Resultados para "1002200-02.2023.8.26.0472" – Página 72 de 72

Processo nº 1000119-55.2024.4.01.4100

ID: 332641196

Tribunal: TRF1 Órgão: 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO Classe: OPOSIçãO Nº Processo: 1000119-55.2024.4.01.4100

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

"LEOPOLDO DE TAL" (VULGO LEO) E OUTROS MARILEIDE DA LUZ SILVA

Sentença Tipo A

Advogados:

MARCELO DUARTE CAPELETTE

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Rondônia 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO PROCESSO: 1003226-78.2022.4.01.4100 CLASSE: INTERDITO PROIBITÓRIO (1709) POLO ATIVO: MARILEID… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Rondônia 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO PROCESSO: 1003226-78.2022.4.01.4100 CLASSE: INTERDITO PROIBITÓRIO (1709) POLO ATIVO: MARILEIDE DA LUZ SILVA REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO DUARTE CAPELETTE - RO3690 POLO PASSIVO: “Leopoldo de tal” (vulgo LEO) e Outros Sentença tipo "C" (Resolução n. 535/2006 do CJF) PROCESSO: 1000119-55.2024.4.01.4100 CLASSE: OPOSIÇÃO (236) POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO CHAVES DA SILVA BATISTA - DF12289 POLO PASSIVO: MARILEIDE DA LUZ SILVA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCELO DUARTE CAPELETTE - RO3690 Sentença tipo "A" (Resolução n. 535/2006 do CJF) SENTENÇA 1 RELATÓRIO 1.1 Processo n. 1003226-78.2022.4.01.4100 MARILEIDE DA LUZ SILVA ajuizou ação de interdito proibitório, com pedido liminar, contra LEOPOLDO DE TAL e outros desconhecidos acampados dentro da fazenda situada na BR 364, km 150, sentido Acre, Linha H, km 5, ao lado do Assentamento São Francisco, zona rural, distrito de Jaci Paraná, município de Porto Velho/RO, a qual foi distribuída à 3ª Vara Cível da comarca de Porto Velho/RO. A petição inicial traz, em suma, os seguintes fatos e fundamentos jurídicos (ID 970641673, p. 04/11): a) A autora é legítima possuidora, há mais de quatorze anos, do imóvel rural denominado “Sítio Paraná”, com área de 160 hectares, conforme Memorial Descritivo e Plantas Técnicas validadas pelo INCRA/RO. O imóvel é objeto do processo de regularização fundiária n. 56.422.000195/2012-23, que tramita junto ao INCRA/MDA e está em fase de titulação; b) Em 25 de agosto de 2015, um grupo de “sem-terras” liderados por um homem identificado apenas como Leopoldo ou Leo invadiu parte do lote vizinho ao seu, de propriedade da senhora Márcia Pereira Batista. A proprietária ajuizou ação de reintegração de posse com pedido liminar (autos n. 7008027-36.2015.8.22.0001), que foi deferido pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho/RO; c) Já foi efetuado um incêndio nas proximidades, que atingiu o lote da requerente e de outros vizinhos, e foram abertas “picadas” dentro da propriedade, atos estes praticados pelo movimento dos sem-terra, o que gerou o registro de Boletim de Ocorrência (documento anexo); d) Após tomarem conhecimento da reintegração de posse acima informada, os invasores estão planejando invadir a área da requerente, em frente à qual estão acampados. A cada dia, mais pessoas se juntam ao grupo. Há rumores de que a invasão ocorrerá nos próximos dias, pela madrugada; e) A autora teme que o grupo de sem-terras, que são conhecidos pelo emprego de ameaças, passe a turbar sua posse ou mesmo a tentar esbulhá-la. Por isso, registrou a Ocorrência Policial n. 16E1004004106 e ajuizou a presente demanda, com o objetivo de resguardar seu direito constitucional à propriedade. Decisão: defere liminarmente a expedição de mandado proibitório para que a requerente não seja molestada na posse que exerce sobre o imóvel e determina aos réus que se abstenham de praticar qualquer ato de interferência material ou imaterial com relação ao lote litigioso, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, até o limite de R$ 40.000,00, caso comprovado nos autos o descumprimento da ordem (ID 970641673, p. 47/48). Contestação apresentada pela Defensoria Pública do Estado de Rondônia, na defesa dos interesses dos requeridos: alega legitimidade da instituição para atuar no processo independentemente da apresentação de procuração e suscita a ausência de interesse processual da parte autora, pois os requeridos não têm interesse em ocupar a área objeto da presente ação. Requer a concessão da gratuidade da justiça, a designação de audiência de mediação com participação do Ministério Público e da Defensoria Pública, a realização de inspeção judicial e a intimação do INCRA e do Programa Terra Legal/MDA para que se manifestem sobre eventual interesse na lide e tragam documentos adicionais referentes à área (ID 970641673, p. 52/58). Certidão do Oficial de Justiça: informa a citação e intimação de Rodrigo Stepanha da Silva, Gilbervani Francisco de Aquino, André Luiz Anunciado de Lima, Sérgio Caetano Sobrinho e Wagner de Oliveira (ID 970641673, p. 59). Auto de constatação juntado ao processo (ID 970641673, p. 66). Petição da autora: afirma que os réus invadiram o imóvel, descumprindo decisão judicial, e lá montaram barracas de lona, além de estarem derrubando árvores e cometendo crimes ambientais. Pede a conversão da ação de interdito proibitório em ação de reintegração de posse (ID 970641673, p. 69 e 71). Despacho: ordena a expedição de mandado de constatação sobre o estado atual do imóvel e intima os requeridos para que se manifestem sobre o aditamento promovido pela parte contrária (ID 970641673, p. 73). Petição da Defensoria Pública: manifestam discordância com o aditamento da petição inicial (ID 970641673, p. 75). Certidão do Oficial de Justiça: informa a impossibilidade de realizar a constatação, pois o imóvel é de difícil acesso e o servidor não localizou a sede da requerente (ID 970641673, p. 77). Petição da autora: reitera o pedido de conversão da ação de interdito proibitório em ação de reintegração de posse (ID 970641673, p. 81/84). Decisão: defere o pedido de conversão e determina a expedição de mandado de reintegração de posse (ID 970641673, p. 85). Petição da Defensoria Pública: reitera o pleito de observância do disposto no art. 565, §§ 1° a 5°, do Código de Processo Civil (ID 970641673, p. 89). Certidão do Oficial de Justiça: informa que não localizou a área a ser reintegrada, sendo necessários mais dados para tanto, além da presença do autor para indicar o local exato. Afirma ser necessário prévio estudo para que seja garantida a segurança de todos os responsáveis pela reintegração e dos ocupantes atuais (ID 970641673, p. 90). Petição da autora: informa que há pessoas acampadas e construindo barracas no seu imóvel, afirma ser necessário o uso de força policial para cumprir a diligência e solicita a expedição do mandado (ID 970641673, p. 92/93). Decisão: defere o pedido da parte autora (ID 970641673, p. 94/95). Certidão do Oficial de Justiça: informa que, de acordo com a Polícia Militar, o estudo de situação ainda não foi concluído (ID 970641673, p. 103). Ofício da Polícia Militar: informa os fatos que impossibilitaram o cumprimento do apoio à ordem judicial (ID 970641673, p. 113/114). Despacho: determina a expedição de novo mandado de reintegração de posse (ID 970641673, p. 115). Petição do INCRA: afirma que o imóvel objeto desta ação possessória é área pública federal em processo de regularização fundiária ainda não finalizado, argumenta ter interesse na demanda e requer a remessa dos autos à Justiça Federal (ID 970641673, p. 122/126). Certidão do Oficial de Justiça: informa que o estudo de situação ainda não foi concluído pela Polícia Militar, impossibilitando o prosseguimento da reintegração de posse (ID 970641673, p. 127). Ofício da Polícia Militar: informa que a instituição aguarda nova manifestação do Juízo (ID 970641673, p. 131/132). Decisão: declina da competência à 5ª Vara Federal da Seção Judiciária de Rondônia (ID 970641673, p. 135). Despacho: ordena a redistribuição do processo ao acervo do Juiz Titular, em face da conexão com a ação civil pública n. 1002200-84.2018.4.01.4100 (ID 978489190). Despacho: intima o INCRA para demonstrar em concreto sua pretensão (ID 1409461759). Petição do INCRA: informa que ajuizou ação de oposição, a qual recebeu o número 1000119-55.2024.4.01.4100 (ID 1980790147). Decisão: determina a reunião da ação possessória e da oposição. Revoga as decisões do Juízo Estadual no que diz respeito à reintegração de posse da autora na área (ID 2092364666). 1.2 Processo n. 1000119-55.2024.4.01.4100 O INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA ajuizou ação de oposição contra MARILEIDE DA LUZ SILVA, LEOPOLDO DE TAL e outros, com a finalidade de ser reintegrado na posse do imóvel objeto do processo originário. A petição inicial apresenta, em síntese, os seguintes fatos e fundamentos jurídicos (ID 1980787147): a) O imóvel litigioso está inserido na Gleba Capitão Sílvio, arrecadada e matriculada em nome da União (matrícula n. 10.030 de 05/12/1994, Livro 02 – Registro Geral, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Porto Velho/RO) e ainda não foi destacado do patrimônio público para o privado. Trata-se, portanto, de área de domínio público, passível de regularização fundiária na forma da Lei n. 11.952/2009; b) No processo administrativo n. 56422.000195/2012-23, consta manifestação da área técnica do INCRA/RO, informando que o imóvel em litígio está sobreposto a área embargada pelo órgão ambiental federal e/ou a área de infrações ambientais expedidas pelo IBAMA. Foi determinada a realização de vistoria na área para verificar se o ocupante pratica cultura efetiva, se exerce ocupação e exploração direta, mansa e pacífica e se ocupava o imóvel pessoalmente ou por seus antecessores em período anterior a 22 de julho de 2008; c) Não consta no referido procedimento administrativo relatório da vistoria e ainda não houve decisão conclusiva/terminativa da Administração. Logo, não há justo título em favor da requerente. Trata-se de área de dominialidade pública e sua ocupação pela parte autora não está autorizada pelo poder público, caracterizando detenção irregular; d) Nem a autora nem os réus possuem direito à posse ou propriedade do imóvel, uma vez que ambos não têm autorização do INCRA para ocupá-lo. Dessa forma, o INCRA deve recuperar a posse direta da área, de modo a conferir-lhe destinação de acordo com as políticas públicas a cargo da autarquia, o que pode ser alcançado por meio da presente oposição. Despacho: determina a citação dos opostos (ID 2098723181). Decisão: decreta a revelia dos opostos e intima as partes para especificação de provas (ID 2152476138). Petição da Defensoria Pública da União: alega legitimidade e boa-fé da ocupação promovida pelos defendidos e requer a designação de audiência de mediação (ID 2154133655). Petição do INCRA: afirma que não deseja produzir provas complementares (ID 2162407523). 2 FUNDAMENTAÇÃO O julgamento simultâneo da ação principal e da oposição é medida que se impõe, por aplicação dos arts. 685 e 686 do Código de Processo Civil. Quanto à ordem de julgamento, estabelece o art. 686 da lei processual que, julgando-se a oposição e a ação originária na mesma sentença, o juiz resolverá antes a oposição, em virtude da prejudicialidade em relação àquela. No tocante à ação civil pública n. 1002200-84.2018.4.01.4100, embora sua petição inicial mencione fatos relacionados àqueles discutidos na ação possessória e na ação de oposição sob exame, entendo que o julgamento em separado das ações individuais e da ação coletiva não ocasionará risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias. A ação coletiva movida pelo Ministério Público Federal busca compelir o INCRA e a União ao cumprimento de obrigações de fazer destinadas à efetivação da política fundiária. As ações individuais discutem a existência ou não do direito de particulares à proteção possessória. Assim, considerando-se que as demandas individuais estão prontas para julgamento e que a ação coletiva permanece em fase processual menos avançada, é recomendável a resolução das primeiras. 2.1 Processo n. 1000119-55.2024.4.01.4100 Cabimento da ação Entre particulares, não há dúvida quanto à vedação de reconhecimento do domínio em ação possessória, nos termos do art. 557 do CPC. Porém, no caso sob exame, o opoente alega que a área objeto do litígio originário pertence ao patrimônio público federal. Nessa circunstância, é admissível a discussão relativa ao domínio, já que a posse exercida pelo Estado é decorrência do próprio direito de propriedade. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: SÚMULA 637. O ente público detém legitimidade e interesse para intervir, incidentalmente, na ação possessória entre particulares, podendo deduzir qualquer matéria defensiva, inclusive, se for o caso, o domínio. (STJ, Corte Especial, enunciado aprovado em 06/11/2019, DJe 11/11/2019) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OPOSIÇÃO. NATUREZA POSSESSÓRIA. IMÓVEL PÚBLICO DESTINADO À REFORMA AGRÁRIA. ART. 923 DO CPC/1973. DISCUSSÃO DA POSSE COMO DESDOBRAMENTO DO DIREITO DE PROPRIEDADE. 1. Caso em que, na origem, o Incra opôs-se à pretensão de particulares litigantes em ação de reintegração de posse, sob a alegação de que se tratava de imóvel da União afetado a programa de reforma agrária. 2. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região consignou: “Nesse contexto, o Opoente (INCRA) sustenta que seu direito à posse deve ser declarado no feito em detrimento da posse exercida e alegada pelos opostos, porque ele detém o domínio das terras. Ao apreciar o recurso, constato que não assiste razão ao Recorrente, uma vez que os juízos possessórios e petitórios não se misturem, sendo vedado ao Opoente (INCRA) aproveitar-se do processo instaurado entre os litigantes primitivos, deduzindo, porém, pedido cujo objeto é diverso do discutido entre os Opostos. Isso porque o primeiro processo tem por objeto a tutela possessória e a oposição tem por objeto tutela petitória, uma vez que o INCRA busca reivindicar/imitir-se na posse do bem em questão, não havendo dúvidas quanto à sua natureza petitória”. 3. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, recentemente, no julgamento dos EREsp 1.296.991/DF (DJe 27/2/2019), firmou a tese de que, nos casos em que o imóvel objeto do litígio é público, como aqueles destinados à Reforma Agrária, a discussão da posse em ação possessória decorre do próprio direito de propriedade, não se aplicando a restrição normativa prevista no art. 923 do CPC/1973 (557 do CPC/2015). 4. Ficou consignado no referido julgado que exigir do poder público o exercício de poder de fato sobre a coisa, especialmente nos casos em que a posse está relacionada a grandes extensões de terra destinadas à Reforma Agrária, inviabilizaria a referida política pública. Interpretação diversa importa, no caso concreto, em sobrepor o interesse privado dos particulares à posse do imóvel ao interesse público primário da efetivação da política pública de reforma agrária. 5. Recurso Especial provido. (STJ, Segunda Turma, REsp 1.819.861/MT, DJe 19/12/2019) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DISCUSSÃO EM TORNO DE POSSE/PROPRIEDADE DE TERRA PÚBLICA. AÇÃO POSSESSÓRIA ENTRE PARTICULARES. OPOSIÇÃO DO INCRA. POSSIBILIDADE. POSSE SOBRE BEM DOMINIAL. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 923 DO CPC/1973, ATUAL ART. 557 DO CÓDIGO FUX. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES DESPROVIDO. 1. A leitura atenta dos autos revela tratar-se a lide de disputa de natureza possessória entre particulares, tendo como objeto terra pública. O INCRA, então, interveio como terceiro na condição de opoente, buscando demonstrar o domínio da União e, consequentemente, a posse, por se tratar de bem dominial. 2. O comando normativo do art. 923 do CPC/1973 (atual 557 do Código Fux) proíbe a busca do reconhecimento judicial de domínio, tanto pelo autor quanto pelo réu, enquanto pendente de julgamento ação possessória. No presente caso, todavia, o INCRA buscou opor-se para defender a posse do bem dominial, sendo que essa posse decorre do próprio domínio, e não de atos de posse propriamente ditos. Destaca-se o presente caso pela circunstância de que a forma do exercício de posse de bens públicos dominiais por parte do Poder Público não depende da verificação de atos concretos de posse, o que faz com que seja impossível para a União levantar discussão possessória sem que, ao mesmo tempo, fale do próprio domínio que legitima essa posse. 3. O critério (ou princípio) da melhor posse, o qual costuma prevalecer no julgamento de semelhantes demandas, leva em conta a posse mais antiga. Como a única posse legítima, no presente caso, é a da União - muito embora, relembre-se, nada impeça a discussão judicial entre particulares a respeito de detenção -, é justo que seja-lhe concedida a oportunidade de se manifestar a respeito da posse do imóvel objeto de litígio, o que, pela natureza do próprio objeto, força a necessidade de demonstração da propriedade. 4. Nesse contexto, é imperativo admitir a oposição do INCRA, permitindo sua intervenção nos autos. 5. Agravo Interno dos Particulares desprovido. (STJ, Primeira Turma, AgInt no REsp 1.820.051/PA, DJe 17/11/2020) Não há, portanto, óbice processual à ação petitória manejada pela autarquia federal para se opor à ação possessória entre particulares. Mérito A ação principal tem por objeto um imóvel rural com aproximadamente 160 hectares localizado no distrito de Jaci Paraná, município de Porto Velho/RO. O INCRA alega que o referido lote está inserido em gleba de propriedade da União. A autarquia também afirma que, embora a área seja passível de regularização fundiária, o processo instaurado pela autora ainda não foi concluído, de modo que a requerente exerce mera detenção. A autora da ação possessória instruiu a petição inicial com cópia do processo administrativo n. 56422.000195/2012-23 (ID 970641673, p. 24/46, dos autos n. 1003226-78.2022.4.01.4100). Os documentos ali acostados confirmam que o imóvel está inserido na Gleba Capitão Sílvio (p. 30/31) e que esta se encontra registrada em nome da União (p. 34). Não há notícia de que o procedimento de regularização tenha sido finalizado, tampouco da emissão de título em favor da requerente. Conclui-se assim que a área em litígio permanece sob o domínio da União. Convém ressaltar que o regime jurídico para o reconhecimento de posse de particulares sobre áreas públicas é distinto daquele aplicável às áreas privadas. Em se tratando de área particular, considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do Código Civil). Porém, em se tratando de imóvel de propriedade do poder público, o direito de posse somente pode ser reconhecido ao particular quando evidenciada a existência de consentimento expresso do proprietário com a ocupação, em razão da natureza indisponível e imprescritível dos bens públicos. No caso em apreço, não foi demonstrado o assentimento da União ou do INCRA com a ocupação. Em complemento, a ausência de oposição do poder público não legitima a ocupação de seus bens por particulares. Conforme mencionado em linhas anteriores, os bens públicos são dotados das prerrogativas de indisponibilidade e imprescritibilidade, de forma que eventual falta de fiscalização pela Administração Pública não pode ter como consequência a validação de ocupações irregulares, em prejuízo à coletividade. Portanto, a ocupação exercida pela oposta-autora qualifica-se juridicamente como mera detenção, de caráter precário, insuscetível de retenção ou indenização por benfeitorias, independentemente do tempo de ocupação ou do tipo de atividade econômica desempenhada no local, sendo igualmente impertinente a apuração da boa-fé da ocupante. A matéria encontra-se pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, conforme exemplificam os excertos a seguir: SÚMULA 619. A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias. (STJ, Corte Especial, enunciado aprovado em 24/10/2018, DJe 30/10/2018) AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA PRECLUSA. NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL ADESIVO PARA ATACAR PARTE DO ARESTO. TEMA SUSCITADO APENAS NO AGRAVO REGIMENTAL. INOVAÇÃO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. CIVIL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. OCUPAÇÃO DE BEM PÚBLICO. DESCONHECIMENTO DO VÍCIO. POSSE. IMPOSSIBILIDADE. MERA DETENÇÃO. NATUREZA PRECÁRIA. ART. 1.219 DO CC. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS E DIREITO DE RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. A ocupação de bem público não gera direitos possessórios, e sim mera detenção de natureza precária. 3. Ainda que a parte desconheça vício que inquine seu direito, gozando de boa-fé, não são cabíveis o pagamento de indenização pelas benfeitorias e o reconhecimento do direito de retenção, nos termos do art. 1.219 do CC. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no REsp: 1.319.975/DF, Relator: Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, data de julgamento: 01/12/2015, publicação: DJe 09/12/2015) ADMINISTRATIVO. IMÓVEL DE PROPRIEDADE DO MUNICÍPIO. INEXISTÊNCIA DE ATO FORMAL AUTORIZANDO A OCUPAÇÃO DO IMÓVEL PELO PARTICULAR. IRREGULARIDADE. BOA-FÉ QUE NÃO PODE SER PRESUMIDA. DEVER DE INDENIZAR. EXISTÊNCIA. (...) 3. A partir da simples exposição dos fatos feita pelo acórdão recorrido, verifica-se que a conclusão a que chegou o Tribunal de Justiça bandeirante é equivocada, pois se o instrumento de concessão/permissão administrativa de uso do imóvel não foi formalmente aperfeiçoado, jamais se poderia dizer que houve boa-fé na ocupação. Se o particular passa a usar imóvel público sem que houvesse sido formalmente autorizado a tanto, ele está procedendo de forma evidentemente irregular. 4. Eventual omissão do Poder Público Municipal em adotar as medidas que seriam cabíveis para se opor à ocupação irregular não transforma o ilícito em lícito, diante do princípio da indisponibilidade do interesse público. 5. Sendo o particular detentor de má-fé, responde por todos os frutos que o proprietário deixou de perceber, na forma do art. 1.216 do Código Civil, cujas disposições a respeito do possuidor se aplicam também, com mais razão até, ao simples detentor. E os frutos, em se tratando de imóveis, correspondem aos valores que poderiam ter sido recebidos pelo proprietário. 6. “6. A ocupação, a exploração e o uso de bem público ... só se admitem se contarem com expresso, inequívoco, válido e atual assentimento do Poder Público, exigência inafastável tanto pelo Administrador como pelo Juiz, a qual se mantém incólume, independentemente da ancianidade, finalidade (residencial, comercial ou agrícola) ou grau de interferência nos atributos que justificam sua proteção. ... 9. Na falta de autorização expressa, inequívoca, válida e atual do titular do domínio, a ocupação de área pública é mera detenção ilícita ... 11. A apropriação, ao arrepio da lei, de terras e imóveis públicos ..., além de acarretar o dever de imediata desocupação da área, dá ensejo à aplicação das sanções administrativas e penais previstas na legislação, bem como à obrigação de reparar eventuais danos causados. 16. Inexiste boa-fé contra expressa determinação legal. Ao revés, entende-se agir de má-fé o particular que, sem título expresso, inequívoco, válido e atual ocupa imóvel público, mesmo depois de notificação para abandoná-lo, situação típica de esbulho permanente, em que cabível a imediata reintegração judicial. 17. Na ocupação, uso ou exploração de bem público, a boa-fé é impresumível, requisitando prova cabal a cargo de quem a alega. ... 18. Na gestão e controle dos bens públicos impera o princípio da indisponibilidade, o que significa dizer que eventual inércia ou conivência do servidor público de plantão ... não tem o condão de, pela porta dos fundos da omissão e do consentimento tácito, autorizar aquilo que, pela porta da frente, seria ilegal ...” (REsp 808.708/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 04/05/2011) 7. Recurso Especial provido para reconhecer o dever dos recorridos de indenizarem ao Município desde a data das notificações para desocupação voluntária até a data da efetiva liberação da área pública, devendo o montante ser apurado com base no valor locativo do imóvel, como se apurar em liquidação. (STJ, REsp 1.370.254/SP, Relator: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, data de julgamento: 08/11/2016, publicação: DJe 29/11/2016) PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. BEM PÚBLICO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. MUNICÍPIO DE MACATUBA. OCUPAÇÃO DE NATUREZA PRECÁRIA. AUSÊNCIA DE POSSE. MERA DETENÇÃO. ARTIGO 1.208 DO CÓDIGO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. (…) 4. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que a ocupação de bem público não gera direitos possessórios, e sim mera detenção de natureza precária e afasta o pagamento de indenização pelas benfeitorias, bem como o reconhecimento do direito de retenção, nos termos do art. 1.219 do CC. 5. A jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça quanto do Supremo Tribunal Federal, é firme em não ser possível a posse de bem público, constituindo sua ocupação mera detenção de natureza precária. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: REsp 1.701.620/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017; AgRg no AREsp 824.129/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 1/3/2016, e REsp 932.971/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 26/5/2011. 6. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Especial. (STJ, AREsp 1.725.385/SP, Relator: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, data de julgamento: 09/02/2021, data de publicação: DJe 09/04/2021) Quanto aos opostos-réus (indivíduos que invadiram a área em 2016, dando origem ao litígio principal), é evidente a ausência de direito de posse, porquanto a ocupação inaugurada naquela ocasião deu-se de forma violenta, sem autorização expressa do ente público proprietário em procedimento administrativo instaurado para tal finalidade. A invocação, em termos genéricos e com baixa densidade normativa, ao direito à moradia não constitui fundamento jurídico adequado e suficiente para afastar a pretensão do opoente, que se baseia no direito de propriedade da União, revestido de interesse público e protegido por lei e pela Constituição. Eventual pretensão de ocupar ou permanecer na área objeto da lide deve ser exercida pelos meios legais, e não mediante esbulho de terras públicas como mecanismo de autotutela. Entendimento contrário conduziria ao esvaziamento da legislação agrária – que condiciona o reconhecimento desses direitos à observância do devido processo administrativo e ao preenchimento de requisitos específicos, a serem comprovados em cada caso concreto –, além de configurar incentivo à invasão de imóveis públicos, o que não pode ser admitido. Com essas razões, a procedência do pedido deduzido pelo opoente é medida que se impõe. 2.2 Processo n. 1003226-78.2022.4.01.4100 Nas ações de manutenção e de reintegração de posse, deve a parte autora alegar e provar: (I) a sua posse; (II) a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; (III) a data da turbação ou do desbulho; (IV) a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração (art. 927 do CPC/1973 e art. 561 do CPC/2015). In casu, a autora da ação possessória pretendia reaver a posse de um imóvel rural localizado na Gleba Capitão Sílvio, distrito de Jaci-Paraná, município de Porto Velho/RO. Porém, foi reconhecido, no capítulo de sentença referente à ação de oposição n. 1000119-55.2024.4.01.4100, o direito de posse do INCRA sobre a área em litígio. Considerando-se que ambas as ações têm como fundamento o direito de posse e que foi julgado procedente o pedido formulado na oposição, fica prejudicado o pleito de reintegração apresentado no processo originário. 3 DISPOSITIVO 3.1 Quanto à ação de oposição, resolvo o mérito, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e JULGO PROCEDENTE o pedido para DECLARAR o direito do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO DE REFORMA AGRÁRIA – INCRA de ser reintegrado na posse do imóvel rural identificado por meio do código 950.181.534.943-3, objeto do processo administrativo de regularização fundiária n. 56.422.000195/2012-23. 3.1.1 CONDENO os opostos ao pagamento das custas processuais e dos horários advocatícios em favor do INCRA, os quais fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fulcro no art. 85, § 8°, do Código de Processo Civil. 3.2 Quanto à ação de reintegração de posse, EXTINGO o processo sem resolução do mérito, por perda do objeto (art. 485, inciso VI, in fine, do Código de Processo Civil). 3.2.1 Sem condenação em custas e honorários advocatícios. Caso interposto recurso de apelação, oportunize-se o contraditório. Após, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Transitada em julgado, intimem-se as partes para requererem o que entenderem de direito. Nada sendo requerido, arquivem-se os autos, após as anotações de praxe. Porto Velho, data da assinatura eletrônica. (assinado eletronicamente) JUIZ(A) FEDERAL 5ª Vara/SJRO – Especializada em matéria ambiental e agrária

