Processo nº 1000821-52.2024.8.11.0102
ID: 316606621
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE VERA
Classe: AçãO PENAL DE COMPETêNCIA DO JúRI
Nº Processo: 1000821-52.2024.8.11.0102
Data de Disponibilização:
04/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VIDIO RODRIGUES BARBOSA
OAB/GO XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VERA AÇÃO PENAL DE COMPETÊNCIA DO JÚRI N. 1000821-52.2024.8.11.0102 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ACUSADO: LEONARDO HENRIQUE …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VERA AÇÃO PENAL DE COMPETÊNCIA DO JÚRI N. 1000821-52.2024.8.11.0102 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ACUSADO: LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO SENTENÇA 1. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DE MATO GROSSO, no uso de suas atribuições instituicionais, ofereceu denúncia contra LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, devidamente qualificado nos autos, pela prática, em tese, do crime tipificado no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, tendo como vítima Nilsimar Lima Oliveira. Nesse sentido, depreende-se da denúncia (ID 171954332): [...] 1. RESUMO DOS FATOS (art. 121, § 2º, II e IV, do CP) No dia 23/06/2024, por volta das 16h45min, em residência particular localizada na Rua Venezuela, n.º 1603, Bairro Esperança, neste município de Vera/MT, o denunciado LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, com consciência, vontade e por motivação fútil (ciúmes), mediante um golpe de faca, matou a vítima Nilsimar Lima Oliveira, mediante recurso que dificultou a defesa da vítima (surpresa). 2. DETALHAMENTO DOS FATOS Consta do incluso caderno investigativo que o denunciado e a vítima eram vizinhos, e tiveram uma discussão, inicialmente, por que o denunciado LEANDRO prometera matar os gatos da vítima, que lhe incomodavam. No dia dos fatos, Carol, ex-esposa do denunciado e Vera, esposa da vítima, estavam sentadas em frente à residência de Carol, conversando acerca de umas mensagens que a vítima Nilsimar encaminhou àquela, o que teria causado ciúmes no denunciado, em relação à ex-esposa. Em dado momento, o denunciado passou por elas, portando uma faca, indo em direção à residência da vítima, que morava nos fundos e estava consumindo bebida alcoólica. Nesse ínterim, Carol questionou o denunciado e tentou impedilo, como também Vera lançou uma pedra nele, todavia, mesmo assim o denunciado se aproximou da vítima e, abruptamente, desferiu-lhe um golpe de faca, acertando-o na altura do peito, sem nenhuma oportunidade de defesa. Em seguida, Carol segurou as mãos do denunciado e tomou a faca, evitando que continuasse a agredir a vítima. Já Vera prestou socorro à vítima, carregando-o para frente da residência, todavia, não houve tempo para o socorro médico, e a vítima faleceu. Enquanto isso, o denunciado empreendeu fuga do local, apresentando-se posteriormente perante a autoridade policial, acompanhado de advogado, quando foi interrogado e confessou os fatos, todavia, alegando legítima defesa. Realizado o exame pericial n.º 541.1.01.8985.2024.186630-A01, a necrópsia apontou as seguintes lesões na vítima [...]. 3. PEDIDO Ante o exposto, denuncio LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO como incurso no art. 121, § 2º, incisos II e IV, do CP [...]. (Destaques no original). Não sendo caso de rejeição (CPP, art. 395), a denúncia foi recebida em 3/12/2024 (ID 177477339). Devidamente citado (ID 191374898), o réu apresentou resposta à acusação por meio de advogado constituído, arrolando as mesmas testemunhas indicadas na peça acusatória (ID 193520232). Realizada audiência de instrução da primeira fase do rito do Júri, foram ouvidas 2 (duas) informantes e 1 (uma) testemunha arrolada em comum pelas partes, bem como promovido o interrogatório do réu (ID’s 195365688 e 195372792). O Ministério Público apresentou alegações finais escritas, requerendo, em suma, a pronúncia do réu pela prática do delito exposto no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, tendo como vítima Nilsimar Lima Oliveira (ID 197082742). A defesa apresentou alegações finais escritas, pugnando, em síntese, pela absolvição sumária do réu e, subsidiariamente, pelo afastamento das qualificadoras narradas na denúncia (ID 197302444). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO (CRFB/88, art. 93, IX) Cuida-se de ação penal pública incondicionada movida pelo Ministério Público de Mato Grosso contra LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, devidamente qualificado nos autos, em decorrência da prática, em tese, do crime tipificado no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, tendo como vítima Nilsimar Lima Oliveira, in verbis: Art. 121 - Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. [...] § 2° Se o homicídio é cometido: [...] II - por motivo fútil; [...] IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. [...] Pena - reclusão, de doze a trinta anos. Ab initio, imperioso destacar que "a pronúncia encerra em si um juízo de viabilidade da acusação, ato por meio do qual o Magistrado, em fundamentação propositalmente comedida: a) afirma a existência de prova quanto à ocorrência do crime investigado; b) destaca os indícios de autoria pelo réu; e c) relata as circunstâncias em que supostamente o delito se deu. Restringindo-se esse ato a um 'mero reconhecimento de justa causa para a fase do júri'" (STJ, AgRg no AREsp nº 895.451/AL, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. em 13/9/2017). Assim, a pronúncia do acusado está condicionada à existência de prova da materialidade do delito e de indícios suficientes de autoria (CPP, art. 413, caput). Com efeito, na primeira fase de apuração dos crimes dolosos contra a vida, impera um juízo sumário de conhecimento, cabendo ao juiz singular tão somente admitir ou rejeitar a acusação, sem incursionar no exame do mérito da demanda, cujo desate toca, com exclusividade, ao Tribunal Popular. Logo, não se está diante de decisão de caráter condenatório, mas, sim, meramente declaratória, preordenada a exprimir a admissibilidade da acusação. Daí não se exigir prova plena acerca da autoria delitiva, sobretudo porque, havendo dúvida razoável a respeito, ou, até mesmo, acerca do elemento volitivo da ação, esta deverá ser submetida à apreciação do juízo natural dos crimes contra a vida. Aliás, na lição de Guilherme de Souza Nucci: [...] Não é à toa que o procedimento do júri possui três fases, a primeira das quais se destina a filtrar a imputação, permitindo a remessa do caso à apreciação do Tribunal Popular se – e somente se – houver provas mínimas a gerar dúvida razoável no espírito do julgador, de modo que, analisando-se as provas, surjam duas ou mais vertentes para a decisão. Noutros termos, a decisão de pronúncia – juízo de admissibilidade da acusação – é momento sério e importante para o réu, devendo ser enfrentado pelo magistrado com a indispensável cautela. Jamais se pode enviar a júri um caso em que as provas, uníssonas, demandam absolvição por insuficiência de provas. Mesmo que o julgador não possa absolver sumariamente, é mais adequado optar pela impronúncia, quando perceber ser totalmente inviável uma condenação justa, no futuro. A expressão in dubio pro societate (na dúvida, em favor da sociedade) é mais didática do que legal. Não constitui um princípio do processo penal, ao contrário, o autêntico princípio calca-se na prevalência do interesse do acusado (in dubio pro reo). Mas tem o sentido eficiente de indicar ao juiz que a decisão de pronúncia não é juízo de mérito, porém de admissibilidade. Por isso, se houver dúvida razoável, em lugar de absolver, como faria em um feito comum, deve remeter o caso à apreciação do juiz natural, constitucionalmente recomendado, ou seja, o Tribunal do Júri [...]. (Código de Processo Penal Comentado, 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, fl. 865). (Destacou-se). Similarmente, preleciona Renato Brasileiro de Lima: [...] Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusaionis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência [...]. (Manual de Processo Penal. 4. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 1336). Não há que se falar, portanto, em aplicação do princípio do in dubio pro reo; ‘[...] neste momento processual, vigora o princípio in dubio pro societate. Isto quer dizer que, existindo qualquer dúvida quanto à ocorrência das causas que implicam o afastamento da competência do júri, cabe ao juiz pronunciar o réu. Não se ignora, por certo, a existência de corrente apregoando a não incidência do postulado in dubio pro societate, e, sim, também nesta fase do processo dos crimes dolosos contra a vida, do in dubio pro reo. Tal orientação, porém, é minoritária e não possui fôlego nos Tribunais Superiores, onde persiste o entendimento de que “a decisão de pronúncia constitui juízo de admissibilidade da acusação, não exige a certeza necessária à condenação”, sendo que “eventuais dúvidas, nessa fase, devem ser solucionadas sempre à luz do princípio in dubio pro societate” [...]. (AVENA, Norberto, op. cit., fl. 829). (Destacou-se). Fixadas tais premissas, registra-se, desde logo, que a prova coligida até então está apta a autorizar a pronúncia de LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO pela prática, em tese, do crime tipificado no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, tendo como vítima Nilsimar Lima Oliveira, haja vista terem sido satisfatoriamente delineadas as provas da ocorrência da infração penal e os indícios suficientes de autoria por parte do acusado, tal como se exige nesta fase do denominado judicium accusationis. Com efeito, a materialidade do delito narrado na denúncia está demonstrada por meio de todo o conjunto probatório produzido neste feito, destacando-se, em especial: a) o boletim de ocorrência registrado na data do fato (ID 169501777, fls. 2/4); b) o Termo de Exibição e Apreensão n. 2024.16.300999 (ID 169501777, fl. 11); c) os “prints” e áudio retratando a existência de conversas entre a vítima e Carol Aline de Almeida Lieberknecht (ID 169501781 até ID 169501786); d) o Termo de Entrega n. 2024.16.308341 (ID 169501789); e) o Relatório de Investigação n. 2024.13.79091 (ID 169502592; f) a foto retratando a possível faca, com resquícios de sangue, utilizada no suposto crime (ID 169502592, fl. 10 e ID 169502593); g) a foto demonstrando a vítima já em óbito no dia do fato (ID 169502592, fl. 10 e ID 169502601); h) a foto apontando a possível pedra utilizada por Vera Lúcia Ricci Cardoso, supostamente para evitar a concretização do homicídio em questão (ID 169502594); i) as fotos do local do crime (ID 169502595 até ID 169502600); j) o vídeo demonstrando o estado da vítima logo após a ocorrência do crime (ID 169502602); k) o laudo necropapiloscópico confirmando que a vítima tratava-se de Nilsimar Lima Oliveira (ID 169502603); l) o laudo pericial n. 541.2.21.8985.2024.188259-A01, cuja conclusão foi no sentido de que “se trata de homicídio perpetrado contra a pessoa de NILSIMAR LIMA OLIVEIRA, atingido por um ou mais golpes de arma branca. [...] A faca encontrada no local, nas proximidades do portão menor, foi recolhida e embalada em envelope lacrado 06043660 pela equipe da Polícia Judiciária Civil e posteriormente encaminhada e já examinada. Se trata de um objeto perfurocortante capaz de lesionar uma pessoa podendo até causar sua morte” (ID 169502604, fl. 15, destaques no original); e, m) o laudo de necrópsia n. 541.1.01.8985.2024.186630-A01, dando conta de que “Ao exame necroscópico externo verificou-se: 1. Grande quantidade de sangue oriundo de ferimento em região de tórax. 2. Perfuração em região de tórax condizente com arma branca de tamanho médio de 1 ou 2 gumes. Sinais de golpe em sentido ascendente e medial (de baixo pra cima e para o “meio” do corpo) e realizado com a mão direita. Ao exame necroscópico interno verificaram-se: 1. Sangue livre em cavidade tóracica. 2. Perfuração do músculo cardíaco com laceração de ventrículo esquerdo”, bem como concluindo que “a morte de Nilsimar Lima Oliveira deu-se em decorrência de Choque Hipovolêmico” (ID 169502605). Por pertinente, cabe reprisar as fotos demonstrando o estado da vítima já em óbito (ID 169502592), bem como a suposta faca utilizada para, em tese, matá-la (ID 169502593): Tais elementos, por certo, fornecem lastros suficientes à ocorrência do delito narrado na denúncia (ID 171954332). Em prosseguimento, subsistem fundados indícios outorgando a autoria do crime a LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, autorizando-se, pois, a sua pronúncia. Nesse sentido, ao ser ouvida perante a Autoridade Policial, Carol Aline de Almeida