Facta Financeira S.A. Credito, Financiamento E Investimento x Cleo Augusto Kretzmann e outros
ID: 313548822
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 19ª Câmara Cível
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 5177279-04.2025.8.21.7000
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
ANNA CANDICE WEILER MIRALLES
OAB/RS XXXXXX
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MAURICIO RODRIGUES DE FREITAS
OAB/RS XXXXXX
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GUSTAVO CENCI AGOSTINI
OAB/RS XXXXXX
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NATHALIA SATZKE BARRETO
OAB/SP XXXXXX
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Agravo de Instrumento Nº 5177279-04.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATORA
: Desembargadora FABIANA ZILLES
AGRAVANTE
: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENT…
Agravo de Instrumento Nº 5177279-04.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATORA
: Desembargadora FABIANA ZILLES
AGRAVANTE
: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO
ADVOGADO(A)
: NATHALIA SATZKE BARRETO (OAB SP393850)
AGRAVADO
: CLEO AUGUSTO KRETZMANN
ADVOGADO(A)
: GUSTAVO CENCI AGOSTINI (OAB RS102173)
ADVOGADO(A)
: MAURICIO RODRIGUES DE FREITAS (OAB RS100379)
INTERESSADO
: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL
EMENTA
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. DEFERIMENTO na origem. MANUTENÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela de urgência para limitar descontos e cobranças mensais em conta bancária nos autos de ação de superendividamento.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. O julgamento versa sobre: (i) preliminar de nulidade da decisão agravada por ausência de fundamentação; (ii) possibilidade de concessão de tutela de urgência em ação de superendividamento antes da realização da audiência de conciliação; (iii) presença dos requisitos do art. 300 do CPC; (iv) aplicação da Lei n.º 14.181/2021 e afastamento do Tema 1085 do STJ; (v) controle difuso de constitucionalidade do Decreto n.º 11.567/2023.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Decisão recorrida suficientemente fundamentada, conforme o disposto nos arts. 93, IX, da CF e 11 do CPC, e não é genérica, tampouco deixou de analisar ou fundamentar as razões para deferir parcialmente a tutela de urgência.
4. Artigo 300 do CPC. São requisitos para a concessão da tutela de urgência, a probabilidade do direito alegado pela parte e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
5. Os descontos referentes aos contratos firmados após a edição da lei n.º 14.131/21 não devem superar o percentual de 35% dos proventos auferidos pelo consumidor, acrescidos de mais 5% se existirem descontos oriundos de cartão de crédito.
6. Caso no qual a parte autora refere a existência de dívidas, que comprometem 70% dos seus vencimentos mensais. Evidenciada suficientemente a probabilidade do direito.
7. Possível a limitação dos descontos também em conta-corrente, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana.
8. Descontos diretamente em contracheque e conta-corrente que poderão implicar em prejuízo a subsistência da parte autora. Perigo de dano demonstrado.
9. Afastamento do Decreto 11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade, que vem sendo aceito pela presente Corte. Ademais, a presente Câmara vem adotando entendimento de que se mostra inaplicável ao caso o disposto no Decreto n° 11.150/2022 e atualizações, o qual restringe a aplicação da Lei do Superendividamento, representando um retrocesso aos direitos assegurados pela Lei n° 14.181/2021.
10. Ausência de risco de irreversibilidade da medida, a qual pode ser facilmente revertida em caso de improcedência dos pedidos postos na petição inicial.
IV. DISPOSITIVO E TESE
11. Recurso desprovido.
12. Teses de julgamento: 1.
São requisitos para a concessão da tutela de urgência, a probabilidade do direito alegado pela parte (fumus boni iuris) e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (periculum in mora); 2. Os descontos referentes aos contratos firmados após a edição da lei n.º 14.131/21 não devem superar o percentual de 35% dos proventos auferidos pelo consumidor, acrescidos de mais 5% se existirem descontos oriundos de cartão de crédito; 3. Possível a limitação dos descontos em conta-corrente, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana; 4. Possibilidade de afastamento do Decreto 11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade.
Dispositivos relevantes citados:
CF/88, art. 93, IX.
CPC, art. 300, 932 e 11.
Lei 14.181/2021, art. 54-A.
Decreto 11.567/2023.
Decreto n° 11.150/2022.
Lei n° 14.181/2021.
Jurisprudência relevante citada
:
TJRS, Agravo de Instrumento, n.º 51742377820248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabiana Zilles, Julgado em: 03-07-2024; Agravo de Instrumento, n.º 53423927820238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 21-06-2024; Agravo de Instrumento, n.º 52339407120238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 07-12-2023; Agravo de Instrumento, n.º 51172652520238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 25-09-2023; Agravo de Instrumento, n.º 50185816520238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 21-07-2023; Agravo de Instrumento, n.º 53105273720238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 23-02-2024; Agravo de Instrumento, n.º 51940511320238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 07-12-2023; Agravo de Instrumento, n.º 53694277620248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 19-12-2024; Agravo de Instrumento, n.º 51086700320248217000, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Vinícius Andrade Jappur, Julgado em: 13-07-2024; Agravo de Instrumento, n.º 50946362320248217000, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 23-06-2024; Agravo de Instrumento, n.º 53609267020238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 19-04-2024; Agravo de Instrumento, n.º 51001842920248217000, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Paula Dalbosco, Julgado em: 23-07-2024; Agravo de Instrumento, Nº 53609267020238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 19-04-2024; Agravo de Instrumento, Nº 51001842920248217000, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Paula Dalbosco.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra decisão (
evento 12, DESPADEC1
) proferida pelo Juízo Projeto de Gestão de Superendividamento, nos autos do processo n.º 5004853-86.2025.8.21.0015, que deferiu tutela provisória de urgência para limitar os descontos realizados em face da parte autora, ora agravada, bem como determinou que os réus se abstenham de incluir a parte agravada em órgãos restritivos de crédito.
O agravante sustenta, preliminarmente, a nulidade da decisão por ausência de fundamentação, em ofensa aos artigos 93, IX, da Constituição Federal e 489, §1º, III, do CPC, diante da falta de análise do caso concreto. Alega que a decisão recorrida é genérica e impede o exercício regular do contraditório e da ampla defesa. No mérito, argumenta que os negócios jurídicos pactuados foram com autenticação por
selfi
e, não havendo irregularidade. Apontou que, em 05/07/2022, a Parte Agravada recebeu em sua conta bancária depósito no valor de R$ 9.199,48, referentes ao saque fácil. Afirmou que a parte agravada não apresentou os contratos cuja repactuação é pretendida e tampouco o plano de repactuação. Alegou que o recorrido, quando da contratação dos produtos, estava ciente de qual o valor que seria descontado na folha de pagamento e também estava ciente de que o não pagamento integral da fatura do cartão de benefícios permitiria que houvesse o desconto do pagamento mínimo no seu contracheque. Argumentou que não oferece empréstimos consignados e sim cartão de benefícios, cuja regulamentação do percentual de margem é dada pelo artigo 16, § 1º, do Decreto Estadual nº 57.241, de 4 de outubro de 2023, o qual é esclusivamente utilizado por si. Declarou que inexiste descumprimento do limite da margem consignáve, pois respeitado o percentual máximo de 5%. Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, no mérito, o provimento do agravo para reformar a decisão agravada.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.
POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO MONOCRÁTICO:
Nos termos do artigo 932, VIII, do CPC, incumbe ao relator “
exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal
”.
No mesmo sentido, o inciso XXXVI do artigo 206 do RITJRS autoriza ao Relator negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca da matéria em discussão no âmbito do STF, do STJ, e do próprio Tribunal:
Art. 206. Compete ao Relator:
(...)
XXXVI - negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal;
(...)
Neste contexto, é possível, na hipótese, pronunciamento monocrático, porquanto a matéria objeto da discussão já se encontra com julgamentos assentados na jurisprudência da 19ª Câmara Cível.
ADMISSIBILIDADE RECURSAL:
O recurso é o adequado à hipótese, na forma do art. 1.015, I, do CPC, versando sobre decisão que deferiu tutela de urgência.
É tempestivo.
MÉRITO RECURSAL:
O recurso não merece prosperar.
Rejeito a preliminar de nulidade da decisão agravada por suposta falta de fundamentação.
A decisão recorrida está suficientemente fundamentada, conforme o disposto nos arts. 93, IX, da CF e 11 do CPC:
Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
(...)
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
(...)
-------------------
Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.
(...)
No caso, a decisão não é genérica, tampouco deixou de analisar ou fundamentar as razões para deferir parcialmente a tutela de urgência.
Veja-se que referiu, inclusive, documentação específica do caso contida nos autos, como extratos bancários e contracheques apresentados pela parte autora:
"(...)
CASO CONCRETO:
De acordo com os documentos apresentados pela parte demandante (
evento 10, CHEQ2
,
evento 10, EXTRBANC3
,
evento 10, EXTRBANC4
,
evento 1, CHEQ5
,
evento 1, EXTRBANC6
), entendo que o requerimento de tutela de urgência merece acolhimento, pois a demora no recebimento da citação e consequente espera na designação de audiência de conciliação não pode atuar em prejuízo à parte demandante.
Além disso, os argumentos expostos pela parte autora (analisados em conjunto com a prova documental) revelam-se coerentes e, em sede de cognição sumária, demonstram a probabilidade do direito afirmado, pois a continuidade dos descontos, na proporção efetuada atualmente prejudica a sua própria subsistência, conforme demonstro a seguir:
Dos descontos em folha de pagamento e conta-corrente
Conforme os documentos anexados, observo que a parte demandante contratou empréstimos com modalidade de pagamento mediante desconto direto em folha de pagamento, bem como em conta-corrente (
evento 10, CHEQ2
,
evento 10, EXTRBANC3
,
evento 10, EXTRBANC4
,
evento 1, CHEQ5
,
evento 1, EXTRBANC6
).
A Lei n. 10.820/2003 trouxe o patamar dos descontos em folha de pagamento ao montante de 35% (trinta e cinco por cento). Cabe destacar que, nos termos do Art. 1º, §1º da Lei 10.820/2003, dentre o limite de 35% (trinta e cinco por cento) estipulado para o desconto em folha de pagamento, 5% (cinco por cento) deveriam ser destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Tais limites restaram alterados, acrescendo-se 5% aos percentuais máximos para contratação até então estipulados, consoante a Lei n. 14.131/2021
1
, a qual converteu a Medida Provisória 1.006/2020, autorizando-se, assim, consignações de até 40% quando existente contratação de cartão de crédito:
Art. 1º Até 31 de dezembro de 2021, o percentual máximo de consignação nas hipóteses previstas no
inciso VI do
caput do art. 115 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991
, no
§ 1º do art. 1º
e no
§ 5º do art. 6º da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003
, e no
§ 2º do art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
, bem como em outras leis que vierem a sucedê-las no tratamento da matéria, será de 40% (quarenta por cento), dos quais 5% (cinco por cento) serão destinados exclusivamente para:
I - amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou
II - utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
(...)"
Neste sentido, em casos análogos ao aqui analisados, precedentes da 19ª Câmara Cível:
DIREITO DO CONSUMIDOR.
AGRAVO
DE INSTRUMENTO.
SUPERENDIVIDAMENTO
. TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME:
Agravo
de instrumento interposto por instituição financeira contra decisão proferida no âmbito de ação de repactuação de dívidas, ajuizada por consumidor em situação de possível
superendividamento
. A decisão
agravada
deferiu tutela de urgência para limitar os descontos incidentes sobre os rendimentos do autor ao patamar legal, vedar a inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes e determinar a designação de audiência conciliatória, afastando a aplicação do Tema 1085 do STJ. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: I. Preliminar de
nulidade
por ausência de
fundamentação
da decisão
agravada
; II. Existência ou não de situação caracterizadora de
superendividamento
; III. Legalidade da limitação dos descontos incidentes sobre proventos mensais; IV. Possibilidade de afastamento do Tema 1085/STJ diante do risco à subsistência do consumidor; V. Alegação de controle de constitucionalidade indevido do Decreto n.º 11.567/2023. III. RAZÕES DE DECIDIR: Rejeitada a preliminar de
nulidade
, a decisão recorrida encontra-se suficientemente
fundamentada
, com análise dos documentos específicos dos autos, como contratos e extratos bancários. Em relação ao mérito, reconhece-se a plausibilidade do direito invocado pelo consumidor à luz da Lei nº 14.181/2021, que visa proteger a dignidade da pessoa humana em casos de comprometimento excessivo da renda. A limitação dos descontos em 35% dos rendimentos está em consonância com a legislação vigente e jurisprudência consolidada, não havendo afronta ao Tema 1085/STJ, pois a controvérsia não reside na validade das cláusulas contratuais, mas em sua execução frente ao mínimo existencial. Inexiste controle de constitucionalidade do Decreto nº 11.567/2023, pois a decisão apenas reconheceu a necessidade de compatibilização com os direitos
fundamentais
, especialmente o direito à dignidade e à subsistência. A ausência de perigo irreparável à instituição financeira também justifica a manutenção da medida. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido, com a manutenção integral da decisão
agravada
que deferiu a tutela provisória de urgência. Tese de julgamento: “1. A limitação judicial dos descontos incidentes sobre os rendimentos de pessoa natural em situação de
superendividamento
encontra amparo na Lei nº 14.181/2021, mesmo diante da existência de cláusulas contratuais autorizando descontos em conta corrente. 2. A preservação do mínimo existencial deve prevalecer frente à execução literal de cláusulas contratuais que possam comprometer a dignidade do consumidor.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 93, IX; CPC, arts. 300 e 489, § 1º, III; Lei nº 10.820/2003, art. 1º, § 1º; Lei nº 14.131/2021, art. 1º; Lei nº 14.181/2021; Decreto nº 11.567/2023. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RMS 30.821/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, j. 27.11.2008; STJ, Tema 1085; TJRS, AI nº 5046175-20.2020.8.21.7000, Rel. Des. Jucelana Lurdes Pereira dos Santos, j. 28.02.2024; TJRS, AI nº 5243971-19.2024.8.21.7000, Rel. Des. Vivian Cristina Angonese Spengler, j. 05.12.2024.(
Agravo
de Instrumento, Nº 51026635820258217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Fusquine Goncalves, Julgado em: 24-04-2025)
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. PRELIMINAR. 1.
NULIDADE
DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO
. A BEM LANÇADA DECISÃO RECORRIDA NÃO PADECE DO VÍCIO ALEGADO PELO AGRAVANTE. A DECISÃO É BEM
FUNDAMENTADA
E POSSUI ADERÊNCIA AO CASO CONCRETO, TENDO DECLARADO A SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
DO AUTOR-
AGRAVADO
COM BASE NOS DOCUMENTOS ACOSTADOS AOS AUTOS. PRELIMINAR REJEITADA. 2.
NULIDADE
DA DECISÃO RECORRIDA NÃO CONFIGURADA.O PROCESSO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS, REGIDO PELA LEI FEDERAL N° 14.181/2021 EXIGE A REALIZAÇÃO DE PRÉVIA FASE DE CONCILIAÇÃO, QUE PODE SE DAR NA VIA JUDICIAL (ART. 104-A, DO CDC) OU NA VIA EXTRAJUDICIAL (ART. 104-C, DO CDC). CASO CONCRETO EM QUE O CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
OPTOU PELO AJUIZAMENTO DA DEMANDA E REALIZAÇÃO DA FASE CONCILIATÓRIA NA VIA JUDICIAL. AUSÊNCIA DE QUALQUER RESSALVA NO PROCEDIMENTO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS, SENDO POSSÍVEL A REALIZAÇÃO E A APRECIAÇÃO PELO JUÍZO, DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA SEDIADO NOS TERMOS DO ART. 300 DO CPC.AUSÊNCIA DE
NULIDADE
DA DECISÃO RECORRIDA NO PONTO. MÉRITO. 1. O
SUPERENDIVIDAMENTO
RESTA CONFIGURADO QUANDO RECONHECIDA A IMPOSSIBILIDADE DE O CONSUMIDOR DE BOA-FÉ ADIMPLIR TODAS AS DÍVIDAS QUE CONTRAIU, SEM COMPROMETER O MÍNIMO EXISTENCIAL ASSEGURADO PARA SUA SOBREVIVÊNCIA. LEI N.º 14.181/2021. 2. CASO CONCRETO EM QUE A SOMA DOS DESCONTOS LEGAIS, DOS DESCONTOS CONSIGNADOS AUTORIZADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DOS LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE BANCÁRIA ESGOTAM OS RECURSOS MENSAIS PERCEBIDOS PELO AUTOR E IMPEDEM QUE O AUTOR-
AGRAVADO
PROVEJA SUA SUBSISTÊNCIA, CARACTERIZANDO INEQUÍVOCA SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. 3. A LEI FEDERAL 14.181/2021 INTRODUZ NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR FERRAMENTAS PARA PREVENÇÃO E TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA QUE, NO CASO CONCRETO, E COM SUPORTE NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE, VISA ASSEGURAR A DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E FAMILIAR DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
. GARANTIA DE ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS PARA O CUSTEIO DAS DESPESAS MAIS ELEMENTARES DA SUBSISTÊNCIA, TAIS COMO ALIMENTAÇÃO HABITAÇÃO E SAÚDE. 4. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DE LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE NO PERCENTUAL DE 35% INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO BRUTA DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
, DESCONTADOS APENAS OS LANÇAMENTOS RELATIVOS À PREVIDÊNCIA OFICIAL E IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, POIS AMPARADA EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E GARANTIA DE ACESSO AO MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR
SUPERENDIVIDADO
. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. 5. PEDIDO DE ALONGAMENTO DA DÍVIDA.NO PROCESSO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS, UM DOS PRINCIPAIS OBJETIVOS É A REUNIÃO DOS CREDORES PARA A CONCILIAÇÃO PRÉVIA, OPORTUNIZANDO A REPACTUAÇÃO VOLUNTÁRIA DOS DÉBITOS.O DEFERIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA DE LIMITAÇÃO DAS PARCELAS CONTRATADAS ASSEGURA A CONTINUIDADE, AINDA QUE LIMITADA, DA EXECUÇÃO DE TODOS OS CONTRATOS SUBMETIDOS AO PROCESSO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. DETERMINAÇÃO DE REALINHAMENTO TOTAL DOS CONTRATOS ANTES DE REALIZADA A FASE DE CONCILIAÇÃO SE REVELA PREMATURA. RECURSO DESPROVIDO.(
Agravo
de Instrumento, Nº 53729503320238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 09-08-2024)
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. PRELIMINAR DE
NULIDADE
DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO
. Consoante o princípio da motivação todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário devem ser necessariamente motivados, sob pena de
nulidade
(art. 93, IX, da CF e art. 489 do CPC). No caso concreto, a decisão que analisou a tutela de urgência está suficientemente
fundamentada
. Preliminar rejeitada.
SUPERENDIVIDAMENTO
. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. A probabilidade do direito alegado associada ao perigo de dano ou ao risco ao resultado útil do processo são requisitos que devem ser preenchidos pelo consumidor em ruína para o deferimento da tutela provisória de urgência em ação de repactuação de dívidas por
superendividamento
. No caso concreto, com base nos elementos presentes na petição inicial acerca das dívidas de consumo, sobretudo na discriminação dos empréstimos consignados em folha de pagamento e dos empréstimos com débito em conta-corrente, além das operações de crédito assumidas decorrentes da relação de consumo (cheque especial e cartão de crédito) e de serviços de prestação continuada, em cotejo com o montante líquido percebido pela parte-autora, observa-se que há prejuízo à garantia do mínimo existencial e, por conseguinte, a subsistência do consumidor. Decisão mantida.
AGRAVO
DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(
Agravo
de Instrumento, Nº 51190490320248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 26-07-2024)
Afasta-se, portanto, a alegada nulidade.
Dito isso, o deferimento de tutela provisória de urgência é medida excepcional, motivo pelo qual esta deve ser utilizada com a devida cautela, em observância aos requisitos do artigo 300 do CPC, que dispõe:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1
o
Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Assim, são requisitos para a concessão da tutela de urgência, a probabilidade do direito alegado pela parte (
fumus boni iuris
) e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (
periculum in mora
).
Nesse sentido, colaciono:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO).
TUTELA
DE
URGÊNCIA
DEFERIDA PARA DETERMINAR A
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
, BEM COMO QUE A REQUERIDA SE ABSTENHA DE INSCREVER O AUTOR NOS CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. 1. ARTIGO 300 DO CPC. SÃO REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA
TUTELA
DE
URGÊNCIA
, A PROBABILIDADE DO DIREITO ALEGADO PELA PARTE (FUMUS BONI IURIS) E O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO (PERICULUM IN MORA). 2. CONFORME ENTENDIMENTO ADOTADO PELA PRESENTE CÂMARA CÍVEL, OS
DESCONTOS
REFERENTES AOS CONTRATOS FIRMADOS APÓS A EDIÇÃO DA LEI N.º 14.131/21 NÃO DEVEM SUPERAR O PERCENTUAL DE 35% DOS PROVENTOS AUFERIDOS PELO CONSUMIDOR. 3. CASO NO QUAL A PARTE AUTORA REFERE A EXISTÊNCIA DE DÍVIDAS, QUE COMPROMETEM 100% DOS SEUS VENCIMENTOS MENSAIS. EVIDENCIADA SUFICIENTEMENTE A PROBABILIDADE DO DIREITO. 4.
