Processo nº 5177297-50.2025.8.09.0051
ID: 291881878
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 5ª UPJ Varas Cíveis: 12ª, 20ª, 21ª, 22ª, 23ª e 25ª
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5177297-50.2025.8.09.0051
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
OSMANY DE OLIVEIRA FERREIRA
OAB/GO XXXXXX
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Poder JudiciárioComarca de GoiâniaGabinete do Juiz da 21ª Vara CívelTelejudiciario (62) 3216-2070, Fórum Cível: 62-3018-6000, 5ª UPJ das Varas Cíveis (62) 3018-6456 e (62) 3018-6457, WhatsApp 5ª UPJ…
Poder JudiciárioComarca de GoiâniaGabinete do Juiz da 21ª Vara CívelTelejudiciario (62) 3216-2070, Fórum Cível: 62-3018-6000, 5ª UPJ das Varas Cíveis (62) 3018-6456 e (62) 3018-6457, WhatsApp 5ª UPJ: (62) 3018-6455E-mail 5ª UPJ: 5upj.civelgyn@tjgo.jus.br, Gabinete Virtual: gab21varacivel@tjgo.jus.br, WhatsApp Gabinete 21ª: (62) 3018-6472Endereço: (Edificio Forum Civel) Avenida Olinda, Esquina com Rua PL-03, Qd. G, Lt. 04, Park Lozandes, Cep: 74.884-120 - Goiânia - GOSENTENÇAProcesso nº 5177297-50.2025.8.09.0051 Trata-se de ação de conhecimento ajuizada por MARIA DE FÁTIMA VIEIRA DA SILVA em face de BANCO MASTER S/A, ambos devidamente qualificados nos autos.Narra a parte autora que foi vítima do denominado "golpe do falso boleto" no período compreendido entre julho e dezembro de 2024. Segundo relata, recebeu mensagens via aplicativo WhatsApp de pessoa que se identificou como atendente virtual do banco requerido, ofertando desconto para quitação de empréstimo consignado em folha de pagamento denominado "CARTÃO BENEFÍCIO CREDCESTA", no valor total de R$ 1.023,15.Aduz que não percebeu inicialmente que se tratava de golpe, uma vez que as informações e tratativas para acordo de quitação da dívida eram condizentes com o relacionamento mantido com o banco requerido. Ressalta que, nas conversas por meio do aplicativo de mensagens, a suposta "golpista" demonstrava conhecimento de informações sigilosas que somente o banco requerido possuiria, tais como: a existência de um contrato de cartão de crédito pessoal consignado, denominação de descontos "CREDCESTA" em folha de pagamento, valores e outros detalhes específicos.Alega que, acreditando ser um acordo vantajoso, aceitou a proposta e efetuou o pagamento do valor de R$ 1.023,15 para quitar a dívida. Posteriormente, ao entrar em contato com o banco, teve ciência de que havia sido vítima de golpe.Diante do ocorrido, a autora afirma ter procurado auxílio junto ao PROCON Estadual, onde registrou reclamação, e também fez registro de ocorrência policial em 15/01/2025. Na reclamação junto ao PROCON, a autora teria informado que, no ato da contratação do serviço, não lhe foi entregue a via do contrato assinado, o que dificultou sua capacidade de verificar a legitimidade da transação.Sustenta que o banco requerido foi negligente na proteção de seus dados sigilosos, permitindo que terceiros tivessem acesso a informações sensíveis sobre seu contrato, o que viabilizou a ocorrência da fraude. Invoca a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, particularmente o artigo 14, e da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018), para fundamentar a responsabilidade objetiva do banco.Com base nesses argumentos, a parte autora requer: a) a concessão da assistência judiciária gratuita; b) a inversão do ônus da prova em seu favor; c) a dispensa da audiência de autocomposição; d) ao final, a procedência total dos pedidos, com a condenação do banco requerido ao pagamento de R$ 1.023,15 a título de danos materiais, e R$ 50.000,00 a título de danos morais.