Processo nº 5004731-77.2025.4.04.7000
ID: 312848557
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5004731-77.2025.4.04.7000
Data de Disponibilização:
01/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EDUARDO DE LEMOS FIEBRANTZ
OAB/PR XXXXXX
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ANDRE LIMA DE ALBUQUERQUE FIGUEIREDO
OAB/RJ XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5004731-77.2025.4.04.7000/PR
AUTOR
: SILVIO FAGUNDES DE ALMEIDA
ADVOGADO(A)
: EDUARDO DE LEMOS FIEBRANTZ (OAB PR113380)
ADVOGADO(A)
: ANDRE LIMA DE ALBUQUER…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5004731-77.2025.4.04.7000/PR
AUTOR
: SILVIO FAGUNDES DE ALMEIDA
ADVOGADO(A)
: EDUARDO DE LEMOS FIEBRANTZ (OAB PR113380)
ADVOGADO(A)
: ANDRE LIMA DE ALBUQUERQUE FIGUEIREDO (OAB RJ224936)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
Em 04 de fevereiro de 2025,
SILVIO FAGUNDES DE ALMEIDA
deflagrou a presente demanda, sob rito dos juizados especiais, em face da UNIÃO FEDERAL e do BANCO DO BRASIL S/A, pretendendo o recebimento das diferenças relativas aos índices de correção monetária e aos expurgos inflacionários, bem assim aos débitos indevidamente realizados na conta do fundo PIS/PASEP.
Para tanto, o requerente argumentou que "
Durante o curso da relação de emprego do Autor, os Réus não promoveram a atualização/correção do PASEP de forma correta, não atendendo ao comando constitucional de que os valores de 1988 deveriam ser preservados.. Seja por falta de inclusão na correção monetária dos expurgos inflacionários em dois períodos – Planos Verão e Collor – seja por saques indevidos, como os detalhados no Anexo I do DOC04, páginas 22 e 23
".
Afirmou que os valores da conta não foram preservados pelo Banco do Brasil, apontando que "
Resta evidente, portanto, que os valores depositados por força dos programas PIS/PASEP foram mal administrados e mal geridos, pelo Banco do Brasil, ora Réu, responsável pela gestão/administração do programa
".
Sustentou que a União e o Banco do Brasil estariam legitimados para a presente demanda. Detalhou os pedidos e atribuiu à causa o valor de R$ 23.699,14, juntando documentos.
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Competência da Justiça Federal:
Com cognição não exaustiva, declaro a competência da Justiça Federal para o caso, dado que a pretensão do autor foi endereçada à União Federal. Aplicam-se ao caso o
art. 109, I, CF/1988 e o art. 10 da lei n. 5.010/66
.
Caso seja declarada, nos tópicos abaixo, a ilegitimidade da União Federal, isso implicará então a incompetência da Justiça Federal para as etapas subsequentes da demanda, conforme lógica do
art. 64, CPC e súmulas 150, 224, 254, Superior Tribunal de Justiça
.
Registro que cabe à Justiça Federal apreciar o alcance da sua competência, ao STJ, quando suscitado conflito ou mesmo ao STF, em caso de interposição de recursos perante a Suprema Corte.
2.2. Submissão do caso à alçada dos Juizados:
Como sabido, a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, diante do previsto no art. 98, I, Constituição e art. 3º da lei n. 10.259, de 2001. Logo, em princípio, não pode ser ampliada ou reduzida, impondo-se sua apreciação de ofício pelo Poder Judiciário, conforme art. 64, CPC.
Não se submetem à "
competência do Juizado Especial Cível as causas: (...) para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal.
"
Convém ter em conta, todavia, que o processo é individualizado pela conjugação do trinômio partes, pedido e causa de pedir (art. 337, §2 CPC). Em decorrência do princípio da substanciação, a parte autora é obrigada a detalhar, na peça inicial, a sua pretensão, indicando o pedido e também a motivação do pedido. Note-se ainda que, como notório, apenas o dispositivo transita em julgado, conforme se infere do Art.. 504, I, CPC:
"Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença."
Assim, como têm entendido os tribunais, os Juizados Especiais são competentes para apreciação de pretensões nas quais a alegada nulidade do ato administrativo é invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido:
"(....) Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º , § 1º , III , da Lei 10.259 ,
uma vez que a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
. Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50446614920184047000 PR 5044661-49.2018.4.04.7000, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, Data de Julgamento: 02/04/2020).
Ainda segundo a Turma Recursal,
"O valor da causa atribuído pela parte autora é inferior a 60 salários, o qual não foi impugnado, logo, não há o que discutir quanto a esse aspecto.
Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259, uma vez que "a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
". Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal. "
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50029127820204047001 PR 5002912-78.2020.4.04.7001, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, 22/10/2020, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Atente-se para os julgados que transcrevo abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. COMPETÊNCIA DESTA E. CORTE. SÚMULA 428 DO STJ. AÇÃO INDIVIDUAL DE DISPENSA DE PAGAMENTO DE PEDÁGIO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. PRECEDENTES DESTA 2ª SEÇÃO. CONFLITO PROCEDENTE. 1 - Nos termos da Súmula 428 do Superior Tribunal de Justiça, compete a esta E. Corte dirimir o presente conflito negativo de competência entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal Cível. 2 - Busca a autora tão somente o reconhecimento de seu direito individual à dispensa do pagamento de pedágio na praça de arrecadação instalada no entroncamento das rodovias BR 153 e BR 369, localizada no município de Jacarezinho/PR, com fundamento na Portaria do Ministério dos Transportes nº 155/2004 bem como na sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.70.13.002434-3. 3 -
A questão relativa à desconstituição de ato administrativo não faz parte do pedido do autor, que dela tratou apenas de forma incidental, como causa de pedir, de modo que, no caso dos autos, resta afastada a aplicação do art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259/01. Precedentes desta Segunda Seçã
o. 4 - Aplicável à hipótese em tela a regra geral prevista no caput do artigo 3º da Lei 10.259/2001, que estabelece a competência dos Juizados Especiais Federais em se tratando de causas com valor inferior a sessenta salários mínimos. 5 - Conflito procedente, para declarar a competência do Juizado Especial Federal Cível de Ourinhos/SP.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 21150 0000310-88.2017.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2017).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA QUE VISA O RECONHECIMENTO DE DIREITO. MERA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO INCISO III DO §1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.250/01. A
parte autora pleiteia a declaração de direito à percepção de determinada vantagem pecuniária, não havendo pedido imediato de anulação de qualquer ato administrativo, o qual só seria atingido via reflexa, razão pela qual não se aplica, na espécie, a regra que excepciona da competência dos Juizados Especiais Federais para causas valoradas até sessenta salários mínimos. Inaplicável ao caso a exceção prevista no inc. III do §1º do art. 3º da Lei nº 10.259/01
. (TRF4 5018358-17.2016.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 22/12/2016).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. COMPETÊNCIA DO STJ PARA APRECIAR O CONFLITO. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA. CRITÉRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL EM FACE DO VALOR DA CAUSA. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que juízo de juizado especial não está vinculado jurisdicionalmente ao tribunal com quem tem vínculo administrativo, razão pela qual o conflito entre ele e juízo comum caracteriza-se como conflito entre juízos não vinculados ao mesmo tribunal, o que determina a competência do STJ para dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição. Precedentes. 2. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados têm natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). 3. A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo).
Entre as exceções fundadas no critério material está a das causas que dizem respeito a "anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal". 4. No caso, a demanda tem valor da causa inferior a sessenta salários mínimos e visa a obter indenização por danos morais. A ilegitimidade dos atos administrativos constitui apenas fundamento do pedido, não seu objeto
. 5. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juízo Federal da 7ª Vara do Juizado Especial Cível da Subseção Judiciária de São Luís -MA, o suscitante. (STJ, CC 75314/MA, 1ª Seção, Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 27/08/2007).
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXCEÇÃO DO ART. 3º, § 1º, INC. III, DA LEI Nº 10.259/01 AFASTADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
A pretensão formulada nesta ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses arroladas no § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, visto não tratar a ação de anulação ou cancelamento de ato administrativo típico.
O pedido envolve, apenas, reconhecimento de direito. Sendo o valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, cabe ao Juizado Especial Federal a competência para processar, conciliar e julgar as causas de competência da Justiça Federal
. (TRF4, conflito de competência (Seção) Nº 5008065-61.2011.404.0000, 2ª Seção, Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, em 08/09/11).
Assim, e atribuído à causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tem-se que competente para o processamento e julgamento da lide o Juizado Especial Federal
. Diante do exposto, nos termos do disposto no art. 120, § único, do CPC, conheço do presente conflito e declaro competente para o processamento e julgamento da lide o juízo suscitado (Juízo Substituto da 1ª Vara de Florianópolis). Publique-se. Comuniquem-se os juízos conflitantes e, com as formalidades de estilo, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.
(TRF4 5013834-11.2015.404.0000, Segunda Seção, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, 11/07/2015)
Eventual complexidade
da demanda não afasta a sua submissão à alçada dos Juizados Especiais Federais, diante do disposto no art. 98, I, Constituição/88 e art. 3 da lei n. 10.259/2001:
"
Não há óbice na Lei nº 10.259/01 a produção de prova pericial nos processos de competência do Juizado Especial Federal. Ao contrário, há previsão expressa no seu Art. 12 relativa a realização de prova técnica. 2. É entendimento assente na jurisprudência que a complexidade da prova necessária ao julgamento da controvérsia não é incompatível com o rito do JEF, sendo certo que o legislador elegeu como único critério de delimitação de sua competência o valor da causa 3. Agravo de instrumento desprovido
."
(TRF-3 - AI: 50174760920214030000 SP, Relator: Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, Data de Julgamento: 07/12/2021, 10ª Turma, 10/12/2021)
Na situação em exame, o conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial é inferior a
60 salários mínimos
- definidos no decreto 12.342, de 30 de dezembro de 2024 (R$ 1.518,00) -, tratando-se de pretensão condenatória, de modo que o seu processamento sob o rito dos Juizados Especiais revela-se devido, não esbarrando na vedação do art. 3, §1, III, lei n. 10.259/2001.
2.3. Competência da presente Subseção Judiciária:
A pretensão deduzida na peça inicial submete-se à alçada desta Subseção Judiciaria de Curitiba, por força do
art. 53, III, "d", CPC/15
, dado constituir-se no local de cogitado adimplemento da obrigação aludida na peça inicial, caso a pretensão da autora venha a ser julgada procedente, em sentença transitada em julgado.
Ademais, ainda que assim não fosse, aplica-se ao caso a regra do
art. 109,§2º, Constituição Federal
, que assegura à parte a escolha entre Subseções Judiciárias:
"As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal."
O art. 109, §2º, CF, prevalece sobre o art. 3º, §3º, da lei n. 10.259, de 2001. Com efeito,
"A competência absoluta dos Juizados Especiais, referida no art. 3º , § 3º , da Lei n. 10.259 /01 não constitui obstáculo à redistribuição para fins de equalização de acervo, desde que o encaminhamento ocorra para outra Vara com competência também vinculada ao sistema dos Juizados Especiais Federais. 5. A norma que afirma que "no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta" tem ligação histórica com a interpretação dada pela doutrina e pela jurisprudência à Lei nº 9.099 /95, no sentido de que "o ajuizamento da ação perante o juizado especial é uma opção do autor (art. 3 ., par.3., da Lei 9.099 /95)" ( REsp 151.703/RJ , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/1998, DJ 08/06/1998, p. 124). 6.
O ajuizamento obrigatório de causas de até 60 salários mínimos nos Juizados Especiais Federais empresta a essas ações uma competência absoluta para o próprio sistema dos Juizados Especiais, mas não torna essas ações infensas às medidas de equalização. Nada impede, portanto, a incidência do art. 109 , § 2º , da Constituição Federal , no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal
."
(TRF-4 - CC: 50799694420214047000 PR 5079969-44.2021.4.04.7000, Relator: NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/02/2022, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Por conseguinte,
considerando o alcance do art. 109, §2, CF, a tramitação desta causa perante esta Subseção Judiciária está em conformidade com a legislação
. Ademais, a declinação de competência territorial depende de prévia exceção de incompetência, na forma do art. 65, CPC/15, e súmula 33, Superior Tribunal de Justiça.
2.4. Competência do presente Juízo:
A causa restou distribuída perante este Juízo, o que atendeu à garantia do Juízo Natural, conforme art. 5, LIII, Constituião Federal.
2.5.
Cogitada conexão:
O processualista Bruno S. Dantas enfatiza que
"
com o início de vigência do CPC/2015, será considerado prevento o juízo perante o qual houver ocorrido o registro ou a distribuição (conforme o caso) da primeira de uma série de demandas conexas, ainda que tal registro ou distribuição tenha ocorrido durante a vigência do CPC/1973
. Desde que a prevenção, ela própria, não se tenha consumado sob a égide do CPC/1973 (por um dos alternativos critérios previstos nos seus arts. 106 e 2019), incidirá de plano o disposto no art. 59 da codificação de 2015 definindo-se o juízo prevento para um conjunto de demandas conexas pela anterioridade dos registros ou das distribuições (conforme o caso) das mesmas. Os arts. 60 e 61 do CPC/2015, por sua vez, praticamente repetem os arts. 107 e 108 do CPC/1973, dispensando, por tal razão, maiores comentários a respeito nesta oportunidade."
(DANTAS, B. S.
in
WAMBIER, Teresa A. Alvim et al.
Breves comentários ao novo código de processo civil.
SP: RT, 2015, p. 229).
Convém ter em conta a lição de Araken de Assis, sobre o tema:
"(...)
O art. 55, caput, definiu a conexão como a identidade de pedido ou de causa inspirado no propósito de erradicar as tergiversações constatadas na vigência do CPC de 1939. A proposição legislativa, excepcional no direito estrangeiro, porque prepondera a tendência de encarregar o órgão judicial de indicar os casos do fenômeno, consonante controvérsia haurida do direito comum, e feita em sentido oposto à do CPC de 1939, em todo caso revela-se incompleta e insuficiente. Não abrange a totalidade das hipóteses de conexão
. O art. 55, § 3.º (“… mesmo sem conexão entre eles”) alude à conexão em sentido estrito do art. 55, caput. Ao nosso ver, os vínculos que geram o risco da prolação de “decisões conflitantes ou contraditórias”, a teor do art. 55, § 3.º, inserem-se na rubrica da conexão em sentido amplo. Não há outro sítio adequado para situar o liame entre os objetos litigiosos
O art. 113 do NCPC, arrolando os casos em que se admite a demanda conjunta, ou litisconsórcio, demonstra que existem outros laços, mais tênues e distantes, que autorizam o processo cumulativo. E a outro juízo não se chega ao avaliar o nexo exigido pelo art. 343 na reconvenção, como ocorria no direito anterior. Retira-se, daí, segura conclusão
. As duas hipóteses descritas no art. 55, caput – identidade de causa ou identidade de pedido – constituem “uma, entre as várias em que ocorre a conexão”. Por isso, antes do CPC de 1939, descreveu-se a conexão como “laço envolvente, que se insinua por entre as relações jurídicas, ora prendendo-as de um modo indissolúvel, por forma a exigir uma única decisão; ora criando entre elas pontos de contato mais ou menos íntimo, que aconselham a reunião em um só processo, ainda quando possam ser decididas separadamente, sem maior dano, a não ser a lentidão e o gravame de maiores despesas”.
Exemplos de causas conexas, segundo a literalidade do art. 55, caput: (a) A reivindica o imóvel x perante B, e, paralelamente, C também reivindica o imóvel x, do mesmo réu, hipótese em que a identidade recai sobre o pedido (objeto) mediato; (b) o locatário A propõe consignatória dos aluguéis perante o locador B, o qual, de seu turno, propõe ação de despejo, fundada no inadimplemento dos aluguéis, perante o inquilino.
Para os efeitos da modificação da competência, as hipóteses contempladas no art. 55, caput – identidade de causa de pedir ou identidade de pedido –, então, ainda consideram-se exemplificativas. Um laço menos intenso já serve para reunir os processos. O objetivo da regra reside em evitar decisões conflitantes, “por isso a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir, que o artigo por primeiro quer que seja comum, deve ser entendida em termos, não se exigindo a perfeita identidade, senão que haja um liame que os faça passíveis de decisão unificada”. Em outra oportunidade, reiterou-se que “não é necessário que se cuide de causas idênticas (quanto aos fundamentos e ao objeto {rectius: pedido})”, bastando “que as ações sejam análogas, semelhantes”, insistiu no “escopo da junção das demandas para um único julgamento é a mera possibilidade da superveniência de julgamentos discrepantes
”.
Por conseguinte, a jurisprudência, atendendo às finalidades da modificação da competência, em que a derrogação das regras gerais se justifica pela economia de atividade e pela erradicação do risco de julgamentos conflitantes, rejeita a exigência de identidade absoluta de causa ou de pedido, aceitando simples analogia entre as ações
. Porém, preocupa-se com o risco de julgamentos contraditórios, evento apurado caso a caso, mas verificado em todas as hipóteses do art. 113, inclusive na afinidade de ponto comum de direito ou de fato (inc. III). Ora, parece difícil visualizar semelhante risco no cúmulo simples de pedidos, em que há total autonomia das pretensões deduzidas, no mesmo processo, contra o réu. Por isso, o intuito de erradicar pronunciamentos conflitantes não oferece a única e constante justificativa para o processo cumulativo e, muito menos, a prorrogação da competência. Ao menos na conexão subjetiva, no caso da cumulação simples de pedidos, impera o princípio da economia processual. E, de toda sorte, as finalidades visadas no processo cumulativo, e na reunião de causas inicialmente autônomas, mostram-se estranhas à verdadeira causa desses fenômenos, que residiria no vínculo entre partes, causa e pedido." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume I. São Paulo: RT, 2015, tópico 302)
No caso em exame, não diviso sinais de conexão desta demanda com algum outro processo, para fins de reunião e solução conjunta, na forma do
art. 55, §1º, parte final, CPC/15:
"Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado
."
Menciono a súmula 235, STJ:
"
A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado
."
2.6. Respeito à
coisa julgada
:
No que toca ao exame de ofício, na forma do art. 485, §3, CPC/15, convém ter em conta que a coisa julgada é uma garantia constitucional, nos termos do art. 5º, XXXVI, Constituição Federal/88:
"a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada."
Segundo a Suprema Corte,
"A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que
haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei
, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal,
estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo STF, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade
. A superveniência de decisão do STF, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia ex tunc - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, in abstracto, da Suprema Corte."
(STF, RE 592.912-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-4-2012, Segunda Turma, DJE de 22-11-2012.)
Atente-se também para a lição de Humberto Theodoro Jr.:
"A coisa julgada é fenômeno próprio do processo de conhecimento, cuja sentença tende a fazer extinguir a incerteza provocada pela lide instalada entre as partes. Mas fazer cessar a incerteza jurídica não significa apenas fazer conhecer a solução cabível, mas impô-la, tornando-a obrigatória para todos os sujeitos do processo, inclusive o próprio juiz. Às vezes, o comando sentencial tem de ser executado por meio de realização coativa da prestação devida pelo vencido. Outras vezes, a declaração apenas é suficiente para eliminar o foco da desavença. Nem sempre, portanto, o processo civil está predisposto a providências executivas. Há acertamentos condenatórios, mas há também os não condenatórios, que se desenvolvem em torno de pretensões constitutivas ou apenas declaratórias.
Uma vez, porém, concluído o acertamento da controvérsia, seja por sentença de imposição de sanção, seja por sentença puramente declaratória, a coisa julgada se estabelece com a mesma função, ou seja, a certeza jurídica em torno da relação controvertida se implanta com plenitude, vinculando as partes e o juiz.
Essa situação jurídica cristalizada pela coisa julgada caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: de um lado, vincula definitivamente as partes; de outro, impede, partes e juiz, de restabelecer a mesma controvérsia não só no processo encerrado, como em qualquer outro.
Admite-se, dessa maneira, uma
função negativa
e uma
função positiva
para a coisa julgada. Pela função negativa exaure ela a
ação exercida
, excluindo a possibilidade de sua
reproposição
. Pela função positiva, “impõe às partes obediência ao julgado como norma
indiscutível
de disciplina das relações extrajudiciais entre elas e obriga a autoridade judiciária a ajustar-se a ela, nos pronunciamento que a pressuponham e que a ela se devem coordenar
” (
apud
NEVES, Celso. Coisa Julgada Civil. São Paulo: RT, 1971, p. 383-383).
A coisa julgada, por sua força vinculativa e impeditiva, não permite que partes e juiz escapem da definitiva sujeição aos efeitos do acertamento consumado no processo de conhecimento. O resultado prático é caber a qualquer dos litigantes “a
exceptio rei iudicatae,
para excluir novo debate sobre a relação jurídica decidida” (
apud
NEVES, Celso. Op. Cit, p. 489), e ao juiz o poder de, até mesmo de ofício, extinguir o processo sem julgamento do mérito, sempre que encontrar configurada a ofensa à coisa julgada (ar. 267, V e § 3º).
Portanto, quando o art. 467 fala em
indiscutibilidade
e
imutabilidade
da sentença transitada em julgado refere-se a duas coisas distintas: a) pela
imutabilidade
, as partes estão proibidas de propor ação idêntica àquela em que se estabeleceu a coisa julgada; b) pela
indiscutibilidade
, o juiz é que em novo processo, no qual se tenha de tomar a situação jurídica definida anteriormente pela coisa julgada como razão de decidir, não poderá reexaminá-la ou rejulgá-la; terá de tomá-la simplesmente como
premissa
indiscutível. No primeiro caso atua a força
proibitiva
(ou negativa) da coisa julgada, e, no segundo, sua força
normativa
(ou positiva)
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil:
Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 587-588).
Nesse mesmo sentido, leiam-se também os seguintes julgados: RE 444.816, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 29-5-2012, Primeira Turma, DJE de 27-8-2012; RE 594.350, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 25-5-2010, DJE de 11-6-2010.
Segundo o conhecido art. 502, CPC/15,
"
Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso
.
" O art. 503, do mesmo código, preconiza que
"A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida."
Merece ênfase, ademais, o art. 508, CPC:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero são precisos quando enfatizam que
"
A coisa julgada pressuposto do discurso jurídico - constitui uma regra sobre o discurso. Não admite, nesse sentido, ponderação. Representa evidente agressão ao Estado Constitucional e ao próprio discurso jurídico a tentativa de relativizar a coisa julgada
."
(
MARINONI
, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Código de processo civil.
6. ed. rev. atual. São Paulo: RT, 2014, p. 449).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC).
No caso em exame, no momento não diviso sinais de que a pretensão da parte autora já tenha sido solucionada no âmbito de algum outro processo, com sentença transitada em julgado.
2.7. Eventual litispendência:
Tampouco parece haver litispendência, o que pressupõe - conforme
art. 337, §2, CPC/15
- identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. No presente processo, a aludida exceção não foi suscitada pelas partes e não constato o cogitado
bis in idem
, no que tange ao exame de ofício.
Aludido requisito de identidade de partes é esmaecido, e fato, quando em causa processos coletivos, na medida em que a parte autora pode deduzir pretensão em nome de coletividades.
Com efeito, quando em causa ações coletivas, é salutar ter em conta
"
que a aferição da litispendência na tutela coletiva deve ser regida não pela análise de quem formalmente se apresenta como autor das diversas demandas, mas, sim, pela qualificação jurídica de tal legitimação. Vale dizer, indagando-se a que título estão as diferentes entidades autoras em juízo, deduzindo idênticas pretensões de tutela de direitos meta-individuais (mesmos pedidos e causas de pedir), quando, então, será possível afirmar serem idênticas as demandas coletivas.
Deste modo, em virtude da especialidade do modelo processual coletivo, e, notadamete da qualificação da legitimação ativa empregaada, revela-se equivocada a afirmação de inexistência de litispendência entre ações coletivas através das quais sejam deduzidas idênticas pretensões, pelo tão-só fato de terem sido propostas por entidades diferentes
."
(VENTURI, Elton.
Processo civil coletivo:
a tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 331).
Ainda segundo Venturi,
"o eventual ajuizamento de várias ações coletivas,
ainda que de diferentes espécies
, como antes ressaltado, pelas quais se deduzem idênticas pretensões (pedidos e causas de pedir), não terá o condão de encobrir a realidade de serem, antes e mais que conexas,
verdadeiramente idênticas
, acarretando, portanto, o fenômeno da litispendência e, assim, a necessidade de o juiz extinguir as demandas coletivas idênticas à originalmente proposta perante o juízo prevento."
(VENTURI, Elton.
Obra cit.
p. 333-334).
Semelhante é a avaliação de Rodolfo de Camargo Mancuso, quando argumenta o que transcrevo abaixo:
"
Para a aferição dos
tria eadem
no processo coletivo não é bastante a identificação física ou institucional dos autores e réus nas ações comparadas, até porque os autores atuam em legitimação extraordinária e concorrente-disjuntiva, de sorte que outros critérios devem ser excogitados
,
inclusive o que conjuga a extensão territorial do dano historiado e a projeção espacial do raio de atuação de quem se apresenta como portador judicial. Luiz Paulo da Silva Araújo Filho escreve, ao propósito
: Não pode ser esquecida a enorme dimensão das ações coletivas, naturalmente aptas a empolgar milhares ou milhões de pessoas, por vezes em todo o território nacional, sendo certo que o Código de Defesa do Consumidor - CDC cuidou de estabelecer um sistema próprio para essa vocação, como, p.ex., ao insttuir que a sentença fará coisa julgada erga omnes ou ultra partes.
Nessa perspectiva, sempre que o thema decidendum for de âmbito nacional, e o autor da ação tiver representação em todo o país, a princípio deverá haver apenas uma única e exclusiva ação coletiva, com o mesmo objeto e a mesma causa petendi
. A propositura de uma nova ação coletiva idêntica (rectius: a reprositura da mesma ação coletiva) caracteriza irrefragável litispendência. (...)
Nem se poderia, em casos que tais, pretender solução diversa, porque em ambas as ações coletivas replicadas a eficácia da coisa julgada irá operar erga omnes (art. 18, lei n. 4.717/1965 e art. 16 da lei n. 7.347/1985). Se as duas tramitassem em paralelo, e no final uma fosse acolhida e outra rejeitada, qual das duas coisas julgadas assim discrepantes deveria ser atendida? Aí a contraição não seria apenas lógica (com a qual de certo modo procura conviver a ciência processual), mas também prática, e esta é insuportável, na medida em que não se concebem dois comandos incompossíveis, num mesmo espaço-tempo e sobre idêntica matéria: é a face negativa da coisa julgada material, decretando a indiscutibilidade futura sobre o quanto acertado ou atribuído anteriormente, em modo definitivo por uma decisão de mérito." (MANCUSO, Rodolfo de Camargo.
Jurisdição coletiva e coisa julgada:
teoria geral das ações coletivas. 3. ed. rev. ampl. São Paulo: RT, 2012, p. 540 e 541)
Atente-se, além disso, para o julgado que trascrevo abaixo:
DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LICITAÇÃO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. LITISPENDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA. 1. Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de liminar, objetivando a concessão, a moradores de determinadas localidades do Município de Teresópolis, de passes livres e descontos no pedágio localizado no Km 71 da BR 116 trecho Além Paraíba - entroncamento BR 040. 2. Dispõe o art. 301, §2º, que há litispendência quando as ações possuem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
Por sua vez, a Lei nº 7.347/85 aponta que, no caso de Ações Civis Públicas, o determinante para configurar a conexão, litispendência, coisa julgada e demais institutos correlatos, é o objeto e causa de pedir e não as partes, podendo o polo ativo não ser o mesmo processualmente, mas sim materialmente em face da sua legitimação extraordinária, disjuntiva e concorrente
. 3. Patente a litispendência constatada entre a presente demanda e a Ação Civil Pública nº 2004.51.15.000683-7, proposta pelo Ministério Público Federal contra a Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, União Federal, Concessionária Rio-Teresópolis S/A - CRT e Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT, pois esta objetiva beneficiar com a isenção do pedágio não apenas os moradores de determinadas localidades do Município de Teresópolis, mas sim todos os seus munícipes, ou seja, possui um pedido mais amplo que a presente Ação Civil Pública. 4. Remessa Necessária desprovida.
(REMESSA 00001015020054025115, GUILHERME DIEFENTHAELER, TRF2.)
Conquanto se cuide de uma legitimação autônoma (LEONEL, Ricardo de Barros.
Manual do processo coletivo.
4. ed. SP: Malheiros. 2017. p. 185), é fato que a atuação das associações, na forma do art. 5º, V, da lei n. 7.347/1985, se justifica por força do seu reconhecimento enquanto uma espécie de corpos intermédios ou grupos de interesse, com propenção para suscitar, perante o Poder Judiciário, debates no interesse da coletividade.
Isso significa que, no âmbito de demandas coletivas,
class actions
e ações civis públicas, a identidade entre demandas não se dá nos exatos termos do art. 337, §2º, CPC/15, já referido
.
Pode haver litispendência entre tais demandas, mesmo quando deflagradas por entidades distintas - veiculando a mesma pretensão -, dada a propensão a se ensejar coisa julgada
erga omnes.
Caso fosse afastada a litispendência, em casos tais, haveria o risco de liberações conflitantes, atingindo os mesmos destinatários; sentenças proibindo e sentenças permitindo a mesma prática, ensejando antagonismo normativo gerador de perplexidades e confusão.
No processo em exame, não estão preenchidos os requisitos para a configuração de litispendência - art. 337, §2, CPC/15, tampouco havendo lastro para aplicação do art. 104, da lei n. 8.078/1990.
2.8. Eventual suspensão da demanda:
Na presente etapa da demana, não constato a presença dos requisitos que ensejariam suspensão do processo, por conta de alguma questão prejudicial - art. 313, Código de Processo Civil/15: "
Suspende-se o processo: (...) V -
quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente
; b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo. (...) § 4 O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II. §5 O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no §4."
A respeito dos aludidos preceitos, convém registrar aqui a análise detida promovida por Araken de Assis:
"Prejudicial externa civil – A hipótese mais frisante de suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa homogênea é a prevista no art. 313, V, a, do NCPC.
Toda vez que o julgamento do mérito “depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”, o juiz suspenderá o processo
. Derivações dessa regra avultam na possibilidade de o relator suspender os processos que dependam do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade (art. 21 da Lei 9.868/1999) e da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 5.º, § 3.º, da Lei 9.882/1999) – não, porém, a suspensão em decorrência do incidente de resolução das demandas repetitivas ou do julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial repetitivos: a questão aí julgada é principal. O art. 313, V, a, trata da suspensão por causa prejudicial, que é a aptidão da prejudicial em tornar-se objeto litigioso em outro processo.
Fica evidente da redação da norma que a prejudicial é externa, porque há de consistir em “objeto principal de outro processo”. Não importa a circunstância de a questão prejudicial consistir no objeto originário do outro processo (v.g., A postula a invalidade do contrato firmado com B, mas B pleiteia o cumprimento da prestação devida por A) ou decorrer do alargamento desse objeto, por força de declaração incidente (v.g. B pleiteou de A, no primeiro processo, o principal da dívida, mas A reagiu pleiteando a declaração incidente da validade do contrato; no segundo processo, B pleiteia de A os juros da dívida). Importa a resolução da questão comum no outro processo, com autoridade de coisa julgada. E, nesse caso, o vínculo produzido na causa subordinante estender-se-á à causa subordinada ou, vencido o prazo máximo de suspensão – hipótese mais do que provável, vez que o interregno de um ano (
art. 313
, § 4.º) é muito curto, pressupondo-se elastério mais dilatado para o julgamento, por forçada ordem cronológica do art. 12, e o trânsito em julgado –, sobre a deliberação incidental na causa subordinada não recairá a coisa julgada (art. 503, § 1.º, III, in fine). Realmente, a questão comum não constitui o objeto principal da causa condicionada. Do contrário, configurar-se-ia um dos efeitos da litispendência, a proibição de renovação de causa idêntica. Cumprirá ao juiz julgá-la vencido o prazo hábil de espera, incidentalmente, apesar dos esforços de concatenação empreendidos pelo expediente da suspensão.
O exemplo ministrado, em que uma das partes pleiteia a decretação da invalidade do contrato e a outra reclama a prestação, releva que tampouco importa a diversidade da força da ação (declarativa, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental) e a espécie de procedimento. A pretensão de A contra B para decretar a invalidade do contrato tem força constitutiva negativa, a de B contra A para realizar a prestação tem força condenatória. Nada obstante, o primeiro processo funciona como causa prejudicial relativamente à pretensão deduzida no segundo: decretada a invalidade do contrato naquele, fica predeterminado o desfecho deste (improcedência). Evidentemente, havendo a possibilidade de reunir os processos no mesmo juízo (retro, 305), para julgamento simultâneo, por força da conexão (retro, 303), inexiste a necessidade de suspender a causa condicionada, porque os processos conexos serão julgados simultaneamente (art. 55, § 1.º).
O objetivo da suspensão prevista no art. 313, V, a, consiste em evitar a emissão de provimentos conflitantes, logicamente incompatíveis, a respeito da questão prejudicial. Por esse motivo, causa prejudicial envolvendo partes distintas raramente constitui razão bastante para suspender outro processo, por mais relevante que seja a questão comum controvertida em ambos, ressalva feita às hipóteses de o julgamento da causa subordinante produzir efeitos erga omnes, como acontece na ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2.º, da CF/1988). Aliás, essa é uma característica – a falta de identidade de partes – da prejudicial de constitucionalidade, objeto do controle concentrado, todavia alheio à incidência do art. 313, V, a. Em outras palavras, o juiz da causa condicionada não suspenderá o processo em que se controverta norma objeto de controle concentrado de constitucionalidade
. Em tal hipótese, ou o STF concedeu liminar, suspendendo a vigência da norma, e o juiz não poderá aplicá-la; ou não concedeu, e o juiz haverá de aplicá-la no julgamento do mérito, ou não, exercendo o controle difuso. A superveniência do julgamento do STF, pronunciando a inconstitucionalidade, será recepcionado no julgamento do mérito ou, havendo ocorrido o trânsito em julgado, a sentença se tornará inexequível, nas condições do art. 525, § 1.º, III, c/c § 12.
No tocante ao estágio do processo subordinado, a suspensão poderá ocorrer no primeiro e no segundo graus; em particular, “o fato de já ter sido proferida sentença no processo prejudicado não afasta, portanto, a possibilidade de sua suspensão”. Conforme deflui da cláusula final do art. 313, V, a, que alude a “outro processo pendente”, tampouco o estágio do processo subordinante se mostra relevante à suspensão, bastando que subsistam os efeitos da litispendência. Encontrando-se a causa prejudicial no tribunal, por força de apelação, admite-se a suspensão, hipótese em que, presumivelmente, o desfecho ocorrerá dentro do prazo de suspensão
.
Era particularmente difícil a interpretação da regra particular do direito anterior, declarando haver suspensão do processo que “tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente” (art. 265, IV, c, do CPC de 1973). A esse propósito, havia dois termos de alternativa: ou se cuidava de prejudicial externa, caracterizada pelo fato se tratar de questão de estado (v.g., na ação de divórcio, a validade do casamento), hipótese em que incorreria a lei em indesejável redundância; ou se tratava de prejudicial interna, caso em que ocorreria colisão com o sistema da declaração incidente, e, pior, nenhuma justificativa plausível para suspender o processo, pois o juiz da causa resolverá conjuntamente a questão prejudicial, e, conforme o teor da resolução, passando ou não à análise da questão prejudicada. Essa situação constitui simples subespécie da regra geral do art. 313, V, a, do NCPC. É digno de nota a possibilidade de o juízo não exibir competência em razão da matéria para julgar questões de estado em caráter principalmente, hipótese em que a resolução incidental porventura tomada não se revestirá de auctoritas rei iudicate, nos termos do art. 503, § 1.º, III." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume II. Tomo II. Parte geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT. 2015. p. 809 e ss.)
No caso em apreço, aplica-se ao caso a ordem de SUSPENSÃO ditada no tema 1300 do STJ, até ordem em contrário daquele Tribunal. Faço aludido registro, portanto, sem prejuízo de eventual reexame
.
2.9. Legitimidade das partes - considerações gerais:
É sabido que, em alguma medida, as questões alusivas à pertinência subjetiva tangenciam o próprio mérito da causa. Nosso sistema ainda se vincula à concepção eclética de Túlio Liebmann - quem distinguia entre pressupostos processuais, condições para o válido exercício do direito de ação e, por fim, as questões de mérito.
O problema é que, no mais das vezes, os temas próprios ao mérito (procedência/improcedência da pretensão) e os temas próprios às condições da ação (legitimidade/ilegitimidade, possibilidade do pedido) não podem ser distinguidos de uma forma absolutamente clara. Como se infere do seu 'Tratado das ações', Pontes de Miranda promovia uma distinção entre (a) ação em sentido material - como uma espécie de projeção do direito subjetivo - ainda vinculada à concepção imanentista do direito civil antigo e (b) ação em sentido processual.
Com base nessa diferenciação pontiana, é que o desembargador gaúcho Adroaldo Furtado Fabrício tem criticado a teoria eclética, ao enfatizar que as 'condições da ação' também tratam, no geral, do mérito da causa (saber se a parte é legítima é, de certa forma, um exame conexo ao mérito: saber se ela poderia ser demandada, se teria a obrigação de indenizar etc). Confira-se com Adroaldo Furtado Fabrício. Extinção do Processo e Mérito da Causa, in OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de (org).
Saneamento do processo:
Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. PA: Sérgio Fabris, 1990, p. 33.
De todo modo, em sentido pontualmente distinto, e por conta dos dispositivos do Código de Processo Civil em vigor, atente-se para a lição de Araken de Assis:
"A legitimidade não condiciona a ação, como quer a opinião há pouco exposta, haja vista um motivo trivial: a sua falta jamais impedirá a formação do processo. A pessoa que toma a iniciativa de provocar o órgão judiciário, seja quem for, cria a relação processual, embora fadada a perecer através de juízo de admissibilidade negativo – item que constitui pressuposto lógico e cronológico do exame do mérito.
Legitimidade é, descansando no direito material, problema distinto do juízo acerca do caráter fundado ou infundado da pretensão deduzida contra o réu. A demanda movida por alguém sem legitimidade é inadmissível, e, não, infundada. Sentença terminativa desse teor limita-se a repelir, a partir dos dados ministrados pelo direito material, sempre in status assertionis, a habilitação da parte para conduzir o processo, relativamente ao objeto litigioso alegado
. Aos esquemas abstratos, traçados na lei, gerando tal capacidade, chamam-se de situações legitimadoras. Portanto, a dissociação entre o sujeito da lide e o do processo evidencia a verdadeira natureza da legitimidade e a situa no lugar próprio no conjunto das questões submetidas à apreciação do órgão judicial. É um pressuposto processual preenchido mediante a simples enunciação do autor. Ninguém se atreverá a reputar respeitante ao mérito eventual juízo quanto à inexistência, em determinado caso concreto, do título legal para alguém pleitear em juízo direito alheio. Descontada a errônea concepção que ilegitimidade do autor obsta à formação do processo, o art. 485, VI, houve-se com acerto ao situar o problema fora do mérito."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral: institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 178).
Em outras palavras, deve-se aferir a pertinência subjetiva dos contendores, tendo-se em conta a causa de pedir detalhada na peça inicial.
2.10. Legitimidade da parte autora:
O(a)(s) requerente(s) sustentou(aram) que os valores mantidos na(s) sua(s) conta(s), vinculada ao PASEP não teriam sido devidamente atualizados. Ele(a)(s) postulou(aram) a condenação dos requeridos ao pagamento das diferenças disso decorrentes disso - diferenças de correção monetária e juros moratórios correlatos.
Assim, a parte demandante está legitimada para a causa, eis que deduziu pretensão própria, em nome próprio, não esbarrando na vedação do art. 18, Código de Processo Civil/15.
2.11. Tema repetitivo 1150 - STJ:
Convém ter em conta a decisão do STJ, ao aprecia a questão discutida no
Tema Repetitivo 1150
:
"o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto à conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo art. 205 do Código Civil; e o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep".
Atente-se ainda para o seguinte:
"(...) 5. O STJ possui o entendimento de que, em ações judiciais nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao Pasep, a União deve figurar no polo passivo da demanda.
6. No entanto, no caso dos autos a demanda não versa sobre índices equivocados de responsabilidade do Conselho Gestor do Fundo, mas sobre responsabilidade decorrente da má gestão do banco, em razão de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e de correção monetária na conta do Pasep. Conclui-se que a legitimidade passiva é do Banco do Brasil S.A. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.898.214/SE, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 29.4.2021; AgInt no REsp 1.867.341/DF, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 7.10.2021; REsp 1.895.114/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 14.4.2021; AgInt no REsp 1.954.954/CE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 25.3.2022; e AgInt no REsp 1.922.275/CE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 29.6.2021. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL 7. O Banco do Brasil S.A. aduz que ocorreu a prescrição do direito do autor em virtude da adoção do prazo quinquenal estabelecido no art. 1° do Decreto-Lei 20.910/1932, cujo termo inicial deveria ser a data do recolhimento das últimas contribuições para o Pasep, que, segundo a instituição financeira, ocorreu em 1988.
8. Contudo, o STJ possui orientação pacífica de que o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/1932 não se aplica às pessoas jurídicas de direito privado. No caso em espécie, sendo a ação proposta contra o Banco do Brasil, sociedade de economia mista, deve-se afastar a incidência do referido dispositivo, bem como da tese firmada no julgamento do Recurso Especial 1.205.277/PB, sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, de que: "É de cinco anos o prazo prescricional da ação promovida contra a União Federal por titulares de contas vinculadas ao PIS/PASEP visando à cobrança de diferenças de correção monetária incidente sobre o saldo das referidas contas, nos termos do art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32" (STJ, REsp 1895936 / TO, 13 de setembro de 2023).
2.12. Pertinência subjetiva da União - critério:
Note-se, portanto, que - caso a parte esteja impugnando a definição dos índices oficiais aplicáveis às contas do PIS/PASEP -, medida promovida pelo Conselho Monetário Nacional, órgão da União Federal (lei n. 4.595/64, art. 2), a União Federal estará legitimada para a demanda.
Situação distinta vigorará, contudo, quanto a parte sustente que o banco depositário teria deixado de aplicar às contas do PIS/PASEP os indexadores fixados pelo CMN. Em tal caso, haverá i
mputação da prática de equívocos na gestão da conta pelo agente financeiro
, e a legitimidade para a demanda será do Banco depositário.
Caso ambos os argumentos sejam veiculados na peça inicial, como causa de pedir, o banco depositário e a União estarão legitimados para a demanda, respectivamente quanto a cada uma das pretensões.
2.13. Situação em exame - legitimidade da União:
No caso em exame, em primeiro exame, reputo que a União está legitimada para a causa eis que o demandante sustentou haver equívocos na definição dos indexadores aplicados à conta do PASEP, por não retratarem a variação do poder aquisitivo da moeda no período considerado. Logo, ele insurgiu-se contra os índices definidos pelo Conselho Monetário Nacional, de modo que a União está legitimada para o caso.
Sem dúvida que, no caso versando sobre expurgos inflacionários, os bancos depositários já foram reputados parte legítima para as demandas, diante do argumento de que deveriam ter corrigido aludidos valores em conformidade com os índices de inflação do período. No caso em análise, contudo, ao menos nesse primeiro exame, a União está legitimada por conta da alegação de que a própria indexação oficial, imposta ao banco depositário pelo CMN, estaria equivocada. Assim, sem prejuízo de nova apreciação em sentença, ao menos por ora declaro a legitimidade da União Federal para esta demanda.
2.14. Representação da União em Juízo:
Dado que a presente demanda não versa sobre questões tributárias, a União Federal há de ser representada neste processo pela Advocacia Geral, conforme lei complementar 73, de 10 de fevereiro de 1993.
2.15. Cogitada legitimidade do Banco do Brasil:
O Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal são gestores das contas do PIS-PASEP, na forma do art. 9º-A da lei n. 7.998, de 11 de janeiro de 1990, com lei n. 13.134, de 16 de junho de 2015:
Art. 9º-A. O abono será pago pelo Banco do Brasil S.A. e pela Caixa Econômica Federal mediante: I - depósito em nome do trabalhador; II - saque em espécie; ou III - folha de salários. §1 Ao Banco do Brasil S.A. caberá o pagamento aos servidores e empregados dos contribuintes mencionados no art. 14 do Decreto-Lei no 2.052, de 3 de agosto de 1983, e à Caixa Econômica Federal, aos empregados dos contribuintes a que se refere o art. 15 desse Decreto-Lei. §2 As instituições financeiras pagadoras manterão em seu poder, à disposição das autoridades fazendárias, por processo que possibilite sua imediata recuperação, os comprovantes de pagamentos efetuados.
Reporto-me ao seguinte julgado do STJ:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PASEP. BANCO DO BRASIL . COMPETÊNCIA. ADMINISTRAÇÃO DO PROGRAMA. ARTS. 5º DA LEI COMPLEMENTAR 8/70 E 4º, XII, DO DECRETO 9 .978/2019. ALEGAÇÃO DE MÁ GESTÃO DOS VALORES DEPOSITADOS, NO BANCO DO BRASIL, EM CONTA INDIVIDUALIZADA DO PASEP. RECONHECIMENTO DA LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA DEPOSITÁRIA. JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ . AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. I. Agravo interno aviado contra decisão que julgara Recurso Especial interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/2015. II . Trata-se, na origem, de Ação de Indenização por danos materiais, ajuizada pela parte agravada em face do Banco do Brasil, em face da má gestão da instituição bancária, com suposta incorreção nos valores existentes na sua conta individualizada do PASEP, derivada de saques indevidos e de omissão ou de correções errôneas do saldo depositado. A sentença acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam do Banco do Brasil e julgou extinto o feito, com fundamento no art. 485, VI, do CPC/2015. O Tribunal a quo deu provimento à Apelação da parte autora, para cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, para regular processamento do feito, em face do reconhecimento da legitimidade passiva ad causam do Banco do Brasil . III. O Programa de Formacao do Patrimonio do Servidor Público ( PASEP) foi instituído pela Lei Complementar 8, de 03/12/70, que prevê a competência do Banco do Brasil para a administração do Programa e manutenção das contas individualizadas para cada servidor, recebendo comissão pelo serviço prestado. A Lei Complementar 26, de 11/09/75, unificou, a partir de 01/07/76, sob a denominação de PIS- PASEP, os fundos constituídos com os recursos do Programa de Integracao Social ( PIS) e do Programa de Formacao do Patrimonio do Servidor Público ( PASEP), instituídos pelas Leis Complementares 7/70 e 8/70, respectivamente. IV . O art. 7º do Decreto do 4.751/2003 previa que a gestão do PASEP compete ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art . 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do PASEP, compete creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS- PASEP. O Decreto 9.978, de 20/08/2019 ? que revogou o Decreto 4.751/2003 ?, não alterou, de forma significativa, as disposições do Regulamento anterior, como se vê do disposto em seus arts . 3º, 4º, 5º e 12. V. O Tribunal de origem, com base no exame dos elementos fáticos dos autos, consignou que "o apelante-autor não requer acréscimos no seu saldo por eventual atuação equivocada do Conselho Diretor do Pasep, mas sim a restituição dos valores supostamente desfalcados da sua conta individual, decorrentes de alegados débitos não autorizados, saques não realizados por ele e incorreta aplicação dos índices de juros e de atualização monetária legalmente definidos". Exsurge, assim, a legitimidade passiva ad causam do Banco do Brasil em face da pretensão de correção dos valores da conta do PASEP do autor, por falhas que teriam sido por ele praticadas, como instituição bancária depositária, por ser administrador do Programa . VI. Na forma da jurisprudência do STJ, "em ações nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao PASEP, a União deve figurar no polo passivo da demanda. No entanto, conforme delineado pelo acórdão recorrido, no caso dos autos, a demanda não versa sobre índices equivocados de responsabilidade do Conselho Gestor do Fundo, mas sobre responsabilidade decorrente da má gestão do banco, decorrente de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e de correção monetária na conta do PASEP. Assim, conclui-se que a legitimidade passiva é do Banco do Brasil S .A., o que define a competência da Justiça Comum estadual. Precedentes do STJ" (STJ, AgInt no REsp 1.878 .378/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/02/2021). Em igual sentido: STJ, AgInt no REsp 1.872 .808/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2020; AgInt no REsp 1.882.478/DF, Rel . Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2020; AgInt no REsp 1.882.379/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 03/12/2020 . VII. Assim, estando o acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência sedimentada nesta Corte, merece ser mantida a decisão ora agravada. VIII. Agravo interno improvido . (STJ - AgInt no REsp: 1883345 DF 2020/0168735-9, Relator.: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 14/09/2021, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/09/2021)
No caso, em princípio, a lógica da súmula 77 do STJ não se aplica ao caso, eis que o demandante não está impugnando as contribuições ao PIS ou PASEP; mas, isso sim, a evolução daquela conta. De todo modo, reputo que o Banco do Brasil parece legitimado para esta demanda, porquanto a parte autora sustentou ter suportado prejuízo por conta da má gestão da conta PASEP. Ressalvo nova análise da questão adiante.
2.16. Litisconsórcio
necessário - considerações
gerais:
O litisconsórcio previsto inicialmente no art. 47, CPC/1973 e atualmente no
art. 114, CPC/2015
, decorre da lógica do
inauditus damnare potest,
imposto pelo art. 5º, LIV e LV, CF. A sentença apenas faz coisa julgada entre as partes, conforme art. 506, CPC/15, exceção feita à regra do art. 109. Código de Processo Civil/2015.
Ora, justamente por força da necessidade de que as decisões judiciais sejam consistentes, é que o Código de Processo civil obriga o demandante, em determinados casos, a orientar a sua pretensão contra todas as pessoas intimamente vinculadas a determinado evento (causa de pedir). Busca-se, com isso, inibir soluções judiciais contraditórias, ao mesmo tempo em que também se otimiza a prestação jurisdicional e se assegura o postulado
nemo inauditus damnare potest.
Reporto-me à lição de Luís Marinoni e Sérgio Arenhart:
"Em princípio, a determinação da formação do litisconsórcio necessário vem estipulada no caput do art. 47, CPC, que afirma que há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Portanto, da leitura desse artigo tem-se que duas causas podem gerar o litisconsórcio necessário; a lei ou a natureza da relação jurídica.
E, somando-se a isso, para a caracterização da necessidade da formação do litisconsórcio, será necessário que essas causas exijam que o juiz julgue o litígio de maneira uniforme para todas as partes (rectius, litisconsortes). Note-se, porém, que a redação do dispositivo é bastante defeituosa, podendo levar à conclusão de que as figuras do litisconsórcio necessário e unitário identificam-se, ou melhor, que o litisconsórcio unitário deve ser necessário e que o litisconsórcio necessário deve ser unitário
.
Nem sempre, porém, assim será. Imagine-se a hipótese em que a lei obriga, por qualquer causa, a formação de determinado litisconsórcio, ainda que a questão não precise, necessariamente, ser resolvida de maneira idêntica para todos os litisconsortes. Pense-se na hipótese da ação popular, em que a lei determina que devam ser citados para a ação todos aqueles que direta ou indiretamente tenham contribuído, por ação ou omissão, para a edição do ato inquinado como ilegal (art. 6º da lei 4.717/1965 - lei de ação popular), bem como seus beneficiários diretos. Ninguém duvida que esse é um litisconsórcio simples, não exigindo solução idêntica perante todos os litisconsortes. Não obstante isso, a lei impõe a formação de litisconsórcio. Seria, por acaso, indevida essa exigência do litisconsórcio? Poderia alguém questionar a exigibilidade desse litisconsórcio? Não parece que a resposta possa ser positiva. Em verdade, a exigência da formação do litisconsórcio, no caso, em que a lei o exija, independe do caráter unitário ou não da figura. Impõe simplesmente porque a lei o quer.
Somente na outra hipótese, em que a formação do litisconsórcio decorre da natureza da relação jurídica, é que efetivamente tem algum interesse a questão da unitariedade ou não da figura
. Aqui, sim, é possível que, diante da necessidade de que a solução da causa seja idêntica para várias pessoas, imponha-se o litisconsórcio ainda que a lei não o determine. E, como já visto, a unitariedade do litisconsórcio decorre não apenas do fato de que a sentença deve decidir a questão de forma uniforme para todos os litisconsortes, mas, sobretudo, da ideia de que essa imposição decorra da unitariedade da relação jurídica material deduzida em juízo. Vale dizer: no litisconsórcio unitário, exige uma relação jurídica material (cuja afirmação é o objeto da demanda) que possui vários sujeitos em um dos pólos. Pense-se no caso de um imóvel que possua vários coproprietários. Ou no negócio jurídico celebrado por marido e mulher com terceiro. Ou ainda em um ato administrativo (por exemplo, uma portaria) complexo, que é emitido por mais de uma entidade. Nesses casos, a relação jurídica material realizada possui, em pelo menos um dos seus pólos, mais de um sujeito. E é precisamente essa pluralidade subjetiva em um dos pólos da relação jurídica material deduzida em juízo que determina, na forma do que prevê o art. 47, CPC (natureza da relação jurídica), o litisconsórcio necessário." (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.
Processo
de conhecimento.
7. ed. São Paulo: RT, 2008, p. 173-174)
Atente-se também para a análise de Marcelo Abelha Rodrigues:
"A necessidade deste tipo de litisconsórcio, prevista no art. 47, CPC, decorre ou por força de lei, ou por natureza da relação jurídica. Será por força de lei no caso, por exemplo, do art. 6º da LAP, ou ainda no caso do art. 942, II, CPC.
Estaremos diante da segunda hipótese quando se cuidar de ação anulatória proposta contra todos os contratantes. Não se pode ser contra apenas um deles, pois a natureza da relação jurídica requer que possuam a mesma decisão. Outro exemplo, por força da lei, é o previsto no art. 10, §2º, CPC
."
(RODRIGUES, Marcelo Abelha.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 296)
O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo, no que toca à obrigatoriedade da sua formação. Também pode ser unitário ou simples, quanto à solução a ser dispensada às partes. O litisconsórcio é facultativo quando determinadas pessoas aquiescem em litigar juntas contra um mesmo demandado; ou quando o autor endereça, a um só tempo, pretensões contra várias pessoas, desde sejam todas legítimas a figurar na causa (art. 17, CPC/15). A respeito do litisconsórcio necessário, atente-se para o seguinte:
"
A obrigatoriedade da formação do litisconsórcio pode ser dada pela lei ou pela relação jurídica. São exemplos de litisconsórcio necessário por disposição de lei: a) CPC 246 §3º, que manda citar os confinantes nas ações de usucapião de imóvel; b) LAP 6º, que manda citar o funcionário que autorizou a prática do ato impugnado, bem como a pessoa jurídica de direito público ou privado a que ele pertence
; c) CPC, art. 76 §1º II, que manda citar ambos os cônjuges em ação na qual se discutam fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou atos praticados por eles (v.g., fiança - CC 1647 III) São exemplos de litisconsórcio necessário por força da relação jurídica: a) todos os partícipes de um contrato, para a ação anulatória do mesmo contrato, porque a sentença que decidir a lide não poderá anular o contrato para um dos contratantes e declará-lo válido para os demais que eventualmente não estivessem no processo como partes. Não sendo obrigatória a formação do litisconsórcio, este se caracteriza como facultativo, cujos casos mais comuns estão enumerados no CPC 113." (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Comentários ao código de
processo
civil.
1ª. ed. SP: RT, 2015)
2.17.
Responsabilização e litisconsórcio:
Em muitos casos - quando a pretensão é ancorada em regras do direito civil -, a alegação da prática de atos ilícitos dá ensejo à responsabilização solidária, conforme art. 942, parágrafo único, Código Civil/2002. Sendo assim, na forma dos arts. 275 e ss., Código Civil, quem se apresenta como credor não é obrigado processar em conjunto todos os cogitados responsáveis. Pode optar por escolher um, alguns ou todos, sendo que o encarregado de eventual pagamento pode demandar os demais codevedores.
Por outro lado, quando a pretensão esteja fundada em regras do Código de Defesa do Consumidor
, a legislação preconiza a responsabilização objetiva e solidária entre os fornecedores, conforme arts. 7, 18, 19, todos da lei n. 8.078/1990. Tanto por isso, na forma dos arts. 275 e ss., CDC, não se aplica ao caso a lógica do art. 48, CPP/41, quando trata da indivisibilidade da ação penal privada. No âmbito do processo civil, quando em causa a responsabilização civil de natureza solidária, o endereçamento da pretensão a todos os cogitados causadores do alegado dano não se faz necessário.
2.18. Interesse processual - considerações gerais:
Por conta do monopólio estatal do uso válido da violência - expressão de Max Weber -, exceção feita aos casos de legítima defesa, estado de necessidade, desforço
incontinenti
etc., as partes não podem resolver seus conflitos mediante o emprego da força (art. 345, Código Penal/40). Assim, sempre que as controvérsias não sejam solucionadas com base no consenso, na prevalência do melhor argumento, os sujeitos devem deduzir suas pretensões perante o Estado, na espera de que haja aplicação isenta, racional e célere da lei (
law enforcement
).
Nos termos impostos pela Constituição, o Poder Judiciário está obrigado a apreciar a alegação de que haja lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV, CF), mecanismo indispensável para o efetivo império da razão pública, ao invés da prevalência dos poderes hegemônicos de ocasião. A prestação jurisdicional não se destina, todavia, a emitir meros pareceres ou cartas de intenções.
O ingresso em juízo deve estar fundado, tanto por isso, em uma situação de efetiva necessidade, de modo que o pedido - caso venha a ser acolhido - se traduza em uma utilidade para o(a) demandante. O meio processual eleito deve ser adequado para tanto. Daí que os processualistas tratem do interesse processual em uma
troika:
a necessidade, a utilidade e a adequação. Por fim, o interesse processual deve persistir no curso da demanda, nos termos do art. 17 e art. 85, §10, CPC/15.
Ora,
"
Mediante a força declaratória, a aspiração do autor consiste na extirpação da incerteza
. Deseja tornar indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade da coisa julgada, a existência ou a inexistência de relação jurídica, a autenticidade ou a falsidade de documento. É o que dispõe, fortemente inspirado no direito germânico e reproduzindo a regra anterior, o art. 19 do NCPC. Também comporta declaração a exegese de cláusula contratual (Súmula do STJ, n.º 181), ou seja, o modo de ser de uma relação jurídica. Na ação declarativa, ignora-se outra eficácia relevante que a de coisa julgada material. Neste sentido, a pretensão à declaração representa fonte autônoma de um bem valiosíssimo na vida social: a certeza. O autor que só pleiteia declaração ao juiz, e obtém êxito, dar-se-á por satisfeito, e cabalmente, desde o curso em julgado da sentença.
Então apropria-se do que pedira ao órgão judicial – certeza –, carecendo a regra jurídica emitida de qualquer atividade complementar em juízo. Focalizando o ponto com preciosa exatidão, diz-se que a sentença declaratória é instrumento autossuficiente de tutela jurisdicional, pois assegura, de maneira plena e completa, a efetividade da situação jurídica substancial deduzida em juízo
."
(ASSIS, Araken de.
Processo
civil brasileiro:
volume I. Parte geral: fundamentos e distribuição de conflitos. São Paulo: RT. 2015. p. 675).
Ainda segundo Araken de Assis,
"
O provimento declaratório tem nítido caráter prescritivo. A parte adquire o direito incontestável de comportar-se em consonância ao comando sentencial, e, principalmente, não é dado àqueles que se vincularam à declaração impedi-la
. A finalidade da ação declaratória da inteligência e do alcance de cláusula contratual é a de prescrever aos parceiros do negócio, sucessivamente, determinada pauta de conduta, independentemente de execução alguma, de que não se cogita e de que não se pode cogitar."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 676).
Dado que o Poder Judiciário não é consultor jurídico das partes, impõe-se que haja uma situação de incerteza jurídica a justificar o ingresso com a demanda:
"
Impende recordar que a certeza implicará a vinculação futura das partes. O provimento exibirá caráter prescritivo para o futuro
. O ato judicial legitima a prática (ou a abstenção) de atos jurídicos “ao abrigo e em conformidade com o conteúdo da sentença. Em geral, a antevisão desse problema provoca o nascimento do interesse. Por assim dizer, o provimento declarativo tem os pés no passado, mas olhar no futuro. É preciso aceitar com reservas, portanto, o julgado da 4.ª Turma do STJ, que assentou: Não é detentor de interesse processual justificador da pretensão declarativa quem não está exposto à possibilidade de dano imediato e concreto. Ora, imediato é o interesse, pois o dano, em sentido amplíssimo, pode ser futuro. Por exemplo, não cabe declarar a inteligência da cláusula contratual em tese; o autor necessitará expor a dificuldade na interpretação da cláusula, os reflexos que este ou aquele entendimento provocará no programa contratual."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 661).
2.19. Interesse processual - caso em exame:
A parte autora deduziu pretensão à revisão dos índices que teriam sido aplicados à conta do PIS/PASEP, seja por conta da incorreção na definição destes indexadores, seja por conta de equívocos na aplicação dos índices pelo Banco depositário. O processamento desta pretensão não depende do prévio exaurimento do debate na seara extrajudicial, dada a ausência de lei que o imponha e dado o direito fundamental previsto no art. 5, XXXV, Constituição Republicana/88. Não se aplica ao caso o tema 350, STF, que versa sobre demandas previdenciárias.
Por outro lado, caso a sua pretensão venha a ser acolhida em sentença transitada em julgado, a medida lhe será útil, mediante incremento do valor depositado na sua conta vinculada ao PIS/PASEP. Por fim, a medida processual adotada - demanda sob o rito dos Juizados - se revela adequada ao fim proposto, como anotei acima.
Com isso, o trinômio necessidade, utilidade e adequação restou satisfeito no processo em causa
.
2.20. Adequação da peça inicial:
A peça inicial se revela adequada, permitindo aos demandados o exercício do contraditório. A requerente detalhou pedidos e causa de pedir, anexando documentos na forma do art. 320 e art. 434, CPC/15.
2.21. Valor atribuído à demanda - considerações gerais:
A toda causa deve ser atribuído algum valor econômico, por força do art. 291, CPC/2015 - projeção do art. 258, CPC/73 -, pois se cuida da base de cálculo da taxa judiciária. Referido valor pode influenciar, em muitos casos, a determinação da competência das unidades judiciais ou o procedimento aplicável, também surtindo reflexos sobre a definição de encargos sucumbenciais.
Trata-se, tanto por isso, de requisito para que a petição inicial seja válida - art. 319, CPC. Como explicita Araken de Assis,
"às vezes, na oportunidade da respectiva fixação (infra, 1.290),
o conteúdo econômico real e imediato da pretensão mostra-se inestimável, ou seja, não pode ser quantificado precisamente. Tal circunstância não constitui motivo bastante para eliminar o ônus atribuído ao autor nos arts. 319, V, e 292, caput
. É apenas causa de estimação voluntária do autor, pois o art. 291 dispõe expressamente que a toda causa será atribuído valor certo. Nada obstante, a indicação aproximar-se-á, tanto quanto possível, do conteúdo econômico mediato da pretensão. Não há incompatibilidade daquelas regras com a do art. 85, § 8.º. aludindo a causas de valor inestimável. Entende-se por tal as causas desprovidas de conteúdo econômico imediato, como é o caso da ação declaratória, e, por esse motivo, sujeitas à estimação do autor."
(ASSIS, Araken.
Processo
civil brasileiro.
Volume II - Tomo I: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 1695)
Convém atentar, tanto por isso, para o art. 292, CPC/15:
"O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação; II -
na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida
; III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor; IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do bem objeto do pedido; V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor; VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal. § 1º
Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e outras. § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações
. § 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
Menciono novamente a análise promovida por Araken de Assis:
"
É exemplificativa a enumeração dos acessórios. Os juros compensatórios, por exemplo, dificilmente se quadram na figura de penalidade. A correção monetária integra o valor originário do crédito e, nesse aspecto, sua menção no art. 292, corrige o direito anterior
. Ressalva feita aos juros moratórios e à correção monetária, verbas implicitamente incluídas no pedido respeitante ao principal (art. 322, § 1.º), e, nada obstante, integrantes do valor da causa, quaisquer outras verbas devem ser objeto de pedido. É o caso, expressis verbis, da cláusula penal moratória ou compensatória e dos juros compensatórios. Omisso que seja o pedido, a respeito da cláusula penal (v.g., o autor quer evitar a controvérsia em torno da interpretação do contrato), tampouco conta-se o respectivo valor. Por óbvio, deixando o autor de pedir os juros moratórios, explicitamente, dificilmente realizará seu cômputo no valor da causa, ensejando a intervenção do órgão judiciário. E os juros vencidos posteriormente ao ajuizamento, automaticamente incluídos na condenação (art. 323), não entram na estimativa da causa.
O custo financeiro do processo (despesas processuais e honorários advocatícios), suportado pelo réu no caso de êxito do autor, não precisa ser computado para apurar o valor da causa. Tais verbas têm caráter eventual e decorrem da lei.
Em face do caráter imperativo do art. 292, I, mostra-se irrelevante a estimativa lançada pelo autor na petição inicial em desacordo com a regra. Prevalecerá o valor da importância reclamada no pedido.
O art. 292, I, aplica-se, por analogia, à pretensão a executar fundada em título judicial ou extrajudicial (infra, 1.292.2.2). O valor da causa é o total do crédito: o principal corrigido, os juros e os demais consectários legais ou contratuais, conforme, aliás, dispõe o art. 6.º, § 4.º, da Lei 6.830/1980. Esse valor constará na planilha aludida no art. 798, I, b, e parágrafo único
.
Também se poderia cogitar do enquadramento da pretensão a executar no art. 292, II, por que pretensão visando ao cumprimento do negócio jurídico, eventualmente consubstanciado em documento dotado de força executiva. O resultado final é idêntico, mas o art. 292, I, avantaja-se ao inciso precedente em ponto decisivo, ao impor um critério simples, direto e analítico ao valor da causa." (ARAKEN, Assis.
Obra citada
. p. 1698 e ss.)
Ora, não se pode perder de vista que o valor atribuído à causa deve corresponder, tanto quanto possível, ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial, como bem equaciona o art. 292, §3º, CPC/15:
"O juiz corrigirá, de
ofício e por arbitramento
, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou
ao proveito econômico perseguido pelo autor
, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
2.22. Atribuição de valor à causa - situação em exame:
No caso, em primeiro exame, a parte autora parece ter atribuído à demanda valor compatível com o contéudo econômico da sua pretensão, atendendo ao art. 292, CPC. Ressalvo nova análise do tema, caso seja a tanto instado na forma do art. 293, CPC/15.
2.23.
Intimação das partes no curso da demanda:
Por outro lado, cabe às partes acessar periodicamente o eproc, na forma do art. 5 da lei n. 11.419/2006, sob pena de que tal intimação seja tida como efetivada, por decurso de prazo.
Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. § 1º Considerar-se-á realizada a intimação no dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor da intimação, certificando-se nos autos a sua realização. § 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, nos casos em que a consulta se dê em dia não útil, a intimação será considerada como realizada no primeiro dia útil seguinte. § 3º
A consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados da data do envio da intimação, sob pena de considerar-se a intimação automaticamente realizada na data do término desse prazo
. § 4º Em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço. § 5º Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz. § 6º As intimações feitas na forma deste artigo, inclusive da Fazenda Pública, serão consideradas pessoais para todos os efeitos legais.
Atente-se para os seguintes acórdãos:
AGRAVO INTERNO IN REVISÃO CRIMINAL. LEGITIMIDADE ATIVA. ADVOGADO. INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO. AUSÊNCIA. INTIMAÇÃO ELETRÔNICA. E-PROC. LEI Nº 11.419/16. JUNTADA. INTEMPESTIVIDADE. JUÍZO PERFUNCTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES EXIGIDAS. INADMISSIBILIDADE DA VIA REVISIONAL. 1. Embora a Revisão Criminal também possa ser requerida por advogado legalmente habilitado, nos termos do art. 553 do CPPM, este deve apresentar o instrumento de procuração assinada pelo condenado. 2.
A partir da implementação do processo eletrônico, a intimação para o cumprimento de atos dar-se-á por meio de publicação de eventos no sistema informatizado, cabendo ao advogado, nos termos da Lei nº 11.419/16, o acesso periódico para inteirar-se da movimentação do feito. Para tanto, a citada lei confere um prazo de graça, o qual, vencido, materializa a intimação e, por conseguinte, consigna a abertura de contagem do prazo para a prática de ato processual subsequente, sobretudo o eventual recurso
. 3. Da análise perfunctória da Inicial verifica-se a inexistência dos requisitos necessários e exigidos no art. 551 do CPPM para a admissão da via revisional. 4. Agravo Interno rejeitado. Decisão unânime. (STM - AGT: 70001154520197000000, Relator: MARCO ANTÔNIO DE FARIAS, Data de Julgamento: 25/04/2019, Data de Publicação: 13/05/2019)
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA CUMULADA COM REPARAÇÃO DE DANOS. PROTESTO. CANCELAMENTO. DANO MORAL. SÚMULA 385/STJ. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. 1.
Conforme o § 3º do artigo 5º da Lei n. 11.419/2006, "a consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados", portanto, conforme consignado no Tribunal de origem, intempestivo o recurso
. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 2025050 MG 2021/0362748-6, Data de Julgamento: 12/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2022)
Ademais,
"Segundo a norma, portanto, caberá aos atores processuais cadastrados a realização de consultas periódicas de acompanhamento, em até
10 (dez) dias
, aos portais de acesso às ações eletrônicas como é o caso do Sistema Eproc, sob pena de se considerar perfectibilizada a intimação."
(TRF-4 - AC: 50019035420204047107, Relator: RODRIGO BECKER PINTO, 23/09/2022, SEGUNDA TURMA)
2.24.
Eventual
prescrição
- considerações gerais:
Convém ter em conta que
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo.
As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada
."
(NERY JÚNIOR, Nelson.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Daí que a prescrição é oponível às pretensões condenatórias.
Anoto, de outro tanto, que o art. 189, Código Civil, preconiza que
"
Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206
."
Isso significa que o cômputo da prescrição deve ser promovido com atenção à teoria da
actio nata.
Ou seja,
"o início do prazo prescricional se verifica com o nascimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo, momento a partir do qual a ação poderia ter sido proposta - enquanto não nascer a ação conferida para a tutela de um direito, não é dado falar em prescrição:
actioni nondum natae non prescritibur." (CAHALI, Yussef Said.
Prescrição
e decadência.
São Paulo: RT, 2008, p. 35).
Yussef Cahali menciona, ademais, a lição de Câmara Leal, para quem
"
A ação nasce, portanto, no momento em que se torna necessária para a defesa do direito violado
- é desse desse momento, em que o titular pode se utilizar da ação, que começa a correr o prazo de prescrição. Portanto, o prazo é contado da data em que a ação poderia ser proposta. O
dies a quo
da prescrição surge em simultaneidade com o direito de ação."
(CAHALI, Yussef Said. Obra cit. p. 36).
Vê-se, portanto, que a prescrição deve ser computada a partir do momento em que o cogitado titular de uma situação jurídica toma conhecimento da agressão ao seu interesse.
"(...) O cômputo do prazo prescricional quinquenal, objetivando o ingresso de ação de indenização contra conduta do Estado, previsto no artigo 1.º do Decreto 20.910/32,
começa quando o titular do direito lesionado conhece o dano e suas sequelas, segundo reza o princípio actio nata
. Precedentes: AgRg no REsp: 1369886/PE Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ de 20.05.2013; AC 0013010-49.2005.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, Sexta Turma, DJ de 16.05.2013." (AC 0011884-90.2007.4.01.3500 / GO, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, Sexta Turma, e-DJF1 p.137 de 15/10/2014).
"(...) Ademais, mesmo que se considerasse o prazo de 3 anos, como quer a requerida, não haveria prescrição. Pelo princípio da
actio nata
, que é adotado pelo ordenamento jurídico pátrio, a pretensão somente nasce com a violação do direito (art. 189 do Código Civil). E a pretensão da autora somente surgiu no momento em que tomou conhecimento da irregularidade cuja prática atribui à ré e que teria causado o dano cujo ressarcimento é postulado. Antes disso, não há como se exigir do lesado o exercício da sua pretensão, até porque a existência de dano é requisito da responsabilidade e, portanto, pressuposto da ação que visa à sua reparação." (AC 00053846420074047108, CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 26/05/2010.)
Com efeito, dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil:
"O início da eficácia dos atos administrativos se assinala pela publicação, ou pelo termo que indicarem; mas os atos administrativos que afetem pessoa certa e determinada assumem eficácia ao serem por ela conhecidos por via de regular comunicação."
(NASSAR, Elody.
Prescrição
na Administração Pública.
2. ed. SP: Saraiva, 2009, p. 148).
Ainda a respeito da definição do termo inicial, atente-se para a lição de Humberto Theodoro Júnior:
"Todo prazo tem um termo inicial (a quo) e tem um termo final (ad quem), ou seja, há sempre um momento para iniciar e outro para encerrar a contagem do tempo de duração.
No caso da prescrição, o
termo a quo
é aquele em que nasce a pretensão e o termo final é aquele em que se completa o lapso temporal assinalado pela lei para o exercício da ação destinada a fazer atuar em juízo a pretensão. Há um prazo geral e vários prazos especiais, segundo o critério da lei, o que faz com que o termo final seja mais próximo ou mais longínquo para as diferentes pretensões.
Uma vez que, para haver prescrição, a inércia do titular do direito afrontado e requisito necessário, somente se pode iniciar a contagem do prazo extintivo a partir do momento em que sua atividade contra a situação injurídica se tornou possível (e, não obstante, deixou de ser exercida)
.
Prescritividade e exigibilidade são ideias que se intervinculam. Apenas as prestações exigíveis (i.e., vencidas), não sendo satisfeitas, sujeitam-se aos efeitos da prescrição. Se a obrigação ainda não se venceu, não está o credor autorizado a exercer o direito que lhe cabe contra o devedor. Não se pode perder por inércia um direito que, posto existente, ainda não se pode exigir. Donde 'o início da prescrição só pode ter lugar quando o direito está em condições de o seu titular poder exercitá-lo.'
Por isso, não corre prescrição nas obrigações a prazo ou sujeitas à condição suspensiva, senão depois de ocorrido o vencimento ou verificada a condição (art. 199, I e II). Termo e condição suspensiva, nessa ordem de ideias, são causas que impedem a prescrio, porque, no primeiro caso, o direito subjetivo nem sequer surgiu, e, no segundo, já existe mas tem o seu exercício suspenso.
Sendo a via judicial o caminho que a ordem jurídica oferece ao titular da pretensão insatisfeita para compelir o obrigado a realizar a prestação devida, é intuitivo que se deverá contar a prescrição a partir de quando a respectiva ação se mostrou exercitável. Nesse sentido, somente se pode cogitar de prescrição em face da chamada actio nata (actioni nondum natae non praescribitur). Vale dizer: o prazo prescricional corre a partir do momento em que o credor pode lançar mão da pretensão, se necessário, por uma ação em juízo.(...)
No caso de obrigação derivada de ato ilícito, desde a ocorrência deste está fluindo a ação para impor a obrigação genérica de indenizar. Sem se saber, porém, o montante do prejuízo, não se pode desde logo exigir-lhe a indenização. Enquanto estiver fluindo a ação condenatória genérica, não corre o prazo para liquidar e exigir a reparação. Mas, se o credor não propõe logo a ação genérica, desde então estarão em risco as pretensões também da liquidação e do respectivo valor líquido. É que a inércia do titular da pretensão terá prejudicado todas as ações que poderia manejar
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Comentários ao novo código civil.
Volume III. Tomo II. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 174-177).
Delimitada a questão quanto ao termo inicial do cômputo da prescrição, outro tópico relevante diz respeito ao seu prazo, quando se cuide de pretensão oponível ao Estado. Ora, no âmbito das obrigações pessoais, as pretensões condenatórias formuladas em face da Fazenda Pública prescrevem, EM REGRA, no prazo de 05 anos, conf. art. 1º do Dec. 20.910/1932 com o Decreto-lei 4.597/1942.
Convém atentar para a lição de Pontes de Miranda:
"
A prescrição
quinquenal somente concerne às ações condenatórias pessoais; não às ações declarativas, constitutivas negativas (e.g., declaração de inconstitucionalidade ou nulidade de lei, ou do ato do Poder Público), mandamentais e executivas que não sejam de dívidas pessoais, ou a de execução de julgado. As ações pessoais (...) são as oriundas de dívidas de direito das obrigações, em que a Fazenda Pública teria de pagar
."
(MIRANDA, Francisco C. P. de
apud
NASSAR, Elody.
Prescrição
na Administração Pública.
2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 271).
Trata-se de norma de conteúdo especial quando confrontada com o art. 206, §3º, V, Código Civil:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. DECRETO 20.910/32. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP 1.251.993/PR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.251.993/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, assentou que o prazo de prescriçãoquinquenal, previsto no Decreto nº 20.910/32, aplica-se às ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002
. a4. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201302893979, MARGA TESSLER (JUÍZA FEDERAL CONVOCADA DO TRF 4ª REGIÃO), STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:12/03/2015 ..DTPB:.)
O prazo de 05 anos também prevalece sobre aquele preconizado no art. 206, §2º, do Código Civil:
"
Prescreve: § 2º Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem
.
"
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA PROPOSTA POR SERVIDORES PÚBLICOS.. VERBA DENOMINADA 'ETAPA ALIMENTAÇÃO'. PRESCRIÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRAZO DE CINCO ANOS. ART. 1º DO DECRETO. 20.910/1932. INAPLICABILIDADE DOS ARTS. 206, § 3º, DO CÓDIGO CIVIL E 10 DO DECRETO 20.910/32. 1. O entendimento do STJ é no sentido de que a prescrição quinquenal prevista no art. 1º. do Decreto 20.910/1932 deve ser aplicada a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja ela federal, estadual ou municipal, independentemente da natureza da relação jurídica estabelecida entre a Administração Pública e o particular. 2. Não incide, portanto, a prescrição bienal do art. 206, § 2º, do CC de 2002, uma vez que o conceito jurídico de prestação alimentar nele previsto não se confunde com o de verbas remuneratórias de natureza alimentar. O Código Civil de 2002 faz referência às prestações alimentares de natureza civil e privada, incompatíveis com as percebidas em relação de Direito Público. Inexiste, no caso, norma específica mais benéfica a ensejar a incidência do art. 10 do Decreto 20.910/32. 3. Agravo Regimental não provido. ..EMEN: (AGARESP 201200734389, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:27/08/2012 ..DTPB:.)
O Min. Herman Benjamin enfatizou, naquela ocasião, que
"se mostra inaplicável, no caso dos autos, a prescrição bienal do art. 206, §2º, Código Civil, uma vez que o conceito jurídico de prestações alimentares nele previsto não se confunde com o de verbas remuneratórias de natureza alimentar. O Código Civil de 2002 faz referência às prestações alimentares de natureza civil e privada, incompatíveis com as percebidas em relação de direito público.
Não há, no caso, norma específica mais benéfica a ensejar a incidência do art. 10 do Decreto 20.910/1932
."
(Agravo no REsp n. 164.513/MS).
2.25. Prescrição de fundo de direito:
Vale a pena atentar, uma vez mais, para a lição de Elody Nassar:
"
A denominada prescrição do fundo de direito tem suporte legal no disposto no art. 1. do Decreto n. 20.910/1932, que dispõe sobre a prescrição das ações contra a Fazenda Pública
(...). Para efeito da compreensão da expressão 'fundo de direito' deve ser observado o marco inicial, ou seja, o momento a partir do qual inicia-se o prazo prescricional. Esse marco inicial é contado a partir da consolidação de uma situação jurídica fundamental que estabelece um ponto ceto e delimitado para a eventual impugnação de um ato lesivo de direito. Essa situação jurídica fundamental, no dizer da mais renomada doutrina, importa em ato único do qual derivam os subsequentes e que, portanto, se torna definitivo se não impugnado em tempo hábil, juntamente com todos os seus efeitos. Destaca-se aqui a existência da teoria estatutária da função pública, distinguindo a prescrição que atinge o fundo de direito (art. 1 do Decreto 20910) da prescrição das prestações sucessivas ou vincendas (art. 3º do mesmo diploma legal). Dessa teoria decorre a exegese de que, enquanto existente o vínculo entre servidor e Poder Público, são imprescritíveis os direitos dele decorrentes, sendo atingidos pela prescrição, tão-somente, alguns de seus efeitos."
(NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 273).
Segundo antiga jurisprudência da Suprema Corte,
"
Quando existe um ato ou fato que ofenda de modo geral, permanente, definitivo, o direito do autor, como a demissão, a preterição no acesso, o cancelamento de pensão, a tomada de coisas sem as formalidades legais, o lapso prescricional corre da data do ato ou do fato
. Quando, porém, a prestação periódica não for paga (vencimentos, juros de apólices, pensões, aluguéis de imóveis etc.), por negligência do credor, por falta de verba orçamentária, ou ainda em consequência de dificuldade burocrática, o prazo é contado da data em que cada prestação for exigível"
(STF, 1ª Turma, 28.08.1969, RT 416/426, citado por CAHALI, Yousse Said.
Prescrição
e decadência.
3. tiragem. São Paulo: RT. 2008. p. 303).
Em período mais recente, o Min. Cézar Peluso sustentou que
"São discerníveis, no plano teórico dos direitos subjetivos funcionais a que correspondem obrigações administrativas, de um lado, a própria relação jurídica estatutária e todas as determinações que, segundo as modalidades legais, é ela capaz de assumir em termos de situações jurídicas do servidor, como as decorrentes de promoção, acesso, reenquadramento, reclassificação, decurso de tempo, desempenho de funções ou serviços especiais, aposentadoria etc. (a), e, de outro, as consequências pecuniárias (b). Perante ambas (a e b), é possível cogitar de direitos à prestação obrigacional, cuja violação desencadeie pretensão sujeita a lapso prescritivo, no sentido de que, realizado o suporte fático, pode o funcionário exigir prestação administrativa, que tenha por objeto o próprio vínculo estatutário, ou uma das muitas situações configuráveis no lado dinâmico do mesmo vínculo, ou ainda só os seus efeitos pecuniários."
(PELUSO, Cézar
apud
CAHALI.
Obra cit.
p. 304).
Cahali sustenta, na sequência, que
"consideradas do ângulo de suas repercussões de caráter financeiro (b), a relação estatutária e suas situações jurídicas (a) são fonte objetiva do direito do servidor de receber as prestações correlatas. Desse ponto de vista, os diretos incidentes sobre a relação jurídico-funcional e cada uma das situações jurídico-subjetivas em que ela se desdobra podem, sem grande impropriedade técnica, chamar-se direitos originantes, e os direitos irradiados às respectivas consequências econômicas, direitos originados. É aos primeiros que a jurisprudência costuma referir-se sobre a expressão 'fundo de direito', a qual se reconhece 'usada para significar o direito de ser o funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos que se admitem com relação a essa situação jurídica fundamental, como reclassificações, reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço, direito à gratificação por prestação de serviço de natureza especial. Os conceitos assim enunciados definem as hipóteses de prescrição do
fundo de direito
(art. 1º), envolvendo os direitos originantes, e de prescrição das prestações vencidas (art. 3º), que diz respeito aos direitos originados."
(CAHALI, Yousse Said.
Obra citada.
p. 304-305).
Isso significa que, em princípio, sempre que determinado pleito é indeferido pela Administração Pública, o interessado possui o prazo de até 05 anos para deflagrar a pertinente demanda judicial, salvo eventuais hipóteses de interrupção do cômputo do prazo, observado, em qualquer caso, o entendimento consagrado com a súmula 383, STF, já transcrita acima.
2.26.
Diferença entre suspensão
e
interrupção da prescrição:
Quanto à distinção entre suspensão e interrupção da prescrição, reporto-me à lição de Elody Nassar:
"
Chama-se suspensão a circunstância especial, em vista da qual a lei paralisa a fluência do prazo prescricional. As causas suspensivas da prescrição são as que, temporariamente, paralisam o seu curso; superado o fato suspensivo, a prescrição continua a correr, computado o tempo decorrido antes dele
.
Denomina-se interrupção a ocorrência de um fato hábil a destruir o efeito do tempo já decorrido, com a anulação da prescrição já iniciada. As causas interruptivas da prescrição são as que inutilizam a prescrição iniciada, de modo que o seu prazo recomeça a correr da data do fato que a interrompeu ou do último ato do processo que a interromper (CC, art. 202, parágrafo único)." (NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 156-157)
Dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil.
Em regra, no curso do processo administrativo o cômputo da prescrição resta suspenso, por força do art. 4º do decreto 20.910/32:
"Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la."
O cômputo da prescrição também resta suspenso nas hipóteses do art. 200, Código Civil/2002:
"Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva."
2.27.
Prescrição
- situação em exame:
Na espécie, a pretensão deduzida na peça inicial está submetida, quanto à União Federal,
ao prazo prescricional de 05 anos, conforme art. 1º do Decreto 20.910/1932, com a interrupção na forma da súmula 383, STF
.
No que toca à pretensão
porventura endereçada
ao Banco do Brasil, o STJ tem enfatizado que a regra do art. 1 do decreto 20.910/32 não ser aplicaria, por conta da sua submissão ao regime jurídico de direito privado (art. 173, §2, Constituição). Tampouco lhe seria aplicável a norma do art 10 do mesmo decreto, eis que também orientado às relações mantidas com entidades de direito público. Sendo assim, a prescrição se operaria, quanto ao Banco do Brasil, em 10 anos, conforme julgado abaixo transcrito:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PASEP. MÁ GESTÃO DOS VALORES DEPOSITADOS . LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL. PRESCRIÇÃO DECENAL PREVISTA NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO . TEORIA DA ACTIO NATA. CIÊNCIA DOS DESFALQUES NA CONTA INDIVIDUALIZADA. 1. As questões a serem definidas nesse Repetitivo são: a) a possibilidade ou não de o Banco do Brasil figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; b)
qual o prazo prescricional a que a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete - se o decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil ou o quinquenal estipulado pelo art . 1º do Decreto 20.910/1932
; c) se o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques ou a data do último depósito efetuado na conta individual vinculada ao Pasep. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL PARA FIGURAR NA DEMANDA2.
O Programa de Formacao do Patrimonio do Servidor Público (Pasep) foi instituído pela Lei Complementar 8, de 3 .12.1970, que prevê a competência do Banco do Brasil para a administração do Programa e manutenção das contas individualizadas para cada servidor, recebendo comissão pelo serviço prestado. A Lei Complementar 26, de 11.9 .1975, unificou, a partir de 1º. 7.1976, sob a denominação de PIS-Pasep, os fundos constituídos com os recursos do Programa de Integracao Social ( PIS) e do Programa de Formacao do Patrimonio do Servidor Público (Pasep), instituídos pelas Leis Complementares 7/70 e 8/70, respectivamente
.3 . O art. 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep compete ao Conselho Diretor do Fundo, cujos representantes são designados pelo Ministro de Estado da Fazenda. De igual modo, o art . 10 do mesmo diploma normativo estabelecia que ao Banco do Brasil, como administrador do Programa, além de manter as contas individualizadas dos participantes do Pasep, cabe creditar, nas referidas contas, a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos, conforme autorizado pelo Conselho Diretor do Fundo PIS-Pasep.4. Destaque-se que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, a União deixou de depositar valores nas contas do Pasep do trabalhador, limitando-se sua responsabilidade ao recolhimento mensal ao Banco do Brasil S.A ., nos termos do art. 2º da LC 8/1970.Por força do art. 5º da referida Lei Complementar, a administração do Programa compete ao Banco do Brasil S .A., bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas para cada trabalhador, de modo que a responsabilidade por eventuais saques indevidos ou má gestão dos valores depositados na conta do Pasep é atribuída à instituição gestora em apreço.5. O STJ possui o entendimento de que, em ações judiciais nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao Pasep, a União deve figurar no polo passivo da demanda .6.
No entanto, no caso dos autos a demanda não versa sobre índices equivocados de responsabilidade do Conselho Gestor do Fundo, mas sobre responsabilidade decorrente da má gestão do banco, em razão de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e de correção monetária na conta do Pasep. Conclui-se que a legitimidade passiva é do Banco do Brasil S.A
. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.898.214/SE, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 29 .4.2021; AgInt no REsp 1.867.341/DF, Rel . Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 7.10.2021; REsp 1.895 .114/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 14.4.2021; AgInt no REsp 1 .954.954/CE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 25.3 .2022; e AgInt no REsp 1.922.275/CE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 29 .6.2021. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL7 .
O Banco do Brasil S.A. aduz que ocorreu a prescrição do direito do autor em virtude da adoção do prazo quinquenal estabelecido no art. 1º do Decreto-Lei 20 .910/1932, cujo termo inicial deveria ser a data do recolhimento das últimas contribuições para o Pasep, que, segundo a instituição financeira, ocorreu em 1988.8. Contudo, o STJ possui orientação pacífica de que o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 20 .910/1932 não se aplica às pessoas jurídicas de direito privado. No caso em espécie, sendo a ação proposta contra o Banco do Brasil, sociedade de economia mista, deve-se afastar a incidência do referido dispositivo, bem como da tese firmada no julgamento do Recurso Especial 1.205.277/PB, sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, de que: "É de cinco anos o prazo prescricional da ação promovida contra a União Federal por titulares de contas vinculadas ao PIS /PASEP visando à cobrança de diferenças de correção monetária incidente sobre o saldo das referidas contas, nos termos do art . 1º do Decreto-Lei 20.910/32
" (grifei).9.
Assim, "as ações movidas contra as sociedades de economia mista não se sujeitam ao prazo prescricional previsto no Decreto-Lei 20 .910/1932, porquanto possuem personalidade jurídica de direito privado, estando submetidas às normas do Código Civil." (AgInt nos EDcl no AREsp 1.902.665/RJ, Rel . Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 10.8.2022). Nesse mesmo sentido: AgInt no AREsp 1 .795.172/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 27.5 .2021; e AgInt no REsp 1.812.518/SE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21 .8.2020.10.
Ressalte-se que não se emprega o prazo prescricional previsto no art . 10 do Decreto 2.052/1983, o qual prevê que "A ação para cobrança das contribuições devidas ao PIS e ao PASEP prescreverá no prazo de dez anos, contados a partir da data prevista para seu recolhimento". Isso porque no caso dos autos não se estão cobrando as contribuições, mas, sim, a indenização por danos materiais decorrente da má gestão dos depósitos.11 . Assim, nas demandas ajuizadas contra a instituição financeira em virtude de eventual má gestão ou descontos indevidos nas contas do Programa de Formacao do Patrimonio do Servidor Público - Pasep, deve-se aplicar o prazo prescricional previsto no art. 205 do Código Civil de 10 anos. DIES A QUO PARA A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL12. O Superior Tribunal de Justiça entende que, conforme o princípio da actio nata, o curso do prazo prescricional do direito de reclamar inicia-se somente quando o titular do direito subjetivo violado passa a conhecer o fato e a extensão de suas consequências .(EREsp 1.106.366/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe de 26 .6.2020.) 13. Sobre a matéria em debate, o STJ tem precedentes: AgInt no REsp 1 .928.752/TO, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 23.6 .2021; e REsp 1.802.521/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma DJe 30 .5.2019.14. Verifica-se que o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep . TESES JURÍDICAS A SEREM FIXADAS15. Em relação ao presente Tema, fixam-se as seguintes Teses: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto à conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo art. 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO16 . No caso dos autos, em relação às Teses ora fixadas, o acórdão de origem decidiu de acordo com o entendimento deste STJ, de modo que não merece reforma.17. O recorrente afirma que houve violação ao art. 17 do CPC/2015, uma vez que estaria ausente o interesse de agir da parte contrária, já que não se demonstrou que o valor atualizado seria indevido .Verifica-se, contudo, que a Corte de origem não emitiu juízo de valor em relação ao citado dispositivo legal, tampouco foram opostos Embargos de Declaração para tal fim. Dessa forma, ausente o prequestionamento, de modo que incide a Súmula 282 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada." CONCLUSÃO 18. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido . (STJ - REsp: 1895941 TO 2020/0242238-2, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 13/09/2023, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 21/09/2023)
Trata-se de norma de conteúdo especial quando confrontada com o art. 206, §3º, V, Código Civil, como registrei acima. A demandante postulou a revisão da evolução da conta.
O prazo de 10 anos encontra suporte no art. 205, do Código Civil/2002
. Aludido prazo deve ser computado a partir da data em que os beneficiários da conta do PASEP tenham tomado ciência dos alegados desfalques, diante do postulado da
actio nata -
implícito no art. 189, CC/2002.
CONSTITUCIONAL - TRIBUTÁRIO - CORREÇÃO MONETÁRIA - FUNDO PIS-PASEP - PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL 1. Trata-se in casu de ação que visa a atualização monetária de valores depositados em contas individuais do PIS/PASEP. Não há expressa previsão normativa de prazo prescricional nas legislações que regulamenta, sendo aplicável a regra geral para ações de natureza não fiscal contra a Fazenda Pública, previsto no artigo 1º do Decreto nº 20.910/32. 2. Computa-se este prazo prescricional da data em que ocorreu o alegado crédito em valor menor que o pretendido. Princípio da actio nata. 3. Apelação não provida. (Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1365733 0008197-81.2007.4.03.6109, DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:20/01/2009 PÁGINA: 477 ..FONTE_REPUBLICACAO:)
ADMINISTRATIVO. PASEP. PRESCRIÇÃO. A INSURGÊNCIA NÃO SE REFERE À CORREÇÃO MONETÁRIA. DISCUSSÃO ACERCA DOS VALORES DOS DEPÓSITOS REALIZADOS A MENOR. TEORIA ACTIO NATA. INEXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. 1. Cuida-se de inconformismo contra acórdão do Tribunal de origem que não acolheu a alegação de ilegitimidade da União e de prescrição quinquenal, em ação em que se discute a recomposição de saldo existente em conta vinculada ao PASEP. 2. Afasta-se, inicialmente, a preliminar de ilegitimidade passiva da União Federal, uma vez que o art. 1º do Decreto-Lei 2.052/1983 atribuiu-lhe competência para a cobrança dos valores das contribuições para o Fundo de Participação PIS/PASEP. 3.
Da mesma sorte, deve ser afastada a ocorrência de prescrição, haja vista a inaplicabilidade, à hipótese versada nos autos, da tese pacificada no REsp 1.205.277/PB (representativo da controvérsia), esclarecendo que a insurgência da parte autora/agravada não era quanto aos índices de correção monetária aplicados ao saldo de sua conta do PASEP, mas sim contra os próprios valores, cujos depósitos foram supostamente realizados a menor e, como o recorrido apenas tomou ciência desse fato no ano de 2015, forçoso reconhecer, com base na teoria actio nata, a inocorrência da prescrição de sua pretensão
. 4. Recurso Especial não provido. ..EMEN: (RESP - RECURSO ESPECIAL - 1802521 2019.00.67325-2, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:30/05/2019 ..DTPB:.)
Em primeiro exame, a prescrição não foi ultimada no caso em exame, diante da ausência de maiores detalhes a respeito da data em que o(a)(s) requerente(s) teria(m) tomado conhecimento do suposto desfalque ou da suposta incorreção na evolução das suas contas PASEP. Ressalvo nova análise do tema, caso a tanto instado.
2.28. Eventual decadência:
O instituto da decadência é aplicável quando em causa cogitados direitos potestativos (direitos formativos geradores, na expressão de Pontes de Miranda). Ou seja, direitos que podem ser exercidos sem prévia aquiescência da contraparte, a exemplo do direito do Fisco promover o lançamento fiscal de revisão (art. 150, §4, CTN), direito à anulação de casamento, direito à demissão de empregados sem justa causa, direito à desistência de compra promovida pela internet etc. Em todos esses casos, sempre que a legislação houver fixado prazo para seu exercício, tratar-se-á de lapso decadencial.
Pode-se cogitar de decadência, por conta do eventual decurso do prazo previsto no art. 26,II, §1º, CDC/1990:
"O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II -
noventa dias
, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. §1°
Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços
."
A respeito do tema, os Tribunais têm decidido como segue:
"Para a solução da questão é necessário conceituar o defeito que macula os serviços ora discutidos. Se estivermos diante da hipótese de responsabilidade por fato do serviço (art. 14, do CDC), o prazo prescricional a ser aplicado é o do art. 27 dessa lei, de cinco anos. Se estivermos diante de responsabilidade por vício do produto (art. 18, do CDC) o prazo será decadencial, disciplinado no art. 26.
Esta Terceira Turma, em precedente de minha relatoria, já teve a oportunidade de se posicionar no sentido de que, nas hipóteses de inadimplemento absoluto, não se estaria no âmbito do art. 18 (e, conseqüentemente, do art. 26 do CDC), mas no âmbito do art. 14, que, quanto à
prescrição
, leva à aplicação do art. 27, com prazo de cinco anos para o exercício da pretensão do consumidor. Isso se deu por ocasião do julgamento do REsp nº 278.893/DF (DJ de 4/11/2002), assim ementado:
Recurso Especial. Civil. "Pacote turístico". Inexecução dos serviços contratados. Danos materiais e morais. Indenização. Art. 26, I, do CDC. Direto à reclamação. Decadência. -
O prazo estatuído no art. 26, I, do CDC, é inaplicável à espécie, porquanto a pretensão indenizatória não está fundada na responsabilidade por vícios de qualidade do serviço prestado, mas na responsabilidade contratual decorrente de inadimplemento absoluto, evidenciado pela não-prestação do serviço que fora avençado no "pacote turístico
". (STJ, Resp, rel. Min. Nancy Andrighi, julgamento unânime por não conhecer do Recurso Especial (...)
Além disso, o acórdão recorrido reconheceu a existência de dano moral causado pela conduta das requerentes. Na esteira do precedente formado a partir do julgamento do REsp nº 722.510/RS (de minha relatoria, DJ de 1/2/2006), nas hipóteses em que "
o vício não causa dano, correrá para o consumidor o prazo decadencial, para que proceda a reclamação, previsto neste artigo 26. No entanto, vindo a causar dano, ou seja, concretizando-se a hipótese do artigo 12, deste mesmo Código, deve-se ter em mente o prazo qüinqüenal, disposto no art. 27, sempre que se quiser pleitear indenização
" (Arruda Alvim, Código do Consumidor Comentado, 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, pp. 172/173).
(STJ, REsp n.º 773.994/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, em 22/05/2007)
Como têm deliberado o TRF4,
"O prazo de 90 dias estatuído no art. 26, II, § 1º, do CDC, não se subsume ao caso vertente, em que não se está a tratar de reclamação quanto a um vício aparente na prestação de serviços, mas do alegado direito da parte autora de obter o diploma pelo curso que prestou, assim como a reparação civil pela impossibilidade de obtê-lo."
(TRF-4 - AC: 50147831220144047003 PR, Relatora: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 30/10/2019, QUARTA TU
2.29.
Quanto à eventual aplicação do regime consumerista:
Com a publicação do CDC, inaugurou-se uma conhecida polêmica sobre o alcance das suas disposições. Grosso modo, as opiniões distribuíram-se em duas grandes correntes: os finalistas e os maximalistas.
Os finalistas amparam-se sobremodo na regra do art. 2º da lei 8078/1990:
"
Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final
."
Logo, em princípio, o CDC apenas tutelaria aquelas relações em que o serviço fosse prestado ou o bem fosse fornecido ao destinatário último, sem subsequentes repasses. Essa orientação foi compartilhada, ao que se sabe, pelos principais idealizadores do projeto que eclodiu no código consumerista brasileiro: Ada Pellegrini Grinover, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin e outros.
Já a orientação maximalista promove uma leitura ampla do conceito de consumidor, destacando que a lei 8078 não tutelaria apenas o destinatário final de bens e serviços, sendo oponível também às relações entre empresas e até mesmo a órgãos públicos (amparando-se, nesse caso, na regra do art. 22, CDC). Essa orientação é compartilhada por Rizzato Nunes, por exemplo (Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004).
Com esse pano de fundo, inúmeras discussões foram promovidas ao longo desses anos de vigência da lei 8078. Ao que releva, o CDC também se aplica a entidades da Administração Pública, quando em causa serviços remunerados mediante preços públicos, ou quando em causa atividades econômicas
stricto senso
(art. 22, CDC).
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRONA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3.
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado
. 4. Recurso a que se nega provimento.(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
CIVIL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. CONTRATO DETRANSPORTE DE ENCOMENDA SEM DECLARAÇÃO DE VALOR. EXTRAVIO DE MERCADORIA. VALORDA INDENIZAÇÃO.1.
Qualifica-se como de consumo a relação jurídica contratual de transportede encomendas. Precedente do STJ
. 2. É do fornecedor o ônus de provar claramente as condições contratuaisparticularmente em relação à opção de informar ou não o valor da mercadoriae o custo do serviço para o fim de indenização em caso de extravio segundoo valor exato da mercadoria transportada.3. Não é aceitável o fornecedor simplesmente alegar que o consumidor nãodeclarou o valor para indenizar o prejuízo de acordo com critério unilateral.4. Apelação provida. (AC 00626681319984010000, JUIZ FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA (CONV.), TRF1 - TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR (INATIVA), DJ DATA:23/06/2005 PAGINA:81.)
D'outro tanto, em princípio, pessoas jurídicas também podem ser qualificadas como consumidoras, para fins de aplicação da lei 8.078/1990, desde que não esteja em causa a aquisição de matéria prima para seus processos produtivos.
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONSUMIDOR. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 2º E 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 8.078/90.I - "
O conceito de "destinatário final", do Código de Defesa doConsumidor, alcança a empresa ou o profissional que adquire bens ouserviços e os utiliza em benefício próprio
" (AgRg no Ag nº807159/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, DJ de 25/10/2008).II - No caso em exame, a recorrente enquadra-se em tal conceituação, visto ser empresa prestadora de serviços médico-hospitalares, que utiliza a água para a manutenção predial e o desenvolvimento de suas atividades, ou seja, seu consumo é em benefício próprio.III - A empresa por ser destinatária final do fornecimento de água e, portanto, por se enquadrar no conceito de consumidora, mantém coma recorrida relação de consumo, o que torna aplicável o disposto no artigo 42, parágrafo único, da Lei 8.078/90.IV - Recurso especial conhecido e provido. (RESP 200800133166, FRANCISCO FALCÃO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:30/04/2008..DTPB:.)
Quanto à aplicação do CDC, quando se trate da prestação de serviços por empresas públicas, remunerados mediante preços públicos/tarifas, convém atentar para o art. 22, CDC:
"
Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos
. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código."
Atente-se ainda para os seguintes julgados:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CORREIOS. CARTA REGISTRADA. EXTRAVIO. DANOS MORAIS. IN RE IPSA. 1. As empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem- se ao regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal e nos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor. 2. No caso, a contratação de serviços postais oferecidos pelos Correios, por meio de tarifa especial, para envio de carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão de postagem revela a existência de contrato de consumo, devendo a fornecedora responder objetivamente ao cliente por danos morais advindos da falha do serviço quando não comprovada a efetiva entrega. 3. É incontroverso que o embargado sofreu danos morais decorrentes do extravio de sua correspondência, motivo pelo qual o montante indenizatório fixado em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi mantido pelo acórdão proferido pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena de enriquecimento sem causa. 4. Embargos de divergência não providos. ..EMEN:
(ERESP 201303279910, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, DJE DATA:24/02/2015 ..DTPB:.)
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1.
Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado. 4. Recurso a que se nega provimento
.
(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
De sua parte, Justen Filho enfatiza a dificuldade, não raro, de se conjugar o regime jurídico público - próprio das concessões - com a aplicação da lógica do Código de Defesa do Consumidor:
"
Ocorre que nem sempre é possível conciliar o regime de direito público com aquele do direito do consumidor. A cumulação dos mecanismos de serviço público e de direito do consumidor provoca um conflito de competências e de regime jurídico, cuja solução deve ser realizada com cautela
.
Um exemplo permite compreender de imediato o problema. Segundo o direito do consumidor, é obrigatório o empresário manter a oferta realizada nas condições originais. Já no âmbito do serviço público, a mutabilidade é da sua inerência. Suponha-se, portanto, o caso da telefonia fixa. Imagine-se que o concessionário estabeleça relação jurídica com o usuário, orientando-se por determinada regulação do poder concedente. Se houver necessidade e conveniência, o poder concedente alterará as regras pertinentes, com reflexos na situação jurídica do usuário. Em face do regime de Direito Administrativo, o usuário não poderia invocar direito adquirido à manutenção de regime jurídico. Mas sua pretensões poderia encontrar respaldo no regime característico do direito do consumidor.
Não seria excessivo afirmar que a concepção do serviço público defere ao poder concedente a função de tutelar e defender o interesse coletivo (aí abrangido também o interesse do usuário). Já o direito do consumidor assegura ao próprio consumidor e às entidades da sociedade a função de sua defesa (sem que isso exclua a intervenção de órgãos estatais)
.
É fundamental tomar em vista, então, que a aplicação das normas do direito do consumidor não pode fazer-se em face do serviço público com idêntica extensão aplicável no caso de relações puramente privadas, relacionadas com a exploração de atividade econômica em sentido restrito." (
JUSTEN
FILHO, Marçal.
Teoria geral das concessões de serviço público.
São Paulo: Dialética, 2003, p. 557-558)
Nesse sentido, destaco o acórdão do STJ, abaixo transcrito:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL ( CPC/1973). AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA EM CONTRATO DE FIANÇA BANCÁRIA. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA ACOLHIDA. FORO DO DOMICÍLIO DO RÉU. ALEGAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO. DESCABIMENTO. FIANÇA BANCÁRIA ACESSÓRIA A CONTRATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 297/STJ. 1. Controvérsia acerca do foro competente para julgamento de ação de declaração de inexistência de relação jurídica deduzida com base na alegação de falsificação de assinatura em contrato de fiança bancária acessória a contrato administrativo. 2.
Nos termos da Súmula 297/STJ, "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". 3. Nos termos do art. 101, inciso I, do CDC, a ação de responsabilidade do fornecedor "pode ser proposta no domicílio do autor". 4. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos administrativos, tendo em vista as prerrogativas já asseguradas pela lei à Administração Pública. Julgado específico desta Corte Superior. 5. Inaplicabilidade também, por extensão, ao contrato de fiança bancária acessório ao contrato administrativo. 6. Impossibilidade de aplicação da Súmula 297/STJ a contrato bancário que não se origina de uma relação de consumo
. 7. Competência do foro do domicílio do réu para o julgamento da demanda, tendo em vista a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à espécie. 8. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ - REsp: 1745415 SP 2017/0083951-3, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 14/05/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/05/2019)
De outro norte, consolidou-se a orientação jurisprudencial que reconhece a sua plena aplicação no âmbito dos contratos bancários, desde que pactuados depois de 1990.
Ora, essa solução é alvo de duas conhecidas súmulas do STJ:
Súmula 297 - O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Súmula 285 -
Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do consumidor incide a multa moratória nele prevista
.
A Suprema Corte reconheceu, ademais, a plena aplicação do CDC às relações estabelecidas entre os bancos e seus clientes, nessa condição, conforme se infere da ADIn 2591/DF, relatada pelo Min. Carlos Velloso. Em regra, portanto, o regime consumerista se aplica à relação entre depositantes e banco depositário, nessa condição.
No caso em exame, em princípio, a relação entre as partes parece se submeter ao regime de direito administrativo em sentido estrito, não sendo aplicável ao caso as legislação consumerista
. Registro, de toda sorte, que há julgados em sentido contrário, destacando a aplicabilidade da lei 8.078:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS. CONTA INDIVIDUAL VINCULADA AO PASEP. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . APLICABILIDADE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (ART. 6º, VIII, DO CDC). REQUISITOS PREENCHIDOS . DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. 1.
Em ação de reparação de danos materiais, ajuizada em função de suposta má gestão de valores em contas individuais vinculadas ao PASEP, a relação está sujeita às normas do Código de Defesa do Consumidor
. 2 . Verificadas a hipossuficiência do consumidor e a verossimilhança das alegações (art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor), deve ser mantida a decisão de deferimento do pedido de inversão do ônus da prova. 3. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TJ-PR 00960581020248160000 Sarandi, Relator.: Luiz Carlos Gabardo, Data de Julgamento: 30/11/2024, 15ª Câmara Cível, Data de Publicação: 02/12/2024)
Nesse mesmo sentido, menciono TJPR - 15ª Câmara Cível - 0066965-02.2024.8.16.0000 - Alto Paraná - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ CEZAR NICOLAU - J. 14.09.2024. Atente-se também para a lógica do seguinte julgado:
"O Código de Defesa do Consumidor (Lei n .º 8.078/1990)é plenamente aplicável às instituições financeiras em relação aos serviços prestados aos seus clientes, na esteira do enunciado da súmula n.º 297 do e. Superior Tribunal de Justiça . A instituição financeira tem a responsabilidade objetiva por danos causados pelo simples fato do serviço, em razão do risco inerente à atividade bancária que exerce, consoante dispõe o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, não havendo falar em perquirição de culpa, pois basta a existência de defeito do serviço, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro."
(TRF-4 - AC: 50240050320204047000, Relator.: SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, 04/05/2022, QUARTA TURMA)
No caso, cogita-se da incidência do CDC no que toca à relação porventura mantida entre a parte autora e o banco depositário de tais contas. A relação mantida com a União é de direito administrativo em sentido estrito, não dando ensejo à aplicação da lei 8.078/1990
.
2.30. Consequências da parcial incidência do CDC:
Dada a aplicação
parcial
do Código de Defesa do Consumidor/90 quanto à relação do autor e banco demandado, isso implica o reconhecimento de um conjunto de garantias asseguradas ao consumidor, conforme se infere dos arts. 4º, 39 e 51 da lei 8078/1990.
Destaco, nesse âmbito, o dever de atuar com boa-fé (e o correspondente respeito à boa-fé objetiva), preconizado no art. 4º, III, CDC. Como diz Rizzatto Nunes,
"
a boa-fé objetiva, que é a que está presente no Código de
defesa do consumidor
, pode ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo
(...) Assim, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra."
(RIZZATTO NUNES
apud
EFING, Antônio Carlos.
Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de defesa do
consumidor
.
2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2012, p. 87).
Esse dever de respeito à boa-fé também foi preconizado pelo art. 422, CC:
"Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé."
Vale a pena atentar para a lição de Antônio Carlos Efing:
"
A boa-fé, assim, possui no macrossistema de direito civil, e, consequentemente no microssistema do direito do consumidor, uma séria de efeitos, seja como um princípio de função interpretativa, seja como cláusula geral geradora de deveres anexos e critério de constatação de exercício abusivo de um direito ou de uma cláusula abusiva
. Como bem sintetiza Cláudia Lima Marques, 'o princípio da boa-fé objetiva na formação e na execução das obrigações possui muitas funções na nova teoria contratual: (a) como fonte de novos deveres especiais de conduta na nova teoria contratual; (b) como causa limitadora do exercício, antes lícito, hoje abusivo, dos direitos subjetivos, e (c) na concreção e interpretação dos contratos."
(EFING, Antônio Carlos.
Obra citada.
p. 90).
De outro tanto, a incidência do CDC implica o dever, por parte do fornecedor, de disponibilizar ao consumidor informação adequada e clara sobre os diferentes serviços e produtos, com especificação correta da quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço (art. 6º, III, CDC c/ redação veiculada pela lei 12.741/2012).
Esses são alguns dos efeitos decorrentes da aplicação do CDC.
2.31. PIS/PASEP - exame precário:
A fim de viabilizar o debate entre as partes, com cognição não exaustiva, anoto que a
lei complementar n. 07, de 07 de setembro de 1990
, instituiu o Programa de Integração Social - PIS, destinado a promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas, a ser executado mediante um fundo de participação constituído com recursos dos empregadores, criando-se uma contribuição social para esse fim específico, e alvo de profundas controvérsias, como sabido (decretos-lei n. 2.445/1988 e 2.449/1988). Por outro lado, em 03 de dezembro de 1970, por meio da
lei complementar n. 08
, foi criado o PASEP, com o escopo de assegurar também uma participação dos servidores públicos civis e miliares na receita das entidades integrantes.
A
lei complementar 19
, de 25 de junho de 1974, preconizou que
"A partir de 1º de julho de 1974, os recursos gerados pelo Programa de Integração Social (PIS) e pelo Programa de Formação do Patrimônio de Servidor Público (PASEP), de que tratam as Leis Complementares nº 7, de 7 de setembro de 1970, e 8, de 3 de dezembro de 1970, respectivamente, passarão a ser aplicados de forma unificada, destinando-se, preferencialmente, a programas especiais de investimentos elaborados e revistos periodicamente segundo as diretrizes e prazos de vigências dos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND)."
Aludidos fundos PIS/PASEP foram unificados, a partir de 01 de julho de 1976, por força da lei complementar n. 26, de 11 de setembro de 1975. Atente-se também para o art. 3º daquele diploma normativo:
"Após a unificação determinada no art. 1º, as contas individuais dos participantes passarão a ser creditadas: a) pela correção monetária anual do saldo credor, obedecidos os índices aplicáveis às Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN); b) pelos juros mínimos de 3% (três por cento) calculados anualmente sobre o saldo credor corrigido; c) pelo resultado líquido adicional das operações realizadas com recursos do PIS-PASEP, deduzidas as despesas administrativas e as provisões de reserva cuja constituição seja indispensável."
A Constituição de 1988 dispôs, no seu art. 239, o seguinte:
Art. 239. A arrecadação decorrente das contribuições para o Programa de Integração Social, criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970, e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, criado pela Lei Complementar nº 8, de 3 de dezembro de 1970, passa, a partir da promulgação desta Constituição, a financiar, nos termos que a lei dispuser, o programa do seguro-desemprego e o abono de que trata o § 3º deste artigo. (Regulamento)
§ 1º Dos recursos mencionados no "caput" deste artigo, pelo menos quarenta por cento serão destinados a financiar programas de desenvolvimento econômico, através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, com critérios de remuneração que lhes preservem o valor.
§ 2º Os patrimônios acumulados do Programa de Integração Social e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público são preservados, mantendo-se os critérios de saque nas situações previstas nas leis específicas, com exceção da retirada por motivo de casamento, ficando vedada a distribuição da arrecadação de que trata o "caput" deste artigo, para depósito nas contas individuais dos participantes.
§ 3º Aos empregados que percebam de empregadores que contribuem para o Programa de Integração Social ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, até dois salários mínimos de remuneração mensal, é assegurado o pagamento de um salário mínimo anual, computado neste valor o rendimento das contas individuais, no caso daqueles que já participavam dos referidos programas, até a data da promulgação desta Constituição.
§ 4º O financiamento do seguro-desemprego receberá uma contribuição adicional da empresa cujo índice de rotatividade da força de trabalho superar o índice médio da rotatividade do setor, na forma estabelecida por lei.
Por conseguinte, a partir de outubro de 1988, os participantes que possuíssem saldos, continuaram a perceber os rendimentos - decorrentes da acumulação das distribuições anteriores -; enquanto que os cadastrados após a Constituição passaram a ter direito apenas ao abono salarial, na forma da lei 7.998, de 11 de janeiro de 1990 (arts. 9º e ss.)
. Ademais, anualmente, em 1º de julho, o valor porventura existente na conta é atualizado por índice apontado pela União Federal, por meio do Ministério da Fazenda; as contas com saldo podem apresentar, então, rendimento a ser sacado. Não havendo saque, os rendimentos são incorporados ao saldo total do dia 01 de julho do ano seguinte.
2.32. Modificações impostas pela Constituição/88:
Em primeiro exame, com a promulgação da Constituição Federal, as contas do PASEP sofreram significativa modificação no seu regime jurídico, deixando serem alimentadas com a arrecadação para contas individuais. A Lei Fundamental/1988 alocou aludidos recursos ao FAT - Fundo de Amparo do Trabalhador par custeio do seguro-desemprego, do abono salarial e o financiamento de programas de desenvolvimento econômico pelo BNDES.
Reporto-me ao julgado abaixo transcrito:
ADMINISTRATIVO. PASEP. ALEGAÇÃO DE DESFALQUE DOS DEPÓSITOS PERCEBIDOS PELO TITULAR NA ÉPOCA DO SAQUE DECORRENTE DE APOSENTADORIA. IMPUTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE À UNIÃO E AO BANCO DO BRASIL. FALTA DE PROVA DOS FATOS ALEGADOS. PRESCRIÇÃO. PROVIMENTO DO APELO DA UNIÃO E DA REMESSA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO COM RELAÇÃO AO BANCO. 1.
Ao ensejo de sua aposentadoria, o autor restou indignado com o valor encontrado em sua conta vinculada ao PASEP. Sem definir os fatos, procura responsabilizar a União, que possivelmente teria deixado de fazer os depósitos regulares, e o Banco, porque teria permitido o saque dos valores por terceiros; 2. A sentença acolheu os pedidos, dado que nenhum dos réus logrou juntar prova da regularidade dos depósitos fundiários e dos extratos da conta; 3. Ocorre que o regime do PASEP somente vigorou até 1988. Com a nova Constituição, os valores do PASEP passaram a financiar a seguridade social, não havendo depósitos posteriores à nova carta política, daí a normal pequenez dos valores que estavam nas contas nos idos de 1988. Demais disso, como o titular recebia periodicamente os rendimentos produzidos pelo saldo fundiário, consoante se colhe de suas fichas financeiras ajuntadas pela União, não se pode dizer que somente tenha tido conhecimento do valor do saldo na época do saque, para com isso afastar a prescrição; 4. É importante frisar que o litígio se reporta a período iniciado em 1977, há cerca de 40 anos, quando não existia informática, daí que não se pode exigir que a União disponha dos papéis (físicos) relativos aos depósitos mensais encerrados há 30 anos
; 5. Porque o autor conhecia o valor do saldo, através das notícias dos rendimentos que produzia mensalmente, força é reconhecer a prescrição do pretenso direito de exigir da União a complementação dos depósitos. Demais disso, não restou comprovado, e os ônus da prova são do autor, que eles tenham sido feitos de maneira indevida ou faltado; 6. Não é possível a acumulação da ação proposta contra a União e contra o banco, num único processo, posto que os pedidos são independentes, tendo causas de pedir própria e exclusiva e são da competência de juízos distintos; 7. Apelação da União provida para julgar a ação improcedente quanto a ela. De ofício, extinta a ação sem apreciação do mérito quanto ao Banco do Brasil. Apelação do Banco do Brasil prejudicada.
(AC - Apelação Civel - 572191 0009847-59.2012.4.05.8300, Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::10/08/2016 - Página::55.)
Em primeira análise, a correção monetária de tais saldos é promovida com a aplicação da TJLP - taxa de juros de longo prazo, ajustada por fator de redução e com juros anuais de 3% sobre o saldo atualizado, conforme lei n. 9.365, de 16 de dezembro de 1996 (art. 4º) e lei complementar 26, de 11 de setembro de 1975 (art. 3º, b).
2.33. Extinção do PIS-
PASEP
- medida não ratificada:
Acrescento que,
"Com edição em
07 de abril de 2020, a Medida Provisória 946 extingue o Fundo PIS-Pasep e transfere seus recursos para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
. Estima-se que as importâncias alcancem cerca de R$ 21 bilhões. A MP 946 teve vigência curta, de 07/4/2020 a 04/08/2020, de acordo com o estatuído no Ato Declaratório do Presidente da Mesa do Congresso Nacional n. 101, de 2020. Conforme entendimento jurisprudencial consagrado pelo Supremo Tribunal Federal, a edição de Medida Provisória suspende a eficácia das normas jurídicas anteriores com ela incompatíveis, de modo que apenas a conversão em lei dessa espécie normativa opera a revogação da legislação anterior."
(PRITSCH, Cesar; SOUZA, Rodrigo.
Direito Emergencial do Trabalho
. São Paulo: RT. 2021, cap. I).
Assim manifestou-se já o STF, em voto da Ministra Rosa Weber:
“2. Medida provisória não revoga lei anterior, mas apenas suspende seus efeitos no ordenamento jurídico, em face do seu caráter transitório e precário. Assim, aprovada a medida provisória pela Câmara e pelo Senado, surge nova lei, a qual terá o efeito de revogar lei antecedente. Todavia, caso a medida provisória seja rejeitada (expressa ou tacitamente), a lei primeira vigente no ordenamento, e que estava suspensa, volta a ter eficácia” (STF, Pleno, ADI 5.709/DF , Rel. Min. Rosa Weber, DJe 28.06.2019).
Atente-se que a hipótese do julgamento referido é da rejeição de medida provisória pelo Congresso, impedindo permanência da revogação legal, conforme então estabelecido pelo normativo temporário. A hipótese da MP 946 é de também estabelecer revogações de dispositivos legais, mas a perda de vigência da medida provisória não ocorreu por rejeição parlamentar expressa ou tácita, mas caducidade. Compreendemos que a ratio decidendi é a mesma nas duas situações fáticas: impossibilidade de se manter revogação legal no caso de perda de vigência de medida provisória que assim dispôs. Desse modo, impõe-se o mesmo efeito: retomam-se as vigências das disposições legais então (provisoriamente) revogadas.
Por consequência, rejeitada a medida provisória, a legislação anterior volta a produzir efeitos. Especificamente, a partir da data da caducidade da MP 946, voltam a produzir efeitos as disposições então tidas como revogadas pelo normativo provisório. É apenas durante o tempo de vigência que se podem considerar revogadas as normas assim definidas na MP.
Mesmo com a caducidade da MP 946, é importante avaliar a constitucionalidade formal do normativo. Isso porque, como já bem definido pelo Supremo Tribunal Federal, a conversão de medida provisória em lei não prejudica o debate jurisdicional sobre o atendimento dos pressupostos de admissibilidade desse espécime de ato da ordem legislativa ( ADI 3.330 /DF, rel. min. Ayres Britto, j. 3-5-2012, TP, DJe de 22-3-2013). Considerando que há efeitos a serem averiguados para o período de vigência da MP caducada, também poderá ser objeto de pressupostos formais." (Pritsch, 2021)
Mesmo com a caducidade da MP 946, é importante avaliar a constitucionalidade formal do normativo. Isso porque, como já bem definido pelo Supremo Tribunal Federal, a conversão de medida provisória em lei não prejudica o debate jurisdicional sobre o atendimento dos pressupostos de admissibilidade desse espécime de ato da ordem legislativa ( ADI 3.330 /DF, rel. min. Ayres Britto, j. 3-5-2012, TP, DJe de 22-3-2013). Considerando que há efeitos a serem averiguados para o período de vigência da MP caducada, também poderá ser objeto de pressupostos formais." (PRITSCH, Cesar; SOUZA, Rodrigo.
Obra citada.
capítulo I).
Ademais,
"Contribuem para o PIS todas as pessoas jurídicas de direito privado, bem como as entidades equiparadas pela legislação do imposto de renda. Parti- cipam do programa todos os empregados, com exceção de domésticos. Trata-se de patrimônio do trabalhador, que deve ser administrado em prol de seu interesse, de forma a ser bem remunerado, e servir de rendimento suficiente para retomada na forma de abono. A partir do cadastramento da Relação Anual de Informações Sociais, o PIS promove pagamento anual de abono, no valor de um salário-mínimo (art. 9o, Lei n. 7.998/1990). Os recursos oriundos do PIS contribuem para integração do Fundo de Am- paro ao Trabalhador (art. 11 da Lei 7.998/1990). Atuam, assim, para cus- tear o seguro-desemprego, o abono salarial e os programas de educação profissional. Todos esses programas permanecem, ainda que haja redução de suas fontes econômicas."
(PRITSCH, Cesar; SOUZA, Rodrigo.
Obra citada.
capítulo I).
Destaco ainda que
"Com a caducidade da MP 946, restou bastante problemática a situação da permanência do Fundo PIS-Pasep. Para tentar resolver a questão, quase imediatamente foi apresentado o Projeto de Lei Complementar n. 202/2020, o qual estabelece em seu art. 1o que "Fica mantida a extinção, em 31 de maio de 2020, do Fundo PIS-Pasep, bem como mantida a trans- ferência de seus ativos e passivos, na mesma data, ao FGTS”. Todavia, em 24/09/2020, tal projeto foi retirado pelo próprio autor, nos termos do dis- posto no art. 104, caput e art. 114, VII, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados. O mesmo parlamentar também apresentou o Projeto de Lei n. 4.066/2020, em 04/08/2020, que também permite a extinção do PIS/PASEP e o repasse de seu patrimônio para o FGTS e saques extraor- dinários até o limite de R$ 1.045,00 por trabalhador.
" (PRITSCH, SOUZA.
Obra cit.
capítulo I).
2.34. Correção monetária - considerações gerais:
No que toca à correção monetária dos valores devidos a título de indenização de danos materiais, como sabido,
"Dívida em dinheiro é a que se representa pela moeda considerada em seu valor nominal, isto é, pelo importe econômico nela numericamente consignado. É aquela contraída em determinada moeda, e que deve ser adimplida pelo valor estampado na sua face, consistindo, assim, na mais acabada expressão do nominalismo."
(MARTINS-COSTA, Judith.
Comentários ao novo Código Civil:
Arts. 304-388. Vol. V. Tomo I. 2. ed. RJ: Forense, 2005, p. 251).
Uma nota promissória insuscetível de correção monetária retrataria, a bem da verdade, uma espécie de obrigação de entregar
quantum
certo, a despeito da sua efetiva capacidade aquisitiva. Mas não é o que ocorre com o adimplemento tardio, pela União Federal, de obrigações para com os servidores do povo lotados nos seus quadros.
Judith Martins-Costa enfatiza, todavia, que
"A expressão dívida de dinheiro não representa, pois, nem o valor material no qual expressa a unidade monetária, nem o valor de compra de produtos ou o valor de serviços, nem objetiva, nem subjetivamente. Ela é, simplesmente, a forma material de uma vinculação monetária, vinculação abstrata e, por isso, apta a comprar e a pagar tudo o que pode ser objeto de patrimônio. É este, diz El-Gamal, o segredo que lhe permite desempenhar as funções prodigiosas nas relações econômicas. Sendo assim, força é concluir que o dinheiro não tem um valor em si, e o que se chama de valor da moeda é o nível geral dos preços, dos produtos e dos serviços, o que não é matéria concernente ao sistema monetária, mas ao sistema econômico."
(MARTINS-COSTA.
Obra citada.
p. 252).
Ora, nas dívidas de valor (
Wertschuld
),
"a moeda não constitui o objeto da dívida. São débitos que visam assegurar ao credor um
quid
e não um
quantum,
uma situação patrimonial determinada e não um certo número de unidades monetárias. Assim, nas dívidas de valor, a quantia em dinheiro é apenas a representação ou tradução transitória, num determinado momento, do valor devido. Variando o poder aquisitivo da moeda, o valor necessário para alcançar a finalidade do débito sofre uma modificação no seu
quantum
monetário, impondo-se, pois, um reajustamento. Em conclusão: enquanto nas dívidas de dinheiro, o
quantum
é o único objeto do débito, nas dívidas de valor, a soma de dinheiro é a quantia correspondente, nas condições atuais, a determinar o poder aquisitivo que o devedor se obrigou a fornecer ao credor."
(WALD, Arnoldo. A teoria das dívidas de valor e as indenizações decorrentes de responsabilidade civil
in
Revista da Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro.
Volume 23, 1970, p. 22).
Ademais, atente-se para o conteúdo da súmula 9 do eg. TRF4:
"Incide correção monetária sobre os valores pagos com atraso, na via administrativa, a título de vencimento, remuneração, provento, soldo, pensão ou benefício previdenciário, face à sua natureza alimentar. "
Semelhante é o conteúdo da s
úmula 38/2008 da AGU, datada de 16.09.2008
:
"Incide a correção monetária sobre as parcelas em atraso não prescritas, relativas aos débitos de natureza alimentar, assim como aos benefícios previdenciários, desde o momento em que passaram a ser devidos, mesmo que em período anterior ao ajuizamento de ação judicial."
2.35. Fatores de correção - exame precário:
Em princípio
, deve-se aplicar - quanto ao operíodo anterior à promulgação da EC 113/2021- o IPCA-SE como fator de atualização, conforme entendimento consolidado do
STJ - REsp 1.492.221, 1.495.144 e 1.495.146
, com termo inicial na data de prolação desta sentença - súmula 362. Destaco o que o termo final da correção recairá na data do efetivo pagamento.
Aludido indexador se aplica em substituição à TRB como fator de correção, eis que o art. 1-F da lei n. 9.494/1997 com lei n. 11.960/2009 foram reputados inválidos pela Suprema Corte, conforme
ADIs 4.357 e 4.425/DF
.
Deve-se ter em conta, ademais, a superveniência da Emenda Constitucinal n. 113, de
08 de dezembro de 2021
, que determinou a aplicação da taxa SELIC como fator de correção das dívidas da Fazenda Pública.
A EC nº 113/2021, em seu art 3°, determinou o emprego da taxa SELIC para atualização e compensação da mora.
"Art. 3º
Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente
."
Guardo, é fato, dúvidas quanto à constitucionalidade do aludido indexador. Menciono, por exemplo, o estudo do Ministro do STJ, Franciulli Neto, conforme se lê FRANCIULLI NETO, Domingos: Da Inconstitucionalidade da taxa SELIC para fins tributários in
Revista Dialética de Direito tributário.
São Paulo. n. 58, p. 7-30, jul. 2000.
Em sentido semelhante, atente-se para o RESP 200101461855, LAURITA VAZ, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:28/03/2006 PG:00201:
'(...)
A Taxa SELIC para fins tributários é, a um tempo, inconstitucional e ilegal. Como não há pronunciamento de mérito da Corte Especial deste egrégio Tribunal que, em decisão relativamente recente, não conheceu da argüição de inconstitucionalidade correspectiva (cf. Incidente de Inconstitucionalidade no REsp 215.881/PR), permanecendo a mácula também na esfera infraconstitucional, nada está a empecer seja essa indigitada
Taxa proscrita do sistema e substituída pelos juros previstos no Código tributário (artigo 161, § 1º, do CTN). O Codex tributário, ao disciplinar, em seu art. 167, a restituição de tributos, determinou a incidência de juros moratórios, na mesma intensidade que aqueles aplicados nos casos de mora do contribuinte e previstos no § 1º do art. 161, ou seja, no percentual de 1% ao mês. Se basta a declaração do contribuinte para o nascimento do débito perante o Poder Público, com a conseqüente aplicação das penalidades por eventual atraso no pagamento, quando o tributo é pago regularmente pelo contribuinte, mas indevidamente cobrado pelo Fisco, naturalmente deve incidir a mesma punição, diante da regra de isonomia. Não se pode dizer que o pagamento dos tributos cujo lançamento se dá por homologação depende unicamente da iniciativa do contribuinte, uma vez que 'o pagamento de tributo é espontâneo, na medida em que decorre de lei que deve ser cumprida compulsoriamente' (REsp 146.568/MG, Rel. Min. Ari Pargendler, DJU 9.12.1997). Julgamento deste recurso especial em 07 de novembro de 2002. Recurso especial provido em parte, para afastar a incidência da Taxa
SELIC
e determinar a aplicação de juros moratórios a partir do trânsito em julgado. ..EMEN:' (RESP 200101461855, LAURITA VAZ, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:28/03/2006 PG:00201 ..DTPB:.)
Em princípio, as mesmas críticas formuladas pelo STF, ao apreciar a ADin 493-0 (insurgência contra a aplicação da TRB para a correção de dívidas do SFH) e as ADIs 4425 e 4357(insurgência contra a aplicação da TRB como critério de correção monetária dos precatórios) são oponíveis à SELIC.
Também é certo, porém, que a jurisprudência predominante sobre o tema tem aplicado aludido fator de indexação para fins de atualização monetária da repetição de indébitos tributários, por força do art. 39, §4º, da lei 9.250, de 1995, ou como juros moratórios. Tramita perante a Suprema Corte a ADI ADI 7.047, deflagrada pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, impugnando a aludida EC nº 113/2021. A causa foi distribuída à relatoria da Min. Rosa Weber.
A Emenda Constitucional 113 deve ser aplicada, até eventual ordem em sentido contrário por parte do STF
. Assim, salvo eventual deliberação em contrário por parte dos Tribunais, é fato que, quanto ao período subsequente à publicação da EC 113, de 08 de dezembro de 2021, aludido critério deve ser aplicado caso.
Quanto ao mês de pagamento
, não estando definida a variação da SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção, conforme lógica do art. 5, §3, da lei n. 9.430/1996, art. 39,§ 4º, da Lei nº 9.250/95.
2.36. Fatores de correção - PASEP - exame precário:
No caso das contas vinculadas ao PASEP, em princípio a sistemática de correção foi determinada pelo Estado, por meio da lei complementar 26, de 11 de setembro de 1975, art. 3.
"Após a unificação determinada no art. 1º, as contas individuais dos participantes passarão a ser creditadas: a) pela correção monetária anual do saldo credor, obedecidos os índices aplicáveis às Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN); b) pelos juros mínimos de 3% (três por cento) calculados anualmente sobre o saldo credor corrigido; c) pelo resultado líquido adicional das operações realizadas com recursos do PIS-PASEP, deduzidas as despesas administrativas e as provisões de reserva cuja constituição seja indispensável."
As obrigações do Tesouro Nacional foram previstas na lei 4.357, de 16 de julho de 1964, com modificações promovidas pela lei complementar 26, de 11 de setembro de 1975 e pelo decreto-lei 2.290, de 21 de novembro de 1986. O tema também restou versado pela lei 9.365, de 16 de dezembro de 1996. Com a redação veicualda pela lei n. 10.199, de 14 de fevereiro de 2001, referida lei n. 9.365 estipulou:
"A administração e a aplicação dos recursos do Fundo de Participação PIS-PASEP, constituído pelos valores do Programa de Integração Social - PIS e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PASEP, inclusive suas disponibilidades, em poder do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, do Banco do Brasil S.A. e da Caixa Econômica Federal serão realizadas de acordo com as regras estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional."
Em princípio, deve-se atentar ainda para o seguinte:
"Os recursos do Fundo de Participação PIS-PASEP, do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do Fundo da Marinha Mercante, repassados ao BNDES ou por este administrados e destinados a financiamentos contratados a partir de 1º de dezembro de 1994, terão como remuneração nominal, a partir daquela data, a
TJLP
do respectivo período, ressalvado o disposto no § 1º do art. 5º e nos arts. 6º e 7º desta Lei. Parágrafo único.
O BNDES transferirá, nos prazos legais, ao Fundo de Participação PIS-PASEP e ao Fundo de Amparo ao Trabalhador o valor correspondente à TJLP aludida no caput deste artigo, limitada a seis por cento ao ano, capitalizada a diferença, podendo o Conselho Monetário Nacional, após manifestação favorável do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT e do Conselho Diretor do Fundo de Participação PIS-PASEP, alterar esse limite
."
O art. 1 da lei 9.365/1996 tratou dos critérios de estipulação da TJLP - taxa de juros de longo prazo.
NO CASO EM EXAME, a parte autora sustentou que aludidos indexadores, definidos pelo CMN - Conselho Monetário Nacional, autarquia definida no art. 2 da lei n. 4.595/164, não teriam tido aptidão para assegurar efetiva preservação do poder aquisitivo da moeda
.
Discute-se, nesse âmbito, se a
natureza estatutária
da conta poderia influenciar a apreciação do aludido critério de correção.
2.37. Debate semelhante - correção da conta do FGTS:
Ademais, como notório (art. 374, I, CPC), há um debate semelhante a respeito da correção dos valores mantidos em conta vinculada ao FGTS, atualmente corrigidos pela variação da taxa referencial básica - TRB. Esgrimem-se argumentos semelhantes àqueles que teriam ensejado a declaração da invalidade da adoção da taxa referencial básica para correção de débitos da Fazenda Pública - ADIs 4425 e 4357.
O Plenário da Suprema Corte apreciou o tema ao julgar a
Ação Direta de Inconstitucionalidade 5090
, reputando que a taxa referencial básica deve ser substituída, quando menos, pelo IPCA, para fins de correção monetária. Aludido entendimento -
ratio decidendi
- pode influenciar, em primeiro exame, demandas como a presente. Fica o registro para que o precedente sejam debatido entre as partes - art. 927, CPC.
2.38. Juros remuneratórios - considerações gerais:
A legislação trata dos juros remuneratórios/compensatórios - fruto da utilização do capital alheio -, juros moratórios, enquanto mecanismo dissuasório do inadimplemento, podendo constituir em uma sanção ou em uma tentativa de reparar danos.
Como sabido, a Constituição Federal estabelecia, na redação originária do seu artigo 192, § 3°, o limite de 12% para os juros reais. Surgiu, então, uma polêmica a respeito do aludido dispositivo.
Para José Afonso da Silva,
a norma seria autoaplicável, dado que
'juros reais'
seriam aqueles calculados mediante desbaste da inflação do período
. Logo, caso a inflação fosse de 10%, os juros poderiam chegar a 22%. Por seu turno, Celso Bastos e Ives Gandra sustentaram que a Constituição não teria definido o que seriam os tais 'juros reais', de modo que o limite demandaria a aprovação da lei complementar prevista no art. 192, caput, CF, redação original.
O STF acolheu essa última orientação, conforme se infere da conhecida súmula 648 e súmula vinculante 7. Ademais, referida limitação foi extirpada do texto constitucional, a partir da emenda constitucional 40/2003
.
Logo, os juros não estão limitados a 12% ao ano (exceção feita aos contratos celebrados sob o SFH, por força do art. 25 da lei 8692/1993). Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça sumulou o entendimento de que a aplicação de juros superiores a 12% não implicaria, de modo automático, onerosidade excessiva: Súmula 382, STJ
- "
a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade
."
Sob o primeiro governo de Getúlio Vargas, o
decreto
22.626/1933
dispôs ser
"proibido contar juros dos juros. Esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano."
Ademais, segundo o seu art. 7º, §2:.
"Em caso de amortização os juros só serão devidos sobre o saldo devedor."
Já o art. 13 preconizou "
É considerado delito de usura, toda a simulação ou prática tendente a ocultar a verdadeira taxa do juro ou a fraudar os dispositivos desta lei, para o fim de sujeitar o devedor a maiores prestações ou encargos, além dos estabelecidos no respectivo título ou instrumento. Penas - prisão por (6) seis meses a (1) um ano e multas de cinco contos a cinqüenta contos de reis. No caso de reincidência, tais penas serão elevadas ao dobro."
Essas normas tiveram por escopo limitar, com severas sanções (inclusive penais), a cobrança dos juros. A lei de usura revogou, nesse particular, o artigo 1262 do Código Civil de 1916, que dispunha ser
"permitido, mas só por cláusula expressa, fixar juros ao empréstimo de dinheiro ou de outras coisas fungíveis. Esses juros podem fixar-se abaixo ou acima da taxa legal, com ou sem capitalização."
Por sinal, o artigo 1263 do Código Civil bevilaquiano preceituava que
"o mutuário que pagar juros não estipulados, não os poderá reaver, nem imputar no capital."
Menciono também as conhecidas súmulas 121 e 596, STF: "
É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. (...) As disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional."
Conquanto a
súmula 596
pareça exonerar totalmente os bancos da aplicação da lei de usura, a sua interpretação foi conferida pelo próprio STF, ao enfatizar que apenas o limite de juros é que teria sido afastado. Ou seja, esse último enunciado não chancela eventual prática de anatocismo por parte das instituições financeiras.
"
Finalmente, é oportuno frisar que a Súmula 596 se refere ao art. 1º do Decreto nº 22.626/33, não conflitando com o verbete da Súmula nº 121, que se apóia no art. 4º do mesmo diploma. Vê-se, diante do exposto, que continua de pé a Súmula nº 121. Em conseqüência, não pode subsistir a decisão, na parte atinente à capitalização mensal dos juros pactuados
." (RE nº 96.875 - RJ, 2ª Turma, julg. 16/09/1983, RTJ - 108, p.277)
Acrescento, por outro lado, que a medida provisória 2.170-36/2001(art. 5º) autorizou os bancos a cobrarem juros sobre juros:
"Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano."
Esse dispositivo foi declarado inválido pelo eg. TRF da 4ª Rg., em controle incidental:
1. Até o advento da indigitada MP nº 1.963-17, publicada em 31/03/2000 (MP nº 2.170, de 23/08/2001 - última edição), a capitalização dos juros mês a mês, nos contratos de abertura de crédito rotativo em conta-corrente - cheque especial - e nos contratos de renegociação, à míngua de legislação especial que a autorizasse, estava expressamente vedada. 2. Estavam excluídos da proibição os contratos previsto no Decreto lei nº 167, de 14/02/67, no Decreto-lei 413, de 09/01/69 e na Lei 6.840, de 03/11/80, que dispõe sobre títulos de crédito rural, título de crédito industrial e títulos de crédito comercial, respectivamente. 3. O Executivo, extrapolando o permissivo constitucional, tratou de matéria antiga, onde evidentemente não havia pressa alguma, eis que a capitalização de juros é matéria que remonta à época do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura). A gravidade é ainda maior quando se tem em conta que a capitalização de juros em contratos bancários e financeiros tem implicações numa significativa gama de relações jurídicas. 4. Não verificado o requisito "urgência" no que se refere à regulamentação da capitalização dos juros em período inferior a um ano. Especialmente quando se trata de uma MP que, dispondo sobre a administração dos recursos de caixa do Tesouro Nacional, dá providências sobre a capitalização de juros para as instituições financeiras. 5. Não se pode reputar urgente uma disposição que trate de matéria há muito discutida, e que, ardilosamente foi enxertada na Medida Provisória, já que trata de tema totalmente diverso do seu conteúdo. Além disto, estatui preceito discriminatório, porque restringe a capitalização de juros questionada unicamente às instituições financeiras. A urgência, portanto, só se verifica para os próprios beneficiados pela regra, já que, para todos os demais, representa verdadeiro descompasso entre a prestação e a contra-prestação, além de onerar um contrato que por natureza desiguala os contratantes (de adesão)." (TRF4, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade 2001.71.00.004856-0, Corte Especial, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 08/09/2004)
De todo modo, a questão está longe de ser pacífica. Remanescem grandes controvérsias sobre o significado da vedação da
'cobrança
de juros sobre juros'.
Afinal de contas, o que se proíbe? Caso se proíba o emprego de fórmulas de juros compostos, a realidade econômica seria inválida. Afinal de contas, CDB's, caderneta de poupança e outras aplicações financeiras estão amparadas todas em mecanismos de juros compostos.
Caso se suponha que o emprego de fórmulas de juros compostos estaria proibido, a própria atividade financeira como um todo estaria à margem da lei. Tem predominado, portanto, o entendimento de que a 'cobrança de juros sobre juros' se limitaria àqueles casos de amortização negativa; i.e., casos em que a prestação mensal é inferior ao valor dos juros mensais, sendo incabível o lançamento de juros impagos no saldo devedor, com incidência de novos juros.
Há quem sustente, todavia, que o emprego de fórmula de juros compostos (capitalização composta de juros) estaria proibida pela lei. Ilustram isso com a leitura a
contrario sensu
do art. 1544 do Código Civil de 1916 (dispositivo sem paralelo, porém, na lei 10.406/2002): "
Além dos juros ordinários, contados proporcionalmente ao valor do dano, e desde o tempo do crime, a satisfação compreende os juros compostos."
Para essa concepção, portanto, o Decreto 22.626/1933 teria proibido a cobrança de juros compostos, salvo quando a capitalização fosse anual. A composição de juros apenas seria admissível a título de sanção, como evidenciaria o art. 1544 do Código Civil de 1916. Revisando soluções anteriores, compartilho do entendimento de que apenas as chamadas 'amortizações negativas' ou práticas semelhantes estão proibidas pela lei. Importa dizer: não há vício no emprego da fórmula do sistema francês de amortização (tabela price):
"ADMINISTRATIVO. SFH. ANATOCISMO - ILICITUDE. TABELA PRICE DESCARACTERIZADA. -
A vedação do anatocismo em contrato de mútuo habitacional não passa pela consideração da liceidade da Tabela Price, que encerra fórmula matemática, certo que a mesma resulta descaracterizada em meio de economia mutável, especialmente a móvel do fenômeno da inflação, enquanto não se lhe apliquem rigorosos elementos de adequação imprescindíveis para o resguardo de sua estrutura original
." (TRF da 4ª Rg., rel. Des. Fed. Amauri Chaves de Ataíde, DJU de 20/10/04, p. 609).
"Diferentemente da existência de previsão no contrato de incidência de uma taxa de juros nominal e outra efetiva (forma de cálculo simples ou composta), ou do sistema de amortização da Tabela Price - cuja legalidade ora se reconhece -,
o que a lei repudia é a prática de anatocismo, caracterizada pela cobrança de juros sobre capital renovado, ou seja, sobre montante de juros não pagos, já resultantes da incidência de juros compostos (capitalizados), que ocorre quando o valor do encargo mensal revela-se insuficiente para liquidar até mesmo a parcela de juros, dando causa às chamadas "amortizações negativas.
" TRF da 4ª Rg., rel. Des. Fed. Valdemar Capeletti, DJU de 08/09/2004, p. 347, omitiu-se parte da ementa).
Sem dúvida que, de corriqueiro uso, a
tabela price
está fundada em fórmula de juros compostos, o que é notório:
Em que:
pmt - Valor da parcela (do inglês
payment
)
PV - Valor Presente (do inglês
Present Value
)
i - Taxa de juros (do inglês
Interest Rate
)
n - Número de períodos
O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a aplicação de que
"
a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade
."
(súmula 382, STJ).
Registro pois a discussão a respeito da cláusula "juros reais".
3.39. Remuneração PIS-PASEP:
No âmbito do PIS/PASEP
parece
incidir a mesma remuneração aplicável às contas do FGTS. Ou seja, 3% de taxa nominal ao ano. Em termos de juros compostos equivalentes, tem-se: (1+3%/12)
12
- 1 = 1,0025
12
- 1 = 1.03041595691 - 1. Logo, a taxa efetiva é de aproximados
3,042% ao ano
.
No caso do FGTS, há distribuição de lucros aos fundistas, tudo a depender do período. Cuida-se, de toda sorte, de uma remuneração diminuta, se comparada com as práticas de mercado.
APELAÇÃO CÍVEL. PASEP. CORREÇÃO MONETÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DO PASEP . ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. FALHA NÃO VERIFICADA. ÔNUS DA PROVA. FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO . APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. 1. Conforme sobressai da Lei Complementar nº 26/1975, do Decreto nº 4.751/2003 e da Lei nº 9 .365/96, as contas individuais do PIS /PASEP têm o saldo (cotas) verificado ao término de cada exercício financeiro (que corresponde ao período de 1º de julho de cada ano a 30 de junho do ano subsequente).
E para corrigi-lo, primeiro é aplicado o percentual correspondente à distribuição de Reserva para Ajuste de Cotas - RAC, se houver, definido pelo Conselho Diretor do Fundo PIS /PASEP. Sobre o saldo acrescido das reservas (RAC) é aplicado o percentual correspondente à Atualização Monetária, também definido pelo Conselho Diretor do Fundo PIS /PASEP. Finalmente, aplica-se o percentual resultado da soma dos Juros (3%) e do Resultado Líquido Adicional - RLA, se houver . O valor dos Juros mais o RLA corresponde aos Rendimentos que são disponibilizados para saque anualmente
. 2. As microfichas e os extratos emitidos pelo Banco do Brasil retrataram a evolução dos depósitos, da correção anual do saldo e das retiradas da conta individual do autor no Fundo PIS /PASEP. 3 . Conforme prova técnica, a planilha apresentada pelo autor não observou a atualização monetária fixada pela Lei Complementar nº 26/1975. Nos termos do art. 373, I do CPC, incumbia ao autor o ônus de provar fato constitutivo do seu direito - vício nos cálculos utilizados para atualização do saldo da sua conta PASEP pelo Banco do Brasil - do que não se desincumbiu. 4 . APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-DF 07041912520218070007 1905039, Relator.: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 08/08/2024, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 21/08/2024)
Faço esse registro
com cognição precária.
2.40. Distribuição do
ônus
da prova CDC - exame precário:
A lei 8078/1990 dispõe, no seu art. 6º, VIII, que
"
São direitos básicos do consumidor: (...) a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências
."
No que toca à aludida cláusula, leia-se:
"(...) Por isso, o reconhecimento da hipossuficiência do consumidor para fins de inversão do ônus da prova não pode ser visto como forma de proteção ao mais pobre. Ou, em outras palavras, não é por ser pobre que deve ser beneficiado com a inversão do ônus da prova, até porque a questão da produção da prova é processual, e a condição econômica do consumidor diz respeito ao direito material.
Na realidade, para beneficiar o carente econômico no processo não seria necessária a inversão. Bastaria determinação judicial de que o fornecedor arcasse com eventuais custas processuais para a produção de provas, tais como as periciais. Determinar-se-ia a inversão do pagamento, e aí sim estar-se-ia protegendo, de forma justa, o economicamente fraco
. Não se pode olvidar que, para os pobres, na acepção jurídica do termo, existe a justiça gratuita, a qual permitem ao beneficiário a isenção do pagamento de custas judiciais, o que não significa que ele está isento de provar o seu direito.
(...) Assim, se a questão for meramente de falta de capacidade financeira de suportar o custo do processo, basta ao consumidor servir-se do benefício legal da lei 1060/1950. E o inverso é verdadeiro: existem consumidores economicamente poderosos, o que não implica a sua não hipossuficiência técnica. Mas, mesmo no caso de o consumidor ter grande capacidade econômica, a inversão do ônus da prova deve ser feita na constatação de sua hipossuficiência técnica (técnica e de informação)." (NUNES, Rizzatto.
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 731-733)
Por seu turno, os Tribunais têm decidido como segue:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 273 DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356/STF. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Inviável o recurso especial quando ausente o prequestionamento das questões de que tratam os dispositivos da legislação federal apontados como violados. 2. A
inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança das alegações do consumidor ou de sua hipossuficiência
. 3. Na hipótese em exame, a eg. Corte de origem manteve a aplicação ao caso do Código de Defesa do Consumidor, e após sopesar o acervo fático-probatório reunido nos autos, concluiu pela configuração da verossimilhança das alegações da parte agravada, bem como de sua hipossuficiência. Desse modo, o reexame de tais elementos, formadores da convicção do d. Juízo da causa, não é possível na via estreita do recurso especial, por exigir a análise do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201300457409, RAUL ARAÚJO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:24/06/2013 ..DTPB:.)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. ART. 130 DO CPC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2.
Cabe ao magistrado, como destinatário da prova, determinar aquelas necessárias à instrução do processo, sempre em busca de seu convencimento racional. O reexame do juízo acerca da produção probatória encontra óbice na Súmula n° 7/STJ. 3. A inversão do ônus da prova se submete ao critério do julgador mediante análise das circunstâncias fáticas, cujo reexame é vedado em sede especia
l. 4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGA 201000593699, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:26/03/2013 ..DTPB:.)
2.41.
Inversão
do
ônus
da prova - art.
373
, CPC:
O processualista Araken de Assis promove uma avaliação crítica da ampliação das hipóteses de inversão do ônus da prova, promovida com o CPC/2015:
"(...) A distribuição dinâmica do ônus da prova ocorre em outros ordenamentos. O art. 217.6 da Ley de Enjuiciamiento Civil espanhola institui dois meios para corrigir a inadequação formal do critério geral (onus probandi incumbit qui ei dicit): (a) a disponibilidade da prova (v.g., na investigação de paternidade, o suposto pai tem condições de esclarecer o fato biológico, através de exame de DNA); e (b) a facilidade probatória (v.g., a empresa encontra-se melhor situada para arrolar as testemunhas de eventos que ocorreram em suas dependências que o visitante ocasional). E, no direito norte-americano, o juiz alocará o ônus da prova segundo numerosas e complicadas regras.
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a) o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentativo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
2.42.
Juízos de abdução:
A distribuição do ônus da prova cuida de um critério de solução da causa, diante da eventual insuficiência da comprovação da veracidade de determinadas asserções. Na forma do art. 373, I, CPC/15, caso a autora tenha promovido a narrativa de um fato, apontado como causa da sua pretensão, e a veracidade dessa narrativa não tenha sido comprovada, a pretensão há de ser julgada improcedente. De modo semelhante, caso o requerido tenha alegado a ocorrência de um fato obstativo do acolhimento da pretensão da parte autora - por exemplo, causação do dano por um terceiro, desvinculado da sua atividade econômica -, e isso não seja provado, sua impugnação não poderá ser acolhida.
Algo diferente ocorre com os critérios de interpretação dos meios de prova. Nesse âmbito, tem-se em conta a forma como o Juízo deve apreciar os elementos probatórios veiculados nos autos, para fins de reconstrução histórica dos fatos narrados pelas partes
.
Como sabido, indício
"
é todo rastro, vestígio, sinal e, em geral, todo fato conhecido, devidamente provado, suscetível de conduzir ao conhecimento de um fato desconhecido, a ele relacionado, por meio de um raciocínio indutivo-dedutivo
"
(MOURA, Maria Thereza.
A prova por
indícios
no processo penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 109). Tais sinais, fundamentando juízos de abdução, podem amparar um decreto condenatório; desde que sejam coerentes, harmônicos entre si, e não refutados por contraindícios.
"
Indício não é uma prova menor, mas uma prova que deve ser verificada. O indício é idôneo para apurar a existência de um fato histórico delituoso somente quando presentes outras provas que excluam uma diversa reconstrução do acontecimento. O princípio é formulado no art. 192, inc. 2, do CPP [italiano]: a existência de um fato não pode ser deduzida por meio de indícios, a menos que estes sejam graves, precisos e consonantes
. Desta regra emerge, em primeiro lugar, que um único indício nunca é suficiente." (TONINI,
Paolo.
A prova no processo penal italiano.
SP:RT, p. 58)
"Valor probatório dos indícios: como já afirmamos em nota anterior, os indícios são perfeitos tanto para sustentara a condenação, quanto para a absolvição. Há autorização legal para a sua utilização e não se pode descurar que há muito preconceito contra essa espécie de prova, embora seja absolutamente imprescindível ao juiz utilizá-la. Nem tudo se prova diretamente, pois há crimes camuflados - a grande maioria - que exigem a captação de indícios para a busca da verdade real. Lucchini, mencionado por Espínola Filho, explica que a eficácia do indício não é menor que a data prova direta, tal como não é inferior a certeza racional à histórica e física. O indício é somente subordinado à prova, porque não pode subsistir sem uma premissa, que é a circunstância indiciante, ou seja, uma circunstância provada; e o valor crítico do indício está em relação direta com o valor intrínseco da circunstância indiciante. Quando esteja bem estabelecida, pode o indício adquirir uma importância predominante e decisiva no juízo (...) Assim também Bento de Faria, apoiado em Malatesta.
Realmente, o indício apóia-se e sustenta-se numa outra prova. No exemplo citado na nota anterior, quando se afirma que a coisa objeto do furto foi encontrada em poder do réu não se está provando o fato principal, que consiste na subtração
, mas tem-se efetiva demonstração de que a circunstância ocorreu, através do auto de apreensão e de testemunhas. Em síntese, o indício é um fato provado e secundário (circunstância) que somente se torna útil para a construção do conjunto probatório ao ser usado o processo lógico da indução." (NUCCI, Guilherme de Souza.
Código de processo penal comentado.
8ª ed., SP: RT, p. 514)
"
Inicialmente, é de ser recordar que todos os meios de prova no processo penal são relativos, não existindo hierarquia entre eles. Fixada essa premissa, é óbvio que os indícios podem servir para sustentar uma condenação, a depender evidentemente da sua qualidade
. (...) [Nota de rodapé:] Em passagem pitoresca Denílson Pacheco afirma: É possível se condenar com base em indícios? Desde que sejam veementes e insofismáveis, a resposta é positiva. Para ilustrar, vamos contar uma estória muito difundida no meio forense. Um gato e um passarinho foram colocados no interior de uma sala hermeticamente fechada e completamente vazia. Várias testemunhas idôneas foram colocadas do lado de fora da sala durante todo o evento. A única saída foi fechada e, rapidamente, foi aberta novamente, com todas as testemunhas observando a única saída. No interior da sala, o passarinho tinha sumido. Havia somente penas pelo chão. O gato encontrava-se num canto da sala, lambendo os beiços, com sangue pelos bigodes e, ainda, umas penas pelos dentes. Alguém viu o gato comendo o passarinho? Alguém viu o assassinato do passarinho? Todas as provas são indiciárias: a sala hermeticamente fechada, o gato e passarinho sozinhos na sala, as testemunhas idôneas que observaram todo o evento etc. Mas, de todos esses indícios veementes, podemos tirar nossa firme conclusão: alguém tem dúvida de que foi o gato que comeu o passarinho? (Direito processual penal, Teoria, crítica e práxis, p. 896)." (BEDÊ JÚNIOR, Américo; SENNA, Gustavo.
Princípios do processo penal:
entre o garantismo e a efetividade da sanção. RT, p. 113.
"
A prova indiciária, ou prova por indícios, terá a sua eficiência probatória condicionada à natureza do fato ou da circunstância que por meio dela (prova indiciária) se pretender comprovar
. Por exemplo, tratando-se de prova do dolo ou da culpa, ou dos demais elementos subjetivos do tipo, que se situam no mundo das idéias e das intenções, a prova por indícios será de grande valia." (Pacelli de Oliveira,
Curso de processo penal,
6ª ed. Del Rey, p. 367).
"Se é verdade que na investigação da subjetividade do agente, o fato externo é que indica o elemento interno, isto não quer dizer que o dolo possa ser presumido. O juiz deverá se convencer da ocorrência do dolo, ainda que - para tanto - deva se basear em elementos objetivos. Estes dados objetivos devem estar provados e convencer o julgador, sem margem de dúvida, sobre qual era a intenção do acusado. A inferência do elemento subjetivo a partir de dados objetivos não significa que o dolo seja presumido." (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Ônus da prova no processo penal.
SP: RT, 2.003, p. 307, grifei.
Transcrevo também alguns julgados a respeito desse tema:
"
Uma sucessão de indícios e circunstâncias, coerentes e concatenadas, podem ensejar a certeza fundada que e exigida para a condenação
."
(STJ, 5ª turma, REsp n. 130.570, rel. Min. Felix Fischer, DJU de 06.10.97, p. 50.035, omiti o restante da ementa). Ademais,
"
Indícios e circunstâncias quando múltiplos, sucessivos, coerentes concatenados e veementes, como no caso dos autos, têm o mesmo valor das provas diretas e são suficientes para embasar uma decisão condenatória, ainda mais quando excluem quaisquer outras hipóteses favoráveis ao condenado
."
(TRF da 4ª Rg., 7ª Turma, Apelação criminal de autos 200104010635742/PR, rel. Des. Fed. José Luiz Borges Germano da Silva, DJU 01.09.2004, p. 802, omiti parte da ementa).
Ainda nesse sentido,
"
Pressuposta a impenetrabilidade de consciência, se o réu não confessa, a prova do elemento subjetivo do delito só pode ser fornecida por meios indiretos, por indícios, vale dizer
."
(TRF 3ª Rg., ACR 17.877, DJU de 05.08.2005, p. 383, rel. Juiz Peixoto Júnior).
Em princípio, cabe a quem alega o ônus da demonstração segura, ou seja, crível e filtrada racionalmente, tanto quanto possível, de que os argüidos teriam praticado, ao tempo reportado pela petição inicial, a conduta imputada, ainda que isso possa ser promovido por meio da conjugação de significativos e consistentes indícios da prática infracional. Sendo isso aplicável na temática processual penal, solução semelhante impõe-se também no âmbito da ação civil pública, com os contornos próprios ao processo civil.
2.43.
Tema 1300 - STJ - exame precário:
No tema 1300, submeteu-se ao STJ a questão de saber
"a qual das partes compete o ônus de provar que os lançamentos a débito nas contas individualizadas do PASEP correspondem a pagamentos ao correntista."
Afetação na sessão eletrônica iniciada em 27/11/2024 e finalizada em 3/12/2024 (Primeira Seção).
O STJ determinou a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional - art. 1.037, II, do CPCP/15
.
2.44. Equacionamento:
No caso, o exame do
thema decidendum
parece gravitar torno de seguintes questões; (ab) aferir se os índices oficiais de ocorreção das contas do PASEP, definidos pelo Estado, deveriam observar os fatores de efetiva variação do poder aquisitivo da moeda, no período considerado; (b) caso positiva a resposta, aferir se os índices efetivamente determinados pelo Estado teriam, então, respeitado aludida variação efetiva da inflação; (c) aferir se o banco depositário teria aplicado às contas os índices definidos pelo CMN, (d) apurar, tudo a depender da resposta a tais questões, os valores proventura definidos, com projeções decorrentes da cogitada incidência de juros remuneratórios.
2.45. Documentos apresentados com a inicial:
O autor apresentou, com a peça inicial, fichas da evolução da conta. Encontram-se esmaecidas e ilegíveis. Também juntou tabela de índices de correção monetária, alegando serem indexadores oficiais aplicáveis ao PASEP.
2.46. Ressalvas:
Ressalvo novo exame de tais temas por época do saneamento, conforme art. 357, CPC, e sentença, dado que se trata de exame fundado em cognição precária.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. DECLARO, em primeiro exame, a competência da Justiça Federal para o caso, na forma do art. 109, I, Constituição e art. 10 da lei n. 5010/66, na medida em que a parte autora deduziu pretensão em face da União Federal. Aludida premissa pode ser infirmada caso se evidencie que a União não estaria legitimada para a causa.
3.2. DESTACO que esta demanda se submete ao processamento no rito dos Juizados, dado que o conteúdo econômico da pretensão deduzida no movimento 1 se revela inferior a 60 salários mínimos, vigentes ao tempo da distribuição. A eventual complexidade da causa não implica a necessidade de tramitação do processo sob rito comum.
3.3. REPUTO que o presente Juízo Substituto da 11.VF é competente para a causa, nos termos da fundamentação.
3.4. SUBLINHO que não diviso conexão entre esta demanda e algum outro processo, para os fins do art. 55, §1, CPC e leitura
a contrario sensu
da súmula 235, STJ.
3.5. ACRESCENTO que a presente demanda é singular, não havendo sinais de violação da garantia da coisa julgada, consagrada no art. 5, XXXVI, Constituição e art. 508, CPC, tampouco tendo incorrido em litispendência, conforme definição do art. 337, §2, CPC.
3.6. ANOTO ainda que não diviso fundamento para eventual suspensão desta demanda, na forma do art. 313, CPC/15, o que aprecio de ofício, conforme lógica do art. 485, §3, CPC.
3.7. ENFATIZO que a parte autora está legitimada para esta demanda, não esbarrando no art. 18, CPC. Atua com interesse processual.
3.8. ACRESCENTO que, nos termos do Tema Repetitivo 1150, a União Federal é legitimada para a demanda, no que toca á impugnação da definição dos índices oficiais aplicáveis à conta PASEP, definição promovida pelo Conselho Monetário Nacional - pedido de aplicação de expurgos inflacionários. O Banco do Brasil está legitimado para a causa, no que toca à alegação de ausência de repasse dos índices oficiais para correção da conta.
3.9. SUBLINHO que a União Federal há de ser representada nesse processo pela Advocacia Geral.
3.10. ACOLHO a atribuição de valor à causa - art. 292, CPC.
3.11. REGISTRO que o CDC não se aplica ao caso, na relação estabelecida entre a União e a demandante, por se cuidar de vínculo de direito administrativo, em sentido estrito. Em princípio, parece incidir sobre a relação mantida entre o Banco do Brasil e os titulares da aludida conta, em que pesem as controvérsias existentes sobre o tema.
3.12. ANOTO que as pretensões deduzidas na peça inicial submetem-se ao prazo prescricional de 10 anos (art. 205, Código Civil) no que toca ao Banco do Brasil - conforme entendimento do STJ -, e de 5 anos no que diz respeito à União (art. 1 do decreto 20.910/32). Aludido prazo deve ser computado a partir da data em que o requerente tenha tomado conhecimento da alegada incorreção na correção dos seus depósitos, termo inicial a ser aferido. O cômputo do prazo permanece suspenso, porém, no curso de eventual processo administrativo versando sobre a correção de valores ou quando haja deflagração de processo judicial para apurar eventual suspeita da prática de delitos, o que não se deu no caso em exame.
3.13. ENFATIZO que o exame de eventual prescrição demanda a fixação do termo inicial para referido cálculo - a data em que a parte autora teria tomado conhecimento da alegada incorreção do saldo devedor da sua conta vinculada ao PASEP.
3.14. DESTACO que, em princípio, não se aplica ao caso a prescrição de fundo de direito, consistente no decurso do prazo presdricional a contar de eventual indeferimento do pedido no âmbito administrativo, com termo final na data da deflagração da demanda.
3.15. ACRESCENTO que a decadência não foi ultimada no caso.
3.16. DISCORRI acima, com cognição precária, sobre as contas vinculadas ao PASEP, critérios de correção e de delimitação dos juros remuneratórios aplicáveis.
3.17.DETERMINO a suspensão desta demanda, em conformidade com o tema 1300, STJ, nos termos da fundamentação.
3.18. DESTACO que aludida suspensão não comprometerá a oportuna interrupção do cômputo da prescrição, com efeitos retroativos à data da deflagração da demanda, conforme art. 240, STJ, tão logo a citação dos requeridos seja viabilizada, com superação da estagnação ditada pelo STJ.
3.19. REGISTRO que caberá à parte autora manifestar-se nos autos informando eventuais atos que ensejem a retomada do processamento desta causa.
3.20. INTIMEM-SE as partes a respeito deste despacho.
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