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Processo nº 1004850-75.2025.4.01.3901

ID: 295137434

Tribunal: TRF1 Órgão: 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Marabá-PA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1004850-75.2025.4.01.3901

Data de Disponibilização: 11/06/2025

Polo Ativo:

CAIO FARIAS ALBUQUERQUE

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

DAVI RABELLO LEAO

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Marabá-PA 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Marabá-PA PROCESSO: 1004850-75.2025.4.01.3901 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO AT… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Marabá-PA 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Marabá-PA PROCESSO: 1004850-75.2025.4.01.3901 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: C. F. A. REPRESENTANTES POLO ATIVO: DAVI RABELLO LEAO - PA22628 POLO PASSIVO:PROGRAMA DE SAUDE E ASSISTENCIA SOCIAL DO MINISTERIO PUBLICO DA UNIAO e outros DECISÃO Trata-se de ação ordinária, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por C.F.A., representado por seu genitor Gilmar Albuquerque da Silva, contra o Plan-Assiste e a União Federal, em que se busca limitar a cobrança da coparticipação, devida ao plano e saúde, à quantia equivalente à mensalidade fixa, de modo que o desembolso mensal realizado não seja maior que o da contraprestação paga pelo beneficiário; ou, subsidiariamente, a incidência da cobrança da coparticipação a uma única vez sobre cada tipo de terapia, independentemente da quantidade do número de sessões realizadas. Narra que o genitor do autor é servidor do MPU e, nesta condição, o autor, menor de idade, é seu dependente no plano de saúde funcional (Plan-Assiste). Refere que o autor fora diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista e que, nesta condição, fora-lhe prescrito tratamento, por tempo indeterminado, com Fonoaudiólogo (duas vezes por semana), Terapia Ocupacional (três vezes por semana), Psicomotricidade (duas vezes por semana), Psicologia Método ABA (oito vezes por semana), Psicopedagogia (duas vezes por semana) e Nutricionista (uma vez por semana), como forma de propiciar um melhor desenvolvimento. Segue relatando que, iniciado o tratamento, a coparticipação incidente no contracheque do genitor do autor teria atingido, para um único mês (Abril/2025), o valor de R$3.353,28 – montante este que, por ser muito alto, entende consubstanciar fator impeditivo à continuidade do tratamento, por onerar desarrazoadamente o orçamento mensal frente à existência de outros custos fixos (aluguel, energia, escola do autor, graduação do genitor, internet), requerendo, portanto, a sua modulação nos moldes do pedido de mérito Por entender preenchidos os requisitos pertinentes, requer o deferimento de tutela de urgência e assistência judiciária. Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. De início, observa-ase que o Plan-Assiste constitui programa assistencial destinado aos servidores do MPU, fatalmente não detém capacidade processual e, portanto, não deve figurar no polo passivo da ação. Por este motivo, determino a exclusão do Plan-Assiste do polo passivo da ação, mantendo apenas a União Federal, que tem legitimidade para responder à demanda que tem por objeto o custeio do plano de saúde por aquele executado em favor dos servidores do MPU. Quanto ao deferimento do pedido de tutela de urgência antecipada, previsto no art. 300 da Lei n. 13.105/2015 (Novo CPC), depende da demonstração da existência de dois requisitos, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso dos autos, estes requisitos tem-se verificados, porém, para deferimento da tutela de urgência apenas parcialmente e com temperamentos. Assim refiro porque a inicial sustenta que o montante a ser descontado mensalmente da remuneração do genitor do autor (em torno de R$3.353,28, conforme ocorrido no mês de Abril/2025), a título de coparticipação destinada a custear o seu tratamento, no caso concreto, consubstanciaria impedimento à continuidade do referido tratamento por onerar desarrazoadamente o orçamento mensal de sua família frente à existência de outros custos fixos (aluguel, energia, escola do autor, graduação do genitor, internet). Por isto, requer, a título de antecipação de tutela, que, desde já, seja limitado o desconto em contrache à quantia equivalente à mensalidade fixa, de modo que o desembolso mensal realizado não seja maior que o da contraprestação paga pelo beneficiário; ou, subsidiariamente, a incidência da cobrança da coparticipação a uma única vez sobre cada tipo de terapia, independentemente da quantidade do número de sessões realizadas. O autor sustenta a pretensão encimada sobre dois precedentes Turmas do STJ: a abusividade de cláusulas de coparticipação que impliquem em impedimento à continuidade terapêutica, no REsp n. 2.085.472/MT (Quarta Turma); e o parâmetro para minoração do desconto de coparticipação, no REsp n. 2.001.108/MT (Terceira Turma). Pois bem. Quanto ao primeiro ponto, muito embora seja de ressalvar a reconhecida legalidade do regime de coparticipação aplicável aos planos de saúde, por outro lado, de fato o entendimento jurisprudencial dá-se no sentido de reputar abusivas cláusulas de coparticipação, ou seja, “que nitidamente afetem, de maneira significativa, a própria essência do contrato, impondo restrições ou limitações aos procedimentos médicos, fonoaudiológicos e hospitalares, prescritos para doenças cobertas nos contratos de assistência e seguro de saúde dos contratantes” (ratio decidendi do Voto vencedor do REsp n. 2.085.472/MT). Trata-se, portanto, de limitação jurídica ao regime de coparticipação aplicável aos planos de saúde, que merecem flexibilização quando, na prática, impliquem no denominado impedimento à continuidade terapêutica. Entretanto, o precedente em questão não trouxe parâmetros gerais a serem observados para a mitigação judicial da incidência dos descontos em questão; ou seja, limitou-se a reconhecer a abusividade de tais descontos quando em patamar que tenha o potencial de obstar à continuidade do tratamento, hipótese em que se autoriza a intervenção judicial para reequilibrar a relação contratual, mas sem fixar, contudo, parâmetros gerais aplicáveis concretamente para a limitação em questão. Frente a esta omissão, o autor busca ver aplicado ao seu caso os mesmos parâmetros restritivos utilizados no REsp n. 2.001.108/MT para o reequilíbrio da relação contratual tratada naquele julgado. Entretanto, as particularidades materiais daquele caso passam ao largo de coincidir com as que incidem neste, motivo pelo qual cabe a realização de distinguishing a desaconselhar a utilização dos referidos parâmetros, também, para o caso ora posto. Senão, vejamos. De saída, verifica-se que naquele caso o julgado determinou que o percentual de coparticipação a ser arcado pelo autor fosse limitado a 50% do preço do tratamento, mediante aplicação por analogia do disposto no art. 19, II, “b”, da RN-ANS 465/2022. Entretanto, no caso ora em análise a própria inicial revela que este percentual já é fixado em 30% no próprio contrato firmado entre o autor com o Plan-Assiste – ou seja, patamar bem menor do que aquele fixado naquele precedente da 3ª Turma do STJ. Tal realidade, por si só, já desautoriza que se aplique a este caso a mesma limitação mensal de exposição financeira do beneficiário, posto que naquele caso o parâmetro utilizado (limitação mensal da cobrança por coparticipação ao valor fixo do plano) foi aplicado mediante associação a um limite, também determinado judicialmente, de 50% do tratamento a ser arcado pelo beneficiário a título de coparticipação – percentual este que, no caso do autor, já é bem menos em razão de previsão constante do próprio contrato. Outrossim, também se tem o fato de que a ementa e a ratio decidendi do Acórdão invocado pelo autor não esclarecem a remuneração do beneficiário a que se refere aquele julgado, de forma que não há como ponderar se a situação financeira do autor desta ação ordinária (servidor efetivo do MPU) é condizente com a situação financeira do interessado naquele caso tratado no julgamento da 3ª Turma do STJ. Advirta-se que tem relevância o que é tratado no parágrafo anterior porque o que se tem reconhecido jurisprudencialmente no REsp n. 2.085.472/MT-STJ não é o direito subjetivo à limitação de descontos a título de coparticipação com relação a tratamentos com custo elevado em geral; ao contrário, a limitação jurisdicional em questão direciona-se a casos excepcionais em que o valor de tais descontos possa impor a desistência do tratamento por questões financeiras – o que fatalmente enseja ponderação sobre qual a renda líquida mensal que será impactada por aqueles descontos. Só assim se pode verificar se o desconto realizado, de fato e em concreto, tem o efetivo potencial de impor ao beneficiário a alternativa de parar o tratamento por ausência de condições financeiras para arcar com a sua quota-parte dos custos envolvidos (coparticipação). Ademais, cabe pontuar que a remuneração de cargo efetivo federal (como o do genitor do autor, que é Técnico do MPU) guarda patamar razoavelmente superior a empregos celetistas junto à iniciativa privada para a realização de tarefas correlatas – o que dificulta ainda mais a ponderação sobre a semelhanças dos casos concretos quanto a este particular, já que não se tem qualquer conhecimento se, no caso utilizado como paradigma pelo autor, o interessado atuava na iniciativa privada ou no setor público, tampouco se conhece, de um modo geral, qualquer indicativo sobre a remuneração/renda efetivamente impactada naquele caso concreto. Por fim, também se tem que a ratio decidendi do precedente invocado esclarece que aquele caso referia-se ao custeio de tratamento com Protocolo Pediasuit, que se sabe perdurar, normalmente, por 03 a 04 semanas – de forma que a opção de, naquele caso, limitar o desconto mensal imediato a título de coparticipação em elevado patamar e postergar o pagamento dos valores residuais (a maior parte do custo do tratamento) para momento futuro tinha mais razoabilidade do que no caso posto, em que a prescrição médica em que se ampara o ajuizamento fala em implementação do tratamento “por tempo indeterminado” (ID 2190710146). Assim, mais um ponto em que os casos concretos passam a largo de coincidir quanto a suas particularidades. Em suma, não há como invocar aqui, objetivamente, os parâmetros utilizados para aquele específico caso, posto que em nada se comprovou que as particularidades do contexto prático em que aquele entendimento fora aplicado sejam minimamente compatíveis com as que incidem neste caso – sobretudo à vista de não se tratar de precedente vinculante. Mesmo raciocínio se segue com relação ao precedente de Turma do TJSP subsidiariamente invocado quanto a este particular (autos n. 2267409-72.2023.8.26.0000), via do qual se pretende que a cobrança mensal seja realizada por procedimento ou terapia, e não por sessão – posto que, também quanto a este caso, tem-se ausentes mínimos esclarecimentos sobre as particularidades materiais que justificaram a aplicação desta conclusão àquele caso, e por consequência, sobre razoável coincidência com as particularidades do caso ora em análise. Assim, ausentes parâmetros gerais jurisprudencialmente fixados para o tratamento de situações desta natureza, e afastada a aplicabilidade dos precedentes não vinculantes invocados pela parte autora, passo a ponderar sobre as particularidades incidentes e os parâmetros de minoração dos descontos devidos a título de coparticipação a serem razoavelmente observados quanto ao caso posto. Pois bem. É inevitável partir da remuneração do genitor do autor, porque invocada na própria inicial como a renda que custeia as despesas do núcleo familiar do autor – e esta se encontra demonstrada pelo contracheque juntada no ID 2190710485, último antes dos descontos guerreados nestes autos. Assim, tem-se que a renda mensal líquida do núcleo familiar do autor deve ser considerada em R$9.815,79. Firme neste raciocínio, em se tratando o objeto da ação de despesas arcadas por um pai em benefício de um filho, pode-se utilizar como fator de ponderação, analogicamente, as despesas mensais arcadas pelo pai separado em favor de filho cuja guarda permaneça, ao menos de maneira cronologicamente predominante (em caso de guarda compartilhada, quando comumente o filho permanece por mais tempo com a genitora), com a mãe. Nestes casos, muito embora não constitua uma regra legal expressa, tem-se recorrentemente aplicado pelos Tribunais o patamar de 30% (trinta por cento) de desconto sobre a remuneração do genitor a ser convertida em pensão alimentícia do seu filho. Esse mesmo percentual limitador de desconto a terceiros de remuneração se aproxima dos parâmetros dos programas de prevenção ao superendividamento, evitando que o gestor da unidade familiar possa ingressar num quadro de forte comprometimento de sua renda. Nota-se que a aplicação deste percentual sobre a atual renda líquida do genitor do autor gira em torno de R$2.944,73 mensais, de forma que entendo por razoável de ser adotado como limite mensal de descontos a serem realizados a título de contraprestação no contracheque do genitor do autor – sobretudo à vista de registro de reembolso parcial de Auxílio-Saúde no valor de R$679,62 (ID 2190710485), que eleva a mitigação dos impactos com despesas de saúde no orçamento mensal da família. Advirta-se que tal limitação não tem o potencial de extinguir o débito remanescente (ou seja, o valor excedente ao desconto aplicado), que deverá ser amortizado pelo autor mediante futuros descontos em contracheque do seu genitor (com juros e correção de acordo com o contrato Plan-Assiste, se houver), conforme a diminuição do número de sessões pertinentes ao tratamento ou o seu encerramento como um todo, o que ocorrer primeiramente – em todo caso observada a limitação mensal de 30% ora fixada para o valor global do desconto em contracheque ser aplicado, mês a mês, a título de coparticipação no custeio dos tratamentos objeto da prescrição médica documentada no ID 2190710146 (inclusive em caso de soma de reembolso de sessões ainda em curso com o reembolso de valores pertinentes a sessões pretéritas do tratamento, que tenham ficado pendentes em razão da aplicação do limite percentual em questão). Assim, tem-se incidente a probabilidade do direito em que se funda a ação, embora o percentual a ser aplicado não deva ser aquele sugerido pelo autor. O perigo em caso de demora também é assente, posto que os descontos objetivados incidem sobre verba remuneratória, portanto de caráter alimentar, e que o que de pretende é resguardar a continuidade do tratamento de saúde de menor de idade. Por todo o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE a tutela de urgência, para determinar à União que, através do Plan-Assiste, observe o limite de 30% (trinta por certo) do valor líquido da remuneração do genitor do autor para efeito de descontos a serem realizados a título de coparticipação pelas terapias prescritas pelo médico que acompanha o autor (conforme prescrição ID 2190710146) – registrando-se, entretanto, que tal limitação não extingue o débito remanescente, que deverá ser amortizado com juros e correção monetária previstos no Plan-Assiste pelo autor mediante futuros descontos em contracheque do seu genitor, conforme a diminuição do número de sessões pertinentes ao tratamento ou o seu encerramento como um todo, o que ocorrer primeiramente, em todo caso observada a limitação mensal de 30% ora fixada para o valor global do desconto em contracheque ser aplicado a título de coparticipação no custeio das referidas terapias (inclusive em caso de soma de reembolso de sessões ainda em curso com o reembolso de valores pertinentes a sessões pretéritas do tratamento, que tenham ficado pendentes em razão da aplicação do limite percentual em questão). Intime-se a União para cumprimento. Outrossim, verifica-se que o autor pretende, no mérito e em seu pedido preferencial, ver afastado, por mês e por tempo indeterminado, o desconto de R$3.189,02 (diferença entre o valor do desconto guerreado – R$3.353,28 – e aquele que se pretende ver aplicado – R$164,26), que deve ser multiplicado por doze (parcela anual). Entretanto, ao atribuir valor à causa, o autor o fez no patamar injustificado de R$4.152,96. Por fim, uma vez adequado regularmente o valor da causa, deve o autor se manifestar sobre eventual competência do JEF Adjunto a este Juízo para o processamento do feito, tendo em vista o teto legal de sua competência (60 salários-mínimos). Assim, intime-se o autor para, em 15 (quinze) dias, adequar fundamentadamente o valor da causa ao proveito econômico consectário à ação e manifestar-se sobre eventual competência absoluta do JEF para o processo e julgamento do feito em razão do valor da causa. Postergo a análise da gratuidade de justiça para o momento de definição da competência, visto que nos JEFs não há custas no 1º grau de jurisdição. Após, retornem os autos conclusos para Decisão – Secretaria. Intime-se. Cumpra-se. Marabá/PA. (Assinado digitalmente) MARCELO HONORATO Juiz Federal JH

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Lucia Pomposa De Oliveira x Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A.

ID: 277769791

Tribunal: TJMT Órgão: 3º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1009957-51.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 23/05/2025

Polo Ativo:

LUCIA POMPOSA DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença

Advogados:

FLAVIO IGEL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

GLECY KELLY NUNES DE MELO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

SENTENÇA Processo: 1009957-51.2025.8.11.0001 Requerente: LUCIA POMPOSA DE OLIVEIRA Requerido: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos, etc. Relatório dispensado (artigo 38 da Lei n. 9.099/1995). 1… SENTENÇA Processo: 1009957-51.2025.8.11.0001 Requerente: LUCIA POMPOSA DE OLIVEIRA Requerido: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos, etc. Relatório dispensado (artigo 38 da Lei n. 9.099/1995). 1. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTE ATO ILÍCITO. De proêmio, cabe ressaltar que, nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95, é dispensado, na presente sentença, o relatório, contudo, neste decisum, serão mencionados os elementos de convicção, com breve resumo dos fatos relevantes. É curial salientar, ainda, que o feito comporta julgamento antecipado do pedido, haja vista que as provas dos autos são suficientes para a solução da lide, sendo, portanto, dispensável a dilação probatória, na forma do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Antes de adentrarmos no exame do mérito da celeuma, se faz necessário sejam enfrentadas as questões preliminares suscitadas. 1.1.Das preliminares No que tange a pedido de gratuidade da justiça, verifico que a mesma não merece guarida, haja vista que a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita não tem cabimento nesta fase processual, uma vez que o acesso ao primeiro grau em sede de Juizado Especial independe do recolhimento de custas, taxas ou despesas processuais, conforme dispõe o artigo 54 da Lei nº 9.099/95. Portanto, remete-se a discussão para a fase de admissibilidade de eventual recurso inominado que possa futuramente ser interposto. Posto isto, rejeito a preliminar suscitada. Em relação a preliminar para aplicabilidade do código brasileiro de aeronáutica em detrimento do código de defesa do consumidor, verifico que a mesma não merece guarida, haja vista que de acordo com o entendimento do STJ, com o advento Lei n.º 8.078/90, nas questões decorrentes de falha na prestação de serviço de transporte nacional contratado entre o passageiro e a companhia aérea, na qualidade de consumidor e fornecedor, deve-se aplicar o CDC, não prevalecendo o disposto na Convenção de Varsóvia, Código Brasileiro de Aeronáutica, tampouco na Lei 8.987/95, vez que se trata, efetivamente, de relação de consumo. (AgInt no AREsp 874.427/SP). Posto isto, rejeito a preliminar suscitada. 2. MÉRITO O deslinde da celeuma instaurada entre as partes litigantes depende da análise se houve ou não falha na prestação de serviço e consequentemente o dever de indenizar. Pela distribuição da carga probatória, o ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu da contraprova, existência de fato modificativo, impeditivo ou extintivo (CPC, art. 373). Lucubrando o feito, verifico que a parte reclamante se desincumbiu de seu ônus probatório, tendo comprovado, por meio das documentações de ID 184087446, ID 184087445, ID 184087448; ID 184087452 que adquiriu as passagens aéreas e que houve cancelamento do voo de conexão cominando com o atraso de quase 24 (vinte e quatro) horas em relação à chegada ao seu destino. Por força do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pelos danos advindos da prestação, se não demonstradas causas excludentes (§ 3º), expressado na obrigação objetiva e teoria do risco do negócio. No vertente caso, a empresa reclamada limitou-se alegar em sua contestação que ocorreu o cancelamento em decorrência de motivos técnicos operacionais (ID 188680921). Porem, não trouxe aos autos nenhum documento comprobatório da sua alegação. Neste sentido é o entendimento jurisprudencial de nosso Tribunal de Justiça quanto ao dever da empresa reclamada de indenizar a parte reclamante. Senão vejamos: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PARCIAL PROCEDÊNCIA - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - READEQUAÇÃO DA MALHA AÉREA - TRANSPORTE AÉREO - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - RISCO DO EMPREENDIMENTO - NÃO COMPROVAÇÃO DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM - DESATENÇÃO AOS PARÂMETROS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - ESPECIFICIDADE DOS AUTOS QUE AUTORIZA A REDUÇÃO - FAMÍLIA DO MENOR QUE AJUIZA CINCO AÇÕES AUTÔNOMAS – DEMANDISMO – ABUSO DO DIREITO DE PETIÇÃO - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Apesar da tese de que não concorreu para o cancelamento do voo, que teria ocorrido em decorrência de readequação da malha aérea no dia do evento, se a companhia aérea não demonstra a necessária excludente de responsabilidade, caracterizada está a falha na prestação dos serviços por ela executados, razão de ser condenada ao pagamento de indenização por danos morais. Arbitrado em valor desarrazoado, considerando que a família da apelada optou por ajuizar ações individuais para cada um de seus cinco (05) membros, em verdadeiro abuso do direito de petição que caracteriza o demandismo desnecessário, para que não se configure enriquecimento sem causa da parte ofendida, deve ser reduzido o valor fixado a título de danos morais, em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.- (N.U 1032343-14.2021.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/08/2023, Publicado no DJE 10/08/2023). Ademais, é incontroverso que houve o extravio de bagagem da Requerente, fato reconhecido pela parte ré em sua contestação, a qual foi devolvida no dia da sua chegada em Cuiabá-MT. O dano moral decorrente de extravio de bagagens do passageiro, durante o transporte aéreo, independe da prova de prejuízo, sendo, portanto, o dano presumido, bastando à comprovação da ocorrência do fato que o gerou. O transportador se obriga não apenas pela conservação e integridade da bagagem que lhe é entregue em custódia, mas também pela sua restituição ao fim da viagem, sob pena de responder objetivamente pelos danos causados ao passageiro. O artigo 17, item 2, do Decreto nº 5.910/2006, que trata da responsabilidade do transportador, estabelece que: “O transportador é responsável pelo dano causado em caso de destruição, perda ou avaria da bagagem registrada, no caso em que a destruição, perda ou avaria haja ocorrido a bordo da aeronave ou durante qualquer período em que a bagagem registrada se encontre sob a custódia do transportador. Não obstante, o transportador não será responsável na medida em que o dano se deva à natureza, a um defeito ou a um vício próprio da bagagem. No caso da bagagem não registrada, incluindo os objetos pessoais, o transportador é responsável, se o dano se deve a sua culpa ou a de seus prepostos”. O artigo 32, § 2º, da Resolução 400/2016 da ANAC acrescenta que o transportador deverá restituir a bagagem extraviada, no local indicado pelo passageiro em até 07 (sete) dias, no caso do voo doméstico. Contudo, o prazo de 07 (sete) dias para a devolução da bagagem extraviada em voo doméstico não pode eximir a companhia aérea das consequências advindas da falha na prestação de serviços, especialmente considerando que, em decorrência do extravio temporário, sem perspectiva de devolução imediata. Nesse contexto, mostra-se irrelevante o fato da bagagem ter sido restituída no dia da sua chegada, pois o simples fato de o passageiro ter sua bagagem extraviada já lhe causa angústia, sofrimento e transtornos graves o suficiente para gerar o dano moral indenizável. Neste sentido: Apelação. Ação indenizatória. Transporte aéreo internacional. Extravio temporário de bagagem . Falha na prestação do serviço. Sentença de parcial procedência. Recurso da parte autora. 1 . Legislação aplicável. Incidência da Convenção de Montreal em detrimento do Código de Defesa do Consumidor para a indenização por dano material (Tema 210). Precedentes. Ausência de limitação para indenização por dano moral . 2. Dano material. Extravio temporário da bagagem da parte autora, que permaneceu em país estrangeiro sem seus bens pessoais e sem perspectiva de devolução, de modo que foi obrigada a comprar novos itens para prosseguir com a viagem. Ressarcimento por dano material devido a todos os autores . Restituição da bagagem temporariamente extraviada, ainda que dentro do prazo de 21 (vinte e um) dias previsto na Resolução nº 400 da ANAC, que não afasta os prejuízos experimentados e demonstrados pelos passageiros. Correção monetária e juros de mora na indenização por dano material. Montante a ser corrigido desde o desembolso, com juros de mora a partir da citação (art. 405 do CC), por se tratar de responsabilidade contratual . 3. Dano moral. Majoração da indenização para R$ 3.000,00 (três mil reais), em consonância com precedentes desta 15ª Câmara de Direito Privado, considerando o extravio da bagagem por 06 (seis) dias . Montante a ser corrigido desde o arbitramento (S. 362 do STJ), com juros de mora a partir da citação (art. 405 do CC), por se tratar de responsabilidade contratual. 4 . Sentença reformada. Recurso provido parcialmente. (TJ-SP - Apelação Cível: 11085826820238260100 São Paulo, Relator.: Elói Estevão Troly, Data de Julgamento: 07/07/2024, 15ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/07/2024). Pois bem. Não resta dúvida do defeito na prestação de serviços por parte da Reclamada, uma vez que não pode ser de responsabilidade dos passageiros o transporte de suas bagagens de uma aeronave à sala de desembarque, pois é sabido que os passageiros não manobram os veículos de transporte de bagagens nos aeroportos. A responsabilidade da entrega da bagagem em perfeito estado é obrigação da Reclamada, sendo inadmissível o fato ocorrido com o Reclamante, constituindo verdadeiro defeito na prestação do serviço, nos termos do art. 14, par. 1º, I do CDC. É fato que a Reclamante suportou transtornos decorrentes do ocorrido, o que não pode ser equiparado a mero contratempo, a pequenos dissabores, ou, ainda, a inconvenientes rotineiros aos quais todos se vejam submetidos, motivo pelo qual é plenamente justificada a reparação almejada. Portanto, uma vez configurado o dano, de rigor se impõe o reconhecimento de que seja devida ao Reclamante a desejada indenização, de sorte a amenizar o sofrimento experimentado, em razão da injusta ofensa. Neste sentido: E M E N T A RECURSO INOMINADO. TRANSPORTE AÉREO. BAGAGEM DANIFICADA. PROBLEMA NÃO SOLUCIONADO ADMINISTRATIVAMENTE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MATERIAL DEVIDO. DANO MORAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO FIXADA FORA DOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor, fundada na teoria do risco da atividade. Configura falha na prestação do serviço e gera o dever de indenizar a título de dano moral e material, se a bagagem da consumidora foi danificada, conforme RIB, e a empresa aérea não busca solucionar o problema enfrentado, administrativamente. Reduz-se a condenação a título de indenização por dano moral, se fixada fora dos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade. (TJ-MT - RI: 10014568720188110055 MT, Relator: VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Data de Julgamento: 31/07/2020, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 04/08/2020) Com efeito, pelos fundamentos acima expendidos, inequívoca a obrigação da empresa reclamada em indenizar a parte reclamante. No que tange ao quantum a ser fixado a título do dano moral, afere-se o que a doutrina e jurisprudência assinalam para o balizamento, como a condição educacional, econômica e profissional do lesado, a intensidade de seu sofrimento, o grau de culpa ou dolo do ofensor, a sua situação econômica e os benefícios advindos do ato lesivo, bem como a extensão do dano, tudo pelo critério da razoabilidade. Senão vejamos: TJ/MT - EMENTA APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO - REESTRUTURAÇÃO DE MALHA AÉREA – FORTUITO INTERNO - CHEGADA AO DESTINO FINAL 15 HORAS APÓS O PERÍODO CONTRATADO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO – DANOS MATERIAIS – COMPROVADOS - RECURSO DESPROVIDO. A reestruturação da malha aérea, noticiada nos autos, caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, de modo que é incapaz de isentar a responsabilidade da companhia aérea. O cancelamento de voo adquirido e a ausência de assistência adequada aos passageiros pela companhia aérea caracteriza falha na prestação do serviço contratado e gera o dever de indenizar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva (N.U 1004850-13.2022.8.11.0007, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/08/2023, Publicado no DJE 08/08/2023). (grifei) RECURSO DE APELAÇÃO – EMPRESA AÉREA – CANCELAMENTO DE VOO – FATORES CLIMÁTICOS ADVERSOS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO - REMARCAÇÃO DE VOO PARA O DIA SEGUINTE – CHEGADA NO DESTINO APÓS 24 HORAS – DANO MORAL CONFIGURADO – INDENIZAÇÃO FIXADA EM OBSERVÂNCIA AOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – MINORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – REJEITADO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Tratando-se de relação de consumo, a responsabilidade do fornecedor é objetiva, prescindindo da comprovação de culpa. Sendo incontroverso o cancelamento do voo, e não tendo o réu comprovado a existência do alegado mau tempo, conclui-se que não foi configurada qualquer excludente de responsabilidade. O atraso de voo configura falha na prestação do serviço e esta falha enseja a responsabilização objetiva pelos danos causados, nos termos do art. 14, do Código de Defesa do Consumidor e arts .186 e 92, do Código Civil. “Identificada a falha na prestação dos serviços pela empresa aérea em razão do considerável atraso do voo, somado à deficiente assistência prestada aos passageiros, menores de idade, é de se concluir pela responsabilidade da empresa aérea de ressarcir os danos morais a eles ocasionados”(TJMG - Apelação Cível 1.0000.21.248078-4/001, Relator(a): Des.(a) Fernando Lins , 20ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 09/11/2022, publicação da súmula em 11/11/2022) Valor da indenização por dano moral, fixada de acordo com os critérios de proporcionalidade e razoabilidade. (N.U 1027497-31.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/03/2023, Publicado no DJE 15/03/2023) (grifei) RECURSO INOMINADO. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO EM VOO. PERDA DE CONEXÃO. ALEGAÇÃO DE IMPEDIMENTOS OPERACIONAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO FIXADA NOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO IMPROVIDO. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor. Impedimentos operacionais que resultaram no atraso superior a dezoito horas em relação ao voo original, não possui o condão de afastar o dever de indenizar, inerente à atividade empresarial desempenhada. A empresa de aviação que permite o atraso de voo, por prazo demasiadamente longo, age negligentemente e gera a obrigação de indenizar a título de dano moral. Mantém-se o valor da indenização se fixado nos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade. (N.U 1005916-51.2019.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Turma Recursal Única, Julgado em 19/05/2020, Publicado no DJE 21/05/2020). (grifei) Sublinhe-se, ainda, que, no que se refere ao valor da indenização, é necessário considerar que a indenização por dano moral deve alcançar um valor tal que sirva de desestímulo para a parte ré, mas que, por outro lado, não seja fonte de enriquecimento para a parte autora. Por esta razão, entendo que o importe de R$ 8.000,00 (oito mil reais) é adequado à reparação dos danos morais experimentados. 3. DISPOSITIVO Posto isto, em consonância com os fundamentos retro expendidos, nos termos do art. 487, I do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedente o pedido produzido na peça anteloquial e, por corolário, · condeno a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais os quais fixo em R$ 8.000,00 (oito mil reais), a ser corrigida monetariamente pelo índice IPCA, nos termos do parágrafo único do artigo 389 do Código Civil, a partir da data do arbitramento, conforme a Súmula 362 do STJ, e acrescida de juros de mora, nos termos do artigo 406, § 1º, do Código Civil, contados a partir da citação. Sem custas e sem honorários (art. 54 e 55 da Lei 9.099/95). Submeto o presente projeto de sentença à homologação do MM. Juiz Togado, nos termos do art. 40 da Lei 9.099/95. Ana Rosa Martins Juíza Leiga S E N T E N Ç A Homologo a minuta de sentença, nos termos do art. 40 da Lei n. 9.099/95. Transitada em julgado, nada sendo requerido, arquivem-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá (MT), data registrada no Sistema PJe. (assinado digitalmente) Jeverson Luiz Quintieri Juiz de Direito

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Schyrlei Scheyla Resende Schley Silva x Bbn Banco Brasileiro De Negócios S.A. e outros

ID: 262429927

Tribunal: TJMT Órgão: 3º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1008660-09.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 29/04/2025

Polo Ativo:

SCHYRLEI SCHEYLA RESENDE SCHLEY SILVA

Polo Passivo:

BBN BANCO BRASILEIRO DE NEGÓCIOS S.A. ITAÚ UNIBANCO S.A.

Sentença

Advogados:

EDUARDO CHALFIN REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO EDUARDO CHALFIN