Lieberknecht, ex-esposa do denunciado, mencionou ter visualizado a ocasião em que a vítima Nilsimar Lima Oliveira, enquanto estava sentada em uma cadeira, foi, em tese, atingida por um golpe de faca desferido por LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO. Disse, ainda, ter recebido mensagens da vítima Nilsimar Lima Oliveira antes da concretização do suposto crime, sendo elas motivo gerador de ciúmes em LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO (ID 169501780): [...] QUE a depoente que é ex-esposa do Sr. Leonardo Henrique de Oliveira Macedo. No dia dos fatos, estava na companhia da Sra. Vera Lucia Ricci Cardoso, esposa da vítima, em frente à residência da depoente. Ambas conversavam sobre algumas mensagens que a vítima havia enviado à depoente. A depoente revela que essas mensagens já haviam gerado uma discussão anterior devido ao ciúmes de seu ex-marido, Leonardo. Durante essa conversa em frente à residência, o suspeito, Leonardo, passou por elas e entrou no quintal com uma faca na cintura, do lado de trás. A depoente questionou sua presença ali, momento em que Vera atirou uma pedra na tentativa de impedi-lo. A depoente narra que a vítima estava sentada em uma cadeira, e houve uma conversa entre a vítima e o suspeito, e em seguida, Leonardo desferiu um golpe de faca na vítima sem tempo dela reagir, isso com a vítima ainda sentada na cadeira neste momento. Desesperada, a depoente segurou as mãos do agressor e tomou a faca dele. Enquanto isso, Vera levava a vítima, já ferida, para a frente da residencia, e a depoente a acompanhou, devido a isso não conseguiu ver para onde Leonardo foi após os acontecimentos. Narra também, que ambos estavam embreagados, tanto a vítima como o suspeito [...]. (Destacou-se). Em Juízo, Carol Aline de Almeida Lieberknecht reprisou seus dizeres (ID 195372792): [...] que ficou com LEONARDO por 4 anos e tiveram 2 filhos, mas resolveram se separar devido ao vício de LEONARDO em álcool [...]; que mesmo após o termino, LEONARDO insistia para voltarem, mas a declarante se recusava; que era vizinha da vítima e podiam visualizar a casa um do outro pelos fundos [...]; que a vítima Nilsimar começou a dar em cima da declarante, lhe mandando mensagens e lhe encarando (principalmente na própria casa, já que era possível ver a casa um do outro pela porta dos fundos), gerando confusões entre a declarante, LEONARDO, Vera e Nilsimar (seus vizinhos); que, inicialmente, Nilsimar acusou a declarante de ter procurado ele, fazendo com que Vera arrumasse intrigas com a declarante; que, certo dia, a declarante discutiu com LEONARDO por causa de pensão e decidiu sair para beber e esfriar a cabeça; que postou uma foto em suas redes sociais e Nilsimar respondeu, dizendo que poderia ir até o bar em que ela se encontrava; que a declarante disse que não gostaria que Nilsimar fosse até o local, pois ela tinha recém se separado, ele era seu vizinho e casado [...]; que voltou para casa e foi conversar com Vera [...]; que as duas sentaram em dois banquinhos, em frente às suas casas; que Carol mostrou as mensagens de Nilsimar para Vera, pedindo para que Vera conversasse com Nilsimar para resolver essa situação; que Vera respondeu as mensagens de Nilsimar pelo próprio celular da declarante; que LEONARDO passou andando rapidamente, indo em direção à casa vizinha; que viu algo aparentando ser uma faca na cintura de LEONARDO; que a declarante e Vera, preocupadas, seguiram LEONARDO e perguntaram o que ele iria fazer; [...] que tudo aconteceu muito rápido; que viu LEONARDO tirar a faca da cintura para frente, acertando a vítima Nilsimar na barriga [...]; que Vera arrastou seu marido para a frente da casa, local em que a vítima perdeu as forças e caiu; que Nilsimar caminhou uma distância aproximada dos fundos da casa até a frente do portão; que a declarante pulou em LEONARDO, segurou as mãos dele e perguntou o porquê dele fazer aquilo, se valia a pena, se ele não havia pensado nos filhos dele; que LEONARDO soltou a faca e começou a chorar; que a declarante foi até a frente da casa, jogando a faca em um canto do portão, a fim de esconder o objeto; que, então, viu que o golpe havia atingido o peito de Nilsimar, e não a barriga; que Nilsimar começou a