destinadas à proteção da pessoa com deficiência, a teor do seu art. 227 juntamente com o Decreto nº 6.949/09, que introduziu, no ordenamento jurídico brasileiro, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, com o status de emenda constitucional. E, sedimentadas nessas premissas, temos a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Lei nº 12.764/2012) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990), dentre muitas outras normas que positivam o dever de proteção integral à criança, garantindo-lhe todos os direitos fundamentais e proporcionando meios para o seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Assim, diante do amplíssimo macrossistema normativo de proteção à criança, mormente a que tem necessidades específicas, prioritárias e inadiáveis, apegar-se a uma única lei ou instrumento coletivo, que limita, impede ou cria embaraços ao seu acesso a uma variedade de tratamentos existentes com a plena participação da família, seria o mesmo que negar à criança os direitos fundamentais de ter uma vida funcional e autônoma. Por todo o exposto, e com base na necessidade da menor com transtorno do espectro autista da presença e acompanhamento constante da sua genitora aos tratamentos multidisciplinares, como já explicitado no acórdão embargado, rejeita-se o pedido da embargante no sentido de que se aplique ao caso as disposições contidas no ACT 2024/2026 e nos Manuais Normativos RH 035 versão 057 e RH 226 versão 021, alterados por força do citado instrumento coletivo. Embargos de declaração que se acolhe para sanar a omissão apontada, mas sem modificação do acórdão embargado. 2.2.2. OMISSÃO QUANTO À DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO DA FILHA PELA RECLAMANTE A embargante alega omissão do acórdão quanto à incumbência da reclamante de provar que é a cuidadora principal e que a jornada normal de trabalho impede o adequado acompanhamento do tratamento da sua filha (arts. 818, da CLT e 373, do CPC). Outrossim, aduz a necessidade de avaliação por junta médica oficial, a garantir horário especial reduzido sem redução remuneratória, "mormente em face da possibilidade de que haja evolução do quadro do portador do espectro autista apto a garantir-lhe autonomia maior". Não procede a argumentação supra. Com efeito, não se verifica a omissão apontada, mas sim a pretensão da embargante de que se reexamine o conjunto fático-probatório dos autos, o que não se coaduna com a finalidade processual dos embargos declaratórios. Como se vê da decisão embargada, este Colegiado expôs, de forma minuciosa e clara, os motivos que levaram ao convencimento de que a menor necessita do acompanhamento diário da sua genitora nos diversos tratamentos que realiza, com psicólogo, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, médico, etc, e nas atividades escolares e sociais, além da necessidade de atenção no próprio lar. Ademais, consta expressamente no acórdão a possibilidade de ser revisada judicialmente a decisão caso sobrevenha prova concreta de alteração da situação. Confira-se: "1. RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA (...) 1.3. MÉRITO "1.3.1. EMPREGADA DE EMPRESA PÚBLICA. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO PARA ACOMPANHAMENTO DA FILHA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA Busca a reclamada a reforma da sentença, afirmando que deve ser observado, no caso, o princípio da legalidade, que rege a Administração Pública. Afirma que não há dispositivo legal no ordenamento jurídico que autorize a redução da jornada de trabalho do agente público, submetido ao regime Celetista, sem compensação de horário e sem prejuízo da sua remuneração, sendo inaplicável o disposto no art. 98, § 3º, da Lei nº 8.112/90 (Estatuto do Servidor Público Federal) e o decidido no tema 1.097 pelo Supremo Tribunal Federal. Outrossim, alega a recorrente que a reclamante não comprovou a necessidade de reduzir a sua jornada especial de 6 (seis) horas. Acrescenta que, no seu cadastro, existem duas dependentes na condição de filha, mas não possuem registro de deficiência no plano Saúde CAIXA. Ao exame. Em relação à questão, assim decidiu o Juízo "a quo": "Inicialmente, alega a reclamante que em 09/08/2023, sua filha Maria Isabela foi diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA) com gravidade moderada nas habilidades sociais e de comunicação, conforme classificação CID-11: 6A02 e CID-10: F84.0, sendo-lhe prescrito tratamento de acompanhamento multiprofissional. Alega que a sua jornada de trabalho está acabando por inviabilizar a realização de várias consultas necessários ao tratamento da criança, uma vez que não é possível o deslocamento da obreira para sair do trabalho, buscar sua filha e chegar nas clínicas a tempo de realizar todas as consultas/terapias, as quais ocorrem todos os dias da semana e demandam a presença da reclamante. Argumenta que labora na agência da Caixa Econômica Federal da cidade de Barbalha-CE, enquanto as clínicas onde são realizadas as consultas/terapias se localizam em Juazeiro do Norte-CE, cidade onde também reside a reclamante e suas filhas. Aduz que o genitor de sua filha é servidor público, lotado na cidade de Salgueiro-PE, exercendo jornada de 40h semanais, não tendo possibilidade de auxiliar a reclamante com as questões inerentes ao tratamento e acompanhamento da filha. Portanto, requer que o juízo reconheça o direito de redução da carga horária a 50%, sem que haja redução salarial ou compensação de jornada, a fim de que preste a assistência necessária a sua filha. A reclamada, por sua vez, alega que em consulta ao sistema do plano Saúde CAIXA, observou que a reclamante possui em seu cadastro duas dependentes na condição de filha que não possuem registro de deficiência. Defende que de acordo com o Regulamento do Plano disposto no MN RH221 v009, é obrigatório o enquadramento do beneficiário como PCD, para utilização da assistência à pessoa com deficiência. Argumenta que não há qualquer dispositivo legal no ordenamento jurídico que autorize a concessão do referido pedido a qualquer agente público submetido ao regime Celetista e que, a partir da edição da Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022, o empregado celetista passou a contar com regramento jurídico específico sobre o apoio ao exercício da parentalidade em casos de necessidades especiais e, do que dispõe a Lei nº 14.457 /2022, c/c a CLT, art. 58-A, entende que tal regramento não contempla hipótese de jornada reduzida sem a correspondente adequação proporcional de salário ou compensação de jornada. Sustenta que o Estatuto do Servidor Público Federal não é aplicável as empresas em geral, dentre elas a CAIXA, pois fora editada uma nova legislação para estabelecer uma igualdade substancial efetiva dos empregados celetistas com parentes nessa situação, com os demais empregados, consoante se depreende da leitura do inc. II do art. 1º da referida Lei 14.457/2022. À análise. De acordo com os documentos constantes nos autos, a autora comprova que sua filha Maria Isabela dos Santos Miguel (ID. 7587ae3) foi diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista - TEA (ID. 84fc774), sendo indicada a seguinte conduta terapêutica: psicólogo duas vezes por semana, fonoaudiólogo três vezes por semana, terapia ocupacional uma vez por semana. Consta na Declaração emitida pela Clínica Integrar de Desenvolvimento Infantil (ID. 75b799f), que Maria Isabela dos Santos Miguel se encontra sendo acompanhada por Sílvia Marta Dantas de Morais Lemos, fonoaudióloga CREFONO: 9739 e com a profissional Elisângela Rodrigues de Matos Firmino, Terapeuta Ocupacional CREFITO: 7454, todos os dias da semana, sendo necessária a presença da genitora FRANCISCA TATHYANA DOS SANTOS, durante as intervenções para acompanhá-la no setting terapêutico, bem como para aprender as abordagens utilizadas pelos profissionais e poder dar continuidade ao tratamento na dinâmica familiar, para evolução do quadro clínico da criança. Há nos autos também uma declaração (ID. 06fdf63) emitida pela Superintendência da Polícia Rodoviária Federal de Pernambuco informando que José Roberto Miguel Andrade - genitor de Maria Isabela dos Santos Miguel - possui jornada de 40 horas semanais naquele Estado, apesar de residir na cidade de Juazeiro do Norte /CE. É bem verdade que a Constituição Federal considera dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Além disso, estabelece que é competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios cuidar da saúde e da assistência pública, da proteção e garantia das pessoas com deficiência. A proteção legal também encontra lugar no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA- Lei 8.609/1990), que assegura à criança todas as oportunidades e facilidades, para facultar seu desenvolvimento integral, em condições de liberdade e de dignidade. Já a Lei 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, reconheceu expressamente que essas pessoas são consideradas, para todos os efeitos legais, pessoas com deficiência, com direito ao acesso a ações e serviços de saúde de atenção integral às suas necessidades, incluindo o atendimento multiprofissional. Por fim, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Decreto 6.949/2009) assegura que crianças com deficiências físicas ou mentais devem desfrutar de uma vida plena e decente, em condições que garantam sua dignidade, favoreçam sua autonomia e facilitem sua participação ativa na comunidade. Assim, aplica-se por analogia o Regime Jurídico Único (Lei 8.112/1990) que assegura esse direito aos servidores públicos da União. A Lei 8.112/1990, a partir de alteração introduzida pela Lei 13.370/2016, passou a estender ao servidor que tenha filho, cônjuge ou dependente com deficiência, a concessão de horário especial, quando "comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário"(art. 98, §2º e 3º). A medida preserva o valor social do trabalho, já que o empregado depende do emprego para custear os elevados custos com alimentação e tratamento especial da criança, e, ambos não conseguirão sobreviver de forma plena e saudável, sem a alteração almejada pelo pai. Acerca dos direitos das pessoas portadoras de Transtornos do Espectro Autista - TEA, a Lei nº 12.764 de 27 de dezembro de 2012, dispõe o seguinte: Art. 3º. São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista: I - a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer; II - a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração; III - o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo: a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo; b) o atendimento multiprofissional; c) a nutrição adequada e a terapia nutricional; d) os medicamentos; e) informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento; IV - o acesso: a) à educação e ao ensino profissionalizante; b) à moradia, inclusive à residência protegida; c) ao mercado de trabalho; d) à previdência social e à assistência social. Parágrafo único. Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2o, terá direito a acompanhante especializado. Além disso, a CF, no artigo nº 227, e a Lei 8.069/1990 positivam o dever de proteção integral à criança, para efetivação dos direitos à "vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária." No que tange ao argumento de que o pedido violaria o art. 37, caput, da CF/88, evidentemente que a empresa não tem razão, porque o princípio da legalidade não pode ser visto como continente isolado. Ao contrário disso, as normas constitucionais devem ser vistas como preceitos integrados a um sistema unitário que exige interpretação garante da sua eficácia integradora, dentre os quais está a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e a proteção à infância (art. 1º, III e IV, e art. 6º da CF/88), quando houver justificativa jurídica para que o Estado atue como seu garante. Todavia, considerando a possibilidade de evolução socioeducativa do indivíduo portador de autismo, com a consequente mitigação da necessidade de atenção integral dos pais, a decisão de redução da jornada poderá ser revisada caso sobrevenha prova concreta de alteração da situação que contingencia a vida, a saúde, alimentação, educação e a compleição pedagógico-social do filho. Nesse sentido, anexo a jurisprudência, verbis: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. EBSERH. EMPREGADA PÚBLICA. FILHO MENOR COM DEFICIÊNCIA (AUTISMO). REDUÇÃO DE JORNADA E MUDANÇA PARA O TURNO NOTURNO SEM ALTERAÇÃO REMUNERATÓRIA E SEM COMPENSAÇÃO DE HORÁRIO. ESPECIFICIDADE A EXIGIR SOLUÇÃO TÓPICA, NÃO GENERALIZÁVEL. O Regional, valendo-se da aplicação analógica do artigo 98, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.112/90, com a redação determinada pela Lei nº 13.370/2016, deferiu a fixação do horário de trabalho da reclamante, empregada pública do Hospital Universitário do Piauí com jornada semanal de trinta e seis horas, exclusivamente à noite, com redução da jornada em 20%, sem compensação e sem comprometimento da remuneração, até que o filho dela venha a completar doze anos de idade, em dezembro de 2020, em virtude de laudos médicos segundo os quais a criança, que padece de Transtorno do Espectro do Autismo - TEA, CID 10 F84.0/F90.0, tem um delicado estado de saúde, com necessidade de acompanhamento materno contínuo, devendo comparecer a pelo menos cinco atendimentos de terapia semanais. Nesse contexto, e a despeito da invocação a latere, pelo Regional, de inúmeros princípios aplicáveis à controvérsia (a saber, aqueles contidos nos artigos 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/90, 1º, III, 6º e 227 da Constituição Federal de 1988, Deficiência promulgada no Brasil pelo Decreto nº 6.949/2009), o Juízo a quo se valeu de método de integração normativa que, longe de afrontar, dá escorreita aplicação tanto ao princípio administrativo da legalidade estrita, insculpido no artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988, quanto ao próprio artigo 98, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.112/90, por força do artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/42). Agravo de instrumento conhecido e não provido" (AIRR-582- 24.2018.5.22.0004, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 04/05/2020)." Como se observa, a reclamante possui jornada de 6 horas diárias, das 10h00 às 16h15, com intervalo das 13h00 às 13h30, com lotação na Agência de Barbalha/CE, havendo a indicação ainda de que a jornada é flexível (ID. 53b83c1). Como é cediço, o expediente bancário exige muito das atividades do caixa - função da reclamante - no período da tarde, eis que comumente no horário vespertino as agências bancárias se encontram com intensa movimentação de clientes. Por isso, considerando que obreira labora em Barbalha e a sua filha Maria Isabela dos Santos Miguel é atendida por profissionais em Clínica situada em Juazeiro do Norte, como indicado na declaração emitida pelas médicas (ID. 75b799f), reconheço que a jornada laboral da autora pode prejudicar o tratamento de sua filha. Não obstante a reclamante tenha demonstrado ser inegável que o estado de saúde da criança requer atenção especial e contínua, os fatos delineados nos autos não justificam a redução de metade da jornada de trabalho da obreira, conforme pleiteado em inicial. Sendo assim, não visualizo como razoável a diminuição da carga horária em 50%, como pretende a reclamante, eis que, sendo sua jornada de 6 horas flexível, não é necessário dispor de todo o período da tarde com a finalidade de acompanhamento da menor. Corroborando tal posicionamento, tem-se que o próprio contracheque anexado pela autora referente ao mês de novembro de 2023 (ID. f59e804) consta o desconto de somente R$ 115,64 em razão de atrasos, demonstrando que a jornada não é inviabilizada consideravelmente. Assim, para possibilitar o acompanhamento de sua filha Maria Isabela dos Santos Miguel, reconheço como viável a jornada de 5 horas diárias/25 horas semanais, sem redução de seu salário, por analogia ao previsto no Estatuto do Servidor Público Federal, sendo legítima a aplicação da lei federal, diante do princípio da igualdade substancial, previsto na Constituição Federal e na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência. Isso porque a redução salarial representaria um grave prejuízo para o sustento familiar, com gastos maiores se considerada a condição especial da menor, que demanda cuidados multidisciplinares. Assim, julgo procedente o pedido de redução da carga horária da reclamante de 6 horas diárias/30 horas semanais para 5 horas diárias/25 horas semanais, a fim de acompanhar a menor Maria Isabela dos Santos Miguel, com transtorno do espectro autista, nas terapias necessárias, enquanto durar a necessidade, mediante atestado médico, sem necessidade de compensação e sem prejuízo da remuneração da obreira. Impende esclarecer, desde já, que, considerando a possibilidade de evolução socioeducativa do indivíduo com autismo, com a consequente mitigação da necessidade de atenção integral da genitora, a decisão de redução da jornada poderá ser revisada judicialmente, caso sobrevenha prova concreta de alteração. Concedo a antecipação da tutela requerida pela reclamante, nos moldes do art. 300 do CPC, na modalidade de tutela de urgência para a implementação da redução da carga horária do reclamante para 5 horas diárias/25 horas semanais, sem compensação ou redução da remuneração, no prazo de 8 (oito) dias a partir da intimação da sentença, independentemente do trânsito em julgado e da interposição de outros recursos pela reclamada, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 30.000,00, reversível à parte reclamante." Pois bem. O cerne da questão é a redução de horas trabalhadas da reclamante com a finalidade de tratamento de saúde da sua filha menor de idade diagnosticada com TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. Consoante se observa, figura nos autos vasto acervo probatório a referendar a necessidade de acompanhamento da sua filha nos diversos tratamentos que realiza, sendo imperioso, para o desenvolvimento físico e mental da criança, o comparecimento contínuo e assíduo em tais tratamentos. Impende reconhecer que a atenuação dos efeitos do Transtorno do Espectro Autista da criança é uma exigência para se alcançar a dignidade e o respeito da menor. A dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, associados à função social da propriedade, são princípios que, neste caso, devem ser harmonizados com a necessidade de promover o bem-estar da criança e o apoio familiar indispensável. Em âmbito constitucional, confira o art. 227 da CF/88: "Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão." Exibida a premissa constitucional, temos que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência instrumento internacional ratificado pelo Brasil, fornecem o amparo legal para a adoção de medidas que assegurem aos pais ou responsáveis o direito de acompanhamento de seus dependentes em tratamentos necessários. Nesta premissa, em 2015 emergiu no ordenamento jurídico, no bojo da supracitada legislação, o princípio da adaptação razoável, constante do art. 3º, VI, consagrando que é fundamental, para garantir a inclusão e acessibilidade das pessoas com deficiência, conforme estabelecido pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a adaptação de situações fáticas com o objetivo de propiciar a igualdade de condições e oportunidades a pessoa com deficiência, em manifesta regra decorrente da premissa da proporcionalidade. Confira-se: "Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se: (...) VI - adaptações razoáveis: adaptações, modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que a pessoa com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais; (...)" Como cediço, a premissa supra exige que sejam feitas modificações e ajustes necessários e apropriados, sem impor ônus desproporcional, para assegurar que pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de condições com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Reforçando a premissa, pode-se invocar, também, a aplicação analógica do art. 98 da Lei nº 8112/90, tendo em vista cuidar-se de emprego público, e tendo em conta que inexiste norma proibitiva para os celetistas, mormente se já demonstrada a deficiência da filha da autora, bem como as necessidades e limitações que justificaram a concessão do direito postulado, dispensando-se, inclusive, junta médica. Além disso, sabe-se que o contrato de trabalho celebrado com a reclamada é submetido às disposições da Consolidação das Leis do Trabalho, razão pela qual, a princípio, os preceitos da Lei nº 8.112/90 (art. 98 - concessão de horário especial a servidor público) não se aplicam diretamente. No entanto, essa legislação pode ser aplicada por analogia, sendo fonte de interpretação, dado que faz parte do sistema jurídico em relação aos servidores públicos, sendo o empregado público uma espécie dessa categoria. Nesse sentido, transcreve-se decisão do Supremo Tribunal Federal: "Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. TRATADO EQUIVALENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL. PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORITÁRIA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. LEI 12.764/2012. POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA DA FAMÍLIA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM ALTERAÇÃO NOS VENCIMENTOS. SERVIDORA ESTADUAL CUIDADORA DE FILHO AUTISTA. INEXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. ANALOGIA AO ART. 98, § 3º, DA LEI 8.112/1990. LEGITIMIDADE DA APLICAÇÃO DE LEGISLAÇÃO FEDERAL QUANDO A OMISSÃO ESTADUAL OU MUNICIPAL OFENDE DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL AUTOAPLICÁVEL QUE NÃO ACARRETE AUMENTO DE GASTOS AO ERÁRIO. PRINCÍPIO DA IGUALDADE SUBSTANCIAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL. I - A Carta Política de 1988 fixou a proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, cujas garantias têm sido reiteradamente positivadas em nossa legislação, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990) e da promulgação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Decreto 99.170/1990). II - A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, no § 2º do art. 1º da Lei 12.764/2012, estipulou que eles são considerados pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais. Assim, é incontestável que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência aplicam-se também a eles. III - A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) foi assinada pelo Brasil e, por ter sido aprovada de acordo com os ritos previstos no art. 5º, § 3º da Constituição Federal de 1988, suas regras são equivalentes a emendas constitucionais, o que reforça o compromisso internacional assumido pelo País na defesa dos direitos e garantias das pessoas com deficiência. IV - A CDPD tem como princípio geral o "respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade" (art. 3º, h) e determina que, nas ações relativas àquelas com deficiência, o superior interesse dela receberá consideração primordial (art. 7º, 2). V No Preâmbulo (item X), o Tratado é claro ao estabelecer que a família, núcleo natural e fundamental da sociedade, tem o direito de receber não apenas a proteção de todos, mas também a assistência necessária para torná-la capaz de contribuir para o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência. VI - Os Estados signatários obrigam-se a "adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção" (art. 4º, a). VII - A omissão do Poder Público, portanto, não pode justificar afronta às diretrizes e garantias constitucionais. Assim, a inexistência de lei estadual específica que preveja a redução da jornada de servidores públicos que tenham filhos com deficiência, sem redução de vencimentos, não serve de escusa para impedir que seja reconhecido a elas e aos seus genitores o direito à dignidade da pessoa humana e o direito à saúde. VIII - A convivência e acompanhamento familiar para o desenvolvimento e a inclusão das pessoas com deficiência são garantidos pelas normas constitucionais, internacionais e infraconstitucionais, portanto, deve-se aplicar o melhor direito em favor da pessoa com deficiência e de seus cuidadores. IX - O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que é legítima a aplicação da Lei 8.112/1990 nos casos em que a legislação estatal e municipal for omissa em relação à determinação constitucional autoaplicável que não gere aumento ao erário. Precedentes. X - Tendo em vista o princípio da igualdade substancial, previsto tanto em nossa Carta Constitucional quanto na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, se os servidores públicos federais, pais ou cuidadores legais de pessoas com deficiência têm o direito a horário especial, sem a necessidade de compensação de horário e sem redução de vencimentos, os servidores públicos estaduais e municipais em situações análogas também devem ter a mesma prerrogativa. XI - Recurso extraordinário a que se dá provimento. Fixação de tese: "Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2º e § 3º, da Lei 8.112/1990"." (STF - RE: 1237867 SP, Relator: RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 17/12/2022, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-003 DIVULG 11 01-2023 PUBLIC 12-01-2023) Colhe-se, também, arestos do C. Tribunal Superior do Trabalho: "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM A DIMINUIÇÃO DA REMUNERAÇÃO. EMPREGADA COM FILHO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA . A presente discussão ainda não foi objeto de pacificação no âmbito desta Corte, o que configura a transcendência jurídica da matéria em debate. Todavia, no caso, o Regional ratificou o entendimento adotado na sentença, no sentido de que a Autora, que possui filho com transtorno do espectro autista (TEA), faz jus à jornada reduzida, sem que isso implique diminuição da respectiva remuneração. Apoiou-se, para tanto, nos postulados da dignidade da pessoa humana e no da proteção à criança e ao adolescente, nos termos do disposto nos artigos 1º, III, e 227 da Constituição Federal, bem como no artigo 7º da Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência. Este Tribunal vem decidindo que o empregado com filho portador de deficiência tem direito à redução da jornada, sem a correspondente diminuição da remuneração, de maneira a possibilitar a assistência necessária ao dependente. E a solução da controvérsia neste sentido atrai também a incidência dos princípios da solidariedade e da função social da empresa, inscritos no caput e no inciso III do art. 170 da Carta Política de 1988, os quais dispõem, no caso examinado, que o interesse patrimonial do empregador deve atuar em conformidade com o postulado maior da dignidade da pessoa humana. Logo, não se configura a ofensa ao art. 5º, II, da Constituição Federal. Julgados desta Corte. Não afastados, pois, os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação." (TST - Ag-AIRR: 00006831220195170151, Relator: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 16 /11/2022, 5ª Turma, Data de Publicação: 25/11/2022) "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. JORNADA DE TRABALHO. REDUÇÃO PARA CUIDADO DE FILHO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA (AUTISMO). EMPREGADO PÚBLICO. ANALOGIA. ART. 98, § 3º, DA LEI 8.112/90. Demonstrada possível violação dos arts. 227 e 229 da Constituição Federal, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. II RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. JORNADA DE TRABALHO. REDUÇÃO PARA CUIDADO DE FILHO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA (AUTISMO). EMPREGADO PÚBLICO. ANALOGIA. ART. 98, § 3º, DA LEI 8.112/90. Esta Corte tem admitido a redução de jornada de empregado público com dependente com deficiência sem alteração remuneratória e sem compensação de horário, a depender da especificidade do caso, não se tratando de uma decisão generalizável. No particular, entendo que há provas suficientes da necessidade de atenção especial a essa criança portadora de autismo. Recurso de revista conhecido e provido." (TST - RR: 13726820195220005, Relator: Delaide Alves Miranda Arantes, Data de Julgamento: 06 /04/2022, 8ª Turma, Data de Publicação: 22/04/2022) "AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. EMPRESA DE ECONOMIA MISTA. DEPENDENTE PORTADOR DE TRANSTORNO ESPECTRO AUTISTA (TEA). REDUÇÃO DE JORNADA DE TRABALHO SEM REDUÇÃO DO SALÁRIO OU NECESSIDADE DE COMPENSAÇÃO - POSSIBILIDADE. De acordo com definição extraída de site oficial do Governo Federal, "O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interacão social, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades". Consta, ainda, a informação de que "o tratamento oportuno com estimulação precoce deve ser preconizado em qualquer caso de suspeita de TEA ou desenvolvimento atípico da criança, independentemente de confirmação diagnóstica"(). Por sua vez, nos termos do § 2º do art. 1º da Lei nº 12.764/2012, que dispõe sobre a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, "A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais". Assim sendo, cabe enfatizar que a Constituição Federal estabelece inúmeras diretrizes e normas destinadas à proteção da pessoa com deficiência, com "absoluta prioridade" à criança e ao adolescente, a teor do seu art. 227, § 1º, II, juntamente com o Decreto nº 6.949/09, que introduziu, no ordenamento jurídico brasileiro, a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, com o status de emenda constitucional (art. 5º, § 3º, da CF/88). Nesse contexto, não merece reparos a decisão regional que reduz a jornada de trabalho da reclamante com dependente portadora de transtorno do espectro autista, sem redução de salário ou necessidade de compensação de jornada. Precedentes no mesmo sentido. Agravo interno a que se nega provimento." ( TST - Ag-AIRR: 00006915920215170008, Relator: Liana Chaib, Data de Julgamento: 29 /03/2023, 2ª Turma, Data de Publicação: 31/03/2023) Cita-se, ainda, a jurisprudência deste Egrégio Regional: "RECURSO ORDINÁRIO. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA SEM DIMINUIÇÃO DE SALÁRIO/COMPENSAÇÃO. EMPREGADO PÚBLICO. FILHO PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. POSSIBILIDADE. A fundamentação lançada no decisum vergastado está alinhada com a jurisprudência pátria, em especial, a desta Corte e a do Tribunal Superior do Trabalho, a qual vem se posicionando favoravelmente à redução da jornada de trabalho de empregado celetista, por aplicação analógica, da norma inserta no artigo 98, §§ 2º e 3º, da Lei 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, valendo-se da integração normativa, consoante previsão do artigo 4º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, ante a flagrante lacuna do microssistema jurídico de proteção ao empregado, omisso em amparar a especial condição familiar e social que aflige trabalhadores, pais e/ou mães de crianças que necessitam de assistência multiespecializada (fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e neurologista) e, por essa razão, demandam de seus tutores/curadores disponibilidade extraordinária de tempo para os cuidados arraigados à situação. Recurso ordinário conhecido e desprovido." (TRT da 7ª Região; Processo: 0000946-46.2023.5.07.0001; Data de assinatura: 09-08-2024; Órgão Julgador: Gab. Des. Plauto Carneiro Porto - 1ª Turma; Relator(a): PLAUTO CARNEIRO PORTO) "PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. REJEIÇÃO. No caso dos autos, percebe-se que, embora se fundamente por analogia no art. 98, § 3º, da lei nº 8.112/90, o pleito contido na presente ação trabalhista contempla matéria de cunho tipicamente trabalhista (jornada de trabalho), não se enquadrando, portanto, na tese fixada no Tema nº 1.143: "A Justiça Comum é competente para julgar ação ajuizada por servidor celetista contra o Poder Público, em que se pleiteia parcela de natureza administrativa". Nesse contexto, não há como afastar a competência material da Justiça do Trabalho para processar e julgar o presente feito. Diante do exposto, rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho. EMPREGADA PÚBLICA. REGIME CELETISTA. REDUÇÃO DA JORNADA SEMANAL DE 36H PARA 24H SEM PREJUÍZO DA REMUNERAÇÃO. IMPERIOSA NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO DO FILHO MENOR DE IDADE COM DIAGNÓSTICO DE "ESPECTRO AUTISTA". APLICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA ATUAL E ITERATIVA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. OBSERVÂNCIA DA MÁXIMA EFETIVIDADE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA IGUALDADE, DA NÃO DISCRIMINAÇÃO E DA DIGNIDADE DA PESSOAL HUMANA. DEFERIMENTO DO PEDIDO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA. Examinando os fatos e provas dos autos por força da devolução recursal, constata-se que a sentença recorrida apreciou o pleito autoral com singular proficuidade, julgando procedente o pedido de redução da jornada laboral com base em análise minuciosa dos aspectos legais, constitucionais e jurisprudenciais suscitados pelas partes, em especial o relevante posicionamento jurisdicional do Tribunal Superior do Trabalho acerca da máxima efetividade dos princípios constitucionais da igualdade, da não discriminação e da dignidade da pessoa humana, com ressonância em normas internacionais sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da qual a República Federativa do Brasil é signatária, de modo a conferir à genitora o direito de adaptação razoável da jornada de trabalho para possibilitar-lhe o necessário e imprescindível acompanhamento nas terapias do filho menor com diagnóstico de "Espectro Autista". Portanto, tratando-se de recurso ordinário em procedimento sumaríssimo, constatado que as matérias devolvidas a exame resultaram suficiente e satisfatoriamente analisadas na origem, com fundamentação erigida nos aspectos fáticos e jurídicos pertinentes ao caso, em harmonia com a legislação e jurisprudência pátrias, em especial os arestos do TST acerca de casos similares, a sentença recorrida há de ser mantida pelos próprios fundamentos, nos termos do artigo 895, § 1º, IV, da CLT, com redação dada pela Lei nº 9.957/2000, com reforço da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho transcrita na fundamentação como razões de decidir. Recurso patronal não provido. JUSTIÇA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. A declaração de miserabilidade pode ser efetuada a qualquer tempo e através de procurador na própria petição inicial, desde que munido de poderes especiais para tal finalidade, conforme súmula 463 do TST. De outra banda, a parte recorrente não trouxe ao feito nenhum elemento ou prova capaz de anular a declaração, conforme exigido no § 2º do art. 99 CPC/2015, acima transcrito, razão pela qual se mantém a sentença de origem no aspecto." (TRT da 7ª Região; Processo: 0000040-74.2024.5.07.0016; Data de assinatura: 05-06-2024; Órgão Julgador: Gab. Des. Emmanuel Teófilo Furtado - 2ª Turma; Relator(a): EMMANUEL TEOFILO FURTADO) "RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. JUSTIÇA GRATUITA INDEFERIDA. CONCESSÃO DE PRAZO PARA O RECOLHIMENTO DO PREPARO. DECURSO DO PRAZO SEM CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO. DESERÇÃO. A reclamada/recorrente não apresentou preparo recursal, entendendo gozar das prerrogativas da Fazenda Pública. Todavia, na esteira do entendimento do Colendo Tribunal Superior do Trabalho (C. TST), a ela se aplica o regramento das empresas privadas, nos termos do inciso II do § 1º do art. 173 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), não sendo, portanto, beneficiária das prerrogativas da Fazenda Pública. Nesse contexto, foi devidamente notificada para o recolhimento do depósito recursal e pagamento das custas processuais, sob pena de deserção do recurso. Entretanto, a empresa pública demandada apenas comprovou o pagamento das custas processuais, não sendo apresentado a prova do recolhimento do depósito recursal. Dessa maneira, transcorrido o prazo sem o cumprimento integral da obrigação, reputa-se não cumprido o requisito extrínseco de admissibilidade recursal relativo ao preparo, estando o recurso deserto. Recurso Ordinário não conhecido. RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA SEMANAL PARA ACOMPANHAMENTO DO TRATAMENTO DE FILHO MENOR COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). PROTEÇÃO À CRIANÇA. DIREITO CONSTITUCIONALMENTE PREVISTO. INDEVIDA A DESIGNAÇÃO DE JUNTA MULTIPROFISSIONAL PELA PRÓPRIA RECLAMADA PARA ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA. É inegável que a reclamante, ora recorrente, faça jus ao direito de ter reduzida a sua carga horária semanal de trabalho, de modo a possibilitar o integral acompanhamento do seu filho aos diversos profissionais da área de saúde, tudo com o fim de minimizar os efeitos do Transtorno de Espectro Autista que o acomete, nos exatos termos em que fora decidido pelo Juízo de Origem. Além disso, a moléstia informada ainda não tem cura definitiva, mas apenas evolução de melhora do comportamento de quem por ele é acometido. Desse modo, o que se faz necessário para manutenção do direito da obreira à redução da jornada, é um regular acompanhamento por profissionais habilitados e a apresentação, ao empregador, de laudos revelando a necessidade da continuidade do tratamento do transtorno. Assim, reforma-se parcialmente a Sentença do Juízo a quo para excluir a necessidade de acompanhamento anual da criança por junta multiprofissional estipulada pela própria empresa, mantendo-se a decisão nos demais termos. Porém, impõe-se à obreira a obrigação de apresentar ao seu empregador, a cada seis meses, laudos médicos, demonstrando a necessidade de manutenção do tratamento e a efetiva realização deste. Recurso Ordinário parcialmente provido." (TRT da 7ª Região; Processo: 0000732-44.2022.5.07.0016; Data de assinatura: 10-04-2023; Órgão Julgador: Gab. Des. Clóvis Valença Alves Filho - 3ª Turma; Relator(a): CLÓVIS VALENÇA ALVES FILHO) "RECURSO ORDINÁRIO. EMPRESA PÚBLICA. TRABALHADOR COM DEPENDENTE DEFICIENTE. REDUÇÃO DE JORNADA. ART. 98, §§2º E 3º DA LEI 8.112/90. POSSIBILIDADE. Ante a carência de legislação específica, reputa-se aplicável, por analogia, o art. 98, §§ 2º e 3º da Lei 8.112/90 ao empregado de empresa pública que comprova possuir dependente (filha menor) com deficiência que necessita de premente e constante de acompanhamento por vários profissionais das áreas psiquiátrica, psicológica e motora. Recurso conhecido e não provido." (TRT7 -RO 0000944-16.2018.5.07.0013. Relatora: Regina Glaucia Cavalcante Nepomuceno. |Incluído em: 05jun.2019|Publicado em: 10jun.2019) "RECURSO ORDINÁRIO EM PROCESSO SUBMETIDO AO RITO SUMARÍSSIMO. EMPREGADO(A) DE EMPRESA PÚBLICA. FILHO(A) PORTADOR(A) DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). DIREITO À REDUÇÃO DE JORNADA SEM COMPENSAÇÃO DE HORÁRIO E SEM REDUÇÃO DA REMUNERAÇÃO. ART. 98, §§2º E 3º, DA LEI 8.112/1990, COM REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI Nº13.370/2016. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, EM RELAÇÃO AOS EMPREGADOS DE EMPRESA PÚBLICA. Na forma do parágrafo segundo, do art. 98, da Lei nº 8.112/1990, "[...] será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário."; esse benefício, nos termos do parágrafo terceiro, do mesmo dispositivo legal, será extensivo "ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência. (Redação dada pela Lei nº 13.370, de 2016)" DEVERES ESTATAIS E DA SOCIEDADE EM RELAÇÃO À PROTEÇÃO DA CRIANÇA. ARTIGO 227 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)" O dispositivo constitucional em epígrafe, por si só, sem dúvida, deveria conduzir o Estado-juiz a decidir as causas que envolvam interesses de crianças, sobretudo quando acometidas de doenças graves ou incuráveis, a encontrar soluções criativas capazes de suplantar os vazios legislativos que impedem a fruição de direitos que a lógica, a razão e o bom senso, há muito, decidiram reconhecer como único meio de por em prática o ideal de justiça." (TRT7 - RO- 0001010 32.2018.5.07.0001. Relator: Durval César de Vasconcelos Maia. |Incluído em: 17jul. 2019|Publicado em: 18 jul.2019) Nesse contexto, mantém-se a sentença que deferiu o pedido de redução da carga horária da reclamante, a fim de acompanhar a sua filha menor de idade, Maria Isabela dos Santos Miguel, com transtorno do espectro autista, nas terapias necessárias, enquanto durar a necessidade, mediante atestado médico, sem necessidade de compensação e sem prejuízo da remuneração da obreira. Recurso da reclamada improvido. 2. RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE (...) 2.2. MÉRITO 2.2.1. QUANTIDADE DE HORAS REDUZIDAS NA CARGA HORÁRIA DA EMPREGADA Em seu arrazoado, a reclamante argumenta que a redução de 1 (uma) hora diária na sua jornada de trabalho, conforme decidido na sentença, é insuficiente para o deslocamento entre o local de trabalho, sua residência e as clínicas, visto que labora na agência da Caixa Econômica Federal da cidade de Barbalha-CE, enquanto as clínicas, não quais são realizadas as consultas/terapias, se localizam em Juazeiro do Norte-CE, cidade onde reside com suas filhas. Aduz, ainda, o seguinte: "As sessões de terapia, ademais, ocorrem sempre no período da tarde, variando o horário de acordo com a disponibilidade da profissional, tendo as sessões duração média de 50 a 60 minutos. Não fosse suficiente, o tratamento não se limita apenas às terapias multidisciplinares necessárias ao desenvolvimento social e à saúde da criança realizadas por profissionais, mas também se estende as atividades realizadas no âmbito residencial, necessitando de uma maior convivência com a mãe. É importante ter em mente que a recorrente realiza tudo sozinha, vez que, como restou documentalmente provado, o genitor da criança labora em estado diverso da federação, não tendo condições de se deslocar para acompanhar a filha e não é possível atribuir /transferir tal responsabilidade a terceiros, vez que a maternidade é uma responsabilidade intrínseca à própria mãe, de natureza única, necessitando de sua ampla atenção, especialmente em casos como o presente, em que se trata do cuidado de uma criança portadora de TEA." Assim, pugna a recorrente pela reforma da sentença, para determinar que a recorrida proceda à redução da sua jornada diária em 50% (cinquenta por cento), na frequência de 05 (cinco) dias na semana. Subsidiariamente, requer a redução da carga horária por, pelo menos, 2 (duas) horas diárias. Analisa-se. Como se vê na sentença, o Juízo "a quo" determinou a redução da carga horária da reclamante de 6 horas diárias/30 horas semanais para 5 horas diárias/25 horas semanais (segunda a sexta-feira), a fim de acompanhar a sua filha, com transtorno do espectro autista, nas terapias, o que enseja redução de 1 (uma) hora por dia na jornada de trabalho da empregada. Contudo, observa-se, do conjunto probatório dos autos, que a redução de 1 (uma) hora na jornada diária da reclamante não é suficiente para a realização dos tratamentos indicados ao caso da menor com transtorno do espectro autista, que tem apenas 3 anos e 8 meses de idade. Com efeito, no laudo médico de Id. 84fc774, a médica neurologista consignou que a criança apresenta alterações comportamentais como atraso de linguagem, dificuldade de interação social, comportamento estereotipado, alterações sensoriais e limiar reduzido a frustrações. Outrossim, prescreveu as condutas terapêuticas necessárias à reabilitação global e promoção do bem estar da criança, que exigem a participação contínua dos pais, dos familiares e de uma equipe profissional multidisciplinar (médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos e pedagogos). Vejam-se as condutas indicadas pela médica: "CONDUTA: - MÉDICO: Acompanhamento com médico especialista e reavaliações a cada 6 meses. - EQUIPE DE TERAPEUTAS: Tratamento com equipe multiprofissional composta por Psicólogo 2X por semana - Estímulo social / habilitado em ABA Fonoaudiólogo 3X por semana - Estímulo de fala e linguagem Terapia ocupacional 1x semana - integração sensorial de Ayres e estímulo de habilidades motoras. * Esta equipe deverá elaborar e aplicar um Plano Terapêutico Individualizado (PTI). - FAMÍLIA: Treinamento parental e suporte familiar intensificado em tempo e qualidade, de ambos os pais, para aplicação de estratégias comportamentais na rotina de vida diária como parte do tratamento. - ESCOLA: Matrícula em instituição de ensino e medidas de adaptação/inclusão escolar, incluindo a presença de acompanhante terapêutico ou acompanhante pedagógico. - SOCIEDADE: Qualquer outro benefício cabível, conforme especificações da legislação brasileira atual." Consta, também, nos autos (Id. 75b799f), uma declaração da Clínica Integrar, assinada pela Terapeuta Ocupacional e pela Fonoaudióloga que acompanham a criança, na qual atestam a necessidade constante da presença da genitora durante as terapias. Veja-se: "Declaro, para todos os fins e a quem possa interessar que a menor MARIA ISABELA DOS SANTOS MIGUEL apresenta diagnóstico médico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) e encontra-se em acompanhamento Multidisciplinar com a profissional Sílvia Marta Dantas de Morais Lemos, fonoaudióloga CREFONO: 9739 e com a profissional Elisângela Rodrigues de Matos Firmino, Terapeuta Ocupacional CREFITO: 7454, todos os dias da semana. Maria Isabela Dos Santos Miguel, apresenta dificuldades nas habilidades de linguagem, socialização e comportamento. Faz-se necessária a presença da genitora FRANCISCA TATHYANA DOS SANTOS, durante as intervenções para acompanhá-la no setting terapêutico, bem como para aprender as abordagens utilizadas pelos profissionais e poder dar continuidade ao tratamento na dinâmica familiar, para evolução do quadro clínico da criança. Por ser expressão da verdade, assino a presente." Impende, ainda, registrar que a reclamante não conta com o auxílio do seu esposo, devido ao fato de este ser servidor público, lotado na cidade de Salgueiro-PE, com jornada de 40 horas semanais (doc. Id. 06fdf63). Do exposto, pois, constata-se que a redução de 1 (uma) hora na carga horária não é suficiente para a reclamante promover os cuidados diários da sua filha e acompanhar os tratamentos/terapias, enfim, dar a atenção especial que uma pessoa com transtorno do espectro autista necessita, mormente quando se trata de uma criança de apenas 3 anos e 8 meses de idade, completamente dependente da mãe, sendo a reforma da sentença, portanto, medida que se impõe. Todavia, não se acolhe o pedido principal da autora, ora recorrente, mas sim o pedido subsidiário, no sentido de reduzir a sua carga horária de 6 horas diárias/30 horas semanais para 4 horas diárias/20 horas semanais (redução de 2 horas diárias) sem compensação das horas não trabalhadas e sem prejuízo da remuneração, por constituir medida razoável para atender as necessidades do caso concreto, sem comprometer significativamente as atividades laborais da empregada pública. Mantém-se a sentença que, "considerando a possibilidade de evolução socioeducativa do indivíduo com autismo, com a consequente mitigação da necessidade de atenção integral da genitora", consignou a possibilidade de ser revisada judicialmente a decisão caso sobrevenha prova concreta de alteração. Mantida, outrossim, a decisão de primeira instância no ponto em que concedeu a antecipação dos efeitos da tutela. Recurso provido nesse tocante." Nesse ponto, não merece amparo o apelo. 2.2.3. OMISSÃO QUANTO À APLICABILIDADE DA LEI N° 14.457/2022 Alega a embargante omissão quanto à aplicabilidade do art. 8º, I, da Lei nº 14.457/2022, c/c art. 58-A, da CLT, que prevê a priorização em regime de tempo parcial para empregados celetistas que têm filhos com deficiência, com adequação salarial proporcional à redução da jornada. Nesse ponto, verifica-se a omissão apontada, que passa-se a suprir, mas sem modificar o acórdão embargado. No recurso ordinário, a Caixa Econômica Federal alega, em síntese, o seguinte: "Com o advento da Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres e alterou dispositivos a CLT, introduziu na ordem jurídica trabalhista as disposições para o atendimento de necessidades parentais de empregados e empregadas com filho, enteado ou pessoa sob guarda judicial com necessidades especiais. (...) Portanto, a partir da edição da Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022, o empregado celetista passou a contar com regramento jurídico específico sobre o apoio ao exercício da parentalidade em casos de necessidades especiais, conforme dispositivos acima transcritos, devendo essa ser adotada para os casos de empregados celetistas, quer públicos, quer privados, porque o regime de direito da CAIXA é o privado, ex vi art. 173 da Constituição Federal. Desse modo, tem-se que é manifestamente inadmissível a aplicação do art. 98, § 3º da Lei nº 8.112/90 (Estatuto do Servidor Público Federal) para os empregados desta empresa pública federal, posto que submetidos ao regime da CLT. Se assim não fosse, sequer haveria competência desta Justiça Especializada para apreciar a presente demanda. Aqui não se aplica o decidido no tema 1.097 pelo Supremo Tribunal Federal, porque na CAIXA não há servidores públicos e sim empregados públicos. (...) Nessa toada, não há que se falar na aplicação da analogia ou equidade para o julgamento do presente caso, por força do art. 8º da CLT, uma vez que há, no âmbito do direito do trabalho, disposição legal específica quanto à matéria. (...) Assim, do que dispõe a Lei nº 14.457/2022, c/c a CLT, art. 58-A, verifica-se que tal regramento não contempla hipótese de jornada reduzida sem a correspondente adequação proporcional de salário ou compensação de jornada. O que demonstra a manifesta improcedência do pedido." A reclamada pretende, pois, que, no caso de acolhimento do pedido autoral, aplique-se o disposto na Lei nº 14.457/2022 c/c o art. 58-A, da CLT, no sentido de reduzir a jornada da reclamante com redução proporcional da remuneração ou compensação das horas não trabalhadas. Assim dispõe o art. 8º, incisos I e II, da citada lei: "CAPÍTULO III DO APOIO À PARENTALIDADE POR MEIO DA FLEXIBILIZAÇÃO DO REGIME DE TRABALHO [...] Seção II Da Flexibilização do Regime de Trabalho e das Férias Art. 8º No âmbito dos poderes diretivo e gerencial dos empregadores, e considerada a vontade expressa dos empregados e das empregadas, haverá priorização na concessão de uma ou mais das seguintes medidas de flexibilização da jornada de trabalho aos empregados e às empregadas que tenham filho, enteado ou pessoa sob sua guarda com até 6 (seis) anos de idade ou com deficiência, com vistas a promover a conciliação entre o trabalho e a parentalidade: I - regime de tempo parcial, nos termos do art. 58-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; II - regime especial de compensação de jornada de trabalho por meio de banco de horas, nos termos do art. 59 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; [...]" O art. 58-A, § 1º, da CLT, mencionado na norma supra, dispõe que "O salário a ser pago aos empregados sob o regime de tempo parcial será proporcional à sua jornada, em relação aos empregados que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)". Indubitavelmente, é louvável a preocupação legislativa em assegurar a flexibilização da jornada àqueles trabalhadores/trabalhadoras responsáveis por crianças de até seis anos de idade ou com deficiência. Todavia, o fato de a citada Lei nº 14.457/2022 ser direcionada ao empregado celetista, por si só, não é suficiente para obstar o direito da autora à redução da jornada, sem compensação das horas não trabalhadas e sem diminuição da remuneração, como deferido no acórdão vergastado, por constituir medida razoável para possibilitar o acompanhamento efetivo da criança com transtorno do espectro autista, sem prejudicar o seu sustento e o custeio do amplo tratamento multidisciplinar que necessita. Com efeito, o ordenamento trabalhista não pode ser visto de maneira estanque, e sim interpretado e aplicado em conjugação indissociável com os princípios constitucionais, como consignado no acórdão embargado, "in verbis": "(...) Impende reconhecer que a atenuação dos efeitos do Transtorno do Espectro Autista da criança é uma exigência para se alcançar a dignidade e o respeito da menor. A dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, associados à função social da propriedade, são princípios que, neste caso, devem ser harmonizados com a necessidade de promover o bem-estar da criança e o apoio familiar indispensável. Em âmbito constitucional, confira o art. 227 da CF/88: "Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão." Exibida a premissa constitucional, temos que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência instrumento internacional ratificado pelo Brasil, fornecem o amparo legal para a adoção de medidas que assegurem aos pais ou responsáveis o direito de acompanhamento de seus dependentes em tratamentos necessários. Nesta premissa, em 2015 emergiu no ordenamento jurídico, no bojo da supracitada legislação, o princípio da adaptação razoável, constante do art. 3º, VI, consagrando que é fundamental, para garantir a inclusão e acessibilidade das pessoas com deficiência, conforme estabelecido pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a adaptação de situações fáticas com o objetivo de propiciar a igualdade de condições e oportunidades à pessoa com deficiência, em manifesta regra decorrente da premissa da proporcionalidade. Confira-se: "Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se: (...) VI - adaptações razoáveis: adaptações, modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que a pessoa com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais; (...)" Como cediço, a premissa supra exige que sejam feitas modificações e ajustes necessários e apropriados, sem impor ônus desproporcional, para assegurar que pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de condições com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Reforçando a premissa, pode-se invocar, também, a aplicação analógica do art. 98 da Lei nº 8112/90, tendo em vista cuidar-se de emprego público, e tendo em conta que inexiste norma proibitiva para os celetistas, mormente se já demonstrada a deficiência da filha da autora, bem como as necessidades e limitações que justificaram a concessão do direito postulado, dispensando-se, inclusive, junta médica. Além disso, sabe-se que o contrato de trabalho celebrado com a reclamada é submetido às disposições da Consolidação das Leis do Trabalho, razão pela qual, a princípio, os preceitos da Lei nº 8.112/90 (art. 98 - concessão de horário especial a servidor público) não se aplicam diretamente. No entanto, essa legislação pode ser aplicada por analogia, sendo fonte de interpretação, dado que faz parte do sistema jurídico em relação aos servidores públicos, sendo o empregado público uma espécie dessa categoria." Nesse sentido, transcreve-se jurisprudência em que o C. Tribunal Superior do Trabalho firmou entendimento de que "nenhuma das medidas exemplificadas no art. 8º da Lei 14.457/2022 (Programa Emprega + Mulheres) é adequada ou suficiente, uma vez que envolvem redução de salário ou, ainda que em dias específicos, aumento da jornada de trabalho", utilizando, como um dos fundamentos, os princípios da igualdade substancial e da adaptação razoável. Confira-se: "I - RECURSO DE REVISTA DA AUTORA. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM A DIMINUIÇÃO PROPORCIONAL DA REMUNERAÇÃO. EMPREGADA MÃE DE FILHAS GÊMEAS NO ESPECTRO AUTISTA. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - DA IGUALDADE MATERIAL E DA ADAPTAÇÃO RAZOÁVEL . APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. EXTENSÃO DO DIREITO AO CUIDADOR. PONDERAÇÃO DOS INTERESSES EM CONFLITO. THE COST OF CARING . TRANSCENDÊNCIA SOCIAL RECONHECIDA. 1. A controvérsia diz respeito à possibilidade de redução da jornada de trabalho da empregada, mãe de filhas gêmeas com deficiência (espectro autista), sem a correspondente diminuição de sua remuneração. A causa tem transcendência social, na forma do art . 896-A, § 1º, III, da CLT. 2. A Constituição Federal de 1988 consagrou a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho como fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III e IV) . O poder constituinte originário erigiu a construção de uma sociedade justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceito ou discriminação, ao status de objetivos fundamentais do Estado brasileiro (art. 3º, I e IV). Os direitos humanos foram alçados ao patamar de princípio norteador das relações externas, com repercussão ou absorção formal no plano interno (art. 4º, II; art . 5º, §§ 2º e art. 3º). 3. O Estado Democrático de Direito recepcionou o modelo de igualdade do Estado Social, em que a intervenção estatal, por meio de medidas positivas coercitivas ou incentivatórias, prevê meios destinados ao tratamento das desigualdades com igual valor, na busca da igualdade material, de forma a garantir a dignidade da pessoa humana . 4. A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU (CDPD), incorporada ao ordenamento nacional com o status de emenda à Constituição (art. 5º, § 3º), estabelece como princípio o respeito pela diferença e a igualdade de oportunidades. Trata, ainda, das adaptações razoáveis, que são as "modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais" . De acordo com o art. 2 da CDPD, a recusa à adaptação razoável é considerada forma de discriminação. 5. É necessário reconhecer que os cuidadores, especialmente enquanto o titular da deficiência não possui a capacidade plena, assumem para si grande parte do ônus acarretado pela deficiência de outrem, como se eles próprios compartilhassem da deficiência (The Cost of Caring) . 6. A Convenção 156 da OIT obriga os países signatários ao estabelecimento de uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento em relação aos pais que possuem responsabilidades com relação a seus filhos dependentes, quando estas responsabilidades restringem a possibilidade de se prepararem para uma atividade econômica e nela ingressar, participar ou progredir. Embora o Brasil não seja signatário da referida convenção, suas disposições servem de fonte subsidiária do Direito, conforme art. 8º da CLT, e devem orientar o Estado . 7. No caso concreto, a empregada é mãe de duas crianças, gêmeas, que estão no espectro autista, em grau moderado a severo, e que, por esse motivo, necessitam de acompanhamento médico, fonoaudiólogo, e psicopedagógico. Essa situação impõe ônus excessivo à mãe, que, além de dispensar grande parcela de seu tempo com o cuidado, também emprega significativa parte de sua remuneração com as crianças. 8 . Nesse contexto, a autora pretende a aplicação analógica do disposto no art. 98, § 3º, da Lei 8.112/1990, que assegura a concessão de horário especial ao servidor ou à servidora que possui cônjuge, filho ou dependente com deficiência, sem prejuízo do salário e sem a necessidade de compensação de horário. 9 . À primeira vista, a Lei 14.457/2022 (Programa Emprega + Mulheres) parece ser mais específica ao caso concreto, visto que estabelece regras gerais de flexibilização do regime de trabalho para empregados que tenham filho, enteado ou pessoa sob sua guarda com deficiência, independentemente da idade (art. 8º). Entretanto, além de a lista de medidas indicada na referida lei não ser exaustiva, todas as normas infraconstitucionais relacionadas a pessoas com deficiência devem ser interpretadas à luz das regras específicas sobre a matéria, em especial a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU (CDPD) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13 .146/2015). 10. O art. 7 .2 da CDPD estabelece que "todas as ações relativas às crianças com deficiência, o superior interesse da criança receberá consideração primordial". Além disso, o art. 8º da Lei 13.146/2015 atribui o dever de efetivação dos direitos das pessoas com deficiência ao Estado, à família e à sociedade . Tal dever, evidentemente, inclui as empresas, cuja função social é reconhecida no art. 170 da Constituição Federal. 11. Na hipótese, a observância do "superior interesse da criança com deficiência" demanda solução que compatibilize os seguintes elementos: a) manutenção do patamar remuneratório da mãe (empregada da empresa), até mesmo para fins de custeio de terapias e tratamentos recomendados para as crianças; b) redução da jornada de trabalho para acompanhamento das filhas, que estão no espectro autista . 12. Nesse contexto, nenhuma das medidas exemplificadas no art. 8º da Lei 14.457/2022 (Programa Emprega + Mulheres) é adequada ou suficiente, uma vez que envolvem redução de salário ou, ainda que em dias específicos, aumento da jornada de trabalho . 13. Por outro lado, a solução prevista pelo art. 98, § 2º e § 3º, da Lei 8.112/1990 atende perfeitamente à hipótese dos autos . 14. Se o dependente de servidor federal possui tal prerrogativa, entende-se que os filhos de empregados, regidos pela CLT, devem desfrutar de direito semelhante. Pessoas em situações análogas não podem ser tratadas de forma absolutamente desigual, sob pena de violação do princípio da igualdade substancial. 15 . A propósito, ressalta-se que o Supremo Tribunal Federal já estendeu as referidas regras a relações de trabalho que não são regidas pela Lei 8.112/1990. Nos autos do RE 1237867, Tema 1097 da tabela de repercussão geral, a Corte fixou a seguinte tese: "Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2º e § 3º, da Lei 8 .112/1990". Na fundamentação do precedente do STF, mencionou-se expressamente a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, a proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e a proteção e assistência da família de pessoas com deficiência. 16. Por fim, ressalta-se que no polo passivo da lide consta uma das maiores instituições bancárias do país, de modo que o ônus a ser suportado pelo empregador é razoável diante do benefício social que o procedimento trará para as crianças com deficiência . Recurso de revista conhecido por violação dos art. 227 da Constituição Federal e provido. II - RECURSO DE REVISTA ADESIVO DA EMPRESA. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM A DIMINUIÇÃO PROPORCIONAL DA REMUNERAÇÃO . EMPREGADA MÃE DE FILHAS GÊMEAS NO ESPECTRO AUTISTA. 17. A empresa se insurge contra o acórdão do TRT que deferiu à autora a redução da jornada de trabalho, com a proporcional diminuição de sua remuneração. 18 . Considerando a identidade de matérias, remete-se à fundamentação adotada quando do exame do recurso de revista da autora, no qual, com base nos princípios da igualdade substancial e a adaptação razoável, concluiu-se por seu direito à redução da jornada de trabalho, sem a correspondente redução remuneratória. Recurso de revista adesivo não conhecido." (TST - RR: 0020253-08.2018 .5.04.0821, Relator.: Alexandre De Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 29/11/2023, 7ª Turma, Data de Publicação: 07/12/2023) Assim, resta suprida a omissão apontada, mas sem alteração no resultado do acórdão embargado. CONCLUSÃO DO VOTO VOTO por conhecer dos embargos de declaração opostos pela reclamante e pela reclamada; no mérito, dar provimento ao apelo da reclamante, para determinar que os honorários advocatícios, a cargo da reclamada, sejam calculados à base de 15% sobre o valor atualizado da causa (art. 791-A, caput, da CLT); e dar parcial provimento ao apelo da reclamada, para sanar as omissões referentes à aplicabilidade do ACT 2024/2026 e da Lei nº 14.457/2022, mas sem modificar o acórdão embargado. Tudo conforme a fundamentação supra, que passa a integrar o acórdão embargado. DISPOSITIVO ACORDAM OS DESEMBARGADORES DA TERCEIRA TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO, por unanimidade, conhecer dos embargos de declaração opostos pela reclamante e pela reclamada; no mérito, dar provimento ao apelo da reclamante, para determinar que os honorários advocatícios, a cargo da reclamada, sejam calculados à base de 15% sobre o valor atualizado da causa (art. 791-A, caput, da CLT); e dar parcial provimento ao apelo da reclamada, para sanar as omissões referentes à aplicabilidade do ACT 2024/2026 e da Lei nº 14.457/2022, mas sem modificar o acórdão embargado. Tudo conforme a fundamentação supra, que passa a integrar o acórdão embargado. Participaram do julgamento os desembargadores José Antonio Parente da Silva, Carlos Alberto Trindade Rebonatto e Durval Cesar de Vasconcelos Maia. Presente ainda representante do Ministério Público do Trabalho Carlos Leonardo Holanda da Silva. Fortaleza, 15 de abril de 2025 JOSE ANTONIO PARENTE DA SILVA Relator FORTALEZA/CE, 28 de abril de 2025. ANA KARINA NOBRE DE MIRANDA LEITAO Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- FRANCISCA TATHYANA DOS SANTOS
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