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

JULIANO RICARDO SCHMITT

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

JOAO VITOR SILVA SIMONATO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PROJETO DE SENTENÇA Processo: 1008660-09.2025.8.11.0001 REQUERENTE: SCHYRLEI SCHEYLA RESENDE SCHLEY SILVA REQUERIDO: BBN BANCO BRASILEIRO DE NEGÓCIOS S.A. REQUERIDO: ITAÚ UNIBANCO S.A. Vistos. Relató… PROJETO DE SENTENÇA Processo: 1008660-09.2025.8.11.0001 REQUERENTE: SCHYRLEI SCHEYLA RESENDE SCHLEY SILVA REQUERIDO: BBN BANCO BRASILEIRO DE NEGÓCIOS S.A. REQUERIDO: ITAÚ UNIBANCO S.A. Vistos. Relatório dispensado. Fundamento e decido. As sentenças nos Juizados Especiais obedecerão aos limites traçados no art. 2º e art. 38 da Lei nº 9.099/95 c.c. art. 1.046, §2º e §4º, do CPC c.c. Enunciados nº 161 e 162 do FONAJE. Preliminar(es). - DA ILEGITIMIDADE PASSIVA DAS RECLAMADAS. Sem razão as Requeridas, uma vez que os documentos anexados pela Autora, pelo menos em primeira análise, indicam que há participação destas na relação jurídica de direito material de prestação de serviços e intermediação, com pagamento de boletos, cuja participação se deu com as Reclamadas, de modo que, seguir com a análise do mérito da demanda, no intuito de se apurar eventual responsabilidade das Reclamadas nos fatos contidos na exordial é de rigor. Prevalecem, no caso, as regras da solidariedade passiva, razão pela qual o consumidor poderá voltar-se contra qualquer dos prestadores de serviços contratados, em conjunto ou isoladamente, de maneira que, com base nessa responsabilidade, poderão os prestadores, depois, valerem-se do direito de regresso. Ademais, é uníssono o entendimento de que o Código de Defesa do Consumidor, no art. 7º, parágrafo único, expressamente estabelece a responsabilidade solidária entre todos os integrantes da cadeia negocial. Deste modo, reconheço a legitimidade das Reclamadas, para figurarem no polo passivo desta demanda. - DA DENUNCIAÇÃO DA LIDE – INCLUSÃO DE TERCEIRO. O ordenamento do rito dos Juizados Especiais, conforme disposto na Lei nº. 9.099/95, não admite qualquer forma de intervenção de terceiros e nem de assistência. Ademais, conforme constatado supra, os pagamentos foram realizados com boleto fornecido pela 1ª Reclamada e pagamento via conta corrente com a 2ª Ré, consignando na possibilidade de análise do mérito e apuração de eventual responsabilidade das respectivas instituições. Nesse sentido: RECURSO INOMINADO. ADITAMENTO DA INICIAL. INCLUSÃO NO POLO PASSIVO DE COMPANHIA AÉREA REJEITADA. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO NÃO ADMITIDA NOS JUIZADOS ESPECIAIS. INDENIZAÇÃO FIXADA NOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1. No presente caso, a parte autora, ora Recorrente alega que adquiriu passagem aérea de ida e volta com destino a Buenos Aires, Argentina, através da agência de viagem Recorrida, contudo ao chegar no aeroporto, no momento do embarque descobriu que seu voo havia sido cancelado pela companhia aérea Gol Linhas Aéreas, tendo que arcar com os custos de uma nova passagem aérea e despesas extras com alimentação, hospedagem e transporte. 2. Nas razões recursais, sustenta a anulação da sentença de primeiro grau, ante ao pedido de aditamento da inicial, nos termos do art. 329, do CPC, constante na impugnação da sentença, para a inclusão da companhia aérea no polo passivo da demanda. Em pedido alternativo, a reforma parcial da sentença para majorar o valor da condenação a título de dano moral. 3. Em contrapartida, a Recorrida sustenta que seja reconhecida a preliminar de litisconsórcio passivo necessário, devendo a companhia aérea ser incluída no polo passivo da lide, para novo julgamento. Requer, ainda, seja negado provimento ao pedido de majoração da condenação por dano moral. 4. Consta na sentença recorrida a qual utilizo como fundamento para julgar o presente recurso: “No tocante a inclusão no polo passivo da Gol linhas aéreas, não acolho, eis que se trata de chamamento ao processo, sendo incabível nos juizados especiais”. 5. A Lei nº 9.099/95 não admite qualquer forma de intervenção de terceiros e nem de assistência. 6. No tocante a condenação arbitrada a título de dano moral não há o que se falar em majoração da condenação a título de dano moral, pois este se encontra dentro dos parâmetros da proporcionalidade e razoabilidade. (...)” (N.U 1037056-98.2022.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Turma Recursal Única, Julgado em 11/04/2023, Publicado no DJE 12/04/2023) (negritei e sublinhei) Rejeito, portanto, a preliminar. – DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR. Alega a parte requerida, preliminarmente, falta de interesse de agir. Contudo, verifica-se que não lhe assiste razão. O interesse processual configura-se pelo binômio necessidade-utilidade. No caso vertente, a prestação jurisdicional buscada é apta a tutelar a situação jurídica da parte autora, além de somente ser possível o acesso ao bem da vida, no presente caso, por meio da atividade jurisdicional. Registre-se, ainda, que, à luz da teoria da asserção, a legitimidade e o interesse de agir devem ser aferidos a partir de uma análise abstrata dos fatos narrados na inicial. Rejeito, portanto, a preliminar. - DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. O valor da causa deve se basear na pretensão econômica objeto do pedido, nos termos do enunciado nº 39 do FONAJE: “Em observância ao art. 2º da Lei 9.099/1995, o valor da causa corresponderá à pretensão econômica objeto do pedido”. No caso, o valor da causa corresponde à pretensão econômica da Reclamante, quanto aos danos morais decorrentes da eventual inscrição indevida, sendo, portanto, impertinente a correção do valor da causa. - DA NECESSIDADE DE AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO – DO JULGAMENTO ANTECIPADO. Não se faz necessária a realização de audiência instrução, já que cabe ao magistrado dirigir a instrução do processo e deferir a produção probatória que considerar necessária à formação do seu convencimento. No caso, não havendo vício que possa obstar o regular prosseguimento do feito, preparado está o processo para julgamento antecipado, pois as provas dos autos são suficientes para a solução da lide, sendo, portanto, dispensável dilação probatória. Mérito. Inexiste vício a obstar o regular prosseguimento do feito, bem como, as provas dos autos sendo suficientes para a solução da lide ou havendo pedido de julgamento, revela-se dispensável a dilação probatória e pronta a reclamação para julgamento antecipado conforme disposição do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS, proposta por SCHYRLEI SCHEYLA RESENDE SCHLEY SILVA, em face de BBN BANCO BRASILEIRO DE NEGÓCIOS S.A. e ITAÚ UNIBANCO S.A. Em síntese, aduz a parte autora, que após ver anúncio veiculado no INSTAGRAM, iniciou tratativas comerciais com o anunciante, e comprou m Iphone 15 Pro, 256 GB, pelo valor de R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais). Porém, em contato com o vendedor, foi bloqueada, momento em que percebeu que teria caído em um golpe, requerendo, indenização por danos materiais e morais. Em defesa, os Reclamados sustentam que, o comprovante de pagamento apresentado pela autora apresenta beneficiário diverso das instituições Reclamadas, não tendo a Reclamante comprovado suas alegações, que agiu diligentemente, e que a culpa é exclusiva da vítima, pugnando pela improcedência da demanda. Inicialmente, há que se esclarecer que, as disposições previstas no Código de Defesa do Consumidor são perfeitamente aplicáveis ao presente caso, uma vez que as partes se amoldam perfeitamente aos conceitos de consumidor e fornecedor previstos na legislação supracitada. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC é um direito do consumidor que facilita sua defesa na atuação em juízo, efetivando o princípio da isonomia material. Nesta situação, a parte mais forte na relação de consumo (fornecedor) pode e deve produzir provas capazes de ilidir as alegações feitas pelo consumidor, no entanto, é certo que tal benesse conferida por Lei não isenta a Reclamante de demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, cabendo a esta, portanto, produzir o mínimo de prova necessária para que se vislumbre, de um prisma jurídico, o nascimento de seu direito e a possibilidade de pleiteá-lo em face de outrem. Ressalto que, o objetivo da inversão do ônus da prova é, tão-só, e exclusivamente, a facilitação da defesa do direito do consumidor em juízo, e não o privilegiar para vencer mais facilmente uma demanda, em detrimento das garantias processuais do fornecedor-Réu. O acervo probatório dos autos demonstra que a Reclamante realizou compra diretamente com perfil fraudulento, e foi vítima de golpe de boleto fraudulento, sem a participação, conivência ou omissão dos Reclamados, de maneira que não há como atribuir responsabilidade objetiva as partes Rés. Verifica-se, que conforme narrado pela própria autora, esta realizou diretamente as negociações por meio do anúncio e WhatsApp do suposto terceiro fraudador. O Reclamado não pode responder por fato de terceiro, quando não comprovado o nexo causal entre sua conduta (omissiva) e o dano. Ademais, trata-se de típico caso de golpe, já conhecido e que torna insuficientes as meras alegações da parte autora. Com efeito, há dever de preservar a segurança das tratativas comerciais, entretanto, não significa que consiga fazê-lo a todo instante, incessantemente, em sua tentativa de salvaguardar os milhões de usuários brasileiros. Em situações como a dos autos, deve-se prezar pelo razoável, o que não parece ocorrer quando a pretensão autoral investe na tentativa de tornar as Reclamadas objetivamente responsáveis, por todo e qualquer ilícito praticado por terceiro em sua rede social. Aliás, as Reclamadas não podem ser responsabilizadas pela idoneidade de toda e qualquer pessoa que oferte produtos de consumo em plataforma de relacionamento, pelos pagamentos não realizados, pela entrega de produtos adquiridos, pela insatisfação do cliente, sob a ótica consumerista. Desta feita, entendo que os Requeridos não detêm responsabilidade civil com a autora, sendo evidente que a fraude ocorreu por sua culpa exclusiva, não podendo se falar em restituição por danos materiais e indenização por danos morais. Por oportuno, ressalto o entendimento jurisprudencial proferido pelo E. TJMT em caso análogo: JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. GOLPE. AÇÃO INDENIZATÓRIA DANOS MATERIAL E MORAL. PARTE AUTORA SOFREU GOLPE DE PIX. FRAUDE PERPETRADA POR TERCEIRO. GOLPE MEDIANTE APLICATIVO. TRANSAÇÃO REALIZADA DIRETAMENTE ENTRE O AUTOR E O ESTELIONATÁRIO. INEXISTÊNCIA DE INTERMEDIAÇÃO DA TRANSAÇÃO. PREJUÍZO OCASIONADO PELO FALSÁRIO QUE A AUTORA CONTACTOU DIRETAMENTE. SEM PROVA NOS AUTOS DE RELAÇÃO DAS PARTES RÉS COM O GOLPE SOFRIDO. TRANSFERÊNCIA VIA PIX. RESPONSABILIDADE OBJETIVA NÃO DEMONSTRADA. SENTENÇA JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. Narra a parte autora que realizou compra de dois ingressos com terceiro que viu anuncio na rede social Instagram no valor de R$600,00(-) e não os recebeu, sendo imediatamente bloqueada após o PIX pelo perfil com o qual negociou o valor. Alega esta conta com a qual negociou tinha sido hackeada, razão pela qual há responsabilidade da ré Instagram. Por fim, informa que entrou em contato com o banco Nubank o qual tinha utilizado para realizar o Pix e este não usou mecanismos de segurança para resolver a situação. 2. A parte ré Instagram (Facebook) alega sua ilegitimidade passiva, uma vez que não participou de nenhuma negociação, ademais informa que a conta supostamente hackeada não pertence a parte autora e que não há responsabilidade no caso em questão. A ré Nubank informa que não é responsável pela transação realizada, uma vez que a autora a realizou por livre e espontânea vontade. 3. Insta consignar inicialmente que a parte autora confessa que entrou em contado com a terceira pessoa por sua escolha, após visualização de anúncio de venda de ingressos no perfil dessa pessoa. Informa ademais que realizou o Pix e que após isso percebeu o golpe, uma vez que foi imediatamente bloqueada pelo perfil com o qual estava negociando. Cumpre destacar que o valor transferido por Pix não ocorreu via plataforma instagram, apenas o contato com a pessoa terceira. 4. Assim sendo, constata-se que a acionante não se desincumbe de seu ônus probatório previsto no art. 373, I do CPC, não apresentando lastro probatório mínimo que comprove o fato constitutivo de seu direito. 5. Ao exame dos autos, verifica-se que a transação foi realizada diretamente pela parte autora ao terceiro, tendo a parte autora se deixado enganar pela falácia do estelionatário, violando, assim, um dever de cuidado. Com efeito, as partes rés, in casu, não podem ser responsabilizado pela conduta do terceiro, uma vez que não praticou qualquer ato que tenha facilitado o cometimento do golpe. 6. Faculta-se ao juiz excepcionar a regra geral indicada, se, diante de uma relação consumerista, as alegações do consumidor/autor, mesmo desacompanhadas da prova desejável, quanto aos fatos constitutivos, mostra-se verossímil, isto é, tem a aparência de verdade, segundo o que lhe informa a razoabilidade, o bom senso e regras ordinárias de experiência. 7. Diante da inexistência de má prestação do serviço, sendo que o réu não participou e não foi comprovada qualquer relação com o golpe, revela-se a improcedência da pretensão autoral. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RELATÓRIO Relatório dispensado, na forma do Enunciado 92 do FONAJE: “Nos termos do art. 46 da Lei nº 9099/1995, é dispensável o relatório nos julgamentos proferidos pelas Turmas Recursais”. VOTO Mantida a sentença prolatada pelo M.M. Juiz a quo pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei 9.099/95. Diante do quanto exposto, VOTO no sentido de NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO para MANTER A SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA, em todos os seus termos. Custas e honorários, estes em 20% do valor da causa a cargo do recorrente vencido. Contudo, em virtude do deferimento da assistência judiciária gratuita, tal pagamento fica suspenso nos termos do art. 98, § 3º do CPC. NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS Juíza Relatora (Classe: Recurso Inominado, Número do Processo: 0026695-70.2023.8.05.0001,Relator(a): NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS, Publicado em: 20/03/2024 ) (negritei e sublinhei) APELAÇÃO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO "INAUDITA ALTERA PARTE” – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – “GOLPE DO BOLETO FALSO” – DOCUMENTO ENVIADO POR WHATSAPP – AUSÊNCIA DE PROVA DO RECEBIMENTO POR CANAIS OFICIAIS DO BANCO – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA – ART. 14, §3º, II, DO CDC –PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO AUTOMÓVEL – NECESSIDADE DE QUITAÇÃO INTEGRAL DA DÍVIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. É ônus do consumidor a adoção das cautelas mínimas necessárias ao pagar boleto bancário, sob pena de responder pela fraude praticada (art. 14, §3º, II, do CDC). Se a purgação da mora não é realizada nos 5 dias previstos no §2º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/69, ocorre a consolidação da propriedade e da posse plena e exclusiva do veículo no patrimônio do credor. (N.U 1027120-55.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/11/2024, Publicado no DJE 16/11/2024) (negritei e sublinhei) RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR VÍTIMA DE GOLPE VIA PIX. GOLPE PRATICADO POR FALSÁRIOS. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA RECORRIDA NÃO VERIFICADA. AUSÊNCIA DE CAUTELA DO CONSUMIDOR. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL DANOS MORAIS E MATERIAIS NÃO CONFIGURADOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A transferência de valores para conta corrente de terceiros, configura culpa exclusiva do consumidor, não existindo, a princípio, nexo de causalidade que relacione qualquer conduta da instituição financeira ao resultado danoso, que, repita-se, ocorreu por culpa exclusiva do consumidor. 2. Cabe a recorrente o ônus de provar que foram os recorridos que deram causa ao ocorrido, consoante exige o art. 373, I do CPC, porquanto a inversão do ônus da prova não tem caráter absoluto. 3. A concretização da fraude só foi possível porque o recorrente não atuou com zelo na situação, restando configurada a excludente de responsabilidade por culpa exclusiva da vítima (CDC art. 14, § 3º, II). 4. Inexistindo prova nos autos da ligação dos fraudadores com o recorrido, não há que se falar em responsabilização deste por danos materiais e morais. 5. Recurso conhecido e não provido. (N.U 1004850-93.2022.8.11.0045, TURMA RECURSAL CÍVEL, LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Turma Recursal Única, Julgado em 13/07/2023, Publicado no DJE 14/07/2023) (negritei e sublinhei) Com efeito, não vislumbro a comprovação dos danos, muito menos suposta culpa da parte Reclamada. Dispositivo. Ante o exposto, rejeito a(s) preliminar(es) e julgo IMPROCEDENTES os pedidos da exordial, extinguindo o feito com julgamento do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sem custas e honorários (art. 54 e 55, ambos da Lei nº 9.099/95). P.I.C. Submeto o presente projeto de sentença à homologação do MM. Juiz Togado, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95. William Hemilliese Oracio Silva Juiz leigo SENTENÇA Vistos. HOMOLOGO o projeto de sentença, nos termos do art. 40, da Lei 9.099/95 c.c. art. 8º, da LCE nº 270/07. Aguarde-se em arquivo a via recursal ou, se for o caso, o trânsito em julgado. JAMILSON HADDAD CAMPOS Juiz de Direito do 3º Juizado Especial Cível da Comarca de Cuiabá ASSINADO DIGITALMENTE

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Rafael Camarao De Oliveira x Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A.

ID: 301154760

Tribunal: TJMT Órgão: 6º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1009910-77.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

RAFAEL CAMARAO DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença

Advogados:

RONILDO PEREIRA DE MEDEIROS JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FLAVIO IGEL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1009910-77.2025.8.11.0001. AUTOR: RAFAEL CAMARAO DE OLIVEIRA REU: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vis… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1009910-77.2025.8.11.0001. AUTOR: RAFAEL CAMARAO DE OLIVEIRA REU: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos, Dispensado relatório na forma do disposto no artigo 38 da Lei 9.099/95. - Da Aplicação do Código do Consumidor Destaca-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que, em casos de falha na prestação do serviço de transporte aéreo, após a entrada em vigor da Lei n. 8.078/1990, deve prevalecer o Código de Defesa do Consumidor sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica. Nesse sentido, colhe-se o seguinte precedente: “A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, tratando-se de falha na prestação do serviço de transporte aéreo, após a entrada em vigor da Lei n. 8.078/1990, incide o Código de Defesa do Consumidor. “(AgInt no AREsp n. 1.707.627/SP, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024.) Diante desse entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, aplicam-se ao caso em análise as normas do Código de Defesa do Consumidor, afastando-se a incidência do Código Brasileiro de Aeronáutica. - Correção Valor da Causa Considerando a manifestação de ambas as partes retifica-se o valor da causa para constar a soma dos valores objetos dos pedidos da petição inicial, sendo R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos morais e R$ 272,40 (duzentos e setenta e dois reais e quarenta centavos), totalizando o valor de R$ 15.272,40 (quinze mil, duzentos e setenta e dois reais e quarenta centavos). Inicialmente, verifica-se que as provas contidas no caderno processual são suficientes para a compreensão e resolução da demanda, não se vislumbrando necessidade da produção de prova oral, o que autoriza o julgamento antecipado do mérito, nos moldes do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Mérito Narra a parte autora que adquiriu passagens aéreas para si e sua família, com embarque em 15/12/2024 às 9h45 (voo CUIABÁ–MACEIÓ com conexões) – id. 184069661, mas, em razão de atraso operacional promovido pela ré, perdeu a conexão e chegou ao destino final apenas às 6h53 do dia seguinte, com 12 (doze) horas de atraso, tendo que alugar veículo por conta própria (R$ 272,40) e suportar cansaço físico e perda de diária de hotel. Pleiteou R$ 272,40 a título de danos materiais e R$ 15.000,00 por danos morais. A ré, em contestação, confirmou o atraso e alegou que este foi ínfimo, justificável por questões operacionais (bagagem), e que prestou assistência adequada (reacomodação e alimentação). Requereu improcedência dos pedidos e sustentou aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), com exigência de comprovação do prejuízo extrapatrimonial nos termos do art. 251-A. Impugnação apresentada pelo autor reiterou a aplicação do CDC, refutou a validade das telas sistêmicas apresentadas e reafirmou a inexistência de assistência efetiva, bem como a configuração de dano moral presumido. Como é sabido, a inversão do ônus da prova libera o consumidor da obrigação de provar a existência dos fatos constitutivos do seu direito, passando a incumbência à parte contrária que deverá comprovar a existência de fatos impeditivos do direito da parte autora, em virtude de a presunção passar a ser favorável a ela. Analisando o conjunto probatório, observa-se que a empresa ré não trouxe qualquer prova cabal de suas alegações, não atendendo ao comando descrito no artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil. Em contrapartida, a parte autora apresentou nos autos o bilhete originário (id. 184069661) que demonstra que o voo originalmente contratado teve como previsão o embarque em 15/12/2024 às 9h45 (voo CUIABÁ–MACEIÓ com conexões), e chegada às 18h00 do mesmo dia, de modo que devido ao cancelamento do voo, chegou ao destino final somente as 06h53 do dia 16/12/2024, caracterizando um atraso superior a 12 horas. Sendo assim, resta comprovado o atraso de voo superior a 12 (doze) horas, tendo a parte autora finalizado o trajeto via terrestre, optando pelo aluguel de carro. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor, decorrentes de falha na prestação de serviço, baseada na teoria do risco do negócio, de modo que o fortuito interno não elide a responsabilidade do fornecedor. Isso porque as companhias aéreas devem adotar medidas preventivas para evitar atrasos e outros transtornos durante a execução do contrato de transporte, de modo que a tese de alteração por motivos operacionais não elide a responsabilidade da empresa, pois são riscos da atividade empresarial e não podem ser transferidos ao consumidor. Assim, a motivação apresentada não constitui causa excludente de responsabilidade, razão por que deve ser reconhecido o serviço deficitário, uma vez que a prestação se deu de maneira diversa e rendeu a impossibilidade de a parte usuária usufruir do serviço devidamente. O prejuízo do consumidor decorre do ferimento de seu status, conquistado em evolução normativa e de décadas de lutas para reconhecimento de seus direitos, e de sua dignidade como participante da relação consumerista. A clausulação do direito do consumidor como direito fundamental social previsto pela Constituição Federal induz a aplicação do princípio da vedação do retrocesso social para a defesa de conquistas adquiridas ao longo do tempo. Se não se pode falar em dano moral puro na seara do atraso/cancelamento unilateral de voo, por outro lado, a situação danosa do consumidor que tem seu itinerário totalmente modificado, permanece horas no aeroporto, que perde o voo, que se utiliza de outros expedientes para chegar ao seu destino, não pode ser desprezada. A ação prolongada de alteração dos horários acarreta danos a serem experimentados pelo consumidor que desbordam, sobremaneira, as raias do tolerável, decorrente do descumprimento do contrato, sentimento de impotência e o elastério temporal, quadro esse com potencial para ingressar nos direitos da personalidade. Desse modo, se o transportador não comprovar caso fortuito ou força maior (art. 256, § 1º, II c/c § 3º, e incisos, Lei 7.565/86), e, aliado à verificação do prejuízo, patente será a obrigação de indenizar, como se afigura a hipótese em exame. Preenchidos, assim, os elementos da responsabilidade civil travada nestes autos: a) ato ilícito; b) dano; e, c) nexo causal. Nessa intelecção, julgados da Turma Recursal deste Estado em que reconhecem a configuração do dano moral: EMENTA: RECURSO INOMINADO CÍVEL. CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIRO. ALTERAÇÃO UNILATERAL DE ITINERÁRIO. ALEGAÇÃO DE REORGANIZAÇÃO DE MALHA AÉREA. AUSÊNCIA DE PROVA DE AVISO PRÉVIO EM TEMPO HÁBIL. TELAS SISTÊMICAS. ATRASO SUPERIOR A 12 (DOZE) HORAS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. INDENIZAÇÃO CORRETAMENTE FIXADA. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO NÃO PROVIDO. 1- A impossibilidade de cumprir o contrato de transporte, da forma como convencionada, quer por razões climáticas, ou qualquer outro motivo, não afasta a responsabilidade do prestador do serviço de transporte aéreo de disponibilizar outro meio menos gravoso, capaz de atender às necessidades do consumidor, de forma a minimizar os transtornos. 2- Na fixação do valor do dano moral, deve o julgador observar as particularidades do caso concreto, dentre as quais as condições e capacidade das partes, o grau de culpa, caráter reparatório sem importar em enriquecimento sem causa, estabelecendo o montante pelos critérios da razoabilidade e proporcionalidade. 3- Sentença mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do artigo 46, da Lei n.º 9.099/95 c.c. art. 60, §§ 1º e 2º do Regimento Interno das Turmas Recursais Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso (Resolução TJMT/OE n.º 016/23/TJMT), fazendo parte integrante deste voto. 4- Nos termos do art. 55, da Lei nº 9.099/95, condeno a parte Recorrente ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes que arbitro: 4.1) inexistindo condenação em primeiro grau, em 15% (quinze por cento) sobre o valor corrigido da causa; 4.2) havendo condenação, em 20% (vinte por cento) sobre o valor desta; 4.3) considerado o proveito econômico inestimável ou irrisório, ou o valor da causa for muito baixo (até 3 salários mínimos), fixo o valor em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), nos termos do art. 85, §§ 8º e 8º-A, do CPC; 4.4) fica ressalvado eventual benefício da Justiça Gratuita, em relação à execução das verbas sucumbenciais. 5- Preclusa a via recursal, retornem os autos ao Juizado de origem, ou arquive-se, conforme o caso. (N.U 1010975-78.2023.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, WALTER PEREIRA DE SOUZA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 24/02/2025, Publicado no DJE 27/02/2025) DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSOS INOMINADOS. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO. ATRASO SUPERIOR A 22 HORAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA COMPANHIA AÉREA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA FORÇA MAIOR. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO. RECURSO DA PARTE RÉ DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recursos Inominados interpostos contra sentença que condenou a Gol Linhas Aéreas S/A ao pagamento de indenização por danos materiais e morais em virtude do cancelamento do voo contratado, o que resultou em atraso de aproximadamente 22 horas na chegada ao destino final. 2. A parte autora pleiteia a majoração do valor arbitrado a título de danos morais, enquanto a companhia aérea sustenta a inexistência de responsabilidade, sob a justificativa de que o atraso decorreu de força maior, pleiteando a exclusão ou redução da condenação. II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se a alegação de força maior, decorrente de condições meteorológicas adversas e reestruturação da malha aérea, exclui a responsabilidade da companhia aérea pelo cancelamento do voo; (ii) se o montante fixado a título de danos morais atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade; III. Razões de decidir 4. O art. 14 do CDC estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pelos danos causados ao consumidor, independentemente de culpa, salvo nos casos de força maior ou caso fortuito externo. 5. A simples apresentação de prints de notícias e de sistema interno da companhia aérea, sem a devida comprovação por meio de nota técnica ou documento oficial, não constitui prova idônea da alegada força maior. Assim, a reestruturação da malha aérea configura fortuito interno, inerente aos riscos da atividade empresarial, não se prestando para afastar a responsabilidade da fornecedora de serviços. 6. Considerando a intensidade dos transtornos sofridos, o tempo excessivo de atraso e a falta de assistência adequada, impõe-se a majoração do montante indenizatório para R$ 8.000,00 (oito mil reais), quantia que atende aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando o enriquecimento indevido da parte autora e desestimulando a reiteração da conduta ilícita pela companhia aérea. IV. Dispositivo 7. Recurso da parte autora provido para majorar a indenização por danos morais para R$ 8.000,00 (oito mil reais), mantendo-se inalterados os demais termos da sentença. (N.U 1003578-11.2024.8.11.0040, TURMA RECURSAL CÍVEL, EDSON DIAS REIS, Segunda Turma Recursal, Julgado em 24/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025) RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – RELAÇÃO DE CONSUMO - TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - DEVER DE INDENIZAR - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Eventuais falhas técnicas em equipamentos ou a necessidade de readequação da malha aérea não eximem o transportador da responsabilidade de reparar ou compensar os danos decorrentes, mormente quando não comprovado excludente de responsabilidade. Os transtornos sofridos geram abalo emocional e, consequentemente, o dever de indenizar. Dano material e moral configurado. (N.U 1000435-02.2023.8.11.0023, TURMA RECURSAL CÍVEL, EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Primeira Turma Recursal, Julgado em 18/09/2023, Publicado no DJE 23/09/2023) RECURSO INOMINADO. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DO VOO. PASSAGEIRA REACOMODADA NO PRÓXIMO VOO. ALEGAÇÃO INTENSO TRÁFEGO AÉREO. CASO FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA NA PRESTAÇÃO. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA AÉREA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços à responsabilidade objetiva quanto aos danos causados a consumidora. A empresa de aviação que permite o atraso de voo de seus passageiros, age negligentemente e gera a obrigação de indenizar a título de dano moral. (TR-MT, N.U 1004850-94.2023.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Terceira Turma Recursal, Julgado em 11/09/2023, Publicado no DJE 15/09/2023) AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO QUE CULMINOU COM A PERDA DE CONEXÃO. ATRASO DE 24 HORAS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. PLEITO DE IMPROCEDÊNCIA OU REDUÇÃO DO DANO MORAL. ALEGAÇÃO DE INTENSO TRÁFEGO AÉREO. FALTA DE COMPROVAÇÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR QUE NÃO COMPORTA REDUÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Recurso inominado. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor, decorrentes de falha na prestação de serviço, baseada na teoria do risco do negócio. O intenso tráfego aéreo não é causa de exclusão da responsabilidade da empresa aérea, pelo atraso de voo que levou o passageiro a chegar a seu destino, com atraso de 24 horas. Fato que caracteriza abalo emocional indenizável economicamente Danos morais configurados. Sentença mantida. Recurso conhecido e desprovido. (TR-MT, N.U 1042213-23.2020.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Turma Recursal Única, Julgado em 19/09/2022, Publicado no DJE 23/09/2022) À vista disso, conclui-se que a situação em apreço ultrapassou os limites do mero aborrecimento ou dissabor. O dano moral além de servir como reparação do prejuízo moral suportado indevidamente, serve também como instrumento didático pedagógico para que as empresas e os estabelecimentos comerciais se ajustem ao Código de Defesa do Consumidor e passem a respeitar não só a legislação em vigor, mas o consumidor e a própria relação de consumo. Feitas as ponderações acima, considera-se adequada a fixação da indenização pelo dano moral no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), notadamente considerando que, em razão da falha na prestação de serviço da companhia aérea, chegou ao seu destino final com mais de 12 (doze) horas de atraso. Por fim, em relação aos danos materiais verifica-se que a parte ré em contestação informou que disponibilizou a finalização do trajeto via terrestre por ônibus, o qual não foi aceito pelo consumidor que optou por alugar um carro, informações não impugnadas pelo autor. O pedido formulado na petição inicial limita-se especificamente à indenização pelo valor despendido com o aluguel de veículo no montante de R$ 272,40, sem pleitear qualquer restituição ou compensação pela diferença entre o transporte aéreo contratado e o transporte terrestre oferecido. Portanto, nos termos do princípio da congruência (art. 492 do CPC), a análise judicial deve se restringir ao pedido tal como formulado. Nesse ponto, o pedido de ressarcimento pelo aluguel do automóvel deve ser julgado improcedente, ainda que se reconheça o descumprimento contratual por parte da companhia aérea no que tange à obrigação de transportar o autor por meio aéreo. Isso porque houve oferta de transporte alternativo (ônibus) para finalização do trajeto, o que, embora não equivalente em conforto ou celeridade, representou cumprimento parcial da obrigação de transporte, minimizando o prejuízo e enquadrando-se dentro das medidas de mitigação previstas na Resolução ANAC nº 400/2016 (art. 21, II). Assim, ao optar deliberadamente por meio próprio e mais oneroso de deslocamento (locação de automóvel), o consumidor assumiu voluntariamente um custo superior à alternativa oferecida pela ré, o que quebra o nexo de causalidade direta entre o ilícito contratual e o gasto com a locação. Ressalte-se que o reconhecimento do descumprimento contratual pela não realização do transporte aéreo conforme contratado não se confunde com o cabimento da indenização específica pleiteada, já que não foi formulado pedido de ressarcimento proporcional entre o valor pago pelo trecho aéreo e o efetivamente prestado via terrestre, o que poderia ensejar outro tipo de avaliação. Portanto, diante da limitação objetiva do pedido à quantia despendida com aluguel de veículo, e considerando que havia transporte alternativo ofertado, julga-se improcedente o pedido de indenização por danos materiais, nos termos em que formulado na petição inicial. Dispositivo Desta feita, com base nos artigos 487, inciso I, do Código de Processo Civil c/c artigo 6º da Lei n.º 9.099/95, opino por julgar parcialmente procedente a pretensão vindicada pela parte autora, a fim de condenar a ré ao pagamento a título de danos morais, a quantia R$ 6.000,00 (seis mil reais), com correção monetária pelo IPCA/IBGE (CC, art. 389, “caput” e parágrafo único), desde o arbitramento (Súmula/STJ nº 362) e juros moratórios pela taxa Selic, deduzindo-se dela o índice de atualização monetária (CC, art. 406, “caput” e parágrafos), a partir da citação. Sem custas e honorários advocatícios neste grau de jurisdição, a teor dos artigos 54 e 55 da Lei 9.099/95. Submeto o presente projeto de SENTENÇA ao MM. Juiz de Direito para os fins estabelecidos no artigo 40 da Lei nº. 9.099/1995. Jéssica da Silva Jesus Caetano Juíza Leiga Vistos. Homologa-se a sentença derradeira elaborada pela Juíza Leiga, com espeque no artigo 40 da Lei nº 9.099/95. Transitado em julgado a sentença, arquive-se, mediante as baixas e anotações de estilo. Publicada e registrada na presente data pelo sistema PJE. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá, data registrada no sistema. Flávio Maldonado De Barros Juiz de Direito

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Processo nº 1008896-77.2024.8.11.0006

ID: 330721806

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1008896-77.2024.8.11.0006

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

SERGIO GONINI BENICIO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008896-77.2024.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Cartão de Crédito] Relator: … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008896-77.2024.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Cartão de Crédito] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [SONIA FERREIRA MARTINS - CPF: 832.933.101-68 (APELADO), SILMARA PINHEIRO LIMA BASTO - CPF: 531.734.651-72 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGADA ABUSIVIDADE. PEDIDO DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO COMPROVADO. VALIDADE DO CONTRATO RECONHECIDA. JUROS DENTRO DA MÉDIA DE MERCADO. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por BANCO BMG S.A. contra sentença que, nos autos de ação declaratória cumulada com pedidos de conversão contratual, repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada por SONIA FERREIRA MARTINS, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: (i) determinar a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado pessoal, com aplicação da taxa média de juros divulgada pelo BACEN à época da contratação; e (ii) condenar o banco à restituição dos valores descontados indevidamente, a serem apurados em liquidação. Houve ainda fixação de sucumbência recíproca. O banco apelante sustenta, preliminarmente, a ocorrência de prescrição e decadência. No mérito, defende a validade do contrato celebrado e a ausência de vício de consentimento, pleiteando a improcedência total da demanda. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se estão configuradas a prescrição e a decadência dos pedidos formulados na ação; (ii) estabelecer se há vício de consentimento ou abuso na contratação de cartão de crédito consignado que justifique sua conversão em empréstimo pessoal; e (iii) determinar se os encargos cobrados são abusivos a ponto de justificar a restituição dos valores e indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A prescrição e a decadência não se configuram, pois o contrato é de trato sucessivo, com descontos mensais ainda em curso, de modo que o prazo prescricional conta-se do vencimento da última parcela, que não ocorreu. 4. A contratação do cartão de crédito consignado encontra respaldo em documento claro e inequívoco, com título expresso (“Cédula de Crédito Bancário – Saque mediante a utilização do Cartão de Crédito Consignado”), não havendo demonstração de erro, dolo, coação ou qualquer outro vício de vontade. 5. A parte autora, civilmente capaz, reconhece ter recebido os valores contratados, não impugna sua titularidade ou uso, tampouco devolve os valores, o que afasta alegações de induzimento a erro e impede a desconstituição do contrato. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso reconhece a validade de contratos dessa natureza quando presentes informações claras e a efetiva fruição dos valores contratados, como no caso concreto. 7. A taxa de juros contratada não extrapola, de forma abusiva, os limites reconhecidos pela jurisprudência, ainda que acima da média de mercado, não se justificando a revisão judicial ou devolução de valores. 8. Inexistindo prova de prática abusiva, vício de consentimento ou dano extrapatrimonial, revela-se indevida a conversão do contrato e a pretensão de restituição ou indenização. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O contrato de cartão de crédito consignado firmado com informações claras e com liberação de valores em favor do contratante presume-se válido, afastando a alegação de vício de consentimento. 2. A natureza sucessiva dos descontos em folha impede o reconhecimento de prescrição e decadência enquanto vigente a relação contratual. 3. A cobrança de juros superiores à média de mercado, mas não exorbitantes ou abusivos, não configura ilegalidade ou abuso passível de revisão judicial. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por BANCO BMG S.A contra sentença proferida na “Ação Declaratória de Abusividade Contratual C/C com Pedidos de Conversão de Contrato, Danos Materiais e Danos Morais e Pedido de Tutela de Urgência” ajuizada pela parte recorrida SONIA FERREIRA MARTINS, que tramita perante a 2ª Vara Cível de Cáceres - MT. O magistrado a quo, em sentença, (ID. 284376885 - ID de origem 186654204), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: Determinar a conversão do contrato para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, aplicando-se a taxa média de juros do mercado referente a essa operação, conforme fixado pelo BACEN à época da contratação; Condenar a parte requerida a restituir os valores descontados indevidamente, a serem apurados em fase de liquidação de sentença, com atualização monetária pelo IPCA desde cada desconto e juros de mora pela taxa SELIC a partir da citação, facultada a compensação; Diante da sucumbência recíproca, fixou a responsabilidade pelo pagamento das custas processuais e honorários advocatícios na proporção de 80% para a parte requerida e 20% para a parte autora, sendo os honorários fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. O apelante em suas razões (ID. 284376887 - ID de origem 189401022) alega, preliminarmente, a prescrição e decadência. Alega que o contrato foi firmado e o primeiro desconto ocorreu em 2009, mas a ação foi proposta apenas em 2023. Assim, o prazo de três anos para indenização e quatro anos para anulação do contrato já teria expirado. No mérito, contesta a conclusão de vício de informação na contratação do cartão consignado. Sustenta que o contrato foi firmado com plena ciência da autora, e que esta realizou saques e compras com o cartão, comprovando conhecimento da natureza jurídica da operação. Afirma que a conversão do contrato para empréstimo viola a autonomia das partes e o princípio da força obrigatória dos contratos. A autora teria ciência dos descontos mensais, correspondentes ao valor mínimo da fatura, típicos do cartão consignado. Sustenta a legalidade da taxa de juros pactuada, apontando que a Lei de Usura não se aplica às instituições financeiras, conforme súmula 596 do STF. Argumenta que os encargos respeitam a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN. Requer provimento, com a reforma total da sentença e julgamento de improcedência dos pedidos. Alternativamente, pleiteia o reconhecimento da prescrição e decadência para afastar os pedidos de indenização e de nulidade do contrato. Contrarrazões sob ID. 284376892 - ID de origem 192764048. É o relatório. V O T O R E L A T O R Na origem trata-se de ação declaratória e indenizatória proposta por SONIA FERREIRA MARTINS contra BANCO BMG S.A., visando à conversão de contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado tradicional, com restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. A parte autora alega que não contratou cartão de crédito consignado, mas sim empréstimo com parcelas fixas descontadas em folha, sendo surpreendida com descontos mensais que não amortizavam o valor principal. O BANCO BMG S.A. apresentou contestação, defendendo a validade da contratação e arguindo preliminares, bem como a regularidade da contratação e a inexistência de vícios capazes de anular o contrato. O magistrado de 1º grau rejeitou as preliminares e, no mérito reconheceu a falha no dever de informação. Considerou abusiva a conduta do banco, por impor uma modalidade que perpetua o endividamento, autorizando a conversão para empréstimo consignado com aplicação da taxa média de mercado do BACEN. A tese recursal reside na afirmação de configuração de legalidade do contrato pactuado entre as partes. Com relação a prescrição suscitada, importante constar que o objeto da lide se refere a contrato de cartão de crédito consignado, cuja obrigação é de trato sucessivo, em que o termo inicial do prazo prescricional é o vencimento da última parcela, que ainda não ocorreu. Quanto à decadência, de igual forma, é cediço que os descontos realizados pela instituição bancária se renovam mensalmente, por isso, não há que se falar em consumação do direito alegado, pois o contrato ainda está vigente. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR LEVANTADA PELA RECORRENTE – CERCEAMENTO DE DEFESA – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINARES FORMULADAS EM CONTRARRAZÕES – VIOLAÇÃO A DIALETICIDADE – NÃO OCORRÊNCIA - DECADÊNCIA DO DIREITO PARA ANULAR O NEGÓCIO JURÍDICO – AFASTADA – RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – OPERAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...). Considerando a ausência de quitação do valor emprestado pelo consumidor, não há razões para o acolhimento do prazo decadencial para se postular a anulação do negócio jurídico, ex vi do art. 178 do Código Civil. Ocorrência da prescrição parcial das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação. Prejudicada. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de dezenove saques, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT 10300163320208110002 MT, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 10/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/08/2022). (g.n). Logo, não há que se falar em prescrição ou decadência, mesmo que parcial, pois apesar da contratação realizada há muitos anos, as prestações continuaram a ser debitadas até os dias atuais. Rejeito as prejudiciais de mérito de prescrição e decadência. Em relação a contratação do produto bancário refutado, verifico que a parte autora em nenhum momento afirma desconhecer a instituição bancária, mas sim, que contratou empréstimo consignado e que, posteriormente, constatou de que se tratava de empréstimo na modalidade cartão de crédito consignado. Nesse passo, é cediço que os contratos de natureza bancária estão inseridos no rol dos contratos de adesão, portanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é imperiosa e também por constar a atividade bancária expressamente elencada no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nesse mesmo sentido é o entendimento sedimentado do c. Superior Tribunal de Justiça, disposto na Súmula 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Quanto a distribuição do ônus da prova, verifico que a ausência de declaração de negativa de relação jurídica com a instituição financeira, somada a declaração de anuência e recebimento de crédito relativo a empréstimo, por si só, evidencia a concordância tácita da parte autora com os termos pactuados. A controvérsia cinge-se à alegação da parte autora de que fora ludibriada pela instituição financeira ao firmar contrato de cartão de crédito consignado, sob a falsa aparência de empréstimo pessoal, o que implicaria vício de consentimento por ausência de transparência, em suposta violação ao Código de Defesa do Consumidor. Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que sob o ID. 284376871 - ID de origem 171629904, restou acostado instrumento contratual denominado "“CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – SAQUE MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO”. O título do documento, grafado em letras garrafais no cabeçalho, revela inequivocamente a natureza jurídica do ajuste celebrado. A parte autora, pessoa civilmente capaz, não alega a existência de quaisquer vícios invalidantes do consentimento stricto sensu, como coação, dolo ou incapacidade superveniente. Ao revés, limita-se a sustentar ausência de transparência, argumento que, embora relevante sob a ótica da boa-fé objetiva, demanda demonstração cabal de que os elementos contratuais foram ocultados ou redigidos de forma a induzir erro substancial, o que não se verifica no caso concreto. A clareza do cabeçalho contratual e a designação expressa da natureza do produto financeiro infirmam a tese de simulação ou induzimento. Outrossim, os documentos juntados sob o ID. ID. 284376875 - Pág. 1 e seguintes demonstram a efetivação de transferências bancárias em favor da requerente, que, em momento algum, impugnou a titularidade das contas recebedoras, tampouco apresentou prova da não fruição dos valores recebidos ou de eventual devolução. Trata-se, portanto, de vantagem econômica auferida em decorrência do ajuste, cujos efeitos não podem ser unilateralmente desconstituídos sem devolução do equivalente patrimonial, sob pena de afronta ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Portanto, à míngua de prova contundente de defeito na formação da vontade, e diante da existência de contrato com designação expressa da operação de crédito por cartão consignado, somada à efetiva disponibilização dos valores contratados, não se sustenta a pretensão desconstitutiva ou reparatória formulada na origem. A narrativa da parte autora, destituída de comprovação robusta, não supera a presunção de validade do contrato assinado, tampouco evidencia prática abusiva da instituição financeira que justifique intervenção judicial corretiva. Além disso, considerando o período em que as partes mantêm relacionamento negocial - contrato assinado em 21/10/2010 - se aplica o princípio do venire contra factum proprium, que veda a adoção de comportamento contraditório após prolongada execução do contrato, gerando legítima expectativa na contraparte. Do mesmo modo, além de anuir com o avençado, que expressamente previa o produto bancário ora refutado - cartão de crédito – efetivamente recebeu o valor emprestado, inclusive a título de saque complementar. ID. 284376874 - Pág. 21: O saque através do cartão de crédito é uma modalidade de operação disponibilizada por instituições financeiras, na qual o titular do cartão de crédito pode sacar valores dentro do limite disponível no cartão. De acordo com o Código Civil, a interpretação das manifestações de vontade deve considerar o comportamento das partes envolvidas, sobretudo quando este comportamento é praticado de forma consistente e habitual, como ocorre no presente caso. Desta forma: “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.” Outrossim, o banco comprovou a realização de transferências em favor da parte autora, demonstrando a efetiva concretização do negócio, que não foi desconstituído pela parte autora. Dessa forma, restou evidenciada a contratação de empréstimo através de cartão de crédito, visto que o requerido acostou aos autos o instrumento devidamente assinado pelo autor, com informações claras sobre as características do negócio jurídico. A jurisprudência deste sodalício trilha no mesmo sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE PLENO CONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO – CONSTATAÇÃO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DO AUTOR – CONTRATO COM INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS QUANTO AOS TERMOS DA CONTRATAÇÃO – ASSINATURA IDÊNTICA ÀS DOS DOCUMENTOS PESSOAIS DO CONTRATANTE – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que o requerido acostou aos autos o contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito em sua conta corrente, há que ser reformada a sentença para julgar improcedente a lide. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo)” (N.U 1004850-76.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/10/2021). Inexiste prova nos autos de ocorrência de vício de vontade que possa anular o acordo travado entre as partes. Nos vícios de vontade o prejudicado é um dos contratantes, pois há manifestação da vontade sem corresponder com o seu verdadeiro querer. Já os vícios sociais se consubstanciam em atos contrários à boa fé ou à lei, prejudicando terceiro. São vícios da vontade: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão; e vícios sociais: a fraude contra credores e a simulação. A anulação de um ato jurídico depende da demonstração inequívoca da existência de vício de consentimento, resultante de erro, dolo ou coação (art. 151 e seguintes do Código Civil), capaz de atingir a manifestação de vontade do agente, interferindo na elaboração do negócio jurídico que se pretende anular. Por fim, a taxa de juros contratada não se mostra ilegal, posto que não extrapola os limites convencionados pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A percepção quanto aos critérios para aferição de eventual cobrança excessiva encontra suporte nos precedentes citados: "A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp. 1.036.818, Terceira Turma, MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.” Nesse sentido, colaciona-se a taxa de juros estipulada entre as partes (4,8% a.m): ID. 284376874 - Pág. 21: Por sua vez, o Banco Central indicou que a média da taxa mensal de juros cobrado pela instituição financeira redundou em 2,01% a.m: (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico/?historicotaxajurosdiario_page=1&codigoSegmento=1&codigoModalidade=218101&tipoModalidade=D&InicioPeriodo=2019-07-15). Não há que se falar em ilegalidade dos juros contratados, se estes se encontram em patamar considerado legal pela jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça. Com tais considerações e diante da comprovação documental da efetivação do negócio jurídico com base do acordo de vontades e recebimento do valor pela parte autora, tenho como válido o contrato questionado em sua integralidade, razão pela qual não há que se falar em nulidade do pacto, conversão, repetição do indébito ou reparação de danos morais. Com essas considerações, CONHEÇO do RECURSO, e DOU PROVIMENTO para julgar a presente ação improcedente. CONDENO a parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atribuído a causa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1008896-77.2024.8.11.0006

ID: 330721807

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1008896-77.2024.8.11.0006

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SONIA FERREIRA MARTINS

Acórdão

Advogados:

SILMARA PINHEIRO LIMA BASTO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008896-77.2024.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Cartão de Crédito] Relator: … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008896-77.2024.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Cartão de Crédito] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [SONIA FERREIRA MARTINS - CPF: 832.933.101-68 (APELADO), SILMARA PINHEIRO LIMA BASTO - CPF: 531.734.651-72 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGADA ABUSIVIDADE. PEDIDO DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO COMPROVADO. VALIDADE DO CONTRATO RECONHECIDA. JUROS DENTRO DA MÉDIA DE MERCADO. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por BANCO BMG S.A. contra sentença que, nos autos de ação declaratória cumulada com pedidos de conversão contratual, repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada por SONIA FERREIRA MARTINS, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: (i) determinar a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado pessoal, com aplicação da taxa média de juros divulgada pelo BACEN à época da contratação; e (ii) condenar o banco à restituição dos valores descontados indevidamente, a serem apurados em liquidação. Houve ainda fixação de sucumbência recíproca. O banco apelante sustenta, preliminarmente, a ocorrência de prescrição e decadência. No mérito, defende a validade do contrato celebrado e a ausência de vício de consentimento, pleiteando a improcedência total da demanda. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se estão configuradas a prescrição e a decadência dos pedidos formulados na ação; (ii) estabelecer se há vício de consentimento ou abuso na contratação de cartão de crédito consignado que justifique sua conversão em empréstimo pessoal; e (iii) determinar se os encargos cobrados são abusivos a ponto de justificar a restituição dos valores e indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A prescrição e a decadência não se configuram, pois o contrato é de trato sucessivo, com descontos mensais ainda em curso, de modo que o prazo prescricional conta-se do vencimento da última parcela, que não ocorreu. 4. A contratação do cartão de crédito consignado encontra respaldo em documento claro e inequívoco, com título expresso (“Cédula de Crédito Bancário – Saque mediante a utilização do Cartão de Crédito Consignado”), não havendo demonstração de erro, dolo, coação ou qualquer outro vício de vontade. 5. A parte autora, civilmente capaz, reconhece ter recebido os valores contratados, não impugna sua titularidade ou uso, tampouco devolve os valores, o que afasta alegações de induzimento a erro e impede a desconstituição do contrato. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso reconhece a validade de contratos dessa natureza quando presentes informações claras e a efetiva fruição dos valores contratados, como no caso concreto. 7. A taxa de juros contratada não extrapola, de forma abusiva, os limites reconhecidos pela jurisprudência, ainda que acima da média de mercado, não se justificando a revisão judicial ou devolução de valores. 8. Inexistindo prova de prática abusiva, vício de consentimento ou dano extrapatrimonial, revela-se indevida a conversão do contrato e a pretensão de restituição ou indenização. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O contrato de cartão de crédito consignado firmado com informações claras e com liberação de valores em favor do contratante presume-se válido, afastando a alegação de vício de consentimento. 2. A natureza sucessiva dos descontos em folha impede o reconhecimento de prescrição e decadência enquanto vigente a relação contratual. 3. A cobrança de juros superiores à média de mercado, mas não exorbitantes ou abusivos, não configura ilegalidade ou abuso passível de revisão judicial. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por BANCO BMG S.A contra sentença proferida na “Ação Declaratória de Abusividade Contratual C/C com Pedidos de Conversão de Contrato, Danos Materiais e Danos Morais e Pedido de Tutela de Urgência” ajuizada pela parte recorrida SONIA FERREIRA MARTINS, que tramita perante a 2ª Vara Cível de Cáceres - MT. O magistrado a quo, em sentença, (ID. 284376885 - ID de origem 186654204), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: Determinar a conversão do contrato para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, aplicando-se a taxa média de juros do mercado referente a essa operação, conforme fixado pelo BACEN à época da contratação; Condenar a parte requerida a restituir os valores descontados indevidamente, a serem apurados em fase de liquidação de sentença, com atualização monetária pelo IPCA desde cada desconto e juros de mora pela taxa SELIC a partir da citação, facultada a compensação; Diante da sucumbência recíproca, fixou a responsabilidade pelo pagamento das custas processuais e honorários advocatícios na proporção de 80% para a parte requerida e 20% para a parte autora, sendo os honorários fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. O apelante em suas razões (ID. 284376887 - ID de origem 189401022) alega, preliminarmente, a prescrição e decadência. Alega que o contrato foi firmado e o primeiro desconto ocorreu em 2009, mas a ação foi proposta apenas em 2023. Assim, o prazo de três anos para indenização e quatro anos para anulação do contrato já teria expirado. No mérito, contesta a conclusão de vício de informação na contratação do cartão consignado. Sustenta que o contrato foi firmado com plena ciência da autora, e que esta realizou saques e compras com o cartão, comprovando conhecimento da natureza jurídica da operação. Afirma que a conversão do contrato para empréstimo viola a autonomia das partes e o princípio da força obrigatória dos contratos. A autora teria ciência dos descontos mensais, correspondentes ao valor mínimo da fatura, típicos do cartão consignado. Sustenta a legalidade da taxa de juros pactuada, apontando que a Lei de Usura não se aplica às instituições financeiras, conforme súmula 596 do STF. Argumenta que os encargos respeitam a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN. Requer provimento, com a reforma total da sentença e julgamento de improcedência dos pedidos. Alternativamente, pleiteia o reconhecimento da prescrição e decadência para afastar os pedidos de indenização e de nulidade do contrato. Contrarrazões sob ID. 284376892 - ID de origem 192764048. É o relatório. V O T O R E L A T O R Na origem trata-se de ação declaratória e indenizatória proposta por SONIA FERREIRA MARTINS contra BANCO BMG S.A., visando à conversão de contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado tradicional, com restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. A parte autora alega que não contratou cartão de crédito consignado, mas sim empréstimo com parcelas fixas descontadas em folha, sendo surpreendida com descontos mensais que não amortizavam o valor principal. O BANCO BMG S.A. apresentou contestação, defendendo a validade da contratação e arguindo preliminares, bem como a regularidade da contratação e a inexistência de vícios capazes de anular o contrato. O magistrado de 1º grau rejeitou as preliminares e, no mérito reconheceu a falha no dever de informação. Considerou abusiva a conduta do banco, por impor uma modalidade que perpetua o endividamento, autorizando a conversão para empréstimo consignado com aplicação da taxa média de mercado do BACEN. A tese recursal reside na afirmação de configuração de legalidade do contrato pactuado entre as partes. Com relação a prescrição suscitada, importante constar que o objeto da lide se refere a contrato de cartão de crédito consignado, cuja obrigação é de trato sucessivo, em que o termo inicial do prazo prescricional é o vencimento da última parcela, que ainda não ocorreu. Quanto à decadência, de igual forma, é cediço que os descontos realizados pela instituição bancária se renovam mensalmente, por isso, não há que se falar em consumação do direito alegado, pois o contrato ainda está vigente. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR LEVANTADA PELA RECORRENTE – CERCEAMENTO DE DEFESA – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINARES FORMULADAS EM CONTRARRAZÕES – VIOLAÇÃO A DIALETICIDADE – NÃO OCORRÊNCIA - DECADÊNCIA DO DIREITO PARA ANULAR O NEGÓCIO JURÍDICO – AFASTADA – RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – OPERAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...). Considerando a ausência de quitação do valor emprestado pelo consumidor, não há razões para o acolhimento do prazo decadencial para se postular a anulação do negócio jurídico, ex vi do art. 178 do Código Civil. Ocorrência da prescrição parcial das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação. Prejudicada. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de dezenove saques, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT 10300163320208110002 MT, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 10/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/08/2022). (g.n). Logo, não há que se falar em prescrição ou decadência, mesmo que parcial, pois apesar da contratação realizada há muitos anos, as prestações continuaram a ser debitadas até os dias atuais. Rejeito as prejudiciais de mérito de prescrição e decadência. Em relação a contratação do produto bancário refutado, verifico que a parte autora em nenhum momento afirma desconhecer a instituição bancária, mas sim, que contratou empréstimo consignado e que, posteriormente, constatou de que se tratava de empréstimo na modalidade cartão de crédito consignado. Nesse passo, é cediço que os contratos de natureza bancária estão inseridos no rol dos contratos de adesão, portanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é imperiosa e também por constar a atividade bancária expressamente elencada no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nesse mesmo sentido é o entendimento sedimentado do c. Superior Tribunal de Justiça, disposto na Súmula 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Quanto a distribuição do ônus da prova, verifico que a ausência de declaração de negativa de relação jurídica com a instituição financeira, somada a declaração de anuência e recebimento de crédito relativo a empréstimo, por si só, evidencia a concordância tácita da parte autora com os termos pactuados. A controvérsia cinge-se à alegação da parte autora de que fora ludibriada pela instituição financeira ao firmar contrato de cartão de crédito consignado, sob a falsa aparência de empréstimo pessoal, o que implicaria vício de consentimento por ausência de transparência, em suposta violação ao Código de Defesa do Consumidor. Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que sob o ID. 284376871 - ID de origem 171629904, restou acostado instrumento contratual denominado "“CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – SAQUE MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO”. O título do documento, grafado em letras garrafais no cabeçalho, revela inequivocamente a natureza jurídica do ajuste celebrado. A parte autora, pessoa civilmente capaz, não alega a existência de quaisquer vícios invalidantes do consentimento stricto sensu, como coação, dolo ou incapacidade superveniente. Ao revés, limita-se a sustentar ausência de transparência, argumento que, embora relevante sob a ótica da boa-fé objetiva, demanda demonstração cabal de que os elementos contratuais foram ocultados ou redigidos de forma a induzir erro substancial, o que não se verifica no caso concreto. A clareza do cabeçalho contratual e a designação expressa da natureza do produto financeiro infirmam a tese de simulação ou induzimento. Outrossim, os documentos juntados sob o ID. ID. 284376875 - Pág. 1 e seguintes demonstram a efetivação de transferências bancárias em favor da requerente, que, em momento algum, impugnou a titularidade das contas recebedoras, tampouco apresentou prova da não fruição dos valores recebidos ou de eventual devolução. Trata-se, portanto, de vantagem econômica auferida em decorrência do ajuste, cujos efeitos não podem ser unilateralmente desconstituídos sem devolução do equivalente patrimonial, sob pena de afronta ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Portanto, à míngua de prova contundente de defeito na formação da vontade, e diante da existência de contrato com designação expressa da operação de crédito por cartão consignado, somada à efetiva disponibilização dos valores contratados, não se sustenta a pretensão desconstitutiva ou reparatória formulada na origem. A narrativa da parte autora, destituída de comprovação robusta, não supera a presunção de validade do contrato assinado, tampouco evidencia prática abusiva da instituição financeira que justifique intervenção judicial corretiva. Além disso, considerando o período em que as partes mantêm relacionamento negocial - contrato assinado em 21/10/2010 - se aplica o princípio do venire contra factum proprium, que veda a adoção de comportamento contraditório após prolongada execução do contrato, gerando legítima expectativa na contraparte. Do mesmo modo, além de anuir com o avençado, que expressamente previa o produto bancário ora refutado - cartão de crédito – efetivamente recebeu o valor emprestado, inclusive a título de saque complementar. ID. 284376874 - Pág. 21: O saque através do cartão de crédito é uma modalidade de operação disponibilizada por instituições financeiras, na qual o titular do cartão de crédito pode sacar valores dentro do limite disponível no cartão. De acordo com o Código Civil, a interpretação das manifestações de vontade deve considerar o comportamento das partes envolvidas, sobretudo quando este comportamento é praticado de forma consistente e habitual, como ocorre no presente caso. Desta forma: “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.” Outrossim, o banco comprovou a realização de transferências em favor da parte autora, demonstrando a efetiva concretização do negócio, que não foi desconstituído pela parte autora. Dessa forma, restou evidenciada a contratação de empréstimo através de cartão de crédito, visto que o requerido acostou aos autos o instrumento devidamente assinado pelo autor, com informações claras sobre as características do negócio jurídico. A jurisprudência deste sodalício trilha no mesmo sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE PLENO CONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO – CONSTATAÇÃO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DO AUTOR – CONTRATO COM INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS QUANTO AOS TERMOS DA CONTRATAÇÃO – ASSINATURA IDÊNTICA ÀS DOS DOCUMENTOS PESSOAIS DO CONTRATANTE – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que o requerido acostou aos autos o contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito em sua conta corrente, há que ser reformada a sentença para julgar improcedente a lide. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo)” (N.U 1004850-76.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/10/2021). Inexiste prova nos autos de ocorrência de vício de vontade que possa anular o acordo travado entre as partes. Nos vícios de vontade o prejudicado é um dos contratantes, pois há manifestação da vontade sem corresponder com o seu verdadeiro querer. Já os vícios sociais se consubstanciam em atos contrários à boa fé ou à lei, prejudicando terceiro. São vícios da vontade: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão; e vícios sociais: a fraude contra credores e a simulação. A anulação de um ato jurídico depende da demonstração inequívoca da existência de vício de consentimento, resultante de erro, dolo ou coação (art. 151 e seguintes do Código Civil), capaz de atingir a manifestação de vontade do agente, interferindo na elaboração do negócio jurídico que se pretende anular. Por fim, a taxa de juros contratada não se mostra ilegal, posto que não extrapola os limites convencionados pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A percepção quanto aos critérios para aferição de eventual cobrança excessiva encontra suporte nos precedentes citados: "A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp. 1.036.818, Terceira Turma, MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.” Nesse sentido, colaciona-se a taxa de juros estipulada entre as partes (4,8% a.m): ID. 284376874 - Pág. 21: Por sua vez, o Banco Central indicou que a média da taxa mensal de juros cobrado pela instituição financeira redundou em 2,01% a.m: (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico/?historicotaxajurosdiario_page=1&codigoSegmento=1&codigoModalidade=218101&tipoModalidade=D&InicioPeriodo=2019-07-15). Não há que se falar em ilegalidade dos juros contratados, se estes se encontram em patamar considerado legal pela jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça. Com tais considerações e diante da comprovação documental da efetivação do negócio jurídico com base do acordo de vontades e recebimento do valor pela parte autora, tenho como válido o contrato questionado em sua integralidade, razão pela qual não há que se falar em nulidade do pacto, conversão, repetição do indébito ou reparação de danos morais. Com essas considerações, CONHEÇO do RECURSO, e DOU PROVIMENTO para julgar a presente ação improcedente. CONDENO a parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atribuído a causa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1004850-29.2025.8.11.0000

ID: 333550672

Tribunal: TJMT Órgão: Vice-Presidência Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1004850-29.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

BANCO DO BRASIL SA

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

JOSE ARNALDO JANSSEN NOGUEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

SERVIO TULIO DE BARCELOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL Nº 1004850-29.2025.8.11.0000 RECORRENTE(S): BANCO DO BRASIL SA RECORRIDA(S): JOSE CANAAN DE JESUS Trata-se de Recu… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL Nº 1004850-29.2025.8.11.0000 RECORRENTE(S): BANCO DO BRASIL SA RECORRIDA(S): JOSE CANAAN DE JESUS Trata-se de Recurso Especial interposto pelo BANCO DO BRASIL S.A com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea “a” e “c”, da Constituição Federal, em face do acórdão proferido (id 282322895). Alega violação aos artigos 45, 330, II, 485 VI do CPC; aponta a existência do Tema 1150 do STJ, além de divergência jurisprudencial. Contrarrazões no id 301310352. É o relatório. Decido. Da sistemática de recursos repetitivos A parte recorrente alega ofensa aos artigos 45, 330, II, 485, VI do CPC; e cita que a tramitação do Tema 1300 do STJ impõe a suspensão do presente feito. Nesse sentido, foi verificada a existência no Superior Tribunal de Justiça de controvérsia, segundo o qual a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 16.12.2024, ao apreciar a proposta de afetação ao rito dos recursos repetitivos, por decisão unânime, afetou os Recursos Especiais nº 2.162.222/PE, 2.162.223/PE, 2.162.198/PE e 2.162.323/PE, sob a relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, para análise no âmbito do Tema nº 1.300. A questão submetida a julgamento consiste em “Saber a qual das partes compete o ônus de provar que os lançamentos a débito nas contas individualizadas do PASEP correspondem a pagamentos ao correntista.” No entanto, a suspensão determinada pelo STJ abrange apenas a discussão sobre o ônus da prova nos saques indevidos, sem afetar outras questões já decididas, como a competência, a prescrição e a legitimidade passiva. A suspensão dos processos determinada pelo STJ, no Tema 1300, refere-se especificamente à definição do ônus da prova sobre os lançamentos indevidos no PASEP, questão não abordada no acórdão impugnado, uma vez que entendeu que haveria supressão de instância, o que acarreta a falta de prequestionamento da matéria e por isso deixo de aplicar no presente caso a sistemática dos repetitivos. Logo, não é o caso de se aplicar a sistemática de precedentes qualificados no presente caso em relação ao Tema 1300/STJ, não incidindo, portanto, a regra do artigo 1.030, I, “b”, II e III, do CPC. Alega, ainda, o recorrente que não se aplica o Tema 1150/STJ no presente caso, em razão de que deve ser reconhecida sua ilegitimidade passiva, pois a pretensão da recorrida é revisional de saldo devedor por eleição de índices de correção monetária, sendo que quem estabelece a regra de remuneração é o Conselho Diretor vinculado à Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda, e desse modo, a União Federal é parte legítima para responder a ação. Aponta que atua como mero mandatário ou mero administrador da conta, não tendo qualquer interferência na eleição de índices ou forma de correção estabelecida pela própria Lei ou a União, além de ser mero depositário das quantias do PASEP, ou seja, sua função é de administrar as contas vinculadas ao fundo. O acórdão recorrido discorre que: “(...)O cerne recursal foi afetado pelo rito dos recursos repetitivos - Recurso Especial Nº 1.895.936 - TO - junto ao Superior Tribunal de Justiça que, no Tema 1150, firmou as seguintes teses: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. No presente caso, busca-se a análise relativa à má gestão das contas vinculadas ao PASEP. Deste modo, a competência para julgar a pretensão é da justiça estadual, porquanto, se sabe, o Banco do Brasil S/A é sociedade de economia mista, entidade não listada no art. 109 da CF que fixa a competência da Justiça Federal. Quanto à prescrição defendida pelo agravante, ainda que o último saque tenha ocorrido há vários anos, a jurisprudência do STJ vem admitindo que, em demandas sobre reparação por erro na administração de contas PASEP, o prazo prescricional pode ser contado da ciência do dano pelo titular da conta e não da data do último saque. Assim, diante da necessidade de aprofundamento da instrução probatória para delimitar o momento exato da ciência do dano, não se justifica o reconhecimento prematuro da prescrição em sede de agravo de instrumento. Assim, não se verifica ilegalidade ou teratologia na decisão agravada, a qual encontra respaldo na legislação e na jurisprudência consolidada. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial que definiu o Tema 1150, sedimentou o entendimento jurisprudencial: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PASEP. MÁ GESTÃO DOS VALORES DEPOSITADOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL. PRESCRIÇÃO DECENAL PREVISTA NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. TEORIA DA ACTIO NATA. CIÊNCIA DOS DESFALQUES NA CONTA INDIVIDUALIZADA.1. As questões a serem definidas nesse Repetitivo são: a) a possibilidade ou não de o Banco do Brasil figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; b) qual o prazo prescricional a que a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete - se o decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil ou o quinquenal estipulado pelo art. 1° do Decreto 20.910/1932; c) se o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques ou a data do último depósito efetuado na conta individual vinculada ao Pasep. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL PARA FIGURAR NA DEMANDA 2. O Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) foi instituído pela Lei Complementar 8, de 3.12.1970, que prevê a competência do Banco do Brasil para a administração do Programa e manutenção das contas individualizadas para cada servidor, recebendo comissão pelo serviço prestado. A Lei Complementar 26, de 11.9.1975, unificou, a partir de 1º.7.1976, sob a denominação de PIS-Pasep, os fundos constituídos com os recursos do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), instituídos pelas Leis Complementares 7/70 e 8/70, respectivamente.3. O art. 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep compete ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art. 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do Pasep, cabe creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS-Pasep.4. Destaca-se que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, a União deixou de depositar valores nas contas do Pasep do trabalhador, limitando-se sua responsabilidade ao recolhimento mensal ao Banco do Brasil S.A., nos termos do art. 2º da LC 8/1970.Por força do art. 5º da referida Lei Complementar, a administração do Programa compete ao Banco do Brasil S.A., bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas para cada trabalhador, de modo que a responsabilidade por eventuais saques indevidos ou má gestão dos valores depositados na conta do Pasep é atribuída à instituição gestora em apreço.5. O STJ possui o entendimento de que, em ações judiciais nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao Pasep, a União deve figurar no polo passivo da demanda.6. No entanto, no caso dos autos a demanda não versa sobre índices equivocados de responsabilidade do Conselho Gestor do Fundo, mas sobre responsabilidade decorrente da má gestão do banco, em razão de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e de correção monetária na conta do Pasep. Conclui-se que a legitimidade passiva é do Banco do Brasil S.A. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.898.214/SE, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 29.4.2021; AgInt no REsp 1.867.341/DF, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 7.10.2021; REsp 1.895.114/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 14.4.2021; AgInt no REsp 1.954.954/CE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 25.3.2022; e AgInt no REsp 1.922.275/CE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 29.6.2021. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL 7. O Banco do Brasil S.A. aduz que ocorreu a prescrição do direito do autor em virtude da adoção do prazo quinquenal estabelecido no art. 1° do Decreto-Lei 20.910/1932, cujo termo inicial deveria ser a data do recolhimento das últimas contribuições para o Pasep, que, segundo a instituição financeira, ocorreu em 1988.8. Contudo, o STJ possui orientação pacífica de que o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/1932 não se aplica às pessoas jurídicas de direito privado. No caso em espécie, sendo a ação proposta contra o Banco do Brasil, sociedade de economia mista, deve-se afastar a incidência do referido dispositivo, bem como da tese firmada no julgamento do Recurso Especial 1.205.277/PB, sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, de que: "É de cinco anos o prazo prescricional da ação promovida contra a União Federal por titulares de contas vinculadas ao PIS/PASEP visando à cobrança de diferenças de correção monetária incidente sobre o saldo das referidas contas, nos termos do art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32" (grifei).9. Assim, "as ações movidas contra as sociedades de economia mista não se sujeitam ao prazo prescricional previsto no Decreto-Lei 20.910/1932, porquanto possuem personalidade jurídica de direito privado, estando submetidas às normas do Código Civil." (AgInt nos EDcl no AREsp 1.902.665/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 10.8.2022). Nesse mesmo sentido: AgInt no AREsp 1.795.172/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 27.5.2021; e AgInt no REsp 1.812.518/SE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21.8.2020.10. Ressalte-se que não se emprega o prazo prescricional previsto no art. 10 do Decreto 2.052/1983, o qual prevê que "A ação para cobrança das contribuições devidas ao PIS e ao PASEP prescreverá no prazo de dez anos, contados a partir da data prevista para seu recolhimento". Isso porque no caso dos autos não se estão cobrando as contribuições, mas, sim, a indenização por danos materiais decorrente da má gestão dos depósitos.11. Assim, nas demandas ajuizadas contra a instituição financeira em virtude de eventual má gestão ou descontos indevidos nas contas do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - Pasep, deve-se aplicar o prazo prescricional previsto no art. 205 do Código Civil de 10 anos. DIES A QUO PARA A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL 12. O Superior Tribunal de Justiça entende que, conforme o princípio da actio nata, o curso do prazo prescricional do direito de reclamar inicia-se somente quando o titular do direito subjetivo violado passa a conhecer o fato e a extensão de suas consequências.(EREsp 1.106.366/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe de 26.6.2020.) 13. Sobre a matéria em debate, o STJ tem precedentes: AgInt no REsp 1.928.752/TO, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 23.6.2021; e REsp 1.802.521/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma DJe 30.5.2019.14. Verifica-se que o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. TESES JURÍDICAS A SEREM FIXADAS 15. Em relação ao presente Tema, fixam-se as seguintes Teses: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto à conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo art. 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. No caso dos autos, em relação às Teses aqui fixadas, o acórdão de origem decidiu de acordo com o entendimento deste STJ, de modo que não merece reforma.17. O recorrente afirma não haver ilícito, e que, "no caso em tela, a parte recorrida não fez prova alguma do prejuízo sofrido." (fl. 528, e-STJ), de forma que não há dever de indenizar. Entretanto, a Corte de origem assim consignou ao decidir a controvérsia (fls. 490-491, e-STJ, grifei): "A partir da análise dos autos originários, constata-se que são incontroversos 1) o saldo no valor de Cz$ 88.881,00 (oitenta e oito mil oitocentos e oitenta e um cruzados) existente na conta individual da parte autora/apelante no dia 18/08/1988 (data limite ao direito aos créditos em sua conta PASEP) - Evento 1, OUT3, fl. 03, autos originários e 2) os débitos realizados no período em que a conta retromencionada esteve ativa (Evento 1, DOCSPESSOAIS2, autos originários). (...) O fato é que o Banco do Brasil S/A tem o dever de informar o motivo e a destinação dos valores questionados pela parte autora/apelante, a fim de comprovar a legalidade dos lançamentos, ônus do qual não se desincumbiu, conforme determina o art. 373, inciso II, do CPC vigente. (...) Dessa nos forma, é forçoso concluir pelo conjunto fático-probatório existente nos autos que o dano material efetivamente restou comprovado (...)".18. Como se observa, o Tribunal a quo, soberano na análise probatória, concluiu que houve ato ilícito e dano. Entender de modo diverso demanda revolvimento no acervo fático-probatório, o que não é possível em Recurso Especial, pois incide a Súmula 7 do STJ. Nessa linha: AgInt no AREsp 2.155.273/RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 15.3.2023; e AgInt no AREsp 1.767.339/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 16.2.2023. CONCLUSÃO 19. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ - REsp 1895936 / TO - RELATOR) Assim, é de competência do Banco do Brasil a administração do programa, bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas, razão pela qual se mostra parte legítima para figurar na polaridade passiva dos autos. (...)” – Id 282322895 Dessa maneira, é caso de aplicar a sistemática de recursos repetitivos no presente caso. No julgamento dos recursos paradigmas REsp 1895936/TO, REsp 1895941/TO e REsp 1951931/DF (Tema 1150/STJ) o Superior Tribunal de Justiça concluiu que: I) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; II) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e III) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep”. No voto condutor no REsp 1.895.941/TO, o Exmo. Sr. Ministro Relator discorreu que: “O art. 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep cabe ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art. 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do Pasep, compete creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS-Pasep”. (g.n) Assim, do exame do acórdão verifica-se que está de acordo com posicionamento do Tema 1150/STJ do Superior Tribunal de Justiça. Do efeito suspensivo O caso dos autos enseja a negativa de seguimento do Recurso Especial, conforme demonstrado na fundamentação. A negativa de seguimento afasta o primeiro requisito necessário ao deferimento do efeito suspensivo, qual seja, a probabilidade de provimento do recurso. Conclui-se, portanto, que, negado seguimento ao recurso, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo. Dispositivo. Ante o exposto, nego seguimento ao Recurso Especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC, ante a sistemática de recursos repetitivos (Tema 1150/STJ) e, como consequência, resta prejudicado o pedido para atribuição de efeito suspensivo. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho Vice-Presidente

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Processo nº 1004850-29.2025.8.11.0000

ID: 333550678

Tribunal: TJMT Órgão: Vice-Presidência Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1004850-29.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOSE CANAAN DE JESUS

Decisão

Advogados:

ALEX DE LAURA DALTRO DE SOUZA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL Nº 1004850-29.2025.8.11.0000 RECORRENTE(S): BANCO DO BRASIL SA RECORRIDA(S): JOSE CANAAN DE JESUS Trata-se de Recu… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL Nº 1004850-29.2025.8.11.0000 RECORRENTE(S): BANCO DO BRASIL SA RECORRIDA(S): JOSE CANAAN DE JESUS Trata-se de Recurso Especial interposto pelo BANCO DO BRASIL S.A com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea “a” e “c”, da Constituição Federal, em face do acórdão proferido (id 282322895). Alega violação aos artigos 45, 330, II, 485 VI do CPC; aponta a existência do Tema 1150 do STJ, além de divergência jurisprudencial. Contrarrazões no id 301310352. É o relatório. Decido. Da sistemática de recursos repetitivos A parte recorrente alega ofensa aos artigos 45, 330, II, 485, VI do CPC; e cita que a tramitação do Tema 1300 do STJ impõe a suspensão do presente feito. Nesse sentido, foi verificada a existência no Superior Tribunal de Justiça de controvérsia, segundo o qual a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 16.12.2024, ao apreciar a proposta de afetação ao rito dos recursos repetitivos, por decisão unânime, afetou os Recursos Especiais nº 2.162.222/PE, 2.162.223/PE, 2.162.198/PE e 2.162.323/PE, sob a relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, para análise no âmbito do Tema nº 1.300. A questão submetida a julgamento consiste em “Saber a qual das partes compete o ônus de provar que os lançamentos a débito nas contas individualizadas do PASEP correspondem a pagamentos ao correntista.” No entanto, a suspensão determinada pelo STJ abrange apenas a discussão sobre o ônus da prova nos saques indevidos, sem afetar outras questões já decididas, como a competência, a prescrição e a legitimidade passiva. A suspensão dos processos determinada pelo STJ, no Tema 1300, refere-se especificamente à definição do ônus da prova sobre os lançamentos indevidos no PASEP, questão não abordada no acórdão impugnado, uma vez que entendeu que haveria supressão de instância, o que acarreta a falta de prequestionamento da matéria e por isso deixo de aplicar no presente caso a sistemática dos repetitivos. Logo, não é o caso de se aplicar a sistemática de precedentes qualificados no presente caso em relação ao Tema 1300/STJ, não incidindo, portanto, a regra do artigo 1.030, I, “b”, II e III, do CPC. Alega, ainda, o recorrente que não se aplica o Tema 1150/STJ no presente caso, em razão de que deve ser reconhecida sua ilegitimidade passiva, pois a pretensão da recorrida é revisional de saldo devedor por eleição de índices de correção monetária, sendo que quem estabelece a regra de remuneração é o Conselho Diretor vinculado à Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda, e desse modo, a União Federal é parte legítima para responder a ação. Aponta que atua como mero mandatário ou mero administrador da conta, não tendo qualquer interferência na eleição de índices ou forma de correção estabelecida pela própria Lei ou a União, além de ser mero depositário das quantias do PASEP, ou seja, sua função é de administrar as contas vinculadas ao fundo. O acórdão recorrido discorre que: “(...)O cerne recursal foi afetado pelo rito dos recursos repetitivos - Recurso Especial Nº 1.895.936 - TO - junto ao Superior Tribunal de Justiça que, no Tema 1150, firmou as seguintes teses: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. No presente caso, busca-se a análise relativa à má gestão das contas vinculadas ao PASEP. Deste modo, a competência para julgar a pretensão é da justiça estadual, porquanto, se sabe, o Banco do Brasil S/A é sociedade de economia mista, entidade não listada no art. 109 da CF que fixa a competência da Justiça Federal. Quanto à prescrição defendida pelo agravante, ainda que o último saque tenha ocorrido há vários anos, a jurisprudência do STJ vem admitindo que, em demandas sobre reparação por erro na administração de contas PASEP, o prazo prescricional pode ser contado da ciência do dano pelo titular da conta e não da data do último saque. Assim, diante da necessidade de aprofundamento da instrução probatória para delimitar o momento exato da ciência do dano, não se justifica o reconhecimento prematuro da prescrição em sede de agravo de instrumento. Assim, não se verifica ilegalidade ou teratologia na decisão agravada, a qual encontra respaldo na legislação e na jurisprudência consolidada. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial que definiu o Tema 1150, sedimentou o entendimento jurisprudencial: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PASEP. MÁ GESTÃO DOS VALORES DEPOSITADOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL. PRESCRIÇÃO DECENAL PREVISTA NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. TEORIA DA ACTIO NATA. CIÊNCIA DOS DESFALQUES NA CONTA INDIVIDUALIZADA.1. As questões a serem definidas nesse Repetitivo são: a) a possibilidade ou não de o Banco do Brasil figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; b) qual o prazo prescricional a que a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete - se o decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil ou o quinquenal estipulado pelo art. 1° do Decreto 20.910/1932; c) se o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques ou a data do último depósito efetuado na conta individual vinculada ao Pasep. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL PARA FIGURAR NA DEMANDA 2. O Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) foi instituído pela Lei Complementar 8, de 3.12.1970, que prevê a competência do Banco do Brasil para a administração do Programa e manutenção das contas individualizadas para cada servidor, recebendo comissão pelo serviço prestado. A Lei Complementar 26, de 11.9.1975, unificou, a partir de 1º.7.1976, sob a denominação de PIS-Pasep, os fundos constituídos com os recursos do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), instituídos pelas Leis Complementares 7/70 e 8/70, respectivamente.3. O art. 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep compete ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art. 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do Pasep, cabe creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS-Pasep.4. Destaca-se que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, a União deixou de depositar valores nas contas do Pasep do trabalhador, limitando-se sua responsabilidade ao recolhimento mensal ao Banco do Brasil S.A., nos termos do art. 2º da LC 8/1970.Por força do art. 5º da referida Lei Complementar, a administração do Programa compete ao Banco do Brasil S.A., bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas para cada trabalhador, de modo que a responsabilidade por eventuais saques indevidos ou má gestão dos valores depositados na conta do Pasep é atribuída à instituição gestora em apreço.5. O STJ possui o entendimento de que, em ações judiciais nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao Pasep, a União deve figurar no polo passivo da demanda.6. No entanto, no caso dos autos a demanda não versa sobre índices equivocados de responsabilidade do Conselho Gestor do Fundo, mas sobre responsabilidade decorrente da má gestão do banco, em razão de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e de correção monetária na conta do Pasep. Conclui-se que a legitimidade passiva é do Banco do Brasil S.A. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.898.214/SE, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 29.4.2021; AgInt no REsp 1.867.341/DF, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 7.10.2021; REsp 1.895.114/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 14.4.2021; AgInt no REsp 1.954.954/CE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 25.3.2022; e AgInt no REsp 1.922.275/CE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 29.6.2021. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL 7. O Banco do Brasil S.A. aduz que ocorreu a prescrição do direito do autor em virtude da adoção do prazo quinquenal estabelecido no art. 1° do Decreto-Lei 20.910/1932, cujo termo inicial deveria ser a data do recolhimento das últimas contribuições para o Pasep, que, segundo a instituição financeira, ocorreu em 1988.8. Contudo, o STJ possui orientação pacífica de que o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/1932 não se aplica às pessoas jurídicas de direito privado. No caso em espécie, sendo a ação proposta contra o Banco do Brasil, sociedade de economia mista, deve-se afastar a incidência do referido dispositivo, bem como da tese firmada no julgamento do Recurso Especial 1.205.277/PB, sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, de que: "É de cinco anos o prazo prescricional da ação promovida contra a União Federal por titulares de contas vinculadas ao PIS/PASEP visando à cobrança de diferenças de correção monetária incidente sobre o saldo das referidas contas, nos termos do art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32" (grifei).9. Assim, "as ações movidas contra as sociedades de economia mista não se sujeitam ao prazo prescricional previsto no Decreto-Lei 20.910/1932, porquanto possuem personalidade jurídica de direito privado, estando submetidas às normas do Código Civil." (AgInt nos EDcl no AREsp 1.902.665/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 10.8.2022). Nesse mesmo sentido: AgInt no AREsp 1.795.172/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 27.5.2021; e AgInt no REsp 1.812.518/SE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21.8.2020.10. Ressalte-se que não se emprega o prazo prescricional previsto no art. 10 do Decreto 2.052/1983, o qual prevê que "A ação para cobrança das contribuições devidas ao PIS e ao PASEP prescreverá no prazo de dez anos, contados a partir da data prevista para seu recolhimento". Isso porque no caso dos autos não se estão cobrando as contribuições, mas, sim, a indenização por danos materiais decorrente da má gestão dos depósitos.11. Assim, nas demandas ajuizadas contra a instituição financeira em virtude de eventual má gestão ou descontos indevidos nas contas do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - Pasep, deve-se aplicar o prazo prescricional previsto no art. 205 do Código Civil de 10 anos. DIES A QUO PARA A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL 12. O Superior Tribunal de Justiça entende que, conforme o princípio da actio nata, o curso do prazo prescricional do direito de reclamar inicia-se somente quando o titular do direito subjetivo violado passa a conhecer o fato e a extensão de suas consequências.(EREsp 1.106.366/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe de 26.6.2020.) 13. Sobre a matéria em debate, o STJ tem precedentes: AgInt no REsp 1.928.752/TO, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 23.6.2021; e REsp 1.802.521/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma DJe 30.5.2019.14. Verifica-se que o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. TESES JURÍDICAS A SEREM FIXADAS 15. Em relação ao presente Tema, fixam-se as seguintes Teses: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto à conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo art. 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. No caso dos autos, em relação às Teses aqui fixadas, o acórdão de origem decidiu de acordo com o entendimento deste STJ, de modo que não merece reforma.17. O recorrente afirma não haver ilícito, e que, "no caso em tela, a parte recorrida não fez prova alguma do prejuízo sofrido." (fl. 528, e-STJ), de forma que não há dever de indenizar. Entretanto, a Corte de origem assim consignou ao decidir a controvérsia (fls. 490-491, e-STJ, grifei): "A partir da análise dos autos originários, constata-se que são incontroversos 1) o saldo no valor de Cz$ 88.881,00 (oitenta e oito mil oitocentos e oitenta e um cruzados) existente na conta individual da parte autora/apelante no dia 18/08/1988 (data limite ao direito aos créditos em sua conta PASEP) - Evento 1, OUT3, fl. 03, autos originários e 2) os débitos realizados no período em que a conta retromencionada esteve ativa (Evento 1, DOCSPESSOAIS2, autos originários). (...) O fato é que o Banco do Brasil S/A tem o dever de informar o motivo e a destinação dos valores questionados pela parte autora/apelante, a fim de comprovar a legalidade dos lançamentos, ônus do qual não se desincumbiu, conforme determina o art. 373, inciso II, do CPC vigente. (...) Dessa nos forma, é forçoso concluir pelo conjunto fático-probatório existente nos autos que o dano material efetivamente restou comprovado (...)".18. Como se observa, o Tribunal a quo, soberano na análise probatória, concluiu que houve ato ilícito e dano. Entender de modo diverso demanda revolvimento no acervo fático-probatório, o que não é possível em Recurso Especial, pois incide a Súmula 7 do STJ. Nessa linha: AgInt no AREsp 2.155.273/RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 15.3.2023; e AgInt no AREsp 1.767.339/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 16.2.2023. CONCLUSÃO 19. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ - REsp 1895936 / TO - RELATOR) Assim, é de competência do Banco do Brasil a administração do programa, bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas, razão pela qual se mostra parte legítima para figurar na polaridade passiva dos autos. (...)” – Id 282322895 Dessa maneira, é caso de aplicar a sistemática de recursos repetitivos no presente caso. No julgamento dos recursos paradigmas REsp 1895936/TO, REsp 1895941/TO e REsp 1951931/DF (Tema 1150/STJ) o Superior Tribunal de Justiça concluiu que: I) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; II) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e III) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep”. No voto condutor no REsp 1.895.941/TO, o Exmo. Sr. Ministro Relator discorreu que: “O art. 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep cabe ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art. 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do Pasep, compete creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS-Pasep”. (g.n) Assim, do exame do acórdão verifica-se que está de acordo com posicionamento do Tema 1150/STJ do Superior Tribunal de Justiça. Do efeito suspensivo O caso dos autos enseja a negativa de seguimento do Recurso Especial, conforme demonstrado na fundamentação. A negativa de seguimento afasta o primeiro requisito necessário ao deferimento do efeito suspensivo, qual seja, a probabilidade de provimento do recurso. Conclui-se, portanto, que, negado seguimento ao recurso, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo. Dispositivo. Ante o exposto, nego seguimento ao Recurso Especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC, ante a sistemática de recursos repetitivos (Tema 1150/STJ) e, como consequência, resta prejudicado o pedido para atribuição de efeito suspensivo. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho Vice-Presidente

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Processo nº 1011662-95.2024.8.11.0041

ID: 330720804

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011662-95.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JULIANA CRISTINA MARTINELLI RAIMUNDI

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011662-95.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, I… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011662-95.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Moral, Cartão de Crédito] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO - CPF: 535.244.461-91 (APELADO), HEBER AZIZ SABER - CPF: 062.290.048-01 (ADVOGADO), MARIANNA BARROS SABER - CPF: 046.353.241-41 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), JULIANA CRISTINA MARTINELLI RAIMUNDI - CPF: 023.580.389-89 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. VALIDADE DO CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSIVIDADE. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta por BANCO BMG S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO em ação declaratória de inexistência de débito c.c. nulidade contratual, restituição de valores e indenização por danos morais. A sentença de primeiro grau determinou a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo pessoal, a devolução simples dos valores descontados, a suspensão da cobrança em folha e a condenação do banco ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais. O banco sustenta a legalidade do contrato celebrado, a inexistência de vício de consentimento, a prescrição de parcelas anteriores e a ausência de danos morais indenizáveis. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) definir se há prescrição ou decadência na pretensão de revisão contratual; (ii) verificar se houve vício de consentimento capaz de anular o contrato de cartão de crédito consignado; (iii) estabelecer se é devida a restituição dos valores pagos; e (iv) determinar se há direito à indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O contrato em exame possui natureza de trato sucessivo, e o prazo prescricional inicia-se com o vencimento da última prestação, razão pela qual se afasta a prescrição e a decadência alegadas. 4. O instrumento contratual acostado aos autos identifica claramente a operação como “cartão de crédito consignado”, não havendo indícios de omissão, induzimento a erro ou qualquer outro vício de consentimento apto a invalidar o negócio jurídico. 5. A parte autora é civilmente capaz, recebeu os valores contratados por meio de transferência bancária e não demonstrou desconhecimento da operação nem devolução dos valores, o que afasta a alegação de vício e reforça a validade do contrato. 6. A prova dos autos não evidencia prática abusiva da instituição financeira, sendo incabível a intervenção judicial para converter o contrato ou impor restituição de valores sob pena de enriquecimento sem causa. 7. A taxa de juros pactuada encontra-se dentro dos parâmetros aceitos pela jurisprudência do STJ, não se revelando abusiva. 8. Ausente a demonstração de conduta ilícita, falha na prestação do serviço ou abalo anímico relevante, não se justifica a condenação por danos morais. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O prazo prescricional para ações envolvendo contrato de trato sucessivo inicia-se com o vencimento da última parcela. 2. A clareza na qualificação do contrato como operação de cartão de crédito consignado e a efetiva disponibilização dos valores afastam a existência de vício de consentimento. 3. Não se justifica a restituição de valores ou a conversão do contrato quando ausente prova de irregularidade ou prática abusiva. 4. A fixação de indenização por danos morais exige demonstração de conduta ilícita e lesão extrapatrimonial efetiva, o que não se verifica no caso. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por BANCO BMG S.A contra sentença proferida na “Ação Declaratória de inexistência de débito c.c. Nulidade Contratual e Restituição e Indenização por Danos Morais” ajuizada pela parte recorrida ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO, que tramita perante a 3ª Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá - MT. O magistrado a quo, em sentença, (ID. 287195089 - ID de origem 185028650), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: Converter o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação. Determinar a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Conceder/manter a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Condenar a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Condenar ainda a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios, estes, considerando que a sentença tem parte ilíquida e parte líquida, arbitrados em 15% (quinze por cento), do proveito econômico obtido (art. 85, § 2º do CPC). O apelante em suas razões (ID. 287195090 - ID de origem 188007503) alega a prescrição da pretensão autoral, pois o contrato data de 17/08/2010 e a ação foi proposta em 26/03/2024. Invoca o art. 206, §3º, IV do Código Civil, e afirma que, ainda que se considere a natureza sucessiva dos descontos, o prazo conta-se a partir de cada vencimento. Quanto ao mérito, o Banco contesta a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo pessoal, como determinado na sentença. Alega que a contratação foi válida e que o produto foi utilizado por meio de saques, descaracterizando a hipótese de desconhecimento contratual. Sustenta que a parte autora teve ciência do contrato e de suas condições, inclusive da taxa de juros pactuada. Por isso, não há justificativa legal para revisão unilateral do pacto, ausentes vícios de consentimento. Reitera que a contratação se deu por iniciativa da parte apelada, com manifestação expressa de vontade. A recorrente contesta ainda a condenação à restituição de valores descontados, defendendo que se basearam em contrato regular e eficaz. Sustenta que tal pedido representa enriquecimento sem causa. No que tange à indenização por danos morais, o Banco, em tese subsidiária, entende que o valor de R$ 8.000,00 é excessivo. Requer sua redução com base na razoabilidade e na natureza compensatória da reparação, afirmando que não houve conduta ilícita ou abusiva que justificasse o valor fixado. Por fim, requer provimento do apelo, com reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos da autora. Caso mantida parte da condenação, requer a exclusão das parcelas prescritas e a redução do valor fixado por danos morais. Contrarrazões sob ID. 287195094 - ID de origem 190769261. É o relatório. V O T O R E L A T O R Na origem trata-se de ação declaratória e indenizatória proposta por ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO contra BANCO BMG S.A., visando à conversão de contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado tradicional, com restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. A autora alega que não contratou cartão de crédito consignado, mas sim empréstimo com parcelas fixas descontadas em folha, sendo surpreendida com descontos mensais que não amortizavam o valor principal. Alega ausência de informações claras sobre a natureza do contrato, bem como inexistência de uso ou desbloqueio do cartão. Juntou documentos e pediu a procedência da demanda. O BANCO BMG S.A. apresentou contestação, defendendo a validade da contratação e arguindo preliminares de defeito de representação, irregularidade do comprovante de endereço, prescrição, decadência e litigância de má-fé, todas afastadas pelo juízo, que reconheceu a regularidade da representação e a inexistência de vícios capazes de impedir o prosseguimento da ação. O magistrado de 1º grau rejeitou as preliminares e, no mérito, reconheceu a falha na prestação do serviço diante da ausência de prova da ciência da autora quanto à contratação por cartão de crédito. Determinou a conversão do contrato em empréstimo consignado, com aplicação da taxa média do Banco Central à época e restituição simples dos valores pagos, bem como indenização por danos morais. A tese recursal reside na afirmação de configuração de legalidade do contrato pactuado entre as partes. Com relação a prescrição suscitada, importante constar que o objeto da lide se refere a contrato de cartão de crédito consignado, cuja obrigação é de trato sucessivo, em que o termo inicial do prazo prescricional é o vencimento da última parcela, que ainda não ocorreu. Quanto à decadência, de igual forma, é cediço que os descontos realizados pela instituição bancária se renovam mensalmente, por isso, não há que se falar em consumação do direito alegado, pois o contrato ainda está vigente. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR LEVANTADA PELA RECORRENTE – CERCEAMENTO DE DEFESA – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINARES FORMULADAS EM CONTRARRAZÕES – VIOLAÇÃO A DIALETICIDADE – NÃO OCORRÊNCIA - DECADÊNCIA DO DIREITO PARA ANULAR O NEGÓCIO JURÍDICO – AFASTADA – RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – OPERAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...). Considerando a ausência de quitação do valor emprestado pelo consumidor, não há razões para o acolhimento do prazo decadencial para se postular a anulação do negócio jurídico, ex vi do art. 178 do Código Civil. Ocorrência da prescrição parcial das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação. Prejudicada. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de dezenove saques, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT 10300163320208110002 MT, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 10/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/08/2022). (g.n). Logo, não há que se falar em prescrição ou decadência, mesmo que parcial, pois apesar da contratação realizada há muitos anos, as prestações continuaram a ser debitadas até os dias atuais. Rejeito as prejudiciais de mérito de prescrição e decadência. Em relação a contratação do produto bancário refutado, verifico que a parte autora em nenhum momento afirma desconhecer a instituição bancária, mas sim, que contratou empréstimo consignado e que, posteriormente, constatou de que se tratava de empréstimo na modalidade cartão de crédito consignado. Nesse passo, é cediço que os contratos de natureza bancária estão inseridos no rol dos contratos de adesão, portanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é imperiosa e também por constar a atividade bancária expressamente elencada no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nesse mesmo sentido é o entendimento sedimentado do c. Superior Tribunal de Justiça, disposto na Súmula 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Quanto a distribuição do ônus da prova, verifico que a ausência de declaração de negativa de relação jurídica com a instituição financeira, somada a declaração de anuência e recebimento de crédito relativo a empréstimo, por si só, evidencia a concordância tácita da parte autora com os termos pactuados. A controvérsia cinge-se à alegação da parte autora de que fora ludibriada pela instituição financeira ao firmar contrato de cartão de crédito consignado, sob a falsa aparência de empréstimo pessoal, o que implicaria vício de consentimento por ausência de transparência, em suposta violação ao Código de Defesa do Consumidor. Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que sob o ID. 287195080 - Pág. 1, restou acostado instrumento contratual denominado "CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – SAQUE MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO PELO BANCO BMG". O título do documento, grafado em letras garrafais no cabeçalho, revela inequivocamente a natureza jurídica do ajuste celebrado. A autora, pessoa civilmente capaz, não alega a existência de quaisquer vícios invalidantes do consentimento stricto sensu, como coação, dolo ou incapacidade superveniente. Ao revés, limita-se a sustentar ausência de transparência, argumento que, embora relevante sob a ótica da boa-fé objetiva, demanda demonstração cabal de que os elementos contratuais foram ocultados ou redigidos de forma a induzir erro substancial, o que não se verifica no caso concreto. A clareza do cabeçalho contratual e a designação expressa da natureza do produto financeiro infirmam a tese de simulação ou induzimento. Outrossim, os documentos juntados sob o ID. 287195086 - Pág. 1 e seguintes demonstram a efetivação de transferências bancárias em favor da requerente, que, em momento algum, impugnou a titularidade das contas recebedoras, tampouco apresentou prova da não fruição dos valores recebidos ou de eventual devolução. Trata-se, portanto, de vantagem econômica auferida em decorrência do ajuste, cujos efeitos não podem ser unilateralmente desconstituídos sem devolução do equivalente patrimonial, sob pena de afronta ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Portanto, à míngua de prova contundente de defeito na formação da vontade, e diante da existência de contrato com designação expressa da operação de crédito por cartão consignado, somada à efetiva disponibilização dos valores contratados, não se sustenta a pretensão desconstitutiva ou reparatória formulada na origem. A narrativa da parte autora, destituída de comprovação robusta, não supera a presunção de validade do contrato assinado, tampouco evidencia prática abusiva da instituição financeira que justifique intervenção judicial corretiva. Além disso, considerando o período em que as partes mantêm relacionamento negocial - contrato assinado em 21/10/2014 - se aplica o princípio do venire contra factum proprium, que veda a adoção de comportamento contraditório após prolongada execução do contrato, gerando legítima expectativa na contraparte. Do mesmo modo, além de anuir com o avençado, que expressamente previa o produto bancário ora refutado - cartão de crédito – efetivamente recebeu o valor emprestado, inclusive a título de saque complementar. ID. 287195087 - Pág. 46: O saque através do cartão de crédito é uma modalidade de operação disponibilizada por instituições financeiras, na qual o titular do cartão de crédito pode sacar valores dentro do limite disponível no cartão. De acordo com o Código Civil, a interpretação das manifestações de vontade deve considerar o comportamento das partes envolvidas, sobretudo quando este comportamento é praticado de forma consistente e habitual, como ocorre no presente caso. Desta forma: “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.” Outrossim, o banco comprovou a realização de transferências em favor da parte autora, demonstrando a efetiva concretização do negócio, que não foi desconstituído pela parte autora. Dessa forma, restou evidenciada a contratação de empréstimo através de cartão de crédito, visto que o requerido acostou aos autos o instrumento devidamente assinado pelo autor, com informações claras sobre as características do negócio jurídico. A jurisprudência deste sodalício trilha no mesmo sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE PLENO CONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO – CONSTATAÇÃO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DO AUTOR – CONTRATO COM INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS QUANTO AOS TERMOS DA CONTRATAÇÃO – ASSINATURA IDÊNTICA ÀS DOS DOCUMENTOS PESSOAIS DO CONTRATANTE – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que o requerido acostou aos autos o contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito em sua conta corrente, há que ser reformada a sentença para julgar improcedente a lide. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo)” (N.U 1004850-76.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/10/2021). Inexiste prova nos autos de ocorrência de vício de vontade que possa anular o acordo travado entre as partes. Nos vícios de vontade o prejudicado é um dos contratantes, pois há manifestação da vontade sem corresponder com o seu verdadeiro querer. Já os vícios sociais se consubstanciam em atos contrários à boa fé ou à lei, prejudicando terceiro. São vícios da vontade: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão; e vícios sociais: a fraude contra credores e a simulação. A anulação de um ato jurídico depende da demonstração inequívoca da existência de vício de consentimento, resultante de erro, dolo ou coação (art. 151 e seguintes do Código Civil), capaz de atingir a manifestação de vontade do agente, interferindo na elaboração do negócio jurídico que se pretende anular. Por fim, a taxa de juros contratada não se mostra ilegal, posto que não extrapola os limites convencionados pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A percepção quanto aos critérios para aferição de eventual cobrança excessiva encontra suporte nos precedentes citados: "A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp. 1.036.818, Terceira Turma, MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.” Nesse sentido, colaciona-se a taxa de juros estipulada entre as partes (4,8% a.m): Por sua vez, o Banco Central indicou que a média da taxa mensal de juros cobrado pela instituição financeira redundou em 1,77% a.m: (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico?historicotaxajurosdiario_page=1&codigoSegmento=1&codigoModalidade=218101&tipoModalidade=D&InicioPeriodo=2020-04-09). Não há que se falar em ilegalidade dos juros contratados, se estes se encontram em patamar considerado legal pela jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça. Com tais considerações e diante da comprovação documental da efetivação do negócio jurídico com base do acordo de vontades e recebimento do valor pela parte autora, tenho como válido o contrato questionado em sua integralidade, razão pela qual não há que se falar em nulidade do pacto, conversão, repetição do indébito ou reparação de danos morais. Com essas considerações, CONHEÇO do RECURSO, e DOU PROVIMENTO para julgar a presente ação improcedente. CONDENO a parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atribuído a causa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1011662-95.2024.8.11.0041

ID: 330720805

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011662-95.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO

Acórdão

Advogados:

HEBER AZIZ SABER

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011662-95.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, I… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011662-95.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Moral, Cartão de Crédito] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO - CPF: 535.244.461-91 (APELADO), HEBER AZIZ SABER - CPF: 062.290.048-01 (ADVOGADO), MARIANNA BARROS SABER - CPF: 046.353.241-41 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), JULIANA CRISTINA MARTINELLI RAIMUNDI - CPF: 023.580.389-89 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. VALIDADE DO CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSIVIDADE. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta por BANCO BMG S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO em ação declaratória de inexistência de débito c.c. nulidade contratual, restituição de valores e indenização por danos morais. A sentença de primeiro grau determinou a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo pessoal, a devolução simples dos valores descontados, a suspensão da cobrança em folha e a condenação do banco ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais. O banco sustenta a legalidade do contrato celebrado, a inexistência de vício de consentimento, a prescrição de parcelas anteriores e a ausência de danos morais indenizáveis. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) definir se há prescrição ou decadência na pretensão de revisão contratual; (ii) verificar se houve vício de consentimento capaz de anular o contrato de cartão de crédito consignado; (iii) estabelecer se é devida a restituição dos valores pagos; e (iv) determinar se há direito à indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O contrato em exame possui natureza de trato sucessivo, e o prazo prescricional inicia-se com o vencimento da última prestação, razão pela qual se afasta a prescrição e a decadência alegadas. 4. O instrumento contratual acostado aos autos identifica claramente a operação como “cartão de crédito consignado”, não havendo indícios de omissão, induzimento a erro ou qualquer outro vício de consentimento apto a invalidar o negócio jurídico. 5. A parte autora é civilmente capaz, recebeu os valores contratados por meio de transferência bancária e não demonstrou desconhecimento da operação nem devolução dos valores, o que afasta a alegação de vício e reforça a validade do contrato. 6. A prova dos autos não evidencia prática abusiva da instituição financeira, sendo incabível a intervenção judicial para converter o contrato ou impor restituição de valores sob pena de enriquecimento sem causa. 7. A taxa de juros pactuada encontra-se dentro dos parâmetros aceitos pela jurisprudência do STJ, não se revelando abusiva. 8. Ausente a demonstração de conduta ilícita, falha na prestação do serviço ou abalo anímico relevante, não se justifica a condenação por danos morais. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O prazo prescricional para ações envolvendo contrato de trato sucessivo inicia-se com o vencimento da última parcela. 2. A clareza na qualificação do contrato como operação de cartão de crédito consignado e a efetiva disponibilização dos valores afastam a existência de vício de consentimento. 3. Não se justifica a restituição de valores ou a conversão do contrato quando ausente prova de irregularidade ou prática abusiva. 4. A fixação de indenização por danos morais exige demonstração de conduta ilícita e lesão extrapatrimonial efetiva, o que não se verifica no caso. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por BANCO BMG S.A contra sentença proferida na “Ação Declaratória de inexistência de débito c.c. Nulidade Contratual e Restituição e Indenização por Danos Morais” ajuizada pela parte recorrida ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO, que tramita perante a 3ª Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá - MT. O magistrado a quo, em sentença, (ID. 287195089 - ID de origem 185028650), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: Converter o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação. Determinar a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Conceder/manter a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Condenar a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Condenar ainda a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios, estes, considerando que a sentença tem parte ilíquida e parte líquida, arbitrados em 15% (quinze por cento), do proveito econômico obtido (art. 85, § 2º do CPC). O apelante em suas razões (ID. 287195090 - ID de origem 188007503) alega a prescrição da pretensão autoral, pois o contrato data de 17/08/2010 e a ação foi proposta em 26/03/2024. Invoca o art. 206, §3º, IV do Código Civil, e afirma que, ainda que se considere a natureza sucessiva dos descontos, o prazo conta-se a partir de cada vencimento. Quanto ao mérito, o Banco contesta a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo pessoal, como determinado na sentença. Alega que a contratação foi válida e que o produto foi utilizado por meio de saques, descaracterizando a hipótese de desconhecimento contratual. Sustenta que a parte autora teve ciência do contrato e de suas condições, inclusive da taxa de juros pactuada. Por isso, não há justificativa legal para revisão unilateral do pacto, ausentes vícios de consentimento. Reitera que a contratação se deu por iniciativa da parte apelada, com manifestação expressa de vontade. A recorrente contesta ainda a condenação à restituição de valores descontados, defendendo que se basearam em contrato regular e eficaz. Sustenta que tal pedido representa enriquecimento sem causa. No que tange à indenização por danos morais, o Banco, em tese subsidiária, entende que o valor de R$ 8.000,00 é excessivo. Requer sua redução com base na razoabilidade e na natureza compensatória da reparação, afirmando que não houve conduta ilícita ou abusiva que justificasse o valor fixado. Por fim, requer provimento do apelo, com reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos da autora. Caso mantida parte da condenação, requer a exclusão das parcelas prescritas e a redução do valor fixado por danos morais. Contrarrazões sob ID. 287195094 - ID de origem 190769261. É o relatório. V O T O R E L A T O R Na origem trata-se de ação declaratória e indenizatória proposta por ANTONIA LEITE DO NASCIMENTO contra BANCO BMG S.A., visando à conversão de contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado tradicional, com restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. A autora alega que não contratou cartão de crédito consignado, mas sim empréstimo com parcelas fixas descontadas em folha, sendo surpreendida com descontos mensais que não amortizavam o valor principal. Alega ausência de informações claras sobre a natureza do contrato, bem como inexistência de uso ou desbloqueio do cartão. Juntou documentos e pediu a procedência da demanda. O BANCO BMG S.A. apresentou contestação, defendendo a validade da contratação e arguindo preliminares de defeito de representação, irregularidade do comprovante de endereço, prescrição, decadência e litigância de má-fé, todas afastadas pelo juízo, que reconheceu a regularidade da representação e a inexistência de vícios capazes de impedir o prosseguimento da ação. O magistrado de 1º grau rejeitou as preliminares e, no mérito, reconheceu a falha na prestação do serviço diante da ausência de prova da ciência da autora quanto à contratação por cartão de crédito. Determinou a conversão do contrato em empréstimo consignado, com aplicação da taxa média do Banco Central à época e restituição simples dos valores pagos, bem como indenização por danos morais. A tese recursal reside na afirmação de configuração de legalidade do contrato pactuado entre as partes. Com relação a prescrição suscitada, importante constar que o objeto da lide se refere a contrato de cartão de crédito consignado, cuja obrigação é de trato sucessivo, em que o termo inicial do prazo prescricional é o vencimento da última parcela, que ainda não ocorreu. Quanto à decadência, de igual forma, é cediço que os descontos realizados pela instituição bancária se renovam mensalmente, por isso, não há que se falar em consumação do direito alegado, pois o contrato ainda está vigente. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR LEVANTADA PELA RECORRENTE – CERCEAMENTO DE DEFESA – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINARES FORMULADAS EM CONTRARRAZÕES – VIOLAÇÃO A DIALETICIDADE – NÃO OCORRÊNCIA - DECADÊNCIA DO DIREITO PARA ANULAR O NEGÓCIO JURÍDICO – AFASTADA – RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – OPERAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...). Considerando a ausência de quitação do valor emprestado pelo consumidor, não há razões para o acolhimento do prazo decadencial para se postular a anulação do negócio jurídico, ex vi do art. 178 do Código Civil. Ocorrência da prescrição parcial das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação. Prejudicada. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de dezenove saques, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT 10300163320208110002 MT, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 10/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/08/2022). (g.n). Logo, não há que se falar em prescrição ou decadência, mesmo que parcial, pois apesar da contratação realizada há muitos anos, as prestações continuaram a ser debitadas até os dias atuais. Rejeito as prejudiciais de mérito de prescrição e decadência. Em relação a contratação do produto bancário refutado, verifico que a parte autora em nenhum momento afirma desconhecer a instituição bancária, mas sim, que contratou empréstimo consignado e que, posteriormente, constatou de que se tratava de empréstimo na modalidade cartão de crédito consignado. Nesse passo, é cediço que os contratos de natureza bancária estão inseridos no rol dos contratos de adesão, portanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é imperiosa e também por constar a atividade bancária expressamente elencada no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nesse mesmo sentido é o entendimento sedimentado do c. Superior Tribunal de Justiça, disposto na Súmula 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Quanto a distribuição do ônus da prova, verifico que a ausência de declaração de negativa de relação jurídica com a instituição financeira, somada a declaração de anuência e recebimento de crédito relativo a empréstimo, por si só, evidencia a concordância tácita da parte autora com os termos pactuados. A controvérsia cinge-se à alegação da parte autora de que fora ludibriada pela instituição financeira ao firmar contrato de cartão de crédito consignado, sob a falsa aparência de empréstimo pessoal, o que implicaria vício de consentimento por ausência de transparência, em suposta violação ao Código de Defesa do Consumidor. Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que sob o ID. 287195080 - Pág. 1, restou acostado instrumento contratual denominado "CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – SAQUE MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO PELO BANCO BMG". O título do documento, grafado em letras garrafais no cabeçalho, revela inequivocamente a natureza jurídica do ajuste celebrado. A autora, pessoa civilmente capaz, não alega a existência de quaisquer vícios invalidantes do consentimento stricto sensu, como coação, dolo ou incapacidade superveniente. Ao revés, limita-se a sustentar ausência de transparência, argumento que, embora relevante sob a ótica da boa-fé objetiva, demanda demonstração cabal de que os elementos contratuais foram ocultados ou redigidos de forma a induzir erro substancial, o que não se verifica no caso concreto. A clareza do cabeçalho contratual e a designação expressa da natureza do produto financeiro infirmam a tese de simulação ou induzimento. Outrossim, os documentos juntados sob o ID. 287195086 - Pág. 1 e seguintes demonstram a efetivação de transferências bancárias em favor da requerente, que, em momento algum, impugnou a titularidade das contas recebedoras, tampouco apresentou prova da não fruição dos valores recebidos ou de eventual devolução. Trata-se, portanto, de vantagem econômica auferida em decorrência do ajuste, cujos efeitos não podem ser unilateralmente desconstituídos sem devolução do equivalente patrimonial, sob pena de afronta ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Portanto, à míngua de prova contundente de defeito na formação da vontade, e diante da existência de contrato com designação expressa da operação de crédito por cartão consignado, somada à efetiva disponibilização dos valores contratados, não se sustenta a pretensão desconstitutiva ou reparatória formulada na origem. A narrativa da parte autora, destituída de comprovação robusta, não supera a presunção de validade do contrato assinado, tampouco evidencia prática abusiva da instituição financeira que justifique intervenção judicial corretiva. Além disso, considerando o período em que as partes mantêm relacionamento negocial - contrato assinado em 21/10/2014 - se aplica o princípio do venire contra factum proprium, que veda a adoção de comportamento contraditório após prolongada execução do contrato, gerando legítima expectativa na contraparte. Do mesmo modo, além de anuir com o avençado, que expressamente previa o produto bancário ora refutado - cartão de crédito – efetivamente recebeu o valor emprestado, inclusive a título de saque complementar. ID. 287195087 - Pág. 46: O saque através do cartão de crédito é uma modalidade de operação disponibilizada por instituições financeiras, na qual o titular do cartão de crédito pode sacar valores dentro do limite disponível no cartão. De acordo com o Código Civil, a interpretação das manifestações de vontade deve considerar o comportamento das partes envolvidas, sobretudo quando este comportamento é praticado de forma consistente e habitual, como ocorre no presente caso. Desta forma: “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.” Outrossim, o banco comprovou a realização de transferências em favor da parte autora, demonstrando a efetiva concretização do negócio, que não foi desconstituído pela parte autora. Dessa forma, restou evidenciada a contratação de empréstimo através de cartão de crédito, visto que o requerido acostou aos autos o instrumento devidamente assinado pelo autor, com informações claras sobre as características do negócio jurídico. A jurisprudência deste sodalício trilha no mesmo sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE PLENO CONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO – CONSTATAÇÃO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DO AUTOR – CONTRATO COM INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS QUANTO AOS TERMOS DA CONTRATAÇÃO – ASSINATURA IDÊNTICA ÀS DOS DOCUMENTOS PESSOAIS DO CONTRATANTE – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que o requerido acostou aos autos o contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito em sua conta corrente, há que ser reformada a sentença para julgar improcedente a lide. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo)” (N.U 1004850-76.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/10/2021). Inexiste prova nos autos de ocorrência de vício de vontade que possa anular o acordo travado entre as partes. Nos vícios de vontade o prejudicado é um dos contratantes, pois há manifestação da vontade sem corresponder com o seu verdadeiro querer. Já os vícios sociais se consubstanciam em atos contrários à boa fé ou à lei, prejudicando terceiro. São vícios da vontade: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão; e vícios sociais: a fraude contra credores e a simulação. A anulação de um ato jurídico depende da demonstração inequívoca da existência de vício de consentimento, resultante de erro, dolo ou coação (art. 151 e seguintes do Código Civil), capaz de atingir a manifestação de vontade do agente, interferindo na elaboração do negócio jurídico que se pretende anular. Por fim, a taxa de juros contratada não se mostra ilegal, posto que não extrapola os limites convencionados pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A percepção quanto aos critérios para aferição de eventual cobrança excessiva encontra suporte nos precedentes citados: "A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp. 1.036.818, Terceira Turma, MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.” Nesse sentido, colaciona-se a taxa de juros estipulada entre as partes (4,8% a.m): Por sua vez, o Banco Central indicou que a média da taxa mensal de juros cobrado pela instituição financeira redundou em 1,77% a.m: (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico?historicotaxajurosdiario_page=1&codigoSegmento=1&codigoModalidade=218101&tipoModalidade=D&InicioPeriodo=2020-04-09). Não há que se falar em ilegalidade dos juros contratados, se estes se encontram em patamar considerado legal pela jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça. Com tais considerações e diante da comprovação documental da efetivação do negócio jurídico com base do acordo de vontades e recebimento do valor pela parte autora, tenho como válido o contrato questionado em sua integralidade, razão pela qual não há que se falar em nulidade do pacto, conversão, repetição do indébito ou reparação de danos morais. Com essas considerações, CONHEÇO do RECURSO, e DOU PROVIMENTO para julgar a presente ação improcedente. CONDENO a parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atribuído a causa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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