ficar muito pálido e, cerca de 2 minutos depois, Vera disse “não adianta mais chamar a ambulância porque ele morreu”; que Vera atirou uma pedra em LEONARDO; [...] que acredita que o motivo de LEONARDO ter adotado essa conduta foi por ciúmes [...]; que sempre deixou claro para LEONARDO que nunca ficaria com seu vizinho Nilsimar; que, no dia dos fatos, não mostrou as mensagens de Nilsimar para LEONARDO, porém LEONARDO tinha ciência das mensagens anteriores [...] (ID 195372792, minutagem: 2min37seg - 25min44seg; destacou-se). De sua vez, Vera Lúcia Ricci Cardoso, mulher da vítima, também disse, em ambas as fases procedimentais, ter visualizado a ocasião em que seu esposo Nilsimar Lima Oliveira, enquanto estava sentado em uma cadeira, foi, em tese, atingido de inopino pelo golpe de faca desferido por LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO. Confirmou, outrossim, a questão envolvendo as mensagens eviadas por Nilsimar Lima Oliveira a Carol Aline de Almeida Lieberknecht, sua vizinha e ex-mulher de LEONARDO HENRIQUE OLIVEIRA MACEDO: [...] Que no dia dos fatos, passou o dia inteiro em casa com seu esposo e na hora em que tudo aconteceu estava sentada na frente da casa conversando com a CAROL ALINE, esposa do suspeito Leonardo. Que viu o momento em que LEONARDO entrou em seu terreno com uma faca na cintura, que CAROL ALINE também viu e falou para a depoente correr a avisar NILSIMAR. Que ambas foram atrás do suspeito, sendo que CAROL foi na frente e tentou segurar o marido, mas não conseguiu. A depoente chegou a jogar uma pedra que acertou as costas de LEONARDO, mas nada fez com que ele parasse. Que quando LEONARDO chegou, NILSIMAR estava sentado mexendo no celular e os dois não conversaram e que foi muito rápido. LEONARDO chegou e foi direto para cima de NILSIMAR e desferiu o golpe, mesmo com a CAROL tentando lhe impedir. Que puxou NILSIMAR e conseguiu levá-lo até a calçada do vizinho, onde ele desfaleceu. Que CAROL continuou segurando LEONARDO e conseguiu tomar a faca dele. O suspeito saiu do local e foragiu em seguida. Perguntado sobre as mensagens enviadas por NILSIMAR para CAROL, respondeu que realmente ele enviou tais mensagens, convidando-a para sair, e que viu as mensagens por que CAROL lhe mostrou. Que LEONARDO também mostrou as mensagens para a declarante e que na ocasião falou para seu marido parar de enviá-las. Perguntado se ficou sabendo de mensagens de NILSIMAR pedindo comida para CAROL, respondeu que ficou sabendo há uma semana atrás, que a mãe de LEONARDO foi quem lhe contou, porém não se recorda de ter falado sobre isso com o suspeito. Perguntado como era a convivência da vítima com o suspeito, respondeu que antes dos fatos era tranquilo, que uma vez LEONARDO falou que mataria os gatos da depoente e NILSIMAR ficou bravo e falou que daria um tiro no LEONARDO se ele fizesse isso, no entanto, afirma que a vítima nunca teve arma. Perguntado do motivo pelo qual LEONARDO matou NILSIMAR, respondeu que não faz ideia, pois no dia dos fatos ele não falou nada, apenas chegou e esfaqueou a vítima. Antes de tudo não tem conhecimento de nenhuma briga, apenas os atritos devido as mensagens. Perguntado se viu a faca na cintura de LEONARDO quando ele foi até NILSIMAR, respondeu que sim, que era uma faca do cabo branco. Perguntado se a faca era de propriedade da depoente, respondeu que não, que LEONARDO a trouxe da casa da sua mãe e acredita que tudo foi premeditado, pois no dia tinha um amigo da vítima bebendo com ele e o suspeito esperou ele ir embora para cometer o crime. Que LEONARDO passou pela depoente e por CAROL andando rapidamente e antes de chegar em NILSIMAR já estava com a faca na mão. Perguntado como o suspeito se vestia, respondeu que estava de shorts e sem camisa e que isso facilitou para verem a faca e correr para tentar evitar o pior. Reitera que não teve nenhuma discussão, que nenhuma palavra foi dita pelo suspeito para a vítima, que foi ferida enquanto ainda estava sentada, pois não deu tempo nem de se levantar. Que após ser ferida a vítima faleceu pouco tempo depois e ainda conseguiu se despedir da depoente e pedir para ela cuidar de sua filha de 07 anos. Perguntado se NILSIMAR estava embriagado, respondeu que sim. Perguntado se LEONARDO estava embriagado, respondeu que acredita que sim. Perguntado se a vítima era violenta, respondeu que não, que era uma pessoal calma, brincalhona e sorridente. Que amava os aminais e a família [...]