DESCONTOS
DIRETAMENTE EM CONTRACHEQUE QUE PODERÃO IMPLICAR EM PREJUÍZO A SUBSISTÊNCIA DA PARTE AUTORA. REGISTRO DE SEU NOME EM CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO PODERÁ ACARRETAR PREJUÍZOS, PREJUDICANDO SEU CRÉDITO E, CONSEQUENTEMENTE, SUA SUBSISTÊNCIA. PERIGO DE DANO DEMONSTRADO. 5. AUSÊNCIA DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. POSSIBILIDADE DE
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
TAMBÉM EM CONTA-CORRENTE. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. MANUTENÇÃO DA
TUTELA
DE
URGÊNCIA
DEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 51742377820248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabiana Zilles, Julgado em: 03-07-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. 1. O SUPERENDIVIDAMENTO RESTA CONFIGURADO QUANDO RECONHECIDA A IMPOSSIBILIDADE DE O CONSUMIDOR DE BOA-FÉ ADIMPLIR TODAS AS DÍVIDAS QUE CONTRAIU, SEM COMPROMETER O MÍNIMO EXISTENCIAL ASSEGURADO PARA SUA SOBREVIVÊNCIA. LEI N.º 14.181/2021. 2. CASO CONCRETO EM QUE A SOMA DOS
DESCONTOS
LEGAIS, DOS
DESCONTOS
CONSIGNADOS AUTORIZADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DOS LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE BANCÁRIA ULTRAPASSAM O
LIMITE
RAZOÁVEL PARA QUE A AUTORA-AGRAVADA MANTENHA SUA SUBSISTÊNCIA, CARACTERIZANDO INEQUÍVOCA SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. 3. A LEI FEDERAL 14.181/2021 INTRODUZ NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR FERRAMENTAS PARA PREVENÇÃO E TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE SUPERENDIVIDAMENTO. CONCESSÃO DA
TUTELA
DE
URGÊNCIA
QUE, NO CASO CONCRETO, E COM SUPORTE NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE, VISA ASSEGURAR A DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E FAMILIAR DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO. GARANTIA DE ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS PARA O CUSTEIO DAS DESPESAS MAIS ELEMENTARES DA SUBSISTÊNCIA, TAIS COMO ALIMENTAÇÃO HABITAÇÃO E SAÚDE. 4.
LIMITAÇÃO
DE
DESCONTOS
CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DE LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE NO PERCENTUAL DE 35% INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO BRUTA DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO,
DESCONTADOS
APENAS OS LANÇAMENTOS RELATIVOS À PREVIDÊNCIA OFICIAL E IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, POIS AMPARADA EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E GARANTIA DE ACESSO AO MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR SUPERENDIVIDADO. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. 5. ASTREINTES.O ART. 537 DO CPC AUTORIZA A FIXAÇÃO DE MULTA COERCITIVA PARA FORÇAR O DEVEDOR A CUMPRIR A OBRIGAÇÃO DE FAZER OU DE NÃO FAZER, MESMO NA FASE DE CONHECIMENTO.FIXAÇÃO DE MULTA POR
DESCONTO
INDEVIDO, COM
LIMITAÇÃO
DO PRAZO DE INCIDÊNCIA, ASSEGURA A PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA PENA DE MULTA APLICADA. MANUTENÇÃO DA MULTA, NOS TERMOS DA DECISÃO RECORRIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 53423927820238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 21-06-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. SUSPENSÃO DOS DESCONTOS. A probabilidade do direito alegado associada ao perigo de dano ou ao risco ao resultado útil do processo são requisitos que devem ser preenchidos para o deferimento da tutela provisória de urgência. Na hipótese, os requisitos legais para o deferimento da tutela de urgência não foram suficientemente preenchidos, especialmente porque a parte-autora autorizou os descontos há longa data, discutindo-se apenas a modalidade da contratação, se cartão de crédito consignado ou se empréstimo consignado. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 52339407120238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 07-12-2023)
No caso dos autos, os requisitos legais para o deferimento da tutela de urgência encontram-se preenchidos.
A Lei 14.181/2021 dispõe, em que artigo 54-A, que:
Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.
§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
§ 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.
§ 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.’
Depreende-se, portanto, que o superendividamento consiste na impossibilidade manifesta de o consumidor - pessoa natural e de boa-fé - pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial.
Ainda, conforme entendimento adotado pela presente Câmara Cível, os descontos referentes aos contratos firmados após a edição da Lei n.º 14.131/21 não devem superar o percentual de 35% dos proventos auferidos pelo consumidor, acrescidos de mais 5% se existirem descontos oriundos de cartão de crédito.
Ilustro:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER PARA LIMITAR
DESCONTOS
EM CONTRACHEQUE C/C EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECEDENTE. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. ART. 300 DO CPC. MULTA COERCITIVA.
DESCONTOS
NA CONTA CORRENTE. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. DECISÃO HOSTILIZADA QUE NÃO VERSOU SOBRE A QUESTÃO. MULTA COERCITIVA. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA FORMA DE INCIDÊNCIA DA MULTA, DE "DIÁRIA", PARA "POR EVENTO DE DESCUMPRIMENTO". AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL, PORQUANTO A DECISÃO JÁ FIXOU A MULTA NA MODALIDADE DE COBRANÇA POR EVENTO DE DESCUMPRIMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. EXTRAI-SE DA INTERPRETAÇÃO DO ART. 300 DO CPC QUE A TUTELA DE URGÊNCIA SERÁ CONCEDIDA QUANDO HOUVER ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM A PROBABILIDADE DO DIREITO E O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. VIGORA O DIREITO DO DEVEDOR DE LIMITAÇÃO DOS
DESCONTOS
CONSIGNADOS. NO CASO EM APREÇO, OS
DESCONTOS
SUPERAM A MARGEM CONSIGNÁVEL. DIREITO À LIMITAÇÃO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUANTO AO PONTO. CONTRATOS APÓS A
LEI
14.131/21
A LIMITAÇÃO DE 30% DE
DESCONTOS
CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PREVISÃO NA
LEI
FEDERAL
Nº
10.820/03 FOI ALTERADA PELA
LEI
FEDERAL N.º
14.131/21
, PASSANDO AO PERCENTUAL DE 35% PARA OS CONTRATOS FIRMADOS APÓS A EDIÇÃO DA NOVA
LEI
. CASO EM QUE HÁ CONTRATOS FIRMADOS ANTES E DEPOIS DA VIGÊNCIA DA NOVA
LEI
. NO ENTANTO, A DECISÃO HOSTILIZADA LIMITOU OS
DESCONTOS
CONSIGNADOS EM 30% PARA TODOS OS CASOS. DECISÃO MODIFICADA QUANTO AO PONTO. MULTA COERCITIVA. MULTA FIXADA PARA A HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO. POSSÍVEL A COMINAÇÃO, A FIM DE CONFERIR EFETIVIDADE À MEDIDA. PRECEDENTE. RECURSO PROVIDO EM PARTE, NA PARTE CONHECIDA.(Agravo de Instrumento,
Nº
51172652520238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 25-09-2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA DE LIMITAÇÃO DE
DESCONTO
. LIMITAÇÃO DE
DESCONTO
EM FOLHA E DÉBITO EM CONTA. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA EM 35%. DECISÃO REFORMADA EM PARTE.
DESCONTOS
EM FOLHA DE PAGAMENTO: O aumento do limite para 35% às operações de empréstimo pessoal consignado e de até 5% às operações de cartão de crédito para
desconto
em folha de pagamento somente tem aplicabilidade aos contratos firmados após promulgação da
Lei
n.
14.131/21
. Há que se observar o momento em que o mútuo foi firmado, pois prevalece a regra da
Lei
Federal
nº
10.820/03, ou seja, o
desconto
não pode exceder 30% do valor do benefício. Recurso provido no ponto para limitar os
descontos
em folha em 30% e não em 35% como constou na decisão recorrida. DÉBITO EM CONTA CORRENTE: Afastou-se a equiparação dos
descontos
realizados em folha de pagamento com os efetuados em conta corrente, uma vez que estes são passíveis de revogação a qualquer momento pelo correntista, segundo orientação do STJ. Não se aplica por analogia a
Lei
nº
10.820/2003, a qual se refere ao percentual de limitação dos
descontos
em folha de pagamento tão somente. Especificamente, não há recurso da parte ré com relação à decisão que deferiu a tutela de limitação em 35%. Contudo, não se mostra viável alterar a decisão para que os débitos em conta sejam limitados em 30%, quando sequer poderia ser limitado em 35%. Agravo desprovido no tópico. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.(Agravo de Instrumento,
Nº
50185816520238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 21-07-2023)
No caso dos autos, é incontroversa a relação jurídica entre as partes.
Ademais, verifico a existência de perigo de dano, diante dos descontos e cobranças, excessivas frente aos limites legais, em princípio, realizadas pelo agravante.
Isso porque, considerando o valor dos rendimentos da parte autora (R$ 9.005,50 -
evento 10, CHEQ2
- antes, ainda, dos descontos legais), bem como os descontos em folha que possui, por empréstimos, no valor de R$ 3.754,12, e as cobranças diretamente em conta bancária, R$ 914,10, R$ 908,67 e 937,91 (dois empréstimos e juros sobre cheque especial (
evento 10, EXTRBANC3
), que comprometem mais de 70% de sua renda bruta, a manutenção da situação de tais descontos, no patamar contratado, implicará em prejuízos à sua subsistência. Saliento que a limitação dos descontos é possível também em relação aos débitos diretos em conta corrente, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido, os precedentes da presente Câmara Cível:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. 1. O SUPERENDIVIDAMENTO RESTA CONFIGURADO QUANDO RECONHECIDA A IMPOSSIBILIDADE DE O CONSUMIDOR DE BOA-FÉ ADIMPLIR TODAS AS DÍVIDAS QUE CONTRAIU, SEM COMPROMETER O MÍNIMO EXISTENCIAL ASSEGURADO PARA SUA SOBREVIVÊNCIA. LEI N.º 14.181/2021. 2. CASO CONCRETO EM QUE A SOMA DOS DESCONTOS LEGAIS, DOS DESCONTOS CONSIGNADOS AUTORIZADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DOS LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE BANCÁRIA ULTRAPASSAM O LIMITE RAZOÁVEL PARA QUE A AUTORA-AGRAVADA MANTENHA SUA SUBSISTÊNCIA, CARACTERIZANDO INEQUÍVOCA SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. 3. A LEI FEDERAL 14.181/2021 INTRODUZ NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR FERRAMENTAS PARA PREVENÇÃO E TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE SUPERENDIVIDAMENTO. CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA QUE, NO CASO CONCRETO, E COM SUPORTE NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE, VISA ASSEGURAR A DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E FAMILIAR DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO. GARANTIA DE ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS PARA O CUSTEIO DAS DESPESAS MAIS ELEMENTARES DA SUBSISTÊNCIA, TAIS COMO ALIMENTAÇÃO HABITAÇÃO E SAÚDE. 4. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DE LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE NO PERCENTUAL DE 35% INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO BRUTA DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO, DESCONTADOS APENAS OS LANÇAMENTOS RELATIVOS À PREVIDÊNCIA OFICIAL E IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, POIS AMPARADA EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E GARANTIA DE ACESSO AO MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR SUPERENDIVIDADO. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. 5. ASTREINTES.O ART. 537 DO CPC AUTORIZA A FIXAÇÃO DE MULTA COERCITIVA PARA FORÇAR O DEVEDOR A CUMPRIR A OBRIGAÇÃO DE FAZER OU DE NÃO FAZER, MESMO NA FASE DE CONHECIMENTO.FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA, COM LIMITAÇÃO DO PRAZO DE INCIDÊNCIA, ASSEGURA A PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA PENA DE MULTA APLICADA. MANUTENÇÃO DA MULTA, NOS TERMOS DA DECISÃO RECORRIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 53105273720238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 23-02-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. DÉBITO EM CONTA-CORRENTE. Em tese, são lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. REsp n. 1.863.973 (Tema 1085-STJ). RETENÇÃO INTEGRAL DO SALÁRIO. Por outro lado, resulta abusiva a retenção integral do salário do correntista com o propósito de honrar débito com a instituição financeira. Precedentes do STJ e desta Corte estadual. CASO CONCRETO. No caso, para pagamento dos débitos decorrentes de contratações pretéritas, o Banco agravante reteve, em dois meses consecutivos, a integralidade do salário da autora logo que creditado em sua conta corrente. Ora, os vencimentos do servidor servem para assegurar a sua própria subsistência e a da sua família. Veja-se que - malgrado o reconhecimento da inaplicabilidade , por analogia, da Lei Federal n. 10.820/2003 para as hipóteses de descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente -. no caso, especificamente, a pretensão de limitação dos descontos vem amparada na justa ponderação de interesses que, inobstante a ausência de previsão expressa no direito pátrio, traduz concreção aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana. Com efeito, a garantia primordial concernente à dignidade da pessoa, associada à preservação do mínimo existencial, prevalece sobre o direito da instituição financeira na obtenção de seu crédito, mormente quando - no caso concreto e no que é possível compreender a partir de uma análise perfunctória -, nada vem aos autos capaz de infirmar suficientemente os fundamentos da decisão agravada. Assim, pertinente sua manutenção quanto à limitação dos descontos no percentual máximo de 30%. MULTA (ASTREINTE). Tratando-se de obrigação de fazer e de não fazer, resulta viável juridicamente a imposição de multa (art. 537 do CPC/15). No caso concreto, o valor das astreintes fixado pelo juízo de origem afigura-se suficiente e compatível com a obrigação determinada. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 51940511320238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 07-12-2023)
Consigno que o afastamento do Decreto 11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade, vem sendo aceito pela presente Corte, conforme colaciono:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1º, III, DO CPC: A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. POSSIBILIDADE DO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTES DA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: Uma vez instaurado o processo, não há obstáculo legal ao deferimento da tutelas antecipatória que, no caso concreto, se deu como meio de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional e a proteção do consumidor em situação de
superendividamento
. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA: A decisão agravada afastou a incidência do Decreto n.11.567/2023, em
controle
difuso
de constitucionalidade, e se valeu das disposições da Lei n. 10.820/2003 e da Lei n. 14.131/2021 para fundamentar que a ocorrência de descontos em patamar superior a 35% da renda do consumidor comprometeria o seu mínimo existencial. Esse critério vem sendo aceito por esta Câmara no âmbito das ações de repactuação de dívidas, pelo que está presente a probabilidade do direito e a urgência para justificar a concessão da medida, ainda que a parte agravada tenha renda líquida superior a R$ 600,00. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS PARA SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL: Ainda que o empréstimo tenha sido contratado por servidor público estadual, possível a limitação dos descontos no patamar de 35%, considerando a ausência de antinomia entre a norma Estadual e Federal, bem como por se tratar de decisão proferida no âmbito de ação de repactuação de dívidas por
superendividamento
, a qual clama pela observância de critérios específicos e possibilita mesmo a imposição de um plano judicial compulsório caso necessário. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EFETUADOS EM CONTA-CORRENTE: O Tema 1085/STJ não se aplica aos contratos discutidos no âmbito de ação de repactuação de dívidas por
superendividamento
, a qual clama pela observância de critérios específicos e possibilita mesmo a imposição de um plano judicial compulsório caso necessário, de modo que é possível a limitação dos descontos efetuados na conta-corrente da parte agravada. IMPUGNAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA: O pedido para revogar a gratuidade de justiça deferida ao agravado não comporta conhecimento, sob pena de violação ao duplo grau de jurisdição, pois tal pleito não foi objeto de apreciação pelo juízo a quo. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 53694277620248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 19-12-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS COM BASE NA LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO
. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO CONTRATADOS COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA AFASTADO. AUSENTE PREJUÍZO, NÃO HÁ FALAR EM NULIDADE. DECRETO N. 11.567/2023.
CONTROLE
DIFUSO
DE CONSTITUCIONALIDADE. PODER DE CAUTELA DO MAGISTRADO QUANDO SE DEPARA COM SITUAÇÃO QUE PODERÁ SE TORNAR IRREVERSÍVEL SE NÃO ESTANCADA DESDE O INÍCIO, QUANDO ESTA DENOTAR PODER DE CONCRETIZAR DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO, SEJA IMEDIATO, SEJA EM FUTURO PRÓXIMO. ANTE UMA SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
, DEVE SER MANTIDA A DECISÃO, EM RAZÃO DA PROBABILIDADE DO DIREITO DA PARTE AUTORA. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO À CONCESSÃO DE MEDIDA ANTECIPATÓRIA, AINDA QUE SE DESDOBREM EM DUAS FASES AS AÇÕES DE
SUPERENDIVIDAMENTO
, PRINCIPALMENTE QUANDO ESTA SE MOSTRAR IMPRESCINDÍVEL PARA GARANTIR O MÍNIMO NECESSÁRIO À SOBREVIVÊNCIA DA PARTE AUTORA, DEVENDO SER OBSERVADO O PRINCÍPIO NORTEADOR DA NORMA ACRESCENTADA AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, QUE TEM POR ESCOPO A PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS BÁSICOS DOS CIDADÃOS. APESAR DA LIBERDADE DE CONTRATAR, CONSIDERANDO-SE A NECESSÁRIA GARANTIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA PARTE DEMANDANTE, EM CONSONÂNCIA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, IMPOSITIVA A LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS. MÉRITO. NÃO OBSTANTE OS LIMITES ESTABELECIDOS PELA LEI N.º 14.131/2022 (QUE ALTEROU A REDAÇÃO DA LEI N.º 10.820/2003), NO CASO, SENDO A DEMANDANTE SERVIDORA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE ALVORADA, O DECRETO Nº 119/2020 (ART. 5º, §§ 1º E 2º), AUTORIZOU A CONSIGNAÇÃO DE 50% DE SUA REMUNERAÇÃO MENSAL (VANTAGENS PERMANENTES), SENDO 30% REFERENTE A EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO (REMUNERAÇÃO BRUTA) E 10% ORIUNDOS DE CARTÕES DE CRÉDITO (REMUNERAÇÃO BRUTA), LIMITES A SEREM OBSERVADOS, EM RELAÇÃO AOS DESCONTOS EFETUADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO PELA MUNICIPALIDADE, QUANTO AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO FIRMADOS PELA PARTE AUTORA COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA AGRAVANTE. TEMA 1085 DO STJ. POSSIBILIDADE DE SEREM DESCONTADAS PARCELAS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS COMUNS EM CONTA CORRENTE. HIPÓTESE QUE NÃO AMPARA A PARTE RECORRENTE, VISTO QUE OS CONTRATOS FIRMADOS ENTRE AS PARTES SÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO, CUJOS DESCONTOS SÃO REALIZADOS DIRETAMENTE NA REMUNERAÇÃO DA AUTORA. MULTA. ADEQUAÇÃO DO QUANTUM E DA PERIODICIDADE ESTABELECIDAS NA DECISÃO RECORRIDA. ONEROSIDADE EXCESSIVA NÃO VERIFICADA. SANÇÃO QUE SOMENTE OCORRERÁ EM CASO DE EVENTUAL DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL PELA PARTE AGRAVANTE, BASTANDO QUE CUMPRA A DETERMINAÇÃO LIMINAR PARA EVITAR SUA INCIDÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 51086700320248217000, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Vinícius Andrade Jappur, Julgado em: 13-07-2024)
Ademais, a presente Câmara vem adotando entendimento de que mostra-se inaplicável ao caso o disposto no Decreto n° 11.150/2022 e atualizações, o qual restringe a aplicação da Lei do Superendividamento, representando um retrocesso aos direitos assegurados pela Lei n° 14.181/2021.
Nesse sentido, colaciono:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. PRELIMINARES: (...) 1. O
SUPERENDIVIDAMENTO
RESTA CONFIGURADO QUANDO RECONHECIDA A IMPOSSIBILIDADE DE O CONSUMIDOR DE BOA-FÉ ADIMPLIR TODAS AS DÍVIDAS QUE CONTRAIU, SEM COMPROMETER O MÍNIMO EXISTENCIAL ASSEGURADO PARA SUA SOBREVIVÊNCIA. LEI N.º 14.181/2021. 2. CASO CONCRETO EM QUE A SOMA DOS DESCONTOS CONSIGNADOS AUTORIZADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DOS LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE BANCÁRIA ULTRAPASSAM O LIMITE RAZOÁVEL PARA QUE O AUTOR-AGRAVADO MANTENHA SUA SUBSISTÊNCIA, CARACTERIZANDO INEQUÍVOCA SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. 3. A LEI FEDERAL 14.181/2021 INTRODUZ NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR FERRAMENTAS PARA PREVENÇÃO E TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA QUE, NO CASO CONCRETO, E COM SUPORTE NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE, VISA ASSEGURAR A DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E FAMILIAR DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
. GARANTIA DE ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS PARA O CUSTEIO DAS DESPESAS MAIS ELEMENTARES DA SUBSISTÊNCIA, TAIS COMO ALIMENTAÇÃO HABITAÇÃO E SAÚDE. 4. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E DE LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE NO PERCENTUAL DE 35% INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO BRUTA DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
, DESCONTADOS APENAS OS LANÇAMENTOS RELATIVOS À PREVIDÊNCIA OFICIAL E IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE, QUANDO HOUVER. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, POIS AMPARADA EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E GARANTIA DE ACESSO AO MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR
SUPERENDIVIDADO
. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. (...).(Agravo de Instrumento, Nº 50946362320248217000, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 23-06-2024)
Destaco, por fim, que não há falar em irreversibilidade da tutela concedida, considerando que com a eventual improcedência dos pedidos, os descontos poderão ser retomados pela parte requerida.
Assim, cabível a manutenção da tutela de urgência deferida pelo juízo de origem, que determinou a limitação dos descontos.
RESULTADO:
Destarte, é caso de ser desprovido o agravo de instrumento, em decisão monocrática, nos termos da fundamentação.
Intimem-se as partes da presente decisão, sendo que
a parte agravante para recolher o preparo, em 05 dias.
Tratando-se de processo eletrônico, a comunicação do Juízo de origem será realizada, de forma automática, pelo Sistema Eproc.
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