Processo nº 5003469-53.2024.4.03.6128
ID: 298956260
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5003469-53.2024.4.03.6128
Data de Disponibilização:
16/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003469-53.2024.4.03.6128 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: ECOPER QUIMICA LTDA Advogado d…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003469-53.2024.4.03.6128 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: ECOPER QUIMICA LTDA Advogado do(a) APELANTE: AISLANE SARMENTO FERREIRA DE VUONO - SP195937-A APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM JUNDIAÍ/SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP D E C I S Ã O Trata-se de apelação de ECOPER QUÍMICA LTDA. em mandado de segurança que impetrou contra ato do DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM JUNDIAÍ - SP, em que se postulou: “[...] (v) ao final, seja CONCEDIDA em definitivo a segurança para declarar a ilegalidade e/ou inconstitucionalidade da cobrança do PIS e da COFINS com a inclusão do PIS e da COFINS em suas bases de cálculo, por ofensa à disposição contida nos artigos 195, inciso I, 150, I e 145, §1º, da Constituição Federal, além do art. 110 do CTN, reconhecendo-se, ainda, o direito da Impetrante apurar os valores pagos indevidamente, observado o prazo prescricional quinquenal, e compensar com débitos vincendos dos tributos e contribuições atualmente administrados pela RFB, de acordo com os procedimentos previstos atualmente na IN 2.055/21 (ou em norma que venha a substituí-la). [...]” A r. sentença (ID 315587900) denegou a segurança. Sem condenação em honorários advocatícios. Em suas razões recursais (ID 315587910), postula a reforma do r. decisum, sob o argumento, em síntese, de que deve ser aplicado ao caso o entendimento consignado nos julgamentos do RE nº 240.785/MG e RE nº 574.706/PR, sob a sistemática da repercussão geral, no qual fora decidido que o ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. Aduz ofensa ao previsto no art. 195, I, “b” da CF, que traz a receita ou o faturamento como possíveis bases de cálculo das contribuições destinadas a financiar a Seguridade Social. Alega que o PIS e a COFINS não representam receita ou faturamento da pessoa jurídica, pois apenas transitam no caixa dos contribuintes, não se tratando, assim, de acréscimo patrimonial. Alega que “ao se pretender tributar esses montantes (PIS e COFINS com a inclusão do PIS e da COFINS em suas respectivas bases de cálculo), valores que, ressalte-se, apenas ingressam contabilmente nos registros da Apelante, sem se incorporar ao seu patrimônio, de modo que não revelam efetivamente riqueza e/ou acréscimo patrimonial, gera invariavelmente distorções enormes na base de cálculo do PIS e da COFINS, ofendendo a capacidade contributiva e elevando de forma artificial o tributo devido ao final, afrontando, dessa forma, o princípio fundamental da vedação de tributo com efeitos confiscatórios, nos termos do artigo 150 da Constituição Federal de 1988, inciso IV”. Esclarece que o que se discute é o conceito de faturamento para fins da delimitação da base de cálculo das contribuições ao PIS e à Cofins, não se tratando de subsídio, isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão de tributos. Afirma que “sob pena de ofensa ao art. 110 do CTN, o conceito de receita não pode ser travestido na forma como pretende o Fisco Federal, chamando aquilo de receita o que, de fato não é receita, de modo a exigir o PIS e a COFINS com as bases de cálculo indevidamente ampliadas pela inclusão das próprias contribuições em sua base de cálculo, sem que elas correspondam a receitas”, invocando, em prol da sua tese, a jurisprudência pátria. Devidamente processado o feito, com contrarrazões (ID 315587916), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. Intimado para ofertar parecer, o Ministério Público Federal deixou transcorrer o prazo sem apresentar manifestação. É o relatório. Decido na forma do artigo 932, com fulcro em entendimento firmado em reiterada jurisprudência do e. STJ e desta 3ª Turma. Discute-se a inclusão, em suas próprias bases de cálculo, da contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS. Da pendência de julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 1.067/STF Curvo-me ao entendimento uníssono das Turmas integrantes da 2ª Seção no sentido de que não se verifica impedimento para julgamento recursal em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 1.067 (“Inclusão da COFINS e da contribuição ao PIS em suas próprias bases de cálculo” – RE n.