Processo nº 1007764-91.2024.8.11.0003
ID: 310850932
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1007764-91.2024.8.11.0003
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EDILIA FERNANDES DAS GRACAS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007764-91.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Defeito, nulidade ou anulaç…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007764-91.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Defeito, nulidade ou anulação, Indenização por Dano Moral, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ITAU UNIBANCO S.A. - CNPJ: 60.701.190/0001-04 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), NEIDE TRINDADE VARELLA - CPF: 463.777.789-53 (APELADO), EDILIA FERNANDES DAS GRACAS - CPF: 027.463.306-01 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por Itaú Unibanco S.A. contra sentença proferida em Ação Declaratória de Inexistência de Débito cumulada com Indenização por Danos Morais ajuizada por Neide Trindade Varella, que julgou procedentes os pedidos para declarar a inexistência do contrato nº 0022422724120220712C e condenar o banco ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00, em razão de descontos indevidos realizados no benefício previdenciário da autora decorrentes de contrato que a parte afirma não ter celebrado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se houve prova suficiente da regularidade da contratação do empréstimo consignado; (ii) verificar a existência de dano moral indenizável decorrente da cobrança indevida e determinar se o valor fixado na sentença é proporcional e adequado. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação jurídica entre as partes é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, sendo a instituição financeira responsável objetivamente pelos danos causados ao consumidor (Súmula 297 do STJ). A instituição financeira não se desincumbe do ônus de comprovar a regularidade da contratação, limitando-se a apresentar telas sistêmicas desprovidas de documentos essenciais como contrato assinado, gravações de voz, comprovantes de biometria ou outros elementos robustos que demonstrem a manifestação de vontade da consumidora. A apresentação de estornos mensais dos valores debitados pela instituição financeira reforça a inexistência de relação jurídica válida e legítima entre as partes, revelando o reconhecimento tácito da irregularidade da cobrança. É insuficiente a alegação de que o contrato impugnado seria um refinanciamento, visto que tal operação demanda novo instrumento contratual formalizado, o que não foi comprovado nos autos. Configura-se falha na prestação do serviço, ensejando responsabilidade civil da instituição financeira, uma vez que realizou descontos indevidos no benefício previdenciário da autora, caracterizando-se dano moral in re ipsa. O valor fixado a título de danos morais (R$ 6.000,00) observa os critérios da razoabilidade, proporcionalidade, caráter compensatório e pedagógico, não sendo cabível a sua minoração. Correta a aplicação dos juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ) e da correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ). Insubsistente o pleito de redução dos honorários advocatícios, fixados na sentença no mínimo legal (10%) e majorados no grau recursal para 15%, nos termos do art. 85, §11, do CPC. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A instituição financeira responde objetivamente pelos danos decorrentes da realização de empréstimo não contratado, cabendo-lhe o ônus de demonstrar a regularidade da contratação mediante elementos de prova robustos e suficientes. 2. A apresentação isolada de telas sistêmicas não é suficiente para comprovar a existência de contrato, especialmente quando impugnada pela parte consumidora. 3. O desconto indevido em benefício previdenciário, decorrente de contrato inexistente, configura dano moral in re ipsa, passível de indenização. 4. O refinanciamento de contrato pressupõe a celebração de nova avença formalizada, sendo inválido na ausência de instrumento contratual específico. 5. Os juros moratórios incidem desde o evento danoso (Súmula 54 do STJ) e a correção monetária desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ).” - Dispositivos relevantes citados: CC, art. 225; CDC, arts. 6º, VIII, e 47º; CPC, art. 85, §§ 2º e 11º, 373, II, e 422. Jurisprudência relevante citada: TJMT, ApCiv 10019412020188110045; TJMT, ApCiv 1008678-75.2023.8.11.0041; TJPE, ApCiv 4878997; TJPB, ApCiv 0811002-94.2022.8.15.0251; TJMT, ApCiv 1002969-89.2017.8.11.0002; TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041; STJ, Súmulas 54, 297 e 362. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por ITAÚ UNIBANCO S.A. contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Luiz Antonio Sari da 1ª Vara Cível de Rondonópolis, que, nos autos da Ação de Anulação de Negócio Jurídico c/c Reparação por Danos Morais com Pedido de Tutela de Urgência proposta por Neide Trindade Varella, julgou procedentes os pedidos para declarar inexistente o apontamento indicado na inicial e condenar a parte ré à indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais). Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, a regularidade da contratação e a ausência de má-fé, pugnando reforma integral da r. sentença. Defende, ainda, a inexistência de danos morais, pois, para além da validade do contrato, a conduta da instituição financeira decorreu de exercício regular de direito. Aduz que o termo inicial dos juros moratórios deve ser alterado para incidir a partir da data do arbitramento, nos termos da Súmula 362 do STJ, “uma vez que é somente a partir desta data é dada ao devedor a opção de saldar sua obrigação”. Diante disso, requer o provimento do recurso, a fim de se reformar totalmente a r. sentença, julgando-se improcedente a ação. Subsidiariamente, que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais, com aplicação da Súmula 362 do STJ e minoração dos honorários advocatícios. Contrarrazões no ID 289725860. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto por Itaú Unibanco S/A contra sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na ação ajuizada por Neide Trindade Varella, para declarar a inexistência do contrato de nº 0022422724120220712C e condenar a instituição financeira à indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais). Na inicial, a parte autora, ora apelada, afirma que a instituição financeira requerida vem realizando descontos de R$ 400,00 em seu benefício de aposentadoria, supostamente relacionados a um contrato de empréstimo consignado que desconhece e jamais firmou. Aduz ainda que, de forma injustificada, a instituição financeira vinha depositando valor semelhante em sua conta bancária com a justificativa de “estorno”. Por estas razões, a consumidora ajuizou a presente ação, pleiteando a declaração de inexistência do contrato nº 0022422724120220712C e a indenização em danos morais. Ao apresentar contestação, a instituição financeira, ora apelante, defende a validade da contratação, porquanto realizada com consentimento da consumidora e por meios legítimos. Assevera, ainda, que se trata de refinanciamento de outro contrato, o que supostamente justificaria a ausência de instrumento contratual específico. O juízo de origem julgou procedente a ação, nos seguintes termos: Vistos, etc... EIDE TRINDADE VARELLA, com qualificação nos autos, via seu bastante procurador, ingressou neste juízo com a presente 'Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais' em desfavor de ITAÚ UNIBANCO S/A, pessoa jurídica de direito privado, aduzindo: “Que, alega não haver contratado empréstimo consignado junto ao réu, razão pela qual vem sofrendo descontos indevidos em seus proventos; que, o contrato nº 0022422724120220712C, contraído na data de 12/07/2022, fora feito à sua revelia, com desconto mensal de R$ 400,00 (quatrocentos reais), assim, requer a procedência da ação, com a condenação da parte ré em danos morais, bem como nos encargos da sucumbência. Junta documentos e dá à causa o valor de R$ 26.166,35 (vinte e seis mil, cento e sessenta e seis reais, trinta e cinco centavos), postulando a ação sob o manto da assistência judiciária”. O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido, não sobrevindo nenhum recurso, bem como deferido o pedido de assistência judiciária gratuita e determinada a citação do réu, não sendo designada audiência de conciliação. Devidamente citado, contestara o pedido, onde procura rechaçar as assertivas levadas a efeito pela autora, pugnando pela improcedência da ação, uma vez que o ato que se pretende anular não possui nenhum defeito, razão pela qual deve o autor ser condenado nos ônus da sucumbência. Junta documentos. Sobre a contestação, manifestou-se a autora. Foi determinada a especificação das provas, tendo a parte autora requerido o julgamento antecipado da lide; e, a empresa ré produção de prova oral. Saneado o processo, foi designada audiência de conciliação, instrução e julgamento, a qual se realizou, ocasião em que foi tomado o depoimento pessoal da autora; e, em alegações derradeiras, as partes reprisaram as teses anteriormente esposadas – Id 185457626, vindo-me os autos conclusos. É o relatório necessário. DECIDO: No caso em tela, a pretensão levada a efeito pela autora é o reconhecimento da inexistência de débito e reparação de danos morais, porque, segundo a inicial, o contrato nº 0022422724120220712C, contraído na data de 12/07/2022, fora feito à sua revelia, bem como o valor tomado no referido empréstimo não aportou em sua conta bancária, razão pela qual, busca ser indenizada por danos morais. Analisando as razões de fato e de direito deduzidas pelas partes e diante das provas trazidas à colação, tenho comigo que a presente ação merece acolhimento, pois, em que pese a versão defensiva trazida na contestação, entendo que houve provas suficientes a demonstrar que a culpa pela ocorrência do fato narrado na exordial, deve ser debitado à empresa ré, que não tomara as providências necessárias que o caso, naquele momento exigia. Infere-se dos autos que a autora negou expressamente a formalização do contrato de nº 0022422724120220712C, de maneira que o ônus de provar o contrário seria do réu, pois o ordenamento jurídico brasileiro não comporta prova negativa.A propósito, sobre a distribuição do ônus da prova, Celso Agrícola Barbi leciona: (...) No caso concreto, extrai-se que o réu não se desincumbiu de seu ônus probatório disposto no artigo 373, II, do Código de Processo Civil, porquanto não apresentou cópia dos documentos pessoais da autora e documentos afins, colacionando apenas e tão somente telas sistêmicas. Insta salientar que as telas de computador apresentadas com a peça de bloqueio não são suficientes, por si sós, para demonstrar a contratação do empréstimo, por se tratarem de documentos produzidos de forma unilateral e de fácil manipulação, oportunamente impugnados pela parte autora. Registra-se que não há nos autos sequer um documento ou outro meio de prova capaz de indicar a autorização da autora, para a solicitação dos serviços de prestados pela instituição financeira ré. Lado outro, não se desconhece, a propósito, que com a modernidade houve verdadeira difusão das contratações através de telefone e de meios eletrônicos. Ocorre que o novo sistema, embora seja ágil, demonstra evidente vulnerabilidade, ensejando situação como a destes autos, pois facilita a atuação de falsários e dificulta a comprovação, pela instituição financeira ré, de quem efetivamente com ela contratou. Ainda que o Judiciário não possa ignorar tal realidade, também não pode deixar de exigir a tradicional prova da contratação - instrumento contratual assinado pela parte ré - mormente quando esta nega a existência de qualquer vínculo com a instituição financeira requerida e a sua alegação é fundada apenas em seus próprios dados unilaterais. Ora, se o requerido possui sistema eletrônico, inclusive de contratação, é dever seu dispor de meios seguros para garantir a identidade de seus clientes, sob pena de responder pela falha na prestação do serviço, assumindo para si o ônus da prova da contratação. Sobre a questão, eis a jurisprudência: (...) Assinala-se, por fim, que a autora não reconhece a relação jurídica estabelecida com a parte ré e que redundou em descontos em seu benefício previdenciário, portanto, cabe ao pretenso credor, então, o ônus da prova acerca da existência e da legitimidade da dívida. Conclui-se dizendo que os prints de tela do sistema eletrônico interno, sem documentos pessoais e assinatura da suposta contratante, não têm o condão de comprovar a contratação, pois é prova unilateral, sem dados hábeis a comprovar relação jurídica contratual. Assim, inequívoca a falha na prestação de serviços prestados pelo requerido, via de consequência a condenação em danos morais é medida que se impõe. Para a fixação do valor do dano moral, inexiste critério definido, pois por não ter natureza reparatória, torna-se difícil ou até mesmo impossível a fixação da indenização em valor equivalente ao dano, mormente como na situação de abalo de crédito, onde não há previsão legal específica no Código Civil acerca do correspondente dano moral ou mesmo patrimonial. Também, se à falta de critérios objetivos da lei, o juiz tem de se valer da prudência para atender, em cada caso, às suas peculiaridades, assim como à repercussão econômica da indenização do dano moral, o certo é que o valor da condenação, como princípio geral: "não deve ser nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequeno que se torne inexpressivo" (Humberto Theodoro Júnior, Dano Moral, página 46). Assim, provado nos autos que houve má prestação de serviços, fato esse de exclusiva culpa do réu, assim, havendo o dano moral, impõe-se o seu ressarcimento e, no que tange a fixação do dano, área em que, em situação como dos autos, arbitro R$ 6.000,00 (seis mil reais), indenização esta que atende os princípios, pois não se deve levar em conta apenas o potencial econômico da empresa demandada, é preciso também a repercussão do ressarcimento sobre a situação social e patrimonial do ofendido, para que lhe seja proporcionada. Face ao exposto e princípios de direito aplicáveis à espécie JULGO PROCEDENTE a presente 'Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais" promovida por NEIDE TRINDADE VARELLA, em desfavor de ITAÚ UNIBANCO S/A, com qualificação nos autos, para declarar inexistente o contrato nº 0022422724120220712C, contraído na data de 12/07/2022; condenar o réu no pagamento da importância de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de danos morais, devendo se corrigido: juros de 1% ao mês a contar do evento danoso e correção monetária a partir desta decisão, bem como no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento), sobre o