Processo nº 1008630-74.2025.8.11.0000
ID: 334906322
Tribunal: TJMT
Órgão: Órgão Especial
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 1008630-74.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
25/07/2025
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO ÓRGÃO ESPECIAL Número Único: 1008630-74.2025.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Classificação e/ou Preterição, Reserva de Vagas] Relat…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO ÓRGÃO ESPECIAL Número Único: 1008630-74.2025.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Classificação e/ou Preterição, Reserva de Vagas] Relator: Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [SAMIR HAMMOUD - CPF: 468.983.281-15 (ADVOGADO), LARISSA BRANDAO SILVA DE SOUZA - CPF: 995.644.081-72 (IMPETRANTE), PRESIDENTE DA COMISSÃO EXAMINADORA DO CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGOS E FORMAÇÃO DE CADASTRO DE RESERVA NO QUADRO DE PESSOAL DO PODER JUDICIÁRIO DE MATO GROSSO (IMPETRADO), MOHAMED ALI HAMMOUD - CPF: 691.966.481-04 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a ÓRGÃO ESPECIAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE CONCEDEU A SEGURANÇA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. O DES. RUI RAMOS RIBEIRO MANIFESTOU SUA SUSPEIÇÃO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. SISTEMA DE COTAS RACIAIS. HETEROIDENTIFICAÇÃO. NÃO COMPARECIMENTO JUSTIFICADO À ENTREVISTA PRESENCIAL. DIREITO DE NOVO AGENDAMENTO. SEGURANÇA CONCEDIDA. I. CASO EM EXAME 1. Mandado de Segurança individual impetrado contra ato do Presidente da Comissão Examinadora do Concurso Público do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que indeferiu a autodeclaração racial da impetrante como negra, após ausência justificada à etapa presencial de heteroidentificação. A candidata, aprovada nas etapas objetivas e discursivas do certame, deixou de comparecer à entrevista presencial por motivo de força maior, devidamente comprovado por documentação médica, e pleiteou o reagendamento do procedimento ou, alternativamente, o reconhecimento da autodeclaração com base em reconhecimento anterior em concurso do TRF da 1ª Região. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência justificada da candidata à etapa de heteroidentificação autoriza o reagendamento do procedimento; (ii) estabelecer se a recusa administrativa, sem previsão de impugnação específica, viola os princípios do contraditório, da ampla defesa e da razoabilidade. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A etapa de heteroidentificação, embora imprescindível, não possui a mesma exigência de simultaneidade e sigilo aplicáveis às provas objetivas, o que permite relativização das regras editalícias em situações excepcionais, como incapacidade por motivo de saúde. 4. A ausência de previsão no edital de forma de impugnação ao indeferimento por não comparecimento justificado à entrevista inviabiliza o exercício do contraditório e da ampla defesa, autorizando a via judicial. 5. A apresentação de documentação médica idônea demonstrou situação imprevisível de saúde grave, o que justifica o não comparecimento à data designada originalmente. 6. A jurisprudência permite o excepcional reagendamento de etapas não simultâneas do concurso, como a heteroidentificação, quando há justificativa médica e ausência de prejuízo à igualdade material do certame. 7. A existência de reconhecimento prévio da condição de pessoa negra pela administração pública federal reforça a plausibilidade da pretensão e a necessidade de reapreciação presencial. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Segurança concedida, ratificando-se a liminar anteriormente deferida. Tese de julgamento: “1. A ausência justificada por comprovado motivo de saúde à etapa presencial de heteroidentificação em concurso público não pode implicar, automaticamente, a perda do direito às cotas raciais, sendo admissível o reagendamento do procedimento, porque tal etapa prescinde da exigência de simultaneidade e sigilosidade.” “2. A omissão editalícia quanto à possibilidade de impugnação do indeferimento por ausência justificada inviabiliza a via administrativa e autoriza a proteção judicial do direito do candidato.” ____________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 1º, III e V; 3º, I e IV; 5º, LIV e LV; Lei 12.016/2009, art. 7º, III; Lei Estadual MT n. 10.815/2019, arts. 1º e 2º; Edital TJMT/PRES n. 74/2024, itens 7.1 a 7.9. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 630.733/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26.6.2014 (Tema 335); TRF-1, APL 1003089-40.2019.4.01.3700/MA, Rel. Des. Souza Prudente, j. 23.9.2020; TJMT, MSI 1004874-57.2025.8.11.0000, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 20.2.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR) Egrégio Órgão Especial: Cuida-se de Mandado de Segurança individual cumulado com pedido de tutela de urgência impetrado na forma do art. 5º, LXIX, da CF, c/c Lei n. 12.016/2009, por Larissa Brandão Silva de Souza, brasileira, qualificada, representada por advogados constituídos, nas pessoas dos Drs. Samir Hammoud, OAB/MT 5.265, e Mohamed Ali Hammoud, OAB/MT 11.184, contra ato reputado ofensivo a direito líquido e certo da impetrante, praticado pelo Exmo. Sr. Des. Luiz Ferreira da Silva, que, na condição de Presidente Comissão Examinadora do Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva no quadro de Pessoal do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, certame esse inaugurado a partir do Edital TJMT/PRES n. 74, de 26 de setembro de 2024, recusou a impetrante na heteroidentificação como “negra”, em razão do não comparecimento ao ato de entrevista presencial de confirmação, agendado para ocorrer no dia 23 de fevereiro próximo passado, nos termos do Edital TJMT/DGP n. 8/2025, cujo comparecimento da impetrante restou impossibilitado por conta de motivo excepcional e imprevisível, decorrente de crise de broncoespasmo e exacerbação infecciosa da doença crônica das vias aéreas, no caso, asma, devidamente comprovada por documentos médicos. Sustenta que a recusa da autodeclaração nessa situação extraordinária viola os postulados da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, bem como a ampla defesa, tendo em vista que não lhe foi oportunizado o reagendamento da entrevista ou utilização de outro meio idôneo para comprovação de sua condição racial, em contraposição às disposições do art. 37 da CF. Registrou, ainda, que a impetrante obteve a heteroidentificação positiva [Edital n. 13 – TRF 1ª Região, de 06/4/2018] em outro concurso público do qual participou, no caso, visando o Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva nos Cargos de Analista Judiciário e Técnico Judiciário do Quadro de Pessoal da Justiça Federal de 1º e 2º Graus – Edital n. 1 TRF 1ª Região, de 05/9/2017, o que reforça a presença de dúvida razoável sobre a necessidade de nova entrevista, ao mesmo tempo em que evidencia a ilegalidade da recusa administrativa aqui questionada. Descreve ainda que a impetrante foi aprovada, sem quaisquer questionamentos, na fase de análise preliminar dos pedidos de inscrição nas vagas destinadas a negros e pardos, cujo prazo de interposição de recursos se iniciou no dia 14/11/2024, e somente depois de aprovada no certame pelo sistema de cotas raciais, sobreveio a decisão impugnada, que recusou o procedimento inicial de heteroidentificação fotográfica da impetrante, e depois deixou de avaliar a impossibilidade de comparecimento ao ato solene de entrevista de confirmação racial, o que, segundo entende, deve ser revisto e reformado. Postula, assim, a concessão de provimento jurisdicional inaudita altera pars, para que o impetrado inclua o nome da Impetrante na lista de convocação para a realização da heteroidentificação, assinalando que “[...] já há convocação para entrevista de heteroidentificação de outra candidata, agendada para o dia 23/03/2025. Caso a liminar não seja concedida, o direito da Impetrante será irremediavelmente comprometido, uma vez que sua participação no certame poderá ser inviabilizada antes mesmo da análise do mérito da presente ação.” [inicial, p. 15.] Pugna, ainda, pela confirmação da decisão liminar no mérito, ratificando-se o direito ao reagendamento da entrevista da impetrante para fins de heteroidentificação por meio de entrevista a ser agendada para o próximo dia 23/3/2025, ou em outra data, se for necessário, “conforme previsão editalícia”. Alternativamente, pugna pela aceitação da autodeclaração de heteroidentificação negra prestada pela Impetrante, ante ao reconhecimento prévio, em procedimento administrativo de verificação presencial, pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, no Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva nos Cargos de Analista Judiciário e Técnico Judiciário do Quadro de Pessoal da Justiça Federal de 1º e 2º Graus - Edital Nº 1 – TRF 1ª Região, de 05/9/2017. Instrui a inicial com a documentação anexa aos ids. 275884891 a 275894384. A certidão no id. 275952365 assenta que não há processos capazes de gerar prevenção de julgador na causa primitiva. A certidão no id. 275952366 assinala que o processo e julgamento do writ constitucional independe de prévio recolhimento de custas iniciais [art. 77 do RITJMT]. A liminar foi concedida em 21/3/2025 [id. 276153871]. O impetrado, Presidente da Comissão Organizadora do Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva no quadro de Pessoal do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, apresentou as Informações n. 1013/2025-DGP, em 04 de abril de 2025, sustentando, em resumo, o cumprimento da liminar concedida e confirmou que a heteroidentificação da candidata foi realizada no dia 23 de março de 2025, e aceita sub judice, cujo resultado foi tornado público no edital n. 21/2025, de 31/3/2025 [id. 279305363]. O Estado de Mato Grosso apresentou informações em 22/4/2025 [id. 281827361], repelindo as aduções postas na impetração, ao argumento de que não houve comprovação cabal de inércia da administração pública, tampouco omissão dolosa ou arbitrária da autoridade impetrada, tendo a candidata impetrante se ausentado da data estipulada para a realização do exame presencial de confirmação da heteroidentificação sem qualquer comunicação formal anterior, de modo que o próprio edital já previa a desclassificação ou indeferimento automático e legítimo da candidatura nessa hipótese. Lado outro, enalteceu que a autoridade apontada como coatora atuou nos estreitos lindes da lei e do edital do certame ao declarar a ausência da candidata, visto que não estava obrigado a remarcar etapas em hipóteses não previstas no edital, mesma linha de intelecção de que deriva a regra do Tema 335, firmado em sede de Repercussão Geral pelo Pretório Excelso. Salienta, ainda, que permitir a reabertura da etapa apenas para a impetrante viola o princípio da isonomia entre os candidatos, criando uma exceção casuística e subjetiva em detrimento de outros candidatos em iguais condições, de modo que só se concebe quando e nas hipóteses previamente estabelecidas no edital. Assim, requer a cassação da liminar e a denegação da ordem, em razão da ausência de direito líquido e certo da impetrante. Instado a se manifestação, a douta Procuradoria de Justiça, na pessoa do Dr. Marcelo Ferra de Carvalho, opinou pela ratificação da liminar e a concessão da ordem em definitivo, não só considerando a ocorrência de força maior que impediu a candidata de comparecer ao exame presencial, devidamente comprovada por documentos nos autos, e a ausência de previsão editalícia de qualquer forma de impugnação expressa quanto ao não comparecimento justificado da candidata à etapa de entrevista presencial, impedindo a impetrante de discutir administrativamente a sua ausência. É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. Desembargador JUVENAL PEREIRA DA SILVA Relator V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR) Egrégio Órgão Especial: A Lei Estadual n. 10.815, de 28 de janeiro de 2019 [DOE de 29/01/2019], estabeleceu regras para o sistema de cotas raciais em concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da Administração Pública do Estado de Mato Grosso, reservando, em seu art. 1º, 20% das vagas ofertadas em certames públicos estaduais para provimento de cargos efetivos e empregos públicos aos candidatos negros. Art. 1º Ficam reservadas aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da Administração Pública Estadual, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pelo Estado de Mato Grosso, na forma desta Lei. § 1º A reserva de vagas será aplicada sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou superior a 3 (três). § 2º Na hipótese de quantitativo fracionado para o número de vagas reservadas a candidatos negros, esse será aumentado para o primeiro número inteiro subsequente, em caso de fração igual ou maior que 0,5 (cinco décimos), ou diminuído para número inteiro imediatamente inferior, em caso de fração menor que 0,5 (cinco décimos). § 3º A reserva de vagas a candidatos negros constará expressamente dos editais dos concursos públicos, que deverão especificar o total de vagas correspondentes à reserva para cada cargo ou emprego público oferecido. Art. 2º Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Parágrafo único. Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. Como visto, o art. 2º da referida Lei estabelece a prerrogativa de concorrência às vagas reservadas a candidatos negros por meio de autodeclaração como “pretos e pardos” no ato de inscrição inicial do concurso, conforme quesito cor ou raça utilizado pela Fundação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, no último CENSO 2022, assim compreendidos: a) pardo se refere a quem se declara pardo e possui miscigenação de raças com predomínio de traços negros; b) preto é a pessoa que se declara preta e possui características físicas que indicam ascendência predominantemente africana. O item 2.1 e respectivas alíneas do edital do concurso previu as seguintes etapas: 2.1 O concurso público será composto pelas seguintes etapas: a) Prova objetiva, de caráter eliminatório e classificatório, para todos os cargos; b) Prova discursiva, de caráter eliminatório e classificatório, para todos os cargos; c) Procedimento de heteroidentificação para os candidatos que concorrerem à reserva de vagas para negros ou indígenas; d) Perícia médica para aqueles que concorrerem à reserva de vagas para candidatos com deficiência. 2.2 As etapas mencionadas nas alíneas do subitem 2.1 serão executadas sob responsabilidade da FGV, exceto a perícia médica, que será de responsabilidade do TJMT. Os itens 7.1 e 10.7.14, e respectivas alíneas “b” e “c” do Edital TJMT/PRES n. 74, de 26 de setembro de 2024, em sintonia com a legislação estadual e federal sobre a matéria, estabeleceu para os candidatos indígenas, negros e pessoas com deficiência, de acordo com as Resoluções n. 512/2023, 516/2023 e 549/2024, todos do CNJ, aprovação caso tenham alcançado 20% a menos da nota mínima exigida para a ampla concorrência, ou seja, aqueles que acertarem no mínimo 28 pontos. Os itens 7.2 do edital estabeleceu que, para concorrer às vagas destinadas a negros, o candidato deverá preencher no ato da inscrição, o formulário de autodeclaração de que é preto ou pardo, conforme quesito de cor ou raça utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e fazer o upload (imagem original) da documentação a seguir, em campo específico no link de inscrição, observado o período de inscrição disposto no subitem 4.2. Exigiu, ainda, que o candidato enviasse uma foto segurando o documento de identificação atualizado, em ambiente com boa iluminação, colorida, cabelo solto, sem adereços e com destaque do rosto e ombro, assentando ainda que a utilização de documentos não aceitos e o não envio da documentação implicaria a perda do direito às cotas nesta fase preambular do certame: 7.2 Para concorrer às vagas reservadas, o candidato deverá, no ato da inscrição, optar por concorrer às vagas reservadas aos negros, preenchendo a autodeclaração de que é preto ou pardo, conforme quesito de cor ou raça utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e fazer o upload (imagem original) da documentação a seguir, em campo específico no link de inscrição, observado o período de inscrição disposto no subitem 4.2. a) uma foto segurando o seu documento de identificação, atualizada, que poderá ser feita por aparelho celular em ambiente com boa iluminação, colorida, cabelo solto, sem adereços e com destaque do rosto e ombro; b) documento de identificação com fotografia e assinatura (frente e verso); e c) preencher corretamente todos os campos, assinar e encaminhar a autodeclaração constante Anexo IV (Formulário de Autodeclaração de candidato Negro) deste Edital. 7.2.1 Para fins do disposto nas alíneas “a” e “b” do subitem 7.2 deste Edital, serão considerados documentos de identificação: carteiras expedidas pelos Comandos Militares, pelas Secretarias de Segurança Pública, pelos Institutos de Identificação e pelos Corpos de Bombeiros Militares; carteiras expedidas pelos órgãos fiscalizadores de exercício profissional (ordens, conselhos etc.); passaporte brasileiro; certificado de reservista; carteiras funcionais expedidas por órgão público que, por lei federal, valham como identidade; carteira de trabalho; carteira nacional de habilitação. Somente serão aceitos documentos com foto. 7.2.1.1 Não serão aceitos como documentos de identidade: certidões de nascimento, CPF, títulos eleitorais, identidade infantil, carteiras de motorista (modelo sem foto), carteiras de estudante, carteiras funcionais sem valor de identidade, nem documentos ilegíveis, não identificáveis e/ou danificados. 7.2.2 Somente serão aceitos os documentos enviados nos formatos PDF, JPEG e JPG, cujo tamanho não exceda 5 MB. O candidato deverá observar as demais orientações contidas no link de inscrição para efetuar o envio da documentação. 7.2.3 Não serão aceitos documentos encaminhados para o endereço eletrônico diverso do indicado, bem como aqueles entregues pessoalmente na sede da FGV. 7.2.4 Não será aceito, ainda, o envio dos documentos elencados neste Edital fora do prazo, por fax, correio eletrônico ou outras vias que não a expressamente prevista. 7.2.5 O não envio da documentação mencionada nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2 ou o envio de documentação incompleta será imputado ao candidato e acarretará na perda do direito às vagas reservadas. 7.3 A autodeclaração é facultativa, ficando o candidato submetido às regras gerais estabelecidas caso não opte pela reserva de vagas. 7.4 A relação dos candidatos na condição de negros será divulgada no endereço eletrônico https://conhecimento.fgv.br/concursos/tjmtservidor. 7.5 A autodeclaração terá validade somente para o concurso público aberto, não podendo ser estendida a outros certames. Os itens 7.6 a 7.8 estabelecem que, com a aprovação nas provas aplicadas, os candidatos autodeclarados negros seriam submetidos a procedimento de heteroidentificação por meio da Comissão de Heteroidentificação, constituída de cinco membros da banca, para fins de confirmação da veracidade das informações prestadas e parecer definitivo a respeito, que se desdobraria em duas etapas: a primeira por meio de confirmação da autodeclaração por meio das fotografias coletadas quando da inscrição inicial, que seria analisada exclusivamente pelo critério fenotípico, e, em um segundo momento, acaso não confirmada, por meio de averiguação presencial a ser realizada em data, horário e demais orientações a serem divulgadas na referida convocação, cujo não comparecimento presencial acarretaria na perda do direito aos quantitativos reservados aos candidatos autodeclarados negros, passando a figurar apenas na lista de Ampla Concorrência do cargo/área/especialidade. 7.6 Os candidatos aprovados que se autodeclararam negros no ato da inscrição e encaminharam os documentos elencados nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2, serão submetidos ao procedimento de heteroidentificação que verificará a veracidade das informações prestadas pelos candidatos e proferirá parecer definitivo a respeito. 7.7 O procedimento de heteroidentificação será realizado por Comissão de Heteroidentificação constituída por 5 (cinco) membros e ocorrerá em 2 (duas) etapas: 7.7.1 A primeira etapa será realizada a partir das fotos coletadas no momento da inscrição no concurso público. 7.7.2 Os candidatos cuja autodeclaração não for confirmada após a verificação na primeira etapa serão convocados para averiguação presencial, por meio de Edital de convocação, que estará disponível no endereço eletrônico https://conhecimento.fgv.br/concursos/tjmtservidor. 7.7.3 Será considerado negro, para os fins estabelecidos neste Edital, o candidato que assim for reconhecido pela maioria dos membros presentes da comissão mencionada no subitem 7.7. 7.7.4 A Comissão de Heteroidentificação utilizará exclusivamente o critério fenotípico para aferição da condição declarada pelo candidato no concurso público. 7.7.5 O candidato convocado deverá comparecer, obrigatoriamente, para averiguação presencial, em data, horário e demais orientações a serem divulgadas na referida convocação. 7.7.6 No caso de averiguação presencial, a avaliação será filmada e sua gravação utilizada para análise de eventuais recursos interpostos; a recusa à realização da filmagem implicará a não validação da condição de pessoa negra. 7.8 O não envio dos documentos elencados nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2, a não convalidação da autodeclaração ou o não comparecimento à averiguação presencial acarretará a perda do direito aos quantitativos reservados aos candidatos autodeclarados negros, passando a figurar apenas na lista de Ampla Concorrência do cargo/área/ especialidade. 7.8.1 De acordo com o § 3º do art. 5º da Resolução n. 203/2015 do CNJ, na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à nulidade de sua nomeação e posse no cargo efetivo, após procedimento administrativo no qual lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. 7.9 Após a análise pela Comissão de Heteroidentificação, será divulgado Edital de resultado provisório da entrevista de verificação, contra o qual o candidato poderá apresentar, no prazo de 2 (dois) dias úteis, recurso dirigido à Comissão Recursal respectiva. 7.9.1 Após a análise dos recursos, será divulgado o resultado definitivo da verificação da condição declarada. [negritei] Apesar de o item 4.10 do edital estabeleça que a inscrição do candidato “implica o conhecimento e a tácita aceitação das normas e condições estabelecidas neste Edital, em relação às quais não poderá alegar desconhecimento, bem como quanto à realização da prova nos prazos estipulados”, não previu quaisquer exceções à regra do item 7.8 no caso de não comparecimento justificado à entrevista de confirmação da heteroidentificação, sujeitando a recurso administrativo apenas aqueles candidatos que se submeteram à referida entrevista e foram recusados, no prazo de dois dias úteis, contados da divulgação do resultado provisório, autorizando, nesta estreita linha de cognição, a análise do writ, dada à ausência de recurso administrativo próprio para atacar a decisão de recusa alertada pela impetrante e comprovada no documento de consulta anexo ao id. 275894350. No caso concreto, a Impetrante obteve 32 pontos na Prova Objetiva para o cargo de Analista Judiciário – Direito – Secretaria do Tribunal de Justiça, conforme consta do Anexo do Edital TJMT/DGP n. 11, de 14 de fevereiro de 2025 [id. 275894362, p. 88], recebendo, ainda, a nota 9,4 na Prova Discursiva, conforme Anexo do Edital n. 14, de 25/02/2025, DJE 11898, de 26/02/2025 [id. 275894366, p. 80]. Segundo consta da documentação médica anexa à impetração, o não-comparecimento da impetrante à entrevista presencial de que trata os itens 7.7.5 a 7.7.6 restou impossibilitado por conta de motivo excepcional e imprevisível, decorrente de crise de broncoespasmo e exacerbação infecciosa da doença crônica das vias aéreas, no caso, asma, devidamente comprovada por documentos médicos. O atestado médico subscrito em 21/02/2025 pela médica pneumologista Karime Schelini, CRM-MT 5754, anexo ao id. 275884896 assenta o seguinte quadro: ATESTO APRA OS DEVIDOS FINS NECESSÁRIOS, QUE A PACIENTE ACIMA É ACOMPANHADA PELA PNEUMOLOGA HÁ MAIS DE 4 MESES, POR UMA DOENÇA CRÔNICA DAS VIAS AÉREAS, A ASMA, E VEM DE FORMA CONTINUADA SENDO ACOMPANHADA, DEVIDO A DIVERSOS QUADROS DE EXABERBAÇÃO DA SUA DOENÇA DE VASE, MESMO A DESPEITO, DO USO CORRETO E DIÁRIO DE MEDICAÇÕES INALATÓRIAS E ORAIS, APRSENTOU CRISE DE BRONCOESPASMO E EXAERBAÇÃO INFECCIOSA DA DOENÇA, COM NECESSIDADE DE ANTIBIÓTICOS, CORTICÓIDE ORAL, MEDICAÇÕES INALATÓRIAS (BOMBINHAS) E AFASTAMENTO DE TODAS AS SUAS ATIVIDADES HABITUAIS, PELO GRANDE RISCO DE SER NECESSÁRIO A INTERNAÇÃO, PARA TRATAMENTO CLÍNICO E RESOLUÇAÕ DO QUADRO ENTRE AS DATAS DE 21/02/2025 A 10/03/2025. CID J45.0 Lastreiam o atestado, ainda, exames médicos datados de dezembro de 2024 que descrevem tratamento médico anterior da impetrante, em abono à descrição feita na inicial, sem que haja qualquer aspecto que comprometa a higidez documental aqui analisada. Destarte, vejo bons motivos para conceder em definitivo a ordem mandamental, pois o edital não previu, como deveria, qualquer forma expressa de impugnação quanto ao não comparecimento justificado à entrevista presencial de heteroidentificação, o que impediu à impetrante discutir administrativamente a inviabilidade de comparecimento presencial ao ato depois de ter recusada a heteroidentificação na primeira fase desse procedimento, de modo que, a meu juízo, remanesce o seu direito de ver-se submetida à etapa presencial, conditio sine qua non para a estancar eventuais dúvidas de sua condição de pessoa negra, à luz dos critérios estipulados no edital. Perfeita a colocação feita pelo eminente Des. Marcos Regenold Fernandes, em decisão unipessoal proferida em 20/02/2025 no MSI 1004874-57.2025.8.11.0000, no sentido de que “[...] não havendo ainda decisão definitiva da comissão quanto ao enquadramento ou não do Impetrante como beneficiário da cota racial após sua submissão a todas as etapas previstas no edital, remanesce hígida sua condição de candidato autodeclarado negro, que deve ser assegurada até ulterior deliberação em sentido contrário. O que se resguarda, aqui, é o direito do Impetrante de participar de tal procedimento em igualdade de condições com os demais candidatos, o que materializa, em última análise, o respeito aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal (art. 5º, LIV e LV, da CF/88).” Não se descura – a exemplo do mencionado pela combativa Procuradoria do Estado – que realmente a etapa de heteroidentificação prevista no Edital TJMT/PRES n. 74/2024 é imprescindível para a validação da autodeclaração racial e não previu a hipótese de remarcação ou reaproveitamento da etapa. Também é unívoco inexistir, na ordem jurídica, prerrogativa constitucional de candidatos a concursos públicos à remarcação de provas com base em suas próprias e pessoais circunstâncias, nos termos da Repercussão Geral inaugurada a partir do RExt 630.733/DF [Tema 335]. Contudo, é necessário cercar-se de mecanismos recursais que assegurem o principal escopo da imposição legal decorrente da política afirmativa e inclusiva, que não somente se expressa na garantia de igualdade material entre candidatos em situação de desigualdade, como também, à construção de uma sociedade solidária, fraterna e pluralista, à redução das desigualdades sociais e à promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, idade e outras formas de discriminação [art. 1º, V, e 3º, ambos da CF]. Dentro desse contexto, a lógica derivada do Tema 335, a meu ver, não se aplica às hipóteses de designação de entrevista presencial para apuração de caracteres fenotípicos de candidatos cotistas, máxime quando aprovados nessa condição em provas anteriores, e que se autodeclaram participantes da mesma etnia ou condição racial especificamente prestigiada no certame em razão de ações afirmativas do Estado. Tenha-se em mente que – conquanto etapa imprescindível do concurso – a heteroidentificação não retrata vetor de disputa entre candidatos, como que os submetendo a balizas tão densas e implacáveis que justifiquem respectiva realização simultânea, ao cabo de proteger a natureza sigilosa própria de uma verdadeira competição. Assim, como não há para essa fase do certame, a necessidade de realização simultânea e sigilosa que garanta o equilíbrio do certame e a íntegra competição dos candidatos, a jurisprudência tem relativizado os rigores editalícios, especialmente aqueles que concernem ao processo de heteroidentificação quando comprovadas incapacidades pessoais decorrentes de problemas de saúde por prova documental, Inclusive, ao que consta, a mesma impetrante obteve aprovação e heteroidentificação positiva como pessoa negra no concurso público para o cargo de analista judiciário – Área: Judiciária – Cuiabá/MT, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região [Edital 13 – TRF 1ª Região, de 06/4/2018, id. 275894360, p. 92], e como o critério fenotípico utilizado para a identificação de candidatos de cotas raciais não admite discrepância, revela-se inusitada a situação em que um órgão público admite tal condição e o outro não, tornando absolutamente incoerente o próprio sistema de avaliação para fins de heteroidentificação. Com efeito, além dos fundamentos anteriores, a sumária recusa da condição de negra ou parda da Impetrante, depois de avaliado documentalmente o por meio de fotografias, também desvela uma absoluta contradição que deve ser corrigida, máxime após o não comparecimento justificado à fase presencial da heteroidentificação da impetrante. Confira-se, no mesmo sentido: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO MARANHÃO. CANDIDATO APROVADO PARA O CARGO DE TÉCNICO ADMINISTRATIVO EM EDUCAÇÃO. VAGA DESTINADA A CANDIDATOS PRETOS E PARDOS. NÃO COMPARECIMENTO AO PROCEDIMENTO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO. INCAPACIDADE MOMENTÂNEA EM RAZÃO DE DOENÇA. POSSIBILIDADE DE DESIGNAÇÃO DE NOVA DATA. I - A jurisprudência deste egrégio Tribunal é no sentido de que se o candidato a concurso público ficou incapacitado, por algum tempo, delimitado por atestado médico, para realização da etapa da avaliação médica ou do curso de formação, é justo que se lhe oportunize realizá-los em segunda chamada, com isonomia de tratamento aos demais concorrentes, pois a igualdade consiste em tratar desigualmente os desiguais nos limites e no espaço de suas desigualdades, para obter se a igualdade real. Precedentes. II- A fase de heteroidentificação, destinada a confirmar a autodeclaração dos candidatos que concorreram na modalidade de vagas reservadas aos pretos e pardos, ao contrário do que sucede com a primeira fase do certame, relativamente às provas objetivas de conhecimento, não se submete aos princípios da simultaneidade e da sigilosidade, de forma que, uma vez demonstrada a ocorrência de circunstância extraordinária que justifique a impossibilidade de o candidato submeter-se a esse procedimento, deverá a Administração viabilizar nova data para sua realização. III- Reexame necessário e apelação desprovidos. Sentença confirmada. [TRF-4 -APL: 1003089-40.2019.4.01.3700 MA, Relator: SOUZA PRUDENTE, Data de Julgamento: 23/09/2020, QUINTA TURMA.] Ante o exposto, com o parecer, e adminículo no art. 7º, III, da Lei n. 12.016/2009, CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada para ratificar a liminar concedida, que determinou a imediata inclusão da impetrante Larissa Brandão Silva de Souza, qualificada, na mesma lista de convocação para a fase de heteroidentificação presencial sub judice, referente ao concurso regido pelo Edital TJMT/PRES n. 74/2024. É como voto. V O T O S V O G A I S V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (1o VOGAL) Pedi vista para melhor exame dos autos. Agora, trago-os para julgamento. Antes de adentrar à análise da presente Ação Constitucional, permita-me fazer um breve histórico dos fatos processuais. Colhe-se do caderno processual que Larissa Brandão Silva de Souza impetrou o Mandado de Segurança contra ato reputado ofensivo ao seu direito líquido e certo, praticado pelo Exmo. Sr. Des. Luiz Ferreira da Silva, que, na condição de Presidente Comissão Examinadora do Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva no quadro de Pessoal do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, certame esse inaugurado a partir do Edital TJMT/PRES n. 74, de 26 de setembro de 2024, recusou a impetrante na heteroidentificação como “negra”, em razão do não comparecimento ao ato de entrevista presencial de confirmação, agendado para ocorrer no dia 23 de fevereiro próximo passado, nos termos do Edital TJMT/DGP n. 8/2025. Alega que se inscreveu como candidata negra e teve inicialmente sua autodeclaração aceita, figurando nas listas preliminares e definitivas de candidatos às cotas raciais. Contudo, na fase de heteroidentificação, sua autodeclaração foi recusada por não comparecimento à entrevista presencial, marcada para 23/02/2025. Salienta que a sua ausência ocorreu, por grave problema de saúde (crise de asma com risco de internação), conforme atestados e exames médicos juntados. Aduz que não teve oportunidade de reagendamento ou de apresentar justificativa administrativa. Registrou, ainda, que já obteve a heteroidentificação positiva [Edital n. 13 – TRF 1ª Região, de 06/4/2018] em outro concurso público do qual participou, no caso, visando o Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva nos Cargos de Analista Judiciário e Técnico Judiciário do Quadro de Pessoal da Justiça Federal de 1º e 2º Graus – Edital n. 1 TRF 1ª Região, de 05/9/2017, o que reforça a presença de dúvida razoável sobre a necessidade de nova entrevista, ao mesmo tempo em que evidencia a ilegalidade da recusa administrativa aqui questionada. Com essas razões postulou, a concessão de medida liminar e no mérito concessão da ordem para que seja incluída na fase de heteroidentificação, garantindo-lhe o direito de concorrer na reserva de vagas para candidatos negros. Alternativamente, pugna pela aceitação da autodeclaração de heteroidentificação negra prestada pela impetrante, ante ao reconhecimento prévio, em procedimento administrativo de verificação presencial, pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, no Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva nos Cargos de Analista Judiciário e Técnico Judiciário do Quadro de Pessoal da Justiça Federal de 1º e 2º Graus – Edital Nº 1 – TRF 1ª Região, de 05/9/2017. O Douto Relator, deferiu a liminar requerida, em 21/3/2025, para determinar a imediata inclusão da Impetrante Larissa Brandão Silva de Souza, qualificada, na mesma lista de convocação para a fase de heteroidentificação presencial sub judice, a ser realizada no próximo dia 23 de março de 2025, nos termos do Edital n. 19, de 12 de março de 2025 (id. 276153871). O Impetrado, Presidente da Comissão Organizadora do Concurso Público para Provimento de Cargos e Formação de Cadastro de Reserva no quadro de Pessoal do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, apresentou as Informações n. 1013/2025-DGP, em 04 de abril de 2025, sustentando, em resumo, o cumprimento da liminar concedida e confirmou que a heteroidentificação da candidata foi realizada no dia 23 de março de 2025, e aceita sub judice, cujo resultado foi tornado público no edital n. 21/2025, de 31/3/2025 (id. 279305363). Na sequência, o Estado de Mato Grosso apresentou manifestação no id. 281827361, alegando que a candidata foi regularmente convocada para a entrevista, teve ciência do cronograma do concurso e não compareceu. Sustenta que não se mostra razoável que se impute à Administração o dever de adaptar o certame à posterior alegação de impedimento pessoal. A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer da lavra do Dr. Marcelo Ferra de Carvalho, opinou pela concessão da segurança, para incluir a Impetrante na fase de heteroidentificação presencial. (id. 283093363). Na sessão designada para o dia 18 de Junho de 2025, o Eminente Relator, Des. Juvenal Pereira da Silva, votou pela Concessão da segurança, ratificando liminar concedida, que determinou a imediata inclusão da impetrante Larissa Brandão Silva de Souza, qualificada, na mesma lista de convocação para a fase de heteroidentificação presencial sub judice, referente ao concurso regido pelo Edital TJMT/PRES n. 74/2024. Assim, para analisar os autos com maior acuidade, tendo em vista a sensibilidade da matéria, solicitei vista dos autos. E, assim, trago-o para julgamento. Pontuo, de início, que, à luz do art. 5o, LXIX, da CRF, e do art. 1o da Lei n. 12.016/2009, o Mandado de Segurança é ação constitucional, franqueada à proteção de direito líquido e certo, nas hipóteses em que haja lesão, ou ameaça de lesão, em decorrência de conduta ilegal ou abusiva, comissiva ou omissiva, praticada por autoridade pública, ou por quem as suas vezes fizer. O Edital regulamentador do certame, no que tange às vagas reservadas para candidatos negros, assim dispôs: “7.2 Para concorrer às vagas reservadas, o candidato deverá, no ato da inscrição, optar por concorrer às vagas reservadas aos negros, preenchendo a autodeclaração de que é preto ou pardo, conforme quesito de cor ou raça utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e fazer o upload (imagem original) da documentação a seguir, em campo específico no link de inscrição, observado o período de inscrição disposto no subitem 4.2. a) uma foto segurando o seu documento de identificação, atualizada, que poderá ser feita por aparelho celular em ambiente com boa iluminação, colorida, cabelo solto, sem adereços e com destaque do rosto e ombro; b) documento de identificação com fotografia e assinatura (frente e verso); e c) preencher corretamente todos os campos, assinar e encaminhar a autodeclaração constante Anexo IV (Formulário de Autodeclaração de candidato Negro) deste Edital. 7.2.3 Não serão aceitos documentos encaminhados para o endereço eletrônico diverso do indicado, bem como aqueles entregues pessoalmente na sede da FGV. 7.2.4 Não será aceito, ainda, o envio dos documentos elencados neste Edital fora do prazo, por fax, correio eletrônico ou outras vias que não a expressamente prevista. 7.2.5 O não envio da documentação mencionada nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2 ou o envio de documentação incompleta será imputado ao candidato e acarretará na perda do direito às vagas reservadas. 7.3 A autodeclaração é facultativa, ficando o candidato submetido às regras gerais estabelecidas caso não opte pela reserva de vagas. 7.4 A relação dos candidatos na condição de negros será divulgada no endereço eletrônico https://conhecimento.fgv.br/concursos/tjmtservidor. 7.5 A autodeclaração terá validade somente para o concurso público aberto, não podendo ser estendida a outros certames. 7.6 Os candidatos aprovados que se declararam negros no ato da inscrição e encaminharam os documentos elencados nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2, serão submetidos ao procedimento de heteroidentificação que verificará a veracidade das informações prestadas pelos candidatos e proferirá parecer definitivo a respeito. 7.7 O procedimento de heteroidentificação será realizado por Comissão de Heteroidentificação constituída por 5 (cinco) membros e ocorrerá em 2 (duas) etapas: 7.7.1 A primeira etapa será realizada a partir das fotos coletadas no momento da inscrição no concurso público. 7.7.2 Os candidatos cuja autodeclaração não for confirmada após a verificação na primeira etapa serão convocados para averiguação presencial, por meio de Edital de convocação, que estará disponível no endereço eletrônico https://conhecimento.fgv.br/concursos/tjmtservidor. 7.8 O não envio dos documentos elencados nas alíneas “a”, “b” e “c” do subitem 7.2, a não convalidação da autodeclaração ou o não comparecimento à averiguação presencial acarretará a perda do direito aos quantitativos reservados aos candidatos autodeclarados negros, passando a figurar apenas na lista de Ampla Concorrência do cargo/ área/ especialidade. 7.9 Após a análise pela Comissão de Heteroidentificação, será divulgado Edital de resultado provisório da entrevista de verificação, contra o qual o candidato poderá apresentar, no prazo de 2 (dois) dias úteis, recurso dirigido à Comissão Recursal respectiva. 7.9.1 Após a análise dos recursos, será divulgado o resultado definitivo da verificação da condição declarada. Conforme se verifica, foram definidas as regras no edital de abertura para orientação aos candidatos sobre os procedimentos necessários para concorrer às vagas reservadas. Assim, não obstante de o item 4.10 do edital estabeleça que a inscrição do candidato “ implica o conhecimento e a tácita aceitação das normas e condições estabelecidas neste Edital, em relação às quais não poderá alegar desconhecimento, bem como quanto à realização da prova nos prazos estipulados”, não previu quaisquer exceções à regra do item 7.8 no caso de não comparecimento justificado à entrevista de confirmação da heteroidentificação, sujeitando a recurso administrativo apenas aqueles candidatos que se submeteram à referida entrevista e foram recusados, no prazo de dois dias úteis, contados da divulgação do resultado provisório, autorizando, nesta estreita linha de cognição, a análise do writ, dada à ausência de Num. 285842896 - Pág. 4 recurso administrativo próprio para atacar a decisão de recusa alertada pela Impetrante e comprovada no documento de consulta anexo ao id. 275894350 Vê-se, assim, que a exclusão da Impetrante do procedimento de heteroidentificação, com fundamento exclusivo no não comparecimento à entrevista presencial, revela-se ilegítima diante da ausência de previsão editalícia quanto à possibilidade de apresentação de justificativa plausível para o não comparecimento. A Administração Pública, ao organizar o certame, previu as consequências da ausência, mas omitiu-se quanto à disponibilização de mecanismo recursal ou canal formal que permitisse ao candidato justificar eventual impossibilidade de participação na data designada por motivo superveniente e alheio à sua vontade. Tal omissão caracteriza falha procedimental relevante, pois inviabilizou o exercício do contraditório e da ampla defesa, princípios constitucionais assegurados pelo art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, inclusive em sede de concursos públicos. Desse modo, a justificativa apresentada pela Impetrante para sua ausência à entrevista presencial está amparada por documentação médica idônea, assinada por profissional especialista, que atesta o acometimento por quadro agudo de broncoespasmo decorrente de asma crônica com risco de agravamento e necessidade de afastamento imediato das atividades habituais. A razoabilidade dessa justificativa é incontestável, sobretudo diante da gravidade do estado clínico descrito e da compatibilidade entre os documentos médicos e o período do procedimento de heteroidentificação. Nessas circunstâncias, exigir o comparecimento presencial da candidata implicaria violação à proporcionalidade, pois desconsidera situação de força maior plenamente documentada. Ademais, a exclusão sumária da Candidata, sem qualquer análise da motivação apresentada e sem oferta de alternativa procedimental para avaliação de sua condição racial, afronta os princípios da legalidade, razoabilidade, proporcionalidade e igualdade, que regem a Administração Pública, nos termos do art. 37 da Constituição. A conduta administrativa restringiu, de forma desarrazoada, o direito da Impetrante de participar regularmente do certame por meio da política afirmativa de cotas raciais, esvaziando o conteúdo substancial do direito à igualdade material. Soma-se a isso o fato de que a Impetrante já teve sua autodeclaração racial reconhecida em concurso público anterior de natureza análoga, submetida à avaliação fenotípica presencial em certame promovido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, cuja banca examinadora a reconheceu como pessoa negra. Desta maneira, entendo que essa circunstância reforça a dúvida razoável acerca da necessidade de nova exclusão e corrobora a verossimilhança da condição racial autodeclarada. Ao ignorar esse histórico, a Administração desprezou elemento relevante de convicção, desconsiderando precedentes administrativos válidos e contribuindo para uma decisão manifestamente desproporcional. Diante desse conjunto de elementos, conclui-se que a recusa da impetrante à etapa de heteroidentificação não poderia ter sido mantida sem oportunizar-lhe o exercício do direito ao contraditório, especialmente diante de motivo justificado e plenamente comprovado Por tais considerações, a segurança deve, pois, ser concedida, para reconhecer o direito da impetrante à reinclusão no procedimento de heteroidentificação presencial. Forte nessas razões, acompanho, integralmente, o voto proferido pelo Eminente Relator, Des. Juvenal Pereira da Silva, para determinar a inclusão da Impetrante Larissa Brandão Silva de Souza, na mesma lista de convocação para a fase de heteroidentificação presencial sub judice, referente ao concurso regido pelo Edital TJMT/PRES n. 74/2024. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/07/2025
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