º 1.233.096), haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão. (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177, relator Ministro Luiz Fux, j. 07.06.2017: “2. A suspensão de processamento prevista no §5º do art. 1.035 do CPC não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la.”). Do mérito A Constituição estabelece que a seguridade social será financiada por toda a sociedade mediante recursos, dentre outros, provenientes das contribuições do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei (artigo 195, I). Até a vigência da Emenda Constitucional n.º 20/1998 essa contribuição incidia sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; posteriormente, passou a incidir sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício (artigo 195, I, a, CF), sobre a receita ou o faturamento (alínea b) e sobre o lucro (alínea c). A contribuição para o Programa de Integração Social – PIS foi instituída pela Lei Complementar n.° 7/70, visando promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas. A Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS foi instituída pela Lei Complementar n.° 70/91, com destinação exclusiva às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social. Ambas as contribuições possuíam como base de cálculo o faturamento, que sempre foi entendido como a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza (confira-se: ADC n.° 1-1/DF; artigo 3º da Lei n.º 9.715/98). Posteriormente, a Lei n.° 9.718/98, em que foi convertida a Medida Provisória n.° 1.724/98, dispôs que a base de cálculo do PIS e da COFINS é o faturamento (artigo 2°), correspondente à receita bruta da pessoa jurídica (artigo 3°, caput), entendida como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas (artigo 3°, § 1°). Em razão desta definição de faturamento, prevista por lei ordinária precedente à EC n.º 20/98, foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo pelo Plenário do e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 390.840-5/MG, em 09.11.05. Enfim, o referido § 1º foi revogado pela Lei n.º 11.941/09. Com a promulgação da EC n.° 20/98, foram editadas as Leis n.°s 10.637/02 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) e 10.833/03 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) que alteraram a base de cálculo do PIS e da COFINS, respectivamente, ao considerar o valor do faturamento entendido como o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendendo a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica. Quanto às pessoas jurídicas sujeitas ao regime cumulativo, reguladas pela Lei nº 9.718/98, foi editada a Lei nº 12.973/2014 que alterou seu artigo 3º, para determinar, como faturamento, a receita bruta de que trata o artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, que, por sua vez, passou a estabelecer: “Art. 12. A receita bruta compreende: I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II - o preço da prestação de serviços em geral; III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.{...} § 4o Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário. § 5o Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4o.” A despeito de eventuais discrepâncias com conceitos empresariais e contábeis, é fato que até a EC n.° 20/98, para fins tributários, fixou-se uma sinomínia entre “faturamento” e a “receita bruta” oriunda das atividades empresariais. Com a inclusão no texto constitucional da hipótese de incidência “receita” ou “faturamento”, revela-se importante a distinção dos conceitos. Enquanto receita é gênero, que abrange todos os valores recebidos pela pessoa jurídica, que incorporam sua esfera patrimonial, independentemente de sua natureza (operacional ou não operacional); faturamento é espécie, que comporta tão somente as receitas operacionais, isto é, provenientes das atividades empresariais da pessoa jurídica. Se, de fato, sempre houve uma imprecisão técnica na redação legislativa sobre o que é “faturamento”, agora repetida quanto ao que é “receita”, tal jamais foi empecilho para ser considerada a exigibilidade das exações cujos fatos geradores ou bases de cálculo fossem fundadas nesses elementos, desde que respeitados os princípios constitucionais e tributários, mormente o da legalidade. À medida que a EC n.° 20/98 permite a incidência de contribuições sociais para financiamento da seguridade social sobre “receita” ou faturamento”, basta à legislação infraconstitucional definir o fato gerador do tributo e respectiva base de cálculo como “receita” ou “faturamento”, tomados em sua conceituação obtida do direito privado. As empresas tributadas pelo regime da Lei n.