valor da condenação, revogando a decisão Id 156606877. [...] Insurge-se a instituição financeira requerida contra a sentença, pleiteando o provimento do recurso para que seja julgada totalmente improcedente a demanda. Subsidiariamente, requer que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais e minoração dos honorários advocatícios. De proêmio, impende ressaltar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacífica jurisprudência cristalizada na Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Nesse contexto, imperativa a análise da controvérsia sob o prisma da vulnerabilidade do consumidor e dos princípios da boa-fé objetiva, transparência e dever de informação que norteiam as relações consumeristas. No presente caso, cinge-se a controvérsia à análise da suficiência probatória das telas sistêmicas para demonstrar a validade da contratação eletrônica do empréstimo consignado, bem como na configuração de eventual responsabilidade civil da instituição financeira pelos alegados danos morais. DAS PROVAS COLIGIDAS AOS AUTOS Primeiramente, cumpre reconhecer que, de fato, a evolução tecnológica transformou as relações contratuais, tornando amplamente difundidas as contratações por meio eletrônico. O ordenamento jurídico, atento a essa realidade, conferiu validade jurídica aos documentos eletrônicos, conforme dispõem os artigos 225 do Código Civil e 422 do Código de Processo Civil. Não obstante, a mera apresentação de telas sistêmicas não constitui, por si só, prova inequívoca da contratação, especialmente quando impugnada pela parte contrária, como ocorre nos presentes autos. É necessário que a instituição financeira demonstre, de forma robusta, não apenas a existência dos registros eletrônicos, mas também a autenticidade da manifestação de vontade do suposto contratante. No caso em exame, verifica-se que o apelante fundamentou sua defesa exclusivamente na apresentação de telas sistêmicas, sem juntar aos autos documentos pessoais da apelada, contratos assinados ou outros elementos que pudessem conferir maior segurança à prova da contratação. Embora seja certo que a contratação eletrônica prescinde de documento físico assinado, é igualmente verdadeiro que a instituição financeira deve dispor de meios seguros para garantir a identidade de seus clientes e a autenticidade das operações realizadas. A jurisprudência desta Corte tem se posicionado no sentido de que as telas sistêmicas, embora admissíveis como meio de prova, devem vir acompanhadas de outros elementos que corroborem a veracidade da contratação, especialmente quando existe negativa expressa do suposto contratante. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - TELAS SISTÊMICAS - DOCUMENTOS UNILATERAIS - DANO MORAL – CONFIGURADO – RECURSO DESPROVIDO. A juntada de cópias de telas sistêmicas e faturas mensais, produzidas unilateralmente sem qualquer outro elemento de prova não é suficiente para sustentar o alegado pela defesa.” (TJ-MT 10019412020188110045 MT, Relator.: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 28/09/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/09/2021, grifo nosso) “As telas do sistema da recorrida não podem ser admitidas como provas porque são confeccionadas unilateralmente, extraídas do seu sistema interno e, mormente quando dissociadas de outros elementos comprobatórios, não têm o condão de atestar, de maneira inequívoca, os fatos alegados, no caso, a aceitação do passageiro da acomodação em outra data, restando configurada a falha na prestação de serviço passível de responsabilização.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1008678-75.2023.8.11 .0041, Relator.: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 16/11/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/11/2023, grifo nosso) No presente caso, a situação apresenta contornos peculiares que merecem especial atenção. Conforme reconhecido pela própria apelada e não refutado pelo apelante, a instituição financeira vem realizando, mensalmente e de forma espontânea, estornos dos valores descontados dos proventos previdenciários da autora, o que, longe de ser mero ato de liberalidade, revela o reconhecimento tácito da irregularidade da cobrança. Ora, se a contratação fosse regular e os valores devidos, não haveria razão plausível para que a instituição financeira procedesse aos mencionados estornos de forma sistemática e espontânea. Essa circunstância, aliada à ausência de documentação complementar que pudesse conferir maior robustez à prova da contratação, conduz à conclusão de que, efetivamente, houve falha na prestação dos serviços bancários. Embora a apelante sustente que o contrato impugnado consiste em mero refinanciamento de contrato preexistente, apresentando como prova o comprovante de realização da operação (ID 289723881), referido documento não pode ser considerado instrumento contratual válido, tampouco prova suficiente da manifestação de vontade da consumidora, especialmente