Processo nº 5844044-64.2024.8.09.0051
ID: 316609740
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 5ª UPJ Varas Cíveis: 12ª, 20ª, 21ª, 22ª, 23ª e 25ª
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5844044-64.2024.8.09.0051
Data de Disponibilização:
04/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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Poder JudiciárioComarca de GoiâniaGabinete do Juiz da 21ª Vara CívelTelejudiciario (62) 3216-2070, Fórum Cível: 62-3018-6000, 5ª UPJ das Varas Cíveis (62) 3018-6456 e (62) 3018-6457, WhatsApp 5ª UPJ…
Poder JudiciárioComarca de GoiâniaGabinete do Juiz da 21ª Vara CívelTelejudiciario (62) 3216-2070, Fórum Cível: 62-3018-6000, 5ª UPJ das Varas Cíveis (62) 3018-6456 e (62) 3018-6457, WhatsApp 5ª UPJ: (62) 3018-6455E-mail 5ª UPJ: 5upj.civelgyn@tjgo.jus.br, Gabinete Virtual: gab21varacivel@tjgo.jus.br, WhatsApp Gabinete 21ª: (62) 3018-6472Endereço: (Edificio Forum Civel) Avenida Olinda, Esquina com Rua PL-03, Qd. G, Lt. 04, Park Lozandes, Cep: 74.884-120 - Goiânia - GOSENTENÇAProcesso nº 5844044-64.2024.8.09.0051 Trata-se de ação de repactuação de dívidas proposta por MAGALI APARECIDA CARNOT DAMACENA em desfavor de BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., BANCO BRADESCO S.A., CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e BANCO DAYCOVAL S.A., já qualificados nos autos.Narra a parte autora, em síntese, que é servidora pública e, em razão da quantidade de dívidas contraídas, sua situação financeira tornou-se insustentável. Afirma que, embora reconheça a legitimidade dos empréstimos contratados, está impossibilitada de saldá-los nos moldes originalmente pactuados devido ao superendividamento, necessitando de repactuação para garantir seu mínimo existencial.Relata que após todos os descontos obrigatórios e das parcelas dos empréstimos, seu rendimento líquido é de apenas R$ 1.704,79 (mil setecentos e quatro reais e setenta e nove centavos), quantia insuficiente para suprir suas necessidades básicas. Menciona que o total de dívidas alcança R$ 228.423,25 (duzentos e vinte e oito mil, quatrocentos e vinte e três reais e vinte e cinco centavos).Em sede de tutela de urgência, requereu a suspensão de todos os descontos mensais ou sua limitação a 30% dos rendimentos líquidos, bem como a abstenção de inclusão de seu nome nos órgãos de proteção ao crédito. No mérito, postulou pela procedência da ação para repactuação de dívidas, nos termos da Lei nº 14.181/2021, com designação de audiência conciliatória.A decisão de evento nº 07 deferiu o pedido de justiça gratuita, contudo, indeferiu o pedido de tutela de urgência. Irresignada, a autora interpôs Agravo de Instrumento, cujo acórdão conheceu e deu parcial provimento ao recurso para determinar a limitação dos descontos relativos aos empréstimos realizados pela autora/agravante a 30% (trinta por cento) de seus proventos, calculados após subtraídos os descontos legais, respeitada a ordem das contratações.Os requeridos foram devidamente citados.Foi realizada audiência de conciliação (evento nº 38), na qual não houve acordo entre as partes.A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL contestou a ação (evento nº 43), arguindo, preliminarmente, a improcedência do pedido de gratuidade da justiça. No mérito, sustentou a regularidade da contratação, inexistência de abusividade e a impossibilidade de modificação unilateral do contrato. Argumentou, ainda, que não concedeu crédito de forma irresponsável e que o empréstimo consignado tem valor prefixado, com parcelas fixas e juros contratados.O BANCO DAYCOVAL S.A. ofereceu contestação (evento nº 44), suscitando, preliminarmente, a ausência de interesse de agir e a inépcia da inicial por ausência de documentos essenciais. No mérito, sustentou a impossibilidade de inclusão do crédito de empréstimo consignado no rol de dívidas sujeitas à Lei do Superendividamento, com base no Decreto nº 11.150/2022, que expressamente exclui o empréstimo consignado do cômputo do mínimo existencial. Alegou que os descontos realizados correspondem a apenas 1% do salário líquido da autora, não comprometendo seu mínimo existencial. Requereu improcedência dos pedidos.O BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. apresentou contestação (evento nº 47), arguindo, em preliminar, a ilegitimidade passiva e ausência de interesse de agir, considerando que os empréstimos consignados não se sujeitam à Lei do Superendividamento, conforme previsto no Decreto nº 11.150/2022. Alegou, ainda, inépcia da inicial por não preencher os requisitos mínimos exigidos pela Lei nº 14.181/2021. No mérito, defendeu a regularidade dos contratos, afirmando que a autora possui rendimentos elevados, muito acima da média nacional, e que não restou comprovadamente prejudicado seu mínimo existencial. Impugnou o valor da causa e pleiteou a improcedência dos pedidos.O BANCO BRADESCO S.A. apresentou contestação (evento nº 48), arguindo, preliminarmente, a inépcia da inicial por pedido genérico. No mérito, alegou que a autora não se enquadra como superendividada, uma vez que, após todos os descontos, ainda resta-lhe um saldo de R$ 1.704,79, valor superior ao considerado como mínimo existencial pelo Decreto nº 11.567/2023 (R$ 600,00). Sustentou que os empréstimos consignados já obedecem ao percentual exigido por lei, sendo que o próprio órgão pagador faz a limitação dos valores. Requereu a improcedência da ação.Instadas sobre as provas, as partes manifestaram nos eventos nº 55, 56 e 57.Em decisão de evento nº 60, foi determinada a intimação da autora para apresentação detalhada do plano de pagamento das dívidas, nos termos do artigo 104-A, §4º do CDC.Impugnação às contestações apresentada em evento nº 71 e plano de pagamento apresentado no evento nº 72.Nova tentativa de acordo, debalde (evento nº 109).É o breve relatório.Decido:Quanto aos requisitos processuais:Para Humberto Theodoro Júnior (1997, p. 58) Os pressupostos processuais são exigências legais sem cujo atendimento o processo, como relação jurídica, não se estabelece ou não se desenvolve validamente. (...). São, em suma, requisitos jurídicos para a validade e eficácia da relação processual.Para esse eminente doutrinador, os pressupostos processuais são de existência (requisitos para que a relação processual se constitua validamente) e de desenvolvimento (aqueles a serem atendidos, depois que o processo se estabeleceu regularmente, a fim de que possa ter curso também regular, até sentença de mérito ou a providência jurisdicional definitiva). (In: Curso de direito processual civil, vol. 1, 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997).No caso vertente, a presente ação foi corretamente ajuizada perante autoridade judicial competente.A citação foi correta e atempadamente efetivada.Não se vislumbra aqui a ocorrência de litispendência ou coisa julgada.Reza o artigo 337, § 1º, do CPC: Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.O parágrafo 3.º deste mesmo artigo complementa ao dizer: Há litispendência quando se repete ação que está em curso, já o parágrafo quarto diz: Há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.A melhor doutrina e jurisprudência apontam três elementos essenciais e fundamentais da litispendência: a) as mesmas partes; b) a mesma causa de pedir; c) o mesmo pedido.Não é o caso dos autos, posto que não restou aqui evidenciado o ajuizamento de duas ou mais ações com a mesma causa de pedir.E é por isso também que também não se evidencia a ocorrência de coisa julgada, porquanto não se repete aqui ação que já foi decidida por sentença de que não caiba recurso (§ 4º, art. 337, CPC).Quanto às condições da ação:O fenômeno da carência de ação nada tem a ver com a existência do direito subjetivo afirmado pelo autor, nem com a possível inexistência dos requisitos, ou pressupostos, da constituição da relação processual. É situação que diz respeito apenas ao exercício do direito de ação e que pressupõe autonomia desse direito. (Nesse sentido: Ada Pellegrini Grinover, in “As condições da ação penal” 1ª ed., 1977, n.º 16, p. 29).Por sua vez, o eminente jurista Humberto Theodoro Júnior, em sua festejada obra: Curso de Direito Processual Civil, 9a. ed., vol. I, ensina que as condições da ação são verdadeiras questões prejudiciais de ordem processual e que, por isso mesmo, não se pode confundir com o mérito da causa, já que nada têm a ver com a justiça ou injustiça do pedido ou com a existência ou inexistência do direito controvertido entre os litigantes. Grifei.Em nosso sistema processual o interesse de agir é indispensável para qualquer postulação em juízo. Dispõe o artigo 17 do CPC: Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade.Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático. (Código de Processo Civil Anotado. Nelson Nery Júnior e Rosa Maria A. Nery, RT, 1996, pg. 672).O interesse de agir, portanto, provém da necessidade de a parte obter um pronunciamento jurisdicional a respeito da res iudicio deducta e da utilidade que o decreto jurisdicional proporciona ao autor, como ser dotado de eficácia para solver o conflito de interesses.Dessa forma haverá interesse sempre que o indivíduo invocar a prestação de tutela jurisdicional do Estado tendente à solução de litígio, se utilizando, para isso, de provimento jurisdicional eficaz.A presente ação é meio adequado para dirimir o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida pela parte requerida que seria a responsável, sob a ótica da parte autora, pelos danos por ela experimentados. Presente, portanto, o interesse processual na modalidade necessidade/adequação.O pedido não é juridicamente vedado.As partes são legítimas e estão regularmente representadas.Quanto a preliminar aventada pelos réus, BANCO DAYCOVAL S.A. e BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. sobre a alegada ilegitimidade passiva e ausência de interesse de agir da autora, argumentando que os empréstimos consignados não estariam sujeitos à repactuação prevista na Lei do Superendividamento, conforme exclusão prevista no Decreto nº 11.150/2022, considerando que a questão se confunde com o mérito, deixo de acolher as preliminares neste momento, postergando sua análise para o mérito.Quanto à petição inicial:Como ocorrente no caso dos autos, não se evidencia inepta a petição inicial quando se descortina coerência entre os argumentos deduzidos como causa de pedir e a pretensão finalmente formulada, evidenciado, de forma suficiente, o encadeamento lógico entre os fatos elencados e os fundamentos jurídicos alegados, de modo a permitir o pleno exercício do direito de ação e de defesa.Os réus BANCO DAYCOVAL S.A., BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. e BANCO BRADESCO S.A. arguiram a inépcia da inicial, alegando que a autora não apresentou documentos indispensáveis à propositura da ação e formulou pedido genérico de limitação de descontos, sem apresentar plano de pagamento detalhado.A petição inicial preencheu os requisitos essenciais previstos no artigo 319 do CPC, contendo a causa de pedir, os fundamentos jurídicos do pedido e o pedido com suas especificações. A