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Marileide Da Luz Silva x "Leopoldo De Tal" (Vulgo Leo) E Outros

ID: 332639522

Tribunal: TRF1 Órgão: 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO Classe: INTERDITO PROIBITóRIO Nº Processo: 1003226-78.2022.4.01.4100

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

MARILEIDE DA LUZ SILVA

Polo Passivo:

"LEOPOLDO DE TAL" (VULGO LEO) E OUTROS

Sentença Tipo C

Advogados:

MARCELO DUARTE CAPELETTE

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Rondônia 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO PROCESSO: 1003226-78.2022.4.01.4100 CLASSE: INTERDITO PROIBITÓRIO (1709) POLO ATIVO: MARILEID… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Rondônia 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO PROCESSO: 1003226-78.2022.4.01.4100 CLASSE: INTERDITO PROIBITÓRIO (1709) POLO ATIVO: MARILEIDE DA LUZ SILVA REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO DUARTE CAPELETTE - RO3690 POLO PASSIVO: “Leopoldo de tal” (vulgo LEO) e Outros Sentença tipo "C" (Resolução n. 535/2006 do CJF) PROCESSO: 1000119-55.2024.4.01.4100 CLASSE: OPOSIÇÃO (236) POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO CHAVES DA SILVA BATISTA - DF12289 POLO PASSIVO: MARILEIDE DA LUZ SILVA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCELO DUARTE CAPELETTE - RO3690 Sentença tipo "A" (Resolução n. 535/2006 do CJF) SENTENÇA 1 RELATÓRIO 1.1 Processo n. 1003226-78.2022.4.01.4100 MARILEIDE DA LUZ SILVA ajuizou ação de interdito proibitório, com pedido liminar, contra LEOPOLDO DE TAL e outros desconhecidos acampados dentro da fazenda situada na BR 364, km 150, sentido Acre, Linha H, km 5, ao lado do Assentamento São Francisco, zona rural, distrito de Jaci Paraná, município de Porto Velho/RO, a qual foi distribuída à 3ª Vara Cível da comarca de Porto Velho/RO. A petição inicial traz, em suma, os seguintes fatos e fundamentos jurídicos (ID 970641673, p. 04/11): a) A autora é legítima possuidora, há mais de quatorze anos, do imóvel rural denominado “Sítio Paraná”, com área de 160 hectares, conforme Memorial Descritivo e Plantas Técnicas validadas pelo INCRA/RO. O imóvel é objeto do processo de regularização fundiária n. 56.422.000195/2012-23, que tramita junto ao INCRA/MDA e está em fase de titulação; b) Em 25 de agosto de 2015, um grupo de “sem-terras” liderados por um homem identificado apenas como Leopoldo ou Leo invadiu parte do lote vizinho ao seu, de propriedade da senhora Márcia Pereira Batista. A proprietária ajuizou ação de reintegração de posse com pedido liminar (autos n. 7008027-36.2015.8.22.0001), que foi deferido pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho/RO; c) Já foi efetuado um incêndio nas proximidades, que atingiu o lote da requerente e de outros vizinhos, e foram abertas “picadas” dentro da propriedade, atos estes praticados pelo movimento dos sem-terra, o que gerou o registro de Boletim de Ocorrência (documento anexo); d) Após tomarem conhecimento da reintegração de posse acima informada, os invasores estão planejando invadir a área da requerente, em frente à qual estão acampados. A cada dia, mais pessoas se juntam ao grupo. Há rumores de que a invasão ocorrerá nos próximos dias, pela madrugada; e) A autora teme que o grupo de sem-terras, que são conhecidos pelo emprego de ameaças, passe a turbar sua posse ou mesmo a tentar esbulhá-la. Por isso, registrou a Ocorrência Policial n. 16E1004004106 e ajuizou a presente demanda, com o objetivo de resguardar seu direito constitucional à propriedade. Decisão: defere liminarmente a expedição de mandado proibitório para que a requerente não seja molestada na posse que exerce sobre o imóvel e determina aos réus que se abstenham de praticar qualquer ato de interferência material ou imaterial com relação ao lote litigioso, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, até o limite de R$ 40.000,00, caso comprovado nos autos o descumprimento da ordem (ID 970641673, p. 47/48). Contestação apresentada pela Defensoria Pública do Estado de Rondônia, na defesa dos interesses dos requeridos: alega legitimidade da instituição para atuar no processo independentemente da apresentação de procuração e suscita a ausência de interesse processual da parte autora, pois os requeridos não têm interesse em ocupar a área objeto da presente ação. Requer a concessão da gratuidade da justiça, a designação de audiência de mediação com participação do Ministério Público e da Defensoria Pública, a realização de inspeção judicial e a intimação do INCRA e do Programa Terra Legal/MDA para que se manifestem sobre eventual interesse na lide e tragam documentos adicionais referentes à área (ID 970641673, p. 52/58). Certidão do Oficial de Justiça: informa a citação e intimação de Rodrigo Stepanha da Silva, Gilbervani Francisco de Aquino, André Luiz Anunciado de Lima, Sérgio Caetano Sobrinho e Wagner de Oliveira (ID 970641673, p. 59). Auto de constatação juntado ao processo (ID 970641673, p. 66). Petição da autora: afirma que os réus invadiram o imóvel, descumprindo decisão judicial, e lá montaram barracas de lona, além de estarem derrubando árvores e cometendo crimes ambientais. Pede a conversão da ação de interdito proibitório em ação de reintegração de posse (ID 970641673, p. 69 e 71). Despacho: ordena a expedição de mandado de constatação sobre o estado atual do imóvel e intima os requeridos para que se manifestem sobre o aditamento promovido pela parte contrária (ID 970641673, p. 73). Petição da Defensoria Pública: manifestam discordância com o aditamento da petição inicial (ID 970641673, p. 75). Certidão do Oficial de Justiça: informa a impossibilidade de realizar a constatação, pois o imóvel é de difícil acesso e o servidor não localizou a sede da requerente (ID 970641673, p. 77). Petição da autora: reitera o pedido de conversão da ação de interdito proibitório em ação de reintegração de posse (ID 970641673, p. 81/84). Decisão: defere o pedido de conversão e determina a expedição de mandado de reintegração de posse (ID 970641673, p. 85). Petição da Defensoria Pública: reitera o pleito de observância do disposto no art. 565, §§ 1° a 5°, do Código de Processo Civil (ID 970641673, p. 89). Certidão do Oficial de Justiça: informa que não localizou a área a ser reintegrada, sendo necessários mais dados para tanto, além da presença do autor para indicar o local exato. Afirma ser necessário prévio estudo para que seja garantida a segurança de todos os responsáveis pela reintegração e dos ocupantes atuais (ID 970641673, p. 90). Petição da autora: informa que há pessoas acampadas e construindo barracas no seu imóvel, afirma ser necessário o uso de força policial para cumprir a diligência e solicita a expedição do mandado (ID 970641673, p. 92/93). Decisão: defere o pedido da parte autora (ID 970641673, p. 94/95). Certidão do Oficial de Justiça: informa que, de acordo com a Polícia Militar, o estudo de situação ainda não foi concluído (ID 970641673, p. 103). Ofício da Polícia Militar: informa os fatos que impossibilitaram o cumprimento do apoio à ordem judicial (ID 970641673, p. 113/114). Despacho: determina a expedição de novo mandado de reintegração de posse (ID 970641673, p. 115). Petição do INCRA: afirma que o imóvel objeto desta ação possessória é área pública federal em processo de regularização fundiária ainda não finalizado, argumenta ter interesse na demanda e requer a remessa dos autos à Justiça Federal (ID 970641673, p. 122/126). Certidão do Oficial de Justiça: informa que o estudo de situação ainda não foi concluído pela Polícia Militar, impossibilitando o prosseguimento da reintegração de posse (ID 970641673, p. 127). Ofício da Polícia Militar: informa que a instituição aguarda nova manifestação do Juízo (ID 970641673, p. 131/132). Decisão: declina da competência à 5ª Vara Federal da Seção Judiciária de Rondônia (ID 970641673, p. 135). Despacho: ordena a redistribuição do processo ao acervo do Juiz Titular, em face da conexão com a ação civil pública n. 1002200-84.2018.4.01.4100 (ID 978489190). Despacho: intima o INCRA para demonstrar em concreto sua pretensão (ID 1409461759). Petição do INCRA: informa que ajuizou ação de oposição, a qual recebeu o número 1000119-55.2024.4.01.4100 (ID 1980790147). Decisão: determina a reunião da ação possessória e da oposição. Revoga as decisões do Juízo Estadual no que diz respeito à reintegração de posse da autora na área (ID 2092364666). 1.2 Processo n. 1000119-55.2024.4.01.4100 O INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA ajuizou ação de oposição contra MARILEIDE DA LUZ SILVA, LEOPOLDO DE TAL e outros, com a finalidade de ser reintegrado na posse do imóvel objeto do processo originário. A petição inicial apresenta, em síntese, os seguintes fatos e fundamentos jurídicos (ID 1980787147): a) O imóvel litigioso está inserido na Gleba Capitão Sílvio, arrecadada e matriculada em nome da União (matrícula n. 10.030 de 05/12/1994, Livro 02 – Registro Geral, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Porto Velho/RO) e ainda não foi destacado do patrimônio público para o privado. Trata-se, portanto, de área de domínio público, passível de regularização fundiária na forma da Lei n. 11.952/2009; b) No processo administrativo n. 56422.000195/2012-23, consta manifestação da área técnica do INCRA/RO, informando que o imóvel em litígio está sobreposto a área embargada pelo órgão ambiental federal e/ou a área de infrações ambientais expedidas pelo IBAMA. Foi determinada a realização de vistoria na área para verificar se o ocupante pratica cultura efetiva, se exerce ocupação e exploração direta, mansa e pacífica e se ocupava o imóvel pessoalmente ou por seus antecessores em período anterior a 22 de julho de 2008; c) Não consta no referido procedimento administrativo relatório da vistoria e ainda não houve decisão conclusiva/terminativa da Administração. Logo, não há justo título em favor da requerente. Trata-se de área de dominialidade pública e sua ocupação pela parte autora não está autorizada pelo poder público, caracterizando detenção irregular; d) Nem a autora nem os réus possuem direito à posse ou propriedade do imóvel, uma vez que ambos não têm autorização do INCRA para ocupá-lo. Dessa forma, o INCRA deve recuperar a posse direta da área, de modo a conferir-lhe destinação de acordo com as políticas públicas a cargo da autarquia, o que pode ser alcançado por meio da presente oposição. Despacho: determina a citação dos opostos (ID 2098723181). Decisão: decreta a revelia dos opostos e intima as partes para especificação de provas (ID 2152476138). Petição da Defensoria Pública da União: alega legitimidade e boa-fé da ocupação promovida pelos defendidos e requer a designação de audiência de mediação (ID 2154133655). Petição do INCRA: afirma que não deseja produzir provas complementares (ID 2162407523). 2 FUNDAMENTAÇÃO O julgamento simultâneo da ação principal e da oposição é medida que se impõe, por aplicação dos arts. 685 e 686 do Código de Processo Civil. Quanto à ordem de julgamento, estabelece o art. 686 da lei processual que, julgando-se a oposição e a ação originária na mesma sentença, o juiz resolverá antes a oposição, em virtude da prejudicialidade em relação àquela. No tocante à ação civil pública n. 1002200-84.2018.4.01.4100, embora sua petição inicial mencione fatos relacionados àqueles discutidos na ação possessória e na ação de oposição sob exame, entendo que o julgamento em separado das ações individuais e da ação coletiva não ocasionará risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias. A ação coletiva movida pelo Ministério Público Federal busca compelir o INCRA e a União ao cumprimento de obrigações de fazer destinadas à efetivação da política fundiária. As ações individuais discutem a existência ou não do direito de particulares à proteção possessória. Assim, considerando-se que as demandas individuais estão prontas para julgamento e que a ação coletiva permanece em fase processual menos avançada, é recomendável a resolução das primeiras. 2.1 Processo n. 1000119-55.2024.4.01.4100 Cabimento da ação Entre particulares, não há dúvida quanto à vedação de reconhecimento do domínio em ação possessória, nos termos do art. 557 do CPC. Porém, no caso sob exame, o opoente alega que a área objeto do litígio originário pertence ao patrimônio público federal. Nessa circunstância, é admissível a discussão relativa ao domínio, já que a posse exercida pelo Estado é decorrência do próprio direito de propriedade. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: SÚMULA 637. O ente público detém legitimidade e interesse para intervir, incidentalmente, na ação possessória entre particulares, podendo deduzir qualquer matéria defensiva, inclusive, se for o caso, o domínio. (STJ, Corte Especial, enunciado aprovado em 06/11/2019, DJe 11/11/2019) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OPOSIÇÃO. NATUREZA POSSESSÓRIA. IMÓVEL PÚBLICO DESTINADO À REFORMA AGRÁRIA. ART. 923 DO CPC/1973. DISCUSSÃO DA POSSE COMO DESDOBRAMENTO DO DIREITO DE PROPRIEDADE. 1. Caso em que, na origem, o Incra opôs-se à pretensão de particulares litigantes em ação de reintegração de posse, sob a alegação de que se tratava de imóvel da União afetado a programa de reforma agrária. 2. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região consignou: “Nesse contexto, o Opoente (INCRA) sustenta que seu direito à posse deve ser declarado no feito em detrimento da posse exercida e alegada pelos opostos, porque ele detém o domínio das terras. Ao apreciar o recurso, constato que não assiste razão ao Recorrente, uma vez que os juízos possessórios e petitórios não se misturem, sendo vedado ao Opoente (INCRA) aproveitar-se do processo instaurado entre os litigantes primitivos, deduzindo, porém, pedido cujo objeto é diverso do discutido entre os Opostos. Isso porque o primeiro processo tem por objeto a tutela possessória e a oposição tem por objeto tutela petitória, uma vez que o INCRA busca reivindicar/imitir-se na posse do bem em questão, não havendo dúvidas quanto à sua natureza petitória”. 3. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, recentemente, no julgamento dos EREsp 1.296.991/DF (DJe 27/2/2019), firmou a tese de que, nos casos em que o imóvel objeto do litígio é público, como aqueles destinados à Reforma Agrária, a discussão da posse em ação possessória decorre do próprio direito de propriedade, não se aplicando a restrição normativa prevista no art. 923 do CPC/1973 (557 do CPC/2015). 4. Ficou consignado no referido julgado que exigir do poder público o exercício de poder de fato sobre a coisa, especialmente nos casos em que a posse está relacionada a grandes extensões de terra destinadas à Reforma Agrária, inviabilizaria a referida política pública. Interpretação diversa importa, no caso concreto, em sobrepor o interesse privado dos particulares à posse do imóvel ao interesse público primário da efetivação da política pública de reforma agrária. 5. Recurso Especial provido. (STJ, Segunda Turma, REsp 1.819.861/MT, DJe 19/12/2019) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DISCUSSÃO EM TORNO DE POSSE/PROPRIEDADE DE TERRA PÚBLICA. AÇÃO POSSESSÓRIA ENTRE PARTICULARES. OPOSIÇÃO DO INCRA. POSSIBILIDADE. POSSE SOBRE BEM DOMINIAL. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 923 DO CPC/1973, ATUAL ART. 557 DO CÓDIGO FUX. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES DESPROVIDO. 1. A leitura atenta dos autos revela tratar-se a lide de disputa de natureza possessória entre particulares, tendo como objeto terra pública. O INCRA, então, interveio como terceiro na condição de opoente, buscando demonstrar o domínio da União e, consequentemente, a posse, por se tratar de bem dominial. 2. O comando normativo do art. 923 do CPC/1973 (atual 557 do Código Fux) proíbe a busca do reconhecimento judicial de domínio, tanto pelo autor quanto pelo réu, enquanto pendente de julgamento ação possessória. No presente caso, todavia, o INCRA buscou opor-se para defender a posse do bem dominial, sendo que essa posse decorre do próprio domínio, e não de atos de posse propriamente ditos. Destaca-se o presente caso pela circunstância de que a forma do exercício de posse de bens públicos dominiais por parte do Poder Público não depende da verificação de atos concretos de posse, o que faz com que seja impossível para a União levantar discussão possessória sem que, ao mesmo tempo, fale do próprio domínio que legitima essa posse. 3. O critério (ou princípio) da melhor posse, o qual costuma prevalecer no julgamento de semelhantes demandas, leva em conta a posse mais antiga. Como a única posse legítima, no presente caso, é a da União - muito embora, relembre-se, nada impeça a discussão judicial entre particulares a respeito de detenção -, é justo que seja-lhe concedida a oportunidade de se manifestar a respeito da posse do imóvel objeto de litígio, o que, pela natureza do próprio objeto, força a necessidade de demonstração da propriedade. 4. Nesse contexto, é imperativo admitir a oposição do INCRA, permitindo sua intervenção nos autos. 5. Agravo Interno dos Particulares desprovido. (STJ, Primeira Turma, AgInt no REsp 1.820.051/PA, DJe 17/11/2020) Não há, portanto, óbice processual à ação petitória manejada pela autarquia federal para se opor à ação possessória entre particulares. Mérito A ação principal tem por objeto um imóvel rural com aproximadamente 160 hectares localizado no distrito de Jaci Paraná, município de Porto Velho/RO. O INCRA alega que o referido lote está inserido em gleba de propriedade da União. A autarquia também afirma que, embora a área seja passível de regularização fundiária, o processo instaurado pela autora ainda não foi concluído, de modo que a requerente exerce mera detenção. A autora da ação possessória instruiu a petição inicial com cópia do processo administrativo n. 56422.000195/2012-23 (ID 970641673, p. 24/46, dos autos n. 1003226-78.2022.4.01.4100). Os documentos ali acostados confirmam que o imóvel está inserido na Gleba Capitão Sílvio (p. 30/31) e que esta se encontra registrada em nome da União (p. 34). Não há notícia de que o procedimento de regularização tenha sido finalizado, tampouco da emissão de título em favor da requerente. Conclui-se assim que a área em litígio permanece sob o domínio da União. Convém ressaltar que o regime jurídico para o reconhecimento de posse de particulares sobre áreas públicas é distinto daquele aplicável às áreas privadas. Em se tratando de área particular, considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do Código Civil). Porém, em se tratando de imóvel de propriedade do poder público, o direito de posse somente pode ser reconhecido ao particular quando evidenciada a existência de consentimento expresso do proprietário com a ocupação, em razão da natureza indisponível e imprescritível dos bens públicos. No caso em apreço, não foi demonstrado o assentimento da União ou do INCRA com a ocupação. Em complemento, a ausência de oposição do poder público não legitima a ocupação de seus bens por particulares. Conforme mencionado em linhas anteriores, os bens públicos são dotados das prerrogativas de indisponibilidade e imprescritibilidade, de forma que eventual falta de fiscalização pela Administração Pública não pode ter como consequência a validação de ocupações irregulares, em prejuízo à coletividade. Portanto, a ocupação exercida pela oposta-autora qualifica-se juridicamente como mera detenção, de caráter precário, insuscetível de retenção ou indenização por benfeitorias, independentemente do tempo de ocupação ou do tipo de atividade econômica desempenhada no local, sendo igualmente impertinente a apuração da boa-fé da ocupante. A matéria encontra-se pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, conforme exemplificam os excertos a seguir: SÚMULA 619. A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias. (STJ, Corte Especial, enunciado aprovado em 24/10/2018, DJe 30/10/2018) AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA PRECLUSA. NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL ADESIVO PARA ATACAR PARTE DO ARESTO. TEMA SUSCITADO APENAS NO AGRAVO REGIMENTAL. INOVAÇÃO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. CIVIL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. OCUPAÇÃO DE BEM PÚBLICO. DESCONHECIMENTO DO VÍCIO. POSSE. IMPOSSIBILIDADE. MERA DETENÇÃO. NATUREZA PRECÁRIA. ART. 1.219 DO CC. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS E DIREITO DE RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. A ocupação de bem público não gera direitos possessórios, e sim mera detenção de natureza precária. 3. Ainda que a parte desconheça vício que inquine seu direito, gozando de boa-fé, não são cabíveis o pagamento de indenização pelas benfeitorias e o reconhecimento do direito de retenção, nos termos do art. 1.219 do CC. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no REsp: 1.319.975/DF, Relator: Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, data de julgamento: 01/12/2015, publicação: DJe 09/12/2015) ADMINISTRATIVO. IMÓVEL DE PROPRIEDADE DO MUNICÍPIO. INEXISTÊNCIA DE ATO FORMAL AUTORIZANDO A OCUPAÇÃO DO IMÓVEL PELO PARTICULAR. IRREGULARIDADE. BOA-FÉ QUE NÃO PODE SER PRESUMIDA. DEVER DE INDENIZAR. EXISTÊNCIA. (...) 3. A partir da simples exposição dos fatos feita pelo acórdão recorrido, verifica-se que a conclusão a que chegou o Tribunal de Justiça bandeirante é equivocada, pois se o instrumento de concessão/permissão administrativa de uso do imóvel não foi formalmente aperfeiçoado, jamais se poderia dizer que houve boa-fé na ocupação. Se o particular passa a usar imóvel público sem que houvesse sido formalmente autorizado a tanto, ele está procedendo de forma evidentemente irregular. 4. Eventual omissão do Poder Público Municipal em adotar as medidas que seriam cabíveis para se opor à ocupação irregular não transforma o ilícito em lícito, diante do princípio da indisponibilidade do interesse público. 5. Sendo o particular detentor de má-fé, responde por todos os frutos que o proprietário deixou de perceber, na forma do art. 1.216 do Código Civil, cujas disposições a respeito do possuidor se aplicam também, com mais razão até, ao simples detentor. E os frutos, em se tratando de imóveis, correspondem aos valores que poderiam ter sido recebidos pelo proprietário. 6. “6. A ocupação, a exploração e o uso de bem público ... só se admitem se contarem com expresso, inequívoco, válido e atual assentimento do Poder Público, exigência inafastável tanto pelo Administrador como pelo Juiz, a qual se mantém incólume, independentemente da ancianidade, finalidade (residencial, comercial ou agrícola) ou grau de interferência nos atributos que justificam sua proteção. ... 9. Na falta de autorização expressa, inequívoca, válida e atual do titular do domínio, a ocupação de área pública é mera detenção ilícita ... 11. A apropriação, ao arrepio da lei, de terras e imóveis públicos ..., além de acarretar o dever de imediata desocupação da área, dá ensejo à aplicação das sanções administrativas e penais previstas na legislação, bem como à obrigação de reparar eventuais danos causados. 16. Inexiste boa-fé contra expressa determinação legal. Ao revés, entende-se agir de má-fé o particular que, sem título expresso, inequívoco, válido e atual ocupa imóvel público, mesmo depois de notificação para abandoná-lo, situação típica de esbulho permanente, em que cabível a imediata reintegração judicial. 17. Na ocupação, uso ou exploração de bem público, a boa-fé é impresumível, requisitando prova cabal a cargo de quem a alega. ... 18. Na gestão e controle dos bens públicos impera o princípio da indisponibilidade, o que significa dizer que eventual inércia ou conivência do servidor público de plantão ... não tem o condão de, pela porta dos fundos da omissão e do consentimento tácito, autorizar aquilo que, pela porta da frente, seria ilegal ...” (REsp 808.708/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 04/05/2011) 7. Recurso Especial provido para reconhecer o dever dos recorridos de indenizarem ao Município desde a data das notificações para desocupação voluntária até a data da efetiva liberação da área pública, devendo o montante ser apurado com base no valor locativo do imóvel, como se apurar em liquidação. (STJ, REsp 1.370.254/SP, Relator: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, data de julgamento: 08/11/2016, publicação: DJe 29/11/2016) PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. BEM PÚBLICO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. MUNICÍPIO DE MACATUBA. OCUPAÇÃO DE NATUREZA PRECÁRIA. AUSÊNCIA DE POSSE. MERA DETENÇÃO. ARTIGO 1.208 DO CÓDIGO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. (…) 4. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que a ocupação de bem público não gera direitos possessórios, e sim mera detenção de natureza precária e afasta o pagamento de indenização pelas benfeitorias, bem como o reconhecimento do direito de retenção, nos termos do art. 1.219 do CC. 5. A jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça quanto do Supremo Tribunal Federal, é firme em não ser possível a posse de bem público, constituindo sua ocupação mera detenção de natureza precária. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: REsp 1.701.620/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017; AgRg no AREsp 824.129/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 1/3/2016, e REsp 932.971/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 26/5/2011. 6. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Especial. (STJ, AREsp 1.725.385/SP, Relator: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, data de julgamento: 09/02/2021, data de publicação: DJe 09/04/2021) Quanto aos opostos-réus (indivíduos que invadiram a área em 2016, dando origem ao litígio principal), é evidente a ausência de direito de posse, porquanto a ocupação inaugurada naquela ocasião deu-se de forma violenta, sem autorização expressa do ente público proprietário em procedimento administrativo instaurado para tal finalidade. A invocação, em termos genéricos e com baixa densidade normativa, ao direito à moradia não constitui fundamento jurídico adequado e suficiente para afastar a pretensão do opoente, que se baseia no direito de propriedade da União, revestido de interesse público e protegido por lei e pela Constituição. Eventual pretensão de ocupar ou permanecer na área objeto da lide deve ser exercida pelos meios legais, e não mediante esbulho de terras públicas como mecanismo de autotutela. Entendimento contrário conduziria ao esvaziamento da legislação agrária – que condiciona o reconhecimento desses direitos à observância do devido processo administrativo e ao preenchimento de requisitos específicos, a serem comprovados em cada caso concreto –, além de configurar incentivo à invasão de imóveis públicos, o que não pode ser admitido. Com essas razões, a procedência do pedido deduzido pelo opoente é medida que se impõe. 2.2 Processo n. 1003226-78.2022.4.01.4100 Nas ações de manutenção e de reintegração de posse, deve a parte autora alegar e provar: (I) a sua posse; (II) a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; (III) a data da turbação ou do desbulho; (IV) a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração (art. 927 do CPC/1973 e art. 561 do CPC/2015). In casu, a autora da ação possessória pretendia reaver a posse de um imóvel rural localizado na Gleba Capitão Sílvio, distrito de Jaci-Paraná, município de Porto Velho/RO. Porém, foi reconhecido, no capítulo de sentença referente à ação de oposição n. 1000119-55.2024.4.01.4100, o direito de posse do INCRA sobre a área em litígio. Considerando-se que ambas as ações têm como fundamento o direito de posse e que foi julgado procedente o pedido formulado na oposição, fica prejudicado o pleito de reintegração apresentado no processo originário. 3 DISPOSITIVO 3.1 Quanto à ação de oposição, resolvo o mérito, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e JULGO PROCEDENTE o pedido para DECLARAR o direito do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO DE REFORMA AGRÁRIA – INCRA de ser reintegrado na posse do imóvel rural identificado por meio do código 950.181.534.943-3, objeto do processo administrativo de regularização fundiária n. 56.422.000195/2012-23. 3.1.1 CONDENO os opostos ao pagamento das custas processuais e dos horários advocatícios em favor do INCRA, os quais fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fulcro no art. 85, § 8°, do Código de Processo Civil. 3.2 Quanto à ação de reintegração de posse, EXTINGO o processo sem resolução do mérito, por perda do objeto (art. 485, inciso VI, in fine, do Código de Processo Civil). 3.2.1 Sem condenação em custas e honorários advocatícios. Caso interposto recurso de apelação, oportunize-se o contraditório. Após, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Transitada em julgado, intimem-se as partes para requererem o que entenderem de direito. Nada sendo requerido, arquivem-se os autos, após as anotações de praxe. Porto Velho, data da assinatura eletrônica. (assinado eletronicamente) JUIZ(A) FEDERAL 5ª Vara/SJRO – Especializada em matéria ambiental e agrária

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Processo nº 3001113-50.2024.8.06.0002

ID: 337852018

Tribunal: TJCE Órgão: 10ª Unidade do Juizado Especial Cível da Comarca de Fortaleza Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3001113-50.2024.8.06.0002

Data de Disponibilização: 30/07/2025

Polo Ativo:

ELVIS CLAY DA SILVA CARVALHO

Polo Passivo:

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

ELVIS CLAY DA SILVA CARVALHO

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsAp… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsApp (exclusivamente) E-MAIL PARA COMUNICAÇÃO: for.10jecc@tjce.jus.br PROCESSO Nº: 3001113-50.2024.8.06.0002 PROMOVENTES: CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT PROMOVIDAS: MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS proposta por CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT em face de MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. Na petição inicial, os autores, Carlos Alberto e Maria Goretti, narram que contrataram um cruzeiro internacional e, por serem idosos, ativaram o seguro viagem vinculado ao cartão Mastercard Black, cuja cobertura é fornecida pela seguradora AIG. Durante a viagem, a autora sofreu uma queda que resultou em fratura na patela, exigindo cuidados médicos urgentes e retorno antecipado ao Brasil. A partir disso, foram realizadas diversas despesas médicas e logísticas, incluindo transporte especial, assistência contínua e passagens aéreas adequadas à condição de saúde da autora. Embora o sinistro tenha sido comunicado e parte dos valores tenha sido reembolsada, os autores alegam que a quantia integral das despesas não foi ressarcida, o que motivou a propositura da demanda. Em razão dos fatos narrados, os autores requerem a condenação das rés Mastercard e AIG ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 22.783,01, correspondente à parte não reembolsada das despesas médicas e de viagem, devidamente atualizada desde o evento danoso. Requerem ainda a condenação ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais, em razão do sofrimento físico, psicológico e das dificuldades financeiras enfrentadas. Pleiteiam também a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova. Na contestação, a AIG Seguros reconhece a existência de apólice de seguro de viagem contratada pelos autores por meio do cartão Mastercard, mas sustenta que todos os reembolsos cabíveis foram devidamente efetuados, conforme os limites de cobertura previstos na apólice. A empresa ré argumenta que o contrato de seguro foi cumprido nos termos pactuados, sendo que algumas das despesas apresentadas pelos autores não estavam cobertas pelas cláusulas contratuais, especialmente no que diz respeito a acompanhantes, passagens em classe executiva e transporte especial. A seguradora também ressalta que eventuais desconfortos ou frustrações enfrentados pelos autores não configuram dano moral indenizável, alegando inexistência de ilicitude ou falha na prestação dos serviços. Diante desses argumentos, a AIG requer a total improcedência dos pedidos formulados na inicial, inclusive o pleito de indenização por danos materiais e morais. Alternativamente, caso superado o pedido de improcedência, requer que eventual condenação observe os limites estabelecidos no contrato de seguro, com aplicação da franquia e das condições de reembolso ali estipuladas. Por fim, pleiteia o reconhecimento da ausência de responsabilidade solidária com a Mastercard e a condenação dos autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Na contestação apresentada, a Mastercard defende sua ilegitimidade passiva, sustentando que não possui vínculo contratual direto com os autores e que sua atuação se restringe à função de bandeira de cartões, sendo a responsabilidade pela contratação e fornecimento do seguro viagem atribuída exclusivamente à instituição financeira emissora do cartão e à seguradora parceira (AIG). A empresa argumenta que não participa da análise, autorização ou negativa de reembolso de sinistros, razão pela qual não pode ser responsabilizada por eventual inadimplemento contratual relacionado à cobertura securitária. A Mastercard também destaca que não há nos autos prova de sua conduta ilícita ou de qualquer falha na prestação de serviços que justifique a sua inclusão no polo passivo da demanda. No mérito, pleiteia a total improcedência dos pedidos formulados pelos autores, sob o argumento de ausência de responsabilidade objetiva ou subjetiva de sua parte. Por fim, requer que eventuais custas processuais e honorários advocatícios sejam suportados pelos autores, nos termos da legislação aplicável. Audiência de instrução realizada (Id 155749174) Réplica (Id 160419328). É o relatório. Decido. PRELIMINAR Em relação à preliminar de falta de interesse de agir a parte ré AIG SEGUROS sustenta que houve a parcial perda superveniente do objeto da presente demanda, visto que, como será visto adiante, este já recebeu a parte que lhe cabia da importância em decorrência do Sinistro nº 235009490 e que teria celebrado instrumento de transação (Id 144379774). O documento juntado é o formulário de pagamento e não se trata de acordo extrajudicial. Ademais, não há que se falar em falta de interesse de agir de modo a inviabilizar o acesso à jurisdição pretendido pela parte autora, razão pela qual rejeito a preliminar suscitada. MÉRITO No mérito, verifica-se que os autores efetivamente celebraram contrato de seguro viagem com a ré AIG Seguros, com cobertura vinculada ao cartão Mastercard Black, conforme certificado e bilhete anexados aos autos Id 129711011 e 129711012. Também restou comprovado que houve a comunicação do sinistro e o pagamento parcial do valor reclamado, totalizando R$ 20.222,56. A Ré AIG SEGUROS juntou aos autos a planilha com os valores aprovados e rejeitados, tendo afirmado que dos valores aprovados restou o saldo de R$ 1.946,23 a ser pago. Vejamos as despesas que foram aprovadas pelo seguro: DESPESAS APROVADAS: • CONSULTA MÉDICA/MEDICAMENTOS - CLÍNICA: HOSPITAL HORACIO ODUBER: 01.06.24 AMBULÂNCIA US$ 250,00 - R$ 1.474,16 01.06.24 BOTICA EAGLE US$ 101,65 - R$ 516,94 IOF US$ 6,48 - R$ 22,64 (OANDA) 01.06.24 ABC MEDICAL US$ 254,44 - R$ 1.266,13 01.06.24 RADIOGRAFIA US$ 830,73 - R$ 4.224,68 IOF US$ 53,00 - R$ 185,04 TOTAL US$ 1.496,30 - R$ 7.689,59 (COBERTO) - CLÍNICA: NORWEGIAN PEARL MEDICAL CENTER 01.07.24 INV 825B854 US$ 235,00 01.08.24 INV F198187 US$ 185,00 01.09.24 INV AF9B0AC US$ 185,00 01.09.24 INV DA41000 US$ 687,00 01.11.24 INV 1002200 US$ 188,00 01.12.24 INV 5D9B0BE US$ 185,00 TOTAL US$ 1.665,00 FESS US$ 39,99 TOTAL US$ 1.704,99 - R$ 8.584,62 IOF US$ 108,77 - R$ 376,00 TOTAL US$ 1.813,76 - R$ 8.960,62 (COBERTO) - PASSAGEM DE RETORNO (PARA PACIENTE): 01.08.24, GOL - FLÓRIDA - BRASIL, 13.01.2024 MARIA R$ 3.810,68 ECONÔMICO R$ 1.707,90 TOTAL R$ 5.518,58 - US$ 1.108,18 (COBERTO) VALOR TOTAL APROVADO: US$ 4.418,24 - R$ 22.168,79 VALOR JÁ PAGO: US$ 4.040,16 - R$ 20.222,56 DIFERENÇA R$ 1.946,23 (VALOR ADICIONAL QUE PODE SER PAGO) Vejamos quais foram as despesas que tiveram a cobertura negada: DESPESAS SEM COBERTURA DESPESAS NÃO COBERTAS POR NÃO TERMOS NOTA FISCAL: 1) TAXA DE CADEIRA DE RODAS R$ 60,00 IOF R$ 13,25 TOTAL R$ 73,25 - US$ 12,42 (NÃO COBERTO) 2) RETORNO NA CLASSE COMFORT (PARA ACOMPANHANTE) NÃO COBERTO PORQUE O PACIENTE NÃO FOI HOSPITALIZADO: 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 CARLOS- R$ 3.810,68 - US$ 646,24 (NÃO COBERTO) 3) OUTRAS PASSAGENS: NÃO COBERTAS PORQUE NÃO HOUVE HOSPITALIZAÇÃO E NÃO SE ENQUADRA COMO ACOMPANHANTE 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 FRANCISCO (GENRO) R$ 3.813,65 CLAUDIA (FILHA) R$ 3.813,65 OUTRAS DESPESAS NÃO COBERTAS: 4) METADE DO CRUZEIRO R$ 9.169,23 TOTAL NÃO COBERTO: R$ 20.680,46 Passo a analisar as despejas rejeitadas pela seguradora. No que se refere à metade do cruzeiro (R$ 9.169,23), verificou-se que não há previsão na apólice (Id 144379773) para indenização. Além disso, o cruzeiro realizado entre 01/01/2024 a 13/01/2024) foi para 4 pessoas, sob o total de R$ 18.038,46 (129711022 - Pág. 9), de modo que ainda que a Autora tenha fraturado a patela em 06/01/2024, ficou usufruindo da hospedagem e alimentação do cruzeiro juntamente com os seus familiares, tendo retornado ao Brasil somente no último dia do cruzeiro (13/01/2024). No que se refere à cadeira de rodas, tendo em vista a ausência de nota fiscal ou comprovante, não há que se falar em reembolso. Em relação as passagens aéreas, verifica-se que na apólice da autora consta na apólice o seguinte: Retorno em Classe Executiva: Se uma Pessoa Elegível for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita fora do seu País de Residência, por mais de 24 horas, a cobertura pode ser fornecida para pagar o custo da passagem aérea para o retorno da Pessoa Elegível, Cônjuge ou Companheiro(a) ou companheiro de viagem para retornar ao seu país de residência ou destino, se for considerado necessário acompanhar a Pessoa Elegível durante uma Remoção Médica de Emergência (Id 144379773 pág. 28). Desse modo, a Autora foi reembolsada pelo seu retorno na classe executiva, mas o seu cônjuge não foi pelo fato de a autora não ter sido hospitalizada por mais de 3 dias e nem ter viajado sozinha. Vejamos: Acompanhante em Caso de Hospitalização Prolongada e Hospedagem: Se uma Pessoa Elegível estiver viajando sozinha e for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita por mais de 3 (três) dias enquanto estiver fora do seu País de Origem, os benefícios podem ser fornecidos para trazer 1 (um) membro imediato da família ou um amigo escolhido pela Pessoa Elegível para ficar ao lado da Pessoa Elegível. Os benefícios estão disponíveis para pagamento dos custos de passagem aérea e diária de hotel até um máximo de 5 (cinco) dias. Ora, se a autora tivesse se enquadrado nessa hipótese, o que não é o caso nos autos, somente seria possível eleger um membro para lhe acompanhar, mas a autora pleiteia o reembolso de passagens do seu cônjuge, filha e genro, sob o argumento de que pelo fato de ter ficado no quarto da cabine do cruzeiro estaria "internada", mas tal interpretação não consta na apólice e, portanto, não merece prosperar. Desse modo, ao contrário do que sustentam os autores, não se pode afirmar que houve descumprimento contratual por parte da seguradora. O contrato de seguro, como pacto bilateral, possui cláusulas limitativas expressas que vinculam ambas as partes. Tais cláusulas, nos termos do artigo 757 do Código Civil, devem ser respeitadas, especialmente no que tange à natureza da cobertura, valores máximos reembolsáveis e requisitos formais para a caracterização do sinistro. A análise dos documentos juntados revela que todas as despesas apresentadas pelos autores refere-se a serviços não cobertos pela apólice, tais como acomodação em classe executiva para acompanhantes, custos do cruzeiro, retorno de terceiros não segurados. Tais despesas, embora possam ter sido necessárias do ponto de vista humanitário ou prático, não se enquadram nas condições da apólice como obrigações assumidas pela seguradora. Ressalta-se que, embora a proteção do consumidor seja princípio basilar das relações de consumo, conforme artigo 4º, inciso I, e artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), tal proteção não implica a eliminação das obrigações contratuais nem permite a interpretação extensiva de coberturas não contratadas. Cabe ao julgador zelar pela segurança jurídica, respeitando os limites legais e contratuais livremente pactuados pelas partes. Ademais, quanto ao pedido de indenização por danos morais, este também não merece acolhimento. A simples frustração de expectativa ou a negativa parcial de reembolso, quando respaldada em cláusulas contratuais válidas, não configura, por si só, abalo moral indenizável. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o mero inadimplemento contratual, ausente ilicitude ou abusividade, não gera direito à compensação extrapatrimonial. Por todo o exposto, conclui-se que a seguradora não extrapolou os limites contratuais da cobertura nem agiu com má-fé ou abuso de direito, razão pela qual não há que se falar em reparação por dano moral ou pagamento adicional por dano material. Por fim, no que se refere ao valor indicado pela AIG SEGUROS como remanescente das despesas aprovadas pela seguradora, tais valores não estão sendo pleiteadas em juízo na petição inicial, de modo que não cabe ao juízo analisar, sob pena de configuração de sentença ultra petita. DISPOSITIVO Diante do exposto, rejeito a preliminar suscitada e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar em custas e honorários, por não serem devidos, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Ultimadas as providências, certificar e arquivar os autos, independente de despacho. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. Bárbara Martins Silva Juíza Leiga Pela MM. Juíza de Direito foi proferida a seguinte Sentença: Nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, HOMOLOGO o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga, para que surta seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Intimem-se. Expedientes necessários. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. MARIA DO SOCORRO MONTEZUMA BULCÃO JUIZA DE DIREITO TITULAR

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 3001113-50.2024.8.06.0002

ID: 337852055

Tribunal: TJCE Órgão: 10ª Unidade do Juizado Especial Cível da Comarca de Fortaleza Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3001113-50.2024.8.06.0002

Data de Disponibilização: 30/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DECIO FLAVIO GONCALVES TORRES FREIRE

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

DENNYS LOPES ZIMMERMANN PINTA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

DECIO FLAVIO GONCALVES TORRES FREIRE

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsAp… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsApp (exclusivamente) E-MAIL PARA COMUNICAÇÃO: for.10jecc@tjce.jus.br PROCESSO Nº: 3001113-50.2024.8.06.0002 PROMOVENTES: CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT PROMOVIDAS: MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS proposta por CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT em face de MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. Na petição inicial, os autores, Carlos Alberto e Maria Goretti, narram que contrataram um cruzeiro internacional e, por serem idosos, ativaram o seguro viagem vinculado ao cartão Mastercard Black, cuja cobertura é fornecida pela seguradora AIG. Durante a viagem, a autora sofreu uma queda que resultou em fratura na patela, exigindo cuidados médicos urgentes e retorno antecipado ao Brasil. A partir disso, foram realizadas diversas despesas médicas e logísticas, incluindo transporte especial, assistência contínua e passagens aéreas adequadas à condição de saúde da autora. Embora o sinistro tenha sido comunicado e parte dos valores tenha sido reembolsada, os autores alegam que a quantia integral das despesas não foi ressarcida, o que motivou a propositura da demanda. Em razão dos fatos narrados, os autores requerem a condenação das rés Mastercard e AIG ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 22.783,01, correspondente à parte não reembolsada das despesas médicas e de viagem, devidamente atualizada desde o evento danoso. Requerem ainda a condenação ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais, em razão do sofrimento físico, psicológico e das dificuldades financeiras enfrentadas. Pleiteiam também a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova. Na contestação, a AIG Seguros reconhece a existência de apólice de seguro de viagem contratada pelos autores por meio do cartão Mastercard, mas sustenta que todos os reembolsos cabíveis foram devidamente efetuados, conforme os limites de cobertura previstos na apólice. A empresa ré argumenta que o contrato de seguro foi cumprido nos termos pactuados, sendo que algumas das despesas apresentadas pelos autores não estavam cobertas pelas cláusulas contratuais, especialmente no que diz respeito a acompanhantes, passagens em classe executiva e transporte especial. A seguradora também ressalta que eventuais desconfortos ou frustrações enfrentados pelos autores não configuram dano moral indenizável, alegando inexistência de ilicitude ou falha na prestação dos serviços. Diante desses argumentos, a AIG requer a total improcedência dos pedidos formulados na inicial, inclusive o pleito de indenização por danos materiais e morais. Alternativamente, caso superado o pedido de improcedência, requer que eventual condenação observe os limites estabelecidos no contrato de seguro, com aplicação da franquia e das condições de reembolso ali estipuladas. Por fim, pleiteia o reconhecimento da ausência de responsabilidade solidária com a Mastercard e a condenação dos autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Na contestação apresentada, a Mastercard defende sua ilegitimidade passiva, sustentando que não possui vínculo contratual direto com os autores e que sua atuação se restringe à função de bandeira de cartões, sendo a responsabilidade pela contratação e fornecimento do seguro viagem atribuída exclusivamente à instituição financeira emissora do cartão e à seguradora parceira (AIG). A empresa argumenta que não participa da análise, autorização ou negativa de reembolso de sinistros, razão pela qual não pode ser responsabilizada por eventual inadimplemento contratual relacionado à cobertura securitária. A Mastercard também destaca que não há nos autos prova de sua conduta ilícita ou de qualquer falha na prestação de serviços que justifique a sua inclusão no polo passivo da demanda. No mérito, pleiteia a total improcedência dos pedidos formulados pelos autores, sob o argumento de ausência de responsabilidade objetiva ou subjetiva de sua parte. Por fim, requer que eventuais custas processuais e honorários advocatícios sejam suportados pelos autores, nos termos da legislação aplicável. Audiência de instrução realizada (Id 155749174) Réplica (Id 160419328). É o relatório. Decido. PRELIMINAR Em relação à preliminar de falta de interesse de agir a parte ré AIG SEGUROS sustenta que houve a parcial perda superveniente do objeto da presente demanda, visto que, como será visto adiante, este já recebeu a parte que lhe cabia da importância em decorrência do Sinistro nº 235009490 e que teria celebrado instrumento de transação (Id 144379774). O documento juntado é o formulário de pagamento e não se trata de acordo extrajudicial. Ademais, não há que se falar em falta de interesse de agir de modo a inviabilizar o acesso à jurisdição pretendido pela parte autora, razão pela qual rejeito a preliminar suscitada. MÉRITO No mérito, verifica-se que os autores efetivamente celebraram contrato de seguro viagem com a ré AIG Seguros, com cobertura vinculada ao cartão Mastercard Black, conforme certificado e bilhete anexados aos autos Id 129711011 e 129711012. Também restou comprovado que houve a comunicação do sinistro e o pagamento parcial do valor reclamado, totalizando R$ 20.222,56. A Ré AIG SEGUROS juntou aos autos a planilha com os valores aprovados e rejeitados, tendo afirmado que dos valores aprovados restou o saldo de R$ 1.946,23 a ser pago. Vejamos as despesas que foram aprovadas pelo seguro: DESPESAS APROVADAS: • CONSULTA MÉDICA/MEDICAMENTOS - CLÍNICA: HOSPITAL HORACIO ODUBER: 01.06.24 AMBULÂNCIA US$ 250,00 - R$ 1.474,16 01.06.24 BOTICA EAGLE US$ 101,65 - R$ 516,94 IOF US$ 6,48 - R$ 22,64 (OANDA) 01.06.24 ABC MEDICAL US$ 254,44 - R$ 1.266,13 01.06.24 RADIOGRAFIA US$ 830,73 - R$ 4.224,68 IOF US$ 53,00 - R$ 185,04 TOTAL US$ 1.496,30 - R$ 7.689,59 (COBERTO) - CLÍNICA: NORWEGIAN PEARL MEDICAL CENTER 01.07.24 INV 825B854 US$ 235,00 01.08.24 INV F198187 US$ 185,00 01.09.24 INV AF9B0AC US$ 185,00 01.09.24 INV DA41000 US$ 687,00 01.11.24 INV 1002200 US$ 188,00 01.12.24 INV 5D9B0BE US$ 185,00 TOTAL US$ 1.665,00 FESS US$ 39,99 TOTAL US$ 1.704,99 - R$ 8.584,62 IOF US$ 108,77 - R$ 376,00 TOTAL US$ 1.813,76 - R$ 8.960,62 (COBERTO) - PASSAGEM DE RETORNO (PARA PACIENTE): 01.08.24, GOL - FLÓRIDA - BRASIL, 13.01.2024 MARIA R$ 3.810,68 ECONÔMICO R$ 1.707,90 TOTAL R$ 5.518,58 - US$ 1.108,18 (COBERTO) VALOR TOTAL APROVADO: US$ 4.418,24 - R$ 22.168,79 VALOR JÁ PAGO: US$ 4.040,16 - R$ 20.222,56 DIFERENÇA R$ 1.946,23 (VALOR ADICIONAL QUE PODE SER PAGO) Vejamos quais foram as despesas que tiveram a cobertura negada: DESPESAS SEM COBERTURA DESPESAS NÃO COBERTAS POR NÃO TERMOS NOTA FISCAL: 1) TAXA DE CADEIRA DE RODAS R$ 60,00 IOF R$ 13,25 TOTAL R$ 73,25 - US$ 12,42 (NÃO COBERTO) 2) RETORNO NA CLASSE COMFORT (PARA ACOMPANHANTE) NÃO COBERTO PORQUE O PACIENTE NÃO FOI HOSPITALIZADO: 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 CARLOS- R$ 3.810,68 - US$ 646,24 (NÃO COBERTO) 3) OUTRAS PASSAGENS: NÃO COBERTAS PORQUE NÃO HOUVE HOSPITALIZAÇÃO E NÃO SE ENQUADRA COMO ACOMPANHANTE 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 FRANCISCO (GENRO) R$ 3.813,65 CLAUDIA (FILHA) R$ 3.813,65 OUTRAS DESPESAS NÃO COBERTAS: 4) METADE DO CRUZEIRO R$ 9.169,23 TOTAL NÃO COBERTO: R$ 20.680,46 Passo a analisar as despejas rejeitadas pela seguradora. No que se refere à metade do cruzeiro (R$ 9.169,23), verificou-se que não há previsão na apólice (Id 144379773) para indenização. Além disso, o cruzeiro realizado entre 01/01/2024 a 13/01/2024) foi para 4 pessoas, sob o total de R$ 18.038,46 (129711022 - Pág. 9), de modo que ainda que a Autora tenha fraturado a patela em 06/01/2024, ficou usufruindo da hospedagem e alimentação do cruzeiro juntamente com os seus familiares, tendo retornado ao Brasil somente no último dia do cruzeiro (13/01/2024). No que se refere à cadeira de rodas, tendo em vista a ausência de nota fiscal ou comprovante, não há que se falar em reembolso. Em relação as passagens aéreas, verifica-se que na apólice da autora consta na apólice o seguinte: Retorno em Classe Executiva: Se uma Pessoa Elegível for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita fora do seu País de Residência, por mais de 24 horas, a cobertura pode ser fornecida para pagar o custo da passagem aérea para o retorno da Pessoa Elegível, Cônjuge ou Companheiro(a) ou companheiro de viagem para retornar ao seu país de residência ou destino, se for considerado necessário acompanhar a Pessoa Elegível durante uma Remoção Médica de Emergência (Id 144379773 pág. 28). Desse modo, a Autora foi reembolsada pelo seu retorno na classe executiva, mas o seu cônjuge não foi pelo fato de a autora não ter sido hospitalizada por mais de 3 dias e nem ter viajado sozinha. Vejamos: Acompanhante em Caso de Hospitalização Prolongada e Hospedagem: Se uma Pessoa Elegível estiver viajando sozinha e for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita por mais de 3 (três) dias enquanto estiver fora do seu País de Origem, os benefícios podem ser fornecidos para trazer 1 (um) membro imediato da família ou um amigo escolhido pela Pessoa Elegível para ficar ao lado da Pessoa Elegível. Os benefícios estão disponíveis para pagamento dos custos de passagem aérea e diária de hotel até um máximo de 5 (cinco) dias. Ora, se a autora tivesse se enquadrado nessa hipótese, o que não é o caso nos autos, somente seria possível eleger um membro para lhe acompanhar, mas a autora pleiteia o reembolso de passagens do seu cônjuge, filha e genro, sob o argumento de que pelo fato de ter ficado no quarto da cabine do cruzeiro estaria "internada", mas tal interpretação não consta na apólice e, portanto, não merece prosperar. Desse modo, ao contrário do que sustentam os autores, não se pode afirmar que houve descumprimento contratual por parte da seguradora. O contrato de seguro, como pacto bilateral, possui cláusulas limitativas expressas que vinculam ambas as partes. Tais cláusulas, nos termos do artigo 757 do Código Civil, devem ser respeitadas, especialmente no que tange à natureza da cobertura, valores máximos reembolsáveis e requisitos formais para a caracterização do sinistro. A análise dos documentos juntados revela que todas as despesas apresentadas pelos autores refere-se a serviços não cobertos pela apólice, tais como acomodação em classe executiva para acompanhantes, custos do cruzeiro, retorno de terceiros não segurados. Tais despesas, embora possam ter sido necessárias do ponto de vista humanitário ou prático, não se enquadram nas condições da apólice como obrigações assumidas pela seguradora. Ressalta-se que, embora a proteção do consumidor seja princípio basilar das relações de consumo, conforme artigo 4º, inciso I, e artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), tal proteção não implica a eliminação das obrigações contratuais nem permite a interpretação extensiva de coberturas não contratadas. Cabe ao julgador zelar pela segurança jurídica, respeitando os limites legais e contratuais livremente pactuados pelas partes. Ademais, quanto ao pedido de indenização por danos morais, este também não merece acolhimento. A simples frustração de expectativa ou a negativa parcial de reembolso, quando respaldada em cláusulas contratuais válidas, não configura, por si só, abalo moral indenizável. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o mero inadimplemento contratual, ausente ilicitude ou abusividade, não gera direito à compensação extrapatrimonial. Por todo o exposto, conclui-se que a seguradora não extrapolou os limites contratuais da cobertura nem agiu com má-fé ou abuso de direito, razão pela qual não há que se falar em reparação por dano moral ou pagamento adicional por dano material. Por fim, no que se refere ao valor indicado pela AIG SEGUROS como remanescente das despesas aprovadas pela seguradora, tais valores não estão sendo pleiteadas em juízo na petição inicial, de modo que não cabe ao juízo analisar, sob pena de configuração de sentença ultra petita. DISPOSITIVO Diante do exposto, rejeito a preliminar suscitada e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar em custas e honorários, por não serem devidos, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Ultimadas as providências, certificar e arquivar os autos, independente de despacho. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. Bárbara Martins Silva Juíza Leiga Pela MM. Juíza de Direito foi proferida a seguinte Sentença: Nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, HOMOLOGO o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga, para que surta seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Intimem-se. Expedientes necessários. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. MARIA DO SOCORRO MONTEZUMA BULCÃO JUIZA DE DIREITO TITULAR

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 3001113-50.2024.8.06.0002

ID: 337852084

Tribunal: TJCE Órgão: 10ª Unidade do Juizado Especial Cível da Comarca de Fortaleza Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3001113-50.2024.8.06.0002

Data de Disponibilização: 30/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DENNYS LOPES ZIMMERMANN PINTA

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

DENNYS LOPES ZIMMERMANN PINTA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

DECIO FLAVIO GONCALVES TORRES FREIRE

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsAp… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE FORTALEZA 10ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - PJE Rua Mário Mamede, 1301 - Fátima. CEP 60.415-000 - Fortaleza-CE (85)3488-7327 / (85)3488-7311 WhatsApp (exclusivamente) E-MAIL PARA COMUNICAÇÃO: for.10jecc@tjce.jus.br PROCESSO Nº: 3001113-50.2024.8.06.0002 PROMOVENTES: CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT PROMOVIDAS: MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS proposta por CARLOS ALBERTO DE NORÕES MILFONT e MARIA GORETTI DE NORÕES MILFONT em face de MASTERCARD BRASIL SOLUÇÕES DE PAGAMENTO LTDA e AIG SEGUROS BRASIL S.A. Na petição inicial, os autores, Carlos Alberto e Maria Goretti, narram que contrataram um cruzeiro internacional e, por serem idosos, ativaram o seguro viagem vinculado ao cartão Mastercard Black, cuja cobertura é fornecida pela seguradora AIG. Durante a viagem, a autora sofreu uma queda que resultou em fratura na patela, exigindo cuidados médicos urgentes e retorno antecipado ao Brasil. A partir disso, foram realizadas diversas despesas médicas e logísticas, incluindo transporte especial, assistência contínua e passagens aéreas adequadas à condição de saúde da autora. Embora o sinistro tenha sido comunicado e parte dos valores tenha sido reembolsada, os autores alegam que a quantia integral das despesas não foi ressarcida, o que motivou a propositura da demanda. Em razão dos fatos narrados, os autores requerem a condenação das rés Mastercard e AIG ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 22.783,01, correspondente à parte não reembolsada das despesas médicas e de viagem, devidamente atualizada desde o evento danoso. Requerem ainda a condenação ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais, em razão do sofrimento físico, psicológico e das dificuldades financeiras enfrentadas. Pleiteiam também a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova. Na contestação, a AIG Seguros reconhece a existência de apólice de seguro de viagem contratada pelos autores por meio do cartão Mastercard, mas sustenta que todos os reembolsos cabíveis foram devidamente efetuados, conforme os limites de cobertura previstos na apólice. A empresa ré argumenta que o contrato de seguro foi cumprido nos termos pactuados, sendo que algumas das despesas apresentadas pelos autores não estavam cobertas pelas cláusulas contratuais, especialmente no que diz respeito a acompanhantes, passagens em classe executiva e transporte especial. A seguradora também ressalta que eventuais desconfortos ou frustrações enfrentados pelos autores não configuram dano moral indenizável, alegando inexistência de ilicitude ou falha na prestação dos serviços. Diante desses argumentos, a AIG requer a total improcedência dos pedidos formulados na inicial, inclusive o pleito de indenização por danos materiais e morais. Alternativamente, caso superado o pedido de improcedência, requer que eventual condenação observe os limites estabelecidos no contrato de seguro, com aplicação da franquia e das condições de reembolso ali estipuladas. Por fim, pleiteia o reconhecimento da ausência de responsabilidade solidária com a Mastercard e a condenação dos autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Na contestação apresentada, a Mastercard defende sua ilegitimidade passiva, sustentando que não possui vínculo contratual direto com os autores e que sua atuação se restringe à função de bandeira de cartões, sendo a responsabilidade pela contratação e fornecimento do seguro viagem atribuída exclusivamente à instituição financeira emissora do cartão e à seguradora parceira (AIG). A empresa argumenta que não participa da análise, autorização ou negativa de reembolso de sinistros, razão pela qual não pode ser responsabilizada por eventual inadimplemento contratual relacionado à cobertura securitária. A Mastercard também destaca que não há nos autos prova de sua conduta ilícita ou de qualquer falha na prestação de serviços que justifique a sua inclusão no polo passivo da demanda. No mérito, pleiteia a total improcedência dos pedidos formulados pelos autores, sob o argumento de ausência de responsabilidade objetiva ou subjetiva de sua parte. Por fim, requer que eventuais custas processuais e honorários advocatícios sejam suportados pelos autores, nos termos da legislação aplicável. Audiência de instrução realizada (Id 155749174) Réplica (Id 160419328). É o relatório. Decido. PRELIMINAR Em relação à preliminar de falta de interesse de agir a parte ré AIG SEGUROS sustenta que houve a parcial perda superveniente do objeto da presente demanda, visto que, como será visto adiante, este já recebeu a parte que lhe cabia da importância em decorrência do Sinistro nº 235009490 e que teria celebrado instrumento de transação (Id 144379774). O documento juntado é o formulário de pagamento e não se trata de acordo extrajudicial. Ademais, não há que se falar em falta de interesse de agir de modo a inviabilizar o acesso à jurisdição pretendido pela parte autora, razão pela qual rejeito a preliminar suscitada. MÉRITO No mérito, verifica-se que os autores efetivamente celebraram contrato de seguro viagem com a ré AIG Seguros, com cobertura vinculada ao cartão Mastercard Black, conforme certificado e bilhete anexados aos autos Id 129711011 e 129711012. Também restou comprovado que houve a comunicação do sinistro e o pagamento parcial do valor reclamado, totalizando R$ 20.222,56. A Ré AIG SEGUROS juntou aos autos a planilha com os valores aprovados e rejeitados, tendo afirmado que dos valores aprovados restou o saldo de R$ 1.946,23 a ser pago. Vejamos as despesas que foram aprovadas pelo seguro: DESPESAS APROVADAS: • CONSULTA MÉDICA/MEDICAMENTOS - CLÍNICA: HOSPITAL HORACIO ODUBER: 01.06.24 AMBULÂNCIA US$ 250,00 - R$ 1.474,16 01.06.24 BOTICA EAGLE US$ 101,65 - R$ 516,94 IOF US$ 6,48 - R$ 22,64 (OANDA) 01.06.24 ABC MEDICAL US$ 254,44 - R$ 1.266,13 01.06.24 RADIOGRAFIA US$ 830,73 - R$ 4.224,68 IOF US$ 53,00 - R$ 185,04 TOTAL US$ 1.496,30 - R$ 7.689,59 (COBERTO) - CLÍNICA: NORWEGIAN PEARL MEDICAL CENTER 01.07.24 INV 825B854 US$ 235,00 01.08.24 INV F198187 US$ 185,00 01.09.24 INV AF9B0AC US$ 185,00 01.09.24 INV DA41000 US$ 687,00 01.11.24 INV 1002200 US$ 188,00 01.12.24 INV 5D9B0BE US$ 185,00 TOTAL US$ 1.665,00 FESS US$ 39,99 TOTAL US$ 1.704,99 - R$ 8.584,62 IOF US$ 108,77 - R$ 376,00 TOTAL US$ 1.813,76 - R$ 8.960,62 (COBERTO) - PASSAGEM DE RETORNO (PARA PACIENTE): 01.08.24, GOL - FLÓRIDA - BRASIL, 13.01.2024 MARIA R$ 3.810,68 ECONÔMICO R$ 1.707,90 TOTAL R$ 5.518,58 - US$ 1.108,18 (COBERTO) VALOR TOTAL APROVADO: US$ 4.418,24 - R$ 22.168,79 VALOR JÁ PAGO: US$ 4.040,16 - R$ 20.222,56 DIFERENÇA R$ 1.946,23 (VALOR ADICIONAL QUE PODE SER PAGO) Vejamos quais foram as despesas que tiveram a cobertura negada: DESPESAS SEM COBERTURA DESPESAS NÃO COBERTAS POR NÃO TERMOS NOTA FISCAL: 1) TAXA DE CADEIRA DE RODAS R$ 60,00 IOF R$ 13,25 TOTAL R$ 73,25 - US$ 12,42 (NÃO COBERTO) 2) RETORNO NA CLASSE COMFORT (PARA ACOMPANHANTE) NÃO COBERTO PORQUE O PACIENTE NÃO FOI HOSPITALIZADO: 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 CARLOS- R$ 3.810,68 - US$ 646,24 (NÃO COBERTO) 3) OUTRAS PASSAGENS: NÃO COBERTAS PORQUE NÃO HOUVE HOSPITALIZAÇÃO E NÃO SE ENQUADRA COMO ACOMPANHANTE 01.08.24, GOL - FLORIDA - BRASIL, 01.13.2024 FRANCISCO (GENRO) R$ 3.813,65 CLAUDIA (FILHA) R$ 3.813,65 OUTRAS DESPESAS NÃO COBERTAS: 4) METADE DO CRUZEIRO R$ 9.169,23 TOTAL NÃO COBERTO: R$ 20.680,46 Passo a analisar as despejas rejeitadas pela seguradora. No que se refere à metade do cruzeiro (R$ 9.169,23), verificou-se que não há previsão na apólice (Id 144379773) para indenização. Além disso, o cruzeiro realizado entre 01/01/2024 a 13/01/2024) foi para 4 pessoas, sob o total de R$ 18.038,46 (129711022 - Pág. 9), de modo que ainda que a Autora tenha fraturado a patela em 06/01/2024, ficou usufruindo da hospedagem e alimentação do cruzeiro juntamente com os seus familiares, tendo retornado ao Brasil somente no último dia do cruzeiro (13/01/2024). No que se refere à cadeira de rodas, tendo em vista a ausência de nota fiscal ou comprovante, não há que se falar em reembolso. Em relação as passagens aéreas, verifica-se que na apólice da autora consta na apólice o seguinte: Retorno em Classe Executiva: Se uma Pessoa Elegível for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita fora do seu País de Residência, por mais de 24 horas, a cobertura pode ser fornecida para pagar o custo da passagem aérea para o retorno da Pessoa Elegível, Cônjuge ou Companheiro(a) ou companheiro de viagem para retornar ao seu país de residência ou destino, se for considerado necessário acompanhar a Pessoa Elegível durante uma Remoção Médica de Emergência (Id 144379773 pág. 28). Desse modo, a Autora foi reembolsada pelo seu retorno na classe executiva, mas o seu cônjuge não foi pelo fato de a autora não ter sido hospitalizada por mais de 3 dias e nem ter viajado sozinha. Vejamos: Acompanhante em Caso de Hospitalização Prolongada e Hospedagem: Se uma Pessoa Elegível estiver viajando sozinha e for hospitalizada devido a Acidente ou Doença Súbita por mais de 3 (três) dias enquanto estiver fora do seu País de Origem, os benefícios podem ser fornecidos para trazer 1 (um) membro imediato da família ou um amigo escolhido pela Pessoa Elegível para ficar ao lado da Pessoa Elegível. Os benefícios estão disponíveis para pagamento dos custos de passagem aérea e diária de hotel até um máximo de 5 (cinco) dias. Ora, se a autora tivesse se enquadrado nessa hipótese, o que não é o caso nos autos, somente seria possível eleger um membro para lhe acompanhar, mas a autora pleiteia o reembolso de passagens do seu cônjuge, filha e genro, sob o argumento de que pelo fato de ter ficado no quarto da cabine do cruzeiro estaria "internada", mas tal interpretação não consta na apólice e, portanto, não merece prosperar. Desse modo, ao contrário do que sustentam os autores, não se pode afirmar que houve descumprimento contratual por parte da seguradora. O contrato de seguro, como pacto bilateral, possui cláusulas limitativas expressas que vinculam ambas as partes. Tais cláusulas, nos termos do artigo 757 do Código Civil, devem ser respeitadas, especialmente no que tange à natureza da cobertura, valores máximos reembolsáveis e requisitos formais para a caracterização do sinistro. A análise dos documentos juntados revela que todas as despesas apresentadas pelos autores refere-se a serviços não cobertos pela apólice, tais como acomodação em classe executiva para acompanhantes, custos do cruzeiro, retorno de terceiros não segurados. Tais despesas, embora possam ter sido necessárias do ponto de vista humanitário ou prático, não se enquadram nas condições da apólice como obrigações assumidas pela seguradora. Ressalta-se que, embora a proteção do consumidor seja princípio basilar das relações de consumo, conforme artigo 4º, inciso I, e artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), tal proteção não implica a eliminação das obrigações contratuais nem permite a interpretação extensiva de coberturas não contratadas. Cabe ao julgador zelar pela segurança jurídica, respeitando os limites legais e contratuais livremente pactuados pelas partes. Ademais, quanto ao pedido de indenização por danos morais, este também não merece acolhimento. A simples frustração de expectativa ou a negativa parcial de reembolso, quando respaldada em cláusulas contratuais válidas, não configura, por si só, abalo moral indenizável. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o mero inadimplemento contratual, ausente ilicitude ou abusividade, não gera direito à compensação extrapatrimonial. Por todo o exposto, conclui-se que a seguradora não extrapolou os limites contratuais da cobertura nem agiu com má-fé ou abuso de direito, razão pela qual não há que se falar em reparação por dano moral ou pagamento adicional por dano material. Por fim, no que se refere ao valor indicado pela AIG SEGUROS como remanescente das despesas aprovadas pela seguradora, tais valores não estão sendo pleiteadas em juízo na petição inicial, de modo que não cabe ao juízo analisar, sob pena de configuração de sentença ultra petita. DISPOSITIVO Diante do exposto, rejeito a preliminar suscitada e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar em custas e honorários, por não serem devidos, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Ultimadas as providências, certificar e arquivar os autos, independente de despacho. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. Bárbara Martins Silva Juíza Leiga Pela MM. Juíza de Direito foi proferida a seguinte Sentença: Nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, HOMOLOGO o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga, para que surta seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Intimem-se. Expedientes necessários. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. MARIA DO SOCORRO MONTEZUMA BULCÃO JUIZA DE DIREITO TITULAR

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0003344-34.2014.4.01.4300

ID: 336391193

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 27 - DESEMBARGADORA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0003344-34.2014.4.01.4300

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

LUIZ NORBERTO LACERDA MAGALHAES FILHO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ALEXANDER JOSE BUENO TELLES

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0003344-34.2014.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003344-34.2014.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: LUIZ NORBERTO LACERD… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0003344-34.2014.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003344-34.2014.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: LUIZ NORBERTO LACERDA MAGALHAES FILHO REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALEXANDER JOSE BUENO TELLES - GO31739-A POLO PASSIVO:INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DO TOCANTINS e outros RELATOR(A):ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 27 - DESEMBARGADORA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003344-34.2014.4.01.4300 R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL NELSON LIU PITANGA (RELATOR CONVOCADO): Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de alteração do regime de trabalho, de 40 horas semanais sem dedicação exclusiva para 40 horas semanais com dedicação exclusiva, com fundamento na Lei nº 12.772/2012 (ID 36340062, fls. 3-9). Em suas razões recursais, o autor sustenta, em síntese, que a nova legislação (Lei nº 12.772/2012) asseguraria o direito à alteração de regime, invocando tratamento desigual em relação a docentes de outros Institutos Federais que teriam sido autorizados a migrar para o regime de dedicação exclusiva. Alega, ainda, que a negativa administrativa violaria os princípios da isonomia, legalidade, moralidade, eficiência e razoabilidade (ID 36340062, fls. 13-25). Sem contrarrazões. É o relatório. Juiz Federal NELSON LIU PITANGA Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 27 - DESEMBARGADORA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003344-34.2014.4.01.4300 V O T O O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL NELSON LIU PITANGA (RELATOR CONVOCADO): A controvérsia cinge-se à possibilidade de o autor, professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins — IFTO, requerer a alteração de seu regime de trabalho para dedicação exclusiva. Nos termos do art. 22 da Lei nº 12.772/2012, vigente à época do requerimento administrativo, a alteração do regime de trabalho para dedicação exclusiva não se operava automaticamente, tampouco constituía direito subjetivo do servidor, tratando-se de ato discricionário da Administração Pública, condicionado à análise de conveniência, oportunidade e disponibilidade orçamentária, conforme abaixo transcrito: Art. 22. O Professor poderá solicitar a alteração de seu regime de trabalho, mediante proposta que será submetida à sua unidade de lotação. (...) § 2º É vedada a mudança de regime de trabalho aos docentes em estágio probatório. Embora o mencionado § 2º tenha sido posteriormente revogado pela Lei nº 13.325, de 29 de julho de 2016, tal circunstância não interfere no deslinde do presente feito, pois o ato administrativo impugnado foi praticado quando a vedação estava plenamente vigente. No caso concreto, restou incontroverso que o apelante, ao tempo do requerimento administrativo, encontrava-se em estágio probatório, circunstância que, por si só, inviabiliza a alteração pretendida, em razão da vedação prevista no § 2º do mencionado artigo. Ademais, conforme consolidado na jurisprudência, a alteração do regime de trabalho para dedicação exclusiva depende de decisão administrativa fundada na análise das necessidades institucionais e da adequação orçamentária, não configurando direito subjetivo do servidor. O simples fato de o autor exercer jornada de 40 horas semanais sem dedicação exclusiva não lhe confere, automaticamente, direito à alteração pretendida. Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes deste Tribunal: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DOCENTE. MUDANÇA DE REGIME. TEMPO INTEGRAL 40 HORAS PARA DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. LEI N. 12.772/2012. EFEITOS FINANCEIROS RETROATIVOS. IMPOSSIBILIDADE. TERMO INICIAL A CONTAR DA DATA DE PUBLICAÇÃO DO DEFERIMENTO. SENTENÇA. MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Cuida-se, na origem, de ação ajuizada por servidor público objetivando o pagamento de valores retroativos decorrentes da mudança de regime de trabalho para dedicação exclusiva, relativos aos meses de março a outubro de 2013. Na sentença, o juízo a quo rejeitou o pedido por considerar que "não haveria direito subjetivo do autor em ser submetido ao regime de dedicação exclusiva [...], porque poderia implicar em aumento de gastos em desacordo com a lei, além de poder não ser conveniente para a Administração ou do interesse público a criação de mais um cargo de DE em razão de já existir quantitativo satisfatório". 2. Extrai-se do acervo fático-probatório que a parte autora, ora apelante, foi nomeada em 19/03/2012 para o cargo de professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe, com carga horária de 40 (quarenta) horas semanais sem dedicação exclusiva, e tomou posse em 11/04/2012. Ainda do estágio probatório, e já na vigência da Lei n. 12.772, de 28/12/2012, requereu administrativamente, em 22/02/2013, a alteração do seu regime de trabalho para dedicação exclusiva, o que foi negado pela Administração. 3. A negativa da Instituição de Ensino está fundada, entre outros motivos, no § 2º do artigo 22 da Lei n. 12.772/2012, segundo o qual "é vedada a mudança de regime de trabalho aos docentes em estágio probatório", o que revela a legitimidade do ato praticado pela Administração Pública. Posteriormente, a Administração promoveu a alteração do regime mediante a Portaria n. 2447, de 24/10/2013. 4. Com efeito, embora o art. 22 e seu § 1º da Lei 12.772/2012 possibilite a alteração do regime de trabalho do professor, a concessão ou não da alteração insere-se no âmbito da discricionariedade da Administração Pública, uma vez que o legislador deu ampla liberdade aos Institutos Federais para decidirem acerca da mudança de regime de trabalho de seus servidores. 5. O mero pedido administrativo ou o fato de trabalhar 40 (quarenta) horas semanais não confere ao servidor o direito inconteste ao regime de dedicação exclusiva, pois, como bem asseverado na sentença, isso "poderia implicar em aumento de gastos em desacordo com a lei, além de poder não ser conveniente para a Administração ou do interesse publico". 6. Os efeitos financeiros da alteração produzem-se a partir da vigência do ato que formalizou a mudança, no caso, a Portaria n. 2447, de 24/10/2013, editada pelo Reitor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe. Nesse sentido: AC 1002200-13.2020.4.01.4101, DESEMBARGADOR FEDERA EULER DE ALMEIDA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 14/03/2024; AC 1012903-06.2020.4.01.4100, DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 05/12/2023; AC 0005091-09.2005.4.01.3500, DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA MARIA ALVES DA SILVA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 06/05/2011. 7. Apelação não provida. 8. Honorários advocatícios majorados na fase recursal em 1% (um por cento) sobre a mesma base de cálculo definida na sentença, além do percentual já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC). Suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida. (AC 0002621-79.2017.4.01.3307, JUIZ FEDERAL EDUARDO DE MELO GAMA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 30/07/2024 PAG.) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Os embargos de declaração se prestam para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia o juiz se pronunciar de ofício ou a requerimento ou para corrigir erro material. Não dão ensejo à reapreciação da matéria, tampouco à modificação do entendimento firmado no acórdão, uma vez que a mera discordância do embargante com o resultado não se mostra compatível com a via integrativa. Precedentes. 2. O julgado foi claro ao dispor que o primeiro indeferimento da Administração Pública foi legítimo, visto que o art. 22 da Lei n. 12.772/2012 vedava a mudança de regime de trabalho, por requerimento do docente, durante seu estágio probatório. Ainda, quanto ao segundo requerimento administrativo da parte autora, então deferido, não houve demora na apreciação e os efeitos financeiros decorrem da publicação do ato. 3. Consignou-se que "o regime de trabalho para o magistério federal está disposto no artigo 20, incisos I e II e § 1º, da Lei n. 12.772 /2012, o qual estabelece que haverá três regimes de trabalho para os professores federais: de 40 horas semanais, com dedicação exclusiva; de 20 horas semanais; ou de 40 horas semanais, sem de dedicação exclusiva. (...) Portanto, inexistia a alegada obrigatoriedade de enquadramento no regime de 40 horas com dedicação exclusiva a partir da vigência da norma, considerando que outros regimes continuaram a ser admitidos. (...) Além disso, ao tempo do advento da aludida lei, seu art. 22, § 2º, vedava a mudança de regime de trabalho, mediante requerimento do professor, aos docentes em estágio probatório, situação da ora autora ao tempo do primeiro requerimento administrativo." 4. Consoante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, "o Órgão Julgador não está obrigado a rebater pormenorizadamente todos os argumentos apresentados pela parte, bastando que motive o julgado com as razões que entendeu suficientes à formação do seu convencimento" (SS 4836 AgR-ED, relator Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente), Tribunal Pleno, DJe-219 de 04/11/2015). No mesmo sentido: ACO 1.202 ED-ED, relator Ministro André Mendonça, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/2023, DJe-s/n, Publicação em 25/04/2023. 5. Assim, a discordância da embargante com o entendimento exposto desafia a interposição de recursos próprios previstos na legislação processual em vigor, não sendo passível de modificação, portanto, pela via dos embargos de declaração. 6. Embargos de declaração rejeitados. (EDAC 1000445-64.2019.4.01.4302, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 17/12/2024 PAG.) ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DOCENTE. MUDANÇA DE REGIME. TEMPO INTEGRAL 40 HORAS PARA DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. LEI 12.772/2012. EFEITOS FINANCEIROS RETROATIVOS. IMPOSSIBILIDADE. GRATUIDADE JUDICIÁRIA DEFERIDA. AFASTADA A CONDENÇÃO EM MULTAS POR EMBARGOS PROTELATÓRIOS E LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS MANTIDOS. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. 1. A divergência decorre, basicamente, dos seguintes aspectos da relação jurídica de direito material: possibilidade de concessão de efeitos retroativos à alteração de regime funcional, de 40 (quarenta) horas semanais sem dedicação exclusiva para 40 (quarenta) horas semanais com dedicação exclusiva, para que produza efeitos financeiros a partir de 01/03/2013, com a entrada em vigor da Lei 12.772/2012, ou, subsidiariamente, a partir de 15/03/2016, data do protocolo do requerimento administrativo para mudança de regime. 2. Consta dos autos que a parte recorrente foi nomeado em 24/01/2013 para o cargo de professor efetivo da UFT, com carga horária de 40 (quarenta) horas semanais sem dedicação exclusiva, e que tomou posse em 06/02/2013. A parte recorrente informou nas razões de seu recurso que entrou em exercício em 08/02/2013, um pouco antes da vigência da lei (01.03.2013). A lei referida é a Lei 12.772/2012, que revogou vários dispositivos da Lei 11.784/2008. 3. Ainda que a nomeação assegure ao servidor o direito de ser empossado e entrar em exercício no cargo para o qual foi aprovado, sua condição de servidor só se aperfeiçoa com a assinatura do termo de posse (art. 13 da Lei 8.112/90), seguida da efetiva entrada em exercício nas funções do cargo, no prazo de até quinze dias da posse, sob pena de exoneração (art. 15, §§ 1º e 2º, da Lei 8.112/90). No caso, a parte recorrente foi empossada enquanto ainda vigente a Lei 11.784/2008, que previa regime de 40 horas sem dedicação exclusiva. 4. Tendo em vista que o enquadramento inicial do professor ocorreu nos moldes da Lei 11.784/2008, a pretensão de mudança de regime durante o estágio probatório encontra óbice no § 2º do art. 22 da Lei 12.772/2012, vigente ao tempo do pedido administrativo, pois sua revogação só ocorreu com o advento da Lei 13.325/2016. 5. A parte recorrente renovou o seu pedido de mudança de regime para dedicação exclusiva em 07/02/2016, cujo processo foi aberto em 15/03/2016. No documento dirigido ao Reitor da IES, o próprio professor informou: Declaro que permanecerei cumprindo a jornada e carga horária regulamentares, até decisão do presente requerimento. 6. Embora o caput do art. 22 e seu § 1º da Lei 12.772/2012 possibilite a alteração do regime de trabalho do professor, esta fica vinculada à decisão final da autoridade ou Conselho Superior competente. Além da necessidade de verificação dos pressupostos legais para o deferimento da mudança de regime (o que só ocorre ao final do processo), a lei não prevê efeitos financeiros retroativos ao protocolo do pedido administrativo. 7. No caso, não houve demonstração razoável de irregularidade na apreciação administrativa dos pedidos da parte recorrente (tanto no que se refere ao pedido formulado em 2013 quanto ao pedido formulado em 2016), mormente porque amparada em texto expresso de lei, consoante se observa do dispositivo legal vigente ao tempo do pedido administrativo (art. 22, §§ 1º e 2º da Lei 12.772/2012). 8. É defeso ao Poder Judiciário, que não possui função legislativa, estabelecer outras condições para viabilizar a concessão de vantagens a servidores públicos, além daquelas estritamente previstas em lei. 9. Deferida a assistência judiciária, porque presentes os requisitos legais. 10. Não se vislumbra má-fé ou intenção protelatória do servidor ao interpor os embargos de declaração, tendo em vista que houve, de fato, omissão do juízo a quo em apreciar o pedido de gratuidade judiciária. Quanto à contradição apontada nos embargos (existência de prova de exercício de atividade em regime de dedicação exclusiva não levada em conta pelo juízo sentenciante), não há que se falar em intuito protelatório, pois a interposição do recurso ocorreu com vistas a sanar vício supostamente presente no julgado. Assim, devem ser afastadas as multas impostas, uma vez que não atendem às previsões do art. 1.026, § 2º, e art. 80, V e VII, todos do CPC/2015. 11. Os honorários foram fixados em 13% sobre o valor da causa, o que atende ao previsto no art. 85, §2º, do CPC/2015. Verba suspensa em razão do deferimento da gratuidade judiciária (§ 3º do at. 98 do CPC/2015). 12. Apelação provida em parte, para deferir a gratuidade judiciária e afastar as multas impostas. (AC 1000503-70.2019.4.01.4301, DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR, TRF1 - NONA TURMA, PJe 07/02/2024 PAG.) Não há, portanto, qualquer irregularidade no indeferimento administrativo, razão pela qual a sentença merece ser mantida. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora. Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do CPC de 1973, não se aplica o disposto no art. 85, § 11, do CPC de 2015 quanto à majoração dos honorários advocatícios. É como voto. Brasília, data da assinatura eletrônica. Juiz Federal NELSON LIU PITANGA Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 27 - DESEMBARGADORA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0003344-34.2014.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003344-34.2014.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: LUIZ NORBERTO LACERDA MAGALHAES FILHO REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALEXANDER JOSE BUENO TELLES - GO31739-A POLO PASSIVO:INSTITUTO FEDERAL DE EDUCACAO, CIENCIA E TECNOLOGIA DO TOCANTINS e outros E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PROFESSOR DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO. ALTERAÇÃO DE REGIME DE TRABALHO DE 40 HORAS SEM DEDICAÇÃO EXCLUSIVA PARA DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. ESTÁGIO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de alteração do regime de trabalho, de 40 horas semanais sem dedicação exclusiva para 40 horas semanais com dedicação exclusiva, com fundamento na vedação prevista na Lei nº 12.772/2012. 2. O autor alegou, em síntese, que a nova legislação asseguraria o direito à alteração do regime de trabalho, bem como que houve tratamento desigual em relação a docentes de outros Institutos Federais, além de violação aos princípios da isonomia, legalidade, moralidade, eficiência e razoabilidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se o servidor público docente, vinculado ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins — IFTO, pode obter, mediante requerimento, alteração de seu regime de trabalho de 40 horas semanais sem dedicação exclusiva para o regime de dedicação exclusiva, quando se encontra em estágio probatório. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A alteração do regime de trabalho para dedicação exclusiva, prevista no art. 22 da Lei nº 12.772/2012, não constitui direito subjetivo do servidor, tratando-se de ato discricionário da Administração Pública, condicionado à conveniência administrativa, à oportunidade e à disponibilidade orçamentária. 5. A legislação vigente ao tempo do requerimento administrativo vedava expressamente a alteração do regime de trabalho aos docentes em estágio probatório, conforme disposto no § 2º do art. 22 da Lei nº 12.772/2012. 6. No caso concreto, restou incontroverso que o autor se encontrava em estágio probatório quando apresentou o requerimento, circunstância que inviabiliza a alteração pretendida. 7. A posterior revogação da vedação legal pela Lei nº 13.325/2016 não repercute sobre o caso, pois o ato administrativo foi praticado sob a égide da norma revogada. 8. A jurisprudência consolidada do Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconhece que a mudança de regime de trabalho para dedicação exclusiva depende de análise discricionária da Administração, não configurando direito subjetivo, ainda que o servidor labore sob regime de 40 horas semanais sem dedicação exclusiva. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Apelação desprovida. Honorários advocatícios mantidos. Tese de julgamento: “1. A alteração do regime de trabalho de professor para dedicação exclusiva, nos termos da Lei nº 12.772/2012, não constitui direito subjetivo, sendo ato discricionário da Administração Pública. 2. É vedada a alteração do regime de trabalho para dedicação exclusiva ao servidor docente que se encontra em estágio probatório, conforme o art. 22, § 2º, da Lei nº 12.772/2012, vigente à época do requerimento.” Legislação relevante citada: Lei nº 12.772/2012, art. 22, § 2º; Lei nº 13.325/2016. Jurisprudência relevante citada: TRF1, AC 0002621-79.2017.4.01.3307, Juiz Federal Eduardo de Melo Gama, Primeira Turma, PJe 30/07/2024; TRF1, EDAC 1000445-64.2019.4.01.4302, Desembargador Federal Marcelo Velasco Nascimento Albernaz, Primeira Turma, PJe 17/12/2024; TRF1, AC 1000503-70.2019.4.01.4301, Desembargador Federal Euler de Almeida Silva Junior, Nona Turma, PJe 07/02/2024. A C Ó R D Ã O Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator. Brasília-DF, data da assinatura eletrônica. Juiz Federal NELSON LIU PITANGA Relator Convocado

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 8000712-07.2023.8.05.0138

ID: 299114239

Tribunal: TJBA Órgão: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 8000712-07.2023.8.05.0138

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOAO VITOR MOURA DA COSTA

Intimação

Advogados:

JOAO VITOR MOURA DA COSTA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.20… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.2023.8.05.0138 Órgão Julgador: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA AUTOR: MARIA DE LOURDES MOREIRA Advogado(s): TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS registrado(a) civilmente como TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS (OAB:BA71483), EMYLLE DIAS BRITTO registrado(a) civilmente como EMYLLE DIAS BRITTO (OAB:BA63330) REU: SANVILA FONSECA BARRETO Advogado(s): JOAO VITOR MOURA DA COSTA registrado(a) civilmente como JOAO VITOR MOURA DA COSTA (OAB:BA53519) SENTENÇA I - RELATÓRIO. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA POR LOCUPLETAMENTO ILÍCITO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta por MARIA DE LOURDES MOREIRA em face de SANVILA FONSCECA BARRETO, partes já qualificadas nos autos. Aduz, em suma, que "A autora contratou a ré para lhe representar em uma ação em desfavor do INSS, solicitando a concessão de aposentadoria por idade rural, sendo protocolado o processo no dia 08/04/2020 (PROC. 1002200- 64.2020.4.01.3308 - TRF1 COMARCA DE JEQUIÉ - BA), tendo sido o mesmo sentenciado em 27/01/2021. Em sentença, foi homologado o acordo apresentado pelo INSS, para concessão da aposentadoria por idade rural, no valor de 01 salário-mínimo + R$ 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), referente a 80% do retroativo. No dia 19/04/2021, foi expedida a certidão para levantamento do RPV, para recebimento e quitação dos VALORES RETROATIVOS em nome da Ré, advogada SANVILA FONSECA BARRETO, sendo sacado o valor de 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), conforme consta na movimentação processual "REQUISIÇÃO DE PAGAMENTO DE PEQUENO VALOR PAGA", momento em que a reclamada informou o saque, mas apenas repassou a quantia de R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais), quando, na verdade, deveria ter repassado R$ 11.112,06 (onze mil cento e doze reais e seis centavos), valor correspondente a 70% do RPV, apropriando se, ilicitamente, do restante do montante até os dias atuais. A advogada ré, de forma covarde e desumana, informou à Autora que o valor recebido era de apenas R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais) e que os honorários advocatícios teriam "caído", automaticamente, na sua conta. Ocorre que, através de uma denúncia de um membro da Câmara de Vereadores do município de Lagedo do Tabocal - BA, que acusou, por meio de provas, a advogada requerida de apropriação ilícita de valores de diversos munícipes, tornou-se público que a atitude da ré, em se apropriar e valores de seus clientes era corriqueira e de forma continuada. [...].". (SIC) Delineando os fundamentos que reputou serem pertinentes à espécie, requereu, dentre outros pedidos, o deferimento da tutela de urgência pleiteada com a posterior confirmação desta no final deste processo e a condenação da ré pelos danos morais ocasionados. Juntou documentos e valorou a causa. Decisão (id. 395604345) indeferindo a tutela de urgência e citando as partes para comparecerem a audiência de conciliação, a qual não logrou êxito (id. 464350039). Citada, a ré apresentou contestação (id. 402549162), cujas ponderações serão analisadas no mérito desta sentença. Réplica à contestação (id. 414299867). Vieram-me, então, os autos conclusos para sentença. É o relatório. Fundamento e decido. II - FUNDAMENTAÇÃO. A questão posta em análise comporta julgamento utilizando-se da técnica de abreviação prevista no art. 355, I, Código de Processo Civil, haja vista que as provas são estritamente documentais e suficientes para o convencimento do Juízo. Com efeito, registro ainda que foram respeitados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, enquanto direitos fundamentais (art. 5º, LX, CF/88). Inicialmente, analiso a preliminar exposta na peça contestatória: Questão Prévia 1. INÉPCIA DA INICIAL - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO. Estabelece o Art. 330, inciso I do Código de Processo Civil (CPC) que a petição inicial será indeferida "quando for inepta", assim considerada, entre outras hipóteses, aquela em que "não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 ." (inciso IV). Por seu turno, o Art. 321 do CPC estabelece que "O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado". Com efeito, pela teoria da asserção, os elementos indispensáveis à propositura da ação devem ser verificados in status assertionis, ou seja, no primeiro momento processual. Nesse sentido, o Juízo entendeu estarem preenchidos os requisitos do 319 do CPC (Art. 282 do CPC, à época), ordenado a citação do réu, estando, pois, a petição inicial e os documentos, conferindo a parte contrária, enquanto fundamental, a ampla defesa (Art. 5º, LV da Constituição Federal). Rejeito, pois, a preliminar. Superada a preliminar aquilatada, passo ao exame do mérito. A priori, verifico que trata-se de uma típica relação de consumo, onde a parte ré figura como prestadora de serviços e a autora apresenta-se como consumidora, aplicando-se portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos arts. 1º, 2º e 3º do referido diploma legal. Explico: Em consonância com o Código de Defesa do Consumidor, fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Desse modo, a pessoa física que introduz produtos ou presta serviços no mercado de consumo é considerada fornecedora, o que por si só abrange os profissionais liberais. A proposição acerca do enquadramento do profissional liberal no conceito de fornecedor de serviços, para fins de incidência do CDC, encontra respaldo na doutrina: "Considera-se profissional liberal aquela pessoa que exerce atividade especializada de prestação de serviços de natureza predominantemente intelectual e técnica, normalmente com formação universitária, em caráter permanente e autônomo, sem qualquer vínculo de subordinação. Benjamin sintetiza numa frase a caracterização, afirmando: "por profissional liberal há que se entender o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência". (...) O profissional liberal celebra, normalmente, com seu cliente um contrato de prestação de serviços em que prepondera o elemento confiança (intuitu personae). Na categoria dos profissionais liberais, incluem-se médicos, dentistas, advogados, engenheiros, arquitetos, psicólogos, veterinários, agrônomos, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, economistas, contabilistas, administradores, enfermeiros, professores, etc. Guardadas as peculiaridades de cada atividade, podem-se apontar as características comuns das profissionais liberais: a) prestação de serviços técnicos ou científicos especializados; b) formação técnica especializada, normalmente em nível universitário; c) vínculo de confiança com o cliente (intuitu personae); d) ausência de vínculo de subordinação com o cliente ou com terceiro; e) exercício permanente da profissão. A relação entre o profissional liberal (fornecedor de serviços) e o seu cliente (consumidor) nasce, em regra, de um contrato de prestação de serviços. Por isso, a sua responsabilidade tem natureza predominantemente contratual. Às vezes, pode apresentar natureza extracontratual, como na hipótese do médico que é obrigado a atender em caráter de urgência, uma pessoa desconhecida na rua que apresenta grave problema de saúde. Semelhante é a situação do advogado dativo designado pelo juiz para defesa do réu pobre. (grifouse) (Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, in "Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor", 3ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 2010, págs. 197/199).". Assim, as atividades técnico-científicas exercidas por profissionais liberais, quando realizadas mediante remuneração, enquadram-se como prestação de serviços, nos termos do artigo 3º, caput e § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nessa perspectiva, o advogado que atua de forma autônoma e presta serviços advocatícios mediante remuneração por honorários está compreendido na definição legal de "fornecedor de serviços", especialmente quando a contratação é firmada com pessoa leiga ou não profissional, cuja vulnerabilidade é presumida por lei. Dessa forma, a atividade advocatícia exercida por profissional liberal configura prestação de serviços no mercado de consumo, estando, portanto, sujeita à aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, é importante salientar que, embora já se verifiquem julgados que afastam a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às relações entre advogado e cliente, sob o fundamento da existência de legislação específica - a Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), não há nenhuma incompatibilidade entre essa e o Código de Defesa do Consumidor. Pelo contrário, em hipóteses como a presente, impõe-se a adoção do princípio do diálogo das fontes, considerando que, enquanto a Lei nº 8.906/1994 apresenta natureza eminentemente ético-disciplinar voltada à regulação da atividade profissional do advogado, disciplinando os interesses da própria classe, o CDC estabelece normas específicas de proteção ao cliente diante de eventuais prejuízos decorrentes de falhas na atuação do profissional. Sobre o tema, eis entendimento jurisprudencial: "Responsabilidade civil do advogado - diálogo de fontes - obrigação de meio "(...) 1. O escritório de advocacia se enquadra no conceito de fornecedor do art. 3º, caput, do Código de Defesa do Consumidor-CDC. Já as pessoas físicas ou jurídicas, destinatárias finais do serviço, são consumidoras, nos termos do art. 2º, caput, do mesmo código. 2. Em que pesem julgados pontuais do Superior Tribunal de Justiça - STJ que afastam a incidência do CDC nas relações entre advogados e seus clientes, a própria Corte adota o finalismo aprofundado (finalismo mitigado) no tocante ao conceito de consumidor que envolvem pessoas jurídicas que atuam no mercado. A definição da pessoa como consumidor depende da análise da vulnerabilidade - fática, jurídica e informacional - no caso concreto 3. A relação jurídica entre advogado e cliente deve ser contextualizada e compreendida no contexto de um diálogo de fontes (Claudia Lima Marques) entre o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB (Lei 8.906/94) e o Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei 8.078/90). 4. A obrigação assumida por advogado para prestação de serviços jurídicos é de meio e não de resultado. Estabelece o art. 32 do Estatuto da OAB que "O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa". 5. De outro lado, o art. 20 do CDC disciplina os vícios dos serviços. A Lei considera impróprio o serviço que não se mostra adequado ao seu fim, bem como o que não observa norma regulamentar de prestabilidade (§ 2º do art. 20). A preocupação central do CDC é que os serviços oferecidos no mercado de consumo atendam adequado grau de qualidade e funcionalidade. [...]" (grifamos) - Acórdão 1693225, 07103489520228070001, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 19/4/2023, publicado no DJe: 11/5/2023.". Ainda: "CIVIL E CONSUMIDOR - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS ADVINDOS DE DEFICIÊNCIA NA EXECUÇÃO DE MANDATO JUDICIAL - ASSISTÊNCIA JURÍDICA PRESTADA POR ADVOGADO INDICADO PELO SINDICATO A QUE FILIADO O CLIENTE - CARACTERIZAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO - COMPATIBILIDADE ENTRE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O ESTATUTO DA ADVOCACIA (LEI 8.906/94) - DIÁLOGO SISTEMÁTICO E COORDENADO DAS FONTES LEGISLATIVAS PLÚRIMAS - PREVALÊNCIA DA INTERPRETAÇÃO CONCRETIZADORA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO DA REGRA PRESCRICIONAL PREVISTA NO CDC (PRESCRIÇÃO QUINQUENAL). 1. A relação jurídica instaurada entre advogado (não empregado) e cliente/filiado do sindicato, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, encontra-se regida pelo CDC, razão pela qual aplicável o prazo prescricional quinquenal para o exercício da pretensão à reparação pelos danos morais e materiais causados por alegada deficiência na execução de mandato judicial (artigo 27 do CDC). 2. O advogado não fica afastado da definição de "fornecedor de serviços", quando, no exercício autônomo da profissão, presta serviços advocatícios, remunerado por honorários, a um sujeito de direitos civil ou leigo, não profissional, cuja vulnerabilidade fática constitui presunção legal indicativa da relação jurídica de consumo. 3. Malgrado a existência de respeitáveis entendimentos em sentido contrário, é certo que a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e o CDC não se revelam incompatíveis. Isto porque o dever de independência do advogado (que, por vezes, deve agir em desconformidade com a vontade do próprio cliente) e a limitação à oferta/publicidade dos serviços prestados não têm o condão de desnaturar a relação jurídica de consumo instaurada com um consumidor. Tais deveres disciplinares apresentam o intuito de preservação da dignidade do exercício da advocacia (mister profissional essencial à Administração da Justiça), inibindo a "mercantilização" da atividade, o que, contudo, não afasta sua inserção no "mercado de consumo". 4. É que, à luz, principalmente, do artigo 4º, inciso I, do CDC, o mercado de consumo apresenta como traço distintivo a existência de um sujeito de direitos em situação de vulnerabilidade em relação a um fornecedor de bens ou serviços, não restando, portanto, adstrito às operações mercantis, em que há oferta irrestrita de produtos ou serviços aos interessados e estímulo à concorrência. 5. Como consabido, o conteúdo da mens legis consumerista, fundada na norma constitucional que erigiu a defesa do consumidor como princípio inafastável, dirige-se à proteção da parte mais fraca da relação jurídica que apresenta como objeto o fornecimento de produtos ou de serviços, não importando qual seja a natureza do vínculo instaurado. 6. Ainda que assim não fosse, qualquer aparente antinomia entre as normas é solucionada, modernamente, com a observância da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, que viabiliza a aplicação simultânea, coerente e coordenada de fontes legislativas plúrimas convergentes, à luz dos valores e princípios albergados pela Constituição da República, afastando-se os métodos tradicionais e excludentes de resolução de supostos conflitos normativos. 7. Deste modo, procedendo-se a um diálogo sistemático e coordenado entre o CDC, norma de caráter principiológico, e a Lei 8.906/94, com o escopo de viabilizar a concretização do mandamento constitucional de proteção do consumidor, sobressai a conclusão de que a prestação de serviço de advocacia subsume-se, sim, ao regime consumerista. 8. A advocacia, assim como outros serviços prestados por profissionais liberais de categorias diversas, é atividade privativa de pessoa devidamente habilitada perante a Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 4º da Lei 8.906/94), não havendo, portanto, justificativa hábil para sua exclusão do rol de serviços oferecidos ao consumidor na atual sociedade de massa e de consumo. 9. Outrossim, verifica-se que as regras dispostas no Estatuto da Advocacia apresentam um caráter nitidamente éticodisciplinar do exercício da atividade profissional, regulando as pretensões advindas de interesses dos advogados, não estipulando normas específicas de proteção dos clientes frente a danos eventualmente produzidos com a atuação deficiente dos causídicos, o que corrobora a tese da incidência do CDC à espécie. 10. Ademais, não se revela coerente afastar a prestação de serviços advocatícios do campo de incidência do CDC, mas, de outro lado, inserir atividades desenvolvidas por outros profissionais liberais cuja legislação própria também prevê o dever de independência profissional e a vedação da prática de publicidade atentatória à dignidade da profissão, a exemplo dos médicos e dos cirurgiões-dentistas. 11. Do mesmo modo, a existência de legislação própria reguladora do regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos (Lei 8.987/85), em que, muitas vezes, sequer se afigura possível a concorrência no mercado, jamais serviu de fundamento para afastamento da incidência da legislação consumerista. 12. No caso, a pretensão reparatória decorre de relação jurídica instaurada entre a advogada, indicada pelo sindicato, e o filiado, leigo e carente economicamente, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, razão pela qual se dessume a incidência das normas do CDC à espécie. 13. Assim, cuidando-se de pretensão de reparação decorrente de responsabilidade por fato do serviço (danos morais e patrimoniais advindos de suposta deficiência na execução de mandato judicial), revela-se aplicável a regra prescricional quinquenal prevista no artigo 27 do CDC, donde se dessume a higidez da pretensão deduzida em juízo pela cliente/consumidora. 14. Recurso especial desprovido, divergindo-se apenas do fundamento expendido pelo e. Ministro Relator. - RECURSO ESPECIAL Nº 1.150.711 - MG (2009/0143715-5).". Diante do exposto, conclui-se que a prestação de serviços advocatícios por profissional liberal, quando autônoma e remunerada, configura relação de consumo, sendo imprescindível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para garantir a proteção do cliente, parte hipossuficiente na relação, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor. Para mais, cediço que o ônus da prova de um fato ou de um direito cabe a quem o alega. Por essa razão o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabelece que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal entendimento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade, e quando a causa versar sobre direitos disponíveis, o que não ocorre no caso dos autos. Neste sentido, ensina SÉRGIO CAVALIERI FILHO: "Consciente das desigualdades existentes entre os sujeitos de uma relação jurídica de consumo, e da vulnerabilidade processual que também caracteriza o consumidor, estabeleceu o art. 6º, VIII, da Lei no 8.078/90, como direito básico deste, a facilitação da defesa de seus interesses em juízo, inclusive com a possibilidade de ser invertido o ônus da prova, em seu favor e a critério do juiz, quando estiver convencido o julgador da verossimilhança das alegações daquele, ou, alternativamente, de sua hipossuficiência (em sentido amplo)." Ademais, havendo defeito ou falha no serviço, a inversão do ônus da prova é ope legis, isto é, por força da lei, conforme regra estatuída no art. 14, § 3º, da Lei n. 8.078/90. Desse modo, em decorrência do instituto da inversão do onus probandi, transfere-se para a fornecedora o ônus de provar que o alegado pela parte autora não corresponde à verdade dos fatos. Posto isso, é válido frisar que o cerne da controvérsia consiste em verificar se houve, por parte da requerida, falha na prestação de serviço ao, supostamente, não entregar, a autor, o valor referente a concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, mesmo após deferimento do alvará de levantamento desses importes. Pois bem. Analisando detidamente os autos, mormente os documentos probatórios acostados pela requerida (id. 402775149 e ss), verifico que essa não evidenciou a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, não cumprindo, assim, com o ônus que lhe incumbia (art. 373, II, Código de Processo Civil), pois, apesar de afirmar, em sua peça contestatória, que a ação é apenas uma fraude processual, não apresentou nenhum comprovante de pagamento que demonstrasse ter quitado valor diverso dos R$ 6.822,00 (seis mil, oitocentos e vinte e dois reais) indicados pela autora em sua petição inicial. Além disso, observo a veracidade das alegações apresentadas pela demandante, principalmente quanto a morosidade da tradição do valor que lhe era de direito, visto que, em consonância com a Certidão de levantamento para RPV (id. 372131137 - fls. 26), a ré já estava munida de poderes para sacar os valores correspondentes ao RPV desde junho de 2021, no entanto, só realizou o depósito em novembro de 2021, sem apresentar qualquer justificativa plausível para tal demora. Cumpre destacar, ainda, que os valores objeto da presente demanda possuem natureza nitidamente alimentar, tendo em vista que se referem a benefício previdenciário concedido judicialmente à autora. Dito isso, a indevida retenção e o atraso injustificado em seu repasse configuram não apenas falha na prestação do serviço, mas também ofensa direta à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), na medida em que privam o jurisdicionado de recursos essenciais à sua subsistência. Desse modo, resta caracterizada não só a falha na prestação de serviços, mas também determinado o ato ilícito cometido pela requerida, devendo, assim, ser responsabilizada por seus atos. Em casos de estrita similitude, eis o entendimento jurisprudencial: "Apropriação indébita. Advogado. Dolo. Atenuante. 1 - O advogado que levanta dinheiro do cliente depositado em conta judicial e não entrega a quantia a esse, sequer o informando que recebeu o valor, e, depois, não se dispõe a devolver ao cliente, comete o crime de apropriação indébita. 2 - Inexistindo provas de que o acusado - que apresenta sintomas de ansiedade e depressão -, encontra-se com a capacidade de discernimento comprometida, ainda que de forma transitória, não se reconhece a atenuante genérica do art. 66 do CP. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00072802320188070001 DF 0007280-23.2018.8.07.0001, Relator: SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, Data de Julgamento: 23/07/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 29/07/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.).". Assim, sabendo que os danos morais são presumidos e independem de prova do prejuízo sofrido, deve, a parte autora, ser indenizada, porque inequívoco o transtorno ocasionado para esta. Logo, resta evidente a responsabilidade da empresa ré, cabendo avaliar o evento danoso. O dano moral, geralmente, é definido como aquele dano causado injustamente por alguém a outra pessoa, o qual não atinge ou diminui o patrimônio material (conjunto de valor econômico) da vítima, ou seja, do qual não resulta uma perda pecuniária. O patrimônio atingido pelo dano moral se diz patrimônio ideal ou o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico (patrimônio desmaterializado). Na fixação do quantum deve-se ter em mente o fim de proporcionar a ofendida uma compensação monetária pelo sofrimento vivido, sem prejuízo de impor a ofensora uma sanção de cunho pedagógico e intimidativo, com o objetivo de desestimulá-la a reincidir no evento de que cuidam os autos. Deste modo, procedendo à convergência dos caracteres consubstanciadores da reparação pelo dano moral, quais sejam, o punitivo, para que a causadora do dano, pelo fato da condenação, se veja castigada pela ofensa perpetrada e o compensatório para a vítima, que receberá uma soma de dinheiro que lhe proporcione prazeres como contrapartida pelo mal sofrido, fixo a indenização devida pela ré em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando, para tanto, sua condição econômica, o grau de culpa da Demandada, a situação econômica desta e, ainda, ao disposto no art. 944, do Código Civil. Por fim, entendo ser plenamente cabível que, além do valor já depositado, a parte ré seja compelida a restituir à autora os valores remanescentes, devidamente corrigidos e atualizados monetariamente, nos termos da legislação vigente. III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial, resolvendo-se o mérito da causa (art. 487, I, CPC), para: I) CONDENAR a parte ré, SANVILA FONSCECA BARRETO, a indenizar a parte autora, MARIA DE LOURDES MOREIRA, a título de danos morais, ao pagamento no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC, a partir da sentença, consoante enunciado 362 do STJ, e juros legais a contar da citação. II) CONDENAR, ainda, a ré para que restitua o importe remanescente referente à concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, com a devida correção e atualização monetária. Condeno a parte Ré ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, estes no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Advirto às partes que eventuais embargos de declaração interpostos sem a estrita observância das hipóteses de cabimento previstas no art. 1.022 do CPC ou destinados a rediscutir matéria já apreciada, serão considerados manifestamente protelatórios e a parte embargante será sancionada nos termos do art. 1.026 do mesmo diploma, sem prejuízo de condenação de multa por litigância de má-fé, quando for o caso. Publique-se. Intimem-se, por seus Advogados. Após as formalidades legais, arquivem-se os autos. Jaguaquara-BA, data da assinatura digital. ANDRÉA PADILHA SODRÉ LEAL PALMARELLA Juíza de Direito C.F.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 8000712-07.2023.8.05.0138

ID: 299114255

Tribunal: TJBA Órgão: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 8000712-07.2023.8.05.0138

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

EMYLLE DIAS BRITTO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.20… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.2023.8.05.0138 Órgão Julgador: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA AUTOR: MARIA DE LOURDES MOREIRA Advogado(s): TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS registrado(a) civilmente como TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS (OAB:BA71483), EMYLLE DIAS BRITTO registrado(a) civilmente como EMYLLE DIAS BRITTO (OAB:BA63330) REU: SANVILA FONSECA BARRETO Advogado(s): JOAO VITOR MOURA DA COSTA registrado(a) civilmente como JOAO VITOR MOURA DA COSTA (OAB:BA53519) SENTENÇA I - RELATÓRIO. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA POR LOCUPLETAMENTO ILÍCITO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta por MARIA DE LOURDES MOREIRA em face de SANVILA FONSCECA BARRETO, partes já qualificadas nos autos. Aduz, em suma, que "A autora contratou a ré para lhe representar em uma ação em desfavor do INSS, solicitando a concessão de aposentadoria por idade rural, sendo protocolado o processo no dia 08/04/2020 (PROC. 1002200- 64.2020.4.01.3308 - TRF1 COMARCA DE JEQUIÉ - BA), tendo sido o mesmo sentenciado em 27/01/2021. Em sentença, foi homologado o acordo apresentado pelo INSS, para concessão da aposentadoria por idade rural, no valor de 01 salário-mínimo + R$ 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), referente a 80% do retroativo. No dia 19/04/2021, foi expedida a certidão para levantamento do RPV, para recebimento e quitação dos VALORES RETROATIVOS em nome da Ré, advogada SANVILA FONSECA BARRETO, sendo sacado o valor de 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), conforme consta na movimentação processual "REQUISIÇÃO DE PAGAMENTO DE PEQUENO VALOR PAGA", momento em que a reclamada informou o saque, mas apenas repassou a quantia de R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais), quando, na verdade, deveria ter repassado R$ 11.112,06 (onze mil cento e doze reais e seis centavos), valor correspondente a 70% do RPV, apropriando se, ilicitamente, do restante do montante até os dias atuais. A advogada ré, de forma covarde e desumana, informou à Autora que o valor recebido era de apenas R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais) e que os honorários advocatícios teriam "caído", automaticamente, na sua conta. Ocorre que, através de uma denúncia de um membro da Câmara de Vereadores do município de Lagedo do Tabocal - BA, que acusou, por meio de provas, a advogada requerida de apropriação ilícita de valores de diversos munícipes, tornou-se público que a atitude da ré, em se apropriar e valores de seus clientes era corriqueira e de forma continuada. [...].". (SIC) Delineando os fundamentos que reputou serem pertinentes à espécie, requereu, dentre outros pedidos, o deferimento da tutela de urgência pleiteada com a posterior confirmação desta no final deste processo e a condenação da ré pelos danos morais ocasionados. Juntou documentos e valorou a causa. Decisão (id. 395604345) indeferindo a tutela de urgência e citando as partes para comparecerem a audiência de conciliação, a qual não logrou êxito (id. 464350039). Citada, a ré apresentou contestação (id. 402549162), cujas ponderações serão analisadas no mérito desta sentença. Réplica à contestação (id. 414299867). Vieram-me, então, os autos conclusos para sentença. É o relatório. Fundamento e decido. II - FUNDAMENTAÇÃO. A questão posta em análise comporta julgamento utilizando-se da técnica de abreviação prevista no art. 355, I, Código de Processo Civil, haja vista que as provas são estritamente documentais e suficientes para o convencimento do Juízo. Com efeito, registro ainda que foram respeitados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, enquanto direitos fundamentais (art. 5º, LX, CF/88). Inicialmente, analiso a preliminar exposta na peça contestatória: Questão Prévia 1. INÉPCIA DA INICIAL - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO. Estabelece o Art. 330, inciso I do Código de Processo Civil (CPC) que a petição inicial será indeferida "quando for inepta", assim considerada, entre outras hipóteses, aquela em que "não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 ." (inciso IV). Por seu turno, o Art. 321 do CPC estabelece que "O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado". Com efeito, pela teoria da asserção, os elementos indispensáveis à propositura da ação devem ser verificados in status assertionis, ou seja, no primeiro momento processual. Nesse sentido, o Juízo entendeu estarem preenchidos os requisitos do 319 do CPC (Art. 282 do CPC, à época), ordenado a citação do réu, estando, pois, a petição inicial e os documentos, conferindo a parte contrária, enquanto fundamental, a ampla defesa (Art. 5º, LV da Constituição Federal). Rejeito, pois, a preliminar. Superada a preliminar aquilatada, passo ao exame do mérito. A priori, verifico que trata-se de uma típica relação de consumo, onde a parte ré figura como prestadora de serviços e a autora apresenta-se como consumidora, aplicando-se portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos arts. 1º, 2º e 3º do referido diploma legal. Explico: Em consonância com o Código de Defesa do Consumidor, fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Desse modo, a pessoa física que introduz produtos ou presta serviços no mercado de consumo é considerada fornecedora, o que por si só abrange os profissionais liberais. A proposição acerca do enquadramento do profissional liberal no conceito de fornecedor de serviços, para fins de incidência do CDC, encontra respaldo na doutrina: "Considera-se profissional liberal aquela pessoa que exerce atividade especializada de prestação de serviços de natureza predominantemente intelectual e técnica, normalmente com formação universitária, em caráter permanente e autônomo, sem qualquer vínculo de subordinação. Benjamin sintetiza numa frase a caracterização, afirmando: "por profissional liberal há que se entender o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência". (...) O profissional liberal celebra, normalmente, com seu cliente um contrato de prestação de serviços em que prepondera o elemento confiança (intuitu personae). Na categoria dos profissionais liberais, incluem-se médicos, dentistas, advogados, engenheiros, arquitetos, psicólogos, veterinários, agrônomos, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, economistas, contabilistas, administradores, enfermeiros, professores, etc. Guardadas as peculiaridades de cada atividade, podem-se apontar as características comuns das profissionais liberais: a) prestação de serviços técnicos ou científicos especializados; b) formação técnica especializada, normalmente em nível universitário; c) vínculo de confiança com o cliente (intuitu personae); d) ausência de vínculo de subordinação com o cliente ou com terceiro; e) exercício permanente da profissão. A relação entre o profissional liberal (fornecedor de serviços) e o seu cliente (consumidor) nasce, em regra, de um contrato de prestação de serviços. Por isso, a sua responsabilidade tem natureza predominantemente contratual. Às vezes, pode apresentar natureza extracontratual, como na hipótese do médico que é obrigado a atender em caráter de urgência, uma pessoa desconhecida na rua que apresenta grave problema de saúde. Semelhante é a situação do advogado dativo designado pelo juiz para defesa do réu pobre. (grifouse) (Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, in "Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor", 3ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 2010, págs. 197/199).". Assim, as atividades técnico-científicas exercidas por profissionais liberais, quando realizadas mediante remuneração, enquadram-se como prestação de serviços, nos termos do artigo 3º, caput e § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nessa perspectiva, o advogado que atua de forma autônoma e presta serviços advocatícios mediante remuneração por honorários está compreendido na definição legal de "fornecedor de serviços", especialmente quando a contratação é firmada com pessoa leiga ou não profissional, cuja vulnerabilidade é presumida por lei. Dessa forma, a atividade advocatícia exercida por profissional liberal configura prestação de serviços no mercado de consumo, estando, portanto, sujeita à aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, é importante salientar que, embora já se verifiquem julgados que afastam a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às relações entre advogado e cliente, sob o fundamento da existência de legislação específica - a Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), não há nenhuma incompatibilidade entre essa e o Código de Defesa do Consumidor. Pelo contrário, em hipóteses como a presente, impõe-se a adoção do princípio do diálogo das fontes, considerando que, enquanto a Lei nº 8.906/1994 apresenta natureza eminentemente ético-disciplinar voltada à regulação da atividade profissional do advogado, disciplinando os interesses da própria classe, o CDC estabelece normas específicas de proteção ao cliente diante de eventuais prejuízos decorrentes de falhas na atuação do profissional. Sobre o tema, eis entendimento jurisprudencial: "Responsabilidade civil do advogado - diálogo de fontes - obrigação de meio "(...) 1. O escritório de advocacia se enquadra no conceito de fornecedor do art. 3º, caput, do Código de Defesa do Consumidor-CDC. Já as pessoas físicas ou jurídicas, destinatárias finais do serviço, são consumidoras, nos termos do art. 2º, caput, do mesmo código. 2. Em que pesem julgados pontuais do Superior Tribunal de Justiça - STJ que afastam a incidência do CDC nas relações entre advogados e seus clientes, a própria Corte adota o finalismo aprofundado (finalismo mitigado) no tocante ao conceito de consumidor que envolvem pessoas jurídicas que atuam no mercado. A definição da pessoa como consumidor depende da análise da vulnerabilidade - fática, jurídica e informacional - no caso concreto 3. A relação jurídica entre advogado e cliente deve ser contextualizada e compreendida no contexto de um diálogo de fontes (Claudia Lima Marques) entre o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB (Lei 8.906/94) e o Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei 8.078/90). 4. A obrigação assumida por advogado para prestação de serviços jurídicos é de meio e não de resultado. Estabelece o art. 32 do Estatuto da OAB que "O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa". 5. De outro lado, o art. 20 do CDC disciplina os vícios dos serviços. A Lei considera impróprio o serviço que não se mostra adequado ao seu fim, bem como o que não observa norma regulamentar de prestabilidade (§ 2º do art. 20). A preocupação central do CDC é que os serviços oferecidos no mercado de consumo atendam adequado grau de qualidade e funcionalidade. [...]" (grifamos) - Acórdão 1693225, 07103489520228070001, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 19/4/2023, publicado no DJe: 11/5/2023.". Ainda: "CIVIL E CONSUMIDOR - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS ADVINDOS DE DEFICIÊNCIA NA EXECUÇÃO DE MANDATO JUDICIAL - ASSISTÊNCIA JURÍDICA PRESTADA POR ADVOGADO INDICADO PELO SINDICATO A QUE FILIADO O CLIENTE - CARACTERIZAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO - COMPATIBILIDADE ENTRE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O ESTATUTO DA ADVOCACIA (LEI 8.906/94) - DIÁLOGO SISTEMÁTICO E COORDENADO DAS FONTES LEGISLATIVAS PLÚRIMAS - PREVALÊNCIA DA INTERPRETAÇÃO CONCRETIZADORA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO DA REGRA PRESCRICIONAL PREVISTA NO CDC (PRESCRIÇÃO QUINQUENAL). 1. A relação jurídica instaurada entre advogado (não empregado) e cliente/filiado do sindicato, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, encontra-se regida pelo CDC, razão pela qual aplicável o prazo prescricional quinquenal para o exercício da pretensão à reparação pelos danos morais e materiais causados por alegada deficiência na execução de mandato judicial (artigo 27 do CDC). 2. O advogado não fica afastado da definição de "fornecedor de serviços", quando, no exercício autônomo da profissão, presta serviços advocatícios, remunerado por honorários, a um sujeito de direitos civil ou leigo, não profissional, cuja vulnerabilidade fática constitui presunção legal indicativa da relação jurídica de consumo. 3. Malgrado a existência de respeitáveis entendimentos em sentido contrário, é certo que a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e o CDC não se revelam incompatíveis. Isto porque o dever de independência do advogado (que, por vezes, deve agir em desconformidade com a vontade do próprio cliente) e a limitação à oferta/publicidade dos serviços prestados não têm o condão de desnaturar a relação jurídica de consumo instaurada com um consumidor. Tais deveres disciplinares apresentam o intuito de preservação da dignidade do exercício da advocacia (mister profissional essencial à Administração da Justiça), inibindo a "mercantilização" da atividade, o que, contudo, não afasta sua inserção no "mercado de consumo". 4. É que, à luz, principalmente, do artigo 4º, inciso I, do CDC, o mercado de consumo apresenta como traço distintivo a existência de um sujeito de direitos em situação de vulnerabilidade em relação a um fornecedor de bens ou serviços, não restando, portanto, adstrito às operações mercantis, em que há oferta irrestrita de produtos ou serviços aos interessados e estímulo à concorrência. 5. Como consabido, o conteúdo da mens legis consumerista, fundada na norma constitucional que erigiu a defesa do consumidor como princípio inafastável, dirige-se à proteção da parte mais fraca da relação jurídica que apresenta como objeto o fornecimento de produtos ou de serviços, não importando qual seja a natureza do vínculo instaurado. 6. Ainda que assim não fosse, qualquer aparente antinomia entre as normas é solucionada, modernamente, com a observância da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, que viabiliza a aplicação simultânea, coerente e coordenada de fontes legislativas plúrimas convergentes, à luz dos valores e princípios albergados pela Constituição da República, afastando-se os métodos tradicionais e excludentes de resolução de supostos conflitos normativos. 7. Deste modo, procedendo-se a um diálogo sistemático e coordenado entre o CDC, norma de caráter principiológico, e a Lei 8.906/94, com o escopo de viabilizar a concretização do mandamento constitucional de proteção do consumidor, sobressai a conclusão de que a prestação de serviço de advocacia subsume-se, sim, ao regime consumerista. 8. A advocacia, assim como outros serviços prestados por profissionais liberais de categorias diversas, é atividade privativa de pessoa devidamente habilitada perante a Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 4º da Lei 8.906/94), não havendo, portanto, justificativa hábil para sua exclusão do rol de serviços oferecidos ao consumidor na atual sociedade de massa e de consumo. 9. Outrossim, verifica-se que as regras dispostas no Estatuto da Advocacia apresentam um caráter nitidamente éticodisciplinar do exercício da atividade profissional, regulando as pretensões advindas de interesses dos advogados, não estipulando normas específicas de proteção dos clientes frente a danos eventualmente produzidos com a atuação deficiente dos causídicos, o que corrobora a tese da incidência do CDC à espécie. 10. Ademais, não se revela coerente afastar a prestação de serviços advocatícios do campo de incidência do CDC, mas, de outro lado, inserir atividades desenvolvidas por outros profissionais liberais cuja legislação própria também prevê o dever de independência profissional e a vedação da prática de publicidade atentatória à dignidade da profissão, a exemplo dos médicos e dos cirurgiões-dentistas. 11. Do mesmo modo, a existência de legislação própria reguladora do regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos (Lei 8.987/85), em que, muitas vezes, sequer se afigura possível a concorrência no mercado, jamais serviu de fundamento para afastamento da incidência da legislação consumerista. 12. No caso, a pretensão reparatória decorre de relação jurídica instaurada entre a advogada, indicada pelo sindicato, e o filiado, leigo e carente economicamente, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, razão pela qual se dessume a incidência das normas do CDC à espécie. 13. Assim, cuidando-se de pretensão de reparação decorrente de responsabilidade por fato do serviço (danos morais e patrimoniais advindos de suposta deficiência na execução de mandato judicial), revela-se aplicável a regra prescricional quinquenal prevista no artigo 27 do CDC, donde se dessume a higidez da pretensão deduzida em juízo pela cliente/consumidora. 14. Recurso especial desprovido, divergindo-se apenas do fundamento expendido pelo e. Ministro Relator. - RECURSO ESPECIAL Nº 1.150.711 - MG (2009/0143715-5).". Diante do exposto, conclui-se que a prestação de serviços advocatícios por profissional liberal, quando autônoma e remunerada, configura relação de consumo, sendo imprescindível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para garantir a proteção do cliente, parte hipossuficiente na relação, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor. Para mais, cediço que o ônus da prova de um fato ou de um direito cabe a quem o alega. Por essa razão o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabelece que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal entendimento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade, e quando a causa versar sobre direitos disponíveis, o que não ocorre no caso dos autos. Neste sentido, ensina SÉRGIO CAVALIERI FILHO: "Consciente das desigualdades existentes entre os sujeitos de uma relação jurídica de consumo, e da vulnerabilidade processual que também caracteriza o consumidor, estabeleceu o art. 6º, VIII, da Lei no 8.078/90, como direito básico deste, a facilitação da defesa de seus interesses em juízo, inclusive com a possibilidade de ser invertido o ônus da prova, em seu favor e a critério do juiz, quando estiver convencido o julgador da verossimilhança das alegações daquele, ou, alternativamente, de sua hipossuficiência (em sentido amplo)." Ademais, havendo defeito ou falha no serviço, a inversão do ônus da prova é ope legis, isto é, por força da lei, conforme regra estatuída no art. 14, § 3º, da Lei n. 8.078/90. Desse modo, em decorrência do instituto da inversão do onus probandi, transfere-se para a fornecedora o ônus de provar que o alegado pela parte autora não corresponde à verdade dos fatos. Posto isso, é válido frisar que o cerne da controvérsia consiste em verificar se houve, por parte da requerida, falha na prestação de serviço ao, supostamente, não entregar, a autor, o valor referente a concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, mesmo após deferimento do alvará de levantamento desses importes. Pois bem. Analisando detidamente os autos, mormente os documentos probatórios acostados pela requerida (id. 402775149 e ss), verifico que essa não evidenciou a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, não cumprindo, assim, com o ônus que lhe incumbia (art. 373, II, Código de Processo Civil), pois, apesar de afirmar, em sua peça contestatória, que a ação é apenas uma fraude processual, não apresentou nenhum comprovante de pagamento que demonstrasse ter quitado valor diverso dos R$ 6.822,00 (seis mil, oitocentos e vinte e dois reais) indicados pela autora em sua petição inicial. Além disso, observo a veracidade das alegações apresentadas pela demandante, principalmente quanto a morosidade da tradição do valor que lhe era de direito, visto que, em consonância com a Certidão de levantamento para RPV (id. 372131137 - fls. 26), a ré já estava munida de poderes para sacar os valores correspondentes ao RPV desde junho de 2021, no entanto, só realizou o depósito em novembro de 2021, sem apresentar qualquer justificativa plausível para tal demora. Cumpre destacar, ainda, que os valores objeto da presente demanda possuem natureza nitidamente alimentar, tendo em vista que se referem a benefício previdenciário concedido judicialmente à autora. Dito isso, a indevida retenção e o atraso injustificado em seu repasse configuram não apenas falha na prestação do serviço, mas também ofensa direta à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), na medida em que privam o jurisdicionado de recursos essenciais à sua subsistência. Desse modo, resta caracterizada não só a falha na prestação de serviços, mas também determinado o ato ilícito cometido pela requerida, devendo, assim, ser responsabilizada por seus atos. Em casos de estrita similitude, eis o entendimento jurisprudencial: "Apropriação indébita. Advogado. Dolo. Atenuante. 1 - O advogado que levanta dinheiro do cliente depositado em conta judicial e não entrega a quantia a esse, sequer o informando que recebeu o valor, e, depois, não se dispõe a devolver ao cliente, comete o crime de apropriação indébita. 2 - Inexistindo provas de que o acusado - que apresenta sintomas de ansiedade e depressão -, encontra-se com a capacidade de discernimento comprometida, ainda que de forma transitória, não se reconhece a atenuante genérica do art. 66 do CP. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00072802320188070001 DF 0007280-23.2018.8.07.0001, Relator: SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, Data de Julgamento: 23/07/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 29/07/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.).". Assim, sabendo que os danos morais são presumidos e independem de prova do prejuízo sofrido, deve, a parte autora, ser indenizada, porque inequívoco o transtorno ocasionado para esta. Logo, resta evidente a responsabilidade da empresa ré, cabendo avaliar o evento danoso. O dano moral, geralmente, é definido como aquele dano causado injustamente por alguém a outra pessoa, o qual não atinge ou diminui o patrimônio material (conjunto de valor econômico) da vítima, ou seja, do qual não resulta uma perda pecuniária. O patrimônio atingido pelo dano moral se diz patrimônio ideal ou o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico (patrimônio desmaterializado). Na fixação do quantum deve-se ter em mente o fim de proporcionar a ofendida uma compensação monetária pelo sofrimento vivido, sem prejuízo de impor a ofensora uma sanção de cunho pedagógico e intimidativo, com o objetivo de desestimulá-la a reincidir no evento de que cuidam os autos. Deste modo, procedendo à convergência dos caracteres consubstanciadores da reparação pelo dano moral, quais sejam, o punitivo, para que a causadora do dano, pelo fato da condenação, se veja castigada pela ofensa perpetrada e o compensatório para a vítima, que receberá uma soma de dinheiro que lhe proporcione prazeres como contrapartida pelo mal sofrido, fixo a indenização devida pela ré em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando, para tanto, sua condição econômica, o grau de culpa da Demandada, a situação econômica desta e, ainda, ao disposto no art. 944, do Código Civil. Por fim, entendo ser plenamente cabível que, além do valor já depositado, a parte ré seja compelida a restituir à autora os valores remanescentes, devidamente corrigidos e atualizados monetariamente, nos termos da legislação vigente. III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial, resolvendo-se o mérito da causa (art. 487, I, CPC), para: I) CONDENAR a parte ré, SANVILA FONSCECA BARRETO, a indenizar a parte autora, MARIA DE LOURDES MOREIRA, a título de danos morais, ao pagamento no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC, a partir da sentença, consoante enunciado 362 do STJ, e juros legais a contar da citação. II) CONDENAR, ainda, a ré para que restitua o importe remanescente referente à concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, com a devida correção e atualização monetária. Condeno a parte Ré ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, estes no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Advirto às partes que eventuais embargos de declaração interpostos sem a estrita observância das hipóteses de cabimento previstas no art. 1.022 do CPC ou destinados a rediscutir matéria já apreciada, serão considerados manifestamente protelatórios e a parte embargante será sancionada nos termos do art. 1.026 do mesmo diploma, sem prejuízo de condenação de multa por litigância de má-fé, quando for o caso. Publique-se. Intimem-se, por seus Advogados. Após as formalidades legais, arquivem-se os autos. Jaguaquara-BA, data da assinatura digital. ANDRÉA PADILHA SODRÉ LEAL PALMARELLA Juíza de Direito C.F.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 8000712-07.2023.8.05.0138

ID: 299114271

Tribunal: TJBA Órgão: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 8000712-07.2023.8.05.0138

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

EMYLLE DIAS BRITTO

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

EMYLLE DIAS BRITTO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.20… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000712-07.2023.8.05.0138 Órgão Julgador: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA AUTOR: MARIA DE LOURDES MOREIRA Advogado(s): TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS registrado(a) civilmente como TIRZA NATIELE ALMEIDA MATOS (OAB:BA71483), EMYLLE DIAS BRITTO registrado(a) civilmente como EMYLLE DIAS BRITTO (OAB:BA63330) REU: SANVILA FONSECA BARRETO Advogado(s): JOAO VITOR MOURA DA COSTA registrado(a) civilmente como JOAO VITOR MOURA DA COSTA (OAB:BA53519) SENTENÇA I - RELATÓRIO. Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA POR LOCUPLETAMENTO ILÍCITO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta por MARIA DE LOURDES MOREIRA em face de SANVILA FONSCECA BARRETO, partes já qualificadas nos autos. Aduz, em suma, que "A autora contratou a ré para lhe representar em uma ação em desfavor do INSS, solicitando a concessão de aposentadoria por idade rural, sendo protocolado o processo no dia 08/04/2020 (PROC. 1002200- 64.2020.4.01.3308 - TRF1 COMARCA DE JEQUIÉ - BA), tendo sido o mesmo sentenciado em 27/01/2021. Em sentença, foi homologado o acordo apresentado pelo INSS, para concessão da aposentadoria por idade rural, no valor de 01 salário-mínimo + R$ 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), referente a 80% do retroativo. No dia 19/04/2021, foi expedida a certidão para levantamento do RPV, para recebimento e quitação dos VALORES RETROATIVOS em nome da Ré, advogada SANVILA FONSECA BARRETO, sendo sacado o valor de 15.874,38 (quinze mil oitocentos e setenta e quatro reais e trinta e oito centavos), conforme consta na movimentação processual "REQUISIÇÃO DE PAGAMENTO DE PEQUENO VALOR PAGA", momento em que a reclamada informou o saque, mas apenas repassou a quantia de R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais), quando, na verdade, deveria ter repassado R$ 11.112,06 (onze mil cento e doze reais e seis centavos), valor correspondente a 70% do RPV, apropriando se, ilicitamente, do restante do montante até os dias atuais. A advogada ré, de forma covarde e desumana, informou à Autora que o valor recebido era de apenas R$ 6.800 (seis mil e oitocentos reais) e que os honorários advocatícios teriam "caído", automaticamente, na sua conta. Ocorre que, através de uma denúncia de um membro da Câmara de Vereadores do município de Lagedo do Tabocal - BA, que acusou, por meio de provas, a advogada requerida de apropriação ilícita de valores de diversos munícipes, tornou-se público que a atitude da ré, em se apropriar e valores de seus clientes era corriqueira e de forma continuada. [...].". (SIC) Delineando os fundamentos que reputou serem pertinentes à espécie, requereu, dentre outros pedidos, o deferimento da tutela de urgência pleiteada com a posterior confirmação desta no final deste processo e a condenação da ré pelos danos morais ocasionados. Juntou documentos e valorou a causa. Decisão (id. 395604345) indeferindo a tutela de urgência e citando as partes para comparecerem a audiência de conciliação, a qual não logrou êxito (id. 464350039). Citada, a ré apresentou contestação (id. 402549162), cujas ponderações serão analisadas no mérito desta sentença. Réplica à contestação (id. 414299867). Vieram-me, então, os autos conclusos para sentença. É o relatório. Fundamento e decido. II - FUNDAMENTAÇÃO. A questão posta em análise comporta julgamento utilizando-se da técnica de abreviação prevista no art. 355, I, Código de Processo Civil, haja vista que as provas são estritamente documentais e suficientes para o convencimento do Juízo. Com efeito, registro ainda que foram respeitados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, enquanto direitos fundamentais (art. 5º, LX, CF/88). Inicialmente, analiso a preliminar exposta na peça contestatória: Questão Prévia 1. INÉPCIA DA INICIAL - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO. Estabelece o Art. 330, inciso I do Código de Processo Civil (CPC) que a petição inicial será indeferida "quando for inepta", assim considerada, entre outras hipóteses, aquela em que "não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 ." (inciso IV). Por seu turno, o Art. 321 do CPC estabelece que "O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado". Com efeito, pela teoria da asserção, os elementos indispensáveis à propositura da ação devem ser verificados in status assertionis, ou seja, no primeiro momento processual. Nesse sentido, o Juízo entendeu estarem preenchidos os requisitos do 319 do CPC (Art. 282 do CPC, à época), ordenado a citação do réu, estando, pois, a petição inicial e os documentos, conferindo a parte contrária, enquanto fundamental, a ampla defesa (Art. 5º, LV da Constituição Federal). Rejeito, pois, a preliminar. Superada a preliminar aquilatada, passo ao exame do mérito. A priori, verifico que trata-se de uma típica relação de consumo, onde a parte ré figura como prestadora de serviços e a autora apresenta-se como consumidora, aplicando-se portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos arts. 1º, 2º e 3º do referido diploma legal. Explico: Em consonância com o Código de Defesa do Consumidor, fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Desse modo, a pessoa física que introduz produtos ou presta serviços no mercado de consumo é considerada fornecedora, o que por si só abrange os profissionais liberais. A proposição acerca do enquadramento do profissional liberal no conceito de fornecedor de serviços, para fins de incidência do CDC, encontra respaldo na doutrina: "Considera-se profissional liberal aquela pessoa que exerce atividade especializada de prestação de serviços de natureza predominantemente intelectual e técnica, normalmente com formação universitária, em caráter permanente e autônomo, sem qualquer vínculo de subordinação. Benjamin sintetiza numa frase a caracterização, afirmando: "por profissional liberal há que se entender o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência". (...) O profissional liberal celebra, normalmente, com seu cliente um contrato de prestação de serviços em que prepondera o elemento confiança (intuitu personae). Na categoria dos profissionais liberais, incluem-se médicos, dentistas, advogados, engenheiros, arquitetos, psicólogos, veterinários, agrônomos, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, economistas, contabilistas, administradores, enfermeiros, professores, etc. Guardadas as peculiaridades de cada atividade, podem-se apontar as características comuns das profissionais liberais: a) prestação de serviços técnicos ou científicos especializados; b) formação técnica especializada, normalmente em nível universitário; c) vínculo de confiança com o cliente (intuitu personae); d) ausência de vínculo de subordinação com o cliente ou com terceiro; e) exercício permanente da profissão. A relação entre o profissional liberal (fornecedor de serviços) e o seu cliente (consumidor) nasce, em regra, de um contrato de prestação de serviços. Por isso, a sua responsabilidade tem natureza predominantemente contratual. Às vezes, pode apresentar natureza extracontratual, como na hipótese do médico que é obrigado a atender em caráter de urgência, uma pessoa desconhecida na rua que apresenta grave problema de saúde. Semelhante é a situação do advogado dativo designado pelo juiz para defesa do réu pobre. (grifouse) (Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, in "Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor", 3ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 2010, págs. 197/199).". Assim, as atividades técnico-científicas exercidas por profissionais liberais, quando realizadas mediante remuneração, enquadram-se como prestação de serviços, nos termos do artigo 3º, caput e § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Nessa perspectiva, o advogado que atua de forma autônoma e presta serviços advocatícios mediante remuneração por honorários está compreendido na definição legal de "fornecedor de serviços", especialmente quando a contratação é firmada com pessoa leiga ou não profissional, cuja vulnerabilidade é presumida por lei. Dessa forma, a atividade advocatícia exercida por profissional liberal configura prestação de serviços no mercado de consumo, estando, portanto, sujeita à aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, é importante salientar que, embora já se verifiquem julgados que afastam a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às relações entre advogado e cliente, sob o fundamento da existência de legislação específica - a Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), não há nenhuma incompatibilidade entre essa e o Código de Defesa do Consumidor. Pelo contrário, em hipóteses como a presente, impõe-se a adoção do princípio do diálogo das fontes, considerando que, enquanto a Lei nº 8.906/1994 apresenta natureza eminentemente ético-disciplinar voltada à regulação da atividade profissional do advogado, disciplinando os interesses da própria classe, o CDC estabelece normas específicas de proteção ao cliente diante de eventuais prejuízos decorrentes de falhas na atuação do profissional. Sobre o tema, eis entendimento jurisprudencial: "Responsabilidade civil do advogado - diálogo de fontes - obrigação de meio "(...) 1. O escritório de advocacia se enquadra no conceito de fornecedor do art. 3º, caput, do Código de Defesa do Consumidor-CDC. Já as pessoas físicas ou jurídicas, destinatárias finais do serviço, são consumidoras, nos termos do art. 2º, caput, do mesmo código. 2. Em que pesem julgados pontuais do Superior Tribunal de Justiça - STJ que afastam a incidência do CDC nas relações entre advogados e seus clientes, a própria Corte adota o finalismo aprofundado (finalismo mitigado) no tocante ao conceito de consumidor que envolvem pessoas jurídicas que atuam no mercado. A definição da pessoa como consumidor depende da análise da vulnerabilidade - fática, jurídica e informacional - no caso concreto 3. A relação jurídica entre advogado e cliente deve ser contextualizada e compreendida no contexto de um diálogo de fontes (Claudia Lima Marques) entre o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB (Lei 8.906/94) e o Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei 8.078/90). 4. A obrigação assumida por advogado para prestação de serviços jurídicos é de meio e não de resultado. Estabelece o art. 32 do Estatuto da OAB que "O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa". 5. De outro lado, o art. 20 do CDC disciplina os vícios dos serviços. A Lei considera impróprio o serviço que não se mostra adequado ao seu fim, bem como o que não observa norma regulamentar de prestabilidade (§ 2º do art. 20). A preocupação central do CDC é que os serviços oferecidos no mercado de consumo atendam adequado grau de qualidade e funcionalidade. [...]" (grifamos) - Acórdão 1693225, 07103489520228070001, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 19/4/2023, publicado no DJe: 11/5/2023.". Ainda: "CIVIL E CONSUMIDOR - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS ADVINDOS DE DEFICIÊNCIA NA EXECUÇÃO DE MANDATO JUDICIAL - ASSISTÊNCIA JURÍDICA PRESTADA POR ADVOGADO INDICADO PELO SINDICATO A QUE FILIADO O CLIENTE - CARACTERIZAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO - COMPATIBILIDADE ENTRE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O ESTATUTO DA ADVOCACIA (LEI 8.906/94) - DIÁLOGO SISTEMÁTICO E COORDENADO DAS FONTES LEGISLATIVAS PLÚRIMAS - PREVALÊNCIA DA INTERPRETAÇÃO CONCRETIZADORA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO DA REGRA PRESCRICIONAL PREVISTA NO CDC (PRESCRIÇÃO QUINQUENAL). 1. A relação jurídica instaurada entre advogado (não empregado) e cliente/filiado do sindicato, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, encontra-se regida pelo CDC, razão pela qual aplicável o prazo prescricional quinquenal para o exercício da pretensão à reparação pelos danos morais e materiais causados por alegada deficiência na execução de mandato judicial (artigo 27 do CDC). 2. O advogado não fica afastado da definição de "fornecedor de serviços", quando, no exercício autônomo da profissão, presta serviços advocatícios, remunerado por honorários, a um sujeito de direitos civil ou leigo, não profissional, cuja vulnerabilidade fática constitui presunção legal indicativa da relação jurídica de consumo. 3. Malgrado a existência de respeitáveis entendimentos em sentido contrário, é certo que a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e o CDC não se revelam incompatíveis. Isto porque o dever de independência do advogado (que, por vezes, deve agir em desconformidade com a vontade do próprio cliente) e a limitação à oferta/publicidade dos serviços prestados não têm o condão de desnaturar a relação jurídica de consumo instaurada com um consumidor. Tais deveres disciplinares apresentam o intuito de preservação da dignidade do exercício da advocacia (mister profissional essencial à Administração da Justiça), inibindo a "mercantilização" da atividade, o que, contudo, não afasta sua inserção no "mercado de consumo". 4. É que, à luz, principalmente, do artigo 4º, inciso I, do CDC, o mercado de consumo apresenta como traço distintivo a existência de um sujeito de direitos em situação de vulnerabilidade em relação a um fornecedor de bens ou serviços, não restando, portanto, adstrito às operações mercantis, em que há oferta irrestrita de produtos ou serviços aos interessados e estímulo à concorrência. 5. Como consabido, o conteúdo da mens legis consumerista, fundada na norma constitucional que erigiu a defesa do consumidor como princípio inafastável, dirige-se à proteção da parte mais fraca da relação jurídica que apresenta como objeto o fornecimento de produtos ou de serviços, não importando qual seja a natureza do vínculo instaurado. 6. Ainda que assim não fosse, qualquer aparente antinomia entre as normas é solucionada, modernamente, com a observância da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, que viabiliza a aplicação simultânea, coerente e coordenada de fontes legislativas plúrimas convergentes, à luz dos valores e princípios albergados pela Constituição da República, afastando-se os métodos tradicionais e excludentes de resolução de supostos conflitos normativos. 7. Deste modo, procedendo-se a um diálogo sistemático e coordenado entre o CDC, norma de caráter principiológico, e a Lei 8.906/94, com o escopo de viabilizar a concretização do mandamento constitucional de proteção do consumidor, sobressai a conclusão de que a prestação de serviço de advocacia subsume-se, sim, ao regime consumerista. 8. A advocacia, assim como outros serviços prestados por profissionais liberais de categorias diversas, é atividade privativa de pessoa devidamente habilitada perante a Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 4º da Lei 8.906/94), não havendo, portanto, justificativa hábil para sua exclusão do rol de serviços oferecidos ao consumidor na atual sociedade de massa e de consumo. 9. Outrossim, verifica-se que as regras dispostas no Estatuto da Advocacia apresentam um caráter nitidamente éticodisciplinar do exercício da atividade profissional, regulando as pretensões advindas de interesses dos advogados, não estipulando normas específicas de proteção dos clientes frente a danos eventualmente produzidos com a atuação deficiente dos causídicos, o que corrobora a tese da incidência do CDC à espécie. 10. Ademais, não se revela coerente afastar a prestação de serviços advocatícios do campo de incidência do CDC, mas, de outro lado, inserir atividades desenvolvidas por outros profissionais liberais cuja legislação própria também prevê o dever de independência profissional e a vedação da prática de publicidade atentatória à dignidade da profissão, a exemplo dos médicos e dos cirurgiões-dentistas. 11. Do mesmo modo, a existência de legislação própria reguladora do regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos (Lei 8.987/85), em que, muitas vezes, sequer se afigura possível a concorrência no mercado, jamais serviu de fundamento para afastamento da incidência da legislação consumerista. 12. No caso, a pretensão reparatória decorre de relação jurídica instaurada entre a advogada, indicada pelo sindicato, e o filiado, leigo e carente economicamente, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, razão pela qual se dessume a incidência das normas do CDC à espécie. 13. Assim, cuidando-se de pretensão de reparação decorrente de responsabilidade por fato do serviço (danos morais e patrimoniais advindos de suposta deficiência na execução de mandato judicial), revela-se aplicável a regra prescricional quinquenal prevista no artigo 27 do CDC, donde se dessume a higidez da pretensão deduzida em juízo pela cliente/consumidora. 14. Recurso especial desprovido, divergindo-se apenas do fundamento expendido pelo e. Ministro Relator. - RECURSO ESPECIAL Nº 1.150.711 - MG (2009/0143715-5).". Diante do exposto, conclui-se que a prestação de serviços advocatícios por profissional liberal, quando autônoma e remunerada, configura relação de consumo, sendo imprescindível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para garantir a proteção do cliente, parte hipossuficiente na relação, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor. Para mais, cediço que o ônus da prova de um fato ou de um direito cabe a quem o alega. Por essa razão o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabelece que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal entendimento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade, e quando a causa versar sobre direitos disponíveis, o que não ocorre no caso dos autos. Neste sentido, ensina SÉRGIO CAVALIERI FILHO: "Consciente das desigualdades existentes entre os sujeitos de uma relação jurídica de consumo, e da vulnerabilidade processual que também caracteriza o consumidor, estabeleceu o art. 6º, VIII, da Lei no 8.078/90, como direito básico deste, a facilitação da defesa de seus interesses em juízo, inclusive com a possibilidade de ser invertido o ônus da prova, em seu favor e a critério do juiz, quando estiver convencido o julgador da verossimilhança das alegações daquele, ou, alternativamente, de sua hipossuficiência (em sentido amplo)." Ademais, havendo defeito ou falha no serviço, a inversão do ônus da prova é ope legis, isto é, por força da lei, conforme regra estatuída no art. 14, § 3º, da Lei n. 8.078/90. Desse modo, em decorrência do instituto da inversão do onus probandi, transfere-se para a fornecedora o ônus de provar que o alegado pela parte autora não corresponde à verdade dos fatos. Posto isso, é válido frisar que o cerne da controvérsia consiste em verificar se houve, por parte da requerida, falha na prestação de serviço ao, supostamente, não entregar, a autor, o valor referente a concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, mesmo após deferimento do alvará de levantamento desses importes. Pois bem. Analisando detidamente os autos, mormente os documentos probatórios acostados pela requerida (id. 402775149 e ss), verifico que essa não evidenciou a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, não cumprindo, assim, com o ônus que lhe incumbia (art. 373, II, Código de Processo Civil), pois, apesar de afirmar, em sua peça contestatória, que a ação é apenas uma fraude processual, não apresentou nenhum comprovante de pagamento que demonstrasse ter quitado valor diverso dos R$ 6.822,00 (seis mil, oitocentos e vinte e dois reais) indicados pela autora em sua petição inicial. Além disso, observo a veracidade das alegações apresentadas pela demandante, principalmente quanto a morosidade da tradição do valor que lhe era de direito, visto que, em consonância com a Certidão de levantamento para RPV (id. 372131137 - fls. 26), a ré já estava munida de poderes para sacar os valores correspondentes ao RPV desde junho de 2021, no entanto, só realizou o depósito em novembro de 2021, sem apresentar qualquer justificativa plausível para tal demora. Cumpre destacar, ainda, que os valores objeto da presente demanda possuem natureza nitidamente alimentar, tendo em vista que se referem a benefício previdenciário concedido judicialmente à autora. Dito isso, a indevida retenção e o atraso injustificado em seu repasse configuram não apenas falha na prestação do serviço, mas também ofensa direta à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), na medida em que privam o jurisdicionado de recursos essenciais à sua subsistência. Desse modo, resta caracterizada não só a falha na prestação de serviços, mas também determinado o ato ilícito cometido pela requerida, devendo, assim, ser responsabilizada por seus atos. Em casos de estrita similitude, eis o entendimento jurisprudencial: "Apropriação indébita. Advogado. Dolo. Atenuante. 1 - O advogado que levanta dinheiro do cliente depositado em conta judicial e não entrega a quantia a esse, sequer o informando que recebeu o valor, e, depois, não se dispõe a devolver ao cliente, comete o crime de apropriação indébita. 2 - Inexistindo provas de que o acusado - que apresenta sintomas de ansiedade e depressão -, encontra-se com a capacidade de discernimento comprometida, ainda que de forma transitória, não se reconhece a atenuante genérica do art. 66 do CP. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00072802320188070001 DF 0007280-23.2018.8.07.0001, Relator: SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, Data de Julgamento: 23/07/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 29/07/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.).". Assim, sabendo que os danos morais são presumidos e independem de prova do prejuízo sofrido, deve, a parte autora, ser indenizada, porque inequívoco o transtorno ocasionado para esta. Logo, resta evidente a responsabilidade da empresa ré, cabendo avaliar o evento danoso. O dano moral, geralmente, é definido como aquele dano causado injustamente por alguém a outra pessoa, o qual não atinge ou diminui o patrimônio material (conjunto de valor econômico) da vítima, ou seja, do qual não resulta uma perda pecuniária. O patrimônio atingido pelo dano moral se diz patrimônio ideal ou o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico (patrimônio desmaterializado). Na fixação do quantum deve-se ter em mente o fim de proporcionar a ofendida uma compensação monetária pelo sofrimento vivido, sem prejuízo de impor a ofensora uma sanção de cunho pedagógico e intimidativo, com o objetivo de desestimulá-la a reincidir no evento de que cuidam os autos. Deste modo, procedendo à convergência dos caracteres consubstanciadores da reparação pelo dano moral, quais sejam, o punitivo, para que a causadora do dano, pelo fato da condenação, se veja castigada pela ofensa perpetrada e o compensatório para a vítima, que receberá uma soma de dinheiro que lhe proporcione prazeres como contrapartida pelo mal sofrido, fixo a indenização devida pela ré em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando, para tanto, sua condição econômica, o grau de culpa da Demandada, a situação econômica desta e, ainda, ao disposto no art. 944, do Código Civil. Por fim, entendo ser plenamente cabível que, além do valor já depositado, a parte ré seja compelida a restituir à autora os valores remanescentes, devidamente corrigidos e atualizados monetariamente, nos termos da legislação vigente. III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial, resolvendo-se o mérito da causa (art. 487, I, CPC), para: I) CONDENAR a parte ré, SANVILA FONSCECA BARRETO, a indenizar a parte autora, MARIA DE LOURDES MOREIRA, a título de danos morais, ao pagamento no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC, a partir da sentença, consoante enunciado 362 do STJ, e juros legais a contar da citação. II) CONDENAR, ainda, a ré para que restitua o importe remanescente referente à concessão da aposentadoria por idade rural e seus respectivos retroativos, com a devida correção e atualização monetária. Condeno a parte Ré ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, estes no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Advirto às partes que eventuais embargos de declaração interpostos sem a estrita observância das hipóteses de cabimento previstas no art. 1.022 do CPC ou destinados a rediscutir matéria já apreciada, serão considerados manifestamente protelatórios e a parte embargante será sancionada nos termos do art. 1.026 do mesmo diploma, sem prejuízo de condenação de multa por litigância de má-fé, quando for o caso. Publique-se. Intimem-se, por seus Advogados. Após as formalidades legais, arquivem-se os autos. Jaguaquara-BA, data da assinatura digital. ANDRÉA PADILHA SODRÉ LEAL PALMARELLA Juíza de Direito C.F.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Empresa Brasileira De Correios E Telegrafos e outros x Arione De Lima Santos Machado

ID: 255913134

Tribunal: TRT10 Órgão: 2ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000267-19.2024.5.10.0004

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS MINISTéRIO PúBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

ARIONE DE LIMA SANTOS MACHADO

Acórdão

Advogados:

FABIO FONTES ESTILLAC GOMEZ

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO LUIS ROCHA SAMPAIO 0000267-19.2024.5.10.0004 : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAF… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO LUIS ROCHA SAMPAIO 0000267-19.2024.5.10.0004 : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS : ARIONE DE LIMA SANTOS MACHADO PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO nº 0000267-19.2024.5.10.0004 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA - ACÓRDÃO 2ªTURMA/2025 RELATOR: DESEMBARGADOR JOÃO LUÍS ROCHA SAMPAIO RECORRENTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS RECORRIDO: ARIONE DE LIMA SANTOS MACHADO ADVOGADO: FÁBIO FONTES ESTILLAC GOMEZ CUSTOS LEGIS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ORIGEM: 4ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF CLASSE ORIGINÁRIA: AÇÃO TRABALHISTA - RITO ORDINÁRIO (JUÍZA ANANDA TOSTES ISONI) EMENTA RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. 1. DESCONTO REALIZADO COM BASE EM NORMA INTERNA. NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE ZERAR CONTRACHEQUE. PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE SALARIAL. Ainda que a norma interna permita o ressarcimento imediato da empregadora em relação aos valores pagos a título de férias quando não houver a regular fruição, tal previsão não deve ser aplicada de forma isolada do resto do ordenamento jurídico, devendo, por certo, passar pelo filtro constitucional e legal. Hipótese em que se mostra abusivo o desconto de 100% (cem por cento) da remuneração do Autor (contracheque zerado), pois viola o princípio da intangibilidade salarial que consta no art. 7º, V da CF/88 e no art. 462 da CLT, bem como desconsidera a necessidade do mínimo existencial e, por certo, a própria dignidade humana, fundamento da República (art. 1º, III da CF/88). Precedente do C. TST. 2. DANO MORAL. NÃO PAGAMENTO DE SALÁRIO EM UM MÊS. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA. In casu, tratando-se de não pagamento de salário em um único mês, é assente a jurisprudência do C. TST no sentido de que tal fato, por si só, não enseja dano moral in re ipsa, de forma que deve haver prova de dano concreto à honra subjetiva do empregado. No mesmo sentido, se o desconto indevido não é recorrente. Elementos dos autos que não demonstram a existência do referido dano concreto, não tendo o Autor se desincumbindo do ônus que lhe cabe. Sentença que merece reparos para excluir a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por dano moral. Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido. RELATÓRIO A Excelentíssima Juíza do Trabalho ANANDA TOSTES ISONI em exercício na MMª 4ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, prolatou sentença às fls. 116/122, complementada pelo julgamento dos embargos de declaração às fls. 132/133, nos autos da reclamação trabalhista ajuizada por ARIONE DE LIMA SANTOS MACHADO em desfavor de EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT, por meio da qual julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial. Concedeu ao Autor os benefícios da justiça gratuita. Inconformada, a Reclamada interpôs recurso ordinário às fls. 136/144. Contrarrazões foram apresentadas pelo Reclamante às fls. 146/152. O Ministério Público do Trabalho se manifestou pelo regular prosseguimento do feito (fls. 156/157). É, em síntese, o relatório. FUNDAMENTAÇÃO 1. ADMISSIBILIDADE O recurso ordinário interposto pela Reclamada é tempestivo e a representação está regular. Há dispensa da realização do preparo. Assim, conheço do recurso ordinário. 2. MÉRITO 2.1. DESCONTOS COM BASE EM NORMA INTERNA. NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE ZERAR CONTRACHEQUE. PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE SALARIAL. O pleito foi assim decidido pelo Juízo de origem: "II - FUNDAMENTAÇÃO DESCONTOS ABUSIVOS O autor afirma que férias para o período de 15/01/2024, e recebeu integralmente todas as remunerações pertinentes a esse período de descanso (fl. 4). Narra que em 12/12/2023 necessitou de um atestado médico de 30 dias para realizar um procedimento cirúrgico, resultando no cancelamento das férias previamente agendadas (fl. 5).Alega que só foi informado sobre o cancelamento de suas férias e a necessidade de reembolsar os valores recebidos em 06/02/2024,pois seu gerente se encontrava de férias (fl. 5). Afirma que na folha de pagamento de 02/2024 a reclamada registrou o débito de R$6.000,00, resultando em contracheque zerado (fl. 5). Assim, aduz que em 02/2024 recebeu de salário um valor líquido de R$0,00 (fl. 5). Pelo exposto, requer que seja considerado ilícito o desconto de 100% do salário, devendo a reclamada providenciar o parcelamento dos valores de forma a não exceder 30% do salário do empregado e garantir que tal parcelamento não prejudique o sustento do empregado e de sua família (fl. 7). A reclamada, por sua vez, alega que em razão do afastamento do trabalho por 30 dias, por motivo de saúde, a partir de 12/12/2023, conforme o autor informa, em 27/12/2023 seu contrato de trabalho foi suspenso por licença INSS, ocasionando o cancelamento de suas férias, então agendadas para 15/01/2024, e a folha de pagamento das férias foi excluída, nos termos do Ofício 47954883/2024 - GPAG-CEGEP (fl. 48). Afirma que o autor recebeu indevidamente o pagamento das verbas das férias, em 03/01/2024, conforme documento de id. 272a4e9, uma vez que teve suas férias canceladas em razão do afastamento pelo INSS, com início em 27/12/2024 (fl. 49). Aduz que não houve um adiantamento salarial, mas um pagamento de férias, que não foram gozadas, logo não há que se falar na ilicitude do desconto em 02/ 2024 (fl. 49). Desse modo, requer a improcedência do pedido autoral (fl. 50). O autor juntou aos autos seus contracheques (fl. 20-22); juntou sua ficha cadastral junto à reclamada (fls. 23- 27); juntou o precesso sei que determinou a restituição dos valores (fl. 28); juntou o contracheques de 02/2024 que veio no valor de R$ 0,00 (fls. 29-30); A reclamada juntou aos autos a ficha cadastral do autor (fls. 54-58); juntou as fichas financeiras do autor (fls. 59- 88); juntou o anexo de férias do manual de pessoal da empresa reclamada (fls. 89- 104). Por meio da decisão de fls. 32/33, a tutela de urgência foi deferida nos seguintes termos: "Trata-se de reclamação trabalhista ajuizada por ARIONE DE LIMA em desfavor de SANTOS MACHADO EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS,na qual o reclamante requer, em sede de tutela, o cancelamento de descontos que excedam 30% do salário do autor, nos termos que especifica. Deu à causa o valor de R$5,000.00. Juntou documentos.Nos termos do artigo 300 do CPC, a tutela de urgência (cautelar ou antecipada) será concedida quando houver elementos que evidenciem a e probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo ainda, a ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente (CPC, artigo 497). Em apertada síntese, o reclamante afirma que agendou férias para 15 de janeiro de 2024, já tendo recebido os valores pertinentes a esse período de descanso. Entretanto, em 12 de dezembro de 2023, obteve atestado médico de 30 dias para realizar cirurgia, resultando no cancelamento das férias, fato do qual só foi informado em 06/02/24. Pelo cancelamento, a reclamada registrou débito de R$6.000,00 no contracheque do autor, resultando em contracheque zerado. Afirma que não foi oferecida oportunidade de parcelar ou negociar os descontos, e que o equívoco da reclamada causou danos ao reclamante, que não conseguiu arcar com suas despesas, inclusive de saúde. Assim, requer em tutela antecipada que este juízo limite os descontos ao teto de 30% do salário do empregado.Pois bem. Examino apenas a probabilidade do direito e o perigo dademora (NCPC, art. 300), porque sumária a cognição judicial na tutela provisória. Contracheques de janeiro e fevereiro, nas fls. 29/31, indicam valor líquido a receber zerado para janeiro. Trecho do processo SEI a que o autor faz menção na fl. 28 indica que, conforme norma interna, a restituição de férias não gozadas deve se dar de imediato. Descontos que impliquem contracheque zerado se revelam desproporcionais, afrontando a dignidade humana do trabalhador. É, também, como entende este Regional: DESCONTOS SALARIAIS EXCESSIVOS. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE SALARIAL. O princípio da intangibilidade salarial insculpido nos artigos 462 da CLT e 7º, VI, da Constituição Federal, bem como da dignidade da pessoa humana tornam claramente ilegais os descontos salariais que resultam em saldo zero no contracheque do trabalhador. Tal proceder coloca em risco não só o trabalhador,. A legalidade de adiantamentos salariais não mas também os seus dependentes autoriza a ilegalidade do desconto abusivo. (TRT-10 00001636520225100014, Relator:DORIVAL BORGES DE SOUZA NETO, Data de Julgamento: 14/09/2022, Data de Publicação: 24/09/2022) Assim, o pedido referente à limitação de descontos defiro pretendida pelo reclamante, determinando que os descontos se limitem a 30% da remuneração do reclamante, nos termos do pedido. Após cognição exauriente, não se constatou produção de prova hábil a alterar a decisão proferida, que ora mantenho por seus próprios fundamentos. Em acréscimo, registro que, embora o precedente colacionado refira-se a desconto de adiantamentos salariais, o entendimento igualmente se aplica ao caso vertente, tendo em vista que a realização de desconto em montante que zere o contracheque do trabalhador, independentemente de sua origem, é abusivo e viola sua dignidade. Condeno, pois, a reclamada a providenciar o parcelamento dos valores de forma a não exceder 30% do salário do reclamante" (fls. 116/119). A Reclamada se insurge. Na oportunidade, ratifica a licitude do desconto que zerou o contracheque do obreiro em fevereiro de 2024, já que houve recebimento indevido das verbas relativas às férias, que foram posteriormente canceladas pelo afastamento do obreiro em razão de saúde. Cita o Módulo 19, Capítulo 01, Anexo 8, que permite o ressarcimento imediato da Empresa em tal situação. Lembra que "ainda que houvesse prevalecido o desconto levado à cabo pela Recorrente / Reclamada, em fevereiro de 2024, não havia que se falar na ofensa ao princípio da irredutibilidade salarial, porque o Reclamante / Recorrido havia, desde 03/01/2024 recebido valores da Reclamada / Recorrente a que não fazia jus e estava de posse deles e, aí, o desacerto da r. sentença recorrida" (fl. 142). Analisa-se. O cerne da questão consiste em analisar a licitude de desconto realizado pela ECT que ensejou contracheque zerado em fevereiro de 2024. Segundo consta nos autos, o Autor gozaria de férias a partir de 15/1/2024. Todavia, em 12/12/2023, precisou ser afastado de suas funções por questão de saúde e pelo prazo de 30 (trinta) dias. No dia 3/1/2024, recebeu valor de cerca de R$ 6.000,00 (seis mil reais) relativo às férias que foram canceladas. Contudo, em 6/2/2024, foi informado sobre a necessidade de reembolsar os valores, o que aconteceu no contracheque de fevereiro, que foi zerado (fls. 30/31). De fato, a necessidade de ressarcimento imediato da Empresa quando as férias não são gozadas encontra amparo no item 13.7.1. do Módulo 19, Capítulo 01, Anexo 8: "13.7 Ressarcimento das Férias não Gozadas 13.7.1 Se o empregado, por qualquer motivo, não gozar as férias no período de fruição programado, após ter recebido o pagamento das verbas das férias, o ressarcimento à Empresa deverá ser efetuado de imediato, por meio de depósito e envio de comprovante de recebimento ao órgão de administração da folha de pagamento, pelo valor bruto, quando o mês de competência das referidas férias estiver fechado, sendo da responsabilidade do empregado os valores do Imposto de Renda - IR, do INSS e demais descontos registrados na folha das férias." (fls. 102/103) Grifos acrescidos Em que pese tal previsão, a sentença que limitou os descontos não merece reformas. É que a referida norma interna não deve ser aplicada de forma isolada do resto do ordenamento jurídico, devendo, por certo, passar pelo filtro constitucional e legal. Lembra-se, nesse sentido, que a Constituição Federal - CF/88, no art. 7º, VI, assegura a intangibilidade salarial, princípio que também consta no art. 462 da CLT. Desta feita, apesar de devido o ressarcimento da ECT, tal direito da encontra limitação na intangibilidade salarial, o que impossibilita que a empregadora zere o contracheque do empregado, desconsiderando o mínimo existencial e, por certo, a própria dignidade humana, fundamento da República (art. 1º, III da CF/88). Recentemente, o C. TST foi instado a se manifestar sobre a licitude de descontos que ensejavam contracheque zerado, tendo entendido o que se segue: "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECLAMADA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESCONTOS SALARIAIS AUTORIZADOS. LIMITE. GARANTIA CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO SALARIAL. PAGAMENTO DE SALÁRIOS EM VALORES ÍNFIMOS OU IGUAIS A ZERO. NATUREZA ALIMENTAR. SUBSISTÊNCIA 1 - O art. 7º, X, da Constituição Federal, garante como direito dos trabalhadores a "proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa" . Trata-se de medida que visa garantir a subsistência do trabalhador, em razão do caráter alimentar da remuneração, em detrimento de eventual direito de credores. 2 - No caso concreto, os descontos em salário foram feitos mediante autorizações do reclamante para pagamento de "Produtos - lojinha" (compra de produtos); medicamentos (Farmácia conveniada com a empresa); ligações particulares; despesas com refeições feitas no restaurante industrial da empresa; seguro de vida individual; Assistência Médica (UNIMED), plano "enfermaria" e "Benefícios da F.C.M.H" ; seguro de vida (plano contributário); "cesta básica" (fl. 961); empréstimo consignado. 3 - Por outro lado, o Regional anotou que "durante a contratualidade os recibos de pagamento consignam em sua grande maioria saldo líquido igual a ' zero'" , ilustrando que, por amostragem, em alguns meses o valor de descontos era igual àquele de proventos e, em outros, após os descontos, houve recebimento de quantias irrisórias (R$70,00/ R$150,00). 4 - O desconto integral ou quase total dos valores devidos a título de salário impede que o reclamante disponha de parcela mínima de sua remuneração, implicando prejuízo à sua subsistência. Nesse sentido, conquanto no caso dos autos houvesse autorização do reclamante para os descontos, não se pode admitir a conduta passiva da empresa em não fixar teto máximo de descontos a ser observado, como é praxe nesses casos. A proteção constitucional do salário é direito objetivo a ser observado pela empresa. Não pode a empregadora se limitar à conduta meramente formal de lançar automaticamente na folha de pagamento todos e quaisquer descontos, independentemente de seu montante, sem limite nenhum. A responsabilidade social da empresa inclui a conduta ativa no sentido de garantir o meio ambiente do trabalho saudável - o que não se verifica quando o trabalhador, por eventual falta de planejamento ou descontrole, chega ao ponto da prestação de serviços com remuneração zero. A título de exemplo, a Lei 10.820/2003, que dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento e dá outras providências, com a redação dada pela Lei 14.431/2022, prevê que a soma das consignações voluntárias não poderá exceder de 40% da remuneração disponível, conforme definido em regulamento (art. 2º, § 2º, II) e fixa também outros percentuais máximos em hipóteses lá disciplinadas. Em razão de situações graves como a do reclamante, foi editada no âmbito do Direito do Consumidor a Lei 14.181/2021, que dispõe sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, cujo art. 54-A, § 1º, tem o seguinte teor: "Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação" . 5 - Neste feito, caracterizada a conduta abusiva e negligente da empregadora, pondo em xeque a subsistência do reclamante, há dano moral a ser reconhecido. Julgados. 6 - Agravo a que se nega provimento. (TST - Ag-AIRR: 00002157820175090656, Relator: Katia Magalhaes Arruda, Data de Julgamento: 14/12/2022, 6ª Turma, Data de Publicação: 16/12/2022) Do julgado acima, observa-se que a Corte Superior não considerou lícito desconto de tal magnitude ainda que autorizado pelo empregado, ressaltando que "A proteção constitucional do salário é direito objetivo a ser observado pela empresa". Se incabível o desconto quando autorizado pelo empregado e decorrente de desorganização financeira dele, de forma mais evidente nos presentes autos, em que a devolução decorre do cancelamento de férias por motivo de saúde. Ademais, a limitação dos descontos a 30% (trinta por cento) de forma alguma impedirá o ressarcimento integral da empregadora, sendo medida legítima que compatibiliza o interesse patrimonial da ECT com o direito constitucional ao salário do empregado. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, mantendo a limitação dos descontos em 30% (trinta por cento) do salário do Reclamante. 2.2. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. A ECT foi condenada ao pagamento de dano moral em favor do Reclamante: " II - FUNDAMENTAÇÃO DESCONTOS ABUSIVOS [...] Nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil, faz jus o autor à reparação pecuniária. Considerando a gravidade dos atos praticados, a extensão do dano moral vivenciado pela parte reclamante, o grau de culpa da empregadora, a situação social e econômica das partes e os demais aspectos elencados no art. 223-G da CLT, condeno a parte reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00." (fl. 119) A Reclamada, nas razões recursais, aponta que, sendo lícito o desconto, não há se falar em indenização moral. Defende, ainda, que "a condenação da Reclamada / Recorrente em danos morais ocorreu sem nenhuma prova do dano moral por aprte do Reclamante / Recorrido, tanto o é, que a r. sentença não as declina" (fl. 142). Subsidiariamente, pede pela redução do quantum indenizatório. Examina-se. O dano moral caracteriza-se quando há violação direta aos direitos da personalidade do empregado (integridade física, moral ou intelectual). Com efeito, ocorre o dano extrapatrimonial quando a ofensa (ato ilícito) afeta o trabalhador em seus sentimentos, na sua honra, sua intimidade, sua privacidade, em seu decoro, em sua consideração social ou laborativa, sua reputação ou dignidade. No mais, é definido positivamente pela violação de um bem integrante da personalidade, da qual resulta dor, vexame, sofrimento, humilhação, desconforto, etc., capaz de atingir o sentimento de dignidade da vítima. O ônus de provar a ocorrência de fatos que configurem abalo moral é da parte autora, por ser fato constitutivo de seu direito (art. 818, I da CLT c/c art. 373, I do CPC). Exceto quando o magistrado condutor da instrução utilize a teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova (§ 1.º do art. 818 da CLT), o que não ocorreu no caso dos autos. Ademais, surge o dever de reparação por dano moral quando demonstrado os requisitos essenciais da responsabilização civil (conduta, dano, nexo de causalidade e a culpa do agente infrator). Tal instituto foi regulamentado na seara trabalhista com a edição da Lei nº 13.647/2017 (reforma trabalhista). A respeito do dano moral, dispõe a CLT: "Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação." "Art. 223-C. A honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física." No caso concreto, ao contrário do que alega a empregadora, o desconto de 100% (cem por cento) da remuneração foi considerado ilícito. Todavia, cabe analisar se o desconto salarial, nessa hipótese, enseja dano moral e se ele prescinde de demonstração. Como se sabe, o C. TST entende que o desconto salarial não enseja dano moral, salvo se reiterado, ocasião em que se torna desnecessária a prova, ou quando comprovada a ocorrência de situação que caracterize ofensa ao direito da personalidade: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. DESCONTOS SALARIAIS INDEVIDOS. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE DANO IN RE IPSA. JURISPRUDÊNCIA ASSENTE DO TST. ACÓRDÃO REGIONAL. NÃO CONFIGURAÇÃO DE DANO MORAL. CONFORMIDADE. SÚMULA Nº 333 DO TST. INCIDÊNCIA I . Com base na jurisprudência deste Tribunal Superior, os descontos indevidos no salário não ensejam, por si só, indenização por dano moral, exceto quando demonstrado que eles eram reiterados (situação de configuração de dano in re ipsa) ou quando comprovada a ocorrência de circunstância que caracterize ofensa a direito da personalidade. É o que demonstram, exemplificativamente, os julgados mencionados na decisão agravada, proferidos por cinco (de um total de oito) Turmas desta Corte Superior, inclusive por esta Sétima Turma, tratando-se, portanto, de jurisprudência assente neste Tribunal. II . No caso dos autos, irretocável a decisão monocrática agravada, pois, embora a parte reclamante tenha sustentado em seu recurso de revista que "os descontos indevidos no salário da recorrente acarretam dano moral por terem atingido as necessidades básicas da recorrente e de sua família" (fl. 1.347 - Visualização Todos PDF), do acórdão regional não se extrai a demonstração de que os descontos eram reiterados a ponto de configurar dano moral in re ipsa, tampouco a comprovação fato que implique ofensa a direito da personalidade decorrente dos descontos, contexto em que se conclui que o Tribunal de origem, ao adotar a tese de que "não há elementos nos autos que justifiquem a concessão da reparação moral pretendida" (fl. 1.246 - Visualização Todos PDF), proferiu decisão em plena conformidade com a atual, notória e iterativa jurisprudência desta Corte Superior. Devidamente aplicado, desse modo, o óbice consolidado na Súmula nº 333 do TST e no art. 896, § 7º, da CLT. III . Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. (TST - Ag-RR: 0001245-38.2013.5.15.0005, Relator: Evandro Pereira Valadao Lopes, Data de Julgamento: 22/05/2024, 7ª Turma, Data de Publicação: 14/06/2024) Grifos acrescidos Não se tratando, o caso dos autos, de descontos recorrentes, cabe destacar, ainda, que a Corte Superior também entende que o não pagamento de salário em um único mês não enseja o dano moral in re ipsa: "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017 . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NÃO PAGAMENTO DAS VERBAS RESCISÓRIAS E INADIMPLEMENTO DE SALÁRIO DE UM MÊS. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. A jurisprudência desta Corte Superior tem se firmado no sentido de que a ausência ou o atraso no pagamento das verbas rescisórias, bem como o inadimplemento salarial que não seja reiterado, não configuram, por si só, dano moral, sobretudo, quando não comprovado dano concreto à honra subjetiva do empregado. O Regional manteve a sentença que indeferiu o pedido de dano moral pelo atraso nas verbas rescisórias e pelo inadimplemento de um mês de labor do reclamante, ante a ausência de demonstração de dano efetivo. A recorrente insiste na indenização por danos morais decorrentes do atraso no pagamento das verbas rescisórias e de um mês de salário. O exame prévio dos critérios de transcendência do recurso de revista revela a inexistência de qualquer deles a possibilitar o exame do apelo no TST. A par disso, irrelevante perquirir a respeito do acerto ou desacerto da decisão agravada, dada a inviabilidade de processamento, por motivo diverso, do apelo anteriormente obstaculizado. Agravo de instrumento não provido. [...]" (ARR-1002200-06.2017.5.02.0383, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 22/03/2024). Grifos acrescidos "RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INADIMPLEMENTO DE SALÁRIO DE UM MÊS . DANO MORAL. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. Debate-se a possibilidade de configuração de dano in re ipsa , no caso de inadimplemento de salário de um mês. Está-se diante de possível contrariedade aos arts. 5º, X, da Constituição Federal , e 186 do Código Civil. A jurisprudência desta Corte Superior tem se firmado no sentido de que a ausência ou o atraso no pagamento das verbas rescisórias não configuram, por si só, dano moral, sobretudo , quando não comprovado dano concreto à honra subjetiva do empregado. No caso em tela, o Tribunal Regional decidiu no sentido de estar caracterizado o dano moral em virtude da ausência total do pagamento de salário de um mês, não se tratando de atraso. Essa circunstância está apta a demonstrar a presença do indicador de transcendência política, nos termos do art. 896-A, § 1º, II, da CLT, a possibilitar o exame do apelo no TST. RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INADIMPLEMENTO DE SALÁRIO DE UM MÊS. DANO MORAL. REQUISITOS DO ART. 896, § 1º-A, DA CLT, ATENDIDOS. A jurisprudência desta Corte distingue os atrasos salariais e a ausência ou atraso no pagamento das verbas rescisórias, considerando cabível o pagamento de indenização por dano moral no primeiro caso, quando reiterado, mas não no segundo, de modo que o atraso ou o não pagamento das verbas rescisórias, por si só, não configura ofensa ao patrimônio moral do trabalhador, devendo ser comprovados, por meio de elementos objetivos, os constrangimentos alegados ou a ofensa aos direitos da personalidade. No caso, o Tribunal Regional manteve a condenação ao pagamento de indenização por danos morais em virtude do inadimplemento total de um mês de salário, não se tratando de atraso. Na linha de precedentes desta Corte e nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil considera-se não caracterizado o dano in re ipsa . Ressalva de entendimento do relator, por considerar que o não pagamento de salário é fato mais grave do que o atraso reiterado, ainda mais se estiver associado a não quitação de verbas rescisórias. Prescinde-se de demonstração do dano efetivo, pois, uma vez cumprido o seu dever obrigacional, o empregado necessita e espera a combinada contraprestação, a fim de cumprir com seu sustento e pagamento das obrigações assumidas em todo aquele mês. Recurso de revista conhecido e provido . (TST - RR: 7112720165050342, Relator: Augusto Cesar Leite De Carvalho, Data de Julgamento: 08/06/2022, 6ª Turma, Data de Publicação: 10/06/2022) Grifos acrescidos No mesmo sentido, este Egr. Tribunal: " [...] DESCONTO DE UM MÊS DE SALÁRIO. DANO MORAL. Em caso de não recebimento de salário em período equivalente a um mês, trilha a jurisprudência majoritária no sentido de desconfigurar o dano moral in re ipsa, estando o reclamante onerado com a comprovação de eventuais prejuízos ou danos sofridos em razão do desconto efetuado. [...]" (TRT da 10ª Região; Processo: 0000508-61.2022.5.10.0004; Data de assinatura: 13-04-2023; Órgão Julgador: Desembargador Ricardo Alencar Machado - 3ª Turma; Relator(a): RICARDO ALENCAR MACHADO) Grifos acrescidos Assim, caberia ao Autor demonstrar efetivamente que houve violação dos seus direitos da personalidade, ônus do qual não se desincumbiu, sendo indevida a reparação moral. Ante o exposto, dou provimento ao recurso patronal para excluir a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. 2.3. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. Com a reforma parcial da sentença vergastada, as partes passaram a ser sucumbentes recíprocas. Por isso, condeno o Reclamante ao pagamento, em favor dos patronos da Reclamada, de honorários advocatícios sucumbenciais de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, dado que a pretensão mantida não tem expressão financeira. Tal valor encontra amparo na jurisprudência assente desta Egr. Turma. Sendo o Autor beneficiário da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade pelo prazo de 2 (dois) anos ao trânsito em julgado e só poderão ser executadas se o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade. Passado o prazo de 2 (dois) anos, tais obrigações serão extintas. CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do recurso ordinário interposto pela Reclamada e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para excluir a condenação ao pagamento de indenização por dano moral, condenando o Reclamante ao pagamento, em favor dos patronos da Reclamada, de honorários advocatícios sucumbenciais de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa por 2 (dois) anos. Tudo nos termos da fundamentação. Custas pela Reclamada no valor mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos), pois a pretensão mantida nesta instância não possui expressão financeira. É o meu voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, conforme certidão de julgamento, em aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário interposto pela Reclamada e, no mérito, dar-lhe parcial provimento. Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Brasília (DF), 09 de abril de 2025 (data do julgamento). Desembargador João Luís Rocha Sampaio Relator(a) DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 11 de abril de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - ARIONE DE LIMA SANTOS MACHADO

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 720 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes