Processo nº 1003159-70.2023.8.11.0025
ID: 258171137
Tribunal: TJMT
Órgão: 1ª VARA DE JUÍNA
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 1003159-70.2023.8.11.0025
Data de Disponibilização:
17/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EUGENIO BARBOSA DE QUEIROZ
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE JUÍNA SENTENÇA Processo: 1003159-70.2023.8.11.0025. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: JOAO CANDOTE DE SOUZA I. RELATÓRIO Tra…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE JUÍNA SENTENÇA Processo: 1003159-70.2023.8.11.0025. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: JOAO CANDOTE DE SOUZA I. RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Pública movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor de JOÃO CORDEIRO CANDOTE DE SOUZA. Nos termos da inicial: "Segundo consta nos autos do incluso Inquérito Civil, no imóvel de responsabilidade da parte requerida e localizado na Comarca de JUÍNA, foram constatadas degradações ambientais consistentes no desmatamento a corte raso de 5,3500 ha. Referido Inquérito Civil foi instaurado em razão do recebimento do Auto de Infração n° 0042005722.2022, lavrado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMA/ MT, noticiando a ocorrência de desmatamento ilegal, a corte raso, em 5,3500 hectares de vegetação nativa na tipologia de FLORESTA em área objeto de especial preservação, após 22/07/2008. A área desmatada ilegalmente foi objeto de embargo/interdição n. 0042005822, de onde se extrai o seguinte excerto: (...) A SEMA elaborou o Relatório Técnico n. 0000000655.2022. onde noticiou que a degradação foi em vegetação nativa e não foi precedida de autorização, motivo pelo qual o órgão ambiental determinou a paralisação imediata da intervenção. Na sequência copiam-se as imagens de satélite produzidas pela Gerência de Planejamento de Fiscalização e Combate ao Desmatamento da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, nas quais estão indicados os momentos dos desmatamentos realizados após 22/07/2008" Descrito o comportamento acoimado de ilícito, a fim de coibir a continuidade da ação danosa ao meio ambiente e de viabilizar a efetiva recuperação da área degradada, pretende o Parquet o deferimento das seguintes tutelas provisórias de urgência: "3.1) Nao explorar economicamente as areas passiveis de uso desmatadas sem autorizacao do orgao ambiental apos 22/07/2008, ate que haja a validacao das informacoes do Cadastro Ambiental Rural - CAR confirmando a inexistencia de passivo de Reserva Legal, conforme previsto no art. 3°, § 2° do Decreto Estadual n° 262/2019; 3.2) Nao realizar o uso produtivo das areas irregularmente desmatadas apos 22/07/2008, utilizando-as somente para a finalidade de recuperacao ambiental; 3.3) Espacializar e recuperar a ARL degradada ou alterada, mediante apresentacao e execucao do Projeto de Recuperacao de Areas Degradadas ou Alteradas (PRADA) aprovado pelo orgao ambiental estadual, visando atingir os indicadores ambientais constantes nos arts. 73 a 77 do Decreto n° 1.491/2018, conforme se tratem de formacoes florestais, savanicas ou campestres; 3.3.1) Corrigir, complementar, zelar e cuidar dos individuos arboreos, inclusive mediante a implementacao de todos os ajustes, estudos complementares e retificacoes necessarios para suplantar as impropriedades do Projeto de Recuperacao de Areas Degradadas ou Alteradas (PRADA), objetivando o atingimento dos indicadores ambientais constantes nos arts. 73 a 77 do Decreto n° 1.491/2018; 3.3.2) Incluir no Projeto de Recuperacao Ambiental da Area Degradada e/ou Alterada a area de ARL decorrente de desmatamento realizado antes de 22/07/2008, na hipotese de existencia de passivo ambiental; 3.4) Abster-se de promover novos desmatamentos nao autorizados e manter todas as suas atividades poluidoras ou potencialmente poluidoras devidamente licenciadas; 3.5) Seja oficiado o Banco Central com a ordem de suspensao da participacao da requerida em linha de financiamentos em estabelecimentos oficiais de credito, bem como em incentivos e beneficios fiscais concedidos pelo poder publico; 3.6) Seja decretada a indisponibilidade de bens do requerido, até o valor de R$ 48.339,93 (quarenta e oito mil trezentos e trinta e nove reais e noventa e três centavos), com o fim de garantir a efetividade e utilidade do provimento final (efetividade da proteção do meio ambiente), promovendo-se as seguintes medidas, sem prejuízo de outras posteriormente indicadas caso estas se mostrarem insuficientes: 3.6.1. inclusão de ordem de