Caroline Mary Matsumoto x Caixa Econômica Federal - Cef e outros
ID: 330450376
Tribunal: TRF4
Órgão: 7ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5032949-52.2024.4.04.7000
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
LOUISE HAGE
OAB/PR XXXXXX
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BRUNO MARCELINO DE ALBUQUERQUE
OAB/SC XXXXXX
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JOÃO PAULO DE CAMPOS ECHEVERRIA
OAB/DF XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5032949-52.2024.4.04.7000/PR
AUTOR
: CAROLINE MARY MATSUMOTO
ADVOGADO(A)
: LOUISE HAGE (OAB PR042231)
RÉU
: CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA
RÉU
:…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5032949-52.2024.4.04.7000/PR
AUTOR
: CAROLINE MARY MATSUMOTO
ADVOGADO(A)
: LOUISE HAGE (OAB PR042231)
RÉU
: CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA
RÉU
: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
DESPACHO/DECISÃO
I -RELATÓRIO
1.1. Petição inicial:
Em 25 de julho de 2024,
CAROLINE MARY MATSUMOTO
deflagrou esta demanda, sob rito dos juizados, em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF e do CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA, pretendendo a declaração judicial de que ausência dos débitos alegadamente mantidos com a universidade, no valor de R$ 5963,44.
A autora postulou a condenação dos requeridos à repetição de indébito e à reparação dos danos morais que disse ter suportado. Para tanto, ela disse ter avençado um contrato de mútuo feneratício, no âmbito do FIES, com a Caixa Econômica, em 04 de março de 2021, destinado a promover o pagamento, em nome dela, das mensalidades exigidas pela universidade de medicina, cursada na Unipositivo.
Alegou ainda que, no primeiro semestre de 2021, o percentual de financiamento da mensalidade era de 77,95%. Aludido percentual, quanto ao primeiro semestre de 2024, teria sido majorado para 94,47%, com limite de R$ 60.000,00 considerando o teto máximo estipulado pelo Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil conforme art. 1º, I, da Resolução nº 54, de 12 de Junho de 2023. A requerente argumentou que a CEF financiaria o valor de R$ 60.000,00, cobrando dela as respectivas diferenças de mensalidade.
A demandante enfatizou, ademais, que ela estaria
"proibida de realizar qualquer tipo de pagamento da coparticipação para IES, bem como a segunda requerida também não pode realizar qualquer tipo de cobrança de coparticipação diretamente da requerente, a qual deve ser intermediada pelo agente financeiro (primeira requerida). Nota-se que, durante sete semestres (janeiro de 2021 até julho 2023), a requerente nunca teve qualquer tipo de problema com isso, sempre realizando os pagamentos diretamente para primeira requerida, sem qualquer tipo de cobrança por parte da segunda requerida, ou seja, desde a contratação de FIES em 2021, nunca realizou qualquer tipo de pagamento diretamente à IES, sempre para CEF conforme previsto contratualmente."
Ela disse ter sido cobrada quanto a valores que deveriam ter sido suportados pela CEF, acabando por pagá-los em favor da universidade. Aduziu que
"No dia 11/10/2023 foi informada que seria restituída dos valores pagos indevidamente para a segunda requerida mediante deposito em conta e que deveria abrir protocolo para tal fim. A requerente fez o protocolo e foi restituída em debito em conta."
Ainda segundo a autora,
"Ocorre que, ao tentar realizar a rematrícula do segundo semestre de 2024, especificamente no mês de Julho, a requerente foi surpreendida com a cobrança indevida por parte da segunda requerida no valor total de R$ 5963,44 a qual informou para aluna que a primeira requerida não teria efetuado o repasse correto dos valores referentes ao primeiro semestre de 2024 para IES, impedindo a requerente de realizar a rematrícula até o pagamento das diferenças de coparticipação diretamente à segunda requerida."
Transcrevo ainda o seguinte: "
A requerente pagou corretamente todos os valores referentes a coparticipação do primeiro semestre de 2024 diretamente para primeira requerida conforme comprovantes de pagamento em anexo, agindo com total boa-fé contratual, não podendo ser prejudicada e impedida de continuar estudando por uma falha na prestação de serviços da primeira requerida em razão dos entraves administrativos. Importante realçar que, conforme os comprovantes de pagamento e recibos juntados pela requerente, comprova-se a assiduidade no pagamento da coparticipação das mensalidades diretamente à primeira requerida, comprovando-se que a estudante jamais esteve inadimplente em relação a coparticipação do primeiro semestre de 2024."
Além disso,
"no primeiro semestre de 2024 (janeiro a junho de 2024), a primeira requerida cobrou da requerente a título de coparticipação o valor total de R$ 11.339,05, cujos valores sempre foram pagos e quitados mensalmente pela requerente conforme comprovantes em anexo. Ou seja, não poderia a segunda requerida impedir a requerente de efetuar a rematrícula pela suposta existência de débitos decorrentes da coparticipação do primeiro semestre de 2024, considerando que a aluna sempre honrou com sua obrigação contratual e pagou todos os valores cobrados pela primeira requerida a título de diferenças de mensalidades, agindo com total boa-fé. Por mais que partíssemos do pressuposto de que realmente existissem eventuais diferenças da mensalidade do primeiro semestre de 2024 (hipótese), tal responsabilidade não poderia ser imputada à requerente uma vez que decorreria de falha na prestação de serviços da primeira requerida, a qual não calculou e realizou corretamente a cobrança de tais valores da estudante, não sendo crível imputar tal responsabilidade à requerente que sempre honrou com seus deveres contratuais e nunca se negou a pagar qualquer valor a título das respectivas diferenças."
Aduziu que, eventuais
"diferenças apuradas posteriormente ao aditamento do contrato de financiamento estudantil em decorrência de entraves administrativos, cujo valor da semestralidade a ser custeado pelo aluno seria de R$ 15.060,95, montante superior ao considerado pela CEF nos repasses efetuados à IES durante o primeiro semestre de 2024, o que possivelmente gerou diferenças de coparticipação."
Discorreu sobre a reparação de danos morais, detalhou os pedidos e juntou documentos.
Postulou antecipação de tutela.
1.2. Deferimento da antecipação de tutela:
A demanda restou distribuída perante o Juízo Titular 7 VF, sendo indeferido o pedido de antecipação de tutela. No evento 16, o Juízo deferiu então a antecipação de tutela, ao apreciar embargos declaratórios opostos pela parte autora,
"acolho o pedido de reconsideração para deferir a tutela de urgência e determinar que o réu CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA realize a rematrícula da autora para o segundo semestre de 2024 do curso de Medicina, independentemente de eventuais pendências financeiras em relação ao contrato FIES nº14.1525.187.0000048-25 ou pagamento de valores complementares que entender devidos."
1.3. Contestação da Positivo:
O Centro de Estudos Superiores Positivo ltda. teceu considerações sobre o FIES,
"instituído pela Lei n.º 10.260, de 12 de julho de 2001. Com a promulgação da Lei n.º 13.530, de 07 de dezembro 2017, que alterou diversos dispositivos da Lei n.º 10.260/2001, o FIES passou por mudanças essenciais em sua estrutura a partir do 1º (primeiro) semestre de 2018 (período 2018.1), inclusive com a implementação de modalidades distintas de financiamento, a saber: (i) o FIES, com regramento no artigo 5º-C e seguintes da Lei n.º 10.260/2001; e (ii) o Programa de Financiamento Estudantil (P-Fies), previsto nos artigos 15-D a 15-M, do mesmo diploma legal."
Argumentou que
"A gestão do FIES indicado no item (i), que é a modalidade tratada no presente caso, cabe ao MEC, formulador da política de oferta de financiamento e supervisão, e à Caixa Econômica Federal (CEF) foi incumbida a função de gestor do Fundo Garantidor do FIES (FG-FIES), bem como de agente operador e financeiro, com fundamento nos artigos 3º, inciso II e § 3º1 e 20-B, § 2º, ambos da Lei n.º 10.260/20012, com as alterações da Lei n.º 13.530/2017, tendo a requerente firmado o seu contrato junto à CEF."
Acrescentou que
"Com efeito, a Portaria n.º 209, de 7 de março de 2018, editada pelo MEC, dispõe sobre as regras aplicáveis à seleção de estudantes elegíveis ao financiamento pelo FIES a partir do período 2018.1, sendo, portanto, a legislação aplicável ao presente caso, considerando que a requerente firmou contrato do FIES no período 2021.1, conforme pode-se observar do contrato e do Documento de Regularidade de Inscrição (DRI)."
A requerente teria realizado os procedimentos necessários para fazer jus ao FIES, passando a usufruir do financiamento quanto ao período de 2021, no percentual de 77,95% (setenta e sete vírgula noventa e cinco por cento). Nesse sentido, uma vez estabelecido o percentual de financiamento na contratação, a cada semestre o valor do financiamento a ser liberado observará esse percentual sobre o valor da semestralidade informado pela CPSA, ficando o remanescendo sob responsabilidade pessoal do estudante a título de coparticipação.
"No período 2021.1, o valor da semestralidade do curso era de R$ 55.139,88 (cinquenta e cinco mil, cento e trinta e nove reais e oitenta e oito centavos) – R$ 9.189,98 mensal –, enquanto o montante financiado pelo FIES (77,95%) era de R$ 42.981,54 (quarenta e dois mil, novecentos e oitenta e um reais e cinquenta e quatro centavos) – R$ 7.163,59 mensal –, de modo que no referido período competia à requerente arcar com recursos próprios o valor de R$ 12.158,34 (doze mil, cento e cinquenta e oito reais e trinta e quatro centavos) no semestre, ou seja, R$ 2.026,39 (dois mil, vinte e seis reais e trinta e nove centavos) mensalmente à CEF, a partir de abril de 2021."
Além disso,
"cumpre registrar que, após a formalização do contrato, caso tenha interesse na manutenção do financiamento, o discente, obrigatoriamente, precisa renová-lo semestralmente, independentemente da periodicidade do curso, nos termos do que dispõe o artigo 67 da Portaria n.º 209/20187, mediante solicitação pela CPSA e confirmação pelo estudante, após verificar a veracidade das informações inseridas no sistema, ou, não estando corretas, rejeitá-la, devendo, nesse último caso, estabelecer contato com a CPSA para sanar as incorreções e solicitar o reinício do processo de aditamento, nos termos do artigo 69 da Portaria MEC n.º 209/2018, fazendo-o por meio de atos que são praticados eletronicamente, via Sistema Informatizado do FIES."
Argumentou que
"Assim, enquanto não é realizado o aditamento do período, os boletos de coparticipação são gerados com os valores definidos na contratação ou no último aditamento, conforme o caso, razão pela qual, em caso de eventual diferença de valores da parte não financiada, o acerto é realizado diretamente entre o estudante e a IES."
Além disso, enfatizou que
"a legitimidade para cobrança de valores remanescentes pela IES no que se referente ao valor devido a título de coparticipação, é repassada pela própria CEF, conforme diversos comunicados que são emitidos semestralmente em seu sítio eletrônico, em observância a sistemática esclarecida no próprio informativo."
Destacou que aludido procedimento seria imposto pela Caixa Econômica, enquanto agente financeiro:
"não se trata de arbitrariedade da IES, mas sim da sistemática imposta pela própria CEF em seus comunicados emitidos semestralmente no seu sítio eletrônico no que se refere ao pagamento da coparticipação pelos estudantes beneficiários do FIES, em que a CEF expressamente prevê a legitimidade de tais cobranças diretamente pela IES."
Enfatizou que
"é possível observar que apenas no mês de dezembro de 2022, ou seja, após a validação do contrato para 2022.2 e consequente alteração do valor devido a título de semestralidade, é que a requerente efetuou o pagamento mensal da coparticipação no montante correto de R$ 1.261,93 (um mil, duzentos e sessenta e um reais e noventa e três centavos), o que gerou, com efeito, nos exatos termos da sistemática divulgada e imposta pela CEF, valores a serem restituídos pela IES à requerente, referente às mensalidades de julho a novembro de 2022, no valor de R$ 1.636,99 (um mil, seiscentos e trinta e seis reais e noventa e nove centavos) cada (R$ 10.062,87 mensalidade – R$ 8.800,94 financiado pelo FIES – R$ 2.898,92 pago a título de coparticipação = R$ 1.636,99 a restituir)."
Discorreu sobre os valores em atraso, segundo argumentou, a título de mensalidade.
1.4. Audiência de tentativa de conciliação:
No movimento 35, foi promovida audiência em prol da solução consensual da demanda, o que não restou efetivo.
1.5. Antecipação de tutela - eventos 44 e 46:
A demandante
"com a demanda e obteve a liminar para que a faculdade procedessse a sua rematricula em julho. Ocorre que novamente a faculdade está lhe impedindo de rematricular sob os mesmos fundamentos discutidos na demanda. Sendo que a aluna está quitando todos os seus boletos junato a Caixa Economica Diante do exposto, requerer a concessao da liminar a fim de proceder sua rematricula , sendo que suas aulas começarao e nao 03/02 devido ao internato."
No evento 46, decidiu-se como segue:
"defiro o pedido de tutela de urgência, para determinar que o réu Centro de Estudos Superiores Positivo Ltda realize a rematrícula da autora para o primeiro semestre de 2025 do curso de Medicina, independentemente de eventuais pendências financeiras em relação ao contrato FIES nº14.1525.187.0000048-25 ou pagamento de valores complementares que entender devidos."
1.6. Contestação da CEF:
A CEF sustentou que
"Medida Provisória 785/17, de 06 de julho de 2017, reformulou o Financiamento Estudantil e conforme dispõe as Portaria Normativa nº 209, de 07 de março de 2018, compete ao MEC, por meio da Secretaria de Educação Superior - SESu/MEC gerir os módulos do Sistema Informatizado do Fies - Sisfies de oferta de vagas e de seleção de estudantes."
Aduziu, na sequência, que
"a Lei nº 13.530, de 7 de dezembro de 2017 alterou a Lei nº 10.260/2001 e introduziu novas regras referentes aos contratos celebrados a partir do primeiro semestre de 2018, estando vigentes até o presente momento. Após concluir sua inscrição no SISFIES (MEC) e validar as informações na CPSA, o estudante comparece a uma agência da CAIXA, com o DRI válido e a documentação exigida, para formalizar a contratação do financiamento. Os dados da contratação são enviados pelo MEC à CAIXA via troca de arquivos eletrônicos."
Ela transcreveu cláusulas contratuais. Destacou competir ao estudante efetuar o pagamento dos boletos / coparticipação diretamente junto à CEF e não na IES/Mantenedora, conforme orientação da portaria MEC nº 209 e a lei 13.530, de 7 de dezembro de 2017. Argumentou ainda que a parcela devida em razão do contrato compreenderia:
"participação (percentual não financiado- valor repassado à IES) Tarifa Agente Operador Tarifa Agente Financeiro Seguro."
Sustentou ainda que
"Após a solicitação da CPSA e a confirmação do estudante, o referido sistema classifica o aditamento quanto a modalidade, simplificado ou não simplificado, e disponibiliza o respectivo DRM para impressão pela CPSA. SIMPLIFICADO – Tem início e fim na IES e é realizado quando não há alteração cadastral ou alteração das condições originalmente contratadas; NÃO SIMPLIFICADO - Tem início na IES, com a emissão do DRM - Documento de Regularidade de Matrícula e é finalizado na Agência O estudante comparece à agência de contratação do financiamento acompanhado do seu representante legal e do(s) fiador(es), quando for o caso, dentro do prazo de validade do DRM, munido da documentação exigida, para formalizar a contratação do aditamento. No momento do aditamento de renovação semestral e após o aceite das condições contratuais, o estudante deve responder ao questionamento se valores da semestralidade, turno, duração regular e total de semestres já concluídos estão corretos."
Enfatizou
"A CAIXA, como agente operador do FIES, comunica às CPSA das IES, sobre os prazos regulamentares para o aditamento semestral, incluindo os extemporâneos conforme determina o § único do artigo 96 da portaria MEC nº 209."
Transcreveu extratos sobre o contrato. Argumentou que
"O percentual financiado excedeu o valor do teto do 1º semestre de 2024, onde o valor informado do semestre fora de R$ 75.060,96, esbarrando no valor financiado de R$ 60.000,00. A diferença desses valores fica a título de coparticipação, gerando parcelas no valor de R$ 2.510,16."
Argumentou não terem sido atendidos os requisitos para antecipação de tutela.
1.7. Réplica - evento 57:
No evento 57, a demandante juntou sua réplica, repisando os argumentos esgrimidos na peça inicial.
O requerido Unipositivo juntou instrumento de procuração, para regularização da representação processual - evento 62.
1.8. Pedido de antecipação de tutela - evento 71:
No evento 71, a autora renovou o pedido de antecipação de tutela:
"Ocorre que novamente a faculdade está lhe impedindo de rematricular sob os mesmos fundamentos discutidos na demanda. Sendo que a aluna está quitando todos os seus boletos junato a Caixa Economica Diante do exposto, requerer a concessao da terceira liminar a fim de proceder sua rematricula , sendo que suas aulas começarao Conforme requerida, faculdade insiste de cobrar valores que nao estao previstos no FIEs, pode a parte deve soemnte pagar a Caixa Economia conforme previsao contratau."
1.9. Decisão de evento 74:
No movimento 74, decidiu-se como segue:
"Os documentos apresentados demonstram a cobrança, pelo réu CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA, de "valores residuais referentes a coparticipação", com vencimento em 30/06/2025, bem como o impedimento à sua rematrícula para o 2º semestre de 2025 (DOC_IDENTIF2, DOC_IDENTIF4 e DOC_IDENTIF5/evento71). Conforme se depreende dos autos, a autora já teve deferidos dois pedidos de tutela de urgência para determinar à ré a realização de sua rematrícula para o 2º semestre de 2024 e 1º semestre de 2025, consignando-se, na decisão mais recente, que "A exigência do pagamento acima referido para realização de matrícula já foi objeto de decisão deste juízo, justificando-se, ao menos até que se conclua instrução processual, com apresentação da defesa pela CEF, que é gestora do FIES e contratada, a manutenção do mesmo entendimento" (DESPADEC1/evento16 e DESPADEC1/evento46). Assim, intime-se o réu CENTRO DE ESTUDOS SUPERIORES POSITIVO LTDA, com urgência, para, no prazo de 5 (cinco) dias, esclarecer a cobrança e o impedimento à rematrícula."
1.10. Demais eventos processuais:
A Universidade requerida anexou documentos no movimento 79. A autora renovou o pedido de antecipação de tutela - evento 80. A autora renovou o pedido no evento 83.
Os autos vieram conclusos.
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Competência da Justiça Federal:
Repiso que a Justiça Federal é competente para o processo e julgamento desta demanda, que a autora endereçou sua pretensão em face da CEF, empresa pública federal criada por força do decreto-lei 759/1969. Logo, restaram atendidos o art. 109, I, Constituição/88 e art. 10 da lei n. 5.010/66.
2.2. Submissão do caso à alçada e rito dos Juizados:
Como sabido, a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, diante do previsto no art. 98, I, Constituição e art. 3º da lei n. 10.259, de 2001. Logo, em princípio, não pode ser ampliada ou reduzida, impondo sua apreciação de ofício pelo Poder Judiciário, conforme art. 64, CPC.
Não se submetem à "
competência do Juizado Especial Cível as causas: (...) para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal
."
Convém ter em conta, todavia, que o processo é individualizado pela conjugação do trinômio partes, pedido e causa de pedir (art. 337, §2 CPC). Em decorrência do princípio da substanciação, a parte autora é obrigada a detalhar, na peça inicial, a sua pretensão, indicando o pedido e também a motivação do pedido. Note-se ainda que, como notório, apenas o dispositivo transita em julgado, conforme se infere do rt. 504, I, CPC:
"
Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença
."
