Municipio De Beberibe x Francisco Ferreira De Almeida
ID: 257340905
Tribunal: TJCE
Órgão: 1º Gabinete da 2ª Câmara de Direito Público
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0002669-70.2019.8.06.0049
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª Câmara de Direito Público PROCESSO Nº 0002669-70.2019.8.06.0049 APELAÇÃO DA 2ª VARA DA COMARCA DE BEBERIBE APELANTE: MUNICÍPI…
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª Câmara de Direito Público PROCESSO Nº 0002669-70.2019.8.06.0049 APELAÇÃO DA 2ª VARA DA COMARCA DE BEBERIBE APELANTE: MUNICÍPIO DE BEBERIBE APELADO: FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA RELATOR: DES. FRANCISCO GLADYSON PONTES Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. TEMA Nº 1184, DO STF. RESOLUÇÃO Nº 547/2024, DO CNJ. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DA PARTE EXEQUENTE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E VEDAÇÃO À DECISÃO SURPRESA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta pelo Município de Beberibe contra sentença que extinguiu execução fiscal, sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir, em razão do reduzido valor executado, aplicando o Tema 1184, do STF, e a Resolução nº 547/2024, do CNJ. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) se houve cerceamento de defesa do exequente em razão da extinção do feito sem prévia manifestação sobre os fundamentos utilizados pelo juízo de primeiro grau; (ii) se estavam preenchidos os requisitos do Tema 1184 do STF e da Resolução nº 547/2024 do CNJ para a extinção da execução fiscal por ausência de interesse de agir. III. Razões de decidir 3. O art. 9º e 10, do CPC, estabelecem que não se pode proferir decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida sobre o fundamento utilizado. No caso, o exequente foi intimado para manifestar-se antes da extinção do feito, afastando a alegação de cerceamento de defesa. 4. O Tema 1184, do STF, e a Resolução nº 547/2024, do CNJ, permitem a extinção de execução fiscal de baixo valor por ausência de interesse de agir, desde que preenchidos certos requisitos, como ausência de movimentação útil por mais de um ano sem citação do executado ou localização de bens penhoráveis. 5. No caso concreto, além de inexistir citação válida do executado, o exequente diligenciou ativamente para efetivar a citação por diversas modalidades, não se configurando a ausência de movimentação útil por mais de um ano. 6. A extinção da execução fiscal sem observância dos requisitos do Tema 1184, do STF, e da Resolução nº 547/2024, do CNJ, configura error in procedendo do juízo de origem, justificando a anulação da sentença. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos ao Juízo de origem. Tese de julgamento: "1. A extinção da execução fiscal por ausência de interesse de agir exige o cumprimento dos requisitos do Tema 1184 do STF e da Resolução nº 547/2024 do CNJ, incluindo a ausência de movimentação útil por mais de um ano sem citação do executado ou localização de bens penhoráveis. 2. A atuação diligente do exequente na tentativa de citação do executado impede o reconhecimento de inércia processual para fins de extinção do feito". ____________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 9º e 10; Lei nº 6.830/1980, art. 34; CNJ, Resolução nº 547/2024. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 1355208, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 19-12-2023; STJ, REsp 1168625/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/06/2010, DJe 01/07/2010; TJCE, APELAÇÃO CÍVEL - 00511333120218060090, Relator(a): JORIZA MAGALHAES PINHEIRO, 3ª Câmara de Direito Público, Data do julgamento: 10/07/2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer da Apelação, para dar-lhe provimento, anulando a sentença recorrida, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. FRANCISCO GLADYSON PONTES Relator RELATÓRIO Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MUNICÍPIO DE BEBERIBE com o objetivo de obter a reforma de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Beberibe/CE que, nos autos da Execução Fiscal ajuizada em desfavor de FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, sob o fundamento de ausência de interesse de agir, em razão do reduzido valor da execução. Em suas razões recursais (id 18771513), o Município de Beberibe aduz que a sentença recorrida, ao utilizar de fundamentos sobre os quais não havia se pronunciado anteriormente, bem como não ter conferido ao município exequente a oportunidade de manifestar-se sobre eles, violou o princípio da vedação da decisão surpresa, o que implica nulidade da sentença recorrida. Alega que a fundamentação da sentença mencionou o Tema 1184 do STF e a Resolução nº 547/2024 do CNJ, decidindo pela extinção da demanda, por suposta ausência de interesse de agir, apontando que não teve a oportunidade de manifestar-se previamente sobre os referidos fundamentos, de modo que foi surpreendido pela decisão recorrido, o que representa ofensa ao princípio do contraditório. Requer, ao final, o conhecimento e provimento do recurso, para declarar a nulidade da sentença recorrida. Sem contrarrazões recursais. Nos termos do enunciado nº 189 das súmulas do STJ ("É desnecessária a intervenção do Ministério Público nas execuções fiscais"), deixo de remeter os autos à Procuradoria de Justiça para manifestação. É o breve relatório. VOTO No caso ora em análise, verifica-se dos autos que o Município de Beberibe ajuizou Ação de Execução Fiscal para cobrança de débitos tributários, na quantia de R$ 2.213,27 (dois mil duzentos e treze reais e vinte e sete centavos), conforme CDA de id 18771351. Com efeito, o cabimento da apelação é condição de sua admissibilidade, representando verdadeira extensão, perante a segunda instância, dos pressupostos ou condições da ação. Sabe-se que a execução fiscal é regida por normas processuais específicas, o que afasta as normas gerais contidas no Código de Processo Civil. Desse modo, o art. 34, da Lei nº 6.830/80, é claro ao estabelecer que nas causas cujo valor não supere 50 (cinquenta) ORTN's, só são admitidos embargos infringentes e embargos de declaração para o próprio juízo de primeiro grau, verbis: "Art. 34 - Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinquenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração. § 1º - Para os efeitos deste artigo considerar-se-á o valor da dívida monetariamente atualizado e acrescido de multa e juros de mora e demais encargos legais, na data da distribuição." Portanto, há de se verificar o valor correspondente à época em ORTN's, sendo essa substituída pela OTN. Em julgamento no Superior Tribunal de Justiça, no REsp nº 1.168.625/MG, Rel. Min. Luiz Fux, na forma do art. 543-C do Código de Processo Civil, restou fixado que o valor de alçada, em dezembro de 2000, observado o parâmetro de 50 OTN's, equivalia a R$ 328,27 (trezentos e vinte e oito reais e vinte e sete centavos), devendo sofrer correção pelo IPCA-E, a partir de janeiro de 2001, verbis: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DE ALÇADA. CABIMENTO DE APELAÇÃO NOS CASOS EM QUE O VALOR DA CAUSA EXCEDE 50 ORTN'S. ART. 34 DA LEI N.º 6.830/80 (LEF). 50 ORTN = 50 OTN = 308,50 BTN = 308,50 UFIR = R$ 328,27, EM DEZ/2000. PRECEDENTES. CORREÇÃO PELO IPCA-E A PARTIR DE JAN/2001. 1. O recurso de apelação é cabível nas execuções fiscais nas hipóteses em que o seu valor excede, na data da propositura da ação, 50 (cinqüenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, à luz do disposto no artigo 34, da Lei n.º 6.830, de 22 de setembro de 1980. 2. A ratio essendi da norma é promover uma tramitação mais célere nas ações de execução fiscal com valores menos expressivos, admitindo-se apenas embargos infringentes e de declaração a serem conhecidos e julgados pelo juízo prolator da sentença, e vedando-se a interposição de recurso ordinário. 3. Essa Corte consolidou o sentido de que "com a extinção da ORTN, o valor de alçada deve ser encontrado a partir da interpretação da norma que extinguiu um índice e o substituiu por outro, mantendo-se a paridade das unidades de referência, sem efetuar a conversão para moeda corrente, para evitar a perda do valor aquisitivo", de sorte que "50 ORTN = 50 OTN = 308,50 BTN = 308,50 UFIR = R$ 328,27 (trezentos e vinte e oito reais e vinte e sete centavos) a partir de janeiro/2001, quando foi extinta a UFIR e desindexada a economia". (REsp 607.930/DF, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 06/04/2004, DJ 17/05/2004 p. 206). 4. Precedentes jurisprudenciais: AgRg no Ag 965.535/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 02/10/2008, DJe 06/11/2008; AgRg no Ag 952.119/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19/02/2008, DJ 28/02/2008 p. 1; REsp 602.179/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 07/03/2006, DJ 27/03/2006 p. 161. 5. Outrossim, há de se considerar que a jurisprudência do Egrégio STJ manifestou-se no sentido de que "extinta a UFIR pela Medida Provisória nº 1.973/67, de 26.10.2000, convertida na Lei 10.552/2002, o índice substitutivo utilizado para a atualização monetária dos créditos do contribuinte para com a Fazenda passa a ser o IPCA-E, divulgado pelo IBGE, na forma da resolução 242/2001 do Conselho da Justiça Federal". (REsp 761.319/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 07/03/2006, DJ 20/03/2006 p. 208) 6. A doutrina do tema corrobora esse entendimento, assentando que "tem-se utilizado o IPCA-E a partir de então pois servia de parâmetro para a fixação da UFIR. Não há como aplicar a SELIC, pois esta abrange tanto correção como juros". (PAUSEN, Leandro. ÁVILA, René Bergmann. SLIWKA, Ingrid Schroder. Direito Processual Tributário. 5.ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado editora, 2009, p. 404) 7. Dessa sorte, mutatis mutandis, adota-se como valor de alçada para o cabimento de apelação em sede de execução fiscal o valor de R$ 328,27 (trezentos e vinte e oito reais e vinte e sete centavos), corrigido pelo IPCA-E a partir de janeiro de 2001, valor esse que deve ser observado à data da propositura da execução. 8. In casu, a demanda executiva fiscal, objetivando a cobrança de R$ 720,80 (setecentos e vinte reais e oitenta centavos), foi ajuizada em dezembro de 2005. O Novo Manual de Cálculos da Justiça Federal, (disponível em), indica que o índice de correção, pelo IPCA-E, a ser adotado no período entre jan/2001 e dez/2005 é de 1,5908716293. Assim, R$ 328,27 (trezentos e vinte e oito reais e vinte e sete centavos), com a aplicação do referido índice de atualização, conclui-se que o valor de alçada para as execuções fiscais ajuizadas em dezembro/2005 era de R$ 522,24 (quinhentos e vinte e dois reais e vinte a quatro centavos), de sorte que o valor da execução ultrapassa o valor de alçada disposto no artigo 34, da Lei n.º 6.830/80, sendo cabível, a fortiori, a interposição da apelação. 9. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008." (REsp 1168625/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/06/2010, DJe 01/07/2010). Na presente hipótese, percebe-se que o valor cobrado pelo ente apelante na CDA acostada foi de R$ 2.213,27 (dois mil duzentos e treze reais e vinte e sete centavos), referente ao Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU, que devidamente atualizado até a data da propositura da ação (23/01/2019), supera o montante equivalente a 50 OTN's que correspondia, em janeiro de 2019, a R$ 998,35 (novecentos e noventa e oito reais e trinta e cinco centavos), sendo cabível, portanto, a interposição do presente recurso de apelação, conforme dispõe o art. 34 da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal). Desse modo, preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação ora interposto, passando à análise do mérito recursal. O cerne da questão controvertida consiste em analisar se houve cerceamento de defesa do ente exequente e violação ao princípio da vedação de decisão surpresa, acarretando a nulidade da sentença, em razão da utilização de fundamentos sobre os quais supostamente o autor não havia se pronunciado anteriormente. Nos termos dos arts. 9º e 10, do Código de Processo Civil, nenhum juiz, em qualquer órgão jurisdicional, poderá proferir decisão com base em fundamento que não tenha sido objeto de discussão prévia entre as partes, ainda que as matérias devam ser conhecidas de ofício pelo julgador, conforme se observa: Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. (…) Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. Sobre os referidos dispositivos, Daniel Amorim Assumpção assim leciona: Determinadas matérias e questões devem ser conhecidas de ofício, significando que, independentemente de serem levadas ao conhecimento do juiz pelas partes, elas devem ser conhecidas, enfrentadas e decididas no processo. Mas o que isso tem a ver com a ausência de oitiva das partes? Continua a ser providência de ofício o juiz levar a matéria ao processo, ouvir as partes e decidir a respeito dela. Como a surpresa das partes deve ser evitada em homenagem ao princípio do contraditório, parece que mesmo nas matérias e questões que deva conhecer de ofício o juiz deve intimar as partes para manifestação prévia antes de proferir sua decisão, conforme inclusive consagrado na legislação francesa e portuguesa. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 27). Trata-se da nova dimensão dada ao princípio do contraditório pleno no CPC, como consequência da adoção do modelo cooperativo de processo, o qual valoriza, dentre outras prerrogativas, o direito subjetivo das partes a um efetivo poder de influência no julgamento da causa, exigindo-se, para tanto, o prévio debate pelas partes, consagrando-se a regra da vedação às decisões surpresas. Por consequência, o descumprimento de tais normas acarreta a nulidade da decisão. Analisando os autos, ao contrário do que argumentou o ente recorrente, verifica-se que o magistrado de origem, antes de proferir a sentença de extinção, determinou a intimação do exequente para se manifestar sobre o enquadramento da demanda ao Tema nº 1184 do STF e à Resolução nº 547/2024, do CNJ (id 18771506). Desse modo, no presente caso, considerando que o juiz de primeiro grau apenas extinguiu a execução fiscal depois de oportunizar a prévia manifestação da parte exequente sobre a fundamentação utilizada na sentença, não há falar em cerceamento de defesa e violação do princípio da vedação à decisão surpresa. No que se refere à matéria discutida nos presentes autos, é importante ressaltar que prevalecia, até pouco tempo, o entendimento jurisprudencial fixado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 591.033-SP, sob o rito do art. 543-B do CPC de 1973, que decidiu ser vedada a extinção da execução fiscal, de ofício pelo magistrado, sob o fundamento de falta de interesse de agir por se tratar de crédito tributário de baixo valor, ementado nos seguintes termos: "TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. MUNICÍPIO. VALOR DIMINUTO. INTERESSE DE AGIR. SENTENÇA DE EXTINÇÃO ANULADA. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO AOS DEMAIS RECURSOS FUNDADOS EM IDÊNTICA CONTROVÉRSIA. 1. O Município é ente federado detentor de autonomia tributária, com competência legislativa plena tanto para a instituição do tributo, observado o art. 150, I, da Constituição, como para eventuais desonerações, nos termos do art. 150, § 6º, da Constituição. 2. As normas comuns a todas as esferas restringem-se aos princípios constitucionais tributários, às limitações ao poder de tributar e às normas gerais de direito tributário estabelecidas por lei complementar. 3. A Lei nº 4.468/84 do Estado de São Paulo - que autoriza a não-inscrição em dívida ativa e o não-ajuizamento de débitos de pequeno valor - não pode ser aplicada a Município, não servindo de fundamento para a extinção das execuções fiscais que promova, sob pena de violação à sua competência tributária. 4. Não é dado aos entes políticos valerem-se de sanções políticas contra os contribuintes inadimplentes, cabendo-lhes, isto sim, proceder ao lançamento, inscrição e cobrança judicial de seus créditos, de modo que o interesse processual para o ajuizamento de execução está presente. 5. Negar ao Município a possibilidade de executar seus créditos de pequeno valor sob o fundamento da falta de interesse econômico viola o direito de acesso à justiça. 6. Sentença de extinção anulada. 7. Orientação a ser aplicada aos recursos idênticos, conforme o disposto no art. 543-B, § 3º, do CPC." (RE 591033, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 17/11/2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-038 DIVULG 24-02-2011 PUBLIC 25-02-2011 EMENT VOL-02471-01 PP-00175)." A matéria, inclusive, é objeto do enunciado de súmula nº 452 do STJ, segundo a qual dispõe que "a extinção das ações de pequeno valor é faculdade da Administração Federal, vedada a atuação judicial de ofício". Entretanto, considerando o elevado número de ações de execução fiscal de pequeno valor em tramitação no Poder Judiciário, que se processam por longos períodos e, em muitos casos, não obtêm o resultado prático pretendido, comprometendo a eficiência da prestação jurisdicional e onerando em excesso os cofres públicos, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 1.355.208, submetido ao regime de repercussão geral (Tema nº 1184), que trata da possibilidade de extinção de execução fiscal de baixo valor por ausência de interesse de agir, fixou nova tese aplicável à matéria, nos seguintes termos: 1. É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado. 2. O ajuizamento da execução fiscal dependerá da prévia adoção das seguintes providências: a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida. 3. O trâmite de ações de execução fiscal não impede os entes federados de pedirem a suspensão do processo para a adoção das medidas previstas no item 2, devendo, nesse caso, o juiz ser comunicado do prazo para as providências cabíveis. Eis a ementa do referido precedente: EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. EXTINÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL DE BAIXO VALOR POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR: POSTERIOR AO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 591.033 (TEMA N. 109). INEXISTÊNCIA DE DESOBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS FEDERATIVO E DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. FUNDAMENTOS EXPOSTOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA TESE DO TEMA N. 109 DA REPERCUSSÃO GERAL: INAPLICABILIDADE PELA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA QUE POSSIBILITOU PROTESTO DAS CERTIDÕES DA DÍVIDA ATIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Ao se extinguir a execução fiscal de pequeno valor com base em legislação de ente federado diverso do exequente, mas com fundamento em súmula do Tribunal catarinense e do Conselho da Magistratura de Santa Catarina e na alteração legislativa que possibilitou protesto de certidões da dívida ativa, respeitou-se o princípio da eficiência administrativa. 2. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem nortear as práticas administrativas e financeiras na busca do atendimento do interesse público. Gastos de recursos públicos vultosos para obtenção de cobranças de pequeno valor são desproporcionais e sem razão jurídica válida. 3. O acolhimento de outros meios de satisfação de créditos do ente público é previsto na legislação vigente, podendo a pessoa federada valer-se de meios administrativos para obter a satisfação do que lhe é devido. 4. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento com proposta da seguinte tese com repercussão geral: "É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor, pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio da eficiência administrativa". (RE 1355208, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 19-12-2023, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n DIVULG 01-04-2024 PUBLIC 02-04-2024) Nos termos do julgamento do RE nº 1.355.208, é possível observar que o STF, considerando modificação legislativa posterior ao julgamento do RE nº 591.033 (Tema 109), que, com fundamento na Lei nº 12.767/2012, incluiu as certidões de dívida ativa entre os títulos sujeitos a protesto, e, ainda, levando em consideração a desproporção dos custos de prosseguimento da ação judicial à luz dos princípios da inafastabilidade da jurisdição, da separação dos poderes, da autonomia dos entes federados e da eficiência administrativa, entendeu por bem legitimar a extinção de processo executivo fiscal de baixo valor, ante a ausência de interesse de agir. Por sua vez, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ, considerando o disposto no Tema nº 1184, editou a Resolução nº 547, de 22 de fevereiro de 2024, que "institui medidas de tratamento racional e eficiente na tramitação das execuções fiscais pendentes no Poder Judiciário, a partir do julgamento do tema 1184 da repercussão geral pelo STF", nos seguintes termos: Art. 1º É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado. § 1º Deverão ser extintas as execuções fiscais de valor inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) quando do ajuizamento, em que não haja movimentação útil há mais de um ano sem citação do executado ou, ainda que citado, não tenham sido localizados bens penhoráveis. § 2º Para aferição do valor previsto no § 1º, em cada caso concreto, deverão ser somados os valores de execuções que estejam apensadas e propostas em face do mesmo executado. § 3º O disposto no § 1º não impede nova propositura da execução fiscal se forem encontrados bens do executado, desde que não consumada a prescrição. § 4º Na hipótese do § 3º, o prazo prescricional para nova propositura terá como termo inicial um ano após a data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no primeiro ajuizamento. § 5º A Fazenda Pública poderá requerer nos autos a não aplicação, por até 90 (noventa) dias, do § 1º deste artigo, caso demonstre que, dentro desse prazo, poderá localizar bens do devedor. Art. 2º O ajuizamento de execução fiscal dependerá de prévia tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa. § 1º A tentativa de conciliação pode ser satisfeita, exemplificativamente, pela existência de lei geral de parcelamento ou oferecimento de algum tipo de vantagem na via administrativa, como redução ou extinção de juros ou multas, ou oportunidade concreta de transação na qual o executado, em tese, se enquadre. § 2º A notificação do executado para pagamento antes do ajuizamento da execução fiscal configura adoção de solução administrativa. § 3º Presume-se cumprido o disposto nos §§ 1º e 2º quando a providência estiver prevista em ato normativo do ente exequente. Art. 3º O ajuizamento da execução fiscal dependerá, ainda, de prévio protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida. Parágrafo único. Pode ser dispensada a exigência do protesto nas seguintes hipóteses, sem prejuízo de outras, conforme análise do juiz no caso concreto: I - comunicação da inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres (Lei nº 10.522/2002, art. 20-B, § 3º, I); II - existência da averbação, inclusive por meio eletrônico, da certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora (Lei nº 10.522/2002, art. 20-B, § 3º, II); ou III - indicação, no ato de ajuizamento da execução fiscal, de bens ou direitos penhoráveis de titularidade do executado. Da leitura dos trechos acima transcritos, verifica-se que a Resolução nº 547/2024, do CNJ, considerou legítima e possível a extinção de execução fiscal quando o valor executado for abaixo de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em que não haja movimentação útil há mais de 01 (um) ano, sem citação do executado ou, ainda que citado, sem localização de bens penhoráveis (art. 1º, § 1º). Ademais, o Tema nº 1184 estabeleceu a necessidade de adoção de prévias providências administrativas no momento do ajuizamento da execução fiscal (tese nº 2), de modo que são exigíveis nas ações protocoladas após o julgamento do RE nº 1.355.208, em 19/12/2023. Conclui-se do panorama acima exposto que para a extinção das execuções fiscais, além do baixo valor executado, deve ser observada a ausência de movimentação útil por mais de um ano nos casos em que a citação não se efetivou ou em que não tenham sido localizados bens penhoráveis da parte executada mesmo quando houver regular citação, bem como a necessidade de demonstração da adoção prévia de providências administrativas aptas à cobrança do débito. Entretanto, observando a cronologia dos atos processuais praticados, é possível verificar que, após a interposição da ação de execução fiscal, em 23/01/2019, não há nos autos a comprovação da efetiva citação da parte executada, conforme inúmeras certidões informando o descumprimento injustificado da diligência por parte da Central de Mandados (id 18771365, 18771368, 18771370, 18771375, 18771382, 18771384, 18771386, 18771493 e 18771494). Ademais, não obstante a ausência de citação da parte executada por mandado, não houve a tentativa de citação pelas demais modalidades previstas na Lei nº 6.830/80, apesar da indicação do endereço do devedor e a manifestação do exequente acerca do prosseguimento da demanda (id 18771389), não se podendo concluir, portanto, em ausência de movimentação útil do processo por mais de um ano. Nesse contexto, constata-se que o exequente, no curso da ação executiva, se mostrou diligente em adotar as medidas para localizar o executado, a fim de esgotar as tentativas de citação pessoal, não podendo ser atribuído a ele o insucesso na citação do devedor. Desse modo, analisando o presente caso, constata-se que não houve o preenchimento dos requisitos fixados pelo Tema 1184 e pela Resolução nº 547/2024 do CNJ para a extinção da execução fiscal por ausência de interesse, na medida em que, embora o valor cobrado seja inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), o executado sequer foi citado ou se utilizou das demais modalidades de citação previstas na Lei nº 6.830/80, bem como o Juízo de primeiro grau chegou a iniciar a constrição de bens do devedor, não restando configurada, portanto, a ausência de movimentação útil por mais de um ano. Dessa forma, não há falar em ausência de interesse de agir do Município de Beberibe, a justificar a extinção da presente execução fiscal, uma vez que não foi observado o disposto no Tema 1184, do STF, conjuntamente com a regulamentação estabelecida pela Resolução nº 547/2024 do CNJ, permanecendo o interesse da municipalidade na busca da satisfação de seus créditos tributários. Em caso similar, esse egrégio Tribunal de Justiça se manifestou no mesmo sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EXTINÇÃO SEM EXAME DO MÉRITO - AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. BAIXO VALOR DO CRÉDITO EXEQUENDO. TEMA Nº 1.184, STF E ART. 1º, §1º, DA RESOLUÇÃO Nº 547/2024, CNJ. ERROR IN PROCEDENDO DO JULGADOR. INEXISTÊNCIA DO REQUISITO DE "AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO ÚTIL POR MAIS DE UM ANO". PERMANÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR DO EXEQUENTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. (APELAÇÃO CÍVEL - 00511333120218060090, Relator(a): JORIZA MAGALHAES PINHEIRO, 3ª Câmara de Direito Público, Data do julgamento: 10/07/2024) Ante o exposto, CONHEÇO da Apelação, para DAR-LHE PROVIMENTO, anulando a sentença recorrida e determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para o regular prosseguimento da execução fiscal. É como voto. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. FRANCISCO GLADYSON PONTES Relator A-5
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