bloqueio no BACEN-JUD; 3.6.2. inclusão de ordem de bloqueio no RENAJUD; 3.6.3. expedição de ofício a ANOREG solicitando seja informado se existem imóveis registrados em nome do demandado. Com a vinda dessas informações que seja providenciado o envio de ofício aos cartórios respectivos para anotação da indisponibilidade; 3.6.4. expedição de ofício ao Banco Central, para que noticie a decisão de indisponibilidade às instituições financeiras, em face da existência de possíveis aplicações financeiras e/ou investimentos em nome do promovido, exceto se for possível efetivar o bloqueio imediato dos valores depositados em contas bancárias, em montante suficiente para a garantia do ressarcimento do dano ambiental, independentemente de ofício, por intermédio do sistema BACENJUD; 3.6.5. expedição de ofício à Junta Comercial do Estado do Mato Grosso, para a indisponibilidade de todas as ações e/ou cotas sociais das empresas lá registradas das quais seja o requerido sócio, administrador ou usufrutuário de cotas/ações, com remessa a estes autos dos contratos sociais, no prazo de 05 (cinco) dias; 3.6.6. expedição de ofício ao Instituto de Defesa Agropecuária – INDEA, com a determinação para que informe o número de animais registradas em nome do requerido, bem como indique a respectiva localização e realize a indisponibilidade; 3.7) Seja oficiado o Banco Central com a ordem de suspensão da participação do requerido em linha de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito, bem como em incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo poder público; 3.8) Seja oficiado o Cartório de Registro de Imóveis desta comarca, requisitando cópia da matrícula do imóvel de propriedade do demandado localizado neste Município, bem como a inscrição da presente ação civil pú3- blica na referida matrícula, para que se dê conhecimento a terceiros 3.9) Seja oficiada a Secretaria de Estado de Meio Ambiente para que tome conhecimento dos termos desta decisão, da liminar eventualmente deferida e que realize a fiscalização da determinação de embargo judicial da área e sua anotação no Cadastro Ambiental Rural. 3.10) A suspensão a incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público, além da suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito, medidas estas que retiram estímulos à continuidade da exploração ilegal". No mérito, requer a condenação do requerido "8.1) Ao pagamento da indenização pelos danos ambientais materiais, atualmente estimados em R$ 48.339,93 (quarenta e oito mil trezentos e trinta e nove reais e noventa e três centavos), ressaltando-se que o montante da indenização reverterá em prol do Fundo Municipal ou Estadual do Meio Ambiente ou em projeto de natureza ambiental aprovado pelo Ministério Público; 8.2) Ao pagamento da indenização pelos danos ambientais extrapatrimoniais, a serem estimados, ressaltando-se que o montante da indenização reverterá em prol do Fundo Municipal ou Estadual do Meio Ambiente; 8.3) Averbando, no bojo da matrícula a presente demanda, a qual se associam ao imóvel em comento, a sentença condenatória, nos termos do art. 167, II, “12)” da Lei nº 6.015/1973 c.c. art. 109 do NCPC." Deferiu-se parcialmente a tutela em Id 130662463. O 1° Serviço de Registro de Imóveis e Títulos e Documentos informou que procedeu à averbação da presente ação na matrícula do imóvel (Id 132612484). Em sede de contestação (Id 143738215), o requerido Gustavo Cordeiro Candote de Souza defende (i) a inaplicabilidade dos efeitos da revelia; (ii) sua ilegitimidade passiva por já ter sido autuado na mesma área no ano de 2014; (iii) que não se comprovou a existência de parcela não recuperável do meio ambiente. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação em Id 152906772. Pugnou-se pela substituição do polo passivo com a inclusão de João Cordeiro Candote e a exclusão de Gustavo Cordeiro Candote de Souza. Em contestação o requerido João Cordeiro Candote alega (i) a Inépcia/Falta de Interesse Processual; (ii) que “tomou todas as medidas necessárias à mitigação de eventuais danos, não realizando qualquer supressão de área de reserva legal ou de área de preservação permanente, inclusive já tendo buscado a SEMA-MT, ali levando pedido de concessão de CAR-MT”; (iii) que “o Ministério Público não trouxe aos autos provas capazes de demonstrar a efetiva correlação entre os alegados danos e a limpeza de pastagem”; (iv) a função social da terra; (v) que “a atividade agrícola exercida pelo requerido e por sua família vai além de mera atividade econômica, sendo atividade que exerce a função de pacificar a família e os seus”; (v) que o pedido indenizatório não pode ferir o princípio da não-confiscatoriedade; (vi) a área em questão era outrora caracterizada como área de pousio; (vii) a possibilidade de supressão de vegetação em 20% da área rural no caso concreto; (viii) a área rural de posse do requerido é aquilo que a legislação e a prática ambiental tipifica como área onde pode ser praticada a agricultura familiar. O Ministério Público requereu o julgamento antecipado da lide (Id 183447207). Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO O presente feito comporta julgamento, uma vez que há nos autos diversos documentos comprobatórios do desmatamento ambiental. Passo, portanto, ao julgamento antecipado do mérito. Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais de existência e validade, promovo o julgamento antecipado do mérito nos termos do art. 355, I, do CPC. Os pedidos merecem parcial acolhimento. II.I. Da justiça gratuita Como se sabe, os benefícios da gratuidade da Justiça somente devem ser deferidos ou mantidos à parte “com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios”. Esse dispositivo deve ser analisado com uma interpretação da Constituição Federal, mais precisamente em seu artigo 5º, inciso LXXIV, que prevê: “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” Ou seja, malgrado a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência seja assegurada pelo art. 99, § 3º, do CPC, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 5º, inciso LXXIV, prevê que tal benefício será concedido para aqueles que comprovarem a insuficiência de recursos: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que COMPROVAREM insuficiência de recursos;” (sem destaques no original). É evidente, portanto, que o Texto Maior dispõe que somente aos que comprovadamente demonstrarem a insuficiência de recursos é que o Estado prestará a assistência jurídica integral. Assim, não basta a mera afirmação da parte de que não tem condições de pagar às custas do processo. Nesse aspecto, não trouxe o requerido qualquer prova de sua hipossuficiência. É notório que a gratuidade judiciária é de caráter restritivo, destinada a possibilitar o acesso ao Judiciário pelas classes menos favorecidas da sociedade, sob pena de desvirtuamento da lei, devendo ser deferida de modo excepcional, somente quando comprovada indene de dúvidas a hipossuficiência. Assim sendo, considerando a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade pleiteada, INDEFIRO o pedido de justiça gratuita. II.II. Preliminares II.II.I. Inépcia/Falta de Interesse Processual; Segundo o requerido, a falta de interesse de agir e, portanto, a inépcia da inicial, se configura uma vez que "a exposição dos fatos não traz, de forma clara, precisa ou permite identificar quais são os supostos danos ocorridos e muito menos qual é o fato preciso de impacto adverso ao meio ambiente capaz de ser compensado do por meio da pretensão posta, e muito menos, os requerimentos têm a ver com a fundamentação posta.". Deve-se ressaltar que os documentos trazidos pelo órgão ambiental, por se tratarem de atos administrativos, gozam de presunção de veracidade, cabendo ao particular/poluidor o ônus de demonstrar a inexistência da infração neles descrita (Súmula 618/STJ). Nesse sentido: RECURSO DE APELAÇÃO CIVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – FUNCIONAMENTO ILEGAL DE CARVOARIA E ABATEDOURO CLANDESTINO – COMPROVAÇÃO – RELATÓRIOS SEMA E IBAMA – INQUÉRITO CIVIL – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – ILEGITIMIDADE PASSIVA – NÃO COMPROVADA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA –– OBRIGAÇÃO DE FAZER – RECOMPOSIÇÃO DO MEIO DEGRADADO – APRESENTAÇAÕ DE PRADE – INDENIZAÇÃO PELOS DANOS AMBIENTAIS MATERIAIS – DEVIDA – COMPATIBILIDADE COM A LESÃO – ADEQUAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. 1. Os documentos produzidos pela SEMA e IBAMA, por se tratarem de atos administrativos, gozam da presunção de legitimidade e veracidade. Tal presunção é relativa, admitindo-se prova em contrário. 2. In casu, o apelante, embora alegue não ser responsável pelo dano ambiental, não trouxe aos autos qualquer prova da ilegitimidade passiva que alega. 