Logo, como têm entendido os tribunais, os Juizados Especiais são competentes para apreciação de pretensões nas quais a alegada nulidade do ato administrativo é invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido:
"(....) Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º , § 1º , III , da Lei 10.259 ,
uma vez que a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
. Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50446614920184047000 PR 5044661-49.2018.4.04.7000, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, Data de Julgamento: 02/04/2020).
Ainda segundo a Turma Recursal,
"O valor da causa atribuído pela parte autora é inferior a 60 salários, o qual não foi impugnado, logo, não há o que discutir quanto a esse aspecto.
Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259, uma vez que "a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
". Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal. "
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50029127820204047001 PR 5002912-78.2020.4.04.7001, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, 22/10/2020, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Atente-se para os julgados que transcrevo abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. COMPETÊNCIA DESTA E. CORTE. SÚMULA 428 DO STJ. AÇÃO INDIVIDUAL DE DISPENSA DE PAGAMENTO DE PEDÁGIO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. PRECEDENTES DESTA 2ª SEÇÃO. CONFLITO PROCEDENTE. 1 - Nos termos da Súmula 428 do Superior Tribunal de Justiça, compete a esta E. Corte dirimir o presente conflito negativo de competência entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal Cível. 2 - Busca a autora tão somente o reconhecimento de seu direito individual à dispensa do pagamento de pedágio na praça de arrecadação instalada no entroncamento das rodovias BR 153 e BR 369, localizada no município de Jacarezinho/PR, com fundamento na Portaria do Ministério dos Transportes nº 155/2004 bem como na sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.70.13.002434-3. 3 -
A questão relativa à desconstituição de ato administrativo não faz parte do pedido do autor, que dela tratou apenas de forma incidental, como causa de pedir, de modo que, no caso dos autos, resta afastada a aplicação do art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259/01. Precedentes desta Segunda Seçã
o. 4 - Aplicável à hipótese em tela a regra geral prevista no caput do artigo 3º da Lei 10.259/2001, que estabelece a competência dos Juizados Especiais Federais em se tratando de causas com valor inferior a sessenta salários mínimos. 5 - Conflito procedente, para declarar a competência do Juizado Especial Federal Cível de Ourinhos/SP.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 21150 0000310-88.2017.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2017).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA QUE VISA O RECONHECIMENTO DE DIREITO. MERA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO INCISO III DO §1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.250/01. A
parte autora pleiteia a declaração de direito à percepção de determinada vantagem pecuniária, não havendo pedido imediato de anulação de qualquer ato administrativo, o qual só seria atingido via reflexa, razão pela qual não se aplica, na espécie, a regra que excepciona da competência dos Juizados Especiais Federais para causas valoradas até sessenta salários mínimos. Inaplicável ao caso a exceção prevista no inc. III do §1º do art. 3º da Lei nº 10.259/01
. (TRF4 5018358-17.2016.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 22/12/2016).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. COMPETÊNCIA DO STJ PARA APRECIAR O CONFLITO. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA. CRITÉRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL EM FACE DO VALOR DA CAUSA. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que juízo de juizado especial não está vinculado jurisdicionalmente ao tribunal com quem tem vínculo administrativo, razão pela qual o conflito entre ele e juízo comum caracteriza-se como conflito entre juízos não vinculados ao mesmo tribunal, o que determina a competência do STJ para dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição. Precedentes. 2. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados têm natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). 3. A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo).
Entre as exceções fundadas no critério material está a das causas que dizem respeito a "anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal". 4. No caso, a demanda tem valor da causa inferior a sessenta salários mínimos e visa a obter indenização por danos morais. A ilegitimidade dos atos administrativos constitui apenas fundamento do pedido, não seu objeto
. 5. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juízo Federal da 7ª Vara do Juizado Especial Cível da Subseção Judiciária de São Luís -MA, o suscitante. (STJ, CC 75314/MA, 1ª Seção, Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 27/08/2007).
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXCEÇÃO DO ART. 3º, § 1º, INC. III, DA LEI Nº 10.259/01 AFASTADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
A pretensão formulada nesta ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses arroladas no § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, visto não tratar a ação de anulação ou cancelamento de ato administrativo típico.
O pedido envolve, apenas, reconhecimento de direito. Sendo o valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, cabe ao Juizado Especial Federal a competência para processar, conciliar e julgar as causas de competência da Justiça Federal
. (TRF4, conflito de competência (Seção) Nº 5008065-61.2011.404.0000, 2ª Seção, Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, em 08/09/11).
Assim, e atribuído à causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tem-se que competente para o processamento e julgamento da lide o Juizado Especial Federal
. Diante do exposto, nos termos do disposto no art. 120, § único, do CPC, conheço do presente conflito e declaro competente para o processamento e julgamento da lide o juízo suscitado (Juízo Substituto da 1ª Vara de Florianópolis). Publique-se. Comuniquem-se os juízos conflitantes e, com as formalidades de estilo, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.
(TRF4 5013834-11.2015.404.0000, Segunda Seção, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, 11/07/2015)
Eventual complexidade da demanda não afasta a competência dos Juizados Especiais Federais, conforme disposto no art. 98, I, Constituição Federal/88.
"Ação originária de produção antecipada de provas, com argumento de complexidade da demanda e necessidade de oitiva de quatro testemunhas. 4. A Lei 10.259/2001 estabelece a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para causas de valor até 60 salários mínimos,
independentemente da complexidade
. 5. O critério de competência dos Juizados Especiais Federais é quantitativo, e o argumento da agravante quanto ao número de testemunhas não é capaz de afastar tal competência. 6. Agravo Interno não provido."
(STJ - AgInt no REsp: 2059305 AL 2023/0090671-3, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 16/10/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/12/2023)
Tanto por isso, em princípio, a presente causa submete-se ao rito e à alçada dos Juizados Especiais Federais, eis que o conteúdo econômico da pretensão da autora é
inferior a 60 salários-mínimos
, tais como definidos no Decreto n. 11.864, de 27 de dezembro de 2023, atendendo ao art. 3º,
caput,
da lei n. 10.259, de 2001. A pretensão da parte autora é condenatória, não esbarrando na vedação do art. 3, §1, III, CPC.
2.3. Competência desta Subseção:
A pretensão deduzida na peça inicial submete-se à alçada desta Subseção Judiciaria de Curitiba, por força do
art. 53, III, "d", CPC/15
, dado constituir-se no local de cogitado adimplemento da obrigação aludida na peça inicial, caso a pretensão da autora venha a ser julgada procedente, em sentença transitada em julgado. Ademais, ainda que assim não fosse, é fato que o STF tem aplicado o art. 109,§2º, CF, também quando em causa pretensões endereçadas às autarquias federais e empresas públicas federais.
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA. CAUSAS AJUIZADAS CONTRA A UNIÃO. ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO DO FORO COMPETENTE. APLICABILIDADE ÀS AUTARQUIAS FEDERAIS, INCLUSIVE AO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I - A faculdade atribuída ao autor quanto à escolha do foro competente entre os indicados no art. 109, § 2º, da Constituição Federal para julgar as ações propostas contra a União tem por escopo facilitar o acesso ao Poder Judiciário àqueles que se encontram afastados das sedes das autarquias. II –
Em situação semelhante à da União, as autarquias federais possuem representação em todo o território nacional. III - As autarquias federais gozam, de maneira geral, dos mesmos privilégios e vantagens processuais concedidos ao ente político a que pertencem. IV - A pretendida fixação do foro competente com base no art. 100, IV, a, do CPC nas ações propostas contra as autarquias federais resultaria na concessão de vantagem processual não estabelecida para a União, ente maior, que possui foro privilegiado limitado pelo referido dispositivo constitucional. V - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem decidido pela incidência do disposto no art. 109, § 2º, da Constituição Federal às autarquias federais. Precedentes. VI - Recurso extraordinário conhecido e improvido
. (STF - RE: 627709 DF, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 20/08/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO)
Nesse mesmo sentido, convergem os julgados: RE 499.093-AgR-segundo/PR e AI 793.409/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski; RE 234.059/AL, Rel. Min. Menezes Direito; RE 484.235-AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 488.704/RJ, RE 527.498/SC e RE 603.311/RS, Rel. Min. Marco Aurélio; RE 590.649/RJ, RE 474.691/SC e RE 491.331/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 474.825/PR, Rel. Min. Dias Toffoli.
O art. 109, §2º, CF, prevalece sobre o art. 3º, §3º, da lei n. 10.259, de 2001. Com efeito,
"A competência absoluta dos Juizados Especiais, referida no art. 3º , § 3º , da Lei n. 10.259 /01 não constitui obstáculo à redistribuição para fins de equalização de acervo, desde que o encaminhamento ocorra para outra Vara com competência também vinculada ao sistema dos Juizados Especiais Federais. 5. A norma que afirma que "no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta" tem ligação histórica com a interpretação dada pela doutrina e pela jurisprudência à Lei nº 9.099 /95, no sentido de que "o ajuizamento da ação perante o juizado especial é uma opção do autor (art. 3 ., par.3., da Lei 9.099 /95)" ( REsp 151.703/RJ , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/1998, DJ 08/06/1998, p. 124). 6.
O ajuizamento obrigatório de causas de até 60 salários mínimos nos Juizados Especiais Federais empresta a essas ações uma competência absoluta para o próprio sistema dos Juizados Especiais, mas não torna essas ações infensas às medidas de equalização. Nada impede, portanto, a incidência do art. 109 , § 2º , da Constituição Federal , no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal
."
(TRF-4 - CC: 50799694420214047000 PR 5079969-44.2021.4.04.7000, Relator: NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/02/2022, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Por conseguinte,
considerando o alcance do art. 109, §2, CF, a tramitação desta causa perante esta Subseção Judiciária está em conformidade com a legislação
. Ademais, a declinação de competência territorial depende de prévia exceção de incompetência, na forma do art. 65, CPC/15, e súmula 33, Superior Tribunal de Justiça.
2.4. Submissão da causa ao presente Juízo:
A demanda em causa foi distribuída ao Juízo Titular da 7.VF, mediante sorteio abrangendo os Juízos desta Subseção de Curitiba, o que atendeu à garantia do Juízo Natural - art. 5, LIII, Constituição.
Atuo neste processo em regime de substituição, por conta da designação da Corregedoria, dada a fruição de férias pelos magistrados atuantes na presente unidade jurisdicional.
2.5. Eventual
conexão
processual:
No presente caso, não diviso situação de conexão que enseje a reunião desta demanda com algum outro processo para solução conjunta, na forma do
art. 55, §1, CPC/15
e leitura
a contrario sensu
da
súmula 235, STJ
.
2.6.
Singularidade
da demanda:
Não há indicativos de que esta demanda seja reiteração de alguma outra, porventura já julgada, com sentença transitada em julgado. Como sabido, a coisa julgada é assegurada constitucionalmente, na forma do art. 5º, XXXVI, Lei Maior, enquanto projeção da garantia da segurança jurídica. Eventual sentença transitada em julgada em regra não pode ser alterada pelo Juízo e tampouco pela parte atingida, salvo eventual celebração de acordo com a parte reconhecida como credora na decisão, quando em causa interesses disponíveis (lógica, por exemplo, do art. 190, CPC).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC). No caso, de todo modo,
não há indicativos de desconsideração à coisa julgada
, por conta do processo em exame.
Ademais, tampouco há sinais de litispendência, o que pressupõe - conforme
art. 337, §2º, CPC/15
- identidade de partes, pedido, causa de pedir. No momento, atentando-se para a presente causa, não vislumbrei sinais de violação ao
ne bis in idem.
Ressalvo nova análise, caso aportem aos autos elementos que infirmem essa análise.
2.7. Eventual suspensão da demanda:
Não estão preenchidos os requisitos para eventual suspensão da demanda, na forma do art. 313, Código de Processo Civil. Não há sinais de alguma questão prejudicial a condicionar a solução deste mandado de segurança.
2.8. Pertinência subjetiva das partes:
A autora está legitimada para esta causa, na medida em que busca a condenação dos requeridos à reparação de danos que alegou ter suportado; o reembolso de valores que disse ter suportado de modo indevido, no âmbito de contrato de mútuo feneratício, avençado sob o FIES e a declaração de não figurar como devedora no âmbito do aludido contrato, quanto aos valores aludidos na peça inicial.
A CEF cuida-se do agente financeiro mutuante, de modo que possui pertinência subjetiva para essa causa, na medida em que a autora busca justamente a declaração de não figurar como devedora quanto a alguns valores concernentes ao aludido pacto. O banco está legitimado para a demanda:
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. FIES. CEF. FNDE. LEGITIMIDADE. A alteração trazida pela Lei nº 12.202/2010, que incluiu o art. 20-A na Lei nº 10.260/01 determinou a legitimidade da CEF e do FNDE para compor a lide na medida em que aquela é operadora do programa e este é o agente operador e administrador dos ativos e passivos. (TRF4, APELREEX 5002594-76.2013.404.7119, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 10/07/2015)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENSINO SUPERIOR. FIES. CEF. FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO. FNDE. LEGITIMIDADE PASSIVA
Considerando a superveniência da Lei nº 12.202/2010, tanto o FNDE como a CEF devem integrar o pólo passivo da ação
. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5011320-85.2015.404.0000, 4ª Turma, Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, por unanimidade, juntado aos autos em 26/05/2015)
A instituição de ensino está legitimada para a demanda, eis que a autora sustentou lhe ter pago valores, de modo indevido. Também argumentou que a universidade lhe teria causado danos, em razão disso. Ademais, ela postulou a antecipação de tutela, em prol da renovação periódica da matrícula.
2.9. Cogitado litisconsórcio - União e FNDE:
Acrescento que a União Federal não está legitimada para a demanda, dado que a questão relacionada aos descontos é processada diretamente pelo banco mutuante, sem necessidade de intervenção do ente federativo.
O simples fato de a legislação em questão ter emanado do Poder Legislativo da União Federal não a legitima para a causa, sob pena de que, com idênticos fundamentos, em todo processo que seja invocado o Código Civil, o Código Penal - leis nacionais - ou seja invocada a lei de licitações - lei federal -, a União seja tida como parte pertinente para a causa. Esse
redutio ad absurdum
evidencia que as atribuições normativas não implicam, por si, legitimidade para os processos em que as normas assim elaboradas sejam discutidas.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO VINCULADO A AUTARQUIA FEDERAL. PRETENSÃO DE RECLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. FIXAÇÃO EM VALOR MÓDICO. REDUÇÃO. NÃO CABIMENTO. 1. O Autor é servidor da Escola Agrotécnica Federal de Barreiros/PE, Autarquia Federal, a qual, portanto, detém personalidade jurídica própria e distinta daquela da UNIÃO, não havendo dúvida quanto à ilegitimidade passiva desta para responder à pretensão inicial do Autor à reclassificação funcional, pois
a simples atribuição normativa e organizacional da UNIÃO em relação à Administração Federal Direta e Indireta não lhe traz a condição da parte na relação jurídica de direito material objeto da lide
(vínculo funcional administrativo de servidor público de Autarquia Federal). 2. Quanto aos honorários advocatícios sucumbenciais, o valor em que fixados, R$ 500,00 (quinhentos) reais, mostra-se módico, atendendo ao disposto no art. 20, parágrafo 4.º, do CPC, razão pela qual não merece acolhimento a pretensão recursal de sua redução. 3. Não provimento da apelação. (AC 200483000079795, Desembargador Federal Emiliano Zapata Leitão, TRF5 - Primeira Turma, DJE - Data::08/10/2009 - Página::125 - Nº::26.)
Ora, ainda que lhe seja atribuída a formulação de política de oferta do financiamento em questão e a supervisão das operações do FIES (art. 3º, I, da Lei 10.260/2001, com redação dada pela Lei 12.202/2010), a União Federal não guarda pertinência subjetiva com a presente demanda:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. FIES. PRELIMINARES. LEGITIMIDADE DO FNDE. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. MÉDICO INTEGRANTE DE EQUIPE DE SAÚDE DA FAMÍLIA. LEI 10.260/2001. ABATIMENTO DO SALDO DEVEDOR CONSOLIDADO. POSSIBILIDADE. 1. Discute-se na ação a legalidade do ato atribuído ao Presidente do Fundo de Desenvolvimento da Educação, que indeferiu requerimento referente ao abatimento de 1% (um por cento) do saldo devedor do contrato de financiamento estudantil do contratante, formado em Medicina, a incidir durante o período em que o profissional exerceu suas funções em Equipe de Saúde da Família. 2. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação é parte legítima na ação, por participar dos contratos do FIES na função de administrador dos ativos e passivos do programa, a teor do art. 3º, I, c, da Lei 10.260/2001 e do art. 6º, IV, da Portaria Normativa/ME n. 209/2018. Preliminar de ilegitimidade passiva do FNDE rejeitada. 3.
Quanto à legitimidade da União para figurar no polo passivo da presente ação, embora lhe seja atribuída a formulação de política do financiamento estudantil e a supervisão das operações do fundo (art. 3º, I, da Lei 10.260/2001), tal atribuição não lhe impõe interesse e legitimidade nas demandas em que se discute a contratação do FIES. Desse modo, a preliminar deve ser acolhida para reconhecer a ilegitimidade passiva da União e excluí-la da demanda. Precedentes
. 4. No caso, o impetrante é médico formado em faculdade particular, beneficiário do programa de financiamento estudantil - FIES. Restou provado nos autos que, após a colação de grau, optou por trabalhar em cidades afastadas de capitais, devido ao incentivo concedido pela União, nos termos do art. 6º-B da lei nº 10.260/01, constituído para atrair médicos às zonas prioritárias (afastadas dos grandes centros), com poucos trabalhadores na área da saúde. Assim, deve ser mantida a sentença que, no mérito, assegurou ao contratante o abatimento previsto na lei vigente. 5. Apelação da União e remessa oficial providas. Apelação do FNDE desprovida. (TRF-1 - AMS: 10002875020214013813, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, Data de Julgamento: 31/08/2022, 5ª Turma, Data de Publicação: PJe 31/08/2022 PAG PJe 31/08/2022 PAG)
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO. ENSINO SUPERIOR. FIES. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. ABATIMENTO MENSAL DE 1% (UM INTEIRO POR CENTO) DO SALDO DEVEDOR CONSOLIDADO. LEI 10.260/2001, ART. 6º-B, II. REQUISITOS PREENCHIDOS. ABATIMENTO
DEFERIDO. DIREITO ASSEGURADO. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. A atribuição da União para a formulação de política de oferta de financiamento estudantil e a supervisão das operações do fundo (art. 3º, I, da Lei 10.260/2001, com redação dada pela Lei 12.202/2010), não lhe confere interesse ou legitimidade na demanda em que se discute a legalidade de cláusulas contratuais atinentes aos juros e à atualização da dívida objeto do mútuo. Ilegitimidade passiva da União reconhecida, para determinar sua exclusão da lide
. 2. O FNDE detém legitimidade para figurar no polo passivo da relação processual, porquanto, na data em que passou a integrá-la, era o agente operador e administrador dos ativos e passivos referentes aos contratos firmados no âmbito do FIES, consoante disposto no art. 3º, II, da Lei nº 10.260/2001, na redação dada pela Lei 12.202/2010. ( AC 1018104-06.2020.4.01.3800, JUÍZA FEDERAL KÁTIA BALBINO DE CARVALHO FERREIRA (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 12/12/2021).
PROCESSUAL CIVIL. PROGRAMA DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL ( FIES). FALECIMENTO DO ESTUDANTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DA IES. PREVISÃO CONTRATUAL DE TRANSFORMAÇÃO DO FIADOR EM DEVEDOR PRINCIPAL. INCOMPATIBILIDADE COM O CARÁTER PERSONALÍSSIMO DA FIANÇA. RESPONSABILIDADE DO FIADOR PELAS PARCELAS VENCIDAS ATÉ A DATA DO ÓBITO. 1. A jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que apenas a Caixa Econômica Federal, na condição de agente financeiro do FIES, detém legitimidade para figurar no polo passivo de demandas que visam à revisão de contrato de FIES, a teor do disposto no art. 6º da Lei nº 10.260/2001 com redação dada pela Lei n. 12.202/2010,
não havendo que se falar em litisconsórcio passivo necessário com a IES ou com a União Federal, a quem compete apenas formular a política de oferta de financiamento e supervisionar a execução das operações do Fundo, a teor do disposto no art. 3º, inciso I do mesmo diploma legal.
(AC 0001639-67.2009.4.01.3300/BA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.883 de 06/07/2015) [...] (ACORDAO 00045243520074013814, DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:09/10/2017).
CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. FUNDO DE FINANCIAMENTO AO ESTUDANTE DO ENSINO SUPERIOR - FIES. EXIGÊNCIA DE IDONEIDADE CADASTRAL. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DA UNIÃO FEDERAL REJEITADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. I –
Versando a controvérsia, como no caso, em torno da exigência de idoneidade cadastral dos autores, para fins de celebração de contrato de financiamento estudantil com recursos do Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior - FIES, a legitimidade passiva ad causam, na espécie, é exclusiva do agente financeiro responsável pelo aludido financiamento, não se caracterizando, assim, a hipótese de citação da União Federal, na qualidade de litisconsorte passivo necessário. Precedentes
. (APELAÇÃO 00605566520124013400, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA:17/08/2016).
Tampouco há litisconsórcio necessário envolvendo o FNDE, entidade encarregada da gestão do sistema FIES, por força lei n. 10.260, de 12 de julho de 2001. No caso, não há pretensão que coloque em causa a atuação da referida Fundação.
2.10. Cogitado
litisconsórcio
passivo necessário - fiadores:
Poder-se-ia cogitar de litisconsórcio com eventuais fiadores, dada a conexão entre o contrato de mútuo feneratício e contrato de fiança, dada a obrigação de fiadores de promoverem o pagamento em caso de inadimplemento da dívida por parte da mutuária. Anoto, porém, que - na espécie - se discute o intento de redução da dívida.
Se acolhida a pretensão da autora, isso não prejudicará eventuais fiadores. Caso reputada improcedente aludido intento, isso não implicará, por si, agravamento do estado do contrato, vigente nesta data
.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. JULGAMENTO NÃO UNÂNIME. SUBMISSÃO AO ART. 942 DO CPC/15. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO PARA FINANCIAMENTO ESTUDANTIL - FIES. DESNECESSIDADE DE LITISCONSÓRCIO ATIVO ENTRE FIADOR E AFIANÇADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA AUTORIDADE IMPETRADA. PRAZO DE CARÊNCIA DE 18 MESES DA LEI Nº 11.941/2009. APLICAÇÃO A CONTRATOS FIRMADOS ANTERIORMENTE À REFERIDA LEI. APELAÇÃO DA CEF DESPROVIDA. 1. Diante do resultado não unânime (em 02 de outubro de 2018), o julgamento teve prosseguimento conforme o disposto no art. 942 do CPC/15, realizando-se nova sessão em 07 de março de 2019. 2.
Não obstante se tratar de hipótese de litisconsórcio ativo unitário, já que a decisão a ser proferida irradia efeitos na esfera jurídica tanto do tomador do empréstimo, como do fiador do negócio, não se mostra pertinente a determinação judicial para que alguém componha o polo ativo de uma demanda. 3. Assim, tendo-se em conta que não cabe ao juiz impor o litisconsórcio ativo, em homenagem ao princípio da livre iniciativa da parte, respaldado pelo postulado constitucional da legalidade ( CF, art. 5º, inciso II), tem-se como impertinente a determinação de intervenção litisconsorcial ativa na lide. 4. Adstrito ao princípio da legalidade tem-se que o atual art. 506 permite que terceiro não partícipe da relação processual possa eventualmente se beneficiar dos efeitos da sentença, não o obrigando, portanto, a compor a lide para necessariamente ser favorecido pela coisa julgad
a. 5. A Caixa Econômica Federal - e, de conseguinte, o seu Gerente (autoridade impetrada em se tratando de mandado de segurança) - é parte legítima, tendo em vista ser a instituição financeira gestora do Fundo de Financiamento na qualidade de agente operador e de administradora dos ativos e passivos, conforme prevê o inciso II do artigo 3º da Lei nº 10.260/01. Precedente ( AC 00097706520044036108, Relator Desembargador Federal Henrique Herkenhoff, Segunda Turma, TRF 3ª Região, DJF 3/10/2008). 6. Quanto ao prazo de carência de 18 (dezoito) meses para início de cumprimento do contrato de financiamento estudantil, conquanto tenha sido trazido somente pela Lei nº 11.941/2009, a jurisprudência dos Regionais é pacífica no sentido da sua aplicabilidade mesmo a contratos firmados anteriormente à vigência da novel legislação (TRF 1ª Região: AC 00309281120104013300 e AC 00099626720144013500; TRF 4ª Região: APELREEX 5012712-53.2013.404.7009; TRF 5ª Região: REO 00019871620124058200). 7. Apelação desprovida. (TRF-3 - Ap: 00113676620134036104 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, Data de Julgamento: 07/03/2019, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/04/2019)
2.11. Interesse processual:
A autora deflagrou a presente demanda, argumentando ter encontrado dificuldades na satisfação do seu interesse no âmbito extrajudicial. Assim, em princípio, ela faz jus à prestação jurisdicional, na forma do art. 5, XXXV, Constituição/88, de modo a definir se possui o direito invocado na peça inicial. Note-se que o esgotamento do debate, na seara administrativa, não é requisito para se ingressar em Juízo.
Por outro lado, caso a pretensão venha a ser julgada procedente pelo Poder Judiciário, isso lhe será útil, por postergar o início da fase de amortização da dívida em causa, algo que influencia o custo de oportunidade de cada verba, liberando-a de suportar os pagamentos no prazo previsto até o momento no contrato. A via processual eleita se revela adequada, de modo que aludido requisito, previsto no art. 17, CPC, foi atendido.
Assim, o trinômio necessidade, utilidade e adequação - enquanto projeto do interesse processual - foi atendido no caso.
2.12. Aptidão da peça inicial e valor da causa:
A autora atendeu ao art. 319, CPC/15, detalhando o pedido e a causa de pedir, de modo a viabilizar o contraditório. O valor atribuído à causa revela-se escorreito, em primeiro exame - R$ 25.961,98 - parece corresponder ao conteúdo econômico da pretensão deduzida no movimento1, nos termos do art. 292, § 2º, CPC. No caso, a rigor, o conteúdo econômico corresponderia ao valor do débito impugnado, o valor que a autora postulara a título de repetição e o montante da indenização de danos por ela postulada.
De toda sorte, aos fins pragmáticos previstos no art. 292, CPC, entendo que o valor indicado se revela adequado. Foram anexados documentos, na forma do art. 320, CPC.
2.13. Considerações gerais sobre a antecipação de tutela:
Como sabido, a cláusula do devido processo envolve alguma aporia. Por um lado, o processo há de ser adequado: deve assegurar defesa, contraditório, ampla produção probatória. E isso consome tempo. Todavia, o processo também deve ser eficiente, ele deve assegurar ao titular de um direito uma situação jurídica idêntica àquela que ele teria caso o devedor houvesse satisfeito sua obrigação na época e forma devidas.
A demora pode contribuir para um debate mais qualificado entre as partes; todavia, também leva ao grande risco de ineficácia da prestação jurisdicional, caso o demandante tenha realmente razão em seus argumentos.
Daí a relevância do prudente emprego da tutela de urgência, prevista no art. 300 e ss. do novo CPC. Desde que a narrativa do demandante seja verossímil, seus argumentos sejam fundados e a intervenção imediata do Poder Judiciário seja necessária - i.e., desde que haja
fumus boni iuris
e
periculum in mora -
a antecipação da tutela deverá ser deferida.
Sem dúvida, porém, que o tema exige cautela, eis que tampouco soa compatível com o devido processo a conversão da antecipação em um expediente rotineiro, o que violentaria a cláusula do art. 5º, LIV e LV, CF. Ademais, o provimento de urgência não pode ser deferido quando ensejar prejuízos irreversíveis ao demandado (art. 300, §3º, CPC).
Daí o relevo da lição de Araken de Assis, como segue:
"A tutela de urgência e a tutela de evidência gravitam em torno de dois princípios fundamentais: (a) o princípio da necessidade; e (b) o princípio da menor ingerência.
- Princípio da necessidade - Segundo o art. 301, in fine, a par do arresto, sequestro, arrolamento de bens, e protesto contra a alienação de bens, o órgão judiciário poderá determinar qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. Essa abertura aplica-se às medidas de urgência satisfativas (art. 303, caput): a composição do conflito entre os direitos fundamentais somente se mostrará legítima quando houver conflito real, hipótese em quase patenteia a necessidade de o juiz alterar o esquema ordinário de equilíbrio das partes perante o fator temporal do processo. A necessidade de o juiz conceder medida de urgência apura-se através da comparação dos interesses contrastantes dos litigantes. Dessa necessidade resulta a medida adequada à asseguração ou à satisfação antecipada em benefício do interesse mais provável de acolhimento em detrimento do interesse menos provável.
-
Princípio do menor gravame - O princípio do menor gravame ou da adequação é intrínseco à necessidade. É preciso que a medida de urgência seja congruente e proporcional aos seus fins, respectivamente a asseguração ou a realização antecipada do suposto direito do autor. Por esse motivo, a medida de urgência cautelar prefere à medida de urgência satisfativa, sempre que adequada para evitar o perigo de dano iminente e irreparável, e, na órbita das medidas de urgência satisfativas, o órgão judiciário se cingirá ao estritamente necessário para a mesma finalidade
." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
volume II. Tomo II. Parge Geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 370-371).
Quando se cuide-se, ademais, de pedido em desfavor da Fazenda Pública, a lei 8.437/1992 veda a antecipação de tutela que implique compensação de créditos tributários ou previdenciários
(art. 1º, §5º). A lei do mandado de segurança veda a concessão de liminares com o fim de se promover a entrega de mercadorias, a reclassificação de servidores públicos e o aumento ou extensão de vantagens de qualquer natureza (art. 7º, §2º, lei 12.016).
Registre-se que o STF já se manifestou sobre a constitucionalidade de algumas dessas limitações (lei 9.494/1997), conforme se infere da conhecida ADC 04-6/DF, rel. Min. Sydnei Sanches (DJU de 21.05.1999), com os temperamentos reconhecidos no informativo 248, STF. No âmbito do Direito Administrativo militar, há restrições ao emprego do
writ
, por exemplo, diante do que preconiza o art. 51, §3º, lei n. 6.880/1980, ao exigir o exaurimento da via administrativa.
Por outro lado, como sabido, o juízo não pode antecipar a eficácia meramente declaratória de uma cogitada sentença de procedência. Afinal de contas, a contingência é inerente aos provimentos liminares; de modo que a certeza apenas advém do trânsito em julgado (aliás, em muitos casos, sequer depois disso, dadas as recentes discussões sobre a relativização da
res iudicata
).
"É impossível a antecipação da eficácia meramente declaratória, ou mesmo conferir antecipadamente ao autor o bem certeza jurídica, o qual somente é capaz de lhe ser atribuído pela sentença declaratória. A cognição inerente ao juízo antecipatório é por sua natureza complemente inidônea para atribuir ao autor a declaração - ou a certeza jurídica por ele objetivada." (MARINONI, Luiz Guilherme.
A antecipação da
tutela
.
7. ed. SP: Malheiros. p. 55).
2.14. Respeito ao contraditório:
Em regra, a antecipação de tutela apenas pode ser promovida quando assegurado prévio contraditório ao demandado, conforme art. 5, LIV e LV, CF e art. 7, parte final, CPC. Em situações excepcionais, o contraditíorio pode ser postergado.
No presente caso, a garantia foi respeitada, como relatei acima, dado que o pleito de antecipação de tutela cuida-se de reiteração de requerimentos anteriores.
2.15. Prazos prescricionais:
No mais das vezes, as pretensões deduzidas em face da Administração Pública estão submetidas ao prazo prescricional de 05 anos, na forma do art. 1º do decreto 20.910/32, com a interrupção na forma da súmula 383, Supremo Tribunal Federal. Trata-se de norma de conteúdo especial quando confrontada com o art. 206, §3º, V, Código Civil:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. DECRETO 20.910/32. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP 1.251.993/PR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.251.993/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, assentou que o prazo de prescrição quinquenal, previsto no Decreto nº 20.910/32, aplica-se às ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002
. a4. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201302893979, MARGA TESSLER (JUÍZA FEDERAL CONVOCADA DO TRF 4ª REGIÃO), STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:12/03/2015 ..DTPB:.)
Aludido prazo é oponível, em princípio, à pretensão porventura endereçada ao FNDE, enquanto autarquia federal (lei 5.537, de 21 de novembro de 1968).
No que toca à Caixa Econômica Federal, submetida ao regime de direito privado (art. 173, §2, Constituição), pode-se cogitar da aplicação do prazo de 10 anos, previsto no art. 205, Código Civil, dado que o art. 206 não detalha prazo para se postular a prorrogação do prazo de carência contratual. Já o art. 27 da lei n. 8.0781/990 - Código de Defesa do Consumidor -, estipula prazo prescricional da pretensão relacionada à reparação de danos
.
Atente-se para a decisão do STJ:
"(...)
Nas controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 CC/02) que prevê dez anos de prazo prescricional e, quando se tratar de responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3º, V, do CC/02, com prazo de três anos.
8. Destarte, considerando que o prazo prescricional aplicável à espécie é o decenal, previsto no art. 205 do CC/02, e que o termo inicial é a data do trânsito em julgado do acórdão que decidiu sobre a liquidação de sentença, conclui-se pela não ocorrência da prescrição. 9. Recurso especial conhecido e não provido."
(STJ, REsp 1453851/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe 08/08/2019)
Nesse mesmo sentido,
"Nas ações de indenização do mandante contra o mandatário, incide o prazo prescricional de 10 (dez) anos, previsto no art. 205 do Código Civil, por se tratar de responsabilidade proveniente de relação contratual. 2. A Corte Especial, no julgamento dos EREsp 1.281.594/SP, concluiu que, nas pretensões relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 do CC/2002) que prevê dez anos de prazo prescricional e, nas demandas que versem sobre responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3º, V, do mesmo diploma, com prazo prescricional de três anos. 3. Agravo interno a que se nega provimento."
(AgInt no AREsp 1210887/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe 27/06/2019).
Ressalvo exame mais detalhado sobre aludido tema por época dca prolação da sentença
. Em princípio, por força do
postulado da
actio nata
,
o termo inicial da prescrição deve recair na data em que restou indeferido o pedido extrajudicial da autora, ou a cobrança impugnada, conforme o caso. No curso do processo administrativo, em que a autora enfatizou ter requerido aludida prorrogação, o cômputo da prescrição permanece suspenso, conforme art. 4. do decreto 20.910/32. Assim, aparentemente, a pretensão da autora não foi atingida pela prescrição.
2.16. Eventual
decadência
do direito invocado na inicial:
O instituto da decadência é aplicável quando em causa cogitados direitos potestativos (direitos formativos geradores, na expressão de Pontes de Miranda). Ou seja, direitos que podem ser exercidos sem prévia aquiescência da contraparte, a exemplo do direito do Fisco promover o lançamento fiscal de revisão (art. 150, §4, CTN), direito à anulação de casamento, direito à demissão de empregados sem justa causa, direito à desistência de compra promovida pela internet etc. Em todos esses casos, sempre que a legislação houver fixado prazo para seu exercício, tratar-se-á de lapso decadencial.
No caso, pode-se cogitar de decadência, por conta do eventual decurso do prazo previsto no art. 26, II, §1º, CDC/1990:
"O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II -
noventa dias
, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. §1°
Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços
."
A respeito do tema, os Tribunais têm decidido como segue:
"Para a solução da questão é necessário conceituar o defeito que macula os serviços ora discutidos. Se estivermos diante da hipótese de responsabilidade por fato do serviço (art. 14, do CDC), o prazo prescricional a ser aplicado é o do art. 27 dessa lei, de cinco anos. Se estivermos diante de responsabilidade por vício do produto (art. 18, do CDC) o prazo será decadencial, disciplinado no art. 26.
Esta Terceira Turma, em precedente de minha relatoria, já teve a oportunidade de se posicionar no sentido de que, nas hipóteses de inadimplemento absoluto, não se estaria no âmbito do art. 18 (e, conseqüentemente, do art. 26 do CDC), mas no âmbito do art. 14, que, quanto à prescrição, leva à aplicação do art. 27, com prazo de cinco anos para o exercício da pretensão do consumidor. Isso se deu por ocasião do julgamento do REsp nº 278.893/DF (DJ de 4/11/2002), assim ementado:
Recurso Especial. Civil. "Pacote turístico". Inexecução dos serviços contratados. Danos materiais e morais. Indenização. Art. 26, I, do CDC. Direto à reclamação. Decadência. -
O prazo estatuído no art. 26, I, do CDC, é inaplicável à espécie, porquanto a pretensão indenizatória não está fundada na responsabilidade por vícios de qualidade do serviço prestado, mas na responsabilidade contratual decorrente de inadimplemento absoluto, evidenciado pela não-prestação do serviço que fora avençado no "pacote turístico
". (STJ, Resp, rel. Min. Nancy Andrighi, julgamento unânime por não conhecer do Recurso Especial) (...)
Além disso, o acórdão recorrido reconheceu a existência de dano moral causado pela conduta das requerentes. Na esteira do precedente formado a partir do julgamento do REsp nº 722.510/RS (de minha relatoria, DJ de 1/2/2006), nas hipóteses em que "
o vício não causa dano, correrá para o consumidor o prazo decadencial, para que proceda a reclamação, previsto neste artigo 26. No entanto, vindo a causar dano, ou seja, concretizando-se a hipótese do artigo 12, deste mesmo Código, deve-se ter em mente o prazo qüinqüenal, disposto no art. 27, sempre que se quiser pleitear indenização
" (Arruda Alvim, Código do Consumidor Comentado. 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, pp. 172/173).
(STJ, REsp n.º 773.994/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, em 22/05/2007)
Como têm deliberado o TRF4,
"O prazo de 90 dias estatuído no art. 26, II, § 1º, do CDC, não se subsume ao caso vertente, em que não se está a tratar de reclamação quanto a um vício aparente na prestação de serviços, mas do alegado direito da parte autora de obter o diploma pelo curso que prestou, assim como a reparação civil pela impossibilidade de obtê-lo."
(TRF-4 - AC: 50147831220144047003 PR, Relatora: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 30/10/2019, QUARTA TURMA)
Em primeiro exame, o aventado direito, alegado pela parte autora, não restou atingido pela caducidade.
2.17. Incidência do Código de Defesa do Consumidor:
Com a publicação do CDC, inaugurou-se uma conhecida polêmica sobre o alcance das suas disposições. Grosso modo, as opiniões distribuíram-se em duas grandes correntes: os finalistas e os maximalistas.
Os finalistas amparam-se sobremodo na regra do art. 2º da lei 8078/1990:
"Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final."
Logo, em princípio, o CDC apenas tutelaria aquelas relações em que o serviço fosse prestado ou o bem fosse fornecido ao destinatário último, sem subsequentes repasses.
Essa orientação foi compartilhada, ao que se sabe, pelos principais idealizadores do projeto que eclodiu no código consumerista brasileiro: Ada Pellegrini Grinover, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin e outros.
Já a orientação maximalista promove uma leitura ampla do conceito de consumidor, destacando que a lei 8078 não tutelaria apenas o destinatário final de bens e serviços, sendo oponível também às relações entre empresas e até mesmo a órgãos públicos (amparando-se, nesse caso, na regra do art. 22, CDC). Essa orientação parece ser compartilhada por Rizzato Nunes, por exemplo (conforme o seu
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004).
Com esse pano de fundo, inúmeras discussões foram promovidas ao longo desses anos de vigência da lei 8078. Ao que releva, o CDC se aplica a entidades da Administração Pública, quando em causa serviços remunerados mediante preços públicos (art. 22, CDC).
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3.
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado
. 4. Recurso a que se nega provimento.(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
CIVIL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. CONTRATO DE TRANSPORTE DE ENCOMENDA SEM DECLARAÇÃO DE VALOR. EXTRAVIO DE MERCADORIA. VALOR DA INDENIZAÇÃO.1.
Qualifica-se como de consumo a relação jurídica contratual de transporte de encomendas. Precedente do STJ
. 2. É do fornecedor o ônus de provar claramente as condições contratuais particularmente em relação à opção de informar ou não o valor da mercadoria e o custo do serviço para o fim de indenização em caso de extravio segundo o valor exato da mercadoria transportada.3. Não é aceitável o fornecedor simplesmente alegar que o consumidor não declarou o valor para indenizar o prejuízo de acordo com critério unilateral.4. Apelação provida. (AC 00626681319984010000, JUIZ FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA (CONV.), TRF1 - TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR (INATIVA), DJ DATA:23/06/2005 PAGINA:81.)
D'outro tanto, em princípio, pessoas jurídicas também podem ser qualificadas como consumidoras, para fins de aplicação da lei 8.078/1990, desde que não esteja em causa a aquisição de matéria prima para seus processos produtivos.
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONSUMIDOR. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 2º E 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 8.078/90.I - "
O conceito de "destinatário final", do Código de Defesa do Consumidor, alcança a empresa ou o profissional que adquire bens ou serviços e os utiliza em benefício próprio
" (AgRg no Ag nº807159/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, DJ de 25/10/2008).II - No caso em exame, a recorrente enquadra-se em tal conceituação,visto ser empresa prestadora de serviços médico-hospitalares, que utiliza a água para a manutenção predial e o desenvolvimento de suas atividades, ou seja, seu consumo é em benefício próprio.III - A empresa por ser destinatária final do fornecimento de água e, portanto, por se enquadrar no conceito de consumidora, mantém coma recorrida relação de consumo, o que torna aplicável o disposto no artigo 42, parágrafo único, da Lei 8.078/90. IV - Recurso especial conhecido e provido...EMEN: (RESP 200800133166, FRANCISCO FALCÃO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:30/04/2008..DTPB:.)
Quanto à aplicação do CDC, quando se trate da prestação de serviços por empresas públicas, remunerados mediante preços públicos/tarifas, convém atentar para o art. 22, CDC:
"
Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos
. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código."
Atente-se ainda para os seguintes julgados:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CORREIOS. CARTA REGISTRADA. EXTRAVIO. DANOS MORAIS. IN RE IPSA. 1. As empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem- se ao regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal e nos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor. 2. No caso, a contratação de serviços postais oferecidos pelos Correios, por meio de tarifa especial, para envio de carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão de postagem revela a existência de contrato de consumo, devendo a fornecedora responder objetivamente ao cliente por danos morais advindos da falha do serviço quando não comprovada a efetiva entrega. 3. É incontroverso que o embargado sofreu danos morais decorrentes do extravio de sua correspondência, motivo pelo qual o montante indenizatório fixado em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi mantido pelo acórdão proferido pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena de enriquecimento sem causa. 4. Embargos de divergência não providos. ..EMEN:
(ERESP 201303279910, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, DJE DATA:24/02/2015 ..DTPB:.)
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado. 4. Recurso a que se nega provimento.
(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
De sua parte, Justen Filho enfatiza a dificuldade, não raro, de se conjugar o regime jurídico público - próprio das concessões ou de empresas públicas - com a aplicação da lógica do Código de Defesa do Consumidor:
"Ocorre que nem sempre é possível conciliar o regime de direito público com aquele do direito do consumidor. A cumulação dos mecanismos de serviço público e de direito do consumidor provoca um conflito de competências e de regime jurídico, cuja solução deve ser realizada com cautela.
Um exemplo permite compreender de imediato o problema. Segundo o direito do consumidor, é obrigatório o empresário manter a oferta realizada nas condições originais. Já no âmbito do serviço público, a mutabilidade é da sua inerência. Suponha-se, portanto, o caso da telefonia fixa. Imagine-se que o concessionário estabeleça relação jurídica com o usuário, orientando-se por determinada regulação do poder concedente. Se houver necessidade e conveniência, o poder concedente alterará as regras pertinentes, com reflexos na situação jurídica do usuário. Em face do regime de Direito Administrativo, o usuário não poderia invocar direito adquirido à manutenção de regime jurídico. Mas sua pretensões poderia encontrar respaldo no regime característico do direito do consumidor.
Não seria excessivo afirmar que a concepção do serviço público defere ao poder concedente a função de tutelar e defender o interesse coletivo (aí abrangido também o interesse do usuário). Já o direito do consumidor assegura ao próprio consumidor e às entidades da sociedade a função de sua defesa (sem que isso exclua a intervenção de órgãos estatais)
.
É fundamental tomar em vista, então, que a aplicação das normas do direito do consumidor não pode fazer-se em face do serviço público com idêntica extensão aplicável no caso de relações puramente privadas, relacionadas com a exploração de atividade econômica em sentido restrito." (JUSTEN FILHO, Marçal.
Teoria geral das
concessões
de serviço público.
São Paulo: Dialética, 2003, p. 557-558)
Assim, conquanto o CDC seja aplicável a serviços remunerados mediante preços públicos, tarifas ou pedágios - a exemplo do que ocorre com o fornecimento de energia elétrica, água, correios etc -, ele não incide quando em causa relações estritamente de direito administrativo.
No presente caso, o regime consumerista se aplica no que toca à Caixa Econômica Federal e à instituição de ensino, tanto por isso.
2.18. Efeitos da aplicação do CDC ao caso:
Dada a aplicação do CDC, no que toca à relação entre a autora e os requeridos, isso implica o reconhecimento de um conjunto de garantias asseguradas ao consumidor, conforme arts. 4º, 39 e 51 da lei 8078/1990.
Destaco, nesse âmbito, o dever de atuar com boa-fé (e o correspondente respeito à boa-fé objetiva), preconizado no art. 4º, III, CDC. Como diz Rizzatto Nunes,
"a boa-fé objetiva, que é a que está presente no Código de
defesa do consumidor
, pode ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo (...) Assim, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra."
(RIZZATTO NUNES
apud
EFING, Antônio Carlos.
Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de defesa do consumidor.
2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2012, p. 87).
Além de ser inerente à garantia do devido processo, esse dever de respeito à boa-fé também foi preconizado pelo art. 422, Código Civil/2002:
"
Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé
."
Vale a pena atentar para a lição de Antônio Carlos Efing:
"A boa-fé, assim, possui no macrossistema de direito civil, e, consequentemente no microssistema do direito do consumidor, uma séria de efeitos, seja como um princípio de função interpretativa, seja como cláusula geral geradora de deveres anexos e critério de constatação de exercício abusivo de um direito ou de uma cláusula abusiva. Como bem sintetiza Cláudia Lima Marques, 'o princípio da boa-fé objetiva na formação e na execução das obrigações possui muitas funções na nova teoria contratual: (a) como fonte de novos deveres especiais de conduta na nova teoria contratual; (b) como causa limitadora do exercício, antes lícito, hoje abusivo, dos direitos subjetivos, e (c) na concreção e interpretação dos contratos." (EFING, Antônio Carlos.
Obra citada.
p. 90).
De outro tanto, a incidência do CDC implica o dever, por parte do fornecedor, de disponibilizar ao consumidor informação adequada e clara sobre os diferentes serviços e produtos, com especificação correta da quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço (art. 6º, III, CDC c/ redação veiculada pela lei 12.741/2012).
Esses são alguns dos efeitos decorrentes da aplicação do CDC, quanto ao vínculo entre a requerente e o banco requerido.
2.19. Considerações gerais sobre o instituto do contrato:
O contrato é manifestação da autonomia da vontade. Em regra, desde que a vontade seja exteriorizada sem vícios (dolo, coação, vício redibitório etc.), ele vincula as partes, obrigando-as ao cumprimento das cláusulas avençadas.
É fato que essa concepção liberal do contrato tem sido esmaecida, dada a sua progressiva funcionalização. Importa dizer: a legislação atual também exige, para exame da validade do contrato, que os seus resultados sejam tidos em conta (p.ex., a vedação da onerosidade excessiva, conforme arts. 39 e 51,
CDC
e arts. 478/480, CC/2002).
Logo, em determinados casos, esse caráter vinculante dos contratos resta mitigado, frente à constatação de que muitos pactos são celebrados por adesão (contratos formulário), a existência de contratos cativos, superendividamento de muitos consumidores, propaganda abusiva etc.
Assim, não se desconhece que o Direito pátrio esposou, de certa forma, a teoria das bases objetivas do contrato, desenvolvida por Karl Larenz em solo alemão:
"Pela base objetiva do negócio tem de se entender o conjunto de circunstâncias e estado geral de coisas cuja existência ou subsistência é objetivamente necessária para que o contrato, segundo o significado das intenções de ambos os contratantes, possa subsistir como regulação dotada de sentido.
A base do negócio objetivo tem desaparecido: a) quando a relação de equivalência entre prestação e contraprestação pressuposta no contrato se tem destruído em tal medida que não pode falar-se racionalmente de uma contraprestação (destruição da relação de equivalência); b) quando a comum finalidade objetiva do contrato, expressada em seu conteúdo, tenha resultado definitivamente inalcançável, ainda quando a prestação do devedor seja, todavia, possível (frustração da finalidade).
Nos casos de destruição da relação de equivalência (IX, a), a parte prejudicada, no caso de não haver realizado a prestação, pode negar-se a fazê-lo contanto que a outra parte não consinta um adequado aumento da contraprestação que restaure a equivalência. Se se rechaça este aumento terminantemente
, a parte prejudicada pode resolver ou, em caso de uma prestação de larga duração já iniciada, denunciar imediatamente o contrato. Se tem realizado sua prestação pode, quando não se admita um adequado aumento posterior da contraprestação, reclamar uma indenização pelo valor do enriquecimento da outra parte.
Nos casos de frustração da finalidade (IX, b), o credor da prestação que resultou inútil pode recusá-la e negar-se a realizar sua contraprestação desde que suporte os gastos que a outra parte tenha realizado para a preparação e execução do contrato e que podiam considerar-se indispensáveis" (LARENZ, Karl.
Base del negócio jurídico y cumplimiento de los contratos.
Tradução do alemão para o espanhol por Carlos Fernándes Rodrigues. Granada: Editorial Comares, 2.002, pp. 211-212. Traduzi).
Reporto-me, a respeito do tema, ao seguinte julgado:
"
Não se perquire mais, como na teoria da Imprevisão, sobre a previsibilidade do fato econômico superveniente. E nem se deveria
. Com efeito, o fato pode ser até previsível, mas não é esperado, porque se esperado fosse, nem o Banco emprestaria o dinheiro e nem o tomador assumiria um compromisso que não pode arcar. Logo, o fato previsível, mas não esperado, situa-se na área do risco inerente a qualquer atividade negocial."
(TJRS, apelação cível de autos 193051083, quarta câmara cível, relator desembargador Márcio de Oliveira Puggina, julgado em 24 de junho de 1994)
Ademais, a legislação consumerista determina a revisão parcial dos contratos, atingindo-se apenas as cláusulas eventualmente viciadas, mas preservando seus demais termos (art. 51, §2º, CDC).
Em que pese tudo isso, é fato, porém, que o contrato não pode ser simplesmente desconsiderado pelo Judiciário. Ele ainda é instituto fundamental para a economia, permitindo o fluxo de bens e o planejamento individual. Logo, conquanto seja certo que o contrato não pode ser suposto como algo inexorável, igualmente certo que tampouco pode ser simplesmente abstraído, como se fosse destituído de qualquer eficácia obrigacional. Tanto por isso, a revisão contratual deve ser promovida com cautelas. Deve-se conjugar a preservação dos direitos fundamentais - cláusulas de ordem pública veiculadas na lei 8078/1990 -, com o reconhecimento da força vinculante dos pactos.
Por sinal, eventuais dificuldades financeiras, caso suportadas pelo devedor, não justificam, por si, o reconhecimento de onerosidade excessiva. Pode-se cogitar de eventual aplicação da teoria da lesão contratual, mas desde que preenchidos os rigorosos requisitos do art. 157, Código Civil/2002.
Como explicita Judith Martins-Costa,
"
A desproporção manifesta é sempre referida à prestação considerada objetivamente, e não à situação subjetiva na qual se encontra o devedor cujas dívidas derivadas de outras relações obrigacionais tenham, por hipótese, aumentado
."
(Judith Martins-Costa.
Comentários ao novo código civil.
Do direito das obrigações. Do adimplemento e da extinção das obrigações. Arts. 304 a 388, volume V, tomo I. 2ª ed. RJ: Forense, 2003, p. 305).
2.20. Funcionalização dos contratos:
Diante do já exposto, vê-se que o instituto jurídico do contrato tem sido funcionalizado, em tempo mais recente. Isso significa que ele deve atender a interesses sociais relevantes, viabilizando-se um controle do seu conteúdo quanto às cláusulas abusivas, manifestamente desproporcionais. O tema é bem exemplificado pela ingerência estatal em contratos de locação, contratos educacionais etc.
No passado, um contrato apenas poderia ser invalidado se as vontades houvessem sido manifestadas com vícios. O exemplo clássico era do sujeito que, pensando ter comprado um candelabro de prata, leva para casa um de ferro fundido, podendo então revisar aludido contrato. Em um período mais recente, porém, os contratos passaram a sofrer significativa ingerência estatal, emk prol da efetivação de certos valores comunitários.
O Estado interfere em contratos de prestação de serviços de saúde, em contratos de locação, em contratos de prestação de serviços educacionais, em contratos de transporte e assim por diante. Trata-se de uma funcionalização dos pactos, que passam a servir de instrumento para efetivação de valores que transcentem os interesses imediatos dos contratantes.
2.21. Interpretação de contratos de adesão:
Diante do já exposto, vê-se que o instituto jurídico do contrato tem sido funcionalizado, em tempo mais recente. Isso significa que ele deve atender a interesses sociais relevantes, viabilizando-se um controle do seu conteúdo quanto às cláusulas abusivas, manifestamente desproporcionais. O tema é bem exemplificado pela ingerência estatal em contratos de locação, contratos educacionais etc.
Ao mesmo tempo, porém, o sistema continua a viabilizar a revisão e anulação de pactos, sempre que comprovado que, por época da sua celebração, a vontade não teria sido manifestada de modo livre, como se infere dos conhecidos institutos do dolo, coação, vício redibitório e teoria da lesão (arts. 138, 145, 151 e 157, Código Civil/2002).
Note-se, todavia, que o contrato não pode ser presumido como inválido tão somente por ter sido lavrado em um formulário padronizado (contrato de adesão). Afinal de contas, tais instrumentos são indispensáveis para o comércio jurídico contemporâneo.
Contudo, havendo cláusulas ambíguas, a lei determina que sejam interpretadas de modo mais favorável ao aderente, conforme art. 423, Código Civil:
"Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente."
Outra ressalva importante é ditada pelo art. 424, CC/2002:
"
Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio
."
De outro tanto, registro que a súmula nº 381 do STJ preconiza que "
nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas
.
"
2.22. Eventuais novações contratuais:
Anoto também que eventual novação contratual não impede, por si, a revisão de todo o período de dívida, desde que o tema seja alvo de pedido expresso e fundamentado na peça inicial (art. 141, novo CPC), apontando-se qual o pretenso vício (p.ex., vício redibitório, aplicação da teoria da lesão contratual, presença de dolo, coação, onerosidade excessiva etc.).
Atente-se para a conhecida súmula 286, STJ:
"
A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores
."
Na espécie, foram aveçançados aditivos contratuais inerentes à sistemática do FIES. De todo modo, a parte autora almeja revisão contratual apenas da etapa alusiva à carência.
2.23. Eventuais contratos bilaterais:
Cuidando-se de contrato sinalagmático,
"nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.
" (art. 476, Código Civil/2002). Cuida-se de simples projeção do postulado
non venire contra factum proprium,
dado que ninguém pode exigir aquilo que não está disposto a cumprir. Quem inadimpliu o contrato tampouco pode exigir que o outro contratante cumpra suas obrigações, como cediço.
Explicita Maria Helena Diniz que
"A exceptio non adimpleti contractus é a cláusula resolutiva tácita que se prende ao contrato bilateral.
Isto é assim porque o contrato bilateral requer que as duas prestações sejam cumpridas simultaneamente, de forma que nenhum dos contratantes poderá, antes de cumprir suas obrigações, exigir o implemento das do outro
. (...) Pelo enunciado n. 24, aprovado na 1. Jornada de direito comercial, os contratos empresariais coligados, concretamente formados por unidade de interesses econômicos, permitem a arguição da exceção de contrato não cumprido, salvo quando a obrigação inadimplida for de escassa importância."
(DINIZ, Maria Helena.
Código civil anotado.
17. ed. São Paulo: Saraiva. 2014. p. 450).
Por conseguinte, também nesse âmbito, deve-se aferir se houve adimplemento substancial.
2.24.
Contrato de mútuo
feneratício:
Sabe-se que o empréstimo é um contrato em regra unilateral, gratuito, real e personalíssimo em que uma das partes recebe, para usar ou consumir, uma coisa que, depois de certo tempo, deve restituir ou – no caso de ser fungível o objeto – restituir por outra do mesmo gênero, quantidade e qualidade. Sua função econômica está em propiciar, para aquele que não é dono do que necessita, o uso (em regra, mas também a fruição, excepcionalmente) do que lhe pode ser disponibilizado, para a finalidade almejada. As modalidades de empréstimo são o comodato e o mútuo.
O comodato é o empréstimo de bens infungíveis. Nesse contrato, não há transmissão da propriedade do objeto emprestado, devendo-se o comodatário restituir ao comodante - ou seja, o proprietário do bem - exatamente a mesma coisa emprestada, devidamente preservada. Caso não a restitua, por dolo, pode responder por apropriação indébita - art. 168, Código Penal.
Já o mútuo cuida do empréstimo de bens fungíveis. Nesse caso, o objeto do contrato é consumido, em regra, pelo mutuário. Ao receber o objeto, ele se torna seu dono, ao tempo em que se torna devedor do mutuante. Fica obrigada a lhe entregar coisa do mesmo gênero, espécie, com eventuais juros remuneratórios, se pactuados (nesse caso, o mútuo será feneratício). O inadimplemento da obrigação não caracteriza apropriação indébita - dado que o mútuo transmite a propriedade por época da tradição (entrega) do objeto emprestado ao mutuário. Contudo, o mutuário poderá ser demandado, exigindo-se o pagamento do valor pertinente, com os juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e eventuais multas, quando pactuados.
A diferença entre comodato e mútuo pode ser compreendida da seguinte forma. Se alguém empresta um veículo para uma empresa (comodato) e a empresa acaba falindo, pode requerer a restituição do bem específico, que lhe pertence, ainda que se encontre mantido indevidamente no pátio da massa falida. Caso, porém, tenha emprestado dinheiro em espécie para essa mesma empresa, não poderá requerer que lhe seja entregue a quantia específica, dede logo, ao argumento de ser sua, já que se trata de crédito, oponível ao patrimônio da massa falida, devendo se habilitar em lista de credores.
Atente-se para os arts. 586 e 587, Código Civil/2002:
"O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.
Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição
."
Menciono ainda o que segue:
"O contrato de mútuo é a modalidade de empréstimo prevista no art. 586 do CC/2002 e seguintes, e diferencia-se do comodato quanto à natureza da coisa em- prestada. Enquanto no comodato se dá o empréstimo de coisa não fungível para uso e posterior devolução (art. 579 do CC/2002 ), no mútuo se dá o empréstimo coisa fungível a fim de que seja consumida e posteriormente substituída por coisa de mesma espécie ou gênero, qualidade e quantidade. Assim dispõe o art. 586: “Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade”.
A fungibilidade de determinado bem é constatada no caso concreto, mas o Código Civil de 2002 oferece alguns critérios: “Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Art. 86. São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação”.
Nas palavras de Sérgio Covello: “Há mútuo, ou empréstimo de consumo, toda vez que uma parte entrega à outra certa quantidade de coisas fungíveis, que esta última fica autorizada a consumir, arcando com a obrigação de restituir no tempo avençado, não as mesmas coisas, mas em quantidade, gênero e qualidade equivalentes”. Ou, como define Maria Helena Diniz, “o mútuo é o contrato pelo qual um dos contraentes transfere a propriedade de bem fungível a outro, que se obriga a lhe restituir coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (art. 586 do CC/2002 )”.
Conforme o art. 587 do CC/2002 , o mútuo é um contrato real, visto que somente se aperfeiçoa com a tradição da coisa fungível: “Art. 587. Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição”. A relação contratual, assim, somente se tem por formada com a transferência da propriedade do bem fungível, a fim de que seja consumido e, ao final, substituído por outro.
Sendo a tradição requisito para a formação do contrato de mútuo, a entrega da coisa fungível pelo mutuante (aquele que dá a coisa fungível em empréstimo) é apenas um ato de aperfeiçoamento do contrato, não uma obrigação. Como esclarece Carlos Roberto Gonçalves: “a traditio é, pois, requisito de constituição da relação contratual, sem a qual há apenas promessa de mutuar (pactum de mutuo dando), contrato preliminar que se não confunde com o próprio mútuo”. Uma vez aperfeiçoado o contrato pela tradição da coisa, ali se esgota a atuação do mutuante e, em regra, apenas o mutuário (aquele que toma a coisa em empréstimo) contrai obrigações, como a devolução de coisa de mesmo gênero, quantidade e qualidade. O mútuo também é, desta forma, um contrato unilateral." (
EFING, Antônio.
Contratos e procedimentos bancários à luz do código de defesa do consumidor
. SP: RT. 2015. item 5.4.).
2.25.
Direito
à
educação
sob a ótica constitucional:
A educação é direito fundamental, conforme se infere do art. 6º da Constituição Federal. Encontra-se garantida, pois, contra o retrocesso social, na forma do art. 26 do Pacto de San Jose de Costa Rica. O tema é versado pelos arts. 205 e ss. da Lei Maior/88
.
Releva atentar para os princípios a serem observados pelos educadores e gestores públicos:
Art. 206 - Constituição.
O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino
; IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII - garantia de padrão de qualidade. VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal. Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
O art. 207 da Constituição/88 assegura às universidades a autonomia didático-científica, bem como a autonomia administrativa e de gestão financeira. Importa dizer: cabe às entidades de ensino superior administrar seus quadros, elaborar seus currículos e gerir seus recursos.
Por outro lado, é relevante atentar para o art. 47 da lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que versa sobre as diretrizes e bases da educação nacional:
Art. 47. Na educação superior, o ano letivo regular, independente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver. § 1º
As instituições informarão aos interessados, antes de cada período letivo, os programas dos cursos e demais componentes curriculares, sua duração, requisitos, qualificação dos professores, recursos disponíveis e critérios de avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas condições
. § 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino. § 3º É obrigatória a freqüência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância. § 4º As instituições de educação superior oferecerão, no período noturno, cursos de graduação nos mesmos padrões de qualidade mantidos no período diurno, sendo obrigatória a oferta noturna nas instituições públicas, garantida a necessária previsão orçamentária.
Ademais, a educação é um direito-dever fundamental, eis que indispensável para o desenvolvimento de uma comunidade de pessoas livres e autônomas. Em princípio, trata-se de serviço a ser prestado pelo Estado e também pela sociedade, com reconhecimento da pluralidade inerente à pesquisa e ensino. As entidades privadas submetem-se a um regime especial de prestação de serviços. Não podem desconsiderar o caráter eminentemente público da educação superior, regrada pela lei 9.394/1996, dentre outros diplomas normativos.
Reporto-me ao art. 6º e ao art. 205 da Lei Fundamental de 1988 e também à lógica do art. 6º da lei 9870/1999, que estabelece:
"São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias."
Registro, porém, que o art. 5º da aludida lei 9870 parece autorizar, em leitura
a contrario sensu,
que a instituição de ensino indefira a matrícula de alunos inadimplentes, como já decidido pelo eg. STJ e pelos Tribunais Regionais:
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. INSTITUIÇÃO PARTICULAR. INADIMPLÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA. 1. O art. 5º da Lei nº 9.870/99, ao assegurar o direito da rematrícula aos alunos que matriculados em determinada instituição de ensino, exclui os inadimplentes. 2.
Dessa forma, nenhuma norma é descumprida caso a universidade particular resolva não mais prestar serviços educacionais aos estudantes em tal situação, uma vez que decorre de relação contratual
. 3. Decidiu com acerto o Tribunal a quo ao aplicar ao presente caso a teoria do fato consumado. 4. Recurso especial improvido." (RESP 200301922068, CASTRO MEIRA - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:16/08/2004 PG:00232 ..DTPB:.)
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR PRIVADO. INADIMPLÊNCIA. AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA. DEFERIMENTO LIMINAR PARA MATRÍCULA. DECURSO DO TEMPO. CONSOLIDAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO FÁTICA. ESTABILIDADE DAS RELAÇÕES SOCIAIS. RESSALVA DOS EFEITOS CONSOLIDADOS PELO TEMPO. I -
Jurisprudência desta Corte firme no entendimento da legitimidade da recusa da instituição de ensino superior em renovar matrícula de aluno que se encontra em situação de inadimplência, com apoio nos arts. 5º e 6º da Lei nº 9.870/99
. II - Todavia, deferido o pedido liminar para matrícula do Impetrante em agosto de 2006, há que se concluir que a essa altura o Requerente já colou grau, consolidada uma situação de fato que deve ser preservada, com apoio na segurança jurídica e estabilidade das relações sociais. Pensar diferente, destarte, é incorrer em medida desarrazoada e desproporcional e, por conseguinte, ilegal, relativizada a autonomia universitária nesse contexto em prestígio ao direito constitucional à educação. Precedentes. III - Remessa oficial e apelação da ASOEC providas, ressalvados, todavia, os efeitos do fato consolidado. (AMS 200638030069601, DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:01/07/2013 PAGINA:74.)
ADMINISTRATIVO - ENSINO SUPERIOR - INSTITUIÇÃO PARTICULAR - INADIMPLÊNCIA DO ALUNO - RECUSA DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA - POSSIBILIDADE. 1. Apelação contra sentença que, em Mandado de Segurança, concedeu a segurança requerida, com o fim de assegurar a efetivação da matrícula em estabelecimento privado de ensino superior, independentemente de inadimplência com relação ao pagamento das mensalidades. 2.
A Constituição Federal prevê a gratuidade do ensino público, entretanto, apenas em estabelecimentos oficiais, implicando a opção por estudo em entidades privadas de ensino no ônus de pagamento das mensalidades
. 3. "
O art. 5º, da Lei 9.870/99, assegura aos alunos de instituições de ensino superior o direito de renovação de matrícula excluindo, expressamente, os alunos inadimplentes
." (TRF 5ª REGIÃO AC351566/RN- SEGUNDA TURMA- DJ: 19/11/2007- Rel. Des. Federal Manoel Erhardt). 4. A inadimplência em um semestre implica a negativa de matricula para o semestre subsequente, sendo legal, portanto a negativa de matrícula, ressalvada a hipótese de consumação do fato em um ou mais semestre que o impetrante tenha cursado por força de decisão judicial. 5. Apelação provida. (AC 200881000046419, Desembargador Federal Francisco Barros Dias, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::25/02/2010 - Página::398.)
Sem dúvida alguma que o referido dispositivo deve ser tomado com temperamentos, diante da natureza essencial do aludido serviço, sobremodo quando em causa alunos em estágio avançado da graduação e com eventuais problemas financeiros pontuais. Por sinal, também há julgados reconhecendo que, em tais casos, mesmo a recusa à renovação de matrícula seria inválida, por conta dos vetores constitucionais já mencionados acima:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. RECUSA DA MATRÍCULA. DÉBITOS PENDENTES DE MENSALIDADES. RECONHECIMENTO DE ASSIDUIDADE. -
A recusa da matrícula não pode ser utilizada como meio de cobrança de mensalidades em atraso, sob pena de violação ao direito fundamental à educação, previsto na Constituição Federal. - Pedido de reconhecimento de freqüência às aulas extinto sem julgamento de mérito por ausência de prova do direito líquido e certo. - Remessa oficial improvida
. (REO 200572010042603, SILVIA MARIA GONÇALVES GORAIEB, TRF4 - TERCEIRA TURMA, DJ 07/06/2006 PÁGINA: 436.)
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. RECUSA DA MATRÍCULA. DÉBITOS PENDENTES DE MENSALIDADES. LEI Nº 9.870/99. - O cancelamento da matrícula não pode ser utilizado como meio de cobrança de mensalidades em atraso, sob pena de violação ao direito fundamental à educação, previsto na Constituição Federal. -
A matrícula da impetrante para cursar o IX semestre do curso de Direito foi aceita após a realização de acordo sobre os débitos pretéritos e cancelada algum tempo depois, o que comprova a ilegitimidade da sanção aplicada, em razão do disposto nos arts. 5º e 6º da Lei nº 9870/99
. - Medida liminar que produziu seus efeitos de forma definitiva, cabendo atender ao dever do Estado de assegurar a estabilidade das relações jurídicas constituídas por força de decisão judicial, respeitando-se os direitos subjetivos formados sob sua proteção e atendendo à teoria do fato consumado. - Remessa oficial improvida. (REO 200371090011459, SILVIA MARIA GONÇALVES GORAIEB, TRF4 - TERCEIRA TURMA, DJ 12/05/2004 PÁGINA: 646.)
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO. RECUSA DA MATRÍCULA. INADIMPLÊNCIA.
A recusa da matrícula não pode ser utilizada como meio de cobrança de mensalidades em atraso, sob pena de violação ao direito fundamental à educação, previsto na Constituição Federal
. (AMS 200671000503168, MARGA INGE BARTH TESSLER, TRF4 - QUARTA TURMA, D.E. 04/08/2008.)
Também é fato que o universitário se obriga, quando contrata com uma instituição de ensino superior particular, ao pagamento das mensalidades respectivas. A entidade carece de tais verbas para pagamento do seu quadro de professores e demais funcionários, não se podendo, tanto por isso, estimular a inadimplência, por mais relevante que seja o serviço público prestado.
O equacionamento desses vetores envolve uma arte difícil, dada a necessidade de se assegurar o direito fundamental ao ensino, mas sem prejuízo também dos créditos a que faça jus a faculdade ou universidade respectivas.
2.26. Programa educacional -
FIES:
O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior encontra-se regulado pela lei 10.260/2001, fruto da conversão da MP 2.094-28/2001. Esse programa destina-se à concessão de financiamento a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores não gratuitos (art. 1º).
O programa permite o financiamento de até 100% dos encargos educacionais cobrados dos estudantes por parte de entidades de ensino superior, cadastradas junto ao Ministério da Educação (art. 4º).
A lei 10.260 dispõe, no seu art. 5º, sobre os financiamentos, impondo, dentre outros, os seguintes detalhes: (a) prazo: não pode ser superior à duração regular do curso, abrangendo todo o período em que o FIES custear os encargos educacionais, inclusive períodos de suspensão temporária; (b) juros, capitalizados mensalmente, a serem estipulados pelo CMN (redação veiculada pela 12.431/2011); (c) oferecimento de garantias adequadas ao estudante financiado; (d) carência - 18 meses contados a partir do mês imediatamente subsequente ao da conclusão do curso; (e) distribuição parcial dos ricos para as instituições de ensino superior.
Aludidos contratos encontram-se, portanto, regulados em lei. Trata-se de mecanismo funcionalizado, destinado à implantação de uma política educacional, viabilizando o acesso a crédito para estudantes de baixa renda.
Ao contrário das práticas mercantis corriqueiras, o referido mútuo prevê um prazo de carência, em que o mutuário paga apenas juros a cada três meses, e limitados a aproximados R$ 50,00, por exemplo. Essa peculiaridade do mútuo destinado ao financiamento educacional não pode ser olvidada, como se percebe. O contrato não pode ser confrontado, sem mais, com instrumentos outros, destinados ao financiamento de veículos ou imóveis, por exemplo, dadas as suas peculiaridades.
Ademais, o FIES prevê uma sistemática de reiterados aditamentos contratuais (
"O estudante deverá reafirmar junto à CAIXA, semestralmente, em período fixado pelo MEC, a intenção de continuar a utilizar esse financiamento por meio de aditamento contratual."
).
2.27. Quanto à garantia pessoal - fiança:
A fiança é regulada pelos arts. 818 e ss. do Código Civil/2002. Trata-se de uma garantia fidejussória, destinada a assegurar o pagamento da obrigação alheia. É
"
o contrato que tem por objeto a obrigação assumida por uma pessoa com o credor de outra de pagar dívida desta, caso ela não o faça
."
(ESPÍNDOLA, Eduardo.
Dos contratos nominados no direito civil brasileiro.
Rio de Janeiro: Gazeta Judiciária, 1953, p. 403).
Em princípio, portanto, o fiador faz jus ao benefício de ordem, conforme se infere do art. 827, Código Civil:
Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.
Parágrafo único.
O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito
.
Logo, como regra, o patrimônio do fiador apenas pode ser constrito para satisfação da dívida caso, antes, o credor tenha executado o afiançado. Todavia, para invocação desse benefício, a lei impõe uma condição: a de que o fiador indique bens, livres e desembaraçados, do devedor principal.
Importa dizer: a invocação do benefício de ordem não se presta a apenas protelar a satisfação da dívida. Atente-se, ademais, para a regra do art. 595, CPC: "
O fiador, quando executado, poderá nomear à penhora bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação do direito do credor. Parágrafo único. O fiador, que pagar a dívida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo."
Ademais, não bastasse isso, também é certo que, por força de lei, o fiador pode renunciar ao benefício de excussão (conforme art. 828, I, CC). De outro tanto, a lei 10.260, que regula o FIES, prevê uma fiança solidária (art. 5º, §9º, II e art. 4º, §7º). A
Portaria 10/2010 do MEC
, que trata dos procedimentos para inscrição e contratação de financiamento estudantil a ser concedido pelo Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES), tratando das garantias a serem prestadas para celebração/novação do contrato.
2.28. Alcance da lei n. 9.807
Acrescento que o art. 6 da
lei n
o
9.870, de 23 de novembro de 1999
, veda que a instituição de ensino retenha
diploma
em casos de inadimplência, utilizando aludida expediente com o fim de viabilizar o pagamento de verbas em atraso.
Art. 6o
São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias
. § 1o O desligamento do aluno por inadimplência somente poderá ocorrer ao final do ano letivo ou, no ensino superior, ao final do semestre letivo quando a instituição adotar o regime didático semestral. (Vide Medida Provisória nº 1.930, de 1999) (Incluído pela Medida Provisória nº 2.173-24, de 2001) § 2o Os estabelecimentos de ensino fundamental, médio e superior deverão expedir, a qualquer tempo, os documentos de transferência de seus alunos, independentemente de sua adimplência ou da adoção de procedimentos legais de cobranças judiciais. (Renumerado pela Medida Provisória nº 2.173-24, de 2001) § 3o São asseguradas em estabelecimentos públicos de ensino fundamental e médio as matrículas dos alunos, cujos contratos, celebrados por seus pais ou responsáveis para a prestação de serviços educacionais, tenham sido suspensos em virtude de inadimplemento, nos termos do caput deste artigo. (Renumerado pela Medida Provisória nº 2.173-24, de 2001) § 4o Na hipótese de os alunos a que se refere o § 2o, ou seus pais ou responsáveis, não terem providenciado a sua imediata matrícula em outro estabelecimento de sua livre escolha, as Secretarias de Educação estaduais e municipais deverão providenciá-la em estabelecimento de ensino da rede pública, em curso e série correspondentes aos cursados na escola de origem, de forma a garantir a continuidade de seus estudos no mesmo período letivo e a respeitar o disposto no inciso V do art. 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente. (Renumerado pela Medida Provisória nº 2.173-24, de 2001)
Menciono o entendimento do STJ a respeito do tema:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. ENSINO SUPERIOR. INSTITUIÇÃO PARTICULAR. INADIMPLÊNCIA DE ALUNA. PROIBIÇÃO DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA. POSSIBILIDADE. 1. "O aluno, ao matricular-se em instituição de ensino privado, firma contrato oneroso, pelo qual se obriga ao pagamento das mensalidades como contraprestação ao serviço recebido.
O atraso no pagamento não autoriza aplicar-se ao aluno sanções que se consubstanciem em descumprimento do contrato por parte da entidade de ensino (art. 5º da Lei 9.870/99), mas está a entidade autorizada a não renovar a matrícula, se o atraso é superior a noventa dias, mesmo que seja de uma mensalidade apenas
." ( REsp 660.439/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 27/6/2005). 2. "A negativa da instituição de ensino superior em renovar a matrícula de aluno inadimplente, ao final do período letivo, é expressamente autorizada pelos arts. 5º e 6º, § 1º, da Lei 9.870/99.") REsp 553.216/RN, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 24/5/2004). 3. Hipótese em que se conclui pela subsistência das alegações da instituição recorrente. 4. Recurso Especial conhecido em parte e, nessa parte, provido. (STJ - REsp: 712313 DF 2004/0181007-3, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 12/12/2006, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 13/02/2008 p. 149)
2.29. Alcance da lei 9.870/99:
Nem mesmo em caso de inadimplemento do(a) aluno(a), é dado à instituição de ensino reter o diploma pertinente ou proibi-lo de realizar provas e demais atividades de avaliação, conforme art. 6º da lei n. 9.870, de 23 de novembro de 1999:
"
São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento
, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias."
Na base disso encontra-se a premissa de que as universidades não podem utilizar os mecanismos de certificação acadêmica como instrumentos de cobrança, cabendo-lhe demandar a efetivação dos seus direitos com o emprego dos meios legalmente previstos para tanto, no que não se incluem a retenção de documentos, recusa de aplicação de provas etc.
A retenção de documentos aproximar-se-ia de uma forma de exercício arbitrário das próprias razões, vedado pelo art. 345, Código Penal/40 e também à lógica da vedação do emprego de pacto comissório - art. 765 do CC/1916 e art. 1.428 do CC/2002
.
O mesmo se aplica também quando em causa a vedação de realização de atividades de avaliação.
PJe- ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. INADIMPLÊNCIA. COLAÇÃO DE GRAU E DIPLOMA. POSSIBILIDADE. ART. 6º DA LEI Nº 9.870/99. I
Nos termos do disposto no caput do art. 6º da Lei nº 9.870/99, são proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias
. II A conduta da instituição de ensino superior em obstar a expedição do respectivo diploma do aluno em razão de inadimplência viola a regra prevista no art. 6º da Lei nº 9.870/99, de modo que devida a manutenção da sentença proferida em primeiro grau de jurisdição. III Remessa oficial a que se nega provimento. (TRF-1 - REO: 10001136720174013300, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 17/02/2020, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 20/02/2020)
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. ALUNO INADIMPLENTE. SANÇÃO PEDAGÓGICA. DESCABIMENTO. ART. 6º DA LEI Nº. 9.870/99. PARTICIPAÇÃO NA CERIMÔNIA DE COLAÇÃO DE GRAU E EXPEDIÇÃO DO DIPLOMA DE BACHAREL EM DIREITO. SITUAÇÃO FÁTICA CONSOLIDADA. I -
O art. 6º da Lei nº. 9.870/99 proíbe "a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias"
. II - Ademais, na espécie dos autos, deve ser preservada a situação de fato consolidada com o deferimento da liminar, postulada nos autos, assegurando a participação dos impetrantes na solenidade de colação de grau, no curso de direito, que, pelo decurso do prazo, há muito já ocorreu. III - Remessa oficial desprovida. Sentença confirmada. (REO 0011387-67.2007.4.01.3600 / MT, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.192 de 25/02/2009)
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. DÉBITO DE MENSALIDADES. RETENÇÃO DE DIPLOMA. -
O art. 6º, da Lei 9.870/99, proíbe a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, enquadrando-se nesse tipo de sanção a retenção de diploma
. (TRF-4 - REO: 22579 PR 2005.70.00.022579-4, Relator: VALDEMAR CAPELETTI, Data de Julgamento: 19/04/2006, QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 10/05/2006 PÁGINA: 831)
Os Tribunais têm reputado adequada, porém, a vedação de matrícula de estudantes inadimplementes, diante dos limites da referida lei n. 9.870/1999. Isso acabou por ensejar, de certo modo, que cursos anuais passassem a ser ofertados de modo semestral, de modo que a cada 06 meses os estudantes precisam comprovar a regularidade no pagamento das mensalidades pertinentes.
2.30. Inscrição em cadastro de inadimplentes:
Conquanto o credor possa promover o lançamento do nome do devedor em castros de restrição ao crédito, isso demanda o rigoroso preenchimento dos requisitos dos arts. 43 e 44 do Código de Defesa do Consumidor (lei n. 8.078/1990). Assim, para tanto, deve ser encaminhada missiva prévia para o endereço atual do cliente, conforme art. 43, §2º, CDC/1990.
"DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO EM CADASTRO de INADIMPLENTES. VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1 -
Caracteriza constrangimento ensejador de danos morais a inscrição do nome do devedor em cadastro de inadimplentes, sem a necessária notificação prévia por parte do fornecedor do serviço
. 2 - O valor da indenização deve levar em consideração o dano em si e as condições pessoais da vítima e do ofensor, de modo a graduar valor suficiente para compensar a dor moral, ao mesmo tempo que pune o ofensor para que não mais repita atos deste tipo, guiando-se pela razoabilidade no sopesar a necessidade de compensar o sofrimento moral e punir o ofensor, ao mesmo tempo que não se permite que tal indenização se torne enriquecimento ilícito . 3 - Recurso provido. (...)" (Processo 143566020044013, ..REL_SUPLENTE:, TR1 - 1ª Turma Recursal - MT, DJMT 10/11/2004.)
É fato que o STJ tem entendido que, para tanto, bastaria a remessa da missiva para o endereço do devedor, sendo desnecessário o aviso de recebimento:
RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. NECESSIDADE. ART. 43, § 2º DO CDC. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. VALOR. ALTERAÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA 07/STJ. 1.
A Segunda Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp 1.083.291/RS, representativo de controvérsia repetitiva, (art. 543 -C CPC), consolidou o entendimento de que para a prévia notificação ao consumidor da inscrição de seu nome em cadastro restritivo de crédito basta o envio de correspondência dirigida ao endereço do credor, sendo desnecessário aviso de recebimento
. 2. O STJ já consolidou sua jurisprudência no sentido de que "a ausência de prévia comunicação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastros de proteção ao crédito, prevista no art. 43, §2º do CDC, enseja o direito à compensação por danos morais, salvo quando preexista inscrição desabonadora regularmente realizada." (Recurso Especiais em Processos Repetitivos nºs 1.061.134/RS e 1.062.336/RS) 3. Na espécie, o Tribunal de origem, analisando as provas constantes dos autos, entendeu não ocorrido a prova do prévio envio da notificação ao consumidor. Assim, a revisão do acórdão, para se alcançar conclusão diversa quanto ao ponto, demandaria a reapreciação das provas, providência que encontra óbice na Súmula 7/STJ. 4. Nos termos da jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça, a revisão de indenização por danos morais só é possível em recurso especial quando o valor fixado nas instâncias locais for exorbitante ou ínfimo, de modo a afrontar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ausentes tais hipóteses, incide a Súmula n. 7 do STJ, a impedir o conhecimento do recurso. 5. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGRESP 201303480751, LUIS FELIPE SALOMÃO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:22/05/2014 ..DTPB:.)
Acrescento também que revela-se incabível o lançamento do nome do aventado devedor em tais registros de inadimplentes, enquanto ele encontre-se discutindo a dívida, fundado em argumentos densos:
"O fumus boni iuris está caracterizado ante a jurisprudência dominante nesta Corte, no sentido de vedar o lançamento do nome do devedor nos bancos de dados de proteção ao crédito, tais o SERASA e o SPC, quando discutido judicialmente o débito"
(STJ, 3ª T., MC 2938/SP, Rel. Min. ALBERTO M. DIREITO, DJ DE 04.12.2000, pg. 063)
Leia-se:
"Estando o montante da dívida sendo objeto de discussão em juízo, pode o Magistrado conceder a antecipação da tutela para obstar o registro do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito. Recurso especial não conhecido."
(RESP 200101940211, BARROS MONTEIRO, STJ - QUARTA TURMA, DJ DATA:09/12/2002 PG:00348 ..DTPB:.)
Atente-se ainda para o seguinte julgado:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INSCRIÇÃO DO NOME DA PARTE NOS CADASTROS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - REJEITADA - LEGITIMIDADE PASSIVA ÓRGÃO MANTENEDOR - DADOS ORIUNDOS DE OUTROS CADASTROS MANTIDOS POR ENTIDADES DIVERSAS - PRÉVIA NOTIFICAÇÃO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO - DEVER DE INDENIZAR. O Superior Tribunal de Justiça no julgamento do RESP 1061134/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, decidiu pela legitimidade passiva dos órgãos mantenedores de cadastros de proteção ao crédito para responder pela reparação de danos morais decorrentes da inscrição do nome do devedor, sem sua notificação prévia, mesmo quando tais dados forem oriundos de outros cadastros mantidos por entidades diversas.
A inscrição do nome do Autor nos cadastros de restrição ao crédito é devida quando precedida de notificação encaminhada ao endereço fornecido pelo credor, não havendo que se falar em dano moral passível de indenização. "É dispensável o aviso de recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em banco de dados e cadastros
." Súmula 404/STJ. (TJ-MG - AC: 10024143336824001 MG, Relator: Marcos Henrique Caldeira Brant, Data de Julgamento: 02/05/2018, Data de Publicação: 11/05/2018)
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. IBAMA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. JUNTADA DE CERTIDÃO NEGATIVA DE AGRAVAMENTO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTE. DANO MORAL EM IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, na forma da Lei nº 9.783/99, interrompendo-se por qualquer ato inequívoco que importe apuração do fato, para tanto não se prestando a juntada de certidão negativa de agravamento. 2.
O dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplente é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
3. Em tema de inscrição indevida em cadastro de devedores, a quantia de R$ 5.000,00, segundo inúmeros precedentes deste tribunal, bem repara o dano sofrido, uma vez que cumpre a finalidade pedagógica de fazer com que o réu não cometa o mesmo erro e, concomitantemente, impede o enriquecimento sem causa da parte lesada. (TRF4, AC 5015079-34.2019.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 04/12/2021)
2.31. Prazo de manutenção da inscrição:
Por conta do art. 206, §5, I, Código Civil, os Tribunais têm enfatizado que o registro de inadimplementos do consumidor, junto aos cadastros restritivos ao crédito, estão submetidas ao prazo de persistência de 05 (cinco) anos, como ilustra o segunte julgado do TRF4:
ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL ( FIES). RESPONSABILIDADE DO FIADOR. PRESCRIÇÃO. ART. 206, § 5º DO CPC. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. - É entendimento deste Tribunal que o contrato de fiança se dá por escrito e não admite interpretação extensiva (art. 819 do Código Civil), de modo que o fiador não está obrigado ao pagamento de valores emprestados para pagamento de mensalidades de período previsto em termo de aditamento ou termo de anuência não assinados por ele - No caso dos autos, todavia, não há como afastar a responsabilidade do fiador pela integralidade da dívida, considerando-se que há cláusula expressa constante no termo aditivo por ele firmado no sentido de que o fiador garante todas as obrigações assumidas pelo estudante -
A teor do disposto no § 5º do art. 206 do Código Civil, a pretensão de cobrança de dívida constante de instrumento particular prescreve em cinco anos. Ademais, o termo inicial para contagem do prazo prescricional é a data prevista para o pagamento da última parcela, independentemente do vencimento antecipado da dívida operado pelo inadimplemento
- Para evitar a inscrição nos cadastros restritivos de crédito não basta o mero ajuizamento de ação; é necessária a efetiva demonstração de que a contestação da cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e que, sendo a contestação apenas de parte do débito, deposite o valor referente à parte incontroversa, ou preste caução idônea - Não restou caracterizada a própria conduta lesiva, sendo impossível, via de consequência, admitirmos a responsabilização por dano moral. (TRF-4 - AC: 50120882120194047000 PR 5012088-21.2019.4.04.7000, Relator: RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Data de Julgamento: 09/06/2021, QUARTA TURMA)
Os Colegiados Recursais têm enfatizado, porém, que aludido prazo de 5 anos seria computado a partir da data da última parcela avençada no contrato, a despeito de eventual vencimento antecipado da dívida por conta do inadimplemento de 02 ou mais parcelas:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO PARA FINANCIAMENTO ESTUDANTIL - FIES. INAPLICABILIDADE DO CDC. TABELA PRICE. LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. 1. Em se tratando de contrato bancário, é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que o termo inicial da prescrição para cobrança da dívida é a data do vencimento do contrato, independentemente de ter ocorrido inadimplemento em data anterior ou vencimento antecipado. 2.
O entendimento manifestado no âmbito desta Corte é no sentido de que, em se tratando de cobrança de dívida decorrente de contrato, a prescrição é de 5 anos a partir da entrada em vigor do Código Civil de 2002, conforme a previsão do parágrafo 5º, inciso I, do artigo 206 do referido diploma legal. 3. A hodierna jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça está assentada no sentido de que os contratos firmados no âmbito do Programa de Financiamento Estudantil - fies - não se subsumem às regras encartadas no Código de Defesa do Consumidor, dado que se está frente à programa governamental, em benefício do discente, sem conotação de serviço bancário, nos termos do art. 3º, § 2º, daquele Codex. Precedentes
4. Até a publicação da Resolução BACEN n.º 3.842/2010, ocorrida em 10 de março de 2010, incidem, sobre as prestações pagas ou impagas dos contratos de FIES, juros remuneratórios anuais de 9%, nos termos pactuados; a partir dessa data, porém, somente podem ser exigidos, sobre o saldo devedor, juros de 3,4% ao ano, na forma da aludida normativa. 5. Inexiste qualquer ilegalidade na utilização da Tabela Price como sistema de amortização do débito, já que esta, com sua fórmula mundialmente conhecida, por si só, não importa conclusão direta no sentido da ocorrência de capitalização mensal tal como vedada no sistema pátrio. (TRF4, AC 5026907-81.2015.4.04.7200, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 20/05/2020)
Assim, a adequada apreciação do tema exige, em princípio, o exame da natureza do contrato cujas obrigações teriam sido inadimplidas.
2.32. CADIN - cadastro de inadimplentes:
D'outro tanto, segundo a jurisprudência predominante, a inibição do lançamento, no CADIN, do nome do interessado, pressupõe a realização do aludido depósito, por força do disposto no art. 7º, I, da lei n. 10.522, de 19 de julho de 2002:
"
Será suspenso o registro no Cadin quando o devedor comprove que: I - tenha ajuizado ação, com o objetivo de discutir a natureza da obrigação ou o seu valor, com o oferecimento de garantia idônea e suficiente ao Juízo, na forma da lei
."
Referido diploma deve ser aferido com cautelas, sabe-se bem. Afinal de contas, o poder geral de tutela, na temática civil, é projeção do art. 5º, XXXV, CF. Importa dizer: a Constituição exige um processo efetivo e, tanto por isso, a lei infraconstitucional não pode restringir demasiadamente a concessão de provimentos de urgência. Tanto por isso, em princípio, a lei infraconstitucional não poderia instituir uma espécie de
solve et repet,
de modo que a inibição de condutas lesivas fique na dependência do depósito em juízo.
De toda sorte, convém ter em conta que essa obrigatoriedade de contracautelas também se encontra prevista no art. 50, §1º, da lei n. 10.931/2001 (quanto à pretensão à revisão de contratos imobiliários), enquanto que a lei n. 13.105/2015 facultou ao Poder Judiciário condicionar a concessão do provimento de urgência à oferta de caução (art. 300, §1º, CPC). Acrescento que, ao apreciar o REsp 1137497/CE, com caráter repetivivo, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a mera discussão judicial da dívida não autorizaria a suspensão do registro no CADIN, sendo necessária a garantia idônea e suficiente do Juízo ou que a exigibilidade do crédito esteja suspensa por algum outro motivo.
Reporto-me também aos seguintes julgados:
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. RECUSA. BEM SITUADO EM OUTRO ESTADO. CADIN. EXCLUSÃO DO NOME DO CADASTRO. 1. Mostra-se justificada a recusa do devedor considerando-se que o bem oferecido não representa efetiva garantia dos créditos exeqüendos, uma vez que o imóvel situa-se em outro Estado da federação. 2. Nos casos em que os contribuintes pleiteiam a exclusão de seu nome dos registros do CADIN, devem ser observados os requisitos de suspensão previstos no art. 7º da Lei nº 10.522/02, como o oferecimento de caução idônea ao juízo ou o depósito judicial dos valores contestados.
(AG 00088123320104040000, VÂNIA HACK DE ALMEIDA, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 26/05/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO FUNDADA NA APARÊNCIA DO BOM DIREITO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. RESP. Nº 1.063.530/RS. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito respeita os seguintes requisitos, cumulativamente: (a) que a ação ajuizada pelo interessado seja fundada em questionamento integral ou parcial do débito; (b) que haja demonstração de que o questionamento à cobrança supostamente indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; e, (c) existência de depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir.
(AC 200770060024893, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 10/03/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. RESSARCIMENTO AO SUS. AJUIZAMENTO DE AÇÃO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. GARANTIA AO JUÍZO. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito condiciona-se ao depósito de caução idônea ou garantia ao juízo pela parte requerente. . Inteligência do art. 7º, I, da Lei nº 10.522 /2002. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. . Agravo de instrumento improvido.
(AG 200904000133210, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 23/09/2009.)
2.33. Sistema de informações de créditos:
O Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos foi constituído no âmbito do Banco Central do Brasil, sendo então administrado pelo Banco do Brasil. Nos quadros do Banco Central, constituiu-se a Central de Riscos de Crédito, que passou a denominar-se Sistema de Informações de Crédito do Banco Central – SCR.
Ao tempo da sua criação, esse banco de dados estava destinado a viabilizar o fornecimento de informações relevantes às instituições financeiras como destinatárias das informações armazenadas. Na sequência, por força de inúmeros convênios, as informações constantes no SCR são diariamente transferidas para outras entidades de proteção ao crédito. São milhões de registros que se referem, conforme regulamentação própria, às dívidas dos cheques emitidos sem suficiente provisão de fundos, apresentados pela segunda vez (alínea 12), aos cheques de contas encerradas (alínea 13) e às práticas espúrias (alínea 14), dentre outros tópicos.
Atente-se para o seguinte:
"O “Sistema de Informações de Crédito do Banco Central –SCR” é um banco de dados oficial, que tem dupla finalidade: em primeiro lugar, serve como o principal instrumento utilizado pela supervisão bancária para acompanhar as carteiras de crédito das instituições financeiras. O SCR armazena dados sobre as operações contratadas por todas as instituições, de forma que o Banco Central pode adotar medidas preventivas com o objetivo de proteger os recursos que os cidadãos confiam às instituições financeiras integrantes do sistema. Assim, o principal objetivo do SCR é o de reforçar os mecanismos de supervisão bancária, com aumento da eficácia de avaliação dos riscos inerentes à atividade e ao sistema como um todo. Trata-se, portanto, de um banco de dados oficial e obrigatório, instituído e gerido pelos órgãos reguladores do sistema financeiro nacional.
Em segundo lugar, por ser um grande cadastro de informações positivas (senão o maior), contendo dados sobre o comportamento dos clientes no que se refere às suas obrigações contraídas no sistema financeiro, o SCR também serve a outro objetivo, o de auxiliar as instituições financeiras na gestão de suas carteiras de crédito, preenchendo uma lacuna na obtenção de informações sobre as características e avaliação da capacidade de pagamento dos devedores, com impactos positivos a diminuição dos índices de inadimplência, fomentando a competição entre os agentes financeiros pela possibilidade de oferta de taxas de juros menores nas operações que oferecem menor risco. Assim, o SCR pode ser consultado por qualquer instituição financeira, desde que preenchidas as condições previstas na Res. CMN 3658/2008.
Na verdade, o SCR é o substitutivo da antiga “Central de Risco deCrédito (CRC)”, criada em 2000, pelas Resoluções CMN 2724/2000 e 2798/2000, que, igualmente, já se prestava a essa dupla finalidade, e, da mesma forma, permitia consultas pelas instituições financeiras, inclusive, exigindo autorização específica do cliente.
Desse modo, a edição da Res. CMN 3658/2008 não veio alterar esse cenário jurídico, porquanto as instituições financeiras continuarão podendo consultar o banco de dados oficial do Bacen, desde que munidas de autorização (Res. CMN 3658/2008 8.º I), podendo valer-se das autorizações já possuídas quando vigia o CRC (Res. CMN 3658/2008 11).
É preciso acrescentar, todavia, que a possibilidade de consulta pelas instituições financeiras ao SCR, banco de dados oficial obrigatório, não esgota nem exaure o direito que àquelas assiste de trocar entre si informações, conforme prevê a LC 105/2001 1.º § 3.º I . Neste sentido já sustentamos em nosso parecer anterior que, ainda que exista central de risco instituída pelas autoridades reguladoras (CMN e Bacen), isto não impede as instituições financeiras de exercerem a atividade de autorregulamentação, criando a sua própria central de risco.
Em face do princípio constitucional da livre-iniciativa (CF 170 caput) e amparadas no disposto na Lei Complementar 105/2001, art. 1.º, § 3.º, I, podem as instituições financeiras autorregulamentar a criação e a manutenção de compartilhamento de dados, direito esse que lhes assiste mesmo diante da existência do SCR instituído pelo BACEN, e da possibilidade de consulta pelas instituições financeiras a esse banco de dados oficial." (JUNIOR, Nelson.
Soluções práticas de direito:
direito bancário, direito internacional, propriedade industrial, direito tributário. SP: RT. 2014, item 39).
Ademais, o
“
Sistema de Informações de Crédito do Banco Central –SCR” é um banco de dados oficial, que tem dupla finalidade: em primeiro lugar, serve como o principal instrumento utilizado pela supervisão bancária para acompanhar as carteiras de crédito das instituições financeiras.
O SCR armazena dados sobre as operações contratadas por todas as instituições, de forma que o Banco Central pode adotar medidas preventivas com o objetivo de proteger os recursos que os cidadãos confiam às instituições financeiras integrantes do sistema. Assim, o principal objetivo do SCR é o de reforçar os mecanismos de supervisão bancária, com aumento da eficácia de avaliação dos riscos inerentes à atividade e ao sistema como um todo. Trata-se, portanto, de um banco de dados oficial e obrigatório, instituído e gerido pelos órgãos reguladores do sistema financeiro nacional."