° 9.718/98 têm como fato gerador e base de cálculo do PIS e COFINS seu faturamento, entendido na qualidade de espécie de receita, cuja ordem é operacional. Já as empresas tributadas pelo regime das Leis n.°s 10.637/02 e 10.833/03 têm como fato gerador e base de cálculo a totalidade de suas receitas e não apenas aquelas consideradas “faturamento”; independentemente de constar no texto destas normas que o fato gerador “é o faturamento mensal” e a base de cálculo “é o valor do faturamento”, a definição apresentada para faturamento (o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendida a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela empresa) é incontestavelmente a do gênero “receita”, que é absolutamente compatível com a EC n.° 20/98. Independentemente da tributação se dar com base na receita ou no faturamento, haja vista que ambas abarcam as receitas operacionais, a questão controvertida recai justamente sobre a técnica de tributação adotada que se dá “por dentro”, isto é, o tributo incide sobre sua própria base de cálculo, posto que, inexoravelmente, encontra-se incluso na formação do preço. Ressalta-se que o e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à controvérsia relativa à “inclusão da COFINS e da contribuição ao PIS em suas próprias bases de cálculo” (Tema de Repercussão Geral n.º 1.067– RE n.º 1.233.096), ainda pendente de julgamento. Não obstante, verifica-se que não há novidade na matéria e há muito se vê sedimentado entendimento das Cortes superiores quanto à constitucionalidade da previsão legal da tributação “por dentro”. Quando inexistente vedação constitucional à sistemática de tributação “por dentro”, a sua previsão legal se revela legítima, porquanto oriunda da competência própria do Poder Legislativo, não cabendo o Judiciário se arvorar na posição de legislador positivo para modificar o sistema tributário adotado, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos Poderes. A própria Corte Suprema reafirmou tal entendimento no julgamento dos Temas de Repercussão Geral n.º 75 (RE n.º 582.525) e 214 (RE n.º 582.461), em que, respectivamente, firmou as seguintes teses: Tema 75: “É constitucional a proibição de deduzir-se o valor da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL do montante apurado como lucro real, que constitui a base de cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ” (redação da tese aprovada nos termos do item 2 da Ata da 12ª Sessão Administrativa do STF, realizada em 09.12.2015) Tema 214: “É constitucional a inclusão do valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS na sua própria base de cálculo” (redação da tese aprovada nos termos do item 2 da Ata da 12ª Sessão Administrativa do STF, realizada em 09.12.2015) Por elucidativo ao tema, destaco o trecho que segue do voto condutor do julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 214, proferido pelo Ministro Gilmar Mendes: “Primeiramente, observo que a inclusão do valor destacado do tributo em sua própria base de cálculo não é um fenômeno isolado no sistema tributário pátrio. Sobre o tema, confira-se estudo de Everardo Maciel e José Antônio Schontag: "Nos regimes de tributação ad valorem, são admitidas diversas formas de incidência de alíquotas. Basicamente, elas podem ser grupadas em três categorias: proporcionais, "por dentro” e "por fora". A opção por uma delas decorrerá exclusivamente e sempre da legislação de regência, informada pela técnica de tributação mais adequada. Na incidência proporcional, o tributo devido é calculado pela aplicação direta da alíquota sobre a base de cálculo. São exemplos dessa hipótese o IPI e o imposto de importação. No IPI, a base de cálculo definida no CTN é 'o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria', sem que se faça qualquer menção à inclusão do próprio imposto em sua base de cálculo. Por conseguinte, um aumento de 10% na alíquota implica aumento de 10% no imposto devido. Na incidência 'por dentro', o tributo goza da peculiar condição de integrar sua própria base de cálculo. É o caso do ICMS, conforme preceituam o art. 155, § 2°, inciso XII, alínea i, da Constituição e o art. 13, § 1”, da Lei Complementar n° 87. Ainda que possa parecer estranho para leigos, aumento de 10% na alíquota do ICMS significa aumento de 11,11% no imposto devido. A base de cálculo do ICMS, na conformidade com a Lei Complementar nº 87, é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria. Portanto, no caso de saídas de um estabelecimento industrial o ICMS e o IPI têm a mesma base de cálculo, observadas as seguintes peculiaridades quanto à tributação reflexa: o IPI incide sobre o ICMS, pois de acordo com o texto constitucional esse imposto estadual é parte integrante do valor da operação; por sua vez, o ICMS, ressalvados as situações previstas no art. 155, § 2, XI, da Constituição, também incide sobre o IPI. Constituem outros exemplos da incidência 'por dentro': a contribuição social incidente sobre a folha de salário e a devida pelo empregado, previstas, respectivamente, no inciso I, a, e no inciso I1 do art. 195 da Constituição. No primeiro caso, a contribuição ao incidir sobre a folha de salário incide, em conseqüência, sobre a contribuição do empregado; no outro, a contribuição do empregado ao incidir sobre o valor bruto da remuneração incide, por conseguinte, sobre ela mesma. Inclusões ou exclusões na incidência 'por dentro', tal como ocorre no imposto de renda, são as previstas na legislação aplicável, como é o caso da expressa exclusão da incidência do imposto sobre a contribuição do empregado. Por fim, no tocante à incidência 'por fora', o tributo é excluído de sua base de cálculo previamente à determinação do montante devido. Era o que acontecia com a CSLL, desde sua instituição até o advento da Lei n° 9.316, de 1996. O mesmo aumento de 10% na alíquota, nessa hipótese, resultaria em aumento de 9,09% do tributo devido. A ampla diversidade dos exemplos apontados serve apenas para demonstrar que não é inusitado, no modelo tributário brasileiro, um tributo incluir, em sua base de cálculo, ele próprio ou outro tributo. Houvesse algum impedimento de incidência reflexa, o ICMS e as contribuições sociais deveriam ser excluídos da base de cálculo do IPI, o imposto de importação e as contribuições sociais da base de cálculo do ICMS, as contribuições sociais da base de cálculo do ISS e delas mesmas, etc. Ao fim e ao cabo, haveria uma verdadeira subversão do sistema tributário brasileiro sem motivação razoável". (MACIEL, Everardo & SCHONTAG, José Antônio. “O ICMS E A BASE DE CÁLCULO DA COFINS", Valor Econômico, edição de 2.8.2002) No que diz respeito ao cálculo "por dentro" do ICMS, o tema foi objeto de amplo debate nesta Corte, no julgamento do RE 212.209, Red. para o acórdão Min. Nelson Jobim, D] 14.2.2003, ementado nos seguintes termos: . "Constitucional. Tributário. Base de cálculo do ICMS: inclusão no valor da operação ou da prestação de serviço somado ao próprio tributo. Constitucionalidade. Recurso desprovido". Na sessão de 23.6.1999, o Plenário do STF, vencido apenas o Min. Marco Aurélio, pacificou o entendimento no sentido de que a quantia referente ao ICMS faz parte do "conjunto que representa a viabilização jurídica da operação"e, por isso, integra sua própria base de cálculo. Em outras palavras, a base de cálculo do ICMS, definida como o valor da operação da circulação de mercadorias (art. 155, II, da CF/1988, c/ c arts. 29, I, e 89, I, da LC 87/1996), inclui o próprio montante do ICMS incidente, pois ele faz parte da importância paga pelo comprador e recebida pelo vendedor na operação. [...] Merece destaque, ainda, o voto do Min. Ilmar Galvão, que, mais uma vez, foi bastante elucidativo quanto à possibilidade de incidência "por dentro" de tributos: ”Sr. Presidente, não é a primeira vez que esta questão é discutida no Supremo Tribunal Federal. Já tive ocasião de relatar casos análogos, não só aqui mas também no STJ. Esse, aliás, não poderia ser um assunto novo, se o DL n° 406 está em vigor há trinta anos. Não seria somente agora que o fenômeno da superposição do próprio ICMS haveria de ser identificado. Vale dizer que, se a tese ora exposta neste recurso viesse a prevalecer, teríamos, a partir de agora, na prática, um novo imposto. Trinta anos de erro no cálculo do tributo. Em votos anteriores, tenho assinalado que o sistema tributário brasileiro não repele a incidência de tributo sobre tributo. Não há norma constitucional ou legal que vede a presença, na formação da base de cálculo de qualquer imposto, de parcela resultante do mesmo ou de outro tributo, salvo a exceção, que é a única, do inciso XI do parágrafo 29 do art. 155 da Constituição, onde está disposto que o ICMS não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos. (...) Se, na verdade, não pudesse haver tributo embutido na base de cálculo de um outro tributo, então não teríamos que considerar apenas o ICMS, mas todos os outros. O problema se mostra relativamente à contribuição para o IAA e para o IBC, não havendo como afastar essas contribuições da base de cálculo do ICMS. Por que, então, o problema em tomo do ICMS sobre ICMS e não do ICMS sobre o IPI, sobre as contribuições (COFINS, PIS)? Na verdade, o preço da mercadoria, que serve de base de cálculo ao ICMS, é formado de uma série de fatores: o custo; as despesas com aluguel, empregados, energia elétrica; o lucro; e, obviamente, o imposto pago anteriormente. O problema, diria que é até de ordem pragmática, em face da dificuldade, quase incontornável, de eliminar-se da base de cálculo de um tributo tudo o que decorreu de tributação. O inciso do art. 34 do ADCT, sobre energia elétrica, é a prova do afirmado, ao estabelecer que o imposto é cobrado sobre o valor da operação final. É assim que o ICMS incide. Peço vênia, portanto, para não conhecer do recurso." (Voto do Min. Ilmar Galvão no RE 212.209/RS, Red. p/ o acórdão Min. Nelson Jobim, D] 14.2.2003). Destarte, assentou-se de maneira inequívoca que a Constituição Federal não torna imune o montante referente ao ICMS recebido pelo contribuinte de jure e repassado pelo contribuinte de facto, pois constitui parte do valor final da operação de transferência de mercadoria. [...]” (g.n.) E nem se diga que a questão traz similitude com aquela decidida no Tema de Repercussão Geral n.º 69 (RE n.º 574.706), em que fixada tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”, uma vez que se tratam de situações jurídicas distintas. Registra-se que, diversamente da não-cumulatividade prevista constitucionalmente em relação ao ICMS e ao IPI, aquela aplicável às contribuições ao PIS e COFINS depende de previsão legal e pode beneficiar distintos setores da atividade econômica, conforme disposto no § 12 do artigo 195 da Constituição, incluído pela Emenda Constitucional n.º 42/03. Não se trata, portanto, de um direito individual do contribuinte de somente pagar o tributo se observada a não-cumulatividade, na medida em que o dispositivo constitucional apenas conferiu ao legislador a faculdade de instituir a não-cumulatividade, podendo, inclusive, adotar como critério diferenciador o setor da atividade econômica atingido, sem que isso implique em ofensa à isonomia. Nesse sentido, o e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 756 (RE n.º 841.979), firmou tese no sentido de que “o legislador ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art. 195, § 12, da Constituição, respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional das contribuições ao PIS e COFINS e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança”. A não-cumulatividade visa ao controle da tributação que ocorre de forma sucessiva (“em cascata”) na cadeia econômica, a fim de desonerá-la. Dentre os métodos de operacionalização da não-cumulatividade destaco para a solução do caso concreto: (i) “imposto contra imposto” (tax on tax), em que se subtrai o tributo suportado na entrada, cujo valor do crédito vem destacado no próprio documento fiscal, do montante devido na saída; e ,(ii) “base contra base” (basis on basis), em que os custos ou despesas são contrapostos ao valor de receitas, sendo deduzido da base de cálculo aquilo que autorizado por lei, de sorte que não há, necessariamente, uma subtração do que incidiu efetivamente na operação anterior. O regime não-cumulativo previsto na Carta para o ICMS se manifesta por meio de compensação “do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal” (artigo 155, § 2º, I), isto é, o ICMS adota a técnica “imposto contra imposto”. Quando submetidas ao regime não-cumulativo, a apuração das contribuições ao PIS e COFINS adotam a técnica “base contra base”, pois, na forma dos artigos 3º das Leis n.ºs 10.637/2002 e 10.833/2003, sobre o valor de determinados custos ou despesas é aplicada uma alíquota e este crédito financeiro é descontando do valor calculado pela aplicação de uma alíquota sobre a base de cálculo. Por nem sempre a tributação das contribuições ao PIS e COFINS se submeter a não-cumulatividade e, mesmo quando submetida, por adotar diferente metodologia de operacionalização do regime não-cumulativo relativamente à tributação do ICMS, exsurge a impossibilidade de aplicação, por analogia, do precedente qualificado firmado no leading case relativo ao Tema de Repercussão Geral n.º 69. Ao determinar a não incidência das contribuições ao PIS e COFINS sobre os valores de ICMS destacados em nota fiscal, a Corte Suprema observou, justamente, que a operacionalização da não-cumulatividade do ICMS se dá “imposto contra imposto”, de sorte que o valor do tributo devido em cada elo da cadeia econômica é perfeitamente identificável e integralmente transferido ao Estado tributante, de sorte que tal receita, na verdade, representa ônus fiscal. Assim, inexistentes óbices constitucionais à incidência das contribuições ao PIS e COFINS sobre suas próprias bases de cálculo, tem-se legítima a tributação na forma legalmente prevista. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes deste Tribunal: “DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PIS E COFINS INCIDENTES EM SUAS PRÓPRIAS BASES DE CÁLCULO. INCIDÊNCIA DE TRIBUTO SOBRE TRIBUTO TEM SIDO VALIDADA PELAS CORTES SUPERIORES. INVIABILIDADE DA EXCLUSÃO. 1. As contribuições ao PIS e à COFINS, na sistemática não cumulativa, incidem sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, consoante previsão do art. 1º das leis 10.637/2002 e 10.833/2003. Na sistemática cumulativa (Lei 9.718/1998, arts. 2º e 3º), a base de cálculo destas contribuições é o faturamento, o qual compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei 1.598/1977. 2. Tendo em vista sua natureza abrangente, a receita total ou bruta engloba todos os ingressos financeiros, de modo que nela estão computados os valores decorrentes dos preços obtidos nas vendas e nas prestações de serviços realizados pela empresa. Na composição deste montante, por sua vez, está inserido o valor dos tributos incidentes nas aquisições anteriores e que foram repassados ao comprador ou tomador de serviços. Por conseguinte, referida receita inclui também a parcela relativa às contribuições ao PIS e à COFINS. 3. Inexiste fundamento legal ou constitucional que permita a exclusão do PIS e da COFINS de suas próprias bases de cálculo, circunstância que é corroborada pela jurisprudência dos tribunais superiores, que têm admitido a incidência de tributo sobre tributo (o chamado “cálculo por dentro”). 4. Em demanda semelhante à discussão travada nestes autos, o Supremo Tribunal Federal firmou compreensão no sentido da constitucionalidade da inclusão do ICMS em sua própria base de cálculo (RE 582.461 – Tema 214). Na mesma linha de entendimento, o Pretório Excelso manifestou entendimento no sentido de que a CSLL integra a sua própria base de cálculo (RE 582.525 – Tema 75). 5. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, já se manifestou sobre a específica discussão travada nestes autos e reafirmou entendimento exarado em sede de representativo de controvérsia no sentido de que “É plenamente legítima a incidência de tributo sobre tributo ou imposto sobre imposto, salvo determinação constitucional ou legal expressa em sentido contrário”. 6. Não se mostra adequada a pretendida adoção do entendimento manifestado pelo STF no RE 574.706 (tema 69), mesmo ao se considerar a identidade de bases de cálculo com a presente hipótese. Isso porque, conforme explanado acima, em situações mais próximas à questão ora em debate (incidência de tributo sobre tributo), as Cortes Superiores validaram a tributação. Precedentes desta Terceira Turma. 7. Apelação da impetrante não provida.” (TRF3, 3ª Turma, ApCiv 5026683-31.2022.4.03.6100, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 05.08.2023) “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INCLUSÃO DO PIS E DA COFINS NAS PRÓPRIAS BASES DE CÁLCULO. POSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO RE 574.706/PR. 1. O faturamento corresponde às receitas advindas com as atividades que constituam objeto da pessoa jurídica, ou seja, à receita bruta das vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços, ou exclusivamente de serviços, de acordo a atividade própria da pessoa jurídica, se mercantil, comercial, mista ou prestadora de serviços. 2. O Supremo Tribunal Federal analisou a questão da incidência tributária mediante o denominado "cálculo por dentro", com entendimento de que referida cobrança não viola norma constitucional. 3. O C. STJ, por sua vez, ao analisar a questão, também já se pronunciou pela possibilidade de inclusão das contribuições ao PIS e à COFINS sobre sua própria base de cálculo. No mesmo sentido é a jurisprudência deste Tribunal. 4. Inviável a aplicação do entendimento firmado no RE 574.706/PR, por não se tratar aqui de inclusão do ICMS nas bases de cálculo do PIS e da COFINS. Precedentes. 5. Apelação desprovida. (TRF3, 6ª Turma, ApCiv 5013327-03.2021.4.03.6100, relator Desembargador Federal Mairan Maia, j. 30.06.2023) Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte impetrante, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição. São Paulo, data constante da certificação de assinatura eletrônica.
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