Processo nº 5002567-45.2024.4.03.6114
ID: 261286786
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5002567-45.2024.4.03.6114
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
BRUNO LUIS TALPAI
OAB/SP XXXXXX
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VICTOR DE ALMEIDA PESSOA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 6ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-45.2024.4.03.6114 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: MARIA DE LOURDES TOLEDO NANCI A…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 6ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-45.2024.4.03.6114 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: MARIA DE LOURDES TOLEDO NANCI Advogados do(a) APELANTE: BRUNO LUIS TALPAI - SP429260-A, VICTOR DE ALMEIDA PESSOA - SP455246-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 6ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-45.2024.4.03.6114 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: MARIA DE LOURDES TOLEDO NANCI Advogados do(a) APELANTE: BRUNO LUIS TALPAI - SP429260-A, VICTOR DE ALMEIDA PESSOA - SP455246-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação pelo procedimento comum ajuizada por MARIA DE LOURDES TOLEDO NANCI, em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes de atos de perseguição por motivos políticos e ideológicos sofridos durante a ditadura militar. Alega, em síntese, que foi reconhecida a sua condição de anistiada política. Relata que foi detida e submetida a sevícias e maus tratos em 1971, foi perseguida pessoalmente e também em razão do envolvimento de seu marido José Nanci, nos movimentos políticos à época. Diz que em maio de 1971 foi demitida por justa causa da Fábrica de Motores Elétricos Búfalo, em razão da perseguição ao seu marido. A r. sentença julgou improcedente o pedido. Custas pelo Autor. Honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça. Apela a parte autora, em suas razões, reitera os termos da inicial e requer a reforma da sentença para julgar procedente o pedido. Com contrarrazões subiram os autos a esta E. Corte. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 6ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-45.2024.4.03.6114 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: MARIA DE LOURDES TOLEDO NANCI Advogados do(a) APELANTE: BRUNO LUIS TALPAI - SP429260-A, VICTOR DE ALMEIDA PESSOA - SP455246-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Cinge a controvérsia na verificação do direito do autor em receber indenização por danos morais pelo período em que alega ter sofrido perseguição política na década de 70. Da Prescrição do direito do autor ao alegado dano moral O prazo geral de prescrição aplicável à hipótese de pretensões formuladas em face da Administração Pública é de 5 (cinco) anos, nos termos do artigo 1º, do Decreto-Lei nº 20.10/32. Confira-se: "Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem." Por outro lado, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a prescrição quinquenal prevista no artigo 1º do Decreto Lei nº 2.910/1932, não se aplica aos danos decorrentes de violação de direitos da personalidade, os quais são imprescritíveis. A questão acerca da imprescritibilidade é decorrente do fato de que em determinadas circunstâncias, o direito à reparação dos danos provém de graves violações a direitos e garantias fundamentais praticadas no período de exceção - tais como mortes, prisões por motivo de opinião, perseguições politicamente motivadas, torturas, o que pode acarretar o afastamento da incidência de prescrição. Neste contexto, o autor pleiteia o reconhecimento da referida indenização com base na coação moral sofrida por ser extensivamente perseguido pelos agentes do regime militar, por ter participado de movimento político sindical/grevista, portanto, dentro do rol de imprescritibilidade. Nesse sentido: “PROCESSO CIVIL E CONSTITUCIONAL. ANISTIADO POLÍTICO. DITADURA MILITAR. PRESCRIÇÃO. LEI Nº 10.559/02. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ DESPROVIDA. 1. Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter indenização por danos morais, em relação ao período da ditadura militar. 2. A jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à imprescritibilidade das ações de reparação de danos decorrente de perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, durante o regime militar. 3. A Corte Superior ainda tem firme entendimento no sentido de que a reparação econômica realizada pela União, decorrente da Lei n. 10.559/02, não se confunde com a reparação por danos morais, prevista no art. 5º, V e X, da Constituição Federal, por se tratar de verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas, visto que, enquanto a primeira visa à recomposição patrimonial, a segunda tem por escopo a tutela da integridade moral. 4. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, ou seja, prescinde da comprovação de culpa do agente, sendo suficiente a comprovação do nexo causal entre a conduta lesiva do Estado e o dano, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 5. No tocante à fixação da indenização, deve-se considerar a proporcionalidade à ofensa, a condição social e a viabilidade econômica do ofensor e do ofendido. Deve-se ter em conta, ademais, que a indenização não pode acarretar enriquecimento ilícito, nem representar valor irrisório. 6. Neste ponto da análise, a conclusão possível é a de que, atento às circunstâncias fáticas do caso concreto, é adequado estabelecer a indenização por dano moral no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), acrescidos de juros de mora e correção monetária, de acordo com o Manual de Cálculo da Justiça Federal. 7. Precedentes. 8. Inversão do ônus de sucumbência. 9. Apelação do autor provida e apelação da parte ré desprovida.(APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 5008393-07.2018.4.03.6100 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 3ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/01/2020 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)." “PROCESSO CIVIL. INTERESSE PROCESSUAL. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. CONSTITUCIONAL. ANISTIADO POLÍTICO. DITADURA MILITAR. LEI Nº 10.559/02. DEMISSÃO DA PETROBRÁS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO DEVIDA. APELAÇÃO DA UNIÃO DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA. 1. Existe interesse processual da parte em recorrer ainda que o valor dado à causa seja inferior ao fixado a título de indenização, pois o montante descrito na inicial se trata de mera estimativa e não vincula o julgador. 2. É pacífico o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça quanto à imprescritibilidade das ações de reparação de danos decorrente de perseguição política durante o regime da ditadura militar. 3. O art. 2º da Lei nº 10.559/02 reconheceu como anistiado político aqueles que, no período de 18 de setembro de 1946 até 05 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente política, foram demitidos por interrupção de atividades profissionais, em decorrência de decisão de trabalhadores. 4. Em julho de 1983, o autor foi demitido de seu cargo (técnico químico de petróleo) por ter aderido ao movimento grevista dos petroleiros, cuja mobilização teve caráter essencialmente político. 5. A Refinaria Landulpho Alves (RLAM), em Mataripe/BA, onde o autor trabalhava, exigia qualificação específica para desempenho da função, razão pela qual enfrentou várias dificuldades para retornar ao mercado de trabalho. Além de o Estado deter o monopólio dessa atividade na época, as empresas privadas, temendo possíveis retaliações, passaram a recusar a contratação de petroleiros demitidos na greve de julho de 1983. 6. O autor também sofreu angústia e desespero ao constatar que pessoas de seu convívio social evitavam contato em virtude do desalinho entre o seu posicionamento político e o dos governantes da época. 7. Mais do que evidente, portanto, que a demissão do autor da PETROBRÁS - Petróleo Brasileiro S.A em razão de questões meramente políticas, implicou efetivo abalo psíquico e constrangimentos que vão além dos meros transtornos decorrentes de uma demissão em condições normais. 8. Segundo a Comissão de Anistia, ligada ao Ministério da Justiça, foi fato público e notório que em represália à participação de seus trabalhadores no movimento grevista naquele ano, a Petrobrás procedeu a cerca de 307 demissões, 180 na Refinaria de Mataripe-BA e 127 na Refinaria de Paulínia-SP. 9. A Corte infraconstitucional segue o entendimento de que a reparação econômica realizada pela União decorrente da Lei n. 10.559/02 não se confunde com a reparação por danos morais, prevista no art. 5º, V e X, da Constituição Federal. 10. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, ou seja, prescinde da comprovação de culpa do agente, sendo suficiente a comprovação do nexo causal entre a conduta lesiva do Estado e o dano, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 11. In casu, diante das condutas comissivas praticadas pelos agentes estatais, resta configurada a responsabilidade objetiva, e, consequentemente, o dever de indenizar. 12. O valor da indenização deve ser majorado para R$ 100.000,00 (cem mil reais) a fim de adequar-se a todo o sofrimento suportado pelo autor após sua demissão da Petrobrás. 13. Precedentes. 14. Apelação da União desprovida. 15. Apelação do autor provida. (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2246336 - 0014608-45.2013.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, julgado em 06/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/09/2017 ).” MÉRITO. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já fixou entendimento de que é possível a cumulação do valor recebido a título de reparação econômica, nos termos da Lei nº 10.559/02, com aquele de indenização por danos morais. Confira-se: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REGIME MILITAR. ANISTIA POLÍTICA.POSSIBILIDADE. 1. O Plenário do STJ decidiu que "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, inexiste vedação de acumulação da reparação econômica com indenização por danos morais, porquanto elas constituem verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas, conforme foi decidido na origem.3. Agravo interno desprovido.(AgInt no REsp 1609796/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/09/2019, DJe 25/09/2019)”. “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ANISTIADO POLÍTICO.RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA OCORRIDA DURANTE O REGIME MILITAR INSTAURADO EM 1964. REPARAÇÃO ECONÔMICA NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO QUE NÃO INIBE A REIVINDICAÇÃO DE DANOS MORAIS PELO ANISTIADO NA VIA JUDICIAL. CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO.INOCORRÊNCIA. 1. O recebimento da reparação econômica de que trata a Lei nº 10.559/02 não exclui, só por si, o direito de o anistiado buscar na via judicial, em ação autônoma e distinta, a reparação dos danos morais que tenha sofrido em decorrência da mesma perseguição política geradora da prefalada reparação administrativa (art. 5º, V e X, da CF), pois distintos se revelam os fundamentos que amparam a cada uma dessas situações.2. Conforme jurisprudência consolidada, "o STJ entende ser possível a cumulação de valor recebido a título de reparação econômica com aquele de indenização de danos morais" (AgRg no REsp 1.270.045/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/08/2016, DJe 12/08/2016) 3. Não há falar em ofensa à cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF) e ao enunciado 10 da Súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal quando não haja declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos legais tidos por violados, tampouco afastamento desses, mas tão somente a interpretação do direito infraconstitucional aplicável ao caso, com base na jurisprudência desta Corte.4. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1385756/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 01/07/2019).” Neste sentido é também o posicionamento desta E. Corte Regional: “PROCESSO CIVIL E CONSTITUCIONAL. ANISTIA POLÍTICA. DITADURA MILITAR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem o firme entendimento de que é possível a cumulação da reparação econômica com indenização por danos morais, por se tratar de verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas. De fato, enquanto a primeira visa à recomposição patrimonial, a segunda tem por escopo a tutela da integridade moral. Precedentes. 2. No caso em comento, o autor, por defender ações contra o regime militar, foi vigiado, perseguido e afastado de suas atividades laborais na empresa Ford Brasil S/A, para fins de apuração de falta grave (incitar a greve), o que não gerou mero constrangimento, mas sim efetivo abalo psíquico. 3. É evidente que os procedimentos então adotados tinham caráter excepcional, usando métodos e técnicas que na normalidade democrática não poderiam ser admitidos, assim gerando danos morais passíveis de indenização, na forma do artigo 37, § 6º, c/c artigo 5º, V e X, ambos da Constituição Federal. 4. No tocante à indenização por danos morais, a conclusão possível é a de que, atento às circunstâncias fáticas do caso concreto, mostra-se adequado fixá-la em R$ 100.000,00 (cem mil reais). 5. Em relação aos consectários legais, adota-se o entendimento firmado pela 1ª seção do e. STJ no julgamento do REsp 1.492.221, que discute a aplicabilidade do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/09, em relação às condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora. 6. Inversão do ônus de sucumbência. 7. Apelação provida. (APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 5003055-73.2019.4.03.6114 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 3ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2020 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.).” “PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - ANISTIADO POLÍTICO - LEI Nº 10.559/02 - POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM A REPARAÇÃO ECONÔMICA CONCEDIDA NA VIA ADMINISTRATIVA - PERSEGUIÇÃO COMPROVADA DOCUMENTALMENTE - PRISÃO PARA AVERIGUAÇÃO - DANO COMPROVADO - MAJORAÇÃO DO DANO - RAZOABILIDADE - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - HONORÁRIOS. I - Descabe reexame necessário, nos termos do artigo 496, § 3º, I e II, do CPC, se a condenação não ultrapassa o montante de 500 ou 1.000 salários mínimos. II - Pacificada na jurisprudência a possibilidade de cumulação entre a reparação econômica assegurada pela Lei nº 10.559/2002 e o recebimento de danos morais ante os fundamentos e finalidades diversas. III - É certa a condição de anistiado político do autor. A documentação também é farta no sentido de comprovar a perseguição política sofrida durante o regime ditatorial, incluindo prisão para averiguação no extinto Departamento de Ordem e Política Social (DOPS), havendo, ainda, informações prestadas por médico psiquiatra - não impugnada - de que o autor "apresenta o quadro descrito na Décima Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), da Organização Mundial da Saúde, sob o código F 62.0: "Modificação duradoura da personalidade após uma experiência catastrófica". IV - Patente a obrigação de indenizar, majora-se o valor fixado pelo juízo a quo para R$ 100.000,00, por estar em consonância com os parâmetros usualmente utilizados por esta E. Corte. V - Os consectários devem seguir o decidido pelo STJ no recurso repetitivo RESP nº 1.492.221. As condenações judiciais sujeitam-se aos seguintes encargos: "(a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E". VI - Honorários advocatícios devidos pela Administração Públicas majorados para 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação (art. 85, § 11, CPC). VII - Apelação do autor provida; apelação da União parcialmente provida e improvida a apelação do Estado de São Paulo. (APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 0009271-32.2009.4.03.6100 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 3ª Turma, Intimação via sistema DATA: 26/11/2019 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.).” Confira-se, ainda, as disposições dos artigos, 3º, § 1º e do art.16, ambos da Lei nº 10.559/2002 a respeito do tema: “Art. 3o A reparação econômica de que trata o inciso II do art. 1o desta Lei, nas condições estabelecidas no caput do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, correrá à conta do Tesouro Nacional. § 1o A reparação econômica em prestação única não é acumulável com a reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada.” "Art. 16. Os direitos expressos nesta Lei não excluem os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedada a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento, facultando-se a opção mais favorável." Como se verifica, não há exclusão dos direitos conferidos por outras normas, sendo vedado apenas o pagamento de verbas que tenham idêntico fundamento, ou seja, a Lei 10.559/2002, proíbe a acumulação de: i) reparação econômica em parcela única com reparação econômica em prestação continuada, nos termos do artigo 3º, § 1º e ii) pagamentos, benefícios ou indenizações com o mesmo fundamento, facultando-se ao anistiado político, nesta hipótese, a escola da opção mais favorável, nos termos do artigo 16. Neste sentido, não há vedação para a acumulação da reparação econômica com indenização por danos morais, porquanto se tratam de verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas: aquela visa à recomposição patrimonial (danos emergentes e lucros cessantes), ao passo que esta tem por escopo a tutela da integridade moral, expressão dos direitos da personalidade. Aplicação da orientação consolidada na Súmula 37/STJ: “Súmula: 37 - SÃO CUMULÁVEIS AS INDENIZAÇÕES POR DANO MATERIAL E DANO MORAL ORIUNDOS DO MESMO FATO” Reconhecida a possibilidade de cumulação entre as referidas indenizações, passo à análise da verificação da efetiva ocorrência dos danos morais. Responsabilidade Civil do Estado Está consagrado no direito brasileiro de que a responsabilidade Civil do Estado é objetiva, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal e se baseia na teoria do risco administrativo, com exigência da ocorrência de dano, de uma ação administrativa, e o nexo causal entre ambos. Há, ainda, a possibilidade de se verificar a culpa da vítima, quando poderá haver abrandamento ou mesmo exclusão da responsabilidade da pessoa jurídica de direito público ou da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. Todavia, tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil do Estado, como regra geral, é subjetiva, e se baseia na teoria da culpa administrativa, na qual deve ser comprovada, (por quem sofreu a lesão), a falta ou a deficiência de um serviço público, o qual o Estado estava obrigado, o dano e o nexo de causalidade entre a omissão havida e o dano sofrido. Na teoria da culpa administrativa deve ser comprovada a ocorrência de uma falha na prestação de um serviço público, consoante a expressão consagrada pelo direito administrativo francês “faute de service”, em que deve ser verificada se a falta ou a prestação defeituosa ou retardamento de um serviço público acarretou prejuízo a terceiros. Nesta teoria da culpa administrativa a responsabilidade civil do Estado é subjetiva, ou seja, exige-se a ocorrência do dolo ou culpa, (esta, numa das três vertentes: negligência, imprudência ou imperícia), que, no entanto, não precisam estar individualizadas, porquanto a culpa pode ser atribuída ao serviço público de forma genérica, ou seja, pela “falta do serviço”, oriunda da “faute de service” do direito francês. Entretanto, o poder público, em face de sua omissão, poderá também responder objetivamente, isto ocorre quando o Estado está na posição de garante, ou seja, quando tem o dever legal de assegurar a integridade de pessoas ou coisas que estejam sob sua guarda, proteção direta ou custódia, sendo o caso de aplicação da “teoria do risco administrativo”, conforme explicitado anteriormente, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, mesmo sem haver atuação dos agentes estatais, porque a omissão, neste caso, se iguala a uma conduta comissiva. Dano Moral O direito à indenização por dano material, moral ou à imagem encontra-se no rol dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, assegurado no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, verbis: "Art. 5º. (...) ... V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; ... X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...)". Outrossim, o dano moral, segundo Orlando Gomes, é o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial, não refletindo no campo econômico, mas causa sofrimento profundo, tais como mágoa, desgosto, desonra, vergonha. Nesse sentido, a visão que prevalece na doutrina é o conceito de danos morais com base na afronta aos direitos da personalidade. Feitas tais considerações, verifica-se que o caso posto em desate se amolda à Responsabilidade Civil do Estado, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, a qual exige, na modalidade objetiva, a ocorrência de dano, de uma ação administrativa, e o nexo causal entre ambos, conforme acima explicitado. No caso dos autos restam demonstrados os danos morais, relativos aos prejuízos de ordem emocional sofridos pela autora, tendo sido perseguida, detida, exclusivamente em razão da sua participação e de seu marido em movimento político partidário na região do ABC, conforme os diversos documentos juntados em sua inicial que dão conta de sua ficha perante o DOPS e sua detenção para averiguações, fatos que denotam a utilização do aparato público com o intuito persecutório político, desprivilegiando direitos e garantias constitucionais à sua integridade psíquica e moral, configurada pois a afronta ao direito à personalidade. Importante frisar, por oportuno, que a autora teve reconhecido seu direito de Anistiada Política, por meio da Portaria nº 2058, de 12/05/2013 por declaração do Ministério da Justiça, sendo lhe concedida reparação econômica de caráter indenizatório em prestação mensal permanente e continuada. (id315053258) Valor a ser arbitrado Não obstante ser a lesão causada a um direito da personalidade seja incomensurável, a reparação civil tem natureza compensatória, de modo que não busca efetivamente supri-la, mas tão somente mitigar ou reconfortar aquele que fora lesado. Nesse caso, não há comprovação de que a parte autora tenha sido recolhida à prisão ou que tenha sofrido violência física, de modo que excessivo o valor pleiteado ou aquele comumente aplicado por esta Corte (R$100.000,00), para os casos de dano moral decorrentes de perseguição política, da qual tenha resultado sofrimento físico. Desta forma, observadas as especificidades do caso concreto e em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade arbitro o valor da indenização em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), atentando-se aos parâmetros adotados por esta E. Corte Regional. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CPC/2015. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. DANO MORAL RECONHECIDO. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O que emerge dos autos é que o agravante, militante político de esquerda e dirigente sindical no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema entre os anos de 1980 a 1985, foi perseguido politicamente pelo Estado brasileiro por participar de movimentos grevistas e ações políticas na tentativa de retomada do Estado Democrático de Direito; foi monitorado por inúmeros órgãos de exceção; foi detido e indiciado em inquérito policial; teve seu nome veiculado na “Lista Negra” do Regime Militar, a qual era repassada entre o setor público e privado; seu nome constou de relatórios confidenciais elaborados no ano de 1980 pelo Serviço Nacional de Informações, da Presidência da República, como um dos líderes sindicais. É inegável que tais atos, nitidamente autoritários e repressivos, tinham potencial para abalar a esfera psíquica e moral da agravante. 2. Não houve sofrimentos físicos infligidos à parte autora. Assim, no tocante ao “quantum” indenizatório pretendido de cem mil reais, conclui-se que o mesmo é excessivo e desproporcional porquanto não se trata de reparação de dano moral advindo de violência física, casos em que esta Sexta Turma vem aplicando aquela quantia; assim sendo, resta fixada a indenização em trinta mil reais. Valor a ser corrigido conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualizado. 3. Os juros e correção monetária serão calculados conforme o artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/21, SELIC, que tem aplicação imediata para todos os casos de indenizações devidas pelo Poder Público (AgInt no AREsp 1944981/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/02/2022, DJe 17/02/2022); conforme atual orientação judicial para esses casos, os juros correrão a partir de 5 de outubro de 1988 (TRF3, QUARTA TURMA, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000552-78.2020.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 03/04/2023, DJEN DATA: 18/04/2023), e a correção monetária desde o arbitramento. No mais, incide o Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualizado. 4. Agravo interno parcialmente provido, com manutenção da sucumbência arbitrada na sentença e fixação de honorários sequenciais. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001121-46.2020.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 12/11/2023, Intimação via sistema DATA: 21/11/2023) As parcelas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária e juros de mora, de acordo com os critérios insculpidos no Manual de Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, no capítulo referente às ações condenatórias em geral, em vigor por ocasião da liquidação do julgado. Com relação aos juros de mora, estes são incidentes a partir do evento danoso, no caso, a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos da jurisprudência desta E. Corte Regional. Na hipótese dos autos, observando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e atentando às peculiaridades da presente demanda, de modo a remunerar adequadamente o trabalho do Advogado fixo a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do artigo 85, §§2º e 3º, do Código de Processo Civil. Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos. Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo, para julgar parcialmente procedente o pedido e fixar a indenização pelo dano moral em R$30.000,00 (trinta mil reais), nos termos da fundamentação. É o voto. E M E N T A ADMINISTRATIVO. ANISTIADO POLITICO. DANO MORAL. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM A REPARAÇÃO ECONÔMICA CONCEDIDA NA VIA ADMINISTRATIVA. PERSEGUIÇÃO POLITICA COMPROVADA. DANO MORAL RECONHECIDO. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. - O autor pleiteia o reconhecimento da referida indenização com base na coação moral sofrida por ser extensivamente perseguido pelos agentes do regime militar, por ter participado de movimento político sindical/grevista, portanto, dentro do rol de imprescritibilidade. - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já fixou entendimento de que é possível a cumulação do valor recebido a título de reparação econômica, nos termos da Lei nº 10.559/02, com aquele de indenização por danos morais. - Não há vedação para a acumulação da reparação econômica com indenização por danos morais, porquanto se tratam de verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas: aquela visa à recomposição patrimonial (danos emergentes e lucros cessantes), ao passo que esta tem por escopo a tutela da integridade moral, expressão dos direitos da personalidade. Aplicação da orientação consolidada na Súmula 37/STJ. - Está consagrado no direito brasileiro de que a responsabilidade Civil do Estado é objetiva, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal e se baseia na teoria do risco administrativo, com exigência da ocorrência de dano, de uma ação administrativa, e o nexo causal entre ambos. Há, ainda, a possibilidade de se verificar a culpa da vítima, quando poderá haver abrandamento ou mesmo exclusão da responsabilidade da pessoa jurídica de direito público ou da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. - O dano moral, segundo Orlando Gomes, é o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial, não refletindo no campo econômico, mas causa sofrimento profundo, tais como mágoa, desgosto, desonra, vergonha. Nesse sentido, a visão que prevalece na doutrina é o conceito de danos morais com base na afronta aos direitos da personalidade. - O caso posto em desate se amolda à Responsabilidade Civil do Estado, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, a qual exige, na modalidade objetiva, a ocorrência de dano, de uma ação administrativa, e o nexo causal entre ambos. - Restam demonstrados os danos morais, relativos aos prejuízos de ordem emocional sofridos pela autora, tendo sido perseguida, detida, exclusivamente em razão da sua participação e de seu marido em movimento político partidário na região do ABC, conforme os diversos documentos juntados em sua inicial que dão conta de sua ficha perante o DOPS e sua detenção para averiguações, fatos que denotam a utilização do aparato público com o intuito persecutório político, desprivilegiando direitos e garantias constitucionais à sua integridade psíquica e moral, configurada pois a afronta ao direito à personalidade. - A autora teve reconhecido seu direito de Anistiada Política, por meio da Portaria nº 2058, de 12/05/2013 por declaração do Ministério da Justiça, sendo lhe concedida reparação econômica de caráter indenizatório em prestação mensal permanente e continuada. - Não obstante ser a lesão causada a um direito da personalidade seja incomensurável, a reparação civil tem natureza compensatória, de modo que não busca efetivamente supri-la, mas tão somente mitigar ou reconfortar aquele que fora lesado. - Não há comprovação de que a parte autora tenha sido recolhida à prisão ou que tenha sofrido violência física, de modo que excessivo o valor pleiteado ou aquele comumente aplicado por esta Corte (R$100.000,00), para os casos de dano moral decorrentes de perseguição política, da qual tenha resultado sofrimento físico. - Observadas as especificidades do caso concreto e em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade arbitro o valor da indenização em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), atentando-se aos parâmetros adotados por esta E. Corte Regional. - As parcelas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária e juros de mora, de acordo com os critérios insculpidos no Manual de Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, no capítulo referente às ações condenatórias em geral, em vigor por ocasião da liquidação do julgado. - Com relação aos juros de mora, estes são incidentes a partir do evento danoso, no caso, a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos da jurisprudência desta E. Corte Regional. - Honorários de advogado fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do artigo 85, §§2º e 3º, do Código de Processo Civil. - Apelação provida em parte. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. SOUZA RIBEIRO Desembargador Federal
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