3. A responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais é objetiva, não exigindo a demonstração do elemento subjetivo. (...) (N.U 0000419-89.2014.8.11.0020, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/06/2022, Publicado no DJE 23/06/2022). II.III. Do dano ambiental A controvérsia cinge-se sobre responsabilidade de JOÃO CORDEIRO CANDOTE DE SOUZA pelo dano ambiental causado por desmatamento ilegal. Cumpre frisar que não obstante os argumentos da defesa, esta não trouxe junto à contestação qualquer documento que comprovasse a atipicidade da conduta. A proteção ao meio ambiente se dá nas searas criminal, administrativa e cível. A responsabilidade civil ambiental tem como objetivo a reparação do dano ambiental causado. Ela possui natureza objetiva e é pautada pela teoria do risco integral. Nesse sentido: RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DANOS DECORRENTES DO ROMPIMENTO DE BARRAGEM. ACIDENTE AMBIENTAL OCORRIDO, EM JANEIRO DE 2007, NOS MUNICÍPIOS DE MIRAÍ E MURIAÉ, ESTADO DE MINAS GERAIS. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. NEXO DE CAUSALIDADE. 1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar; (...) (STJ - REsp: 1374284 MG 2012/0108265-7, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 27/08/2014, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 05/09/2014). Dessa forma, em havendo dano, o que precisa se investigar é a existência de conduta que gerou esse resultado. Sobre a autoria, a parte requerida é proprietário do imóvel, conforme demonstra diversos documentos acostados aos autos em petição inicial e contestação. A jurisprudência é clara no sentido da responsabilidade ambiental possui natureza propter rem, conforme súmula 623 do STJ. Logo, é irrelevante ser ou não proprietário. Uma vez que estava exercendo a posse e houve desmatamento, passa a ser considerado autor do dano. Nesse sentido: APELAÇÃO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – PRELIMINAR – GRATUIDADE DA JUSTIÇA – AFASTADA – ILEGITIMIDADE E FALTA DE INTERESSE DE AGIR – NÃO COMPROVADAS – RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL – OBJETIVA – DEGRADAÇÃO AMBIENTAL – PERDA DE 239,03 HECTARES DE VEGETAÇÃO NATIVA DA FLORESTA AMAZÔNICA – CICATRIZES DE QUEIMADAS NO PERÍODO PROIBITIVO – INQUÉRITO CIVIL – AUTO DE INSPEÇÃO – SEMA/MT – RELATÓRIO TÉCNICO – PRESUNÇÃO DE VERACIDADE E LEGITIMIDADE – INVASÃO DE ASSENTAMENTOS – OBRIGAÇÃO DE FAZER – RECOMPOR A ÁREA – PRAD – REGISTRO DO CAR – INDENIZAÇÃO POR DANO AMBIENTAL DIFUSO E MORAL – DEVIDA – QUANTUM – ADEQUAÇÃO – INDIVIDUALIZAÇÃO DA POSSE E OBRIGAÇÕES DE CADA UM DOS APELANTES – DEVE SER REALIZADA QUANDO DA VERIFICAÇÃO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – RECURSO PROVIDO EM PARTE. (...) 2. A responsabilidade civil pela reparação do dano ambiental adere ao título de domínio ou posse, como obrigação propter rem. (...) (N.U 0002783-48.2016.8.11.0025, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 13/09/2022, Publicado no DJE 24/09/2022) É importante ressaltar que os documentos trazidos pelo órgão ambiental, por se tratarem de atos administrativos, gozam de presunção de veracidade, cabendo ao particular/poluidor o ônus de demonstrar a inexistência da infração neles descrita (Súmula 618/STJ). Nesse sentido: RECURSO DE APELAÇÃO CIVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – FUNCIONAMENTO ILEGAL DE CARVOARIA E ABATEDOURO CLANDESTINO – COMPROVAÇÃO – RELATÓRIOS SEMA E IBAMA – INQUÉRITO CIVIL – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – ILEGITIMIDADE PASSIVA – NÃO COMPROVADA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA –– OBRIGAÇÃO DE FAZER – RECOMPOSIÇÃO DO MEIO DEGRADADO – APRESENTAÇAÕ DE PRADE – INDENIZAÇÃO PELOS DANOS AMBIENTAIS MATERIAIS – DEVIDA – COMPATIBILIDADE COM A LESÃO – ADEQUAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. 1. Os documentos produzidos pela SEMA e IBAMA, por se tratarem de atos administrativos, gozam da presunção de legitimidade e veracidade. Tal presunção é relativa, admitindo-se prova em contrário. 2. In casu, o apelante, embora alegue não ser responsável pelo dano ambiental, não trouxe aos autos qualquer prova da ilegitimidade passiva que alega. 3. A responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais é objetiva, não exigindo a demonstração do elemento subjetivo. (...) (N.U 0000419-89.2014.8.11.0020, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/06/2022, Publicado no DJE 23/06/2022). Uma vez definida a conduta e o resultado, passa-se a analisar o nexo causal. Pela teoria do risco integral, tendo a ação da parte requerida causado o resultado e não havendo nenhuma causa de rompimento do nexo causal, verifico que ele está presente. Não há que se falar em elemento subjetivo, uma vez que se trata de responsabilidade objetiva. Por tudo que foi exposto, resta demonstrado que houve dano ambiente e este foi causado pela parte requerida. II. IV. Da Obrigação de Recuperar o Meio Ambiente O Ministério Público deseja indenização material quanto aos danos supostamente irreparáveis. A Ação Civil Pública por dano ambiental, como sabido, pode ter dois desfechos distintos: indenização em dinheiro (condenatória pecuniária) ou obrigação de fazer, ou não fazer (condenatória mandamental), sendo, perfeitamente, passíveis de cumulação. Em que pese à possibilidade de cumulação da condenação pecuniária com a de reparação do dano, tem-se, contudo, que, na hipótese em que seja possível a reparação completa do prejuízo ambiental, deve ser afastada a condenação ao pagamento de indenização. Nesse sentido, perfilho o seguinte julgado: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL –AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL – DANO AMBIENTAL – DISPOSITIVOS APONTADOS COMO VIOLADOS – PREQUESTIONAMENTO – INDISPENSÁVEL – SÚMULA 282/STF – OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO – PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – CUMULAÇÃO – POSSIBILIDADE – PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA AFASTADA PELO TRIBUNAL A QUO. ACÓRDÃO ANCORADO NO SUBSTRATO FÁTICO DOS AUTOS – REEXAME – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA 7/STJ – RECURSO INTERPOSTO TAMBÉM PELA ALÍNEA C DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL – NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. 1. (...). 2. Ao decidir pela possibilidade, porém ausência de obrigatoriedade, na cumulação de condenações em reparação do dano ambiental e em indenização pecuniária, a instância de origem alinhou-se ao entendimento firmado no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, segundo o qual "Embora se admita, a princípio, a cumulação da obrigação reparatória do dano ambiental com a indenizatória, nos casos em que é possível a reparação completa, esta Corte Superior de Justiça tem o entendimento de que deve ser afastada a obrigação de natureza pecuniária" (AgInt no AREsp 640.586/SC, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 20/3/2019). 3. (...). (AgInt no REsp 1538112/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019). Destaquei. Da análise dos autos, verifico que o dano ambiental praticado consiste no desmatamento de 5,3500 hectares de vegetação nativa, objeto de especial preservação. Logo, é certo que o dano ao meio ambiente é recuperável. Com efeito, se a parte autora não trouxe aos autos nenhuma prova de que o dano ambiental seja irrecuperável, penso que a condenação da parte requerida ao pagamento de indenização pecuniária, de forma alternativa, ou seja, somente para o caso de não cumprimento da obrigação de fazer, mostra-se acertada. No que atine ao quantum debeatur dos danos materiais ambientais, arbitro a importância de R$ 48.339,93 (quarenta e oito mil trezentos e trinta e nove reais e noventa e três centavos), nos termos da inicial, a ser pago alternativamente, no caso de descumprimento da recuperação da área, visto que se busca, prioritariamente, a regeneração ambiental. II. V. Dano moral coletivo O fundamento para existência do dano moral coletivo é a lesão a um conjunto de pessoas reunidas por valores que são atingidos pelo ato do poluidor. Esta lesão deve atingir sentimentos, ideias e emoções de uma coletividade, cujo dano daí decorrente também merece reparação. Afinal, não é apenas a dimensão econômica do ato lesivo que deve ser prestigiada, mas também a qualidade de vida, o sossego, o senso estético, os valores culturais, históricos e paisagísticos. Estes elementos, ainda que não quantificáveis economicamente, não podem ser violados impunemente, devendo o poluidor responder por eles. No caso vertente, tenho que restou comprovado o dano moral ambiental em razão dos requeridos terem desmatado 5,3500 hectares de vegetação nativa de especial preservação sem a devida autorização do órgão competente, sendo desnecessária uma perícia judicial para constatar tal fato, além de prejudicar as futuras gerações em seu direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, dever este erigido à categoria de direito fundamental estatuído no art. 225 da CF/88. Ainda, consigne-se ser correto afirmar que a reparação por danos morais difusos ou coletivos, originários do fluid recovery norte-americano, é cabível nas ações que versem sobre direitos indivisíveis (difusos ou coletivos), como ocorre na espécie, já que faticamente impossível, nesses casos, repartir o produto da indenização entre pessoas indetermináveis. Nessa hipótese, a reparação deve ser destinada ao fundo previsto no art. 13 da Lei n.º 7.347/85. Entretanto, não se pode perder de vista que a objetividade jurídica do dano moral coletivo (que se constitui em um alargamento da conceituação do dano moral puro) esteia-se na prática de uma injusta lesão (do ponto de vista jurídico) da qual resulte abalo ao sentido de dignidade, falta de apreço e consideração, a ser alcançado por toda a coletividade, de grandeza tal que lhe gere graves prejuízos, no seu aspecto imaterial. Assim, tenho que o valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) é adequado e proporcional ao caso, considerando a dimensão da área devastada. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DESMATAMENTO – AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO ORGÃO COMPETENTE – DANO MORAL COLETIVO – OCORRÊNCIA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Comprovado o nexo causal entre o ato ilícito praticado pelo Apelante (extração ilegal de madeira em área da Amazônia Legal sem autorização) e o dano ambiental em questão, surge, objetivamente, o dever de promover a recuperação da área afetada e de indenizar eventuais danos remanescentes, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e a plena recuperação do meio ambiente degradado (dano interino ou intermediário), na forma do art. 14, § 1°, da Lei nº 6.938/81. 2. A cumulação de obrigação de fazer, de não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, inclusive pelo dano moral coletivo, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível. Precedentes: REsp 1.328.753/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 3/2/2015; REsp 1.382.999/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 18.9.2014; REsp 1.307.938/GO, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 16.9.2014; REsp 1.227.139/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 13.4.2012; REsp 1.115.555/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe de 23.2.2011. (REsp n. 1.635.451/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/12/2016, DJe de 28/8/2020). (N.U 0000756-68.2010.8.11.0101, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 02/08/2022, Publicado no DJE 15/08/2022) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DESMATAMENTO ILEGAL EM ÁREA DE FLORESTA AMAZÔNICA – COMPROVAÇÃO – AUTUAÇÃO E TERMO LAVRADO PELO IBAMA – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – VISTORIA IN LOCU – RESPONSABILIDADE - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS COLETIVOS – CONFIGURAÇÃO - QUANTUM ATENDE AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS CONHECIDOS DESPROVIDOS. A responsabilidade civil pela reparação do dano ambiental adere ao título de domínio ou posse, como obrigação propter rem. Em razão da gravidade da infração ambiental, mostra-se razoável e proporcional o montante arbitrado a título de indenização pelos danos morais coletivos ao meio ambiente no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Recursos conhecidos e desprovidos. (N.U 0014969-41.2013.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 02/08/2022, Publicado no DJE 25/08/2022) III. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor para CONDENAR a parte requerida JOÃO CORDEIRO CANDOTE DE SOUZA: a. a obrigação de fazer consistente em recuperar a área degradada ou alterada, mediante apresentação e execução do Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas ou Alteradas (PRADA) aprovado pelo órgão ambiental estadual - SEMA nas áreas desmatadas e no prazo de 120 (cento e vinte) dias para comprovação do cumprimento da obrigação; b. alternativamente, não comprovada a apresentação do PRADA e nem a regeneração da vegetação suprimida, condenar a parte requerida ao pagamento, a título de danos ambientais materiais residuais, do montante de R$ 48.339,93 (quarenta e oito mil trezentos e trinta e nove reais e noventa e três centavos), ressaltando-se que o montante da indenização reverterá em prol do Fundo Municipal de Proteção ao Meio Ambiente. c. ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em prol do Fundo Municipal de Proteção ao Meio Ambiente, a título de danos morais coletivos, no prazo de 20 (vinte) dias, aplicando a SELIC (art. 406, §1º, do CC) para atualização do débito, a partir da data do efetivo prejuízo, nos termos da Súmula 43 do STJ. Após o trânsito em julgado, DÊ-SE vista dos autos ao Ministério Público para dar início a execução. Publique-se. Intimem-se. Juína/MT, data registrada no sistema. PATRICK COELHO CAMPOS GAPPO Juiz de Direito
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