autora juntou documentos suficientes para demonstrar o alegado superendividamento, como contracheques e extratos bancários.Quanto à ausência de plano de pagamento detalhado, tal questão foi objeto de determinação judicial posterior (evento nº 60), não constituindo óbice ao processamento da ação. A apresentação do plano de pagamento pode ocorrer durante a audiência conciliatória, conforme previsão do artigo 104-A do CDC, não sendo necessariamente um requisito da petição inicial.Portanto, REJEITO a preliminar de inépcia da inicial.Ademais, não se confundem, à luz da melhor técnica processual, questionamentos prefaciais, afetos às condições da ação e aos pressupostos processuais, com alegações de falta de provas dos fatos constitutivos, matéria, por óbvio, voltada ao cerne meritório e de procedência da pretensão autoral. Nesse sentido: 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, 2014 03 1 003061-3 ACJ (0003061-97.2014.8.07.0003 - Res.65 – CNJ) DF, rel. Juiz LUIS MARTIUS HOLANDA BEZERRA JUNIOR 12/08/2014, Publicado no DJE: 14/08/2014. Pág.: 236).Quanto a impugnação ao valor da causa:O BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. impugnou o valor atribuído à causa, alegando que não corresponde ao benefício econômico pretendido pela autora.A impugnação não merece acolhimento. Nos termos do artigo 292, VI, do CPC, o valor da causa na ação em que há cumulação de pedidos, corresponde à soma dos valores de todos eles. No caso em tela, a autora busca a repactuação de dívidas que totalizam R$ 228.423,25 (duzentos e vinte e oito mil, quatrocentos e vinte e três reais e vinte e cinco centavos), conforme demonstrativo apresentado na inicial.O valor atribuído à causa está de acordo com o proveito econômico pretendido, representando a soma das dívidas objeto de repactuação. Assim, REJEITO a impugnação ao valor da causa.Quanto a impugnação à gratuidade da justiça:A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL impugnou a concessão da gratuidade da justiça à autora, alegando que esta não demonstrou de forma eficaz a necessidade do benefício.A impugnação não merece acolhimento. A autora comprovou sua hipossuficiência financeira mediante a juntada de seus contracheques, demonstrando o comprometimento significativo de sua renda mensal com empréstimos consignados e outras despesas básicas. Ademais, a decisão que concedeu a gratuidade da justiça não foi objeto de recurso específico no momento oportuno.Conforme entendimento consolidado pela jurisprudência, a mera alegação genérica de que a parte possui condições de arcar com as despesas processuais, sem a apresentação de provas concretas, não é suficiente para afastar o benefício da gratuidade.No caso em tela, não há elementos que demonstrem a capacidade financeira da autora para arcar com as custas processuais sem prejuízo de seu sustento, razão pela qual mantenho o benefício da gratuidade da justiça concedido.Quanto ao princípio da não surpresa:O art. 10 do CPC/2015 estabelece que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, no caso de não se ter dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. Trata-se de proibição da chamada decisão surpresa, também conhecida como decisão de terceira via, contra julgado que rompe com o modelo de processo cooperativo instituído pelo Código de 2015 para trazer questão aventada pelo juízo não ventilada nem pelo autor nem pelo réu.A intenção do CPC/2015 foi "permitir que as partes, para além da ciência do processo, tenham a possibilidade de participar efetivamente dele, com real influência no resultado da causa". (Nesse sentido: STJ, REsp 1.755.266, rel. Ministro Luis Felipe Salomão).Não obstante, nada há se falar em cooperação das partes no que diz respeito a requisitos processuais e condições da ação, posto que sobre tais temas - de cunho eminentemente legal e já previamente estabelecido/codificado e que não se confundem com o funamento e substrato fático do pedido – não ser contemporizados, tampouco podem as partes sobre tais requisitos e condições exercer qualquer influência quanto a conclusão adotada pelo julgador em face de sua não observância. Não se pode relegar ao oblívio que o fundamento ao qual se refere o artigo 10 do CPC/2015 é o fundamento jurídico – circunstância de fato qualificada pelo direito, em que se baseia a pretensão ou a defesa, ou que possa ter influência no julgamento, mesmo que superveniente ao ajuizamento da ação –, não se confundindo com o fundamento legal (dispositivo de lei regente da matéria). (Nesse sentido: STJ, REsp 1.280.825, rel. Min. Isabel Gallotti).Requisitos processuais e condições de ação são perfeitamente previsíveis e cogitável pelas partes, pois inerente a pressuposto formal contido no CPC e leis processuais especiais de regência. O resultado da violação dessas regras é perfeitamente previsível e, portando, não representa surpresa. A título de exemplo: a não efetivação de prévia notificação do devedor fiduciária implicará no indeferimento da petição inicial e extinção de ação de busca e apreensão, à míngua de requisito processual. Em casos que tais, não há se falar em decisão advinda das próprias investigações ou inovação do julgador. Não existe afronta ao princípio da não surpresa quando o julgador, examinando os fatos expostos na petição inicial, aplica o entendimento jurídico que considerada coerente para a causa. (STJ, AREsp 1.468.820, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).Descabe alegar surpresa se o resultado da lide encontra-se previsto objetivamente no ordenamento disciplinador do