Processo nº 1000953-49.2024.8.11.0025
ID: 331079837
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado
Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000953-49.2024.8.11.0025
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
NATANAEL BEDA DA CRUZ
OAB/GO XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000953-49.2024.8.11.0025 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar] R…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000953-49.2024.8.11.0025 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [G. R. N. - CPF: 106.713.241-44 (EMBARGANTE), NATANAEL BEDA DA CRUZ - CPF: 067.882.535-10 (ADVOGADO), GEAP AUTOGESTAO EM SAUDE - CNPJ: 03.658.432/0001-82 (APELADO), DANDARA LESCANO - CPF: 030.247.361-07 (ADVOGADO), LETICIA DE AMORIM PEREIRA - CPF: 048.874.491-19 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), EDUARDO DA SILVA CAVALCANTE - CPF: 859.755.161-53 (ADVOGADO), G. R. N. - CPF: 106.713.241-44 (APELANTE), NATANAEL BEDA DA CRUZ - CPF: 067.882.535-10 (ADVOGADO), GEAP AUTOGESTAO EM SAUDE - CNPJ: 03.658.432/0001-82 (EMBARGANTE), EDUARDO DA SILVA CAVALCANTE - CPF: 859.755.161-53 (ADVOGADO), DANDARA LESCANO - CPF: 030.247.361-07 (ADVOGADO), ROSANA ROX - CPF: 044.328.259-52 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: EMBARGOS REJEITADOS. UNANIME. E M E N T A EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – PLANO DE SAÚDE DE AUTOGESTÃO – ALEGAÇÃO DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE – INEXISTÊNCIA – INAPLICABILIDADE DO CDC EXPRESSAMENTE RECONHECIDA NO ACÓRDÃO – FUNDAMENTAÇÃO BASEADA NOS PRINCÍPIOS GERAIS DOS CONTRATOS, NA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA DOS PLANOS DE SAÚDE E NAS NORMAS CONSTITUCIONAIS – AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO INTERNA – PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA – IMPOSSIBILIDADE – EMBARGOS REJEITADOS. Na forma do artigo 1.022 do CPC, os embargos de declaração são viáveis quando presente omissão, obscuridade, contradição ou erro material na decisão recorrida, circunstâncias não evidenciadas no caso. R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração opostos por GEAP AUTOGESTÃO EM SAÚDE contra acórdão proferido por esta Terceira Câmara de Direito Privado, que, por unanimidade, negou provimento ao seu recurso e deu parcial provimento ao recurso da parte autora G. R. N. REPRESENTADO POR ROSANA ROX, apenas para majorar os honorários advocatícios para 15% sobre o valor da condenação. A embargante alega a existência de omissão, contradição e obscuridade no acórdão embargado, sustentando que o julgado teria reconhecido a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, por se tratar de entidade de autogestão, mas que, posteriormente, teria aplicado entendimentos típicos das relações de consumo. Argumenta que "o MM. Juízo entendeu que aplicaria ao caso o CDC, utilizando como fundamento 'Aos planos de saúde de autogestão não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula 608 do STJ, devendo a relação jurídica ser regida pelos princípios contratuais do Código Civil e pela legislação específica da saúde suplementar", o que configuraria contradição. Destaca que "a GEAP Autogestão em Saúde é fundação de direito privado classificada perante a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS como Operadora de Saúde na modalidade de autogestão multipatrocinada", e que "o modelo de assistência à saúde é desenvolvido de acordo com a política assistencial definida pelos beneficiários empregados/servidores e patrocinadores (empregadores), os quais gerem a entidade por meio dos seus representantes no Conselho de Administração". Sustenta que, "restando demonstrado que a GEAP, enquanto operadora de saúde, é uma entidade de autogestão, evidencia-se a premissa de que não tem o lucro como sua finalidade existencial, sendo os próprios associados que custeiam os serviços oferecidos pela entidade por meio da formação de um fundo comum, sem qualquer objetivo de lucro, não estão presentes a figura de consumidor e fornecedor e, por sua vez, a relação estabelecida entre as partes não se enquadra nos ditames consumeristas e sim nos preceitos da Legislação específica Lei 9.656/98 e do Código Civil Brasileiro". Invoca a Súmula 608 do STJ e precedentes jurisprudenciais para reforçar a tese da inaplicabilidade do CDC às entidades de autogestão. Ao final, requer o acolhimento dos embargos de declaração para que seja reconhecida "a omissão, contradição e obscuridade na decisão prolatada a fim de sanar o equívoco apontado, considerando ainda a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para as Operadoras de Saúde em Autogestão, afastando a inversão do ônus da prova, atendendo assim a súmula 608 do STJ/2018". É o relatório. Inclua-se em pauta. DES. DIRCEU DOS SANTOS RELATOR V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. Na forma do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são viáveis quando presentes as hipóteses restritas de omissão, obscuridade, contradição ou erro material na decisão. Relevante consignar, ainda, que os embargos de declaração não têm a mesma amplitude recursal destinada aos demais recursos, ou seja, não podem ser utilizados com o fim único de reexame do julgado, pois são condicionados à existência de omissão, contradição e obscuridade. Nesse passo, a despeito da tese da parte embargante, o fato de haver decisão desfavorável ao posicionamento que adota, não leva ao raciocínio de que houve vício no julgado a legitimar o manejo dos presentes declaratórios. A embargante alega a existência de omissão, contradição e obscuridade no acórdão embargado, sustentando que o julgado teria reconhecido a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, por se tratar de entidade de autogestão, mas que, posteriormente, teria aplicado entendimentos típicos das relações de consumo. Sem razão a embargante. O acórdão embargado já consignou que: “As entidades de autogestão caracterizam-se pela ausência de finalidade lucrativa e pelo modelo associativo em que os próprios beneficiários participam da gestão do plano de saúde. No caso da GEAP, trata-se de fundação de direito privado, classificada perante a Agência Nacional de Saúde Suplementar como operadora de saúde na modalidade de autogestão multipatrocinada, cujo modelo assistencial é desenvolvido de acordo com política definida pelos próprios beneficiários e patrocinadores, que administram a entidade por meio de seus representantes. Não obstante a inaplicabilidade do CDC, a relação contratual permanece regida pelos princípios gerais dos contratos, notadamente a boa-fé objetiva, a função social do contrato e o equilíbrio contratual, além da legislação específica dos planos de saúde (Lei nº 9.656/98) e das normas constitucionais que asseguram o direito à saúde. Adentrando ao cerne da controvérsia meritória, observa-se que a matéria em disceptação gravita em torno da legitimidade da negativa de cobertura de tratamento médico denominado "Protocolo PediaSuit", prescrito por médico especialista ao menor G. R. N., portador de hidrocefalia, paralisia cerebral, nascido prematuro com anoxia neonatal e hemorragia intraventricular grau IV. Prima facie, cumpre estabelecer as premissas teóricas que fundamentam a presente análise. O contrato de plano de saúde caracteriza-se como avença de trato sucessivo, cuja execução se protrai no tempo, objetivando o resguardo da saúde do contratante mediante contraprestação pecuniária. A função social desse contrato consiste, precipuamente, em proporcionar ao beneficiário o amparo necessário à preservação de sua saúde em situações de enfermidade, mediante assistência médica, hospitalar, laboratorial, farmacêutica e terapêutica, conforme os limites estabelecidos na apólice. In casu, consoante documentação médica acostada aos autos, o menor apelante é portador de graves comorbidades neurológicas decorrentes de parto prematuro extremo (27 semanas de gestação), com anóxia neonatal prolongada e hemorragia intraventricular grau IV, resultando em hidrocefalia e alterações motoras caracterizadas por espasticidade, atonia de tronco e incoordenação de membros. Conforme laudo médico emitido por especialista que acompanha o paciente, o tratamento convencional de fisioterapia não tem apresentado resultados satisfatórios para o quadro do menor, permanecendo importante atraso motor, com fraqueza de membros e axial, associados à hipertonia espástica. Diante disso, o médico assistente prescreveu expressamente o protocolo PediaSuit, com o objetivo específico de "melhorar o desenvolvimento motor, resistência, flexibilidade, equilíbrio e coordenação para proporcionar reabilitação adequada ao quadro do paciente". A negativa da operadora de plano de saúde ampara-se precipuamente em três fundamentos: a) a ausência do tratamento no Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS); b) o alegado caráter experimental do método terapêutico prescrito; e c) a alegação de que o protocolo PediaSuit envolve o uso de órteses não ligadas ao ato cirúrgico, cuja exclusão de cobertura estaria expressamente prevista no artigo 10, VII, da Lei nº 9.656/98. Quanto ao primeiro fundamento, impende destacar que a Lei nº 14.454/2022 trouxe clareza definitiva à questão, estabelecendo que o rol de procedimentos da ANS constitui referência básica para os planos de saúde, mas prevendo expressamente que "em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde", desde que: a) exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou b) existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional. No caso em tela, o objeto da contratação é a cobertura de todas as doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde da Organização Mundial da Saúde, entre as quais se incluem a hidrocefalia e a paralisia cerebral, diagnosticadas no menor. A prescrição médica fundamentada, detalhando os benefícios específicos do protocolo PediaSuit para o caso concreto, atende ao requisito legal de comprovação da eficácia do tratamento à luz das ciências da saúde, o que torna obrigatória a cobertura pela operadora, nos termos da Lei nº 14.454/2022. No que concerne ao alegado caráter experimental do tratamento, verifica-se que tal caracterização não encontra respaldo nos elementos objetivos carreados aos autos. Primeiramente, constata-se que a apelante incorre em imprecisão técnica ao equiparar o protocolo PediaSuit ao método Therasuit, tratando-os como sinônimos, quando na realidade constituem abordagens terapêuticas distintas, ainda que com algumas similaridades. O protocolo PediaSuit, especificamente prescrito ao menor apelante, possui registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sob o código 81265770001, o que, por si só, afasta a caracterização como procedimento experimental. A existência de registro sanitário pressupõe a avaliação técnica do órgão regulador quanto à segurança e eficácia do dispositivo médico, sendo incompatível com a natureza experimental alegada pela operadora de plano de saúde. Ademais, o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), por meio do Acórdão nº 38, de 26 de junho de 2015, reconheceu modalidades terapêuticas como o PediaSuit como "avanço técnico para a melhora da funcionalidade dos pacientes, sendo utilizada, para tal fim, intervenção com cinesioterapia, visando restaurar e recuperar a capacidade para a realização das tarefas". Quanto à alegação de que o protocolo PediaSuit envolveria o uso de órteses não ligadas ao ato cirúrgico, cuja exclusão de cobertura estaria autorizada pelo artigo 10, VII, da Lei nº 9.656/98, tal argumento não prospera. Isso porque o tratamento prescrito constitui procedimento fisioterapêutico integral, sendo as vestes terapêuticas parte indissociável da técnica empregada, e não mero dispositivo auxiliar que possa ser caracterizado isoladamente como órtese para fins de exclusão de cobertura. A interpretação teleológica do dispositivo legal invocado pela operadora revela que a exclusão de cobertura para órteses não ligadas ao ato cirúrgico visa afastar a obrigatoriedade de fornecimento de dispositivos ortopédicos de uso contínuo ou prolongado pelo paciente (como muletas, andadores, cadeiras de rodas, órteses plantares, entre outros), não se aplicando a dispositivos que integram indissociavelmente técnicas terapêuticas específicas, como ocorre no protocolo PediaSuit. Nesse diapasão, considerando a principiologia aplicável à espécie, notadamente os princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da proteção da dignidade da pessoa humana, bem como a interpretação sistemática do ordenamento jurídico pátrio e as diretrizes expressas da Lei nº 14.454/2022, forçoso reconhecer a abusividade da negativa de cobertura no caso concreto, por frustrar a própria finalidade do contrato de plano de saúde e comprometer o direito à saúde do beneficiário. A alegação da operadora de plano de saúde quanto ao potencial desequilíbrio econômico-financeiro decorrente da obrigação de custear tratamentos não previstos no rol da ANS não possui o condão de afastar sua responsabilidade contratual, mormente quando comprovada a imprescindibilidade do tratamento para a saúde do beneficiário e existente expressa previsão legal na Lei nº 14.454/2022 determinando a cobertura em casos como o presente. O risco econômico é inerente à atividade empresarial desenvolvida pelas operadoras de planos de saúde, não podendo ser transferido ao beneficiário mediante negativa de cobertura de tratamentos medicamente indicados. No que tange à pretensão de limitação temporal do tratamento, tal pedido não merece acolhimento, considerando a natureza crônica e não curável das condições neurológicas que acometem o menor. O tratamento prescrito possui caráter contínuo e progressivo, visando o desenvolvimento de habilidades motoras e a mitigação de déficits funcionais, não sendo possível estabelecer a priori um termo final para sua necessidade. A manutenção do tratamento deve estar condicionada à avaliação periódica do médico assistente quanto à sua necessidade e eficácia, não podendo ser arbitrariamente limitada pela operadora de plano de saúde. Quanto à alegação de que o tratamento deveria ser realizado exclusivamente por profissionais credenciados à rede da operadora, tal pretensão também não prospera. Conforme documentação acostada aos autos, o protocolo PediaSuit requer estrutura específica e capacitação técnica especializada, não disponível na rede credenciada da operadora. A ausência de profissionais habilitados na rede própria não pode constituir óbice ao acesso do beneficiário ao tratamento prescrito, sendo legítima, em tais circunstâncias, a autorização para realização em estabelecimento não credenciado, com posterior reembolso integral das despesas, sob pena de frustração da própria finalidade do contrato. Igualmente não merece acolhimento o pedido subsidiário de autorização para pesquisa de mercado com elaboração de no mínimo três orçamentos para escolha do prestador com o custo mais benéfico para a operadora. A relação médico-paciente e a escolha do profissional para a realização de tratamento prescrito constituem questão personalíssima, que não pode ficar subordinada exclusivamente a critérios econômicos, mormente em se tratando de tratamento especializado para paciente menor de idade com condições neurológicas complexas. Este Egrégio Tribunal tem reiteradamente decidido em consonância com o mesmo entendimento. “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. COBERTURA DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PARA CRIANÇA COM PARALISIA CEREBRAL. FISIOTERAPIA PELO MÉTODO PEDIASUIT. ROL DA ANS COMO REFERÊNCIA BÁSICA. CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS CONFIGURADAS. RECURSO NÃO PROVIDO. (...) Tese de julgamento: O rol da ANS é referência básica, não excluindo a cobertura de tratamento não previsto quando presentes evidências científicas e recomendações técnicas. O método Pediasuit, utilizado em sessões de fisioterapia e terapia ocupacional, possui eficácia reconhecida, registro na Anvisa e não é considerado experimental, assim, em análise sumária, é devida a cobertura. A tutela de urgência para custeio de tratamento essencial à saúde de menor gravemente enfermo é medida que se justifica diante da demonstração do perigo de dano e da probabilidade do direito. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 6º; Lei 9.656/1998, arts. 10, 12 e 35-C; Lei 14.454/2022; CPC/2015, art. 297; RN 465/2021 da ANS, art. 17. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1886929/SP, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, j. 08.06.2022; STJ, REsp 2.108.440/GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03.04.2025.” (N.U 1006302-74.