. (Depoimento na Delegacia de Polícia, ID 169501787, destacou-se). [...] que estava em sua casa com seu marido, Nilsimar, quando Carol lhe chamou para conversar, então a declarante se dirigiu até a frente de sua casa; que Carol mostrou-lhe as mensagens que Nilsimar estava enviando novamente [...]; que LEONARDO passou em frente à casa de Carol, em direção à residência da vítima Nilsimar; que Carol disse tê-lo visto portando uma faca na cintura; que a declarante também reparou nisso; que ambas foram atrás de LEONARDO; que arremessou uma pedra contra LEONARDO e atingiu suas costas, mas isso não chegou a intimidá-lo; que Nilsimar estava sentado em uma cadeira e, ao perceber que alguém entrou, levantou a cabeça; que, então, LEONARDO rapidamente desferiu um golpe de faca; que Carol se jogou em cima de LEONARDO e disse para ele não fazer isso, onde os dois caíram; que aproveitou para pegar a vítima Nilsimar e sair da casa, temendo que LEONARDO lhe golpeasse também; que Nilsimar foi perdendo as forças e caiu na calçado do vizinho, falecendo em seu colo [...]; que nega a suposta fala de Nilsimar, no sentido de que mataria LEONARDO se ele não o matasse; que houve um desentendimento entre os quatro antes, em razão de Nilsimar ter dado em cima de Carol cerca de 15 dias antes; que haviam resolvido isso sem discussões; [...] que antes de LEONARDO ir atrás de Nilsimar, Nilsimar estava bebendo com alguns amigos; que LEONARDO esperou os amigos de Nilsimar se retirarem para ir até ele; que já haviam discutido antes, pois os gatos da declarante teriam adentrado à casa de LEONARDO, e LEONARDO, bêbado, disse que mataria os gatos, se desentendendo com Nilsimar [...]; que a declarante disse que aumentaria a cerca para que seus gatos não passassem para a casa da frente, resolvendo o conflito; que eram amigos no começo, onde até iam na casa um do outro; [...] que Nilsimar foi assassinado por volta das 16 horas; que Nilsimar não possuía nenhum tipo de arma enquanto morava com a declarante; que LEONARDO saiu da casa de sua mãe sem camisa, apenas com um shorts de pano mole, deixando visível o cabo branco da faca; que não houve nenhuma discussão ou conversa antes de LEONARDO desferir a facada na vítima Nilsimar; que Nilsimar não era violento, ele sempre foi uma pessoa calma, brincalhona e sorridente, e ninguém tinha o que reclamar dele [...]; que acredita que essa atitude de LEONARDO ocorreu devido às mensagens enviadas por Nilsimar para Carol; que se dava bem com Carol, até brincava com os filhos dela, conversava com sua sogra e, quando ela mostrou as mensagens, escutou Carol numa boa e não houve intrigas. (Depoimento em Juízo, ID 195372792, minutagem: 1min56seg 15min1seg; destacou-se). Em arremate, tem-se o testemunho de Carlos Augusto Bernardino Simonetti, Investigador de Polícia responsável pela elaboração do laudo pericial demonstrando a dinâmica da cena do crime: [...] que chegando lá, a PM já estava fazendo local de crime; que visualizou um corpo estendido na calçada; que conversando com a esposa da vítima, ela informou que viu LEONARDO vindo da casa dele e passando por ela e por Carol, que viu uma faca na cintura de LEONARDO, pois ele estava sem camisa; que as duas seguiram LEONARDO; que Vera chegou a arremessar uma pedra em LEONARDO, mas isso não o impediu; que LEONARDO chegou perto da vítima Nilsimar e esfaqueou o peito dele, tentando sair logo na sequência; que Carol segurou LEONARDO pelo braço até que ele largasse a faca; que, posteriormente, LEONARDO pulou a cerca; que isso se deu por ciúmes, pois Carol e LEONARDO estavam em processo de separação, onde Nilsimar se aproveitou da situação para a enviar mensagens dando em cima de Carol, ex-mulher de LEONARDO; que Carol estava morando na casa da frente e LEONARDO na casa de trás, junto com sua mãe; que se recorda de uma discussão em que Carol mostrou para Vera que Nilsimar estava pedindo comida; que se recorda também de outra discussão entre eles, em virtude de Leonardo não gostar dos gatos de Vera, dizendo que, caso eles continuassem incomodando, ele mataria os animais, onde Nilsimar ficou sabendo e disse que daria um tiro da cara do acusado caso ele fizesse isso; que, em sua defesa, LEONARDO disse que foi tentar conversar, mas Nilsimar desferiu um soco nele, o qual desviou; que LEONARDO disse que foi empurrado por Nilsimar, tropeçando e caindo perto de uma mesa; que LEONARDO disse que viu uma faca e esfaqueou o peito da vítima; que a faca estava dentro do terreno, perto do portão de entrada. (ID 195372792, minutagem: 1min13seg 9min57seg, destacou-se). Interrogado tanto na fase extrajudicial (ID 169501778), quanto sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (ID 195372792, minutagem: 2min54seg - 13min42seg), o réu LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO mencionou que a vítima teria iniciado a briga, de modo que atingiu Nilsimar Lima Oliveira com o golpe de faca apenas para se defender. Pois bem. Como se vê, o acervo probatório amealhado em juízo, embasado, especialmente, na prova documental e oral supramencionada, atesta a materialidade do homicídio de Nilsimar Lima Oliveira, revelando, ainda, a existência de indícios suficientes da autoria de LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, pois ele, possivelmente, pode ter sido o autor do golpe de faca desferido contra Nilsimar Lima Oliveira, ocasionando lesões que foram o motivo de sua morte. Com efeito, não há nos autos elementos que, por si só, autorizem, desde logo, a impronúncia (CPP, art. 414) ou a absolvição sumária (CPP, art. 415) do réu, nem a desclassificação do delito contra a vida da vítima acima citada por outro crime cuja competência para julgamento não seja do Tribunal Popular (CPP, art. 419). Em verdade, existem elementos suficientes para submeter LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO ao julgamento pelo Júri Popular, a quem é atribuída a competência para o julgamento dos delitos dolosos contra a vida. Isso porque, conforme já adiantado, a pronúncia não se trata de um decreto condenatório, mas de mero juízo de admissibilidade da acusação, devendo prevalecer nesta fase processual, portanto, o princípio do in dubio pro societate. A propósito, colhe-se da jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso: Direito Penal. Recurso em sentido estrito. Pronúncia por tentativa de homicídio qualificado. ABSOLVIÇÃO OU DESPRONÚNCIA. Recurso desprovido. [...] A decisão de pronúncia exige apenas prova da materialidade e indícios de autoria, conforme art. 413 do CPP, e é regida pelo princípio: in dubio pro societate. A materialidade está comprovada pelos exames periciais e relatos testemunhais. 4. Os depoimentos da vítima, de testemunhas e da informante em juízo indicam indícios de autoria e dolo, reforçados pela dinâmica dos fatos e pelo laudo que descarta a tese de acidente de trânsito. A ausência de prova inequívoca para afastar a autoria ou dolo impede a absolvição sumária (art. 415, CPP) ou a impronúncia. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso desprovido. Teses de julgamento: "1. A decisão de pronúncia exige apenas prova da materialidade e indícios de autoria, sendo inadmissível a impronúncia ou absolvição sumária sem prova inequívoca da inexistência de autoria ou dolo. Havendo controvérsias quanto aos fatos e indícios suficientes, compete ao Tribunal do Júri a análise aprofundada sobre o mérito, uma vez que há indícios mínimos capazes de embasar a versão que o recorrente teria, dolosamente, atentado contra a vida da vítima. In casu, torna-se impossível à absolvição sumária ou impronúncia, neste momento processual, pois existem dúvidas nos fatos apresentados pelo recorrente, de que não teria cometido o delito, versão que colide com os demais elementos de provas produzidos nos autos, em especial pelo depoimento da vítima, colhido em juízo, que relatou ter sido o recorrente a agir dolosamente contra sua vida." [...]. (TJMT, Autos n. 1002567-16.2021.8.11.0051, Terceira Câmara Criminal, Des. Rel. Rondon Bassil Dower Filho, j. em 16/12/2024). (Destacou-se). Relativamente às qualificadoras expostas na denúncia, estas, identicamente, devem ser submetidas à análise pelo Conselho de Sentença. Efetivamente, os elementos amealhados ao processo denotam a possibilidade de o homicídio ter sido concretizado por motivo fútil (CP, art. 121, § 2º, II), consubstanciado nos ciúmes de LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO em relação às mensagens enviadas pela vítima Nilsimar Lima Oliveira a Carol Aline de Almeida Lieberknecht, sua ex-esposa. Além disso, existe a probabilidade de o homicídio contra a vida de Nilsimar Lima Oliveira ter sido cometido mediante recurso que dificultou a defesa da vítima (CP, art. 121, § 2º, IV, in fine), pois a vítima foi, em tese, supreendida com a facada enquanto estava sentada em uma cadeira, sem poder oferecer qualquer tipo de resistência. Presente esse cenário, não há se falar no afastamento das qualificadoras, especialmente porque eventual exclusão constitui-se medida de exceção, sendo retirada da pronúncia somente quando manifestamente improcedentes ou absolutamente descabidas as circunstâncias elementares, não sendo este, pois, o caso dos autos. Nesse sentido: DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA. ANIMUS NECANDI. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. RECONHECIMENTO DE QUALIFICADORA. RECURSO PROVIDO. [...] Há duas questões em discussão: (i) se o conjunto probatório autoriza a desclassificação do crime doloso contra a vida para delito diverso, afastando a competência do Tribunal do Júri; e (ii) se deve ser mantida a qualificadora do motivo fútil na pronúncia. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A desclassificação prevista no art. 419 do CPP exige prova inequívoca da ausência de animus necandi, o que não se verifica no presente caso, considerando os disparos efetuados pelos recorridos em direção ao veículo da vítima e o contexto dos fatos, que demonstram possível intenção homicida. 4. À luz do princípio do in dubio pro societate, a competência para dirimir a dúvida sobre o dolo homicida pertence ao Tribunal do Júri, órgão constitucionalmente designado para julgar crimes dolosos contra a vida (CF/1988, art. 5º, XXXVIII). 5. A qualificadora do motivo fútil deve ser mantida, considerando que os recorridos, após um desentendimento banal no trânsito, deliberadamente buscaram a vítima e efetuaram disparos contra o veículo desta, evidenciando a desproporção e insignificância da motivação. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso provido. Tese de julgamento: "1. A desclassificação de crime doloso contra a vida para delito diverso exige prova inequívoca da ausência de animus necandi, cabendo, em caso de dúvida, submeter a questão ao Tribunal do Júri, nos termos do princípio do in dubio pro societate. 2. A qualificadora do motivo fútil deve ser mantida na pronúncia, salvo se manifestamente improcedente, em respeito à competência constitucional do Tribunal do Júri para julgar crimes dolosos contra a vida." [...]. (TJMT, Autos n. 0001056-42.2012.8.11.0042, Segunda Câmara Criminal, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. em 16/12/2024). (Destacou-se). Dessarte, uma vez comprovada a materialidade do crime narrado na denúncia, e havendo indícios fundados de, possivelmente, ter sido LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO o autor do homicídio de Nilsimar Lima Oliveira, impõe-se a pronúncia do réu nos exatos moldes delineados pelo Ministério Público na denúncia de ID 171954332. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no artigo 413 do Código de Processo Penal, JULGO ADMISSÍVEL a denúncia (ID 171954332) e, por consequência, PRONUNCIO o réu LEONARDO HENRIQUE DE OLIVEIRA MACEDO, devidamente qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II (motivo fútil) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima), do Código Penal, tendo como vítima Nilsimar Lima Oliveira. Desta feita, SUBMETO o acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri desta comarca, em data oportuna. Sentença publicada e registrada eletronicamente. INTIMEM-SE pessoalmente o réu e o Ministério Público (CPP, art. 420, I). INTIME-SE a defesa na forma do artigo 420, inciso II, do Código de Processo Penal. Com o trânsito em julgado da presente pronúncia, RETORNEM conclusos para designação da sessão do Júri. Vera, datado e assinado digitalmente. Victor Lima Pinto Coelho Juiz de Direito
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