instrumento processual utilizado e insere-se no âmbito do desdobramento causal, possível e natural, da controvérsia. (STJ, RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 54.566 - PI (2017/0165308-0), rel. Min. HERMAN BENJAMIN).A propósito do tema, ao julgar o AgInt no AREsp n. 1.205.959/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 25/9/2019, o STJ assentou que “(…) em relação à violação ao princípio da não surpresa, cabe salientar que a orientação jurisprudencial deste Tribunal Superior, reconhece que a vedação à decisão surpresa, prevista nos arts. 9º e 10 do CPC/2015, não se aplica à análise dos requisitos de admissibilidade recursal. Nesse sentido: “na linha da jurisprudência do STJ, a proibição da denominada decisão surpresa - que ofende o princípio previsto nos arts. 9º e 10 do CPC/2015 -, ao trazer questão nova, não aventada pelas partes em Juízo, não diz respeito aos requisitos de admissibilidade do Recurso Especial, previstos em lei e reiteradamente proclamados por este Tribunal, pois não há, neste caso, qualquer inovação no litígio ou adoção de fundamentos que seriam desconhecidos pelas partes, razão pela qual inexiste a alegada nulidade da decisão agravada, à míngua de intimação acerca dos fundamentos utilizados para o não conhecimento do Recurso Especial, que deixou de preencher os pressupostos constitucionais e legais do apelo…”E mesmo que assim não se entenda, não se pode perder de vista que o e. STJ firmou entendimento de que a decretação de nulidade pressupõe a demonstração de efetivo prejuízo ao exercício do direito de defesa, uma vez que o trâmite processual deve observância aos princípios da instrumentalidade das formas e da celeridade (princípio pas de nullité sans grief) não sendo de boa técnica processual declarar a nulidade de sentença quando não se evidenciou a ocorrência de prejuízo à tese desposada pelas partes. (EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1563273/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/06/2020, DJe 12/06/2020).Sobre os temas, vejamos:AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PRECLUSÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO. PREJUÍZO NÃO COMPROVADO. PRINCÍPIO DA PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA DECISÃO SURPRESA. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO ART. 489 DO CPC/2015. DEFICIÊNCIA NA ARGUMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Nos termos do entendimento jurisprudencial vigente nesta Corte Superior, inexiste violação ao princípio da colegialidade quando o relator julga monocraticamente recurso inadmissível, ainda ma is quando é oportunizada à parte recorrente o direito de interposição de agravo previsto no art. 1.021 do CPC/2015. 2. A falta de intimação da parte para manifestação sobre a preclusão do pedido de inversão do ônus da prova não constitui automática nulidade, ficando condicionada à demonstração dos prejuízos decorrentes. 3. Segundo orientação jurisprudencial, aplicando o princípio do pas de nullité san grief, a nulidade dos atos processuais só ocorre quando comprovados os prejuízos para as partes da relação processual. 4. In casu, entendendo o Tribunal estadual que a ausência de intimação para ciência do recorrente sobre a preclusão do pedido de inversão do ônus da prova não gerou prejuízos, descabe ao Superior Tribunal de Justiça alterar o posicionamento adotado, ante a incidência da Súmula 7/STJ. 5. Inexiste afronta ao princípio da não surpresa quando o julgador, examinando os fatos expostos na inicial, juntamente com o pedido e a causa de pedir, aplica o entendimento jurídico que considerada coerente para a causa. 6. O julgamento e conhecimento do recurso especial exige a efetiva demonstração, de forma clara e precisa, dos dispositivos apontados como malferidos pela decisão recorrida juntamente com argumentos suficientes à exata compreensão da controvérsia estabelecida, sob pena de inadmissão, por incidência da Súmula 284/STF. 7. Agravo interno desprovido. (AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.468.820 - MG (2019/0074221-1), rel.: MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE). Destaquei.EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. OBSCURIDADE. CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. AUSÊNCIA DE OFENSA. EFEITOS MODIFICATIVOS. USO DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS PARA CONFORMAÇÃO A JULGAMENTO EM REPETITIVO. APLICAÇÃO RESTRITIVA. 1. Os embargos de declaração só se prestam a sanar obscuridade, omissão ou contradição porventura existentes no acórdão, não servindo à rediscussão da matéria já julgada no recurso. 2. O "fundamento" ao qual se refere o art. 10 do CPC/2015 é o fundamento jurídico - circunstância de fato qualificada pelo direito, em que se baseia a pretensão ou a defesa, ou que possa ter influência no julgamento, mesmo que superveniente ao ajuizamento da ação - não se confundindo com o fundamento legal (dispositivo de lei regente da matéria). A aplicação do princípio da não surpresa não impõe, portanto, ao julgador que informe previamente às partes quais os dispositivos legais passíveis de aplicação para o exame da causa. O conhecimento geral da lei é presunção jure et de jure. 3. O acolhimento dos embargos de declaração com efeitos modificativos para fim de adequação a precedente julgado em recurso repetitivo tem como pressuposto que a tese repetitiva seja anterior ao julgado embargado. Somente assim se poderia considerar que o acórdão embargado tivesse se omitido na consideração da orientação firmada no recurso repetitivo. Precedente da Corte Especial: EAg 1.014.027/ RJ, rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 26.10.2016. 4. Ademais, tal efeito modificativo somente se justificaria, de forma excepcional, se se cuidasse da mesma matéria julgada no repetitivo. Os embargos de declaração não se prestam à aplicação analógica de tese repetitiva, o que deve ser buscado na via processual adequada. 5. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.280.825 - RJ (2011/0190397-7), RELATORA: MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI.) Destaquei.RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 7/STJ. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO OU ENTREVISTA. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DESNECESSIDADE. CURADOR ESPECIAL. INTIMAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE. NULIDADE. DEVER DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. COMPARECIMENTO DO INTERDITANDO. DESNECESSIDADE. TOMADA DE DECISÃO APOIADA. FIXAÇÃO DE OFÍCIO PELO JUIZ. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LEGITIMIDADE EXCLUSIVA. CURATELA COMPARTILHADA. FIXAÇÃO DE OFÍCIO PELO JUIZ. IMPOSSIBILIDADE. OBRIGATORIEDADE. AUS&E circ;NCIA. (...) 8- Esta Corte Superior perfilha o entendimento de que "mesmo nas hipóteses em que se configuram os vícios mais graves, como é a nulidade por falta de intimação pessoal do curador especial, eles serão reconhecidos somente quando devidamente demonstrado o prejuízo suportado pela parte, em homenagem ao princípio da pas de nullité sans grief" (AgInt no REsp 1720264/MG, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 21/09/2018). (...) 18- Recurso especial conhecido em parte e, nesta extensão, não provido. (REsp 1795395/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 06/05/2021)". (G.n.)APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C DANO MORAL E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. PREJUÍZO NÃO CONSTATADO. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. IRREGULARIDADE. VERIFICAÇÃO. REQUISITO PROCESSUAL DE VALIDADE. AUSÊNCIA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 104, §2º DO CPC. Não há que se falar em nulidade da sentença por inobservância ao art. 10, do CPC se não demonstrado o prejuízo efetivo à parte. A postulação em juízo sem procuração, ou por instrumento inválido, é vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro, nos termos do art. 104 do CPC/2015. A condenação do advogado ao pagamento das custas processuais, estabelecida em decorrência de sua atuação sem instrumento regular de mandato, mostra-se em consonância com os ditames do §2º, in fine, desse mesmo dispositivo legal. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.198065-7/001, Relator(a): Des.(a) Jaqueline Calábria Albuquerque , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/09/2023, publicação da súmula em 18/09/2023).APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. VIOLAÇÃO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. REVOGAÇÃO DE PROVA ANTERIORMENTE DEFERIDA. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PRELIMINAR REJEITADA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA NÃO SUPRESA. NÃO VERIFICADA. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES DO STJ. TRATAMENTO ODONTOLÓGICO. DANO MATERIAL E MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. REQUISITOS NÃO COMPROVADOS. AUSÊNCIA DE CULPA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NÃO DEMONSTRADOS. - Ainda que a falta de intimação da parte sobre a possível revogação da prova oral anteriormente deferida ofenda a higidez processual, pelo princípio da instrumentalidade das formas, não se invalida o ato processual que atinge a finalidade e deixa de causar dano processual à parte, bem como a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça posiciona-se no sentido de que mesmo nas hipóteses de vícios mais graves, só serão reconhecidas as nulidades quando demonstrados efetivos prejuízos suportados pelas partes, em homenagem ao princípio "pas de nullité sans grief". - Ademais, não incorre em nulidade, por ofensa ao princípio da não surpresa, a decisão que traz resultado "previsto objetivamente no ordenamento disciplinador do instrumento processual utilizado e insere-se no âmbito do desdobramento causal, possível e natural, da controvérsia. Cuida-se de exercício da prerrogativa jurisdicional admitida nos brocados 'iura novit curia e da mihi factum, dabo tibi ius'" (STJ - RMS 54.566/PI, Relator o Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/09/2017, DJe 09/10/2017). - A jurisprudência do Excelso Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firme no sentido de que, em matéria probatória, não há preclusão pro judicato. - O ordenamento jurídico adota a teoria subjetiva da culpa, exigindo a comprovação da conduta do agente e o dano, além do nexo causal entre o comportamento danoso e a alegada lesão. A responsabilidade civil do dentista, não obstante seja também disciplinada pelas normas protetivas do direito do consumidor, está diretamente atrelada à comprovação da culpa no cometimento da lesão. - A não comprovação, através de prova técnica, da ocorrência de falha ou erro grosseiro dos profissionais da saúde, nas modalidades negligência, imperícia ou imprudência, não enseja a obrigação de indenizar. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.11.187897-1/002, Relator(a): Des.(a) Luiz Artur Hilário , 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/10/2022, publicação da súmula em 20/10/2022). Destaquei.No caso dos autos, no que pertine às questões meritórias, foi assegurado às partes, no momento processual adequado, a oportunidade de se manifestarem quanto as circunstâncias de fato qualificadas pelo direito em que se baseou a pretensão inaugural e a defesa, nada havendo se falar em violação do contraditório.Quanto ao julgamento antecipado do mérito:Cumpre-me de início afastar eventual alegação de cerceamento de defesa ante o indeferimento de produção de prova testemunhal ou depoimento pessoal.Ocorre o cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide somente se e quando, havendo controvérsia a respeito da matéria de fato relevante, o juiz impedir a produção de provas necessárias a sua elucidação. Entenda-se por fato relevante aquele que, além de manter pertinência com a causa, também é apto a influir no julgamento do pedido... Este é o magistério de Antônio Carlos Marcato in Código de Processo Civil Interpretado, São Paulo, Atlas, 2004, p. 984).O juiz é o destinatário das provas, cabendo-lhe aquilatar aquelas que realmente se mostrem aptas à formação do seu convencimento, indeferindo as que se revelarem inúteis à resolução da controvérsia. Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado é dever do magistrado assim proceder e não há que se falar em cerceamento de defesa. (Nesse sentido TJDF Apelação nº. 20060110337208APC, Relator J.J. COSTA CARVALHO, 2ª Turma Cível, julgado em 10/08/2011, DJ 02/09/2011 p. 57).Assim, cumpre ao magistrado avaliar, segundo o conjunto probatório constante dos autos, a necessidade ou não da produção de outras provas indeferindo aquelas que não considerar aptas a influir no julgamento do pedido. Há de se prestigiar o princípio da persuasão racional, insculpido no artigo 130 da Lei Adjetiva, correspondente à intima convicção do magistrado, o qual é soberano para investigar a verdade e apreciar as provas. Não se pode relegar ao oblívio que compete ao julgador a análise das provas, posto que destinadas a seu convencimento, não podendo a conclusão ser infirmada com base em mera afirmação manifesta fora da linha nítida dos fatos e seus eventos.Consoante o escólio de Humberto Theodoro Júnior: (...) o sistema de persuasão racional é fruto da mais atualizada compreensão da atividade jurisdicional. Em tal sistema, sem a rigidez da prova legal, em que o valor de cada prova é previamente fixado em lei, o Juiz, atendo-se apenas às provas do processo, formará o seu convencimento com liberdade e segundo a consciência formada. Embora seja livre o exame das provas, não há arbitrariedade porque a conclusão deve ligar-se logicamente à apreciação jurídica daquilo que restou demonstrado nos autos. E o Juiz não pode fugir dos meios científicos que regulamentam as provas e sua produção, nem tampouco às regras da lógica e da experiência (In Curso de Processo Civil, Forense, 9a. Ed. vol. I, p. 416).E afirma ainda: “O encargo de provar o fato constitutivo continua inteiramente na responsabilidade do autor, mesmo que o réu nada prove a respeito de sua versão”.E continua afirmando que: Na definição de Carnelutti, documento é “uma coisa capaz de representar um fato”. É o resultado de uma obra humana que tenha por objetivo a fixação ou retratação material de algum acontecimento. Contrapõe-se ao testemunho, que é o registro de fatos gravados apenas na memória do homem.Embora a regra seja a admissibilidade da ouvida de testemunhas em todos os processos, o Código permite ao juiz dispensar essa prova oral. Haverá, por isso mesmo, indeferimento da inquirição de testemunhas, segundo o art. 443, quando a prova versar sobre fatos: (a) já provados por documento ou confissão da parte (inciso I); (b) que só por documento ou por exame pericial puderem ser provados.Tratando-se de contrato solene, a respeito do qual a lei material exige pelo menos a forma escrita, a prova por testemunhas somente será admitida: (a) quando houver começo de prova por escrito emanado da parte contra a qual se pretende produzir (art. 444).” (Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I, 56. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2015.pg. 1218-1219 e 1250).Segundo o escólio do preclaro jurista João Monteiro, para o processo, a prova não é somente um fato processual, mas ainda de uma indução lógica, é um meio com que se estabelece a existência positiva ou negativa do fato probando, e é a própria certeza dessa existência...(In Programa de Curso de Processo Civil, 3a. Ed., vol. II, p. 36).Os poderes do juiz relacionados à produção de prova não se referem exclusivamente à possibilidade de determiná-las ex officio. Verificada a inutilidade de diligências requeridas pelas partes, deve o julgador indeferi-las, para evitar que atos meramente protelatórios acabem retardando a entrega da tutela jurisdicional. Ao fazê-lo, estará simplesmente velando pela rápida solução do litígio (art. 125,II). Este é o escólio de José Roberto dos Santos Bedaque, in Código de Processo Civil Interpretado/Antônio Carlos Marcato, coordenador, São Paulo, Atlas, 2004, p. 364).Por isso mesmo, como é cediço, indeferimento de depoimento pessoal da parte ou de inquirição de testemunha com o julgamento antecipado da lide não implica em cerceamento de defesa quando a matéria é unicamente de direito ou quando há nos autos elementos suficientes para dirimir a matéria fática que compõe a lide, como na hipótese dos autos.De se ver, pois, que o cerceamento de defesa não pode ser analisado sobre o simplório argumento de que o indeferimento de produção de certa prova teria prejudicado a parte. Tal argumento deve ser observado à luz do princípio da persuasão racional, é dizer: se ao fundamentar o seu pedido, o juiz analisou as teses defensivas arguidas pelas partes e se o resultado proclamado encontra-se fundamentado à guisa da balança pender a favor ou contra uma das partes. Não fosse assim, o juiz jamais poderia julgar antecipadamente fazendo letra morta a legislação de regência.Nesse sentido já é posicionamento do STJ:PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. INDICAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVO LEGAL COMPROVADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. Existência de omissão no acórdão, visto que restou comprovada a indicação de violação ao dispositivo legal apontado. 2. Inocorre cerceamento de defesa quando é aberta oportunidade ao réu para que justifique as provas que pretenda produzir, limitando-se ele, porém, a requerer depoimentos pessoais e inquirição de testemunhas, desnecessários ao deslinde da ação. 3. Questão envolvida que trata, unicamente, de matéria de direito, não sendo necessário o exame de fatos e provas a serem carreados aos autos, posto que suficientes para o julgamento da demanda os documentos juntados pelas partes. 4. Embargos acolhidos para sanar a omissão apontada sem. contudo, alterar o acórdão impugnado. EDCL NO RECURSO ESPECIAL N° 389.693 - PR (2001/000179198-2), rel. MINISTRO JOSÉ DELGADO.No caso dos autos, as próprias alegações despendidas pelas partes em suas peças, somado aos documentos que acostou aos autos já asseguram a formação de minha convicção.“Não ocorre o cerceamento de defesa na hipótese em que o magistrado entende que o feito está suficientemente instruído e julga a causa sem a produção de prova testemunhal, pois os princípios da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz permitem ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como indeferir aquelas que considerar inúteis ou protelatórias...” (STJ, AgRg no REsp nº 845.384, Rel Min. Luiz Felipe Salomão, julgado em 03/02/11).A propósito a Súmula nº 28 do TJGO:“Afasta-se a preliminar de cerceamento de defesa, suscitada em razão do julgamento antecipado da lide, quando existem nos autos provas suficientes à formação do convencimento do juiz e a parte interessada não se desincumbe do ônus de demonstrar o seu prejuízo, sem o qual não há que se falar em nulidade.”Dessa forma, em análise dos autos, verifico que estes possuem as formalidades legais exigíveis para a espécie, inexistindo nulidades ou irregularidades a serem sanadas, razão pela qual passo à incursão da causa, nos moldes do artigo 355, I do CPC.Quanto ao mérito:O cerne da controvérsia reside na análise da possibilidade de repactuação das dívidas contraídas pela autora junto às instituições financeiras requeridas, com fundamento na Lei nº 14.181/2021 (Lei do Superendividamento).A Lei nº 14.181/2021 alterou o Código de Defesa do Consumidor para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, introduzindo, entre outros, os artigos 54-A e 104-A ao CDC.O artigo 54-A, § 1º, do CDC define o superendividamento como "a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação".O artigo 104-A, por sua vez, estabelece que a requerimento do consumidor superendividado, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial e as garantias e formas de pagamento originalmente pactuadas.O Decreto nº 11.567/2023, que alterou o Decreto nº 11.150/2022, estabeleceu em seu artigo 3º que, para fins de prevenção, tratamento e conciliação das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais).O parágrafo único do artigo 4º do Decreto nº 11.150/2022, por sua vez, excluiu da aferição da preservação e do não comprometimento do mínimo existencial as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica (inciso I, alínea "h").No caso em apreço, a autora alega que está superendividada, uma vez que, após os descontos de empréstimos consignados e demais despesas, sua renda líquida se mostra insuficiente para sua subsistência digna.Conforme documentação acostada aos autos, a autora é servidora pública estadual, com renda bruta de aproximadamente R$ 7.232,77 (sete mil, duzentos e trinta e dois reais e setenta e sete centavos). Após os descontos obrigatórios (INSS, IRRF, IPASGO ESPECIAL e SINDIPÚBLICO), sua renda líquida seria de R$ 4.565,46 (quatro mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e quarenta e seis centavos).Com os descontos relativos aos empréstimos consignados, que totalizam R$ 2.860,67 (dois mil, oitocentos e sessenta reais e sessenta e sete centavos), sua renda líquida disponível reduz-se para R$ 1.704,79 (mil, setecentos e quatro reais e setenta e nove centavos).A autora alega possuir despesas mensais essenciais que totalizam R$ 3.721,00 (três mil, setecentos e vinte e um reais), incluindo alimentação, saúde, água, energia, internet, lazer, higiene pessoal e gasolina. Contudo, não apresentou qualquer comprovação documental dessas despesas, limitando-se a elencá-las genericamente em sua petição inicial, sem juntar faturas, notas fiscais ou recibos que demonstrem efetivamente esses gastos.A comprovação das despesas mensais é imprescindível para a configuração do superendividamento, pois sem ela não há como aferir se realmente existe comprometimento do mínimo existencial.Ocorre que, conforme o Decreto nº 11.567/2023, para fins de prevenção, tratamento e conciliação das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais).Nesse sentido, é a jurisprudência:APELAÇÃO CÍVEL. Ação de repactuação de dívidas. Superendividamento. Sentença de improcedência . Insurgência do requerente. PRELIMINAR, em contrarrazões, de violação ao princípio da dialeticidade recursal. Não ocorrência. Requerente suficientemente indica a razões de fato e de direito que, no abstrato, sustém a pretensão recursal . Atendimento o disposto no art. 1.010, III, do Código de Processo Civil. MÉRITO . Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Art. 54-A, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor. Não se sopesam, para fins de análise de violação ao mínimo existencial, as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica, nos termos do art . 4º, parágrafo único, I, h, do Decreto nº 11.150/2022. A contraprestação mensal a que se submeteu o requerente, descontada do benefício previdenciário percebido por aquele, sem que considerados os descontos consignados, resulta em rendimento mensal superior ao mínimo existencial previsto na legislação de regência, a saber, R$600,00, conforme art. 3º do Decreto nº 11 .150/2022. Não despontante, por razão da contratação de consumo controvertida, violação ao mínimo existencial. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1002180-23.2022.8.26 .0156 Cruzeiro, Relator.: Márcio Teixeira Laranjo, Data de Julgamento: 08/02/2024, 13ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2024).APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS . REQUISITOS. AUSÊNCIA. 1. O fenômeno social do "superendividamento" ensejou a edição da Lei n . 14.181/2021, a qual busca aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 2. De acordo com novel legislação, ?entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação? (art . 54-A do CDC). 3. O regulamento específico atribui, por sua vez, ao ?mínimo existencial? o valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, caput, do Decreto 11 .150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja norma segue com presunção de constitucionalidade. 4. Além disso, exclui da aferição da preservação e do comprometimento do mínimo existencial as parcelas oriundas de dívidas renegociadas, as decorrentes de operação de crédito consignado e de operações de crédito com antecipação, entre outras (art . 4º, parágrafo único, inc. I, alíneas ?f?, ?h? e ?i?, do Decreto 11.150/22). 5 . Não há obrigatoriedade de instauração da segunda fase do procedimento especial de repactuação de dívidas (art. 104-B do CDC), se não preenchidos os pressupostos legais. 6. Inviável o prosseguimento do procedimento especial da Lei n . 14.181/2021, se não comprovado o superendividamento e os requisitos indispensáveis à revisão e integração dos contratos e a repactuação das dívidas, em especial, a conduta abusiva dos credores, mesmo porque a prevenção e o combate ao superendividamento, com vista à preservação do mínimo existencial do mutuário, não devem se dar por meio de uma indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. 7. Negou-se provimento ao recurso. (TJ-DF 07368129320218070001 1719216, Relator.: FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA, Data de Julgamento: 28/06/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/07/2023).Desta forma, o valor de R$ 1.704,79 (mil, setecentos e quatro reais e setenta e nove centavos) que resta à autora após os descontos de empréstimos consignados é significativamente superior ao valor considerado como mínimo existencial pelo Decreto nº 11.567/2023, sendo quase três vezes superior ao patamar estabelecido legalmente.Não se relegue ao oblívio que é ônus da parte autora comprovar os fatos constitutivos de seu direito, nos termos do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil. No caso em análise, a autora alega possuir despesas mensais essenciais que totalizam R$ 3.721,00 (três mil, setecentos e vinte e um reais), contudo, não apresentou qualquer documento que comprove tais gastos.A mera alegação de despesas sem a respectiva comprovação não é suficiente para caracterizar o superendividamento, pois não permite ao julgador aferir se realmente existe comprometimento do mínimo existencial.Portanto, não tendo a autora comprovado as despesas essenciais alegadas, não há como aferir se realmente existe comprometimento do mínimo existencial, requisito indispensável para a caracterização do superendividamento.Ademais, o Decreto nº 11.150/2022 expressamente exclui da aferição da preservação e do não comprometimento do mínimo existencial as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica, como é o caso dos empréstimos contratados pela autora.EX POSITIS, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial.Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC, observada a suspensão da exigibilidade em razão da gratuidade da justiça, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC.Caso haja interposição de recurso de apelação, sem a necessidade de nova conclusão, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias úteis (art. 1.010 § 1º CPC). Decorrido o prazo sem manifestação, após certificação pelo cartório, ou juntadas as contrarrazões, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, com nossas homenagens.Transitada a sentença em julgado, aguarde-se o requerimento para o seu cumprimento. Nada sendo requestado e permanecendo o feito paralisado por mais de 15 (quinze) dias, observem-se as regras do Provimento 58/2021 da CGJ/TJGO no que for pertinente e, após, arquivem-se os autos com as cautelas de estilo.Goiânia, (data e hora da assinatura eletrônica).P.R.I.MARCELO PEREIRA DE AMORIMJuiz de Direito da 21ª Vara Cível de GoiâniaBOB
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