Processo nº 5001824-16.2024.8.24.0068
ID: 330387165
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5001824-16.2024.8.24.0068
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VANESSA BAUFLENHER DA SILVA
OAB/SC XXXXXX
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ALEXANDRE BERNARDON
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5001824-16.2024.8.24.0068/SC
APELANTE
: NOEMIA BUTH (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: VANESSA BAUFLENHER DA SILVA (OAB SC046602)
ADVOGADO(A)
: ALEXANDRE BERNARDON (OAB SC038460)
DESPACHO/DECISÃO
Tra…
Apelação Nº 5001824-16.2024.8.24.0068/SC
APELANTE
: NOEMIA BUTH (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: VANESSA BAUFLENHER DA SILVA (OAB SC046602)
ADVOGADO(A)
: ALEXANDRE BERNARDON (OAB SC038460)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de
Apelação Cível
interposta por
N. B.
contra a sentença proferida pelo juízo da Vara Única da comarca de Seara que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição do Indébito e Indenização por Danos Morais n. 500182416-20.24.8.24.0068 ajuizada contra AASAP - A. de A. S. ao A. e P., julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (
evento 29, SENT1
- autos de origem):
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto,
JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES
os pedidos contidos na inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), para
DECLARAR
a
inexistência
de relação jurídica entre as partes e
CONDENAR
a parte ré a restituir, de forma dobrada, os valores descontados do benefício previdenciário da parte autora, nos termos da fundamentação, corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir do evento danoso (cada desconto indevido - art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), até 29/08/2024, indexadores que, a partir do início da vigência da Lei n.º 14.905/24 (30/08/2024), passarão a incidir unicamente pela taxa referencial SELIC, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único, e art. 406, § 1º, ambos do CC).
Diante da sucumbência mínima da parte ré, já que a parte autora decaiu da maior parte econômica do pedido -- danos morais --,
condeno
a parte autora ao pagamento das custas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência em favor do procurador da parte ré, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade judiciária que lhe foi deferida.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se
.
Sobrevindo recurso voluntário,
intime-se
a parte adversa para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias (CPC, art. 1.003, § 5º), e, na sequência,
remetam-se
os autos à Superior Instância.
Com o trânsito em julgado,
baixe-se
.
Em atenção ao princípio da celeridade processual e a fim de evitar tautologia, adota-se o relatório da sentença apelada (
evento 29, SENT1
- autos de origem):
I - RELATÓRIO
NOEMIA BUTH
ajuizou ação declaratória de inexistência de débito c/c obrigação de fazer e indenização por dano moral em desfavor de AASAP - AASAP - ASSOCIACAO DE AMPARO SOCIAL AO APOSENTADO E PENSIONISTA, ambos qualificados, alegando, em resumo, que constatou a realização de descontos em seu benefício previdenciário, que remetiam à entidade associativa ré, no valor de R$ 35,30.
Argumentou, porém, que jamais se associou à ré, tampouco solicitou os seus serviços, razão pela qual pugna pela procedência dos pedidos para que seja reconhecida a inexistência da relação jurídica entre as partes, com a nulidade contratual e a condenação da ré ao pagamento da restituição do indébito em dobro, além de danos morais.
Recebida a inicial, foi invertido o ônus da prova e deferida a gratuidade da justiça (
evento 10, DESPADEC1
).
Citada (
evento 19, DOC1
), a parte ré não apresentou contestação (evento 20).
Inconformada, a parte apelante insurgiu-se contra a improcedência do pedido de indenização por danos morais, sustentando a ocorrência de abalo moral decorrente do desconto não autorizado em benefício previdenciário. Ainda, argumentou que a correção monetária deve se dar pelo INPC desde o evento danoso, com juros de mora de 1% ao mês. Ao final, pugnou pelo que o réu seja condenado ao pagamento de honorários de sucumbência com base na tabela da OAB, e pelo provimento do recurso (
evento 37, APELAÇÃO1
, autos da origem).
Destaca-se ser dispensável a intimação do apelado, posto que revel no processo de origem, o que faz recair sobre ele o efeito de fluência dos prazos independentemente de intimação, consoante o art. 346,
caput,
do CPC.
Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
É o relatório.
Exame de Admissibilidade Recursal
Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se à análise.
Nos termos do art. 932
, inc. V, alínea c, do Código de Processo Civil, incumbe ao relator "dar provimento
a recurso se a decisão for contrária a entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência". Ainda, no inc. VIII,
"exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal"
. Por sua vez, o art. 132 do atual Regimento Interno deste Tribunal de Justiça passou a conter nos incisos XV e XVI, que compete ao relator, por decisão monocrática:
XV –
negar provimento a recurso
nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;
XVI – depois de facultada a apresentação de contrarrazões,
dar provimento a recurso
nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;
Também, a Súmula 568 do Superior Tribunal de Justiça prevê que "o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça,
poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema".
Assim, em primazia à celeridade processual, tem-se a possibilidade de julgamento monocrático do recurso de apelação interposto, porquanto a temática discutida nos autos possui entendimento dominante pela Primeira Câmara de Direito Civil desta Corte de Justiça.
A propósito, a controvérsia acerca da possibilidade de julgamento monocrático pelo relator já foi superada pelo órgão colegiado, em julgamento ampliado realizado na sessão do dia 20/02/2025, nos termos do art. 942 do Código de Processo Civil. Na ocasião, ao apreciar os
Agravos Internos de ns. 5004031-94.2020.8.24.0175 e 5003661-98.2021.8.24.0040
, firmou-se entendimento, por maioria, de que não há nulidade na decisão monocrática proferida pelo relator nas hipóteses em que se discute matéria idêntica à tratada nesses precedentes, consolidando, assim, a possibilidade do julgamento unipessoal na hipótese.
Relação de Consumo
De plano, registra-se que ao caso aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, porquanto se trata de relação consumerista, estando de um lado o consumidor e de outro o fornecedor de serviços.
A defesa dos direitos básicos do consumidor deve ser resguardada e, em especial, o previsto no art. 6º, incisos VI, VIII e X, do CDC, que assim dispõe: "São direitos básicos do consumidor
a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais
, coletivos e difusos;
a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil
, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; e
a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral
".
Dessarte, o julgamento da presente demanda está adstrito às regras de proteção ao consumidor, notadamente a inversão do ônus da prova, pois ele é parte hipossuficiente e merece especial tratamento.
Mérito
O cerne da questão jurídica cinge-se à afiliação sindical e, por via de consequência, do desconto efetuado no benefício previdenciário da autora.
A parte apelante pugnou pela reforma da sentença a fim de que a ré seja condenada ao pedido de danos morais, na quantia de R$ 20.000,00, bem como seja modificado o capítulo da sentença relativo aos consectários incidentes sobre os valores a serem restituídos pelo réu, e, ainda que os honorários de sucumbência sejma fixados com base na tabela divulgada pela OAB.
O recurso, adianta-se,
comporta parcial provimento.
Os descontos em questão foram registrados sob a rubrica "CONTRIB. AASAP 0800 202 0177", no valor de R$ 35,30. A autora demonstrou que teriam sido efetuado o débito de 3 parcelas em seu benefício previdenciário (
evento 1, HISCRE7
). Ainda, verifica-se que a parte autora é pessoa idosa (73 anos quando iniciaram os descontos) e recebia R$ 1.412,00 de pensão por morte previdenciária (à época do protocolo da inicial), representando os descontos cerca de 2,50% dos proventos mensais.
Consoante informações dos autos, o magistrado
a quo
julgou os pedidos parcialmente procedentes diante da ausência de provas da regularidade da contratação.
Dano Moral
Sobre o assunto, o Grupo de Câmaras de Direito Civil desta Corte de Justiça, no julgamento do IRDR n. 5011469- 46.2022.8.24.0000 (Tema 25), de relatoria do Des. Marcos Fey Probst, dirimiu a controvérsia acerca da presunção do dano moral em descontos indevidos em benefício previdenciário, fixando a seguinte tese jurídica:
"Não é presumido o dano moral quando o desconto indevido em benefício previdenciário decorrer de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente pelo poder judiciário".
O dano moral consiste no prejuízo de natureza não patrimonial que afeta o estado anímico da vítima, seja relacionado à honra, à paz interior, à liberdade, à imagem, à intimidade, à vida ou à incolumidade física e psíquica.
Conforme o art. 186 do Código Civil: "
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito
".
Outrossim, cumpre ressaltar que os danos morais não servem única e exclusivamente para compensar a vítima de um injusto, mas também para desestimular o ofensor na conduta reiterada de ações contra demais consumidores.
Nesse sentido, ensina a doutrina:
Segundo nosso entendimento a indenização da dor moral, sem descurar desses critérios e circunstâncias que o caso concreto exigir, há de buscar, como regra, duplo objetivo: caráter compensatório e
função punitiva da sanção (prevenção e repressão), ou seja: a) condenar o agente causador do dano ao pagamento de certa importância em dinheiro, de modo a puni-lo e desestimulá-lo da prática futura de atos semelhantes;
b) compensar a vítima com uma importância mais ou menos aleatória, em valor fixo e pago de uma só vez, pela perda que se mostra irreparável, ou pela dor ou humilhação impostas. (STOCO, Rui, Tratado de responsabilidade civil. São Paulo. RT. 2004. p. 1709).
No presente caso, a situação descrita nos autos ultrapassa os meros aborrecimentos do cotidiano, uma vez que envolve a realização de descontos indevidos no benefício previdenciário da parte autora, decorrentes de associação realizada de forma abusiva. Embora os valores descontados mensalmente no importe de R$ 35,30 não sejam, isoladamente, de grande monta — representando cerca de 2,5% da renda mensal da beneficiária, que recebe renda miníma de um salário mínimo —, é importante considerar que foram realizados sem a anuência da aposentada.
Tal conduta, por parte da ré, revela descuido que pode gerar no consumidor um sentimento legítimo de insegurança e vulnerabilidade. Diante disso, é cabível a reparação por danos morais, devendo o valor da indenização ser fixado com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de modo a refletir a gravidade da ofensa e o caráter pedagógico da medida.
Assim tem decidido esta Primeira Câmara de Direito Civil:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. DANOS MORAIS. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO NÃO PRESUMIDO. TEMA 25 DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. RECEBIMENTO DE APOSENTADORIA DE UM SALÁRIO MÍNIMO. DESCONTOS MENSAIS DE R$ 39,53 (TRINTA E NOVE REAIS E CINQUENTA E TRÊS CENTAVOS) QUE PERDURARAM POR, PELO MENOS, CINCO MESES. NEGLIGÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO.
ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL PORQUE DO APONTADO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO JÁ ERAM DESCONTADOS OUTROS IMPORTES, DE MANEIRA QUE O ABATIMENTO DE NOVA PARCELA PECUNIÁRIA CERTAMENTE REPERCUTIRIA DE MODO NEGATIVO NAS FINANÇAS DO APOSENTADO, E SEM DESCONSIDERAR QUE FORAM DESCONTOS ORIUNDOS DE PACTO NÃO CONTRATADO. VEROSSÍMIL A ALEGAÇÃO DOS FATOS DANOSOS. CONDENAÇÃO FIXADA EM R$ 3.000,00. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
SENTENÇA REFORMADA. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. PRETENSA ALTERAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DA VERBA HONORÁRIA. INVIABILIDADE. ORDEM DE PREFERÊNCIA ESTABELECIDA NO ART. 85, § 2º, DO CPC. TEMA 1076. TABELA DA OAB AFASTADA, PORQUANTO NÃO VINCULATIVA. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5023744-02.2024.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Flavio Andre Paz de Brum, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 08-05-2025).
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRIBUIÇÃO PARA ASSOCIAÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. DANOS MORAIS. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO NÃO PRESUMIDO. TEMA 25 DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL. ANÁLISE DO CASO CONCRETO.
RECEBIMENTO DE APOSENTADORIA DE UM SALÁRIO MÍNIMO. DESCONTOS MENSAIS DE R$ 46,20 (QUARENTA E SEIS REAIS E VINTE CENTAVOS) QUE PERDURARAM POR UM ANO. NEGLIGÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO.
ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL. CONDENAÇÃO FIXADA EM R$ 2.333,33 (DOIS MIL TREZENTOS E TRINTA E TRÊS REAIS E TRINTA E TRÊS CENTAVOS). MONTANTE DEFINIDO POR MEIO DE MÉDIA ARITMÉTICA APÓS DIVERGÊNCIA ENTRE OS VOTANTES. EXEGESE DO ART. 187 DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL. VALOR EM CONFORMIDADE COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SENTENÇA REFORMADA. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000924-78.2024.8.24.0053, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Flavio Andre Paz de Brum, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 03-04-2025).
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRIBUIÇÃO PARA ASSOCIAÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. DANOS MORAIS. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO NÃO PRESUMIDO. TEMA 25 DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. RECEBIMENTO DE APOSENTADORIA DE UM SALÁRIO MÍNIMO. DESCONTOS MENSAIS DE R$ 45,00 (QUARENTA E CINCO REAIS) QUE PERDURARAM POR UM ANO.
NEGLIGÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO. ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL.
CONDENAÇÃO FIXADA EM R$ 5.000,00. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES DESTA CÂMARA DE DIREITO CIVIL. SENTENÇA REFORMADA. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5011328-32.2024.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Flavio Andre Paz de Brum, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 13-03-2025).
Diante da comprovação da fraude nos descontos realizados, da situação de vulnerabilidade da parte autora e do impacto negativo em sua renda mensal, é evidente o direito à devida reparação. Assim, impõe-se à parte ré o dever de indenizar os prejuízos morais sofridos, em razão da conduta lesiva praticada.
Quantum
Compensatório
O valor a ser fixado a título de danos morais deve atender ao binômio punição/reparação, cuja importância deve ser expressiva o suficiente para desestimular o responsável a reincidir na conduta repreendida e reparar o dano ao patrimônio moral da vítima sem, contudo, ser tão elevado a ponto de constituir enriquecimento sem causa.
Como parâmetro, a doutrina e a jurisprudência sedimentaram que devem ser considerados fatores como a intensidade e duração do dano, a gravidade do fato que causou o dano, a condição pessoal e social das partes e o grau de culpa do lesante, bem como o valor do negócio.
Na situação vertente, considerando a capacidade econômica das partes, já que a parte autora é aposentada que aufere renda mensal mínima; o valor dos descontos de R$ 35,30 a comprovação de que ocorreu pelo menos 3 descontos no benefício previdenciário da parte autora, tem-se que a quantia de R$ 2.000,00
é perfeitamente adequada, levando em consideração também o cunho pedagógico e o valor usualmente fixado por este órgão fracionário em casos análogos.
Assim, o recurso deve ser provido para condenar o réu à compensação pelo dano moral, com correção monetária pelo IPCA a partir deste arbitramento (Súmula 362 do STJ), acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ), aplicável até 29/8/2024, e a partir de 30/8/2024
, com base na taxa legal, que corresponde à taxa referencial Selic, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único e art. 406, § 1º, do CC).
Consectários Legais da Repetição do Indébito
Outrossim, com relação aos consectários legais de repetição de indébito, o magistrado
a quo
fixou da seguinte forma: "
CONDENAR
a parte ré a restituir, de forma dobrada, os valores descontados do benefício previdenciário da parte autora, nos termos da fundamentação, corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir do evento danoso (cada desconto indevido - art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), até 29/08/2024, indexadores que, a partir do início da vigência da Lei n.º 14.905/24 (30/08/2024), passarão a incidir unicamente pela taxa referencial SELIC, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único, e art. 406, § 1º, ambos do CC).
" (
evento 29, SENT1
- autos de origem).
Convém ressaltar que
se
trata de relação extracontratual.
A teor do art. 398 do Código Civil "nas obrigações
provenientes de ato ilícito
,
considera-se o devedor em mora, desde que o praticou
" e, no caso, desde cada desconto indevido efetuado no benefício previdenciário.
Trata-se de ato ilícito autônomo, desvinculado do contrato entre as partes, consoante informações dos autos.
Quanto ao termo inicial de contagem dos consectários legais da restituição,
o STJ quando do julgamento monocrático no AREsp n. 2.470.022, de relatoria do Ministro Moura Ribeiro, j. 1/12/2023 já decidiu que
"a jurisprudência dominante desta Corte entende que, em se tratando de responsabilidade extracontratual, como é o caso dos autos, os juros de mora incidirão desde o evento danoso (Súmula n. 54 do STJ)".
Na hipótese, o caso restou assim ementado pelo TJMS:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANO MORAIS
. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURADOS. REFORMA DA PRETENSÃO. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ.
RESTITUIÇÃO DE VALORES. JUROS DE MORA. RELAÇÃO CONTRATUAL AFASTADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 54 DO STJ
.
AGRAVO CONHECIDO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
Na mesma linha de raciocínio vem entendendo as Câmaras de Direito Civil desta Corte de Justiça:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DESCONTOS MENSAIS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. PLEITEADA CONDENAÇÃO DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INVIABILIDADE. DESCONTOS IRREGULARES EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO QUE, POR SI SÓ, NÃO PRESUMEM A EXISTÊNCIA DE DANO MORAL. (...) HIPÓTESE DE ENGANO JUSTIFICÁVEL QUE TAMBÉM NÃO FOI DEMONSTRADA. INDÉBITO QUE DEVE SER REPETIDO NA FORMA DOBRADA, NOS TERMOS DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR,
COM ACOLHIMENTO DO PEDIDO DE MODIFICAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC E JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS A PARTIR DO EVENTO DANOSO, QUE EM ATENÇÃO À RELAÇÃO EXTRACONTRATUAL ENTRE AS PARTES (SÚMULA 54 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA). (...)
(TJSC, Apelação n. 5019044-18.2021.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 08-02-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDOS DE REPARAÇÃO DE ORDEM MATERIAL E MORAL, DECORRENTES DE DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. (...) ALMEJADA RESTITUIÇÃO DE VALORES NA FORMA SIMPLES. PRETENSÃO PARCIALMENTE ACOLHIDA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO PROFERIDA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANDO DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA N. 676608/RS. VALORES REFERENTES AOS DESCONTOS OPERADOS EM DATA ANTERIOR QUE DEVEM SER RESTITUÍDOS NA FORMA SIMPLES, POIS A MÁ-FÉ DA PARTE RÉ NÃO RESTOU DEMONSTRADA, TAMPOUCO SE PRESUME.
CONSECTÁRIOS LEGAIS. PLEITEADA A MODIFICAÇÃO DO TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA SOBRE A REPARAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS. INACOLHIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA DESDE O EFETIVO PREJUÍZO. SÚMULA 43 DO STJ. JUROS DE MORA, OUTROSSIM, QUE DEVEM INCIDIR DESDE O EVENTO DANOSO. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. APLICAÇÃO DO ART. 398 DO CÓDIGO CIVIL E DA SÚMULA 54 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ADEQUAÇÃO DE OFÍCIO. (...)
(TJSC, Apelação n. 5002602-92.2020.8.24.0175, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 07-03-2023).
Ademais, a controvérsia relativa aos consectários legais — correção monetária e juros de mora — deve ser analisada à luz da transição normativa promovida pela Lei n. 14.905/2024, que alterou os arts. 389 e 406 do Código Civil. A correta aplicação dos índices deve observar as regras de direito intertemporal, em respeito aos princípios constitucionais da segurança jurídica e da irretroatividade das leis.
Até 29/08/2024, a jurisprudência consolidada e os atos normativos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (Provimento n. 13/1995) estabeleciam a aplicação cumulativa de:
Correção monetária pelo INPC
, reconhecido como índice adequado para recompor o valor econômico da dívida e
juros de mora de 1% ao mês
, fundamentados no art. 406 do Código Civil em conjunto com o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional.
A manutenção desse regime para fatos ocorridos até 29/08/2024 está em consonância com precedentes do TJSC, os quais reafirmam a aplicabilidade do INPC e dos juros de mora de 1% como critérios apropriados antes da entrada em vigor da nova legislação.
Com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, a redação dos arts. 389 e 406 do Código Civil foi alterada para: (i) Determinar a aplicação do
IPCA
como índice de correção monetária, conforme o parágrafo único do art. 389 e (ii) Estabelecer a
Taxa Selic
como índice unificado que engloba atualização monetária e juros de mora, conforme o § 1º do art. 406.
A Circular n. 345/2024 da Corregedoria-Geral de Justiça do TJSC reforça a necessidade de explicitar os critérios de atualização e juros de mora nas decisões judiciais, observando os marcos temporais para evitar dúvidas e litígios desnecessários. Essa recomendação assegura que a transição normativa seja aplicada de forma uniforme e previsível.
No julgamento do
REsp n. 1.795.982/SP
, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a
taxa Selic
deveria ser aplicada às relações civis como índice unificado, nos termos do art. 406 do Código Civil, considerando sua natureza macroeconômica que engloba tanto a correção monetária quanto os juros de mora. Entretanto, com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, a questão de ordem relativa ao método de cálculo tornou-se prejudicada, visto que a legislação uniformizou a aplicação da Selic e do IPCA nas relações civis.
A propósito, assim já decidiu a Primeira Câmara de Direito Civil pela aplicação dos marcos temporais com a vigência da Lei n. 14.905/2024:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA REQUERIDA. AUSÊNCIA DE FALHA NO SERVIÇO DE VIGILÂNCIA E MONITORAMENTO. (...)
CONSECTÁRIOS LEGAIS MANTIDOS COMO ESTABELECIDOS NA ORIGEM. INCIDÊNCIA, TODAVIA, DA TAXA SELIC A PARTIR DE 30/08/2024, CONFORME ARTS. 389, PARÁGRAFO ÚNICO E 406, § 1°, DO CC. PRECEDENTES.
REPARAÇÃO MINORADA PARA 50% DO PREJUÍZO, CONFORME PRECEDENTES EM CASOS ANÁLOGOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA CONFIGURADA. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS, NO CASO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0305239-24.2018.8.24.0005, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Flavio Andre Paz de Brum, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 21-11-2024).
De igual modo, extrai-se da recente jurisprudência desta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APRESENTAÇÃO DE RECONVENÇÃO PELA RÉ. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS EFETUADOS NA AÇÃO PRINCIPAL E IMPROCEDENTE O PLEITO RECONVENCIONAL. RECURSO DA AUTORA. PLEITEADO O EMPREGO DO INPC COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA FIXADA NA ORIGEM, AO INVÉS DA SELIC, E JUROS DE MORA DE 1% ATÉ O EFETIVO PAGAMENTO. PARCIAL PROCEDÊNCIA.
ORIENTAÇÃO DA CIRCULAR CJG/SC N. 345/2024. VALOR DA INDENIZAÇÃO QUE DEVE SOFRER A INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS DESDE A INSCRIÇÃO INDEVIDA E CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC A CONTAR DO ARBITRAMENTO ATÉ A DATA EM QUE PASSOU A VIGORAR A LEI Nº 14.905/2024. A PARTIR DESSE MOMENTO SE OBSERVARÁ A ALTERAÇÃO DA REDAÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 389 E DO ART. 406, § 1°, DO CÓDIGO CIVIL, O QUE IMPLICARÁ NA INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA E JUROS DE MORA PELA TAXA SELIC, COM DEDUÇÃO DO IPCA. (...)
(TJSC, Apelação n. 0300447-30.2018.8.24.0004, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 14-11-2024).
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. ACÓRDÃO QUE CONHECEU E NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ. ACLARATÓRIOS OPOSTOS PELA REQUERIDA. AVENTADA A EXISTÊNCIA DE OMISSÃO NO JULGADO. INOBSERVÂNCIA AO NOVO ENTENDIMENTO DO STJ PARA APLICABILIDADE DO ART. 406, §1º, DO CÓDIGO CIVIL, COM AS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI N. 14.905/2024. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DOS JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS E CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC PARA INCIDÊNCIA EXCLUSIVA DA TAXA SELIC. PARCIAL ACOLHIMENTO.
INÍCIO DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 14.905/2024, QUE ALTEROU O CÓDIGO CIVIL PARA DEFINIR A TAXA SELIC COMO INDEXADOR, A PARTIR DE 30/08/2024. INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO PELO INPC E JUROS DE 1% AO MÊS PARA PERÍODOS ANTERIORES. SUBSTITUIÇÃO DA TAXA DE JUROS FIXA PELA SELIC A PARTIR DA VIGÊNCIA DA NOVA LEGISLAÇÃO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 389 E 406 DO CÓDIGO CIVIL.
EMBARGOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE ACOLHIDOS. (TJSC, Apelação n. 5001897-84.2019.8.24.0028, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 21-11-2024).
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO DO APELADO. (...) 2) SUSCITADA OMISSÃO NA INCIDÊNCIA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 406, DO CC, SOBRE A REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
CONSECTÁRIOS LEGAIS. INCIDÊNCIA DA LEI N. 14.905/24. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA CONFORME O INPC E JUROS DE 1% AO MÊS, DESDE O EVENTO DANOSO, ATÉ 29.08.24, E EQUIVALENTES À SELIC, DEDUZIDO O IPCA, A PARTIR DE 30.08.2024. OMISSÃO SUPRIDA.
3) PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. POSSIBILIDADE. 4) HONORÁRIOS RECURSAIS DESCABIDOS. EMBARGOS DECLARATÓRIOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. (TJSC, Apelação n. 5000057-41.2024.8.24.0003, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Gerson Cherem II, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 26-11-2024).
Desse modo, ao contrário do que almeja a recorrente, a sentença merece ser mantida no ponto.
Honorários de Sucumbência
Insurge-se a autora/apelante contra o capítulo da sentença que fixou os honorários advocatícios de sucumbência, sob o fundamento de que fixados em valor irrisório, de modo que a fixação deveria ocorrer com base na tabela divulgada pela OAB, de forma equitativa.
No juízo
a quo
os honorários foram fixados da seguinte forma (
evento 29, SENT1
- autos da origem):
Diante da sucumbência mínima da parte ré, já que a parte autora decaiu da maior parte econômica do pedido -- danos morais --,
condeno
a parte autora ao pagamento das custas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência em favor do procurador da parte ré, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade judiciária que lhe foi deferida.
Com a vigência do CPC, dentre outras mudanças, houve a redução das hipóteses de sucumbência por equidade apenas para quando for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou muito baixo o valor da causa. A intenção do legislador é perceptível pela dicção do § 2º do art. 85 do CPC, como regra geral,
in verbis
:
§ 2º Os
honorários
serão fixados entre o
mínimo de dez e o máximo de vinte por cento
sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I - o grau de zelo do profissional;
II - o lugar de prestação do serviço;
III - a natureza e a importância da causa;
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Assim, tem-se que a norma estabelece uma ordem preferencial para o arbitramento dos honorários sucumbenciais: sobre o valor da condenação,
do proveito econômico obtido
e sobre o valor da causa (nos casos de não ser possível mensurar o proveito econômico), de sorte que
somente nas restritas hipóteses do § 8º do art. 85 do CPC é que caberá a apreciação equitativa.
Ademais, consoante entendimento proferido pelo STJ no julgamento dos REsp's n. 1.850.512/SP, 1.877.883/SP, 1.906.623/SP e 1.906618/SP (Tema 1076), em 16/3/2022, de relatoria do Ministro Og Fernandes, foi dirimida a controvérsia acerca da "definição do alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados", no qual fixaram a seguinte tese:
i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.
ii) Apenas se admite arbitramento de
honorários
por
equidade
quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.
In casu
, o montante de 10% sobre o valor atribuído à causa (R$ 30.157,52) não representa quantia inestimável ou irrisória, motivo pelo qual não há necessidade de readequação dos honorários fixados na origem.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS. (...) QUANTUM COMPENSATÓRIO. MANUTENÇÃO EM R$ 6.000,00 (SEIS MIL REAIS). OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. VERBA INCLUSIVE INFERIOR AO PATAMAR EMPREGADO POR ESTA CÂMARA EM CONTENDAS ANÁLOGAS.
HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. VALOR DA CONDENAÇÃO NÃO INESTIMÁVEL OU IRRISÓRIO.
ADEQUAÇÃO IMPOSITIVA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000862-40.2024.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 08-10-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. INCLUSÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA QUE DECLARA INEXISTENTE E DÍVIDA E CONDENA A RÉ AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS NO VALOR DE R$ 6.000,00. RECURSO DA AUTORA. PEDIDO DE MAJORAÇÃO DA QUANTIA INDENIZATÓRIA. AFASTAMENTO. MONTANTE QUE SE ENCONTRA DENTRO DOS LIMITES RAZOÁVEIS ADOTADOS POR ESTE COLEGIADO. INEXISTÊNCIA DE ALGUMA PARTICULARIDADE QUE JUSTIFIQUE VALOR MAIOR.
ALMEJADA, OUTROSSIM, A MAJORAÇÃO DA VERBA ADVOCATÍCIA, FIXADA EM 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. REJEIÇÃO. PERCENTUAL ADEQUADO À SINGELEZA DA CAUSA E À CURTA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
(3 MESES). RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5003090-90.2021.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 01-06-2023).
Além de que, não se desconhece da nova disposição no CPC atinente à verba honorária correspondente aos valores recomendados pela Ordem dos Advogados do Brasil (art. 85, § 8-A, do CPC). Entretanto, tal premissa serve como parâmetro e não como regra, de modo que não deve vincular o julgador.
Dessarte, considerando os requisitos e a fundamentação acima elencados, assim como as particularidades do caso em comento (peças elaboradas, valor da causa e demais fatores implícitos à lide), a readequação da verba honorária é medida descabida na hipótese, porquanto a quantia fixada encontra-se condizente com o serviço prestado.
No mais, destaca-se que
"A fixação dos honorários advocatícios, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, deve observar os critérios objetivos previstos nos incisos I a IV, adotando-se como base o valor da condenação, o proveito econômico obtido ou, subsidiariamente, o valor atualizado da causa, nessa ordem de preferência. A tabela organizada pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil tem natureza meramente orientadora e, por isso, não vincula o julgador, devendo o valor dos honorários advocatícios ser fixado de acordo com o caso concreto"
(TJSC, Apelação n. 5025641-02.2023.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Yhon Tostes, Segunda Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 13-02-2025).
Dessa forma, a sentença recorrida não merece reparo no ponto.
Honorários Recursais
Por fim,
inviável o arbitramento dos honorários recursais
, nos termos do art. 85, §11, do CPC, porque não configurados os pressupostos autorizadores consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento proferido nos autos do Recurso Especial n.1.573.573, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze,
em razão do parcial provimento do recurso.
Parte Dispositiva
Ante o exposto, com fulcro no art. 932, incisos V, alínea c e VIII, do CPC c/c art. 132, inciso XVI, do RITJSC, conhece-se do recurso e
dá-se-lhe parcial provimento
a fim de
fixar os danos morais na quantia de R$ 2.000,00
, com correção monetária pelo IPCA a partir deste arbitramento (Súmula 362 do STJ), acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ), aplicável até 29/8/2024, e a partir de 30/8/2024
,
com base na taxa legal, que corresponde à taxa referencial Selic, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único e art. 406, § 1º, do CC). Inviável o arbitramento dos honorários recursais em razão do provimento parcial do recurso, nos termos da fundamentação.
Intimem-se.
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