por não conter assinatura ou informações essenciais sobre as condições da operação. Ademais, cumpre esclarecer que o refinanciamento, embora vinculado ao contrato original, constitui negócio jurídico autônomo que demanda instrumentalização própria. Não se trata de mera prorrogação ou alteração do contrato inicial, mas sim de nova avença que substitui a anterior, estabelecendo condições diversas quanto a prazo, valor das parcelas e demais cláusulas contratuais. Por essa razão, o refinanciamento deveria estar devidamente formalizado em instrumento específico, contendo todas as informações e requisitos exigidos para os contratos de empréstimo consignado, não sendo admissível sua comprovação mediante simples comprovante de operação desprovido dos elementos essenciais à validade negocial. A propósito: “É cediço que o refinanciamento consiste é um novo contrato, pelo qual, o empréstimo anterior é rediscutido, seja no sentido de liberação de mais crédito ou aumento das parcelas; diminuição dos juros aplicados, porém uma vez realizado, o contrato anterior não existe mais, no caso em tela, observa-se que embora o banco argumente o refinanciamento, não faz prova disso, pois os três contratos existem simultaneamente e estão sendo descontados, além dos boletos enviados à residência da autora e negativação indevida de seu nome.” (TJ-PE - APL: 4878997 PE, Relator.: José Viana Ulisses Filho, Data de Julgamento: 22/11/2017, 1ª Câmara Regional de Caruaru - 1ª Turma, Data de Publicação: 14/12/2017, grifo nosso) “Assim como afirmou o Juiz de origem e não foi refutado pelo Banco, o contrato de empréstimo nº 625723670, teve sua nulidade declarada nos autos do processo nº 0811005-49.2022.8.15 .0251, ante a falsidade da assinatura, de modo que, havendo a nulidade do contrato originário, que foi refinanciado, perde-se a validade o contrato secundário. – O contrato de refinanciamento é considerado um contrato coligado ao contrato de empréstimo principal, já que ambos estão relacionados ao mesmo objeto, que é a dívida do mutuário. Ressalte-se, ainda, que as condições do contrato de refinanciamento são dependentes do contrato de empréstimo principal, uma vez que é a dívida original que está sendo refinanciada.” (TJ-PB - AC: 08110029420228150251, Relator.: Des. José Ricardo Porto, 1ª Câmara Cível, grifo nosso) É relevante destacar que, no sistema de responsabilidade civil consumerista aplicável às instituições financeiras, vigora a teoria do risco do negócio. Assim, ao disponibilizar sistemas eletrônicos de contratação, o fornecedor assume os riscos inerentes a essa modalidade de prestação de serviços, devendo responder pelos danos decorrentes de eventuais falhas de segurança ou fraudes praticadas por terceiros. Nesse contexto, a inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, encontra plena aplicação, cabendo à instituição financeira demonstrar a regularidade da contratação e a inexistência de defeito na prestação do serviço. No caso dos autos, tal ônus não foi adequadamente cumprido. DA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO Por força do art. 373, II, do CPC, competia ao banco apelado demonstrar, de forma robusta, que houve legítima contratação, o que poderia ter sido feito por meio da juntada do contrato e comprovação de saques, movimentação bancária, gravação de ligação telefônica, ou mesmo laudo pericial que atestasse a autenticidade da assinatura. Nenhum desses elementos, contudo, foi apresentado nos autos. À luz do contexto probatório, nota-se que a instituição financeira não logrou êxito em demonstrar a legitimidade do negócio jurídico supostamente firmado, visto que sequer colacionou aos autos o instrumento contratual, limitando-se a defender, de forma genérica, a sua existência e validade. Com essas considerações, tendo em vista a fragilidade do acervo probatório produzido pela instituição financeira, que dispunha de diversos meios para demonstrar a legitimidade da contratação, mas não o fez, e diante dos demais elementos carreados aos autos, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade da avença e, por consequência, da indevida realização de descontos no benefício previdenciário da apelada. DOS DANOS MORAIS Prosseguindo, apesar do esforço argumentativo da instituição financeira, tenho que restou demonstrada, na hipótese, a falha na prestação do serviço do banco requerido, por ter realizado descontos no benefício previdenciário da parte autora relativos a contrato de empréstimo consignado cuja legitimidade não foi comprovada. Assim, compreende-se que está caracterizada situação apta a ensejar a indenização em danos morais. A jurisprudência deste egrégio Sodalício é no sentido de que a cobrança indevida decorrente de contrato fraudulento resulta em danos morais in re ipsa, os quais dispensam a comprovação do abalo extrapatrimonial sofrido. Destaca-se: “O desconto indevido acarreta dano moral in re ipsa, ou seja, presumido, sendo desnecessária a comprovação do abalo ou sofrimento psicológico. V - A indenização por danos morais deve atender ao caráter sancionatório e inibitório, suficiente a desestimular a repetição da conduta lesiva, razão pela qual o valor do dano moral fixado na origem em R$ 8.000,00 (oito mil reais), não merece minoração.” (TJ-MT - AC: 10029698920178110002, Relator.: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 21/06/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/06/2023) Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 6.000,00 (seis mil reais), mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como, observados os princípios da moderação e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Nesse sentido: “Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. Constatada a má-fé, as parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas em dobro (art. 42 do CDC).” (TJ-MT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Julgado em 02/07/2024, Publicado em 02/07/2024) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. DO TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA Neste ponto, necessário consignar que sendo o contrato nulo, isso configura uma situação de responsabilidade extracontratual, pois não há um contrato válido que regule a relação entre as partes. A parte apelante sustenta que os juros moratórios devem incidir a partir da data do arbitramento do valor da indenização, conforme Súmula 362 do STJ. Contudo, verifico que o juízo de origem decidiu em consonância com o entendimento jurisprudencial consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.” (Súmula 54) Importa mencionar que o termo inicial a que se refere a instituição financeira é, na realidade, aplicável à correção monetária (e não aos juros de mora), por força da Súmula 362 do STJ, o que foi devidamente observado pelo juízo sentenciante. “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.” Portanto, quanto à indenização por danos morais, a correção monetária incide a partir da data do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ, e os juros moratórios incidem a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ, exatamente como determinado na sentença. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Por fim, a instituição financeira impugna o quantum arbitrado a título de honorários advocatícios. Todavia, suas ilações não merecem guarida. De maneira imprecisa e sem fundamentos sólidos, alega a excessividade do percentual fixado e a inobservância do magistrado sentenciante ao § 2º do art. 85 do CPC, que dispõe: “Art. 85.A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. (...) § 2ºOs honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I- o grau de zelo do profissional; II- o lugar de prestação do serviço; III- a natureza e a importância da causa; IV- o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.” Como visto, o referido dispositivo estabelece ordem decrescente de preferência, sendo o proveito econômico ou o valor da causa parâmetros subsidiários para fixação dos honorários sucumbenciais, devendo ser adotados apenas quando inexistente condenação pecuniária. Além disso, há expressa limitação ao percentual a ser arbitrado, de no mínimo 10% e máximo de 20% sobre a base de cálculo, o que foi devidamente considerado pelo magistrado. No caso dos autos, o juízo singular fixou os honorários advocatícios no mínimo legal permitido, de modo que não se verifica a plausibilidade de suas alegações. Não há falar, igualmente, em redução do quantum indenizatório por alegada excessividade, uma vez que o valor fixado em R$ 6.000,00 (seis mil reais) se revela adequado e proporcional às circunstâncias do caso. Considerando-se a capacidade econômica da instituição financeira ré e a necessidade de que a indenização cumpra tanto a função compensatória quanto a pedagógica, o montante estabelecido se mostra suficiente para reparar os transtornos e constrangimentos suportados pela autora em decorrência dos descontos indevidos em seus proventos previdenciários, sem configurar enriquecimento sem causa, ao mesmo tempo em que possui aptidão para desestimular a reiteração de condutas similares por parte da fornecedora de serviços bancários. Diante da ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, da regularidade das cobranças impugnadas, bem como da inexistência de prova incontestável de que a consumidora possuía pleno conhecimento e consentiu expressamente com a contratação, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, por esses e seus próprios fundamentos, e em estrita observância aos princípios basilares que regem as relações de consumo, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável (art. 47 do CDC). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a sentença impugnada. Em se tratando de consectário lógico do resultado do julgamento, majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025
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