À inicial foram juntados documentos, incluindo prints de conversas por WhatsApp, reclamação junto ao PROCON, boletim de ocorrência policial e contracheques.Em decisão inicial (evento 6), este Juízo deferiu o pedido de gratuidade da justiça, determinou a citação da parte requerida e designou audiência de conciliação.O requerido foi devidamente citado e, antes da audiência de conciliação, apresentou contestação (evento 15). Em sua defesa, o banco sustenta preliminarmente: a) falta de interesse processual da autora; b) impugnação ao deferimento da assistência judiciária gratuita.No mérito, o requerido nega qualquer irregularidade na contratação, afirmando que a autora efetivamente contratou o cartão de benefício CREDCESTA e o serviço adicional de saque, com autenticação por selfie e assinatura digital. Apresenta documentos que comprovariam a contratação legítima, incluindo termo de adesão, termo de consentimento esclarecido, contrato digital assinado e comprovante de transferência bancária.O banco requerido esclarece que o "Saque Fácil" é uma linha de crédito disponibilizada ao servidor público ou pensionista por meio do cartão de benefício CREDCESTA, com a respectiva contraprestação consignada em folha de pagamento. Afirma que no caso em questão, foi contratado um saque no valor de R$ 1.710,10, a ser pago em 96 parcelas de R$ 103,37 cada, conforme cédula de crédito bancário assinada pela autora.Argumenta que tomou todas as cautelas necessárias para a contratação, solicitando documentação e utilizando assinatura eletrônica avançada, com vinculação da identidade da usuária via biometria facial. Alega que os descontos em folha estão dentro do limite legal previsto pelo Decreto nº 3.316/2021 e pela Lei Complementar nº 348/2022 do Município de Goiânia.Subsidiariamente, caso o juízo entenda que houve fraude, o banco invoca excludente de responsabilidade civil por culpa exclusiva de terceiros, nos termos do art. 14, § 3º, II, do CDC. Alega que, nessa hipótese, tanto a autora quanto o banco seriam vítimas da fraude, não cabendo responsabilização do requerido.Ainda, sustenta que a autora incorreu em comportamento contraditório (venire contra factum proprium) ao propor a presente ação, uma vez que teria contratado os serviços, recebido o valor em sua conta e agora busca se eximir do pagamento das parcelas.Por fim, nega a ocorrência de dano moral e material indenizável e argumenta que eventual acolhimento do pedido da autora configuraria enriquecimento sem causa, já que esta teria recebido o valor do saque e agora pretende se furtar ao pagamento.A audiência de conciliação foi realizada em 06/05/2025 (evento 17), sem êxito na composição entre as partes.Em 20/05/2025 (evento 24), a parte autora apresentou impugnação à contestação, reiterando os argumentos da inicial e rebatendo os pontos apresentados pelo requerido. Invoca a Súmula 479 do STJ, que estabelece a responsabilidade objetiva das instituições financeiras por danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes praticadas por terceiros. Insiste na manutenção da gratuidade da justiça.Em 23/05/2025 (evento 25), o banco requerido manifestou desinteresse na produção de novas provas, requerendo o julgamento antecipado da lide, considerando suficiente a prova documental já produzida.Decido:Quanto aos requisitos processuais:Para Humberto Theodoro Júnior (1997, p. 58) Os pressupostos processuais são exigências legais sem cujo atendimento o processo, como relação jurídica, não se estabelece ou não se desenvolve validamente. (...). São, em suma, requisitos jurídicos para a validade e eficácia da relação processual.Para esse eminente doutrinador, os pressupostos processuais são de existência (requisitos para que a relação processual se constitua validamente) e de desenvolvimento (aqueles a serem atendidos, depois que o processo se estabeleceu regularmente, a fim de que possa ter curso também regular, até sentença de mérito ou a providência jurisdicional definitiva). (In: Curso de direito processual civil, vol. 1, 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997).No caso vertente, a presenta ação foi corretamente ajuizada perante autoridade judicial competente.A citação foi correta e atempadamente efetivada.Não se vislumbra aqui a ocorrência de litispendência ou coisa julgada.Reza o artigo 337, § 1º, do CPC: Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.O parágrafo 3.º deste mesmo artigo complementa ao dizer: Há litispendência quando se repete ação que está em curso, já o parágrafo quarto diz: Há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.A melhor doutrina e jurisprudência apontam três elementos essenciais e fundamentais da litispendência: a) as mesmas partes; b) a mesma causa de pedir; c) o mesmo pedido.Não é o caso dos autos, posto que não restou aqui evidenciado o ajuizamento de duas ou mais ações com a mesma causa de pedir.E é por isso também que também não se evidencia a ocorrência de coisa julgada, porquanto não se repete aqui ação que já foi decidida por sentença de que não caiba recurso (§ 4º, art. 337, CPC).Quanto às condições da ação:O fenômeno da carência de ação nada tem a ver com a existência do direito subjetivo afirmado pelo autor, nem com a possível inexistência dos requisitos, ou pressupostos, da constituição da relação processual. É situação que diz respeito apenas ao exercício do direito de ação e que pressupõe autonomia desse direito. (Nesse sentido: Ada Pellegrini Grinover, in “As condições da ação penal” 1ª ed., 1977, n.º 16, p. 29).Por sua vez, o eminente jurista Humberto Theodoro Júnior, em sua festejada obra: Curso de Direito Processual Civil, 9a. ed., vol. I, ensina que as condições da ação são verdadeiras questões prejudiciais de ordem processual e que, por isso mesmo, não se pode confundir com o mérito da causa, já que nada têm a ver com a justiça ou injustiça do pedido ou com a existência ou inexistência do direito controvertido entre os litigantes. Grifei.Em nosso sistema processual o interesse de agir é indispensável para qualquer postulação em juízo. Dispõe o artigo 17 do CPC: Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade.Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático. (Código de Processo Civil Anotado. Nelson Nery Júnior e Rosa Maria A. Nery, RT, 1996, pg. 672).O interesse de agir, portanto, provém da necessidade de a parte obter um pronunciamento jurisdicional a respeito da res iudicio deducta e da utilidade que o decreto jurisdicional proporciona ao autor, como ser dotado de eficácia para solver o conflito de interesses.Dessa forma haverá interesse sempre que o indivíduo invocar a prestação de tutela jurisdicional do Estado tendente à solução de litígio, se utilizando, para isso, de provimento jurisdicional eficaz.A presente ação é meio adequado para dirimir o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida pela parte requerida.Presente, portanto, o interesse processual na modalidade necessidade/adequação.O pedido não é juridicamente vedado.A legitimidade ad causam ativa se afere pela causa de pedir, configurando-se quando se alega na inicial direito atribuído à pessoa que pede em desfavor do suposto causador do dano.Presente a legitimidade passiva.Presentes, pois, a interesse processual e a legitimidade de partes, questões processuais estas que, conforme acima alinhavado, não se confundem com o mérito dos pedidos exordiais.Quanto à petição inicial:Como ocorrente no caso dos autos, não se evidencia inepta a petição inicial quando se descortina coerência entre os argumentos deduzidos como causa de pedir e a pretensão finalmente formulada, evidenciado, de forma suficiente, o encadeamento lógico entre os fatos elencados e os fundamentos jurídicos alegados, de modo a permitir o pleno exercício do direito de ação e de defesa.Ademais, não se confundem, à luz da melhor técnica processual, questionamentos prefaciais, afetos às condições da ação e aos pressupostos processuais, com alegações de falta de provas dos fatos constitutivos, matéria, por óbvio, voltada ao cerne meritório e de procedência da pretensão autoral. Nesse sentido: 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, 2014 03 1 003061-3 ACJ (0003061-97.2014.8.07.0003 - Res.65 – CNJ) DF, rel. Juiz LUIS MARTIUS HOLANDA BEZERRA JUNIOR 12/08/2014, Publicado no DJE: 14/08/2014. Pág.: 236).Quanto à impugnação a concessão da gratuidade da justiça:O banco requerido também impugnou a concessão da assistência judiciária gratuita à autora, alegando que esta, na condição de servidora pública municipal, aufere renda mensal de forma contínua e estável, tendo condições de arcar com as custas processuais, ainda que de forma parcelada.No entanto, a impugnação não prospera. Conforme já analisado na decisão inicial (evento 6), os documentos apresentados pela autora, especialmente seus contracheques, demonstram que ela percebe remuneração líquida pouco superior a R$ 2.000,00, com diversos descontos, e que o valor das custas processuais (R$ 3.381,86) comprometeria significativamente seu sustento e de sua família.Ademais, como bem apontado pela autora em sua impugnação, o ônus de provar a ausência dos requisitos legais para a concessão do benefício pertence ao impugnante, ônus do qual o banco requerido não se desincumbiu. Não foram apresentadas provas robustas que indicassem a capacidade financeira da autora para arcar com as despesas processuais sem prejuízo de seu sustento.Portanto, mantenho o benefício da gratuidade da justiça concedido à parte autora.Quanto ao mérito:As questões trazidas à baila se inserem nas relações de consumo e como tal deve receber o tratamento previsto no Código de Defesa do Consumidor, posto que, consoante o art. 17 do CDC, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.A controvérsia central do presente caso reside em determinar: (i) se a autora efetivamente contratou o Saque Fácil pelo cartão de benefício CREDCESTA junto ao banco requerido, ou se foi vítima do denominado "golpe do falso boleto"; (ii) em caso de fraude, se o banco requerido tem responsabilidade pelos danos sofridos pela autora. A autora alega ter sido vítima de golpe, em que terceiros, passando-se por funcionários do banco requerido, obtiveram indevidamente informações sobre sua relação contratual com o banco e a induziram a pagar um boleto fraudulento para suposta quitação de empréstimo consignado. Alega que o pagamento no valor de R$ 1.023,15 foi feito a terceiros, não tendo sido considerado pelo banco para quitação de sua dívida.O banco requerido, por sua vez, sustenta que a autora efetivamente contratou o Saque Fácil por meio do cartão de benefício CREDCESTA, apresentando como prova documentos digitais assinados eletronicamente pela autora, incluindo termo de adesão, termo de consentimento e cédula de crédito bancário. Afirma ainda que o valor de R$ 1.710,10 foi depositado na conta da autora, conforme comprovante de transferência juntado aos autos.A contratação digital apresentada pelo banco requerido foi realizada com diversas medidas de segurança, incluindo autenticação por selfie e assinatura digital, o que torna improvável a alegação de que terceiros tenham se passado pela autora no momento da contratação. Ademais, a geolocalização registrada no momento da contratação indica que esta foi realizada a apenas dois minutos de distância da residência da autora, conforme demonstrado pelo banco.Mais significativo ainda é o fato de que o valor contratado (R$ 1.710,10) foi efetivamente depositado na conta bancária da autora, conforme comprovante de transferência e extrato bancário juntados aos autos. Esse elemento é particularmente relevante, pois seria improvável que fraudadores depositassem valores na conta da vítima após obter acesso a seus dadosA autora, por sua vez, centra sua argumentação no suposto "golpe do falso boleto", apresentando prints de conversas por WhatsApp com pessoa que se identificava como atendente do banco requerido, oferecendo desconto para quitação de empréstimo. No entanto, não demonstrou de forma clara a relação entre esse suposto golpe e a contratação do Saque Fácil comprovada pelo banco requerido.De fato, os elementos apresentados sugerem situações distintas: por um lado, a contratação legítima de Saque Fácil junto ao banco requerido, comprovada por documentação robusta; por outro lado, uma possível abordagem fraudulenta por terceiros via WhatsApp, que pode ter induzido a autora a realizar pagamento indevido, mas que não descaracteriza a contratação original.Outrossim, verifica-se que o fraudador enviou mensagem para a parte autora e se passou por um dos funcionários da agência, tudo a fazer crer que era, realmente, um preposto do requerido. Ainda que tenha havido ato de terceiro e a vítima tenha sido incauta e ingênua ao cair no golpe, o art. 14, § 3º, do CDC exige culpa exclusiva do terceiro ou da vítima para afastar a responsabilidade do fornecedor, o que não ocorre no presente caso, pois o fraudador utilizou número telefônico da agência do banco requerido e ainda dispunha de dados sigilosos da conta bancária da autora. Com efeito, em situações como a narrada nos autos, a fraude tem um elemento essencial, que consiste na apropriação de informações bancárias e, portanto, sigilosas, pertencentes ao consumidor e cuja guarda é de exclusiva responsabilidade da instituição financeira.Nesse contexto, parece inequívoco que, se terceiros conseguem ter acesso a tais informações e, com base nelas, convencer o consumidor a realizar a contratação do empréstimo e transferência realizada, existe uma falha na segurança dos dados armazenados pelas instituições financeiras.Não se deslembre que o fato de terceiro não elide a responsabilidade objetiva do fornecedor, que responde pela rubrica do "fato do serviço" (faute du service, segundo a doutrina francesa, na qual se hauriu parte do ethos do CDC).Certamente, fato exclusivo de terceiro é fator obstante do nexo de causalidade, constituindo uma das excludentes da responsabilidade civil consumerista. Não menos certo porém, é que esse terceiro deve ser pessoa estranha à relação jurídica estabelecida. Se houver qualquer pressuposição entre tal terceiro e o fornecedor ou prestador, o último responde. Terceiro que, mesmo que de forma fraudulenta, integra a corrente produtiva, não é terceiro.Em sendo assim, resta evidente que de nada serve à empresa alegar que “é tão vítima quanto o consumidor”, por ter sido alvo de fraude de terceiro. Nessas hipóteses, os fatos costumam apontar para uma mistura de desídia (negligência no cruzamento de dados) e ganância (escopo exagerado de lucro imediato e isento de ônus), por parte desses estabelecimentos, cabendo-lhes o ônus de provar o contrário da conclusão que emana dessa presunção juris et de jure. Nesse sentido: (Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, rel. Juiz JOSÉ GUILHERME, julgado em 02/06/2009, DJ 21/07/2009 p. 100).Nesse sentido, a jurisprudência:CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS. DEVER DE SEGURANÇA. FRAUDE PERPETRADA POR TERCEIRO. CONTRATAÇÃO DE MÚTUO. MOVIMENTAÇÕES ATÍPICAS E ALHEIAS AO PADRÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.1. Ação declaratória de inexistência de débitos, ajuizada em 14/8/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 21/6/2022 e concluso ao gabinete em 17/2/2023.2. O propósito recursal consiste em decidir (I) se a instituição financeira responde objetivamente por falha na prestação de serviços bancários, consistente na contratação de empréstimo realizada por estelionatário; e (II) se possui o dever de identificar e impedir movimentações financeiras que destoam do perfil do consumidor.3. O dever de segurança é noção que abrange tanto a integridade psicofísica do consumidor, quanto sua integridade patrimonial, sendo dever da instituição financeira verificar a regularidade e a idoneidade das transações realizadas pelos consumidores, desenvolvendo mecanismos capazes de dificultar fraudes perpetradas por terceiros, independentemente de qualquer ato dos consumidores.4. A instituição financeira, ao possibilitar a contratação de serviços de maneira facilitada, por intermédio de redes sociais e aplicativos, tem o dever de desenvolver mecanismos de segurança que identifiquem e obstem movimentações que destoam do perfil do consumidor, notadamente em relação a valores, frequência e objeto.5. Como consequência, a ausência de procedimentos de verificação e aprovação para transações atípicas e que aparentam ilegalidade corresponde a defeito na prestação de serviço, capaz de gerar a responsabilidade objetiva por parte da instituição financeira.6. Entendimento em conformidade com Tema Repetitivo 466/STJ e Súmula 479/STJ: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".7. Idêntica lógica se aplica à hipótese em que o falsário, passando-se por funcionário da instituição financeira e após ter instruído o consumidor a aumentar o limite de suas transações, contrata mútuo com o banco e, na mesma data, vale-se do alto montante contratado e dos demais valores em conta corrente para quitar obrigações relacionadas, majoritariamente, a débitos fiscais de ente federativo diverso daquele em que domiciliado o consumidor.8. Na hipótese, inclusive, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa (75 anos - imigrante digital), razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável.9. Recurso especial conhecido e provido para declarar a inexigibilidade das transações bancárias não reconhecidas pelos consumidores e condenar o recorrido a restituir o montante previamente existente em conta bancária, devidamente atualizado.(REsp n. 2.052.228/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/9/2023, DJe de 15/9/2023.)PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITOS POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONSUMIDOR. GOLPE DO MOTOBOY. RESPONSABILIDADE CIVIL. USO DE CARTÃO E SENHA. DEVER DE SEGURANÇA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DANOS MORAIS. CONFIGURADOS. 1. Ação declaratória de inexigibilidade de débitos cumulada com indenização por danos morais e materiais, ajuizada em 05/11/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 31/01/2022 e concluso ao gabinete em 14/12/2022.2. O propósito recursal consiste em decidir se, quando o correntista é vítima do golpe do motoboy, (I) o banco responde objetivamente pela falha na prestação do serviço bancário e se (II) é cabível a indenização por danos morais.3. Se comprovada a hipótese de vazamento de dados por culpa da instituição financeira, será dela, em regra, a responsabilidade pela reparação integral de eventuais danos. Do contrário, naquilo que entende esta Terceira Turma, inexistindo elementos objetivos que comprovem esse nexo causal, não há que se falar em responsabilidade das instituições financeiras pelo vazamento de dados utilizados por estelionatários para a aplicação de golpes de engenharia social.4. O cartão magnético e a respectiva senha são de uso exclusivo do correntista, que deve tomar as devidas cautelas para impedir que terceiros tenham acesso a eles. Se as transações contestadas forem feitas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros. Precedentes 5. Nos termos da jurisprudência deste STJ, cabe às administradoras, em parceria com o restante da cadeia de fornecedores do serviço (proprietárias das bandeiras, adquirentes e estabelecimentos comerciais), a verificação da idoneidade das compras realizadas com cartões magnéticos, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido roubo ou furto.6. O dever de adotar mecanismos que obstem operações totalmente atípicas em relação ao padrão de consumo dos consumidores enseja a responsabilidade do prestador de serviços, que responderá pelo risco da atividade, pois a instituição financeira precisa se precaver a fim de evitar golpes desta natureza, cada vez mais frequentes no país.7. Quando se trata de responsabilidade objetiva, a possibilidade de redução do montante indenizatório em face do grau de culpa do agente deve ser interpretada restritivamente, devendo ser admitida apenas naquelas hipóteses em que o agente, por meio de sua conduta, assume e potencializa, conscientemente, o risco de vir a sofrer danos ao contratar um serviço que seja perigoso.8. Não é razoável afirmar que o consumidor assumiu conscientemente um risco ao digitar a senha pessoal no teclado de seu telefone depois de ouvir a confirmação de todos os seus dados pessoais e ao destruir parcialmente o seu cartão antes de entregá-lo a terceiro que dizia ser preposto do banco, porquanto agiu em razão da expectativa de confiança que detinha nos sistemas de segurança da instituição financeira.9. Entende a Terceira Turma deste STJ que o banco deve responder objetivamente pelo dano sofrido pelas vítimas do golpe do motoboy quando restar demonstrada a falha de sua prestação de serviço, por ter admitido transações que fogem do padrão de consumo do correntista.10. Se demonstrada a existência de falha na prestação do serviço bancário, mesmo que causada por terceiro, e afastada a hipótese de culpa exclusiva da vítima, cabível a indenização por dano extrapatrimonial, fruto da exposição sofrida em nível excedente ao socialmente tolerável.11. Recurso especial conhecido e provido.(REsp n. 2.015.732/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023.) Portanto, é forçoso reconhecer que a fraude decorreu do fato atribuível à própria instituição credora, pois o terceiro estelionatário possuía todos os dados da cliente, de modo que o contexto dificultou a percepção da fraude. Quanto ao dano material:Quanto aos danos materiais, a autora pleiteia o ressarcimento do valor de R$ 1.023,15, correspondente ao pagamento realizado ao suposto golpista.Comprovado o nexo causal entre a falha na proteção de dados pelo banco requerido e o dano patrimonial sofrido pela autora, impõe-se o dever de ressarcimento integral desse valor, corrigido monetariamente desde a data do efetivo desembolso, conforme pedido na inicial.Quanto ao dano moral:Ver a demora da solução do imbróglio, sem qualquer perspectiva de solução por parte do réu não se me antolha mero aborrecimento e sim ato e conduta hábeis a afetar a sua tranquilidade psíquica ao ponto de gerar-lhe danos morais.Nesse sentido:EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - GOLPE DO FALSO MOTOBOY - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - DANO MORAL - CONFIGURADO. Em se tratando de ação indenizatória por serviço defeituoso, o fornecedor responde pelas falhas na prestação de serviços, que resultarem em danos ao consumidor, independentemente da demonstração de culpa, pois sua responsabilidade é objetiva. Assim, a instituição financeira e a administradora do cartão de crédito respondem solidariamente pelos danos decorrentes de terceiro fraudador, que obtém informações sigilosas do correntista e se passa por funcionário de banco para aplicar o conhecido "golpe do motoboy".(TJ-MG - AC: 10000212737290001 MG, Relator: José Augusto Lourenço dos Santos, Data de Julgamento: 12/05/2022, Câmaras Cíveis / 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 13/05/2022)AÇÃO DECLARATÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA. FRAUDE. GOLPE DO MOTOBOY. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. VIOLAÇÃO DE DADOS DA CONSUMIDORA QUE VIABILIZOU O GOLPE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 479 DO STJ. FALHA NO SETOR DE FRAUDE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DÍVIDA INEXIGÍVEL. DANOS MORAIS RECONHECIDOS. Primeiro, reconheço a falha na prestação dos serviços pelo réu. Importante registrar que o golpe somente foi possível por conta do acesso do fraudador aos dados pessoais e bancários (no mínimo o telefone da autora e a existência de conta no Banco Itaú). Esse ponto demonstrou o acesso daquele terceiro a dados do sistema interno da instituição financeira. O perfil das compras mostrou-se suspeito, na medida que elas foram feitas em um mesmo dia em valores semelhantes (R$ 999,34 e R$ 999,68 em 3 parcelas) completamente fora do padrão de gastos da autora, conforme fatura do seu cartão de crédito (fl. 24). Falha no serviço de segurança reconhecida. Ademais, competia ao banco réu provar a culposa ou dolosa participação da consumidora para cessão deliberada daquela senha (culpa exclusiva). Fortuito interno caracterizado pelo acesso indevido de terceiro às informações da autora e movimentações dos seus cartões de crédito, condição para sucesso da iniciativa da fraude. Súmula 479 do STJ. Responsabilidade do réu pelo fato do serviço. E segundo, reconheço a ocorrência de dano moral. A consumidora experimentou dissabores, transtornos e aborrecimentos advindos não somente da falta de segurança do sistema bancário, mas também do atendimento inadequado recebido. Mesmo em Juízo, somente houve atendimento à demanda da consumidora após a prolação da r. sentença, insistindo-se numa versão (sem qualquer indício) de sua participação no evento danoso. Indenização dos danos morais fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), parâmetro este razoável e admitido por esta Turma julgadora em casos semelhantes. A quantia atenderá as funções compensatória (principal) e inibitória (secundária), concretizando-se o direito básico do consumidor. Ação julgada procedente em segundo grau. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.(TJ-SP - AC: 10023762920208260296 SP 1002376-29.2020.8.26.0296, Relator: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 22/08/2022, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/08/2022)A indenização por danos morais, em casos que tais, se justifica em face da desnecessária “via crucis” a que se submeteu o consumidor, apta a gerar ansiedade e desconforto psicológico atípicos, que ultrapassam os limites do mero dissabor ou aborrecimento, posto que submetido pelas partes requeridas a situação de extremo desgaste e estresse.Para a sua reparação, ensina Roberto de Ruggiero, basta a perturbação feita pelo ato ilícito nas relações psíquicas, na tranquilidade dos sentidos, nos afetos de uma pessoa, para reproduzir uma diminuição no gozo do respectivo direito ...(In Instituições de Direito Civil, tradução 6ª ed. Italiana, do Dr. Ary dos Santos, ed. Saraiva, 1937).Segundo respeitável doutrina pretoriana, a qual me perfilho, o dano simplesmente moral, sem repercussão no patrimônio, não há como ser comprovado. Ele existe tão somente pela ofensa, e dele é presumido, sendo o bastante para justificar a indenização. (Nesse sentido: RT 681/163 e RDP 185/198).De se ver, portanto, que não há se falar em ausência dos pressupostos do dever de indenizar.Quanto ao valor da indenização:Consoante ao autorizado magistério de Rui Stoco, ao qual me perfilho, a indenização da dor moral há de buscar duplo objetivo: (...) Condenar o agente causador do dano ao pagamento de certa importância em dinheiro, de modo a puni-lo, desestimulando-o da prática futura de atos semelhantes, e, com relação à vítima, compensá-la com uma importância mais ou menos aleatória, pela perda que se mostra irreparável, pela dor e humilhação impostas. (...)Evidentemente, não haverá de ser fonte de enriquecimento injustificado da vítima, nem poderá ser inexpressiva a ponto de não atingir o objetivo colimado, de retribuição do mal causado pela ofensa, com o mal da pena. (...)É que a sanção pecuniária deve estar informada dos princípios que a regem e que visam a prevenção e a repressão. (Responsabilidade Civil e Sua Interpretação Jurisprudencial, São Paulo, Ed. RT, 1994 p. 558).Destarte, estou convencido que a condenação da parte ré a pagar à parte autora a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de reparação de dano moral, perfeitamente atende a tais objetivos.EX POSITIS, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para CONDENAR o requerido ao pagamento de:a) indenização por danos materiais no valor de R$ 1.023,15 (mil e vinte e três reais e quinze centavos), atualização monetária pelo INPC a partir do efetivo desembolso, acrescida de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação, até 29/08/2024 e a ser atualizada monetariamente pelo IPCA (art. 389 do Código Civil, com nova redação), a partir de 30/08/2024, e acrescida de juros de mora pela taxa SELIC, deduzindo-se o IPCA daquele mês (segundo o art. 406, § 1º, do Código Civil, com nova redação), a partir de 30/08/2024.b) indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com atualização monetária pelo INPC a partir desta data, acrescida de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação, até 29/08/2024 e a ser atualizada monetariamente pelo IPCA (art. 389 do Código Civil, com nova redação), a partir de 30/08/2024, e acrescida de juros de mora pela taxa SELIC, deduzindo-se o IPCA daquele mês (segundo o art. 406, § 1º, do Código Civil, com nova redação), a partir de 30/08/2024.Diante da sucumbência mínima (quantum indenizatório), condeno a parte ré ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil.Caso haja interposição de recurso de apelação, sem a necessidade de nova conclusão, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias úteis (art. 1.010 § 1º CPC). Decorrido o prazo sem manifestação, após certificação pelo cartório, ou juntadas as contrarrazões, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, com nossas homenagens.Transitado em julgado e inertes as partes, observem-se as regras do Provimento 58/2021 da CGJ/TJGO no que for pertinente e, após, arquivem-se os autos com as cautelas de estilo.Cópia desta decisão servirá como MANDADO/OFÍCIO, para o efetivo cumprimento das determinações constantes do ato, nos termos do artigo 136 e seguintes do Código de Normas e Procedimentos do Foro Judicial da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Goiás.Cumpra-se.Goiânia, data da assinatura eletrônica.MARCELO PEREIRA DE AMORIM Juiz de Direito da 21ª Vara Cível de Goiânia MCR
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