(JUNIOR, Nelson.
Obra citada.
item 39).
Sustenta-se, portanto, que,
"por ser um grande cadastro de informações positivas (senão o maior), contendo dados sobre o comportamento dos clientes no que se refere às suas obrigações contraídas no sistema financeiro, o SCR também serve a outro objetivo, o de auxiliar as instituições financeiras na gestão de suas carteiras de crédito, preenchendo uma lacuna na obtenção de informações sobre as características e avaliação da capacidade de pagamento dos devedores, com impactos positivos a diminuição dos índices de inadimplência, fomentando a competição entre os agentes financeiros pela possibilidade de oferta de taxas de juros menores nas operações que oferecem menor risco. Assim, o SCR pode ser consultado por qualquer instituição financeira, desde que preenchidas as condições previstas na Res. CMN 3658/2008."
O SCR cuida-se, como registrei, de substitutivo da antiga Central de Risco de Crédito (CRC), criada em 2000, por meio das Resoluções CMN 2724/2000 e 2798/2000. Além disso, convém destacar que
"
Para o compartilhamento desses dados não se faz necessária autorização do cliente, o qual deverá, contudo, ser devidamente comunicado e ter assegurado o acesso ao banco de dados, para correções de eventuais inexatidões, mediante requerimento fundamentado. Deve-se acrescer que essas informações deverão ser compartilhadas apenas entre as instituições financeiras e para fins cadastrais, observando-se a forma disciplinada pelos órgãos reguladores.
"
2.34. Aplicação analógica dos arts. 43 e 44, CDC:
Desse modo, deve-se promover a aplicação analógica dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor que versam sobre a inclusão de dados do consumidor em cadastros restritivos ao crédito.
A Turma Recursal tem reputado incabível tal equiparação:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BACEN. SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE CRÉDITO - SCR. INSCRIÇÃO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. OBRIGATORIEDADE. AUSÊNCIA. 1.
O Bacen não tem a obrigação de efetuar a notificação prévia da pessoa inscrita no Sistema de Informações de Créditos - SCR, porque não se trata de uma relação de consumo. Dessa forma, não se aplica o art. 43, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Precedente da TNU. 2. Aplicação da Questão de Ordem 38, desta TNU
: Em decorrência de julgamento em pedido de uniformização, poderá a Turma Nacional aplicar o direito ao caso concreto decidindo o litígio de modo definitivo, desde que a matéria seja de direito apenas, ou, sendo de fato e de direito, não necessite reexaminar o quadro probatório definido pelas instâncias anteriores, podendo para tanto, restabelecer a sentença desconstituída por Turma Recursal ou Regional. (TNU - Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma): 50028199020184047129, Relator: LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, Data de Julgamento: 05/05/2022, TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, Data de Publicação: 06/05/2022)
Note-se, porém, que a própria TNU já deliberou de modo distinto, mas afastando a responsabilização do BACEN:
Pedido de uniformização de lei federal. Direito civil e administrativo. Inscrição indevida, por instituição financeira, que
não o Bacen
, no sistema de informações de crédito do Banco Central do Brasil - SCR/SISBACEN.
natureza jurídica semelhante aos cadastros restritivos de crédito. dano moral in re ipsa
. "a inscrição indevida no scr/sisbacen pela instituição financeira responsável gera dano moral in re ipsa". caracterização. incidente conhecido e provido. (TNU - Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma): 05060041920184058300, Relator: FRANCISCO GLAUBER PESSOA ALVES, Data de Julgamento: 23/06/2022, TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, Data de Publicação: 27/06/2022)
Leia-se ainda o seguinte:
CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO INDEVIDA DE INSCRIÇÃO NO SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO DO BANCO CENTRAL. A despeito da assertiva de que o registro de dados no Sistema de Informações de Crédito do Banco Central não gera, necessariamente, um juízo de valor negativo do devedor, é um cadastro de caráter público, com informações (des) abonatórias sobre clientes, as quais influenciam a decisão das instituições financeiras sobre a concessão de crédito.
Comprovada a manutenção indevida do nome do autor no SCR, configurada está a responsabilidade da ré pelos danos causados injustamente a ele. É sabido que (1) no âmbito das relações negociais, a reputação do agente econômico é fundamental para sua atuação no mercado, e (2) a indenização por dano moral é cabível com base na simples prova de que houve inscrição - ou manutenção - indevida de registro nos órgãos de proteção de crédito, sendo desnecessária a demonstração de efetivo prejuízo sofrido pela parte, uma vez tratar-se de dano in re ipsa
(STJ, 1ª Turma, AgRg no AREsp 752.290/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, julgado em 14/06/2016, DJe 22/06/2016). (TRF-4 - AC: 50020667220184047214 SC 5002066-72.2018.4.04.7214, Relator: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 04/09/2019, QUARTA TURMA)
DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. ANTT. DANO MORAL. SERASA. MANUTENÇÃO DA INSCRIÇÃO. DANO MORAL IN RE IPSA. FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. 1.
A indevida manutenção da inscrição do nome do devedor em cadastros de inadimplentes gera o direito à indenização por danos morais, sendo desnecessária a comprovação dos prejuízos suportados, pois são óbvios os efeitos nocivos da negativação. 2. O valor da indenização deve atender aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, observado seu conteúdo didático, de modo a coibir reincidência do causador do dano sem enriquecer a vítima
. (TRF-4 - AC: 50033547920184047012 PR 5003354-79.2018.4.04.7012, Relator: SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, Data de Julgamento: 20/10/2021, QUARTA TURMA)
Os Tribunais têm responsabilizado os encarregado dos lançamento do nome do consumidor junto ao SCR. Em alguns casos, isso tem se traduzido na declaração da ilegitimidade passiva do BACEN para tais demandas:
ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CEF. INSCRIÇÃO INDEVIDA NO SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO - SCR. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BACEN. PRESCRIÇÃO. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. 1.
O Banco Central do Brasil tem, em relação ao Sistema de Informações de Crédito (SCR), a função de mero centralizador das informações prestadas pelas instituições financeiras, de maneira que nenhuma responsabilidade pode recair sobre a autoridade monetária pelos dados equivocadamente lançados, ou pela falta de notificação prévia do consumidor
. 2. Tratando-se de ação de indenização por danos morais decorrentes da inscrição indevida em cadastro de inadimplentes, o prazo prescricional aplicável é o de 3 anos, previsto no art. 206, § 3º, V, do Código Civil, cujo termo inicial é a data em que a parte prejudicada tem ciência inequívoca do ato lesivo. 3.
Conforme jurisprudência consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça sob a sistemática dos recursos repetitivos, "A ausência de prévia comunicação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastros de proteção ao crédito, prevista no art. 43 , § 2º, do CDC, enseja o direito à compensação por danos morais, salvo quando preexista inscrição desabonadora regularmente realizada"
( REsp 1.061.134/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, julgado em 10/12/2008, DJe de 1º/4/2009). 4. O dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplente é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. 5. No arbitramento da indenização advinda de danos morais, o julgador deve se valer do bom senso e razoabilidade, atendendo às peculiaridades do caso, não podendo ser fixado quantum que torne irrisória a condenação, tampouco valor vultoso que traduza enriquecimento ilícito. Danos morais reduzidos para R$ 10.000,00, na linha dos precedentes desta Corte em casos análogos. (TRF-4 - AC: 50025820720184047210 SC 5002582-07.2018.4.04.7210, Relator: LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, Data de Julgamento: 10/11/2021, QUARTA TURMA)
ADMINISTRATIVO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - ATRASO EM ANOTAÇÃO. RESPONSABILDADE DA FINANCEIRA. INDEVIDA INSCRIÇÃO NO SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO DO BACEN (SCR). FALHA NO SERVIÇO BANCÁRIO. TRANSTORNOS - DEMONSTRADOS. NEXO CAUSAL. INDENIZAÇÃO - CABÍVEL. 1. Na hipótese, o autor solicitou e teve deferido empréstimo consignado em financeira.
O dano moral decorre da falha no serviço da financeira em não fazer a anotação desse empréstimo, dando azo à dívida involuntária do autor com posterior apontamento de seu nome como inadimplente no SCR. 2. O SCR é um banco de dados que, ao apontar negativação a nome de cliente, assemelha-se a cadastros de inadimplentes, sujeitando-se, portanto, às normas vigentes a respeito. 3. Demonstrado o nexo causal entre o fato lesivo imputável à ré, exsurge o dever de indenizar, mediante compensação pecuniária compatível com a dor moral, a qual, no caso dos autos, revelou-se na busca de anulação de negativação do nome do autor junto às instituições financeiras. 3. Indenização por danos morais mantida em R$ 2.500,00 a ser paga por cada réu, segundo a situação econômica e o grau de negligência da demandada e em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade à ofensa, bem como em razão da dupla função de compensar o dano sofrido e punir o ofensor
. (TRF-4 - AC: 50016550420144047106 RS 5001655-04.2014.404.7106, Relator: FERNANDO QUADROS DA SILVA, Data de Julgamento: 13/09/2016, TERCEIRA TURMA)
2.35. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
O SCR veicula registros de crédito de cliente cujo risco direto na instituição financeira - somatório de operações de crédito, repasses interfinanceiros, coobrigações e limites, créditos a liberar - seja igual ou superior a R$ 200,00 (duzentos reais). Cuida-se de um instrumento de registro gerido pelo BC e alimentado mensalmente pelas instituições financeiras.
O cadastro permite, em princípio, à supervisão bancária a adoção de medidas preventivas, com o aumento da eficácia de avaliação dos riscos inerentes à atividade. Por meio dele, o BC consegue verificar operações de crédito atípicas e de alto risco, sempre preservando o sigilo bancário. Trata-se, em primeiro exame, de um instrumento para supervisão panorâmica do sistema bancário, muito mais do que para a efetivação de créditos dos agentes financeiros.
Note-se que a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça consolidou a orientação, em sede de recurso repetitivo, de ser ilegal e de que haveria de ser cancelada a inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito realizada sem a prévia notificação exigida pelo art. 43, § 2º, do CDC
(REsp 1061134/RS, 2ª Seção, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/12/2008). Por outro lado, deve-se apurar se o Sistema de Informações de Créditos (SCR) poderia ser equiparado a um cadastro restritivo de crédito, a exemplo do SPC, SERASA etc. Ou seja, se o Banco Central do Brasil haveria de ser compreendido como fornecedor (art. 3º, CDC), na espécie.
Por outro lado, deve-se apurar se o Sistema de Informações de Créditos (SCR) poderia ser equiparado a um cadastro restritivo de crédito, a exemplo do SPC, SERASA etc. Ou seja, se o Banco Central do Brasil haveria de ser compreendido como fornecedor (art. 3º, CDC), na espécie.
O tema já foi alvo de debates no âmbito do STJ, cuja 3. Turma chegou a considerá-lo como cadastro restritivo de créditos, submetendo-o ao regime consumerista
:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. CENTRAL DE RISCO DE CRÉDITO DO BANCO CENTRAL. NATUREZA DE CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO MORAL "IN RE IPSA". PRESUNÇÃO. DESNECESSIDADE DE PROVA. AGRAVO DESPROVIDO. ( AgRg no REsp 1183247/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 14/08/2012)
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. sisbacen. SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO DO BANCO CENTRAL DO BRASIL (SCR). NATUREZA DE CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANOS MORAIS. DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MINORAÇÃO. NECESSIDADE. VERBA HONORÁRIA. PERCENTUAL SOBRE A CONDENAÇÃO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. [...] 2.
As informações fornecidas pelas instituições financeiras ao sisbacen afiguram-se como restritivas de crédito, haja vista que esse sistema de informação avalia a capacidade de pagamento do consumidor de serviços bancários. O banco que efetuou a inclusão indevida do nome da autora nesse cadastro deve ser responsabilizado pelos danos morais causados
. [...] 5. Recurso especial parcialmente provido tão somente para minorar o valor da compensação por danos morais para R$ 6.000,00 (seis mil reais). ( REsp 1117319/SC, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/02/2011)
Transcrevo parte do voto da Min. Nancy Andrighi sobre o tema:
"Para uma melhor solução da controvérsia, mostra-se necessário fixar o conceito e a natureza jurídica do Sistema de Informação Banco Central - sisbacen e de seu"Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil"(SCR), ou como anteriormente era conhecido:"Central de Risco de Crédito"(CRC).
O Sisbacen, conforme consta em seu Regulamento, divulgado pela Circular 3.232 do BACEN, disponível no sítio da autarquia é o"conjunto de recursos de tecnologia de informação, interligados em rede, utilizado pelo Banco Central na condução de seus processos de trabalho". A finalidade desse sistema de informações encontra-se prevista no art. 1º, I, II e III do mencionado regulamento, in verbis
:
I - prover o Banco Central do Brasil de instrumentos de tecnologia da informação para o cumprimento da sua missão institucional;
II - facilitar a captação, o tratamento e a divulgação de informações de interesse do Banco Central do Brasil, relativamente às instituições objeto da sua ação controladora, reguladora e fiscalizadora;
III -
disponibilizar para órgãos e entidades do Poder Público, bem como a pessoas físicas e jurídicas, informações constantes das suas bases de dados e de interesse desses entes, observados os preceitos de sigilo que legalmente as envolvem
.
A fim de possibilitar sua finalidade regulamentar, o Sisbacen desmembra-se em outros sistemas de informação ou cadastros de menor porte, dentre os quais destacam-se o"Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos"(
CCF
), o"Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal"(
Cadin
) e o"Sistema de Informações de Crédito do Banco Central"(
SCR
), esse último de especial relevância para a solução da presente controvérsia.
O SCR - Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil -, conforme definição extraída do sítio do BACEN,"é um banco de dados sobre operações e títulos com características de crédito e respectivas garantias contratadas por pessoas físicas e jurídicas perante instituições financeiras (IFs) no país"(in http://www.bcb.gov.br/pre).
Como todo sistema de informações, o Sisbacen - e nele incluí-se o Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil (SCR) - deve ser alimentado, missão que cabe às instituições bancárias
. A Resolução 2.724/00 do BACEN determina que as instituições financeiras prestem a esse informações sobre o montante dos débitos e responsabilidades contratuais de seus clientes, ainda que não haja inadimplência, sempre que ultrapassar determinado valor, constante das normas emanadas pelo BACEN.
Prestar informações ao BACEN das operações financeiras realizadas constitui, portanto, obrigação do banco, e não faculdade, como ocorre com os cadastros de inadimplentes
, conforme se depreende pela leitura do art. 1º da mencionada resolução:
Art. 1º Determinar a prestação ao Banco Central do Brasil de informações sobre o montante dos débitos e responsabilidades por garantias de clientes pelos bancos múltiplos, bancos comerciais, Caixa Econômica Federal, bancos de investimento, bancos de desenvolvimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades de crédito, financiamento e investimento, companhias hipotecárias, agências de fomento e sociedades de arrendamento mercantil. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se também às instituições em regime especial.
Ressalta-se que, por força do disposto no art. 2º, II, da Resolução 2.724/00, da mesma forma que compete à instituição financeira informar novas operações, qualquer alteração ou exclusão deve ser por elas igualmente comunicada:
Art. 2º As informações de que se trata: I - serão consolidadas no sistema Central de Risco de Crédito em termos de débitos e responsabilidades por cliente; II - são de exclusiva responsabilidade das instituições mencionadas no art. 1º, inclusive no que diz respeito às respectivas inclusões, atualizações ou exclusões do sistema.
A peculiaridade do banco de dados mantido pelo BACEN, que o faz diferir, em parte, dos demais bancos de dados, sejam públicos ou privados, é que aquele é alimentado tanto por informações positivas quanto negativas, o que o caracteriza como um"sistema múltiplo
", enquanto a maioria dos demais somente armazenam informações negativas.
O benefício de um sistema múltiplo reside no fato de que o consumidor bancário que celebra, a título exemplificativo, contrato de financiamento e mantém as operações sem atraso, poderá vir a usufruir desse seu histórico de adimplência junto ao SCR
- Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil - quando for contratar outro serviço bancário, no mesmo ou em outro banco, mediante, por exemplo, o oferecimento de uma taxa reduzida de juros a ser cobrada em determinado negócio bancário.
Por outro lado,
como um cadastro de negativação, o Sisbacen, no âmbito das instituições bancárias, através de seu scr - Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil -, age, da mesma forma como os demais órgãos restritivos de crédito
, como uma central de risco, cuja finalidade é avaliar o"risco de crédito", com vistas à idoneidade financeira dos consumidores, ou seja, avaliar a probabilidade de que o valor emprestado por consumidor de serviços bancários seja recebido de volta pelo banco mutuante.
As informações estão disponibilizadas no sistema para uso no processo de tomada de decisões, tanto de um pequeno empresário que consulta o SPC antes de vender à crédito determinada mercadoria, quanto para uma grande instituição bancária, que realiza consulta ao scr - Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil - antes de celebrar um contrato de arrendamento mercantil.
Havendo negativação no SPC ou a informação de"prejuízo"no cadastro de determinada pessoa física ou jurídica junto ao Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil (SCR) - o que, segundo a nomenclatura utilizada nesse sistema, significa inadimplência por parte do consumidor bancário -, a opção de"fechar o negócio"está nas mãos do pequeno empresário e do banco
.
Salienta-se, ainda, que
o art. 43 do CDC sinaliza para a proteção do consumidor em relação a"informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes", de modo a abranger também o scr - Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil.
Por fim, vale ressaltar que nada obsta que as instituições bancárias e financeiras, dentre outras, informem a situação de inadimplemento ocorrida nos negócios realizados com pessoas físicas ou jurídicas com elas contratantes"
Por seu turno, a 4ª Turma do STJ chegou a sustentar que o Código de Proteçâo e Defesa do Consumidor não seria aplicável no âmbito do SCR - sistema de informações de crédito, dado lhe faltar natureza consumerista. Acrescentou não ser exigível do BACEN que promovesse prévia notificação do devedor
(AgRg no REsp 1443317/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 27/05/2014).
Mais recentemente, porém, ao julgar o
REsp n.º 1.365.284/SC
, relator Min. Luis Felipe Salomão, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça passou a adotar a compreensão da 3ª Turma, decidindo que o Sistema de Informações de Créditos (SCR) seria um cadastro público, destinado a tutelar o interesse público, alusivo ao acompanhamento, de alcance macro, do grau de inadimplência no sistema financeiro brasileiro, e também um mecanismo dissuasório do inadimplemento individual, por conta dos efeitos dele decorrentes sobre a capacidade de crédito dos agentes econômicos registrados.
RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA DO NOME DE PESSOA JURÍDICA NO CADASTRO DE INADIMPLENTES DO SISBACEN/SCR. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PROFERIDA EM LIMINAR EM AÇÃO REVISIONAL DETERMINANDO QUE A RÉ SE ABSTIVESSE DE INCLUIR OU MANTER O NOME DA AUTORA NO ROL DE "QUALQUER ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO". ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DANO MORAL. RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DO QUANTUM.
1. O Sistema de Informações do Banco Central - Sisbacen, mais precisamente o Sistema de Informações de Crédito do Banco Central - scr, é cadastro público que tem tanto um viés de proteção do interesse público (como regulador do sistema - supervisão bancária), como de satisfação dos interesses privados (seja instituições financeiras - gestão das carteiras de crédito -, seja mutuários - demonstração de seu cadastro positivo).
2.
Por óbvio que referido órgão deve ser tratado de forma diferente dos cadastros de inadimplentes como o Serviço de Proteção ao Crédito - SPC e o Serasa. Contudo, não se pode olvidar que ele também tem a natureza de cadastro restritivo de crédito, justamente pelo caráter de suas informações, tal qual os demais cadastros de proteção, pois visam a diminuir o risco assumido pelas instituições na decisão de tomada de crédito
.
3. Observa-se, pois, que apesar da natureza de cadastro público, não tem como se desvincular de sua finalidade de legítimo arquivo de consumo para operações de crédito, voltado principalmente às instituições financeiras para que melhor avaliem os riscos na sua concessão à determinada pessoa, isto é, o crédito é justamente o objeto da relação jurídica posta.
4.
A Lei n. 12.414/2011, chamada de lei do "cadastro positivo", apesar de disciplinar a formação e consulta a banco de dados com informações de adimplemento para histórico de crédito (art. 1º), estabelece que os bancos de dados de natureza pública terão regramento próprio (parágrafo único do art. 1º), o que, a contrario sensu, significa dizer que eles também são considerados bancos de dados de proteção ao crédito, os quais futuramente serão objeto de regulamentação própria
.
5.
Na hipótese, a informação do Sisbacen sobre o débito que ainda está em discussão judicial pode ter sido apta a restringir, de alguma forma, a obtenção de crédito pela recorrida, haja vista que as instituições financeiras, para a concessão de qualquer empréstimo, exigem (em regra, via contrato de adesão) a autorização do cliente para acessar o seu histórico nos arquivos do Bacen
.
6. Recurso especial a que se nega provimento. ( REsp 1365284/SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. p/ Acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/09/2014)
Essa solução, dispensada ao
REsp n.º 1.365.284/SC
, retrata o conteúdo do art. 1º da Lei n.º 12.414/2011 - que trata dos cadastros sobre histórico de crédito. Essa lei preconizou que os bancos de dados de natureza pública teriam regramento próprio, o que,
a contrario sensu
, significa dizer que estes também haveriam de ser considerados bancos de dados de proteção ao crédito. E, sendo assim, em regra, os ditames da legislação consumerista também seriam aplicáveis nesse âmbito.
2.36. Ô
nus
da prova CDC - exame precário:
A lei 8078/1990 dispõe, no seu art. 6º, VIII, que
"
São direitos básicos do consumidor: (...) a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências
."
No que toca à aludida cláusula, leia-se:
"(...) Por isso, o reconhecimento da hipossuficiência do consumidor para fins de inversão do ônus da prova não pode ser visto como forma de proteção ao mais pobre. Ou, em outras palavras, não é por ser pobre que deve ser beneficiado com a inversão do ônus da prova, até porque a questão da produção da prova é processual, e a condição econômica do consumidor diz respeito ao direito material.
Na realidade, para beneficiar o carente econômico no processo não seria necessária a inversão. Bastaria determinação judicial de que o fornecedor arcasse com eventuais custas processuais para a produção de provas, tais como as periciais. Determinar-se-ia a inversão do pagamento, e aí sim estar-se-ia protegendo, de forma justa, o economicamente fraco
. Não se pode olvidar que, para os pobres, na acepção jurídica do termo, existe a justiça gratuita, a qual permitem ao beneficiário a isenção do pagamento de custas judiciais, o que não significa que ele está isento de provar o seu direito.
(...) Assim, se a questão for meramente de falta de capacidade financeira de suportar o custo do processo, basta ao consumidor servir-se do benefício legal da lei 1060/1950. E o inverso é verdadeiro: existem consumidores economicamente poderosos, o que não implica a sua não hipossuficiência técnica. Mas, mesmo no caso de o consumidor ter grande capacidade econômica, a inversão do ônus da prova deve ser feita na constatação de sua hipossuficiência técnica (técnica e de informação)." (NUNES, Rizzatto.
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 731-733)
Por seu turno, os Tribunais têm decidido como segue:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 273 DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356/STF. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Inviável o recurso especial quando ausente o prequestionamento das questões de que tratam os dispositivos da legislação federal apontados como violados. 2. A
inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança das alegações do consumidor ou de sua hipossuficiência
. 3. Na hipótese em exame, a eg. Corte de origem manteve a aplicação ao caso do Código de Defesa do Consumidor, e após sopesar o acervo fático-probatório reunido nos autos, concluiu pela configuração da verossimilhança das alegações da parte agravada, bem como de sua hipossuficiência. Desse modo, o reexame de tais elementos, formadores da convicção do d. Juízo da causa, não é possível na via estreita do recurso especial, por exigir a análise do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201300457409, RAUL ARAÚJO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:24/06/2013 ..DTPB:.)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. ART. 130 DO CPC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2.
Cabe ao magistrado, como destinatário da prova, determinar aquelas necessárias à instrução do processo, sempre em busca de seu convencimento racional. O reexame do juízo acerca da produção probatória encontra óbice na Súmula n° 7/STJ. 3. A inversão do ônus da prova se submete ao critério do julgador mediante análise das circunstâncias fáticas, cujo reexame é vedado em sede especia
l. 4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGA 201000593699, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:26/03/2013 ..DTPB:.)
2.37.
Inversão
do
ônus
da prova - art.
373
, CPC:
Por outro lado, aparentemente seria incabível a inversão do ônus da prova, prevista no art. 373, §1º, CPC/15. A vingar solução diversa, dever-se-ia então converter o julgamento em diligência, a fim de se assegurar que o(s) requerido(s) produzisse(m) as dilações probatórias porventura devidas, conforme preconiza a parte final do aludido art. 373, §1º, CPC.
O processualista Araken de Assis promove uma avaliação crítica da ampliação das hipóteses de inversão do ônus da prova, promovida com o CPC/2015:
"(...) A distribuição dinâmica do ônus da prova ocorre em outros ordenamentos. O art. 217.6 da Ley de Enjuiciamiento Civil espanhola institui dois meios para corrigir a inadequação formal do critério geral (onus probandi incumbit qui ei dicit): (a) a disponibilidade da prova (v.g., na investigação de paternidade, o suposto pai tem condições de esclarecer o fato biológico, através de exame de DNA); e (b) a facilidade probatória (v.g., a empresa encontra-se melhor situada para arrolar as testemunhas de eventos que ocorreram em suas dependências que o visitante ocasional). E, no direito norte-americano, o juiz alocará o ônus da prova segundo numerosas e complicadas regras.
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a) o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentativo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
Faço esse exame para fins de apreciação do pedido de antecipação de tutela, sem prejuízo de nova análise por época do saneamento - art 357, CPC.
2.38. Elementos de convicção veiculados nos autos:
Com cognição precária, anoto que, com a sua contestação, a CEF anexou cópia do contrato de mútuo feneratício avençado com a autora em 04 de março de 2021:
O formulário indicou: valor total estimado do financiamento R$: 515.802,23 (Atualizado pelo IPCA) Valor estimado do limite de crédito global
R$: 644.752,78
(Atualizado pelo IPCA).
Anexaram-se cartilha do estudante e planilha financeira:
Indicou-se o valor das mensalidades mais recentes:
No evento 24, contrato 9, encontra-se o seguinte:
Valor do limite de crédito global (R$):
644.752,80(seiscentos e quarenta e quatro mil, setecentos e cinqüenta e dois reais e oitenta centavos)
O banco veiculou encarte sobre o NOVO FIES:
"O aumento do teto de financiamento estudantil, ora regulamentado pela resolução n° 50 do CGFIES, contempla somente o curso de MEDICINA e tem seus efeitos a partir das contratações e aditamentos de renovação que tenham como referência o 2° semestre de 2022 e posteriores. Reforçamos que os efeitos da resolução nº 50 do CGFIES não são retroativos, portanto, os aditamentos de renovação dos semestres que estejam pendentes, (02/20, 01/21, 02/21 e 01/22) e que sejam realizados em janela extemporânea futura, não terão reflexo no aumento do teto. Alertamos que o percentual de financiamento concedido ao estudante pelo Ministério da Educação, no momento da seleção para o FIES, não sofre qualquer alteração com a publicação da resolução nº 50 do CGFIES, portanto, permanece inalterado. O cálculo do financiamento estudantil se dá pela aplicação do percentual concedido ao estudante (Y) sobre o valor da semestralidade atual com desconto (W)."
Apresentou cópia da resolução 22, de 5 de junho de 2018. Anexou-se boleto de pagamento:
Anexou-se ainda cópia do instrumento contratual celebrado com a Unipositivo. A autora anexou extrato de tela sobre a renovação da matrícula:
Ela anexou termos de renovação da matrícula, juntou cópia da resolução do conselho de ensino, pesquisa e extensão 269, de 11 de dezembro de 2023 da Universidade, versando sobre o calendário universitário. Comprovou o pagamento do boleto antes aludido:
Anexou-se deliberação da universidade:
"Prezados, Contratação do FIES realizada para 1°/2021 e formalizada em 04/03/2023. O valor restituído refere-se: Aos títulos 22205/06, 22206/06, 23201/06 e 23202/06 no total de R$ 4035,11. Houve abatimento total de R$ 0,01 referente ao título 23105/06, restando ainda o valor de R$ 4035,10 a ser restituído ao aluno. OBS: Foi feita a devolução referente ao semestre de 2022/2 até o mês de ABR, conforme protocolo 2233354486 - FIES / DEVOLUÇÃO EM NUMERÁRIO, por este motivo, os meses de MAI e JUN estão sendo restituídos agora. A devolução referente a 2023/2 está sendo realizada apenas nos meses de JAN e FEV, pois conforme relatório analítico do FIES, os demais meses ainda não foram repassados pelo agente financeiro (CAIXA), sendo assim, a estudante poderá abrir nova solicitação FIES / DEVOLUÇÃO EM NUMERÁRIO no início de 2024/1. Atenciosamente, Financiamento Estudantil."
Juntou termo de pendência de aditamento e anexou relação de mensalidades, como segue:
No movimento 79, a Unipositivo apresentou informações a respeito de novo aditamento contratual:
Destacou a necessidade de coparticipação:
Em síntese, esses são os elementos de convicção.
2.39. Valoração precária:
Nos tópicos acima, equacionei - com cognição não exaustiva - alguns vetores importantes para a apreciação do pedido de antecipação de tutela. Também registrei os elementos de convicção veiculados no movimento-1 deste eproc. A autora alegou ter celebrado com a CEF, enquanto agente mutuante, o contrato de mútuo feneratício 14.1525.187.,, emm 04 de março de 2021, 0000048-25, de modo a viabilizar o pagamento da mensalidade do curso de medicina, junto à Unipositivo.
Segundo formulários, teriam sido financiados 94,47% das mensalidades - evento1, outros-5. O instrumento contratual veiculou:
Atente-se ainda para o seguinte:
(...)
No caso, a autora alegou encontrar-se adimplemente quanto às obrigações decorrentes do mútuo, dado ter promovido o pagamento das coparticipações, previstas no pacto. Argumentou, porém, que os valores estariam evoluindo de modo indevido, superando os percentuais decorrentes do pacto.
Pode-se apurar, em princípio, em que medida isso corresponderia à verdade dos fatos, medinate confronto entre os valores pagos pela autora, a título de coparticipações, com o valor da mensalidade exigida pela instituição de ensino. De todo modo, esta deliberação é projeção das antecipações já deferidas no curso desta demanda.
Oportunamente, deve-se examinar se eventuais alterações do sistema normativo, subsequentes à celebração do contrato, poderiam incidir sobre a avença em curso. Note-se que o tema foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o alcance e validade do art. 18 da lei n. 8.177/1991, conforme ADI 493-0, em cujo âmbito foi apreciada a preservação do contrato diante de normas subservientes, salvo quando sejam fruto de renegociação entre as partes contratantes. Por outro lado, certas regras de ordem pública incidem de modo imediato, a exemplo da aplicação da lei do Plano Real aos contratos em curso. A funcionalização dos pactos também surtem efeitos em determinadas avenças, quando orientadas à preservação de interesses públicos.
Reporto-me, portanto, às decisões já lançadas no curso deste processo pelo Juízo Titular desta unidade jurisdicional. Nâo há uma alteração significativa do aludido quatro. DEFIRO, pois, a antecipação de tutela.
2.40. Perigo de dano:
Há uma situação de risco para a autora, dado o início das aulas. Ela frequenta curso de medicina, que exige, como notório, dedicação intensa. Deseja estudar, o que é louvável. Assim, reputo haver necessidade de imediata intervenção judicial no caso.
2.41. Eventual exigência de contracautelas:
Deixo de condicionar a antecipação de tutela à apresentação de contracautelas pelo(a) autor(a), na forma do art. 300,§1º, CPC, na medida em que não há sinais da sua necessidade. Ademais, não houve tal exigência nas deliberações anteriores.
2.42. Cominação de multas-diárias:
Arbitro multa de R$ 500,00 - quinhentos reais, para cada dia de atraso no cumprimento desta decisão. Cominada multa, resta afastada a viabilidade de imputação da prática de crime de desobediência.
"O crime de desobediência, entretanto, não ficou configurado, pois firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que não há o crime de desobediência se para o descumprimento da ordem legal já há previsão legislativa de sanção civil ou administrativa, salvo se há expressa admissibilidade da cumulação das sanções extrapenal e penal."
(ACR 0016055-73.2015.4.01.3900, DES. FEDERAL NÉVITON GUEDES, TRF1 - QUARTA TURMA, e-DJF1 09/12/2020 PAG.)
Caso se faça necessário, a multa poderá ser majorada, na forma do art. 537, CPC, dado o seu caráter modulável. Em casos extremos, persistindo o descumprimento da decisão, a medida poderá ser orientada ao patrimônio do servidor porventura responsável pelo inadimplemento, viabilizando-se sua manifestação nos autos a respeito do tema. Sendo cominada e paga, haverá de ser destinada a favor da empresa impetrante, na forma do art. 537, §2, CPC. Em tal caso, deverá ser paga de modo atualizado, conforme variação da taxa SELIC, com termo inicial na data em que a multa teria se tornado devida e termo final na data do efetivo pagamento. Não estando definida a variação da SELIC no mês de pagamento, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção monetária. Não incidem juros moratórios sobre aludida multa, dado que isso configuraria
bis in idem,
eis que ela já é mecanismo dissuasório do atraso.
Anoto ainda que a fixação das
astreintes
não gera preclusão
pro iudicato,
eis que, em determinados contextos, contanto que a liminar reste cumprida, aludido crédito pode ser reduzido ou mesmo cancelado, dado que se trata de medida de inibição do inadimplemento. De todo modo, como regra, surge com isso certo dilema envolvendo, de um lado, a vedação de enriquecimento sem causa de uma das partes (art. 884, Código Civil) e, de outro, a necessidade de assegurar mecanismo indispensável para assegurar a efetividade da tutela de direitos, debatidos em Juízo.
Acresento que a cobrança de
astreintes
apenas pode ser promovida depois de eventual confirmação da liminar em sentença (STJ - EAREsp: 513829, Relator.: LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: 05/06/2015). NO caso, por ora, a multa haverá de ser suportada pela Unipositivo, caso haja descumprimento da decisão.
2.43. Súmula 410, STJ e notificação:
Reputo que a notificação promovida pelo eproc suprirá a necessidade prevista na súmula 410, STJ. Ademais, assegura-se à autora promover a notificação por meio do(a) seu(sua) advogado(a), conforme art. 269, §1, Código de Processo Civil.
2.44. Responsabilização processual:
Registrei acima que o devido processo implica certo dilema. Por outro lado, deve assegurar defesa, dilações probatórias etc., de modo que, como regra, uma sentença de procedência apenas poderia surtir efeitos depois do trânsito em julgado. Por outro lado, o processo deve ser efetivo, assegurando ao titular do direito a efetiva proteção da sua situação jurídica.
Acrescento que, para além disso, o processo não pode causar prejuízos para quem tenha razão. A antecipação de tutela é fundada em um juízo provisório, precário, tomando em conta os elementos probatórios com exame
prima facie.
Nada impede, portanto, que aludido exame tenha que ser revisto no curso do processo ou em sentença, conforme lógica do art. 296, Código de Processo Civil/15.
A eventual revogação da antecipação de tutela surtirá efeitos retroativos -
ex tunc -,
tornando-a sem efeitos desde o deferimento
. Logo, caso isso venha a ocorrer, a requerente poderá ser responsabilizada por prejuízos que porventura tenham decorrido do provimento de urgência. Isso decorre da lógica dos arts. 302, 520, CPC e da súmula 405, STF.
No caso em exame, isso se traduziria na cobrança dos débitos discutidos, atualizados e com a incidência dos consectários moratórios previstos nos instrumentos contratuais em questão. De todo modo, isso é tema a ser apreciado caso tal revogação ocorra.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. REITERO a competência do presente juízo para processamento deste mandado de segurança, conforme fundamentação.
3.2. DESTACO que não diviso um contexto de conexão processual a ensejar a reunião desta causa com alguma outra, para fins de solução conjunta, conforme art. 55, §1, CPC e súmula 235, STJ.
3.3. ACRESCENTO que não há indicativos de violação à garantia do respeito à coisa julgada - art. 508, CPC/15 e art. 5, XXXVI, CF/88. Tampouco há sinais de litispendência na espécie, conforme art. 337, §2, CPC/15. Não estão preenchidos os requisitos da suspensão da demanda.
3.4. RECONHEÇO, com cognição precária, a legitimidade do impetrante para o presente processo, na forma do art. 17, CPC. REGISTRO, ademais, que as demandadas estão incumbidas de atribuições para atender a pretensão no âmbito administrativo.
3.5. DEFIRO a antecipação de tutela, repisando as decisões anteriores havidas nessa demanda. DETERMINO que a Universidade Positivo promova a matrícula da demandante no curso de medicina, no semestre pertinente (período letivo 2025.2). Prazo de 05 (cinco) dias úteis, contados da notificação.
3.6. COMINO multa de
R$ 500,00 - quinhentos reais
- para o cada dia de atraso no cumprimento desta decisão, sem prejuízo de eventual exasperação, caso se faça necessário (art. 537, CPC). Registro que aludida multa haverá de ser paga, em princípio, pela Universidade demandada. A multa deverá ser paga, caso incidente, de modo autalizado, conforme variação da SELIC, com termo inicial na data da sua incidência e termo final na data do efetivo pagamento. Caso, no mês de pagamento, a SELIC não esteja prevista, deverá incidir 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de atualização, conforme art. 39, §4, lei n. 9.250/1995. Não incidem juros moratórios sobre as astreintes. Eventual execução apenas pode ser promovida depois do trânsito em julgado de eventual sentença que porventura confirme a liminar em questão.
3.7. NOTIFIQUE-SE a Universidade requerida a respeito da comuninação da multa em questão, para os fins da súmula 410, STJ.
3.8. ANOTO que, por conta da urgência, a autora poderá promover a notificação Universidade requerida, apresentando cópia desta deliberação, nos termos do art. 269, §1, Código de Processo Civil.
3.9. INTIMEM-SE as partes a respeito desta decisão.
3.10. INTIMEM-SE as partes, ademais, para que, querendo, detalhem, de modo justificado, as diligências probatórias pertinentes e necessárias para a solução do processo. Caso requeiram a inquirição de testemunhas deverão apresentar desde logo o pertinente rol, com a qualificação devida, atentando para o limite do art. 537, §6, CPC/15. Prazo comum de 15 dias úteis, contados da intimação.
3.11. ACRESCENTO que, caso requeiram dilação pericial, deverão apresentar desde logo os quesitos correlatos, sem prejuízo de oportuna intimação para indicação de assistentes periciais e demais medidas do art. 465, §1, CPC, caso a medida venha a ser deferida pelo Juízo. Ficam cientes de que o decurso
in albis
do aludido prazo implicará preclusão temporal. Prazo comum de 15 dias úteis, contados da intimação, conforme arts. 219, 224, CPC, art. 12-A da lei n. 9.099/1995 e art. 5 da lei n. 11.419/2006.
3.12. VOLTEM conclusos para saneamento, tão logo as partes se manifestem a respeito do eventual interesse em diligências probatórias ou se esgote o prazo para tanto fixado. Caso não sobrevenham pedidos, voltem para prolação de sentença.
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