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS – PLANO DE SAÚDE – PRESCRIÇÃO MÉDICA PARA TRATAMENTO COM O MEDICAMENTO DENOMINADO “PEDIASUIT” – PACIENTE MENOR ACOMETIDO COM SÍNDROME DE DOWN – RECUSA INDEVIDA – TRATAMENTO INDICADO FORA DO ROL DA ANS – IRRELEVÂNCIA – PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS – DANO MORAL RECONHECIDO – VALOR FIXADO COM BASE NOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE - SENTENÇA REFORMADA - CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Segundo orienta o Superior Tribunal de Justiça, o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura contratual, todavia, não lhe é permitido restringir o tipo de tratamento, medicamento ou procedimento indicado por médico considerado essencial para a cura de tais doenças. Segundo a jurisprudência do STJ, “é abusiva a recusa da operadora do plano de saúde de custear a cobertura do medicamento registrado na ANVISA e prescrito pelo médico do paciente, ainda que se trate de fármaco off-label, ou utilizado em caráter experimental” (AgInt no AREsp: 2092427 SC 2022/0083001-0, Data de Julgamento: 15/08/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/08/2022). Há nexo de causalidade entre a conduta de recusar a cobertura e o resultado suportado pela beneficiária, quais sejam, transtornos, angústia, abalo psicológico de monta imensurável, mormente por se tratar da própria saúde. A indenização por dano moral deve ser fixada em montante que não onere em demasia o ofensor, mas, por outro lado, atenda à finalidade para a qual foi concedida, compensando o sofrimento da vítima e desencorajando a parte quanto a outros procedimentos de igual natureza.” (N.U 1002204-61.2023.8.11.0050, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 08/03/2025) No que concerne ao dano moral, impende consignar que a negativa injustificada de cobertura de tratamento médico essencial constitui violação a direitos da personalidade, notadamente quando envolve paciente menor de idade em situação de especial vulnerabilidade. No caso concreto, a recusa da operadora de plano de saúde em custear o tratamento prescrito por médico especialista, indispensável para o desenvolvimento neuropsicomotor do menor, ultrapassa a esfera do mero inadimplemento contratual, configurando dano moral passível de compensação pecuniária. Conforme bem destacado pelo Ministério Público em seu parecer, "o Superior Tribunal de Justiça já fixou entendimento no sentido de que a negativa indevida do plano de saúde em autorizar tratamento prescrito por médico habilitado configura ato ilícito do qual decorre dano moral indenizável". O quantum indenizatório fixado na sentença – R$ 3.000,00 (três mil reais) – observou os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, considerando as circunstâncias do caso concreto, a capacidade econômica das partes e o caráter compensatório e pedagógico da indenização, não merecendo reforma neste particular. No que tange aos honorários advocatícios, objeto do recurso do autor, verifica-se que o magistrado a quo fixou os honorários em 10% sobre o valor da condenação, com base no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Em seu recurso, o autor pleiteia não apenas a majoração do percentual para 20%, mas também a alteração da base de cálculo, pretendendo que os honorários incidam sobre o valor da causa (R$ 361.920,00), e não sobre o valor da condenação. Prima facie, impende estabelecer a correta interpretação do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, que determina: "Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço." A exegese do dispositivo legal em comento revela que a base de cálculo dos honorários advocatícios deve ser, em ordem de preferência: a) o valor da condenação; b) o proveito econômico obtido; ou, c) não sendo possível mensurá-los, o valor atualizado da causa. Trata-se de critérios sucessivos, não alternativos, de modo que a aplicação do valor da causa como base de cálculo somente se justifica quando não for possível mensurar o valor da condenação ou o proveito econômico obtido. In casu, a sentença condenou a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais e determinou o fornecimento do tratamento pelo protocolo PediaSuit, configurando obrigação de fazer cujo valor econômico é mensurável. Destarte, havendo condenação de natureza pecuniária e obrigacional, a base de cálculo dos honorários deve ser o valor total da condenação, que abrange tanto o montante da indenização por danos morais quanto o valor estimado da obrigação de fazer. Quanto ao percentual fixado na sentença (10%), entendo que assiste parcial razão ao apelante. Considerando a complexidade da causa, que envolve matéria técnica especializada relacionada a tratamento médico inovador; o trabalho desenvolvido pelo patrono do autor, que apresentou fundamentação robusta e documentação técnica pertinente; e o proveito econômico obtido, correspondente ao custo do tratamento por período indeterminado, mostra-se adequada a majoração dos honorários para 15% sobre o valor da condenação, percentual intermediário entre o mínimo e o máximo previsto no dispositivo legal supramencionado. Ressalte-se que, diferentemente do sugerido pelo Ministério Público em seu parecer, não há razão para aplicação do §8º do art. 85 do CPC (apreciação equitativa), pois o caso em tela possui valor definido da condenação e proveito econômico mensurável. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a fixação equitativa só é possível quando inestimável ou irrisório o valor da causa e da condenação, o que não é o caso dos presentes autos. No que concerne ao pedido de fixação da base de cálculo sobre o valor da causa, esta não merece acolhimento, uma vez que, havendo condenação expressa em valor monetário e obrigação de fazer de natureza mensurável, deve-se aplicar a regra geral do art. 85, § 2º, do CPC, utilizando-se o valor da condenação como base de cálculo para os honorários advocatícios. Ademais, a pretendida alteração da base de cálculo para o valor da causa (R$ 361.920,00) resultaria em honorários desproporcionais ao trabalho realizado e à importância da causa, o que contraria os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade que devem nortear a fixação da verba honorária.” Inviável, portanto, a modificação do julgado na ausência de vício sanável. Além do mais, se a parte embargante não concorda com a fundamentação expendida na decisão embargada, como é de se esperar, já que as decisões judiciais nem sempre satisfazem os interesses daqueles que procuram o Judiciário, deve a sua irresignação, se for o caso, ser deduzida por meio de outra via, que não a dos embargos declaratórios. Outrossim, cabe relembrar que ainda que a parte alegue a intenção de ventilar matéria para fins de prequestionamento, o julgador não é obrigado a examinar exaustivamente todos os dispositivos legais apontados pela recorrente, quando a fundamentação da decisão for clara e precisa, solucionando o objeto da lide. Ademais, é cediço que basta ao magistrado declinar o seu entendimento sobre o caso que lhe é apresentado, expondo os motivos que o levaram a tal desiderato. O Superior Tribunal de Justiça assevera: “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA. 1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço. 2. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida. 3. No caso, entendeu-se pela ocorrência de litispendência entre o presente mandamus e a ação ordinária n. 0027812-80.2013.4.01.3400, com base em jurisprudência desta Corte Superior acerca da possibilidade de litispendência entre Mandado de Segurança e Ação Ordinária, na ocasião em que as ações intentadas objetivam, ao final, o mesmo resultado, ainda que o polo passivo seja constituído de pessoas distintas.4. Percebe-se, pois, que o embargante maneja os presentes aclaratórios em virtude, tão somente, de seu inconformismo com a decisão ora atacada, não se divisando, na hipótese, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil, a inquinar tal decisum.5. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ. EDcl no MS 21.315/DF, Rel. Ministra DIVA MALERBI (Desembargadora convocada TRF 3ª região), PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08.06.2016, DJe 15.06.2016). Desse modo, não é exigido que a decisão rebata uma a uma das teses levantadas, ou mencione todos os dispositivos legais que alicerçam o convencimento, devendo apenas mostrar, de forma clara, quais os fundamentos que motivaram a convicção. Assim, não necessita, o julgador, dissecar dispositivo por dispositivo, concedendo-lhe ou negando-lhe vigência. Acerca do assunto, proclamou o Superior Tribunal de Justiça: O Tribunal a quo enfrentou fundamentadamente os pontos essenciais para o deslinde da controvérsia. O julgador não é obrigado a manifestar-se acerca de todos os argumentos apontados pelas partes, se já tiver motivos suficientes para embasar a sua decisão (EDclAg n. 742.465/SP, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJU de 30-5-2006). Por fim, advirto o embargante que nova reiteração da tese aqui tratada ensejará a aplicação da sanção descrita no art. 1.026, § 2º, do CPC. Dispositivo. Com estas considerações, conheço os EMBARGOS DE DECLARAÇÃO e REJEITO-OS. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear