Processo nº 1002110-68.2017.5.02.0004
ID: 321864562
Tribunal: TST
Órgão: 7ª Turma
Classe: RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO
Nº Processo: 1002110-68.2017.5.02.0004
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
DR. FLAVIA MARTINS GONCALVES DE AZEVEDO
OAB/RJ XXXXXX
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A C Ó R D Ã O
7ª Turma
GMEV/ROS/iz
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE RÉ. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA. Em relação à transcendência econ…
A C Ó R D Ã O
7ª Turma
GMEV/ROS/iz
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE RÉ. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA. Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso da empresa, os valores fixados no artigo 496, § 3º, do CPC, conforme seu âmbito de atuação. No caso, o Tribunal Regional arbitrou à condenação o valor de R$ 1.000.000,00, e, assim, foi alcançado o patamar da transcendência. Assim, admite-se a transcendência econômica da causa.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. INTERESSE DE AGIR. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e a desta Corte Superior firmou-se no sentido de que o Ministério Público do Trabalho detém legitimidade para ajuizar ação civil pública para tutela de interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos socialmente relevantes. No caso destes autos, o órgão ministerial propugna pela observância das normas protetivas consolidadas (duração do trabalho), tratando-se de defesa de interesses coletivos, na espécie de direito individual homogêneo, de origem comum. Assim, patente a legitimidade ativa e o interesse de agir do Ministério Público do Trabalho. Inteligência dos artigos 127, caput, e 129, III, da Constituição Federal; 5º, I, da Lei nº 7.347/85; 1º, 6º, VII, e 83, I e III, da Lei Complementar nº 75/93. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
INÉPCIA DA INICIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. O TRT anotou que, "após relatar diversas irregularidades praticadas pela ré quanto às normas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, o autor fundamentou o pleito relativo à indenização por dano moral coletivo, formulando pedido certo e determinado". O artigo 810, §1º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, de aplicação a presente demanda coletiva, é claro ao dispor que: "sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante". Ademais, no processo do trabalho, em virtude dos princípios da simplicidade e da informalidade, não se exige rigor no exame dos requisitos da inicial. Basta que do seu contexto se possa extrair a pretensão, sem exigência de maiores formalidades Assim, havendo a breve exposição dos fatos em que se alicerça a lide, não se há de falar em prejuízo à prestação da tutela jurisdicional ou à tese de defesa, razão pela qual não merece guarida a pretensão ventilada pela ré. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
CUMULAÇÃO DOS PEDIDOS DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER E PAGAMENTO DA REPARAÇÃO DOS DANOS COLETIVOS. O artigo 3º da Lei nº 7.347/85 preceitua que "a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer." A conjunção "ou" - contida no referido dispositivo, tem, tanto para o Superior Tribunal de Justiça como para esta Corte Superior, sentido de adição, ou seja, é possível a cumulação das condenações em obrigações de fazer ou não fazer e indenização pecuniária. Nesse contexto, afigura-se lícita, em sede da Ação Civil Pública, a cumulação da condenação ao pagamento de danos coletivos, além da determinação de obrigação de fazer. Precedentes. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER. JORNADA DE TRABALHO. INTERVALOS INTRAJORNADAS E INTERJORNADAS. CONSTATAÇÃO DE IRREGULARIDADES. TESE RECURSAL QUE DEMANDA O REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. A Corte de origem, soberana na análise do conjunto fático-probatório, após minuciosa apreciação dos elementos coligidos aos autos, anotou não haver "dúvidas quanto à prática de irregularidades pela empresa no tocante às normas de saúde e segurança do trabalho de forma contínua ao longo de tempo". O exame da tese recursal, em sentido contrário, esbarra no óbice da Súmula nº 126 do TST, pois demanda o revolvimento de fatos e provas. Com respaldo no artigo 405 do Código de Processo Civil, as provas produzidas no inquérito civil possuem valor probante e podem ser devidamente apreciadas quando da propositura da ação civil pública. Contudo, tal valor é relativo e o conjunto probatório pode ser afastado, diante de contraprova produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Sucede que, na ocasião, não foram produzidas provas aptas a infirmar aquelas colacionadas com a inicial. Registra-se que a ré não juntou, sequer, os cartões de ponto, como consignado no acórdão recorrido. Portanto, não merece reforma a decisão regional, devendo ser mantida a condenação da empresa nas obrigações de fazer e não fazer, consoante postulado pelo Parquet. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
TUTELA ANTECIPADA. DEFERIMENTO. NÃO ATENDIMENTO DA EXIGÊNCIA CONTIDA NO ARTIGO 896, §1º-A, I, DA CLT. Inviável a apreciação da matéria, pois a parte deixou de colacionar o trecho do julgado que consubstancia o prequestionamento da controvérsia, desatendendo, assim, a disciplina do artigo 896, §1º-A, I, da CLT. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
LIMITAÇÃO DAS ASTREINTES. ARTIGO IMPERTINENTE. A limitação contida no artigo 412 do Código Civil aplica-se apenas aos casos de apuração de multa estipulada em cláusula penal, nos moldes da Orientação Jurisprudencial nº 54 da SBDI-1 desta Corte, de modo que impertinente ao caso a indicação de afronta ao artigo 412 do Código Civil. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
DANO MORAL COLETIVO. DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA CONCERNENTE À JORNADA DE TRABALHO. POTENCIAL PREJUÍZO À SAÚDE E HIGIDEZ FÍSICA E MENTAL DO TRABALHADOR. A prática reiterada da empresa em desrespeito aos direitos trabalhistas não pode ser opção, tampouco merece ser tolerada pelo Poder Judiciário, sobretudo no Estado Democrático de Direito, em que a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho representam fundamentos da República (art. 1º, III e IV). No caso, a caracterização do dano moral coletivo perpetrado pela empresa dispensa a prova do efetivo prejuízo financeiro de todos os empregados ou do dano psíquico, pois a lesão decorre da própria conduta ilícita da empresa, pela inobservância da limitação da jornada ajustada e da obrigação de sua anotação, inclusive no que tange ao cumprimento dos intervalos intrajornada e entre jornadas e demais pausas para o descanso, ultrapassando, portanto, os limites da pretensão meramente individual. Caracterizada, assim, a lesão a direitos e interesses transindividuais, tem-se por configurada a ofensa a patrimônio jurídico da coletividade, que necessita ser recomposto. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
VALOR ARBITRADO. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. A alegação genérica de que o valor arbitrado para a indenização por danos morais não atende aos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade não se coaduna com a natureza especial do recurso de revista. É necessário que a parte indique, de modo fundamentado, em que pontos os critérios utilizados pela Corte Regional não foram aplicados ou mensurados corretamente e as razões pelas quais considera que o valor fixado não corresponde à extensão do dano. Não observada essa exigência, mostra-se inviável a constatação de afronta ao artigo 944, parágrafo único, do Código Civil. Precedentes desta Turma. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
RECURSO DE REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA. Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso do empregado/parte autora, o valor fixado no artigo 852-A da CLT e, na hipótese dos autos, há elementos a respaldar a conclusão de que os pedidos rejeitados e devolvidos à apreciação desta Corte ultrapassam o valor de 40 salários mínimos. Assim, admite-se a transcendência da causa.
DANOS MORAIS COLETIVOS. INDENIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRO. VALOR ARBITRADO. DO PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. DOS PARÂMETROS PARA FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA (PUNITIVE DAMAGES). JUSTIÇA CORRETIVA (CORRELATIVIDADE E PERSONALIDADE)/ CRITÉRIO COMPENSATÓRIO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. CRITÉRIO BIFÁSICO DE MENSURAÇÃO DOS DANOS MORAIS.
I. No caso dos autos, a fixação do quantum indenizatório por empresa com capital social bilionário é incontroversa. Ademais, importa ressaltar que as empresas que se lançam no mercado, assumindo o ônus financeiro de cumprir a legislação trabalhista, perdem competitividade em relação àquelas que reduzem seus custos de produção à custa dos direitos mínimos assegurados aos empregados. Diante desse quadro, comprovada a deliberada e reiterada desobediência do empregador à legislação trabalhista, em afronta à Constituição da República, que tem por objetivo fundamental construir sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da CF), tratando-se de lesão que viola bens jurídicos indiscutivelmente caros a toda a sociedade, surge o dever de indenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP).
II. Para verificar se o valor foi ínfimo ou exorbitante é preciso levar em consideração as peculiaridades do caso concreto, conforme método bifásico adotado pelo STJ.
III. Há jurisprudência em casos com identidade morfofuncional fixando o quantum indenizatório no patamar de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais). Essa é a regra geral.
IV. No caso concreto, restou consignado no acórdão regional que o montante de irregularidades observadas pelo setor pericial da Regional totalizaram o expressivo número de 8.871 (oito mil, oitocentas e setenta e uma) ocorrências, o que demonstra a recalcitrância e o descumprimento reiterado das obrigações trabalhistas, razão pela qual a redução do quantum indenizatório no patamar de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), nestes autos, se mostra ínfimo. Nesse contexto, tendo em vista o critério bifásico adotado pelo STJ, além da concepção aristotélica de justiça corretiva, que leva em consideração a correlatividade e a personalidade, por entender que a redução dos danos morais não foi equitativa, bem como tendo em vista as particularidades já mencionadas do caso concreto, conheço do recurso de revista da parte reclamante para, no mérito, majorar os danos morais para quatro milhões de reais (R$ 4.000.000,00), por entender que houve violação aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, bem como da reparação integral, além dos seguintes dispositivos, em interpretação sistemática: arts. 186, 927e 944 do Código Civil de 2002 e 5°, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República.
V. Recurso de revista conhecido, por violação aos arts. 186, 927 e 944 do Código Civil de 2002 e 5°, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República, e, no mérito, provido, para majorar os danos morais em quatro milhões de reais (R$ 4.000.000,00),
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo n° TST-RRAg-1002110-68.2017.5.02.0004, em que é Agravante e Recorrida AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL S.A. e é Agravado e Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO.
Em face do acórdão regional foram interpostos recursos de revista pelas partes.
O Tribunal Regional admitiu apenas o processamento do apelo do Parquet, quanto ao tema "valor arbitrado à indenização por danos morais coletivos", o que ensejou a interposição do agravo de instrumento da reclamada.
Contraminuta e contrarrazões apresentadas.
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 95, § 2º, I, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
MARCOS PROCESSUAIS E NORMAS GERAIS APLICÁVEIS
Considerando que o acórdão regional foi publicado em 12/2/2021, incidem as disposições processuais da Lei nº 13.467/2017.
Registre-se, ainda, que os presentes autos foram remetidos a esta Corte Superior em 9/9/2021.
AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELA PARTE RÉ
CONHECIMENTO
Conheço do agravo de instrumento, visto que presentes os pressupostos legais de admissibilidade.
MÉRITO
TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA
Nos termos do artigo 896-A da CLT, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 13.467/2017, antes de adentrar o exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista, é necessário verificar se a causa oferece transcendência.
Primeiramente, destaco que o rol de critérios de transcendência previsto no mencionado preceito é taxativo, porém, os indicadores de cada um desses critérios, elencados no § 1º, são meramente exemplificativos. É o que se conclui da expressão "entre outros" utilizada pelo legislador.
Pois bem.
Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso da empresa, os valores fixados no artigo 496, § 3º, do CPC, conforme seu âmbito de atuação. No caso, o Tribunal Regional arbitrou à condenação o valor de R$ 1.000.000,00, e, assim, foi alcançado o patamar da transcendência.
Assim, admito a transcendência econômica da causa.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS - INTERESSE DE AGIR - INÉPCIA DA INICIAL - CUMULAÇÃO DOS PEDIDOS DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER E PAGAMENTO DA REPARAÇÃO DOS DANOS COLETIVOS - OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER - JORNADA DE TRABALHO - INTERVALOS INTRAJORNADAS E INTERJORNADAS - CONSTATAÇÃO DE IRREGULARIDADES - TESE RECURSAL QUE DEMANDA O REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS - TUTELA ANTECIPADA - DEFERIMENTO - NÃO ATENDIMENTO DA EXIGÊNCIA CONTIDA NO ARTIGO 896, §1º-A, I, DA CLT - LIMITAÇÃO DAS ASTREINTES - ARTIGO IMPERTINENTE - DANO MORAL COLETIVO - DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA CONCERNENTE À JORNADA DE TRABALHO - POTENCIAL PREJUÍZO À SAÚDE E HIGIDEZ FÍSICA E MENTAL DO TRABALHADOR - VALOR ARBITRADO - PROPORCIONALIDADE - IMPUGNAÇÃO GENÉRICA
O agravante pretende o processamento do recurso de revista às fls. 41835/41929. Sustenta, em suma, que o MPT não possui legitimidade ou interesse de agir para pleitear direitos pessoais e patrimoniais dos substituídos. Afirma que a ação civil pública só pode ser utilizada nos casos em que a tutela pretendida envolver direitos difusos ou coletivos. Aponta violação aos artigos 18 do CPC e 83 da Lei Complementar n º 75/93, dentre outros fundamentos.
Aduz que a parte autora formulou pedido genérico de indenização por danos morais coletivos, de modo que requer o reconhecimento da inépcia da inicial. Aponta violação ao artigo 330, I, do CPC, dentre outros.
Defende não ser possível a cumulação do pedido de obrigação de fazer ou não fazer e de condenação no pagamento de indenização por danos morais coletivos, ante o que dispõe o artigo 3º da Lei nº 7.347/85. Aponta violação ao mencionado preceito, dentre outros.
Assevera que as provas dos autos, em especial a oral, demonstram que a ré sempre observou os limites impostos às jornadas ajustadas, com o respeito ao módulo semanal de 36 horas, assim como os intervalos intrajornadas e interjornadas, e que qualquer descumprimento foi apenas pontual. Aponta violação aos artigos 5º, LV, da Constituição Federal; 74, §2º, 227 e 818 da CLT e 373 do CPC, dentre outros.
Afirma que não foram preenchidos os requisitos para o deferimento da tutela antecipada. Aponta violação aos artigos 818 da CLT; 300 e 373 do CPC.
Requer sejam as astreintes limitadas ao valor da obrigação principal. Aponta violação ao artigo 412 do Código Civil.
Aduz que não praticou qualquer "ato atentatório à dignidade coletiva ou proposital e deliberado desrespeito à ordem jurídica", apto a gerar o alegado dano moral coletivo. Aponta violação ao artigo 5º, X, da CF/88, dentre outros. Transcreve jurisprudência.
Por fim, pugna pela redução do importe fixado a título de dano moral coletivo. Aponta violação ao artigo 944 do Código Civil, dentre outros. Transcreve jurisprudência.
Observados os requisitos do artigo 896, § 1º-A, I, II, e III, da CLT, eis a decisão recorrida:
"(...) Ilegitimidade ativa do Ministério Público
Aduz a reclamada que os interesses ora defendidos pelo autor são individuais plúrimos, restritos à parcela identificável de trabalhadores. Sustenta que as matérias ventiladas nos autos se referem à jornada de trabalho não abrangendo toda a categoria, havendo necessidade de colher prova individualizada acerca da situação concreta vivenciada por cada um dos empregados (depoimento pessoal, testemunhal e documental), podendo cada trabalhador fazer jus, ou não, a determinado título, objeto da demanda ajuizada pelo Ministério Público (fls. 41.646/41.651).
Sem razão.
O Ministério Público do Trabalho pleiteia por meio da presente Ação Civil Pública o cumprimento das normas legais relativas à saúde e segurança do trabalho, com pedidos de obrigação de fazer e pedidos indenizatórios, conforme transcrição a seguir:
"a) PROCEDER o registro fidedigno dos horários de entrada e saída dos seus empregados; b) RESPEITAR o limite legal de jornada aos trabalhadores em teleatendimento/telemarketing de 36 (trinta e seis) horas semanais e 06(seis) horas diárias; c) CONCEDER aos empregados do teleatendimento da empresa o efetivo gozo de 02 (duas) pausas remuneradas de 10 (dez) minutos cada uma, ao longo da jornada de trabalho, para aqueles que laborem acima de 04 horas diárias e, para aqueles que laborem até 04 horas diárias, uma pausa de 10 (dez) minutos, devidamente remunerada; bem como a pausa de 15 (quinze) minutos antes do início do período extraordinário de trabalho; d)REGISTRAR EFETIVAMENTE as pausas para descanso; e) DISPONIBILIZAR em forma impressa ou eletrônica, os registros das pausas para descanso, tanto à Fiscalização do Trabalho, quanto aos próprios trabalhadores; f) RESPEITAR o limite legal e constitucional (diário e semanal) da carga horária de seus empregados, ressalvada a possibilidade de prorrogação da jornada normal por até 02 (duas) horas extras; g) OBSERVAR a redução da hora noturna, e respectiva prorrogação, para o cômputo da jornada de trabalho efetivamente laborada, inclusive em relação aos trabalhadores que laboram na escala 12x36; h) CONCEDER o intervalo intrajornada a todos os empregados, respeitando-se os limites, mínimo e máximo, fixados no art. 71 da CLT, observando-se, também, o item 5.4.2. do Anexo II da NR-17para os trabalhadores em teleatendimento/telemarketing; i) CONCEDER, aos empregados em regime laboral de oito horas diárias, o gozo efetivo de 11hs (onze horas) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, conforme art. 66 da CLT, ou de 36 (trinta e seis) horas aos trabalhadores - excetuados aqueles na função de teleatendimento/telemarketing, que laboram na escala 12x36; j) CONCEDER o repouso semanal remunerado após o 06º (sexto) dia seguido de trabalho,preferencialmente aos domingo; l) fixação de astreintes e a condenação ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais)" (sic, fls. 59/61).
Verifica-se, assim, que o Ministério Publica do Trabalho não busca a reparação individual do bem lesado, mas a tutela de interesses coletivos, precisamente os direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
Ressalte-se que, não obstante a faculdade de tutela individual de tais direitos, é admissível a tutela coletiva, em razão do interesse comum de todos os trabalhadores envolvidos.
Portanto, ao contrário do alegado nas razões de recurso, é indiscutível a legitimidade do Ministério Público do Trabalho e a adequação da propositura da Ação Civil Pública, consoante os termos dos artigos 127 e129, III, da Constituição Federal e artigos 6º, VII, e 83, III, da Lei Complementar nº 75/1993.
Nesse sentido é o entendimento já manifestado pelo C. TST em diversos julgados:
(...)
Nesse contexto, rejeito.
Ausência de interesse de agir
Sustenta a reclamada que o Ministério Público do Trabalho não possui interesse de agir, ante a natureza individual dos direitos defendidos na presente ação (fls. 41.766/41.656).
Sem razão.
Dispõe o art. 17 do Código de Processo Civil que para postular em Juízo é necessário ter interesse e legitimidade.
O interesse processual pode ser traduzido pelo binômio necessidade e adequação.
Assim, o interesse processual nasce da necessidade do provimento jurisdicional, invocado pelo meio adequado, que determinará o resultado útil pretendido.
No caso, o Parquet requer sejam impostas obrigações de fazer a fim de compelir a ré a cumprir as normas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, especialmente àquelas que determinam limites à duração da jornada de trabalho.
Trata-se, pois, da tutela de direitos individuais homogêneos e, como visto acima, é indiscutível a legitimidade do Ministério Público para propor a presente ação.
Ainda, diante das irregularidades trabalhistas constatadas pelo órgão ministerial, está presente o interesse de agir, invocado por meio da ação adequada.
Rejeito.
Inépcia do pedido de danos morais coletivos
Suscita a reclamada inépcia do pedido de indenização por danos morais coletivos, sob a alegação de que o pleito é genérico e desprovido de fundamentação. Aduz que o Parquet deixou explicitar quais seriam as "macrolesões sofridas pela coletividade", de forma a justificar tão significativo pedido (fls. 41.656).
Conforme se extrai da petição inicial (fls. 48/54), após relatar diversas irregularidades praticadas pela ré quanto às normas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, o autor fundamentou o pleito relativo à indenização por dano moral coletivo, formulando pedido certo e determinado.
Cabe ressaltar que a configuração de lesão ao patrimônio coletivo, como no caso, dispensa prova de efetivo prejuízo de todos os trabalhadores, uma vez que a lesão decorre da conduta antijurídica da empresa em desrespeito à lei e a seus empregados.
Rejeito.
Impossibilidade jurídica de cumulação de pedidos - obrigação de não fazer e indenização por danos morais coletivos
Sustenta que o Ministério Público do Trabalho não detém legitimidade para cumular pedido diverso.
Sem razão.
É plenamente viável a cumulação de pedido de condenação em dinheiro (indenização) com obrigação de fazer ou não fazer em Ação Civil Pública, desde que presentes os pressupostos previstos no art. 327, do Código de Processo Civil.
Com efeito, a interpretação restritiva do art. 3º da Lei 7.347/1985 não se sustenta, uma vez que necessária interpretação sistemática da norma, de modo que a conjunção "ou" deva ser interpretada de forma aditiva.
Nesse sentido é o entendimento já manifestado pelo C. TST em diversos julgados:
(...)
Rejeito.
MÉRITO
Jornada. Operadores de teleatendimento. Intervalo intrajornada e interjornada
Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, pautada no Inquérito Civil n.º 005268.2014.02.000/9, o qual restou instaurado com base em denúncia sigilosa (fls. 72/74) relatando irregularidades a respeito da jornada de trabalho realizada pelos empregados, bem como do pagamento do vale alimentação.
Na exordial narrou o Ministério Público do Trabalho que, após a denúncia, a Fiscalização do Trabalho realizou diligência no estabelecimento da ré, sob CNPJ nº 29.309.127/0135-80 e concluiu pela precarização das relações de trabalho desenvolvido pela prestação de serviço "home Office", motivando a lavratura de 10 (dez) autos de infração (fls. 125 e seguintes).
Relatou que em audiência administrativa a empresa se negou a firmar TAC (fls. 140/145), tendo afirmado que estaria tomando providências para adequação das irregularidades que foram detectadas pela fiscalização do trabalho. Na ocasião, juntou documentos a demonstrar a regularização informada.
Narrou o Parquet que os documentos apresentados pela empresa foram encaminhados ao Setor Pericial Contábil do órgão, que, por sua vez, solicitou a apresentação dos seguintes documentos: registros de jornadas e folhas de pagamentos dos empregados, referentes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2016; a relação de empregados com jornada 12x36; a relação de empregados no cargo de "operador de telemarketing"; os comprovantes de entrega dos vales refeição e a convenção coletiva vigente.
Referidos documentos foram apresentados e analisados pelo perito contábil, que concluiu pela manutenção das irregularidades verificadas pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE, bem como de outras, como a prática de jornada 12x36 de operadores de telemarketing; inobservância da redução da hora noturna trabalhada; ausência de registro das horas extras laboradas; ausência do registro de pausas dos operadores de telemarketing; não concessão de DSR.
Disse que o montante de irregularidades observadas pelo setor pericial da Regional, totalizaram-se o expressivo número de 8.871 (oito mil, oitocentas e setenta e uma) ocorrências.
Informou que a ré foi instada se manifestar, mas permaneceu inerte, não comparecendo na audiência designada.
Afirmou que diante da reiteração dos mesmos ilícitos observados pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego e tendo restado infrutífera por duas vezes a assinatura de TAC, não lhe restou alternativa senão a propositura da presente Ação Civil Pública.
O Juízo de Origem, analisando as provas constantes dos autos, julgou procedente a presente Ação Civil Pública e condenou a reclamante ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no importe de R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais) e determinou o cumprimento das seguintes obrigações de fazer liminarmente:
"- deverá a demandada respeitar o limite legal e constitucional (diário e semanal) à carga horária de seus empregados, ressalvada a possibilidade de prorrogação, conforme previsão e requisitos dos artigos 59 e 61, da CLT e art. 7º, XIII, da CF/88, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado;
- conceder o gozo efetivo de 11hs (onze horas) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado;
- conceder e registrar regularmente os intervalos intrajornadas aos seus empregados nos termos do art. 71 da CLT observando o intervalo específico de 20 (vinte) minutos aplicável aos trabalhadores em teleatendimento/telemarketing, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado;
- conceder o repouso semanal remunerado após o 06º (sexto) dia seguido de trabalho, preferencialmente aos domingos, nos termos do inciso XV do art. 7º da CF, art. 67 da CLT e OJ nº 410 da SDI-I do TST, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado." (sic, fl. 41.584).
Ainda, determinou o Juízo a quo o cumprimento das seguintes obrigações de fazer após o trânsito em julgado:
"- registro correto da jornada de trabalho, inclusive quanto aos intervalos, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado;
- registro e cálculo correto da jornada noturna de seus empregados, devendo cumprir com tal obrigação após o trânsito em julgado, passível de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado." (sic, fl. 41.584).
Inconformada recorre a reclamada (fls. 41.664/ 41.681), sustentando que o Juízo a quoanalisou de forma superficial as provas constantes dos autos e desconsiderou as provas testemunhais colhidas na audiência.
Alega, em síntese, que a sentença está fundamentada nas conclusões colhidas no Inquérito Civil nº 005268/.2014.02.000/9, conduzido de forma a desatender a finalidade de efetiva investigação e mediação, não prestando como meio de prova; que ocorrências irregulares detectadas no Laudo Técnico pericial não abrangem a totalidade de trabalhadores, tendo ocorrido há mais de 4 anos.
Aduz que não foi apresentada pelo Ministério Público do Trabalho uma única prova capaz de demonstrar a ilegalidade da jornada, mesmo porque o limite semanal de 36 horas previsto sempre foi respeitado pela recorrente; que observou a carga horária permitida, os intervalos intra e interjornada, o descanso semanal remunerado de seus empregados.
Pois bem.
A Gerência Regional do Trabalho e Emprego - Osasco/SP, atendendo solicitação do Parquet após denúncia anônima, realizou inspeção em um estabelecimento da ré (CNPJ nº 29.309.127/0135-800), tendo notificado a empresa a apresentar documentos, como controles de jornada, convenções coletivas de trabalho, relação dos trabalhadores na modalidade de "Home Office", folhas de pagamento e comprovação de fornecimento de vales refeição e alimentação (fl. 77).
Do exame da referida documentação, concluiu a Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE que:
"Da análise da documentação apresentada, e esclarecimentos prestados pelo empregador, verificou-se a existência de cerca de 150 trabalhadores na modalidade "home Office", os quais realizam atividades de teleatendimento, para marcação de consultas e agendamento de exames na rede credenciada da Amil. Concluiu-se pela precarização das relações de trabalho nessa forma de prestação de serviços, motivando a lavratura do auto de infração n° 20.845.335-1, por discriminação, conforme descrito no histórico daquele documento, e seus anexos - inclusive, sendo observada a prática de não fornecimento de vales-refeição para os trabalhadores que laboram em suas residências.
No tocante à prática de banco de horas, tal procedimento é autorizado mediante acordo coletivo de trabalho celebrado entre a empresa e o sindicato da categoria profissional (cópias anexas). Não obstante, verificou-se uma série de irregularidades quanto ao excesso de jornada, falta de concessão de intervalos para descanso e alimentação, falta de concessão de intervalo interjornadas, e também falta de controle de jornada de alguns empregados administrativos (ponto "britânico") e de todos os empregados "home Office" (não apresentação de qualquer tipo de controle de jornada, embora a empresa pratique descontos em caso de faltas)." (sic, fl. 77, gn).
Ainda, consta do referido relatório de fiscalização que foram lavrados, ao todo, 10 (dez) autos de infração (fls. 78/136), conforme ementas a seguir transcritas:
"AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.324-5: Deixar de consignar em registro mecânico, manual ou sistema eletrônico, os horários de entrada, saída e período de repouso efetivamente praticados pelo empregado, nos estabelecimentos com mais de 10 (dez) empregados.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.327-0: Deixar de conceder ao empregado um descanso semanal de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.328-8: Prorrogar a jornada normal de trabalho, além do limite legal de 2 (duas) horas diárias, sem qualquer justificativa legal.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.329-6: Deixar de conceder período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.330-0: Deixar de consignar as pausas para descanso em registro impresso ou eletrônico.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.331-8: Deixar de conceder pausas de descanso em dois períodos de 10 minutos contínuos.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.332-6: Deixar de conceder intervalo para repouso e alimentação de 20 minutos na atividade de teleatendimento/telemarketing.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.333-4: Adotar qualquer prática discriminatória e limitativa de acesso ao/ou manutenção do emprego por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.334-2: Deixar de conceder descanso de 15 minutos antes do início do período extraordinário do trabalho, quando da prorrogação do horário normal.
AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.335-1: Manter trabalhador em efetiva atividade de teleatendimento/telemarketing por mais de 36 horas semanais." (sic, fl. 78).
Em audiência realizada no Inquérito Civil nº 005268.2014.02.000/9 (fl. 139), a reclamada informou que "as irregularidades pontuais teriam sido corrigidas" e em sua manifestação de fls. 146/148 apresentou documentos a fim de comprovar suas alegações.
Os documentos foram encaminhados ao Setor Pericial Contábil do órgão ministerial, o qual solicitou novos documentos à ré para análise (fl. 149).
O resultado do Laudo Contábil realizado encontra-se encartado às fls. 4.429/4.441 e nele constou quanto à jornada extraordinária que:
"(...) 8. Dessa forma, o exame consistiu em verificar, com base nas informações contida nos arquivos eletrônicos, em formato texto - TXT, extraídos diretamente do sistema de jornada da investigada, cujo tratamento foi realizado pelo sistema JORNADA, d M.T.E., as jornadas efetivamente realizadas, considerando-se o intervalo intrajornada e tendo como limite a jornada máxima de 8 [oito] horas diárias, isto é, considerou-s o máximo de 2 [duas] horas suplementares em relação à jornada norma preestabelecida de 6 (seis) horas diárias do item 5.3 do Anexo 2 da NR 17. Portanto as jornadas de trabalho que ultrapassaram esse limite, caracterizam - s.m.j. - descumprimento do art. 59 da CLT.
9. Aplicada a metodologia, considerando-se o limite de 08 [oito] horas diárias de jornada, foram constatadas 1.296 situações que configuram desrespeito ao art. 59 d CLT, as quais se encontram devidamente mensuradas no Apêndice 1, que atingiram 96 funcionários, que representa 12% do total de 773 empregados operadores de teleatendimento que registraram ponto no período de 11.07.2016 a 10.10.2016.
10. Em relação aos demais funcionários, que laboram 220 horas mensais considerando-se o limite de 10 [dez] horas diárias, foram constatadas 113 ocorrência que configuram descumprimento do art. 59 da CLT, que atingiram 26 empregados, isto é, 18% dos 142 empregados que registraram ponto no período de 11.07.2016 10.10.2016, conforme demonstrado no Apêndice 2.
11. A investigada informa, ainda, que existem 634 operadores de teleatendimento que laboram no regime de 12x36, que está autorizado na cláusula 46ª do Acordo Coletivo de Trabalho, a seguir reproduzido. (...)
12. Primeiramente, ressalta-se que o regime 12x36 não encontram previsão no Anexo 2 da NR 17, já que essa estabelece, no item 5.3, a jornada máxima diária de 6 (seis) horas para os operadores de teleatendimento. Portanto, não se aplica a cláusula em questão para esses empregados. 13. Ainda assim, no que concerne aos funcionários operadores de teleatendimento que laboram no regime 12x36, o exame consistiu em verificar a aplicação da Súmula 444 do TST, ou seja, verificou-se o cumprimento da jornada trabalhada de 11 (onze) horas, mais as concessões do descanso intrajornada de 1 (uma) hora e da folga subsequente de 36 horas.
14. No que diz respeito à regularidade do cumprimento da escala 12x36, foram constatadas 912 situações de extrapolação da jornada trabalhada de 11 horas, que atingiram 37 funcionários, no período de 11.07.2016 a 10.10.2016, conforme demonstrado no Apêndice 3.
15. Diante dessas informações, em razão da extrapolação da jornada trabalhada de 11 horas, evidenciada no Apêndice 3, verifica-se a invalidação do regime de 12x36, pois esse pressupõe, para o elastecimento da jornada diária até 12 horas, a concessão do descanso intrajornada de uma hora e uma folga subsequente de 36 horas, sem a realização de horas extras. Portanto, considera-se descumprido o art. 59 da CLT. (...)" (sic, fl. 4.432/4.434).
Ainda , no tocante ao intervalo intrajornada restou constatado que:
"(...) 23. Aplicada a metodologia, foram catalogadas 5.137 ocorrências de ausência de marcações dos intervalos intrajornada e das pausas obrigatórias, referentes ao período de 11.07.2016 a 10.10.2016, que atingiram 476 funcionários, conforme apurado no Apêndice 4.
24. Vale ressaltar, ainda, que em relação às marcações de intervalo intrajornada e às pausas para descanso dos operadores de teleatendimento/telemarketing, que constam nos cartões de ponto, verifica-se que se apresentam registradas de forma "britânica", ou seja, sem variação, portanto, não representam fidedignamente o usufruto, conforme o cartão de ponto da funcionária Michelle Martins Cimino, a seguir reproduzido. (...)
25. Diante disso, conclui-se que as marcações registradas não atestam se a investigada vem concedendo regulamente o intervalo intrajornada e as pausas para descanso aos operadores de teleatendimento/telemarketing." (sic, fl. 4.436).
Por fim, quanto ao intervalo interjornada e descanso semanal remunerado foram constatadas as seguintes irregularidades:
"(...) 27. Aplicada a metodologia, foram catalogadas 86 ocorrências, no período de 11.07.2016 a 10.10.2016, as quais apresentaram situações que configuram desrespeito ao art. 66 da CLT, que atingiram 47 funcionários, conforme demonstrado no Apêndice 5. (...)
29. Aplicada a metodologia, foram identificadas 693 situações de descumprimento do art. 67 da CLT, referentes ao período de 11.07.2016 a 10.10.2016, que atingiram 380 funcionários, conforme demonstrado no Apêndice 6. (...)" (sic, fls. 4.437/4.438).
Assim, ao contrário do que pretende fazer crer a recorrente em suas razões de recurso, o conjunto fático-probatório não deixa dúvidas quanto à prática de irregularidades pela empresa no tocante às normas de saúde e segurança do trabalho de forma contínua ao longo de tempo.
Nesse sentido, a notícia de fato que deu ensejo ao Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público do Trabalho refere-se aos anos de 2013/2014 (fl. 72), a fiscalização da Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE ocorreu em 2015 e o Laudo Técnico elaborado com base nos documentos fornecidos pela empresa levou em consideração o período de 11.07.2016 a 10.10.2016.
E não prospera a alegação simplista da ré no sentido de que as provas colhidas no âmbito do Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público do Trabalho não podem ser utilizadas nos autos porque produzidas de forma unilateral.
O Ministério Público do Trabalho, como órgão fiscalizador da lei, tem o dever e poder de investigar fatos, ouvir testemunhas e tudo o que for necessário para apuração da verdade, sendo o Inquérito Civil procedimento administrativo, presidido por membro do Parquet, que tem por intuito a coleta de elementos para a apuração de autoria e materialidade de lesão ou ameaça de lesão a direitos metaindividuais, tudo para futura propositura de ação civil pública, exatamente como ocorreu no caso em tela.
A prova produzida no âmbito do Inquérito Civil Público possui valor probante relativo, já que colhida em sede de procedimento administrativo inquisitório, conforme artigos 8º, §1º e 9º da Lei nº 7.347/85 e art. 129, III, da Constituição Federal.
Contudo, no caso concreto, tais provas devem prevalecer, revelando-se aptas a instruir a presente Ação Civil Pública, uma vez que o acervo probatório produzido em juízo não é apto a infirmá-las.
Nesse sentido, compartilho do entendimento da origem no sentido de que os depoimentos das duas testemunhas supervisoras (fls. 41.546/ 41.547), as quais respondiam por equipes de aproximadamente 30 empregados, não abrangem a realidade fática de todos os operadores de teleatendimento da reclamada.
E, por óbvio, apenas referida prova testemunhal não é capaz de invalidar toda a prova documental produzida pelo Ministério Público do Trabalho no Inquérito Civil, inclusive os autos de infrações lavrados pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE.
Aqui cabe destacar que os autos de infração lavrados por Auditor Fiscal do Trabalho ostentam presunção de legalidade e veracidade e não foram desconstituídas pela empresa.
Aliás, a reclamada não negou a ocorrência das irregularidades, limitando-se a afirmar na audiência administrativa (fl. 139) realizada em 26/07/2016 que "as irregularidades pontuais teriam sido corrigidas", o que foi refutado pelo resultado da perícia contábil realizada posteriormente.
Dessa forma, não há que se falar em ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa.
Com efeito, comprovada a prática de inúmeras irregularidades quanto às normas de saúde e segurança do trabalho, caberia a empresa comprovar o cumprimento da legislação, inclusive com a juntada de cartões de ponto, o que não o fez.
No tocante ao valor das provas produzidas no âmbito do Inquérito Civil, cito as seguintes decisões do C. TST:
(...)
Por tais fundamentos, nada a reparar na r sentença.
(...)
Limitação das astreintes
A reclamada pretende a redução do montante fixado a título de "astreintes". Aduz que o valor é excessivo e pugna pela sua redução.
Pois bem.
A determinação de multa diária em caso de descumprimento de obrigação de fazer encontra amparo nos arts. 497 e 536, § 1º e 537, § 1º, do Código de Processo Civil transcritos a seguir:
(...)
No presente caso, o Juízo de primeiro grau determinou o pagamento de multa no importe de R$ 500,00 (quinhentos reais) por infração e por empregado prejudicado (fl. 41.573).
Com efeito, considerando o porte da empresa e os direitos que se busca resguardar - normas relativas à saúde e segurança do trabalho - o valor fixado é razoável e proporcional.
Rejeito.
Danos morais coletivos. Indenização. Valor
Insurge a recorrente contra a sua condenação ao pagamento dos danos morais coletivos, novamente sobre os mesmos pretextos que pretendeu a improcedência da ação: que não houve irregularidades tuteláveis pela via coletiva; que supostas irregularidades ocorreram em uma pequena parcela de trabalhadores; que a sentença foi contraditória porque não levou em consideração o depoimento de testemunhas; que o Ministério Público do Trabalho não tem legitimidade para pleitear dano moral coletivo; que não houve violação aos direitos dos trabalhadores (fls. 41.684/ 41.698).
Caso o entendimento não seja pela exclusão da indenização, pleiteia a redução da indenização por danos morais fixada pela origem em R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais).
Ao exame:
Além de mais do que superados os questionamentos ora invocados pela recorrente nos tópicos que se antecederam, compactuo com os fundamentos da Origem quanto à existência do dano coletivo, em vista das inegáveis violações ao ordenamento jurídico praticados pela empresa.
Portanto, demonstrada a violação aos direitos individuais homogêneos, como no caso (violação às normas relativas à saúde e segurança do trabalho) torna-se pertinente a reparação do dano moral coletivo.
Quanto ao valor a ser arbitrado a título da referida indenização, devem ser considerados alguns critérios como a gravidade e extensão do dano, o caráter pedagógico da medida e a capacidade econômica do ofensor.
No presente caso, como visto acima, é evidente a gravidades das lesões perpetradas, pois restou demonstrado o descumprimento pela ré de normas de saúde e segurança do trabalho, relacionadas ao desrespeito ao limite legal e constitucional de jornada, intervalo interjornada, intervalo intrajornada, pausas para descanso, concessão do repouso semanal remunerado, dentre outras.
Quanto à capacidade econômica do ofensor, verifica-se que a ré possui capital social no valor de R$ 8.681.776.903,84 (oito bilhões seiscentos e oitenta e um milhões setecentos e setenta e seis mil novecentos e três reais e oitenta e quatro centavos), conforme contrato social juntado aos autos (fl. 4.833).
Assim, considerando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mas sem desconsiderar a gravidade e repercussão social da lesão e o caráter pedagógico-punitivo da indenização, entendo que o quantum indenizatório comporta redução para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Dou provimento parcial ao apelo.
Impossibilidade de atribuir efeito reparatório à ACP e de cumulação de obrigações de não fazer com indenização.
A questão encontra-se superada, pois como visto no capítulo acima é plenamente viável a cumulação de pedido de condenação em dinheiro (indenização) com obrigação de fazer ou não fazer em ação civil pública.
Nego provimento." (fls. 41770/41792 - destaquei)
Ao exame.
No contexto do microssistema de processo coletivo, a ação civil pública consolida-se como instrumento para tutela de interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, nas exatas definições do artigo 81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. Ela emerge, pois, como ferramenta apta a materializar o desenvolvimento humano, uma vez que, na atual maturidade do Direito Processual brasileiro, não compreende um fim em si mesmo, mas mecanismo para a concretização de direitos fundamentais.
A tutela de direitos coletivos em sentido amplo, sejam eles difusos ou coletivos sentido estrito ou, ainda, individuais homogêneos, difundiu-se com o advento, dentre outros, da lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). Este, não obstante sua denominação, transcendeu as fronteiras das relações jurídicas consumeristas e ora abarca outros direitos coletivos, sob a égide da Constituição Federal e baseado em uma interpretação sistemática e teleológica.
Nesse passo, ao Ministério Público incumbe "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (artigo 127, caput, da Constituição), competindo-lhe, entre outras atribuições, "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos" (artigo 129, III, da Constituição).
Especificamente na seara da Justiça do Trabalho, como positiva a Lei Complementar nº 75/93, compete-lhe promover a ação civil pública para defesa de interesses coletivos, quando forem desrespeitados direitos sociais constitucionalmente garantidos (artigo 83, III) e outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos (artigos 83, III, 84, caput, e 6º, VII, "d").
Sua função de fiscal da lei (ou da ordem jurídica) decorre da natureza indisponível da maior parte dos direitos trabalhistas. Ao empregado não é dado dispor de seus principais direitos. E ao Ministério Público cabe defendê-los, opondo-se a decisões judiciais, legislativas ou do Poder Executivo que firam tais direitos sociais albergados pela Constituição Federal. Isso ainda que o próprio trabalhador, hipossuficiente que é, não o faça.
Vale destacar que, mesmo em relação aos direitos individuais, há legitimação do Ministério Público, diante da outorga conferida pelo artigo 82, I, da Lei nº 8.078/90. Esse dispositivo não faz ressalva quanto aos direitos que podem ser por ele tutelados: interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Nas três hipóteses, o órgão ministerial está autorizado a promover sua defesa em Juízo.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de ele deter legitimidade para ajuizar ação civil pública a fim de tutelar os interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos socialmente relevantes, reconhecendo a natureza coletiva destes.
Assim, o questionamento que antes existia na doutrina e jurisprudência nacional quanto à sua legitimidade para tutela de direitos individuais homogêneos foi ultrapassada. O leading case sobre o tema foi o Recurso Extraordinário nº 163.231/SP, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa, julgado em 26/02/1997. Nele consignou-se:
"EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. 1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. 5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1. Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação." (RE 163231, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 26/02/1997, DJ 29-06-2001 PP-00055 EMENT VOL-02037-04 PP-00737).
A matéria, hoje, está completamente pacificada, como expressa a Súmula nº 643 do STF:
"O Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades escolares."
Desde então, a tese da legitimidade do Parquet para propor ações civis públicas em prol de direitos individuais homogêneos de relevância social consolidou-se. Da mesma forma quanto aos direitos individuais indisponíveis. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes da Corte Constitucional, inclusive em matéria trabalhista:
"Agravo regimental no agravo de instrumento. Trabalhista. Condições de trabalho. Dano moral. Prequestionamento. Ausência. Ministério Público. Legitimidade ativa. Quantum indenizatório. Precedentes. 1. Não se admite o recurso extraordinário quando os dispositivos constitucionais que nele se alega violados não foram devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que o Ministério Público possui legitimidade ativa para propor ações civis públicas em defesa de interesses individuais homogêneos, notadamente quando se trata de interesses de relevante valor social. 3. As questões relativas à caracterização do dano moral e ao quantum indenizatório estão restritas ao exame dos fatos e das provas dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF. 4. Agravo regimental não provido." (ARE 660140 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 08/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-238 DIVULG 03-12-2013 PUBLIC 04-12-2013);
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA À SEGURANÇA E À SAÚDE DO TRABALHADOR. INTERESSES COLETIVOS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. O Ministério Público tem legitimidade para a defesa, por meio de ação civil pública, de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos de natureza trabalhista. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido." (RE 214001 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 27/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 10-09-2013 PUBLIC 11-09-2013);
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO - LEGITIMIDADE - MINISTÉRIO PÚBLICO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. O Tribunal, no Recurso Extraordinário nº 163.231/SP, concluiu pela legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, mesmo no caso de interesses homogêneos de origem comum, por serem subespécies de interesses coletivos." (AI 559141 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 21/06/2011, DJe-155 DIVULG 12-08-2011 PUBLIC 15-08-2011 EMENT VOL-02565-01 PP-00147);
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS NA ESFERA TRABALHISTA. 1. Assentada a premissa de que a lide em apreço versa sobre direitos individuais homogêneos, para dela divergir é necessário o reexame das circunstâncias fáticas que envolvem o ato impugnado por meio da presente ação civil pública, providência vedada em sede de recurso extraordinário pela Súmula STF nº 279. 2. Os precedentes mencionados na decisão agravada (RREE 213.015 e 163.231) revelam-se perfeitamente aplicáveis ao caso, pois neles, independentemente da questão de fato apreciada, fixou-se tese jurídica no sentido da legitimidade do Ministério Público ajuizar ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos na esfera trabalhista, contrária à orientação adotada pelo TST acerca da matéria em debate. 3. Agravo regimental improvido." (RE 394180 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 23/11/2004, DJ 10-12-2004 PP-00047 EMENT VOL-02176-03 PP-00531).
Vale ressaltar que o posicionamento adotado pelo STF, de alcance genérico, friso, sequer excepciona o fato de o objeto da ação voltar-se para direitos disponíveis, como registra o precedente que transcrevo:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA DE INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DISPONÍVEIS. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRECEDENTES. 1. O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil coletiva em defesa de interesses individuais homogêneos de relevante caráter social, ainda que o objeto da demanda seja referente a direitos disponíveis (RE 500.879-AgR, rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe de 26-05-2011; RE 472.489-AgR, rel. Min. Celso De Mello, Segunda Turma, DJe de 29-08-2008). 2. Agravo regimental a que se nega provimento." (RE 401482 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 04/06/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-119 DIVULG 20-06-2013 PUBLIC 21-06-2013).
No caso destes autos, o órgão ministerial propugna pela observância das normas protetivas consolidadas (notadamente, aquelas referentes às horas extras, intervalos intrajornadas e interjornadas e anotação dos cartões de ponto), tratando-se de defesa de interesses coletivos, na espécie de direito individual homogêneo, de origem comum.
Assim, é patente a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho, por inteligência dos artigos 127, caput, e 129, III, da Constituição Federal; 5º, I, da Lei nº 7.347/85; 1º, 6º, VII, e 83, I e III, da Lei Complementar nº 75/93. Inconteste também é seu interesse de agir, na busca de proteger plurais trabalhadores e a própria ordem jurídica constitucional e laboral deste país.
Nesse sentido destaco os seguintes precedentes da SBDI-I:
"LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CUMPRIMENTO DE NORMAS ALUSIVAS À DURAÇÃO DA JORNADA. 1. A Lei Complementar 75/1993 dispõe sobre a organização, atribuições e estatuto do Ministério Público da União, conferindo-lhe legitimidade para -promover o inquérito civil e a ação civil pública para (...) outros interesse individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos- (art. 6º, inc. VII, alínea -d-), mormente quando -decorrentes dos direitos sociais dos trabalhadores- (art. 84, inc. II), como também para -promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos- (art. 83, inc. III), observando-se idêntica conclusão no art. 5º da Lei 7.347/85. Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.076/90) definiu, em seu art. 81, as espécies de interesse passíveis de defesa coletiva aplicáveis ao processo do trabalho, ex vi do art. 769 da CLT, ressaltando, no inc. III, os -interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum-. 2. A presente Ação Civil Pública foi proposta pelo Ministério Público do Trabalho objetivando impor à empresa obrigação de fazer e de não fazer, consistente em: a) abster de prorrogar a jornada norma de trabalho além do limite de duas horas diárias sem qualquer justificativa legal; b) conceder a todos os empregados intervalo interjornadas mínimo de onze horas consecutivas; c) conceder a todos os empregados descanso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, coincidentemente com o domingo; d) abster-se de exigir trabalho em domingo sem permissão prévia da autoridade competente; e) consignar em registro mecânico, manual ou sistema eletrônico os horários de entrada, saída e os períodos de repouso praticados pelos empregados, de modo a apurar as horas efetivamente trabalhadas. 3. Trata-se, portanto, de pretensão que se enquadra na categoria dos direitos ou interesses coletivos, na espécie de direito individual homogêneo, de origem comum, porquanto decorrente de uma relação jurídica base. Com efeito, o direito às parcelas decorrentes do descumprimento de normas trabalhistas relativas à jornada de trabalho dos empregados da empresa ré constitui interesse individual homogêneo, vez que resultam de origem comum, justificando a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor a Ação Civil Pública. Recurso de Embargos de que se conhece e a que se dá provimento." (E-RR-170000-69.2009.5.11.0007, Relator Ministro: João Batista Brito Pereira, DEJT 19/04/2013);
"RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI N° 11.496/2007. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - DEPÓSITOS DO FGTS REFERENTES À PERÍODO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA CONHECIDO E PROVIDO NO ASPECTO. O pedido inicial da ação civil pública refere-se à obrigação de recolher o FGTS em período passado e a recolher pontualmente no futuro. Ambas as obrigações tem como cominação o pagamento de multa reversível ao FAT pelo seu descumprimento. A Turma reconheceu a legitimidade do parquet apenas para propor ação civil pública visando o recolhimento do FGTS em período futuro (segundo pedido). Quanto ao primeiro requerimento, referente à obrigação de recolher o FGTS em período anterior ao ajuizamento da referida ação, declarou a ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho, extinguindo o processo sem julgamento do mérito, por -perceber o nítido caráter de defesa de interesses individuais homogêneos-. Esta SBDI1, entretanto, no julgamento do processo nº TST-RR-127800-64.2002.5.23.0005, da relatoria da Exmª Srª Ministra Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, publicado no DJ de 4/2/2011, defendeu entendimento no sentido de que o Ministério Público tem legitimação para a defesa dos interesses difusos e coletivos na Justiça do Trabalho, bem assim que os interesses individuais homogêneos são espécie dos interesses coletivos em sentido amplo. Assim, naquele caso, constado que o bem tutelado é o recolhimento do FGTS, entendeu incontestável a legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação civil pública. Assim, com ressalva do meu entendimento pessoal, a Turma, ao afastar a legitimidade do Ministério Público para a defesa em ação civil pública de interesses individuais homogêneos, espécie de interesses coletivos lato sensu, e, em consequência, extinguir o processo com base no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil em relação ao primeiro pedido (obrigação de recolher o FGTS em período anterior ao ajuizamento da ação civil pública), vulnerou o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. Recurso de embargos conhecido e provido." (E-RR-44300-29.2004.5.10.0802, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, DEJT 10/05/2013);
"EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTOS NA VIGÊNCIA DA LEI 11.496/2007 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS - FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS MEDIANTE CONTRATO DE FRANQUIA - RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Na esteira dos arts. 127, caput, e 129, incisos III e IV, da Constituição Federal, a Lei Complementar nº 75/93, em seu art. 83 c/c o art. 6º, inciso VII, 'd', deixa inequívoca a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para a propositura de ação civil pública. Os interesses a serem defendidos por esse instrumento são aqueles de natureza coletiva lato sensu ou transindividual, disciplinados no art. 81 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). E não restam dúvidas que dentre os interesses coletivos estão resguardados os de natureza individual homogênea, assim compreendidos os que têm origem comum (art. 81, inciso III, do CDC). No caso, a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 1ª Região denuncia fraude na contratação de empregados mediante a formalização de contrato de franquia, referindo-se a controvérsia a obrigação de não fazer e, também, obrigação de fazer, esta consistente no reconhecimento do vínculo de emprego. Diante da natureza dos pedidos formulados nesta reclamação trabalhista, não resta dúvida acerca da legitimidade do Ministério Público do Trabalho, por se tratar de defesa de direitos individuais homogêneos dos trabalhadores decorrentes de fraude imputada à reclamada, de origem comum, ensejando o seu desrespeito, portanto, grave repercussão social, sendo possível a sua defesa pelo órgão encarregado pela Constituição Federal de garantir a incolumidade da ordem jurídica. Precedentes. Recurso de embargos conhecido e desprovido." (E-ED-RR-150600-97.2005.5.01.0036, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 14/02/2014);
"RECURSO DE EMBARGOS DA CREDICENTER. (...). AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. DESVIRTUAMENTO DO CONTRATO DE ESTÁGIO. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. TUTELA COLETIVA. A legitimidade do Ministério Público do Trabalho, na defesa de interesses individuais homogêneos, em ação civil pública, já está consagrada, na doutrina e na jurisprudência do c. Tribunal Superior do Trabalho e do e. Supremo Tribunal Federal. Constatado ser o bem tutelado a condenação do reclamado ao cumprimento das normas que disciplinam a irregular contratação de estagiários no âmbito da tomadora de serviços, sobressai a legitimidade do Ministério Público em face da existência de lesão comum, a grupo de trabalhadores, inerentes a uma mesma relação jurídica, a determinar que, mesmo que o resultado da demanda refira-se a direitos disponíveis de empregados, decorre de interesses individuais homogêneos que, embora tenham seus titulares determináveis, não deixam de estar relacionados aos interesses coletivos, sendo divisível apenas a reparação do dano fático indivisível. O interesse coletivo presente determina a atuação, quando identificada lesão comum a grupo de trabalhadores que laboram a latere das normas que disciplinam a jornada de trabalho, em desrespeito aos direitos sociais garantidos no art. 7º da CF. Precedentes. Recurso de embargos conhecido e desprovido. (...)." (E-ED-ED-ED-RR-197500-59.2001.5.15.0014, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, DEJT 17/10/2014).
Incidem, no caso, o disposto no artigo 896, § 7º, da CLT e o teor da Súmula nº 333 do TST.
Sobre a inépcia da inicial, o TRT anotou que, "após relatar diversas irregularidades praticadas pela ré quanto às normas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, o autor fundamentou o pleito relativo à indenização por dano moral coletivo, formulando pedido certo e determinado".
O artigo 810, §1º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, de aplicação a presente demanda coletiva, é claro ao dispor que: "sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante" (grifo nosso).
Ademais, no processo do trabalho, em virtude dos princípios da simplicidade e da informalidade, não se exige rigor no exame dos requisitos da inicial. Basta que do seu contexto se possa extrair a pretensão, sem exigência de maiores formalidades.
Assim, havendo a breve exposição dos fatos em que se alicerça a lide, não se há de falar em prejuízo à prestação da tutela jurisdicional ou à tese de defesa, razão pela qual não merece guarida a pretensão ventilada pela ré.
Incólumes os dispositivos indicados.
Por sua vez, dispõe o artigo 3º da Lei nº 7.347/85:
"Art. 3º. A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer."
O cerne da questão consiste em definir se a referida disposição vedaria a cumulação de pedido de condenação em dinheiro (danos coletivos) com eventual determinação quanto ao cumprimento de obrigação de fazer.
De fato, diante da gravidade evidenciada em situações de lesão de âmbito coletivo, não parece crível que a exegese do mencionado dispositivo seja de que apenas se permite articulação de um dos pedidos.
Essa também tem sido a conclusão no campo doutrinário, por aqueles que se detém no exame dos termos do artigo 3º da Lei nº 7.347/85. Nesse sentido, os ensinamentos de Adriano Andrade:
"(...) o uso da conjunção alternativa 'ou' não pode ser interpretado de modo a configurar uma proibição à cumulação de um pedido de condenação em dinheiro com um de obrigação de fazer ou não fazer. Na verdade, a norma simplesmente externa a possibilidade de, entre os pedidos condenatórios, serem formulados tanto os de obrigação de pagar como os de obrigação de fazer ou de não fazer. Interpretação contrária atentaria contra o princípio do adequado acesso à Justiça". ANDRADE, Adriano. Interesses difusos e coletivos esquematizados. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011. p. 97.
Para o Superior Tribunal de Justiça, a conjunção "ou" - contida no referido dispositivo, tem sentido de adição, ou seja, é possível a cumulação das condenações em obrigações de fazer ou não fazer e indenização pecuniária. Nesse sentido, cito o seguinte julgado:
"ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE AMBIENTAL. DANOS CAUSADOS À BIOTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 4º, VII, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981, E DO ART. 3º DA LEI 7.347/85. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL, DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). REDUCTION AD PRISTINUM STATUM. DANO AMBIENTAL INTERMEDIÁRIO, RESIDUAL E MORAL COLETIVO. ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA DA NORMA AMBIENTAL. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos ambientais causados pela supressão de vegetação nativa e edificação irregular em Área de Preservação Permanente. O juiz de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consideraram provado o dano ambiental e condenaram o réu a repará-lo; porém, julgaram improcedente o pedido indenizatório pelo dano ecológico pretérito e residual. 2. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei 7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp 1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, entre outros). 3. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que fixe, in casu, o quantum debeatur reparatório do dano já reconhecido no acórdão recorrido." destaquei - (RECURSO ESPECIAL Nº 1.328.753 - MG (2012/0122623-1) - Relator: Ministro Herman Benjamin - Dje: 03/02/2015).
Na mesma linha, são os julgados deste Tribunal:
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA CUMULAÇÃO DE PEDIDOS - POSSIBILIDADE. O art. 3º da Lei nº 7.347/85 expressamente permite que a parte realize pedidos de condenação em pecúnia ou de satisfação de obrigação de não fazer, não obstando, portanto, a cumulação de tais pretensões. Recurso de revista não conhecido." (RR - 1784/2003-011-08-00, Relator Ministro Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Publicação: 13/6/2008);
"RECURSO DE REVISTA. (...) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDENAÇÃO EM DINHEIRO E EM OBRIGAÇÃO DE FAZER OU NÃO FAZER. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. O artigo 3º da Lei n° 7.347, ao dispor que a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, tenha limitado a tutela em ações coletiva a uma das espécies de condenações. Em verdade, o sentido da lei se expressa de forma oposta, confirmando a possibilidade da imposição de ambas as modalidades condenatórias. Não conhecido." (RR - 75600-37.2002.5.15.0059, Relator Ministro: Emmanoel Pereira, 5ª Turma, Data de Publicação: 17/12/2010);
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDENAÇÃO EM DINHEIRO E EM OBRIGAÇÃO DE FAZER OU NÃO FAZER. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. A reclamada sustentou, de fato, nas razões do apelo, ser juridicamente impossível a cumulação do pedido de obrigação de fazer com o de condenação ao pagamento em dinheiro, em sede de ação civil pública, a teor do art. 3º da Lei 7.347/85. Ora, ao prever expressamente que a ação civil pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou de obrigação de não fazer (art. 3º da Lei 7.347/1985), a lei não pode ser interpretada como se o pedido de condenação em dinheiro impedisse os de condenação em obrigação de fazer ou de não fazer. Precedentes dessa Corte. Embargos de declaração acolhidos apenas para prestar esclarecimentos, sem imprimir efeito modificativo no julgado." (ED-AIRR - 162840-20.2006.5.03.0104, Relator Ministro Pedro Paulo Manus, 7ª Turma, Data de Publicação: 24/02/2012);
"(...) 3. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. NÃO OCORRÊNCIA. CUMULAÇÃO DE CONDENAÇÃO PECUNIÁRIA E OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER. A conclusão adotada pelo Regional no sentido de que "é plenamente possível a cumulação de pedidos de tutelas inibitórias com o pedido de indenização por danos morais coletivos" revela-se irrepreensível, pois a conjunção "ou" estabelecida na redação do artigo 3º da Lei nº 7.347/1985 tem sentido aditivo, consoante jurisprudência sedimentada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Superior Trabalhista. Aresto inservível, à luz da Súmula nº 337 do TST. (...)" (RRAg - 1160-23.2015.5.14.0001, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/10/2020).
A decisão recorrida encontra-se em sintonia com esse entendimento. Logo, incidem, no aspecto, o disposto no artigo 896, § 7º, da CLT e o teor da Súmula nº 333 do TST.
Acerca dos fatos que ensejaram o deferimento das tutelas pretendidas pelo MPT, melhor sorte não assiste à agravante.
A Corte de origem, soberana na análise do conjunto fático-probatório, após minuciosa apreciação dos elementos coligidos aos autos, anotou não haver "dúvidas quanto à prática de irregularidades pela empresa no tocante às normas de saúde e segurança do trabalho de forma contínua ao longo de tempo".
O exame da tese recursal, em sentido contrário, esbarra no óbice da Súmula nº 126 do TST, pois demanda o revolvimento de fatos e provas.
Com respaldo no artigo 405 do Código de Processo Civil, as provas produzidas no inquérito civil possuem valor probante e podem ser devidamente apreciadas quando da propositura da ação civil pública. Contudo, tal valor é relativo e o conjunto probatório pode ser afastado, diante de contraprova produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
Nesse sentido, citem-se os seguintes julgados:
"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014. EXECUÇÃO. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. Demonstrada possível divergência jurisprudencial, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista . Agravo de instrumento provido. II - RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014. EXECUÇÃO. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. Conforme jurisprudência desta Corte, o inquérito civil possui valor probante, motivo pelo qual deve ser admitido como meio de prova. Todavia, o valor probatório do inquérito é relativo, podendo ser confrontado com as demais provas produzidas nos autos . No caso concreto, o Tribunal Regional concluiu que não há prova do descumprimento da cláusula inserta no Termo de Ajustamento de Conduta, desconsiderando, a priori, a prova produzida no inquérito civil. Por possuir força probante, deveria a Corte de origem ter confrontando a prova produzida nos autos do inquérito com as demais produzidas nos autos. Assim, impõe-se o retorno dos autos ao Tribunal Regional para que análise a controvérsia quanto ao cumprimento ou não da cláusula do TAC. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-169700-26.2013.5.13.0003, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaide Miranda Arantes, DEJT 19/12/2017);
"RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. LAUDO DE INSPEÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. MEIO DE PROVA. VALIDADE. À luz do disposto no art. 405 do CPC, os documentos públicos gozam de presunção de legitimidade e somente podem ser desconstituídos por meio de contraprova produzida pela parte adversa, não bastando para tanto, a singela impugnação. Os laudos de inspeção do Ministério do Trabalho e as peças de inquérito civil público, promovido pelo Ministério Público do Trabalho, desfrutam de valor probante e, sem elementos que contradigam os fatos neles descritos, não podem ser ignorados como meios de prova. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-11616-64.2015.5.01.0075, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 06/08/2021);
"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - INQUÉRITO CIVIL - VALOR PROBANTE. O entendimento desta Corte é no sentido de que o inquérito civil tem força probante apenas relativa, devendo ser confrontado com as demais provas produzidas nos autos. Na hipótese, examinadas as alegações da Ação Civil Pública ajuizada com supedâneo no inquérito civil elaborado, o julgador ordinário procedeu à colheita de provas e concluiu não ter sido demonstrado o dano moral coletivo. Para se chegar à conclusão diversa quanto à configuração do dano moral coletivo, seria necessário o revolvimento do conjunto fático - probatório dos autos. Incide o óbice da Súmula nº 126 do TST. Agravo desprovido" (Ag-AIRR-1192-39.2010.5.05.0038, 7ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 14/08/2017);
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RÉ EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. (...) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VALOR PROBANTE DOS ELEMENTOS REUNIDOS PELO PARQUET EM SEDE DE PRÉVIO INQUÉRITO CIVIL. As provas produzidas no inquérito civil possuem valor probante e podem ser devidamente apreciadas quando da propositura da ação civil pública. Contudo, possuem valor probatório relativo e devem ser afastadas, diante de contraprova produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. No caso dos autos, acrescentou o Tribunal Regional que: "perde força a discussão acerca do valor dos elementos de prova reunidos pelo MPT quando se verifica que também há testemunhos coletados em juízo que delatam os atos de assédio moral". Ilesos os artigos indicados como violados. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...)" (RR-99500-91.2009.5.03.0106, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 23/10/2015);
"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RÉ (...) CERCEAMENTO DE DEFESA - CONDENAÇÃO FUNDADA EM PROVA PRODUZIDA EM INQUÉRITO CIVIL - LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO 1. O inquérito civil possui valor probante e, desse modo, pode ser apreciado como meio de prova em Ação Civil Pública. Seu valor probatório é relativo, deve ser o inquérito confrontado com as demais provas produzidas nos autos. 2. No caso dos autos, o Eg. Tribunal Regional do Trabalho confrontou os depoimentos colhidos dos autos do inquérito civil com os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo e concluiu que o conjunto probatório não foi capaz de infirmar as evidências produzidas no inquérito civil. Assim, demonstrou-se o efetivo exame das provas produzidas pelos Réus, procedimento que demonstra o efetivo contraditório e respeito ao devido processo legal. 3. O inconformismo da Recorrente quanto à apreciação das provas pelo juízo a quo também não procede, pois foi observado o princípio processual do livre convencimento motivado. (...)" (RR-1089-76.2013.5.10.0009, 8ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 27/10/2017).
Sucede que, na ocasião, não foram produzidas provas aptas a infirmar as aquelas colacionadas com a inicial. Registra-se que a ré não juntou, sequer, os cartões de ponto, como consignado no acórdão recorrido.
Portanto, não merece reforma a decisão regional, devendo ser mantida a condenação da ré nas obrigações de fazer e não fazer, consoante postulado pelo Parquet.
Com relação ao preenchimento dos requisitos da tutela antecipada, verifico que não houve o atendimento da exigência contida no artigo 896, §1º-A, I, da CLT, tendo em vista que a ré deixou de colacionar o trecho do julgado que consubstancia o prequestionamento da controvérsia, razão pela qual se torna inviável o exame da matéria.
No que se refere à limitação das astreintes, é impertinente a indenização de afronta ao artigo 412 do Código Civil, o qual trata, especificamente, de cláusula penal, sendo inaplicável à situação.
Ainda, caracteriza dano moral coletivo a violação de direitos de certa coletividade ou ofensa a valores próprios dessa. Nas lições de Xisto Tiago de Medeiros Neto (in Dano Moral Coletivo, São Paulo: LTr, 2014, p. 172), pode assim ser conceituado:
"dano moral coletivo corresponde à lesão a interesse ou direitos de natureza transindividual, titularizados pela coletividade, considerada em seu todo ou em qualquer de suas expressões (grupos, classes ou categorias de pessoas), em decorrência da violação inescusável do ordenamento jurídico".
Constitui, pois, instituto jurídico que objetiva a tutela de direitos e interesses transindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), os quais, quando vulnerados, também reclamam responsabilidade civil.
Surgiu da evolução do próprio conceito de dano moral e a partir do reconhecimento de que uma determinada comunidade é titular de valores que lhe são próprios, não se confundindo com a tutela subjetiva individual dos indivíduos que a compõem, como decorrência natural da transformação pela qual passa o Direito, e são de natureza indivisível. Veja-se, a propósito, a precisa lição de Carlos Alberto Bittar Filho:
"Assim como cada indivi?duo tem sua carga de valores, tambe?m a comunidade, por ser um conjunto de indivi?duos, tem uma dimensa?o e?tica. Mas e? essencial que se assevere que a citada amplificac?a?o desatrela os valores coletivos das pessoas integrantes da comunidade quando individualmente consideradas. Os valores coletivos, pois, dizem respeito a? comunidade como um todo, independentemente de suas partes. Trata-se, destarte, de valores do corpo, valores esses que na?o se confundem com os de cada pessoa, de cada ce?lula, de cada elemento da coletividade." (BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto juri?dico brasileiro. Disponível em
. Acesso em: 12 Dez. 2015).
No caso em análise, o interesse coletivo a ser tutelado consiste na coibição de a empresa permanecer com comportamento renitente em se escusar a cumprir a legislação, que lhe impõe a obrigação prevista em normas de segurança e saúde no trabalho, como a observância limitação da jornada dos operadores de teleatendimento e a obrigação de sua anotação, inclusive no que tange aos intervalos intrajornadas e interjornadas, ultrapassando, portanto, os limites da pretensão meramente individual.
Some-se a isso a finalidade precípua de revelar à própria sociedade que a lei é feita para todos e por todos, e deve ser cumprida, o que pode servir de estímulo para moldar o comportamento de qualquer um frente ao sistema jurídico.
Não há dúvida, por outro lado, da possibilidade de tutela judicial dos interesses coletivos, na precisa lição de Barbosa Moreira, citado na obra referida:
"Em muitos casos, o interesse em jogo, comum a uma pluralidade indeterminada (e praticamente indetermina?vel) de pessoas, na?o comporta decomposic?a?o num feixe de interesses individuais que se justapusessem como entidades singulares, embora ana?logas. Ha?, por assim dizer, uma comunha?o indivisi?vel de que participam todos os possi?veis interessados, sem que se possa discernir, sequer idealmente, onde acaba a 'quota' de um e onde comec?a a de outro. Por isso mesmo, instaura-se entre os destinos dos interessados ta?o firme unia?o, que a satisfac?a?o de um so? implica de modo necessa?rio a satisfac?a?o de todas; e, reciprocamente, a lesa?o de um so? constitui, ipso facto, lesa?o da inteira coletividade. Por exemplo: teme-se que a realizac?a?o de obra pu?blica venha a causar danos graves a? flora e a? fauna da regia?o, ou acarrete a destruic?a?o de monumento histo?rico ou arti?stico. A possibilidade de tutela do 'interesse coletivo' na preservac?a?o dos bens em perigo, caso exista, necessariamente se fara? sentir de modo uniforme com relac?a?o a? totalidade dos interessados. Com efeito, na?o se concebe que o resultado seja favora?vel a alguns e desfavora?vel a outros. Ou se preserva o bem, e todos os interessados sa?o vitoriosos; ou na?o se preserva, e todos saem vencidos." (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Tutela Jurisdicional dos Interesses Coletivos ou Difusos. In Temas de Direito Processual (Terceira Se?rie). São Paulo: Saraiva, 1984. p. 195-196).
O quadro fático delineado no acórdão regional revela que a ré descumpriu normas de segurança e saúdo do trabalho, submetendo seus trabalhadores a jornadas em limites superiores ao permitido e não concedendo os intervalos entre jornadas e intrajornadas devidos, relativos, inclusive, às pausas para descanso dos que atuam em teleatendimento.
Essa prática não pode ser opção, tampouco merece ser tolerada pelo Poder Judiciário, sobretudo no Estado Democrático de Direito, no qual a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho representam fundamentos da República (art. 1º, III e IV, CF), de modo que sua constatação enseja a condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos.
Ademais, a configuração de lesão ao patrimônio moral coletivo dispensa a prova do efetivo prejuízo de todos os empregados ou do dano psíquico dele derivado. A lesão decorre da própria conduta ilícita da empresa, em desrespeito à lei e à dignidade do trabalhador.
Nesse diapasão, os ensinamentos de Leonardo Roscoe Bessa (in Revista de Direito do Consumidor: "Dano Moral Coletivo" p. 103-104), também registrados por Xisto Tiago de Medeiros Neto (in Dano Moral Coletivo, São Paulo: LTr, 2014, p. 171):
"o dano extrapatrimonial, na área de direitos metaindividuais, decorre da lesão em si a tais interesses, independentemente de afetação paralela de patrimônio ou de higidez psicofísica. (...) Em outros termos, há que se perquirir, analisando a conduta lesiva em concreto, se o interesse que se buscou proteger foi atingido. (...)
(...) A dor psíquica ou, de modo mais genérico, a afetação da integridade psicofísica da pessoa ou da coletividade não é pressuposto para caracterização do dano moral coletivo (....). Embora a afetação negativa do estado anímico (individual ou coletivo) possa ocorrer, em face dos mais diversos meios de ofensa a direitos difusos e coletivos, a configuração do denominado dano moral coletivo é absolutamente independente desse pressupostos. (...)."
Caracteriza-se, assim, lesão a direitos e interesses transindividuais, relativa à saúde e segurança dos empregados da ré, razão pela qual se tem por configurada a ofensa a patrimônio jurídico da coletividade, que necessita ser recomposto.
Nesse norte, confiram-se os seguintes precedentes:
"(...) 4 - DANO MORAL COLETIVO. 4.1. A condenação ao pagamento de indenização por dano moral coletivo encontra respaldo na ordem jurídica (Art. 6.º, VI, VII, da Lei n.º 8.078/90 e Art. 1.º da Lei n.º 7.347/85) e na jurisprudência desta Corte. 4.2. Na hipótese dos autos, restou sobejamente demonstrado o ato ilícito, consistente no elastecimento excessivo e reiterado dos limites legais de jornada laboral. Recurso de revista não conhecido. (...)" (RR - 1772-85.2012.5.09.0071, Relatora Ministra: Delaíde Miranda Arantes, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 15/02/2019)
"[...]. II - RECURSO DE REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014. DANO MORAL COLETIVO. REITERADO DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. 1.1. O atraso reiterado do pagamento de salários, bem como a prorrogação de jornadas além de 10 horas, descumprimento do intervalo intrajornada e das normas de segurança do trabalho representam lesões graves aos direitos mínimos trabalhistas. 1.2. As empresas que se lançam no mercado, assumindo o ônus financeiro de cumprir a legislação trabalhista, perdem competitividade em relação àquelas que reduzem seus custos de produção à custa dos direitos mínimos assegurados aos empregados. 1.3. Diante desse quadro, tem-se que a deliberada e reiterada desobediência do empregador à legislação trabalhista ofende a população e a Carta Magna, que tem por objetivo fundamental construir sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da CF). 1.4. Tratando-se de lesão que viola bens jurídicos indiscutivelmente caros a toda a sociedade, surge o dever de indenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP). 1.5. Frise-se que, na linha da teoria do 'danum in re ipsa', não se exige que o dano moral seja demonstrado. Ele decorre, inexoravelmente, da gravidade do fato ofensivo que, no caso, restou materializado pelo descumprimento de normas que visam à proteção do salário e a mantença da saúde física e mental dos trabalhadores no Brasil. Recurso de revista conhecido e provido. [...]." (ARR-528-92.2014.5.18.0171, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, DEJT 17/06/2016);
"(...). 5. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO. DESCUMPRIMENTO REITERADO DAS NORMAS TRABALHISTAS RELATIVAS À JORNADA DE TRABALHO (INTERVALO INTERJORNADAS, EXTRAPOLAÇÃO HABITUAL DA JORNADA DE TRABALHO, LABOR AOS DOMINGOS E FERIADOS). No caso presente, o Tribunal Regional manteve a condenação da Reclamada ao pagamento do dano moral coletivo em virtude de ter restado comprovada a conduta negligente da Reclamada no que diz respeito ao descumprimento reiterado de normas trabalhistas relativas à extrapolação habitual da jornada de trabalho, inobservância do intervalo interjornadas e trabalho aos domingos e feriados. Esta Corte tem firmado jurisprudência no sentido de que, em hipóteses como a tratada nos autos, resta configurado o dano moral coletivo, estando dispensada a prova do prejuízo financeiro ou psíquico, uma vez que a lesão encontra-se relacionada ao próprio ato ilícito. Julgados desta Corte. Incide a Súmula 333/TST como óbice ao conhecimento do recurso de revista. Recurso de revista não conhecido. (...)." (RR - 855-09.2013.5.09.0014, Relator Ministro: Douglas Alencar Rodrigues, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/09/2018)
Não merece reforma a decisão regional.
Finalmente, depreende-se da transcrição acima que o valor arbitrado à indenização por danos morais foi fundamentado nos seguintes critérios: gravidade e extensão do dano, o caráter pedagógico da medida e a capacidade econômica do ofensor.
A parte recorrente, ao se insurgir contra tal decisão, limita-se a invocar os Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade, de forma genérica, pleiteando a redução da quantia deferida.
Tal postura não se coaduna com a natureza especial do recurso de revista.
Seria necessário que expusesse as razões pelas quais considera inadequado o valor arbitrado e demonstrasse em que pontos e de que maneira ele não corresponde à extensão do dano. Além, disso, deveria ter indicado, de modo preciso e fundamentado, porque os critérios utilizados pela Corte Regional não foram aplicados ou mensurados corretamente. Tais providências, no entanto, não foram tomadas pela parte recorrente.
Nesse mesmo sentido já decidiu esta Turma, em voto da lavra do Exmo. Ministro Vieira de Mello Filho:
"O reclamado, em seu recurso de revista, aponta violação do art. 944 do Código Civil. Apresenta divergência jurisprudencial.
Sustenta que a indenização por danos morais deve ser reduzida, porque o arbitramento deve ser moderado equitativamente e realizado com prudência, sendo descabido o enriquecimento do ofendido.
Primeiramente, como visto acima, está superada a questão relativa à existência dos requisitos para o deferimento dos danos morais decorrentes da doença ocupacional.
No mais, a insurgência de revista do reclamado apresenta insanável defeito de fundamentação neste tópico.
Neste ponto do apelo de revista, a instituição financeira limita-se a afirmar que o valor da reparação moral não foi arbitrado equitativamente e com prudência. Contudo, não traz os reais motivos pelos quais considera a reparação moral pecuniária exorbitante.
Para possibilitar a revisão do valor atribuído aos danos morais a parte recorrente deve apontar, explicitar e demonstrar inequivocamente em seu recurso de revista o desequilíbrio entre o valor da indenização e o dano extrapatrimonial causado ao empregado, considerando as condições pessoais e econômicas dos envolvidos e a gravidade da lesão aos direitos fundamentais da pessoa humana, da honra e da integridade física, psicológica e íntima.
Diante dos fracos e genéricos fundamentos trazidos pelo reclamado neste ponto de seu recurso de revista, impossível reconhecer a ofensa direta e literal ao art. 944 do Código Civil.
(...)
Não conheço." (RR-34800-71.2008.5.17.0003, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, DEJT 06/06/2014).
Outros precedentes:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. (...). VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. A mera alegação de forma genérica de que o critério utilizado para arbitrar o valor da indenização por danos materiais afronta o art. 950 do Código Civil, sem que a parte esclareça os motivos pelos quais entende que o valor fixado é insuficiente e não atende os preceitos contidos no aludido dispositivo legal, não tem o condão de demonstrar a violação direta do concernente dispositivo de lei federal (art. 950 do CCB). A deficiência na fundamentação do recurso inviabiliza a dialeticidade recursal, obstando o acolhimento das alegações da parte. Agravo de instrumento desprovido." (AIRR-544-91.2010.5.15.0002, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, DEJT 10/10/2014).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014. DANO MORAL. DOENÇA OCUPACIONAL. MORTE DE EX-EMPREGADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. ARTIGO 1.016, III, DO CPC/2015. (...) A Agravante não se insurge especificamente contra os fundamentos da Corte Regional, limitando-se a afirmar, de forma genérica, que o montante fixado não se mostra razoável e proporcional e acarreta o enriquecimento ilícito. Não consta das razões recursais impugnação específica aos motivos que levaram a Corte a quo a concluir que o valor de R$20.000,00 para cada Autor, a título de danos morais, mostra-se razoável. Ocorre que o princípio da dialeticidade impõe à parte o ônus de se contrapor à decisão recorrida, esclarecendo seu desacerto e fundamentando as razões de sua reforma, o que não ocorre na minuta de agravo de instrumento. Não havendo, portanto, impugnação específica aos elementos considerados pela Corte de origem para aferição do quantum indenizatório a título de danos morais em razão da morte do ex-empregado, o recurso encontra-se desfundamentado, no particular, nos termos do artigo 1.016, III, do CPC/2015. Agravo de instrumento não conhecido." (AIRR - 10727-08.2015.5.03.0091 , Relator Ministro: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 12/09/2018, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/09/2018)
"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO ANTES DA LEI 13.015/2014. (...) INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL. VALORAÇÃO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. QUANTUM FIXADO. (...) 3. A reclamada, ao insurgir-se contra o acórdão regional que reduziu o montante arbitrado a título de danos morais para R$ 20.000,00. (vinte mil reais), limita-se a alegar, genericamente, que o valor fixado não é proporcional, tampouco razoável, ao pleitear nova redução da quantia deferida. Compete à parte recorrente expor as razões pelas quais considera desajustado o valor arbitrado e demonstrar em que pontos e de que maneira ele não corresponde à extensão do dano. Deve, ainda, apontar, de forma fundamentada e precisa, porque os critérios utilizados pelo Tribunal Regional não foram mensurados corretamente. Tem-se, portanto, que recurso de revista é genérico, em razão de os argumentos de razoabilidade e proporcionalidade estarem desacompanhados dos elementos objetivos de impugnação dos parâmetros utilizados pelo Tribunal Regional, os quais podem servir tanto para aumentar quanto para reduzir a condenação. Recurso de revista não conhecido.(...)" (RR - 80200-51.2011.5.13.0024, Relatora Ministra: Maria Helena Mallmann, Data de Julgamento: 05/12/2017, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 15/12/2017)
Tanto o apelo é genérico, que o argumento da razoabilidade e proporcionalidade, quando desacompanhado dos elementos objetivos de impugnação dos parâmetros utilizados pelo Tribunal Regional, pode servir para aumentar quanto para reduzir a condenação.
Inviável, assim, a constatação de afronta literal aos preceitos indicados no apelo.
Quanto ao dissenso pretoriano, verifica-se que os arestos colacionados são inviáveis ao conflito de teses, porque inespecíficos, nos termos da Súmula nº 296 desta Corte.
Nego provimento ao agravo de instrumento.
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passo à análise dos pressupostos recursais intrínsecos.
TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA
Pelos motivos acima já declinados, passo ao exame da presença dos indicadores de transcendência, previstos no artigo 896-A da CLT.
Pois bem.
Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso do empregado/parte autora, o valor fixado no artigo 852-A da CLT e, na hipótese dos autos, há elementos a respaldar a conclusão de que os pedidos rejeitados e devolvidos à apreciação desta Corte envolvem pretensões que ultrapassam o valor de 40 salários mínimos.
Assim, admito a transcendência da causa.
DANOS MORAIS COLETIVOS. INDENIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRO. VALOR ARBITRADO. DO PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. DOS PARÂMETROS PARA FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA (PUNITIVE DAMAGES). JUSTIÇA CORRETIVA (CORRELATIVIDADE E PERSONALIDADE)/CRITÉRIO COMPENSATÓRIO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. CRITÉRIO BIFÁSICO DE MENSURAÇÃO DOS DANOS MORAIS. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA.
CONHECIMENTO
Em face do acórdão regional foram interpostos recursos de revista pelas partes.
O Tribunal Regional admitiu apenas o processamento do apelo do Parquet, quanto ao tema "valor arbitrado à indenização por danos morais coletivos", o que ensejou a interposição do agravo de instrumento da reclamada.
Contraminuta e contrarrazões apresentadas.
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 95, § 2º, I, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.
A Relatora, Desembargadora Convocada Ana Paola Diniz, se manifestou pelo não conhecimento do recurso de revista do Ministério Público do Trabalho quanto ao tema "danos morais - valor da indenização - arbitramento", sob os seguintes fundamentos, in verbis:
RECURSO DE REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA. Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso do empregado/parte autora, o valor fixado no artigo 852-A da CLT e, na hipótese dos autos, há elementos a respaldar a conclusão de que os pedidos rejeitados e devolvidos à apreciação desta Corte ultrapassam o valor de 40 salários mínimos. Assim, admite-se a transcendência da causa.
DANO MORAL COLETIVO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. ARBITRAMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. Ainda que se busque criar parâmetros norteadores para a conduta do julgador, certo é que não se pode elaborar uma tabela de referência para a reparação do dano moral. A lesão e a reparação precisam ser avaliadas caso a caso, a partir de suas peculiaridades. Isso porque, na forma prevista no caput do artigo 944 do Código Civil, "A indenização mede-se pela extensão do dano". O que se há de reparar é o próprio dano em si e as repercussões dele decorrentes na esfera jurídica do ofendido. Na hipótese, o Tribunal Regional fixou o valor da indenização por dano moral coletivo em R$1.000.000,00 (um milhão de reais). Para tanto, fundamentou: "(...) ao valor a ser arbitrado a título da referida indenização, devem ser considerados alguns critérios como a gravidade e extensão do dano, o caráter pedagógico da medida e a capacidade econômica do ofensor. Quanto à capacidade econômica do ofensor, verifica-se que a ré possui capital social no valor de R$ 8.681.776.903,84 (oito bilhões seiscentos e oitenta e um milhões setecentos e setenta e seis mil novecentos e três reais e oitenta e quatro centavos), conforme contrato social juntado aos autos". Não obstante esta Relatora tenha reservas pessoais quanto à utilização de critérios patrimonialistas calcados na condição pessoal da vítima e na capacidade econômica do ofensor para a quantificação do dano moral, verifica-se que o valor arbitrado pela Corte de origem mostra-se proporcional à própria extensão do dano moral coletivo acima descrito. A única exceção à reparação que contemple toda a extensão do dano está descrita no parágrafo único do artigo 944, já referido. Todavia, constitui autorização legislativa para a redução equitativa em razão do grau de culpa do ofensor, o que não se constata na demanda. Recurso de revista não conhecido.
No que toca ao recurso de agravo de instrumento de instrumento da parte reclamada, no mesmo tema, a Desembargadora Convocada desproveu o recurso por entender que a impugnação foi genérica. In verbis:
VALOR ARBITRADO. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. A alegação genérica de que o valor arbitrado para a indenização por danos morais não atende aos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade não se coaduna com a natureza especial do recurso de revista. É necessário que a parte indique, de modo fundamentado, em que pontos os critérios utilizados pela Corte Regional não foram aplicados ou mensurados corretamente e as razões pelas quais considera que o valor fixado não corresponde à extensão do dano. Não observada essa exigência, mostra-se inviável a constatação de afronta ao artigo 944, parágrafo único, do Código Civil. Precedentes desta Turma. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
Pois bem.
Consoante disposto no recurso de revista do Ministério Público do Trabalho, trata-se de ação civil pública, com pedido de tutela de urgência, ajuizada em 21/11/2017 pelo Ministério Público do Trabalho, objetivando a condenação da ré Amil Assistência Médica Internacional S.A., tendo como pedidos:
(...) III. DOS PEDIDOS III.1. EM CARÁTER DE TUTELA DE URGÊNCIA Por todo o exposto, requer o Ministério Público do Trabalho a condenação da Ré nas obrigações a seguir expostas, fixando-se astreintes em valor não inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por verificação de descumprimento e por trabalhador prejudicado, nos termos do art. 11 da Lei 7.347/85, dos arts. 536, caput e §1° e 537 do CPC sobre cujo valor deverá incidir multa e correção monetária, reversível ao FAT: a) PROCEDER o registro fidedigno dos horários de entrada e saída dos seus empregados, conforme § 2º do art. 74 da CLT c.c. súmula 338 do TST; b) RESPEITAR o limite legal de jornada aos trabalhadores em teleatendimento/telemarketing de 36 (trinta e seis) horas semanais e 06 (seis) horas diárias conforme item 5.3. e 5.31 do Anexo II da NR-17 c.c. 227 da CLT; c) CONCEDER aos empregados do teleatendimento da empresa, conforme disposto na NR-17, com o Anexo II, o efetivo gozo de 02 (duas) pausas remuneradas de 10 (dez) minutos cada uma, ao longo da jornada de trabalho, para aqueles que laborem acima de 04 horas diárias e, para aqueles que laborem até 04 horas diárias, uma pausa de 10 (dez) minutos, devidamente remunerada; bem como a pausa de 15 (quinze) minutos antes do início do período extraordinário de trabalho, na forma dos itens5.1.3.1 e 5.4.1 e ss. do Anexo II da NR-17; d) REGISTRAR EFETIVAMENTE as pausas para descanso nos termos do item 5.4.4 do Anexo II da NR-17; e) DISPONIBILIZAR, em forma impressa ou eletrônica, os registros das pausas para descanso, tanto à Fiscalização do Trabalho, quanto aos próprios trabalhadores nos termos dos 5.4.4.1 e 5.4.4.2 do Anexo II da NR-17; f) RESPEITAR o limite legal e constitucional (diário e semanal) da carga horária de seus empregados, ressalvada a possibilidade de prorrogação da jornada normal por até 02 (duas)horas extras, conforme previsão e requisitos dos arts. 59 e 61, da CLT e art. 7º, XIII, da CF/88; g) OBSERVAR a redução da hora noturna, e respectiva prorrogação, para o cômputo da jornada de trabalho efetivamente laborada, conforme §1º e 4º do art. 73 da CLT, inclusive em relação aos trabalhadores que laboram na escala 12x36; h) CONCEDER o intervalo intrajornada a todos os empregados, respeitando-se os limites, mínimo e máximo, fixados no art. 71 da CLT, observando-se, também, o item 5.4.2. do Anexo II da NR-17 para os trabalhadores em teleatendimento/telemarketing; i)CONCEDER, aos empregados em regime laboral de oito horas diárias, o gozo efetivo de 11hs (onze horas) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, conforme art. 66 da CLT, ou de 36 (trinta e seis) horas aos trabalhadores - excetuados aqueles na função de teleatendimento/telemarketing, que laboram na escala 12x36. III.2. EM CARÁTER DEFINITIVO Em caráter definitivo, requer o MPT a condenação do Réu nas obrigações expostas no item anterior, confirmando-se in totum a tutela de urgência requerida (provimento antecipatório), bem como a fixação de astreinte em valor não inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por verificação de descumprimento e por trabalhador prejudicado, reversível ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Ademais, ora se requer a condenação da Ré a pagar indenização por dano moral coletivo, no valor de R$R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais), conforme fundamentação, corrigido monetariamente até o efetivo recolhimento em favor ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), acrescido de juros moratórios, bem como as custas e demais despesas processuais." (Petição Inicial 8a2345d - 21/11/2017 14:00 )" (fls. 19.116/19.118).
Aduz, nas razões de seu recurso de revista, que a "r. sentença rejeitou as preliminares suscitadas pela ré (Amil Assistência Médica Internacional S.A.) e, no mérito, julgou PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, condenando a ré nas seguintes obrigações de pagar e fazer" (fl. 19.118):
(...) Determinar que a reclamada pague, após o trânsito em julgado, as seguintes parcelas: - indenização por danos morais coletivos no importe de R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais); - honorários de sucumbência correspondentes a 15% do valor da liquidação da sentença. Determinar que a reclamada cumpra as seguintes obrigações de fazer liminarmente: - deverá a demandada respeitar o limite legal e constitucional (diário e semanal) à carga horária de seus empregados, ressalvada a possibilidade de prorrogação, conforme previsão e requisitos dos artigos 59 e 61, da CLT e art. 7º, XIII, da CF/88, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder o gozo efetivo de 11hs (onze horas) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder e registrar regularmente os intervalos intrajornadas aos seus empregados nos termos do art. 71 da CLT observando o intervalo específico de 20 (vinte) minutos aplicável aos trabalhadores em teleatendimento/telemarketing, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder o repouso semanal remunerado após o 06º (sexto) dia seguido de trabalho, preferencialmente aos domingos, nos termos do inciso XV do art. 7º da CF, art. 67 da CLT e OJ nº 410 da SDI-I do TST, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado. Determinar que a reclamada cumpra as seguintes obrigações de fazer após o trânsito em julgado: - registro correto da jornada de trabalho, inclusive quanto aos intervalos, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - registro e cálculo correto da jornada noturna de seus empregados, devendo cumprir com tal obrigação após o trânsito em julgado, passível de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado Sentença líquida. Correção monetária na forma da fundamentação. Juros simples de 1% ao mês, observando-se a data do ajuizamento da ação (art. 883, da CLT e Súmula 200 do TST), já atualizado monetariamente. Em relação ao dano moral, se aplica o entendimento consolidado na Súmula n. 439 do TST. Não há parcelas passíveis de incidência de contribuição previdenciária e imposto de renda. Ressalto que é completamente desnecessária a interposição de Embargos Declaratórios para prequestionamento em primeira instância, pois trata-se de requisito recursal exigido apenas nos apelos de índole extraordinária, bem como que eventual inconformismo em relação ao decidido deve ser objeto de recurso apropriado perante a instância superior, sob pena de caracterização de embargos com propósito protelatório e aplicação das sanções processuais cabíveis (CPC, art. 80, 81 e 1.026). Custas de R$ 177.420,00, pela ré, calculadas sobre o valor de R$ 8.871.000,00, arbitrado à condenação. INTIMEM-SE AS PARTES. Intime-se a União. (Sentença 61aef2d - 19/11/2019 14:08) (fls. 19.118/19.119 - reproduzidas no recurso de revista).
A 1ª Turma do Tribunal Regional da 2ª Região conheceu do recurso ordinário interposto pela ré, rejeitou as preliminares suscitadas e, no mérito, proveu parcialmente o apelo, reduzindo o valor da indenização por dano moral coletivo para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), sob os seguintes fundamentos:
Danos morais coletivos. Indenização. Valor
Insurge a recorrente contra a sua condenação ao pagamento dos danos morais coletivos, novamente sobre os mesmos pretextos que pretendeu a improcedência da ação: que não houve irregularidades tuteláveis pela via coletiva; que supostas irregularidades ocorreram em uma pequena parcela de trabalhadores; que a sentença foi contraditória porque não levou em consideração o depoimento de testemunhas; que o Ministério Público do Trabalho não tem legitimidade para pleitear dano moral coletivo; que não houve violação aos direitos dos trabalhadores (fls. 41.684/ 41.698). Caso o entendimento não seja pela exclusão da indenização, pleiteia a redução da indenização por danos morais fixada pela origem em R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais).
Ao exame:
Além de mais do que superados os questionamentos ora invocados pela recorrente nos tópicos que se antecederam, compactuo com os fundamentos da Origem quanto à existência do dano coletivo, em vista das inegáveis violações ao ordenamento jurídico praticados pela empresa.
Portanto, demonstrada a violação aos direitos individuais homogêneos, como no caso (violação às normas relativas à saúde e segurança do trabalho) torna-se pertinente a reparação do dano moral coletivo.
Quanto ao valor a ser arbitrado a título da referida indenização, devem ser considerados alguns critérios como a gravidade e extensão do dano, o caráter pedagógico da medida e a capacidade econômica do ofensor.
No presente caso, como visto acima, é evidente a gravidades das lesões perpetradas, pois restou demonstrado o descumprimento pela ré de normas de saúde e segurança do trabalho, relacionadas ao desrespeito ao limite legal e constitucional de jornada, intervalo interjornada, intervalo intrajornada, pausas para descanso, concessão do repouso semanal remunerado, dentre outras.
Quanto à capacidade econômica do ofensor, verifica-se que a ré possui capital social no valor de R$ 8.681.776.903,84 (oito bilhões seiscentos e oitenta e um milhões setecentos e setenta e seis mil novecentos e três reais e oitenta e quatro centavos), conforme contrato social juntado aos autos (fl. 4.833).
Assim, considerando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mas sem desconsiderar a gravidade e repercussão social da lesão e o caráter pedagógicopunitivo da indenização, entendo que o quantum indenizatório comporta redução para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Dou provimento parcial ao apelo. Impossibilidade de atribuir efeito reparatório à ACP e de cumulação de obrigações de não fazer com indenização. A questão encontra-se superada, pois como visto no capítulo acima é plenamente viável a cumulação de pedido de condenação em dinheiro (indenização) com obrigação de fazer ou não fazer em ação civil pública. Nego provimento.
No que toca ao trecho do acórdão que se refere a outros elementos que dizem respeito à existência do dano moral coletivo julgados em "outro tópico" importa assinalar as irregularidades que foram registradas no acórdão recorrido e reproduzidas nas razões do recurso de revista do Ministério Público (às fls. 19.128/19.136). A saber:
MÉRITO
Jornada. Operadores de teleatendimento. Intervalo intrajornada e interjornada
Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, pautada no Inquérito Civil n.º 005268.2014.02.000/9, o qual restou instaurado com base em denúncia sigilosa (fls. 72/74) relatando irregularidades a respeito da jornada de trabalho realizada pelos empregados, bem como do pagamento do vale alimentação. Na exordial narrou o Ministério Público do Trabalho que, após a denúncia, a Fiscalização do Trabalho realizou diligência no estabelecimento da ré, sob CNPJ nº 29.309.127/0135-80 e concluiu pela precarização das relações de trabalho desenvolvido pela prestação de serviço "home Office", motivando a lavratura de 10 (dez) autos de infração (fls. 125 e seguintes). Relatou que em audiência administrativa a empresa se negou a firmar TAC (fls. 140/145), tendo afirmado que estaria tomando providências para adequação das irregularidades que foram detectadas pela fiscalização do trabalho. Na ocasião, juntou documentos a demonstrar a regularização informada. Narrou o Parquet que os documentos apresentados pela empresa foram encaminhados ao Setor Pericial Contábil do órgão, que, por sua vez, solicitou a apresentação dos seguintes documentos: registros de jornadas e folhas de pagamentos dos empregados, referentes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2016; a relação de empregados com jornada 12x36; a relação de empregados no cargo de "operador de telemarketing"; os comprovantes de entrega dos vales refeição e a convenção coletiva vigente. Referidos documentos foram apresentados e analisados pelo perito contábil, que concluiu pela manutenção das irregularidades verificadas pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE, bem como de outras, como a prática de jornada 12x36 de operadores de telemarketing; inobservância da redução da hora noturna trabalhada; ausência de registro das horas extras laboradas; ausência do registro de pausas dos operadores de telemarketing; não concessão de DSR. Disse que o montante de irregularidades observadas pelo setor pericial da Regional, totalizaram-se o expressivo número de 8.871 (oito mil, oitocentas e setenta e uma) ocorrências. Informou que a ré foi instada se manifestar, mas permaneceu inerte, não comparecendo na audiência designada. Afirmou que diante da reiteração dos mesmos ilícitos observados pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego e tendo restado infrutífera por duas vezes a assinatura de TAC, não lhe restou alternativa senão a propositura da presente Ação Civil Pública. O Juízo de Origem, analisando as provas constantes dos autos, julgou procedente a presente Ação Civil Pública e condenou a reclamante ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no importe de R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais) e determinou o cumprimento das seguintes obrigações de fazer liminarmente: "- deverá a demandada respeitar o limite legal e constitucional (diário e semanal) à carga horária de seus empregados, ressalvada a possibilidade de prorrogação, conforme previsão e requisitos dos artigos 59 e 61, da CLT e art. 7º, XIII, da CF/88, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder o gozo efetivo de 11hs (onze horas) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder e registrar regularmente os intervalos intrajornadas aos seus empregados nos termos do art. 71 da CLT observando o intervalo específico de 20 (vinte) minutos aplicável aos trabalhadores em teleatendimento/telemarketing, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - conceder o repouso semanal remunerado após o 06º (sexto) dia seguido de trabalho, preferencialmente aos domingos, nos termos do inciso XV do art. 7º da CF, art. 67 da CLT e OJ nº 410 da SDI-I do TST, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado." (sic, fl. 41.584). Ainda, determinou o Juízo a quo o cumprimento das seguintes obrigações de fazer após o trânsito em julgado: "- registro correto da jornada de trabalho, inclusive quanto aos intervalos, sob pena de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado; - registro e cálculo correto da jornada noturna de seus empregados, devendo cumprir com tal obrigação após o trânsito em julgado, passível de multa no importe de R$ 500,00 por infração e por empregado prejudicado." (sic, fl. 41.584). Inconformada recorre a reclamada (fls. 41.664/ 41.681), sustentando que o Juízo a quoanalisou de forma superficial as provas constantes dos autos e desconsiderou as provas testemunhais colhidas na audiência. Alega, em síntese, que a sentença está fundamentada nas conclusões colhidas no Inquérito Civil nº 005268/.2014.02.000/9, conduzido de forma a desatender a finalidade de efetiva investigação e mediação, não prestando como meio de prova; que ocorrências irregulares detectadas no Laudo Técnico pericial não abrangem a totalidade de trabalhadores, tendo ocorrido há mais de 4 anos. Aduz que não foi apresentada pelo Ministério Público do Trabalho uma única prova capaz de demonstrar a ilegalidade da jornada, mesmo porque o limite semanal de 36 horas previsto sempre foi respeitado pela recorrente; que observou a carga horária permitida, os intervalos intra e interjornada, o descanso semanal remunerado de seus empregados. Pois bem. A Gerência Regional do Trabalho e Emprego - Osasco/SP, atendendo solicitação do Parquet após denúncia anônima, realizou inspeção em um estabelecimento da ré (CNPJ nº 29.309.127/0135-800), tendo notificado a empresa a apresentar documentos, como controles de jornada, convenções coletivas de trabalho, relação dos trabalhadores na modalidade de "Home Office", folhas de pagamento e comprovação de fornecimento de vales refeição e alimentação (fl. 77). Do exame da referida documentação, concluiu a Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE que: "Da análise da documentação apresentada, e esclarecimentos prestados pelo empregador, verificou-se a existência de cerca de 150 trabalhadores na modalidade "home Office", os quais realizam atividades de teleatendimento, para marcação de consultas e agendamento de exames na rede credenciada da Amil. Concluiu-se pela precarização das relações de trabalho nessa forma de prestação de serviços, motivando a lavratura do auto de infração n° 20.845.335-1, por discriminação, conforme descrito no histórico daquele documento, e seus anexos - inclusive, sendo observada a prática de não fornecimento de vales-refeição para os trabalhadores que laboram em suas residências. No tocante à prática de banco de horas, tal procedimento é autorizado mediante acordo coletivo de trabalho celebrado entre a empresa e o sindicato da categoria profissional (cópias anexas). Não obstante, verificou-se uma série de irregularidades quanto ao excesso de jornada, falta de concessão de intervalos para descanso e alimentação, falta de concessão de intervalo interjornadas, e também falta de controle de jornada de alguns empregados administrativos (ponto "britânico") e de todos os empregados "home Office" (não apresentação de qualquer tipo de controle de jornada, embora a empresa pratique descontos em caso de faltas)." (sic, fl. 77, gn). Ainda, consta do referido relatório de fiscalização que foram lavrados, ao todo, 10 (dez) autos de infração (fls. 78/136), conforme ementas a seguir transcritas: "AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.324-5: Deixar de consignar em registro mecânico, manual ou sistema eletrônico, os horários de entrada, saída e período de repouso efetivamente praticados pelo empregado, nos estabelecimentos com mais de 10 (dez) empregados. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.327-0: Deixar de conceder ao empregado um descanso semanal de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.328-8: Prorrogar a jornada normal de trabalho, além do limite legal de 2 (duas) horas diárias, sem qualquer justificativa legal. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.329-6: Deixar de conceder período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.330-0: Deixar de consignar as pausas para descanso em registro impresso ou eletrônico. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.331-8: Deixar de conceder pausas de descanso em dois períodos de 10 minutos contínuos. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.332-6: Deixar de conceder intervalo para repouso e alimentação de 20 minutos na atividade de teleatendimento/telemarketing. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.333-4: Adotar qualquer prática discriminatória e limitativa de acesso ao/ou manutenção do emprego por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.334-2: Deixar de conceder descanso de 15 minutos antes do início do período extraordinário do trabalho, quando da prorrogação do horário normal. AUTO DE INFRAÇÃO Nº 20.845.335-1: Manter trabalhador em efetiva atividade de teleatendimento/telemarketing por mais de 36 horas semanais." (sic, fl. 78). Em audiência realizada no Inquérito Civil nº 005268.2014.02.000/9 (fl. 139), a reclamada informou que "as irregularidades pontuais teriam sido corrigidas" e em sua manifestação de fls. 146/148 apresentou documentos a fim de comprovar suas alegações. Os documentos foram encaminhados ao Setor Pericial Contábil do órgão ministerial, o qual solicitou novos documentos à ré para análise (fl. 149). O resultado do Laudo Contábil realizado encontra-se encartado às fls. 4.429/4.441 e nele constou quanto à jornada extraordinária que: "(...) 8. Dessa forma, o exame consistiu em verificar, com base nas informações contida nos arquivos eletrônicos, em formato texto - TXT, extraídos diretamente do sistema de jornada da investigada, cujo tratamento foi realizado pelo sistema JORNADA, d M.T.E., as jornadas efetivamente realizadas, considerando-se o intervalo intrajornada e tendo como limite a jornada máxima de 8 [oito] horas diárias, isto é, considerou-s o máximo de 2 [duas] horas suplementares em relação à jornada norma preestabelecida de 6 (seis) horas diárias do item 5.3 do Anexo 2 da NR 17. Portanto as jornadas de trabalho que ultrapassaram esse limite, caracterizam - s.m.j. - descumprimento do art. 59 da CLT. 9. Aplicada a metodologia, considerando-se o limite de 08 [oito] horas diárias de jornada, foram constatadas 1.296 situações que configuram desrespeito ao art. 59 d CLT, as quais se encontram devidamente mensuradas no Apêndice 1, que atingiram 96 funcionários, que representa 12% do total de 773 empregados operadores de teleatendimento que registraram ponto no período de 11.07.2016 a 10.10.2016. 10. Em relação aos demais funcionários, que laboram 220 horas mensais considerando-se o limite de 10 [dez] horas diárias, foram constatadas 113 ocorrência que configuram descumprimento do art. 59 da CLT, que atingiram 26 empregados, isto é, 18% dos 142 empregados que registraram ponto no período de 11.07.2016 10.10.2016, conforme demonstrado no Apêndice 2. 11. A investigada informa, ainda, que existem 634 operadores de teleatendimento que laboram no regime de 12x36, que está autorizado na cláusula 46ª do Acordo Coletivo de Trabalho, a seguir reproduzido. (...) 12. Primeiramente, ressalta-se que o regime 12x36 não encontram previsão no Anexo 2 da NR 17, já que essa estabelece, no item 5.3, a jornada máxima diária de 6 (seis) horas para os operadores de teleatendimento. Portanto, não se aplica a cláusula em questão para esses empregados. 13. Ainda assim, no que concerne aos funcionários operadores de teleatendimento que laboram no regime 12x36, o exame consistiu em verificar a aplicação da Súmula 444 do TST, ou seja, verificou-se o cumprimento da jornada trabalhada de 11 (onze) horas, mais as concessões do descanso intrajornada de 1 (uma) hora e da folga subsequente de 36 horas. 14. No que diz respeito à regularidade do cumprimento da escala 12x36, foram constatadas 912 situações de extrapolação da jornada trabalhada de 11 horas, que atingiram 37 funcionários, no período de 11.07.2016 a 10.10.2016, conforme demonstrado no Apêndice 3. 15. Diante dessas informações, em razão da extrapolação da jornada trabalhada de 11 horas, evidenciada no Apêndice 3, verifica-se a invalidação do regime de 12x36, pois esse pressupõe, para o elastecimento da jornada diária até 12 horas, a concessão do descanso intrajornada de uma hora e uma folga subsequente de 36 horas, sem a realização de horas extras. Portanto, considera-se descumprido o art. 59 da CLT. (...)" (sic, fl. 4.432/4.434). Ainda , no tocante ao intervalo intrajornada restou constatado que: "(...) 23. Aplicada a metodologia, foram catalogadas 5.137 ocorrências de ausência de marcações dos intervalos intrajornada e das pausas obrigatórias, referentes ao período de 11.07.2016 a 10.10.2016, que atingiram 476 funcionários, conforme apurado no Apêndice 4. 24. Vale ressaltar, ainda, que em relação às marcações de intervalo intrajornada e às pausas para descanso dos operadores de teleatendimento/telemarketing, que constam nos cartões de ponto, verifica-se que se apresentam registradas de forma "britânica", ou seja, sem variação, portanto, não representam fidedignamente o usufruto, conforme o cartão de ponto da funcionária Michelle Martins Cimino, a seguir reproduzido. (...) 25. Diante disso, conclui-se que as marcações registradas não atestam se a investigada vem concedendo regulamente o intervalo intrajornada e as pausas para descanso aos operadores de teleatendimento/telemarketing." (sic, fl. 4.436). Por fim, quanto ao intervalo interjornada e descanso semanal remunerado foram constatadas as seguintes irregularidades: "(...) 27. Aplicada a metodologia, foram catalogadas 86 ocorrências, no período de 11.07.2016 a 10.10.2016, as quais apresentaram situações que configuram desrespeito ao art. 66 da CLT, que atingiram 47 funcionários, conforme demonstrado no Apêndice 5. (...) 29. Aplicada a metodologia, foram identificadas 693 situações de descumprimento do art. 67 da CLT, referentes ao período de 11.07.2016 a 10.10.2016, que atingiram 380 funcionários, conforme demonstrado no Apêndice 6. (...)" (sic, fls. 4.437/4.438). Assim, ao contrário do que pretende fazer crer a recorrente em suas razões de recurso, o conjunto fáticoprobatório não deixa dúvidas quanto à prática de irregularidades pela empresa no tocante às normas de saúde e segurança do trabalho de forma contínua ao longo de tempo. Nesse sentido, a notícia de fato que deu ensejo ao Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público do Trabalho refere-se aos anos de 2013/2014 (fl. 72), a fiscalização da Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE ocorreu em 2015 e o Laudo Técnico elaborado com base nos documentos fornecidos pela empresa levou em consideração o período de 11.07.2016 a 10.10.2016. E não prospera a alegação simplista da ré no sentido de que as provas colhidas no âmbito do Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público do Trabalho não podem ser utilizadas nos autos porque produzidas de forma unilateral. O Ministério Público do Trabalho, como órgão fiscalizador da lei, tem o dever e poder de investigar fatos, ouvir testemunhas e tudo o que for necessário para apuração da verdade, sendo o Inquérito Civil procedimento administrativo, presidido por membro do Parquet, que tem por intuito a coleta de elementos para a apuração de autoria e materialidade de lesão ou ameaça de lesão a direitos metaindividuais, tudo para futura propositura de ação civil pública, exatamente como ocorreu no caso em tela. A prova produzida no âmbito do Inquérito Civil Público possui valor probante relativo, já que colhida em sede de procedimento administrativo inquisitório, conforme artigos 8º, §1º e 9º da Lei nº 7.347/85 e art. 129, III, da Constituição Federal. Contudo, no caso concreto, tais provas devem prevalecer, revelando-se aptas a instruir a presente Ação Civil Pública, uma vez que o acervo probatório produzido em juízo não é apto a infirmá-las. Nesse sentido, compartilho do entendimento da origem no sentido de que os depoimentos das duas testemunhas supervisoras (fls. 41.546/ 41.547), as quais respondiam por equipes de aproximadamente 30 empregados, não abrangem a realidade fática de todos os operadores de teleatendimento da reclamada. E, por óbvio, apenas referida prova testemunhal não é capaz de invalidar toda a prova documental produzida pelo Ministério Público do Trabalho no Inquérito Civil, inclusive os autos de infrações lavrados pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego - GRTE. Aqui cabe destacar que os autos de infração lavrados por Auditor Fiscal do Trabalho ostentam presunção de legalidade e veracidade e não foram desconstituídas pela empresa. Aliás, a reclamada não negou a ocorrência das irregularidades, limitando-se a afirmar na audiência administrativa (fl. 139) realizada em 26/07/2016 que "as irregularidades pontuais teriam sido corrigidas", o que foi refutado pelo resultado da perícia contábil realizada posteriormente. Dessa forma, não há que se falar em ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa. Com efeito, comprovada a prática de inúmeras irregularidades quanto às normas de saúde e segurança do trabalho, caberia a empresa comprovar o cumprimento da legislação, inclusive com a juntada de cartões de ponto, o que não o fez. No tocante ao valor das provas produzidas no âmbito do Inquérito Civil, cito as seguintes decisões do C. TST: "(...) CERCEAMENTO DE DEFESA - CONDENAÇÃO FUNDADA EM PROVA PRODUZIDA EM INQUÉRITO CIVIL - LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO 1. O inquérito civil possui valor probante e, desse modo, pode ser apreciado como meio de prova em Ação Civil Pública. Seu valor probatório é relativo, deve ser o inquérito confrontado com as demais provas produzidas nos autos. 2. No caso dos autos, o Eg. Tribunal Regional do Trabalho confrontou os depoimentos colhidos dos autos do inquérito civil com os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo e concluiu que o conjunto probatório não foi capaz de infirmar as evidências produzidas no inquérito civil. Assim, demonstrou-se o efetivo exame das provas produzidas pelos Réus, procedimento que demonstra o efetivo contraditório e respeito ao devido processo legal. 3. O inconformismo da Recorrente quanto à apreciação das provas pelo juízo a quo também não procede, pois foi observado o princípio processual do livre convencimento motivado. (...)" (RR-1089-76.2013.5.10.0009, 8ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 27/10/2017). "(...) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VALOR PROBANTE DOS ELEMENTOS REUNIDOS PELO PARQUET EM SEDE DE PRÉVIO INQUÉRITO CIVIL. As provas produzidas no inquérito civil possuem valor probante e podem ser devidamente apreciadas quando da propositura da ação civil pública. Contudo, possuem valor probatório relativo e devem ser afastadas , diante de contraprova produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.No caso dos autos, acrescentou o Tribunal Regional que: " perde força a discussão acerca do valor dos elementos de prova reunidos pelo MPT quando se verifica que também há testemunhos coletados em juízo que delatam os atos de assédio moral ". Ilesos os artigos indicados como violados. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...)" (RR-99500-91.2009.5.03.0106, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 23/10/2015). Por tais fundamentos, nada a reparar na r sentença.
Ao exame.
Com a Constituição de 1988 (e lá se vão vinte e nove anos), a indenização por dano moral puro, sem consequências materiais, tão só psicossomáticas - que há muito batia às portas de uma legislação específica, face os reclamos da doutrina, secundada pela jurisprudência - tornou-se conquista definitiva e irreversível em nosso direito, perfilhando os ordenamentos modernos. Apesar desse reconhecimento e dessa adoção, inconteste de vozes em contrário, algumas questões ainda residem no campo da controvérsia, por abalizadas e respeitáveis opiniões, e uma delas, talvez a mais tormentosa e ainda insolúvel ou não pacificada, é a da estimativa da indenização, sujeita, à míngua de tarifas preestabelecidas, ao prudente arbítrio, impregnado de subjetivismo do julgador, atraindo, aqui e ali, soluções quantitativas díspares para casos semelhantes ou assemelhados, gerando perplexidade, para não dizer incredulidade quanto à justiça a ser prodigalizada. Isso sem se falar na tábula rasa que se faz com a percussão do dano moral na consciência e sensibilidade da vítima singular, id est, de cada qual que passa pela provação, como sujeito em si, irrepetível na vivência, embora circunstâncias próximas ou iguais. O que a jurisprudência tem trilhado e aportou até agora, apesar de sérias dissonâncias doutrinárias de respeito e de impositiva reflexão, é a dupla finalidade da indenização de natureza pecuniária: à vítima a título de compensação e ao autor da ofensa a título pedagógico, de dissuasão de outras ou reiteradas práticas lesivas. Esse binômio, entretanto, não encontra, na grande maioria dos casos, notadamente em relação aos mais graves, um equilíbrio desejável ou satisfatório; ora a balança pende favorável a uma, ora a outra parte, a caracterizar ou, pelo menos, a permitir vislumbrar uma injustiça não reparada. Pacífico é que a indenização à vítima tem como limite a cinzenta linha do locupletamento indevido, mas que se confronta, em muitos casos, com a irrisoriedade da sanção ao ofensor, tal que este sai ileso ou, de certa forma, impune. Esse questionamento estará sempre presente quando se defrontam patrimônios e capacidade financeira da vítima e do ofensor, manifestamente diferenciados, inclusive quanto ao maior ou menor grau de culpa. Daí que a solução que se pretende buscar (...) é a da socialização da indenização por dano moral no que sobeja ao limite do locupletamento indevido às custas do potencial econômico/financeiro do ofensor, mesmo porque, toda ofensa, seja material ou moral, interessa e atinge a sociedade como um organismo que almeja a solidariedade e a utilidade da ação individual. Nesse sentido, Wilson J. Comel em "DANO MORAL - SOCIALIZAÇÃO DA INDENIZAÇÃO", JURIS PLENUM - XIV - número 79 - janeiro de 2018.
Explicitando o conceito de dano moral enquanto lesão à direito da personalidade, derivado inexoravelmente do fato ofensivo, sendo, portanto, in re ipsa, Wilson J. Comel, citando Roberto de Ruggiero, Maria Helena Diniz, Eduardo Zannoni, Clóvis Beviláqua, Sérgio Cavalieri Filho e voto do Ministro Octávio Galotti, que assentou no julgamento perante o excelso Supremo Tribunal Federal (in RTJ 115/1.383/1.386) que "o dano, puramente moral, é indenizável", prescindindo, pois, da apuração da patrimonialidade do dano. Dito de outro modo, uma vez provada a ofensa, restará demonstrado o dano à guisa de uma presunção natural que decorre das regras da experiência comum. In verbis:
Incisivo Roberto de Ruggiero quando afirma que não há delito civil se não houver dano. E, com sua peculiar clareza, elucida: "é indiferente que este seja no patrimônio ou em outros bens da pessoa, como os bens imateriais. Dano é sempre, e indenizável, a ofensa à honra, a difamação, a injúria, porque basta a perturbação feita pelo ato ilícito nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma pessoa, para produzir uma diminuição no gozo do respectivo direito".37 "O dano moral - segundo Maria Helena Diniz, ancorada em diversos autores - vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocado pelo fato lesivo" e, citando Eduardo Zannoni, acrescenta: "não é a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois estes estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do dano".3
Clóvis Beviláqua, em seus comentários ao Código Civil de 1916, faz síntese conclusiva: "A reparação é a regra para o dano, seja moral, seja material. A irreparabilidade é exceção." Entretanto, no seu sentir, "o dano moral, nem sempre, é ressarcível, não somente por se não poder dar-lhe valor econômico, por não se poder apreçá-lo em dinheiro, como, ainda, porque essa insuficiência dos nossos recursos abre a porta a especulações desonestas, acobertadas pelo manto nobilíssimo de sentimentos afetivos".54 Alerta este, por sinal, presente nos dias de hoje.
Atualmente, porém, em doutrina e em jurisprudência - por imposição de norma constitucional - é pacífica na recepção de que o dano moral puro, isto é, aquele do qual não se pode ou são extremas as dificuldades de demonstrar eventuais reflexos materiais (pessoais, familiares, políticos, psicossomáticos ou sociais), não está indene de reparação pecuniária. Exemplo comum e corriqueiro é o reconhecimento de dano moral decorrente da inscrição do nome do cliente no cadastro dos devedores inadimplentes (Serasa, Seproc...) pelos estabelecimentos financeiros, estando já solvida a dívida, sem que tenha sido possível demonstrar prejuízos de ordem material; a presunção de dano é iuris tantum e pronto!55 A jurisprudência pátria, reformulando posição anterior, tem estaqueado a de que o dano moral resulta da simples ofensa, sem que seja necessário demonstrá-lo concretamente. "Basta a ofensa - decidiu o eg. TJDF (RT 733/297) - para justificar a indenização". Pelo voto do Ministro Octávio Galotti, o excelso Supremo Tribunal Federal (in RTJ 115/1.383/1.386) assentou: "Dano, puramente moral, é indenizável", prescindindo, pois, da apuração da patrimonialidade do dano. A desnecessidade da prova dos prejuízos tem merecido agasalho no eg. Tribunal Superior de Justiça (in RT 746/183).
A par desse entendimento, além do mais, passou a vingar o de que "o dano simplesmente moral existe pela ofensa e dela é presumido. Basta a ofensa para justificar a indenização",56 de modo que o ônus da prova passa ao agente do dano, incumbindo-lhe demonstrar que não feriu a moral em virtude das circunstâncias e das condições do ofendido.57 Isso porque, segundo Sérgio Cavalieri Filho, citado em acórdão do TJAL (1ª Câm. Civ.),58 [...] o dano moral existe in re ipsa, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum.(COMEL, Wilson J. DANO MORAL - SOCIALIZAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. JURIS PLENUM - XIV - número 79 - janeiro de 2018).
Na lição de Xisto Tiago de Medeiros Neto, o dano moral coletivo visa a tutelar direitos "que traduzem valores jurídicos fundamentais da coletividade, que lhes são próprios, e que refletem, no horizonte social, o largo alcance da dignidade dos seus membros" (O dano moral coletivo e a sua reparação. Revista eletrônica [do] Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região, Curitiba, PR, v. 4, n. 38, p. 11-35, mar. 2015). Assim, trata-se de direitos cujo sujeito e? uma coletividade difusa e indeterminada, que na?o goza de personalidade juri?dica e cuja pretensa?o so? pode ser satisfeita quando deduzida em jui?zo por representantes adequados. Seu conteu?do consiste em lesa?o objetiva e intolera?vel a? ordem juri?dica.
Nessa diretriz, explica o autor que "[...] Tenha-se presente, tambe?m, que caracteriza dano coletivo, por traduzir prejui?zo a? pro?pria coletividade, a situac?a?o em que o infrator, pela via da ilicitude, busca auferir situac?a?o de vantagem indevida, principalmente no plano econo?mico. Para isso, utiliza-se de lo?gica transgressora do Estado Democra?tico de Direito, refletida na certeza de que na?o cumprir a lei - e reflexamente produzir danos - e? proveitoso para os seus interesses." (op. cit).
Segundo o escólio de Jose? Affonso Dallegrave Neto, a partir dos ensinamentos de Maria Celina Bodin de Moraes, "Particularmente, entendo que o dano moral caracteriza-se pela simples violac?a?o de um direito geral de personalidade, sendo a dor, a tristeza ou o desconforto emocional da vi?tima sentimentos presumidos de tal lesa?o (presunc?a?o hominis) e, por isso, prescindi?veis de comprovac?a?o em jui?zo.(...) Em igual direc?a?o doutrina?ria, Maria Celina Bodin de Moraes enaltece a importância de conceituar o dano moral como lesão a? dignidade humana, sobretudo pelas consequências dela geradas: 'Assim, em primeiro lugar, toda e qualquer circunstância que atinja o ser humano em sua condição humana, que (mesmo longinquamente) pretenda te?-lo como objeto, que negue a sua qualidade de pessoa, será? automaticamente considerada violadora de sua personalidade e, se concretizada, causadora de dano moral a ser reparado. Acentua-se que o dano moral, para ser identificado, na?o precisa estar vinculado a? lesa?o de algum 'direito subjetivo' da pessoa da vi?tima, ou causar algum prejui?zo a ela. A simples violac?a?o de uma situac?a?o juri?dica subjetiva extrapatrimonial (ou de um 'interesse patrimonial') em que esteja envolvida a vi?tima, desde que merecedora da tutela, sera? suficiente para garantir a reparac?a?o'." (DALLEGRAVE NETO, Jose? Affonso. Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho, 2a ed., Sa?o Paulo: LTr, 2007, p. 154).
No caso concreto, evidencia-se que, considerados os mesmos parâmetros de julgamento da sentença, tendo em vista as inegáveis violações ao ordenamento jurídico pela empresa, supratranscritas e negritadas; considerada, ainda, a demonstração de violação a normas de saúde e segurança no trabalho, a gravidade das lesões perpetradas ("relacionadas ao desrespeito ao limite legal e constitucional de jornada, intervalo interjornada, intervalo intrajornada, pausas para descanso, concessão do repouso semanal remunerado, dentre outras"), bem como a capacidade econômica do ofensor, que possui capital social no valor de R$ 8.681.776.903,84, levando em conta "os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mas sem desconsiderar a gravidade e repercussão social da lesão e o caráter pedagógicopunitivo da indenização", o Tribunal Regional reduziu o valor do dano moral coletivo de R$ 8.871.000,00 (oito milhões, oitocentos e setenta e um mil reais) para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Em síntese, o acórdão do Tribunal Regional pautou-se nos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade para, partindo das mesmas premissas fáticas constantes na sentença, reduzi-lo.
No vertente hipótese, a causa ensejadora do dano moral está provada e exaustivamente demonstrada, motivo pelo qual passo à análise da proporcionalidade do valor fixado a título de danos morais coletivos com base na jurisprudência do STJ, que estipula o critério bifásico de mensuração, pautado na análise de precedentes semelhantes e, ato contínuo, nas peculiaridades do caso concreto e, ainda, na acepção de justiça corretiva de Aristóteles, que associa critério de correlatividade e de personalidade.
Antes disso, contudo, alguns prolegômenos acerca da proporcionalidade merecem ser traçados.
Sobre o tema, leciona Willis Santigo Guerra que "considerando a atual tendência da filosofia e teoria do Direito para se ocupar dos procedimentos de interpretação, aplicação e produção do seu objeto, é fácil constatar a posição destacada que se destina a ocupar nessa conjuntura reflexões sobre o tema de que agora nos ocupamos" (o princípio da proporcionalidade).
Para o autor, o princípio da proporcionalidade seria o "princípio dos princípios", o verdadeiro principium ordenador do Direito, incrustado na noção do princípio da isonomia, entendido como "igualdade proporcional", e que não se confunde com o princípio da razoabilidade, na medida em que este consiste na vedação à perpetração de abusos com o direito e aquele na exigência de racionalidade no ato de julgar, pressupondo já a razoabilidade.
Explica Santigo Guerra que: "O princípio da proporcionalidade, entendido como um mandamento de otimização do respeito máximo a todo direito fundamental em situação de conflito com outro(s), na medida do jurídico e faticamente possível, tem um conteúdo que se reparte em três "princípios parciais" (...): "princípio da proporcionalidade em sentido estrito" ou "máxima do sopesamento" (...), "princípio da adequação" e princípio da exigibilidade ou "máxima do meio mais suave". O "princípio da proporcionalidade em sentido estrito" determina que se estabeleça uma correspondência entre o fim a ser alcançado por uma disposição normativa e o meio empregado, que seja juridicamente a melhor possível. Isso significa, acima de tudo, que não se fira o "conteúdo, essencial" (Wesensgehalt) de direito fundamental, com o desrespeito intolerável da dignidade humana, bem como que, mesmo havendo desvantagens para, digamos, o interesse de pessoas, individual ou coletivamente consideradas, acarretadas pela disposição normativa em apreço, as vantagens que traz para interesses de outra ordem superam aquelas desvantagens. Os subprincípios da adequação e da exigibilidade, por seu turno, determinam que, dentro do faticamente possível, o meio escolhido se preste para atingir o fim estabelecido, mostrando-se, assim, "adequado". Além disso, esse meio deve se mostrar "exigível", o que significa não haver outro, igualmente eficaz, e menos danoso a direitos fundamentais. Sobre essa distinção, vale referir a formulação lapidar do Tribunal Constitucional alemão: "O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e exigível, para que seja atingido o fim almejado. O meio é adequado, quando com seu auxílio se pode promover o resultado desejado; ele é exigível, quando o legislador não poderia ter escolhido outro igualmente eficaz, mas que seria um meio não-prejudicial ou portador de uma limitação menos perceptível a direito fundamental" (Entscheidungen der Bundesverfassungsgeritch, 1971, p. 316)". (GUERRA FILHO, Willis Santiago. "Sobre o Princípio da Proporcionalidade" in Dos princípios constitucionais : Considerações em tomo das normas principiológicas da Constituição I George Salomão Leite (coordenação). - 2. ed. rev. atual. e ampl. - São Paulo : Método, 2008).
E prossegue aduzindo que:
Uma característica marcante do pensamento jurídico contemporâneo, que se faz notar em autores como Josef Esser (1964), Ronald Dworkin (1977, 1978, 1985), Robert Alexy (1985) e, entre nós, Paulo Bonavides (1993), repousa precisamente na ênfase dada ao emprego de princípios jurídicos, positivados no ordenamento jurídico, quer explicitamente - em geral, na constituição -, quer por meio de normas em que se manifestam claramente, para o tratamento dos problemas jurídicos. Com isso, dá-se por superado o legalismo do positivismo normativista, para o qual as normas do direito positivo se reduziriam ao que hoje se chama "regras" (rules, Rege/n) na teoria jurídica anglo-saxônica e germânica, isto é, normas que permitem realizar uma subsunção dos fatos por elas regulados (Sachverhalte), atribuindo a sanção cabível. Princípios, por sua vez, se encontram em um nível superior de abstração, sendo igualmente hierarquicamente superiores, dentro da compreensão do ordenamento jurídico como uma "pirâmide normativa" (Stufenbau), e se eles não permitem uma subsunção direta de fatos, isso se dá indiretamente, colocando regras sob o seu "raio de abrangência". Ao contrário destas, também se verifica que os princípios podem se contradizer, sem que isso faça qualquer um deles perder a sua validade jurídica e ser derrogado. É exatamente numa situação em que há conflito entre princípios, ou entre eles e regras, que o princípio da proporcionalidade (em sentido estrito ou próprio) mostra sua grande significação, pois pode ser usado como critério para solucionar da melhor forma o conflito, otimizando na medida em que se acata um e desatende o outro. Esse papel lhe cai muito bem pela circunstância de se tratar de um princípio extremamente formal e, à diferença dos demais, não haver um outro que seja o seu oposto em vigor, em um ordenamento jurídico digno desse nome.
(...)
O traço distintivo entre regras e princípios, por último referido, aponta para uma característica destes que é de destacar: sua relatividade. Não ha princípio do qual se possa pretender seja acatado de forma absoluta, em toda e qualquer hipótese, pois tal obediência unilateral e irrestrita a uma determinada pauta valorativa - digamos, individual- termina por infringir uma outra - por exemplo coletiva. Daí dizer que há uma necessidade lógica e, até, axiológica, de se postular um "princípio de proporcionalidade" para que se possam respeitar normas, como os princípios, tendentes a colidir, quando se opera concretamente com o Direito (cf. Alexy, ob. ctt.: p. 100, 143 e s., passim; Willis S. Guerra Filho, 1989, p. 47, 69 e s., passim).
(...)
Da mesma forma como em sede de teoria do direito, os doutrinadores pátrios apenas começaram a se tornar cientes da importância dos princípios jurídicos, antes referida, também aos poucos é que estudiosos do Direito Constitucional e demais ramos do Direito vão se dando conta da necessidade intrínseca ao bom funcionamento de um Estado Democrático de Direto, de reconhecer e empregar o princípio da proporcionalidade, a Grundaz der VerhaltnismaBigkeit também chamada de "mandamento da proibição do excesso" (ÜbermaBverbot) - sem que deixe de haver sinonímia entre o princípio da proporcionalidade em sentido estrito e a proibição de excesso "de ação", por implicar o princípio também em uma "proibição de (excesso) de omissão ( UntermaBverbot).
(...)
Daí termos acima referido a esse princípio como "princípio dos princípios", verdadeiro principium ordenador do Direito. A circunstância de ele não estar previsto expressamente na Coonstituição de nosso país não impede que o reconheçamos em vigor também aqui, invocando o disposto no § 2º do art. 5º : "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados etc. Aqui cabe indagar se o princípio da proporcionalidade corresponderia a um direito ou garantia fundamental, podendo a mesma questão ser colocada em face do princípio da isonomia. Ambos os princípios, aliás, acham-se estreitamente associados, sendo possível, inclusive, que se entenda a proporcionalidade como incrustada na isonomia, pois como se encontra assente em nossa doutrina, com grande autoridade, o princípio da isonomia traduz a idéia aristotélica- ou, antes "pitagórica", como prefere Del Vecchio - de igualdade proporcional ,própria da "justiça distributiva", "geométrica", que se acrescente àquela "comutativa", "aritmética", meramente formal - aqui, igualdade de bens, ali,igualdade de relações.
Segundo o escólio de Robert Alexy, algumas premissas básicas devem ser respeitadas no momento da aplicação da lei, quais sejam: a) a concepção de que os direitos fundamentais possuem a estrutura de princípios perfazendo, por conseguinte, comandos de otimização os quais, b) não raro, entram em rota de colisão, devendo o conflito ser solucionado a partir da c) técnica da ponderação.
Contudo, embora as três primeiras fases estejam consolidadas na mentalidade judicial nacional, a quarta e última, que consistiria em uma fundamentação robusta e exauriente do sopesamento, muitas vezes, não é técnica valorizada. Isto é, não é aconselhável que o princípio da proporcionalidade seja utilizado de forma mecânica e meramente retórica, sem que objetivamente se demonstre as razões da desproporcionalidade do ato (Revista Cidadania e Justiça, Edição 229).
A justiça corretiva na tarefa de quantificação da indenização por dano moral é tarefa complexa inerente ao ato de julgar que deve levar em consideração ser o Estado fator de coesão e de ordenação dos fatores de produção, sendo o Judiciário a esfera de concretização dessa dimensão econômica do Estado, devendo sempre ponderar até que ponto a reparação efetivamente está sendo atingida a partir do âmbito material e programa normativo para se extrair a norma para o caso concreto. Nesse sentido, Friedrich Müller e Poulantzas.
Considerando o disposto no art. 5º, V e X da Constituição da República c/c art. 944 do Código Civil, "a indenização mede-se pela extensão do dano" e, no caso concreto, a indagação é quanto vale o respeito à normas de saúde e segurança do trabalhador?
Note-se que os valores abstratos do texto legal devem ser concretizados à luz da "magnitude do dano sofrido pela vítima, de modo a realizar a justiça corretiva propugnada pela responsabilidade civil" (ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
Nesse contexto, imperiosa as lições de Bonna e Teixeira Leal sobre a justificativa moral da responsabilidade civil:
A justificativa moral da responsabilidade civil remonta à classificação da justiça de Aristóteles em Ética a Nicômaco (1991), onde se acentua que existe uma justiça geral, relativa à consecução do bem comum de forma ampla, e a justiça particular. Dentro da justiça particular, tem-se, de um lado, a justiça distributiva, entendida como o conjunto de exigências de colaboração que intensificam o bem-estar, e, de outro, a justiça corretiva, responsável por recompor o equilíbrio nas relações entre particulares, pois, sendo as transações interpessoais uma espécie de igualdade, eventual desigualdade injusta deve ser igualada pelo juiz da seguinte forma: "ele retira a diferença pela qual uma das partes se beneficiou. E quando o todo for igualmente dividido, os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence - isto é, receberam o que é igual" (ARISTÓTELES, 1991, p. 104-105). Portanto, em um sentido amplo, dano é a violação a um interesse - patrimonial ou existencial, concretamente merecedor de tutela jurídica, entendido como aquele que historicamente foi construído por uma comunidade política como digno de proteção -, de modo que não existe rol de interesses jurídicos pretensamente válido para todos os casos (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2015, p. 232), havendo uma verdadeira cláusula geral de reconhecimento de danos a partir dos arts. 186 e 927 do Código Civil de 2002 - CC/2002 (BRASIL, 2002), que asseveram que aquele que causa dano a outrem comete ato ilícito e fica obrigado a reparar o dano, sem indicar como identificar o dano merecedor de tutela. Enquanto o dano material é a violação a um interesse patrimonial digno de tutela, o dano moral é a violação a um interesse existencial merecedor de proteção jurídica (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2015, p. 296). (ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
O desafio envolvido na quantificação da indenização pode ser solucionado de duas formas, quais sejam: a partir da indenização punitiva que levará em conta dentro outros fatos, os seguintes: "a) se houve dano físico; b) se a vítima é vulnerável; c) se a conduta é reiterada; d) se a conduta do ofensor foi marcada por alto grau de desprezo; e e) se o dano é de pequena monta e perpetrado em larga escala a ponto de existir o risco de o ofensor não pagar por todo o mal que fez perante outras vítimas". (ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
Critério também chamado de "punitive damages" ou de "teoria do valor do desestímulo", cuja aplicação no ordenamento jurídico brasileiro é controvertida, embora, como Pondera o Ministro Raul Araújo Filho, do Superior Tribunal de Justiça, a jurisprudência vem sinalizando a possibilidade de sua adoção "quando se tratar de conduta dolosa ou praticada com culpa grave, mostrando-se o comportamento do agente especialmente reprovável, com as adaptações necessárias à observância dos princípios e regras constitucionais e legais aplicáveis, inclusive da premissa da vedação ao enriquecimento sem causa".
Por outro lado, "o outro viés para o estabelecimento do valor indenizatório do dano moral (...) é o critério da indenização compensatória, a qual tem por principal tarefa a clássica função da responsabilidade civil centrada na justiça corretiva: a de eliminar o dano injusto, nem que seja de forma aproximativa (visto que os bens existenciais não se vendem em prateleiras e não podem ser objeto de troca por um bem equivalente). (ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
Sobre a correlatividade do critério compensatório ponderam Bonna e Teixeira Legal, citando Weinrib, que:
A correlatividade reflete "que ofensor e vítima respectivamente fizeram e sofreram a mesma injustiça, de modo que a responsabilidade é uma concepção de justiça que reconhece a igualdade normativa das partes e trata suas posições uma como o espelho da outra" (WEINRIB, 2012, p. 10, tradução nossa). Nesse sentido, todo o processo de justificativa da imposição de uma indenização percorrerá esse caminho, pressupondo que entre as partes, independentemente de contrato, existe uma relação normativa que exige a inviolabilidade de bens materiais e existenciais, e eventual violação de direitos representa desequilíbrio injusto que merece correção. De igual forma, a ideia de correlatividade também é importante para compreender que o dano e a ofensa são duas faces da mesma moeda, na medida em que o direito violado da vítima corresponde a um dever do ofensor de não interferir indevidamente no mesmo. Assim, direito e dever estão conectados, na medida em que o direito da vítima é a base do dever do ofensor, assim como o dever de abstenção do ofensor está relacionado com o direito de não interferência da vítima (WEINRIB, 2012, p. 11).
Contudo, a correlatividade não é o único componente jurídico da noção de justiça corretiva, que necessita da compreensão da personalidade. A personalidade é apresentada como o que é normativamente significante na interação das partes para fins de responsabilidade, ou seja, como o conjunto de direitos e deveres que formam o conteúdo do direito privado. Em outras palavras, a personalidade demonstra que o campo de liberdade do agir das partes está envolvido em um "sistema de deveres negativos de não interferência indevida nos direitos dos outros" (WEINRIB, 2012, p. 15, tradução nossa). Correlatividade e personalidade, assim, se interpenetram:
Assim como a correlatividade exibe a estrutura das justificativas que pertence ao direito privado, então a personalidade articula o pressuposto de que informa o conteúdo dessas justificativas. Correlatividade e personalidade fazem parte do mesmo campo teórico em diferentes dimensões. (WEINRIB, 2012, p. 15, tradução nossa).
Portanto, a justiça corretiva buscará restaurar, tanto quanto possível, o dano injustamente causado por uma das partes, tentativa esta que, se fosse perfeita, restabeleceria a posição inicial de igualdade normativa das partes ("initial positions to two equal lines/restoration of the original equality of the two lines") (WEINRIB, 2012, p. 16). Em se tratando de danos morais, o valor da indenização sempre será uma forma de atenuar o mal causado, sem ter o condão de restaurar integralmente o equilíbrio anteriormente existente. Contudo, mesmo a justiça corretiva tendo uma tarefa mais árdua no campo do dano moral, ainda assim é preciso levar a sério a dimensão normativa da vítima, no sentido de investigar tudo aquilo de interesse juridicamente protegido que lhe foi afetado. A indenização é um remédio que visa impor uma obrigação destinada a recompor os direitos da vítima, e, tanto quanto possível, lhe dar o equivalente aos seus direitos e interesses violados. A justiça corretiva tem essa ambição, com enfoque sério na dimensão normativa interna violada (WEINRIB, 2012, p. 35).(ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
"Isso implica em mergulhar a fundo na identificação de todos os interesses jurídicos violados e, ao mesmo tempo, na compreensão da magnitude dos danos, de modo a possibilitar não somente a caracterização de um dano como indenizável, mas também de proporcionar um valor monetário equivalente ou proporcional à total extensão normativa dos danos, da forma mais aproximativa possível" (...) "Seguindo essa linha, em matéria de dano moral, a função compensatória está relacionada à tentativa de estabelecer um valor indenizatório suficiente para conduzir a vítima a um estado semelhante ao que se encontraria caso não tivesse sofrido o dano, ou seja, busca, tanto quanto possível, a exata extensão desse dano, em prestígio ao restitutio in integrum com vistas a pôr a vítima em situação idêntica à de antes do evento danoso, com o conjunto de seus interesses inteiramente preservados. Esse estado perquirido pela função reparatória é denominado de status quo ante" (...) Essa função busca alcançar em maior grau possível um "valor que em verdade tem para o lesado o bem que se destruiu, ou a perda que sofreu" (MIRANDA, 1958, p. 183), contudo, caso não seja possível, pode a responsabilização versar sobre uma prestação equivalente, geralmente em dinheiro, aproximativa, imperfeita - porém frequente em razão dos chamados danos morais - que tem como característica a impossibilidade de pôr a vítima no estado em que se encontrava, de modo a retirar todos os males do dano existencial sofrido, cabendo à responsabilidade civil apenas compensar o dano por não se admitir restabelecimento perfeito do estado anterior (ALEXANDRE PEREIRA BONNA e PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL em "A quantificação do dano moral compensatório: em busca de critérios para os incisos V e X do art. 5º da CF/88". Revista Jurídica da Presidência Brasília v. 21 n. 123 Fev./Maio 2019 p. 124-146).
Pois bem.
O entendimento desta Corte Superior e? no sentido de que a revisa?o do montante arbitrado na origem, em compensac?a?o pelo dano moral sofrido, da?-se, ta?o somente, em hipo?teses em que e? ni?tido o cara?ter irriso?rio ou exorbitante da condenac?a?o, de modo tal que nem sequer seja capaz de atender aos objetivos estabelecidos pelo ordenamento para o dever de indenizar. Logo, configuradas tais hipo?teses de valores irriso?rios ou nitidamente exagerados, denotando manifesta inobserva?ncia aos princi?pios da razoabilidade e da proporcionalidade, aferi?vel de plano, sem necessidade de incursa?o na prova, na?o ha? o propalado o?bice da Su?mula 126/TST invocado pelo agravante.
Resta saber, portanto, qual será o critério objetivo para fins de verificação se o valor fixado a título de danos morais é irrisório ou exorbitante.
Para o Superior Tribunal de Justiça um meio de definir o quantum indenizatório por danos morais é o método bifásico que implica na adoção de um valor básico para a reparação considerando o interesse jurídico lesado e um grupo de precedentes. Depois, verificam-se as circunstâncias do caso concreto para fixar em definitivo a indenização.
No RESP 710.809, a Ministra Nancy Andrighi explicitou que "ao STJ é dado revisar o arbitramento da compensação por danos morais quando o valor fixado destoa daqueles estipulados em outros julgados recentes deste Tribunal, observadas as peculiaridades de cada litígio. (...) Com base nos precedentes encontrados referentes à hipóteses semelhantes e consideradas as peculiaridades do processo, fixa-se em sessenta mil reais para cada um dos recorrentes, o valor da compensação por danos morais". In verbis:
EMENTA Direito civil e processual civil. Ação de indenização por danos morais e materiais. Acidente rodoviário sofrido por passageiro de transporte coletivo. Resultado morte. Fundamentação deficiente. Prequestionamento. Danos materiais. Reexame de provas. Danos morais. Valor fixado. Revisão pelo STJ. Possibilidade. - Não se conhece do recurso especial na parte em que se encontra deficiente em sua fundamentação, tampouco quando a matéria jurídica versada no dispositivo legal tido por violado não tiver sido apreciada pelo Tribunal estadual. - A improcedência do pedido referente à indenização por danos materiais em 1º e em 2º graus de jurisdição foi gerada a partir da análise dos fatos e provas apresentados no processo, o que não pode ser modificado na via especial. - Ao STJ é dado revisar o arbitramento da compensação por danos morais quando o valor fixado destoa daqueles estipulados em outros julgados recentes deste Tribunal, observadas as peculiaridades de cada litígio. - A sentença fixou a título de danos morais o equivalente a quinhentos salários mínimos para cada recorrente; o acórdão reduziu o valor para vinte mil reais para a mãe, vinte mil reais para o pai, e dez mil reais para a irmã. - Com base nos precedentes encontrados referentes à hipóteses semelhantes e consideradas as peculiaridades do processo, fixa-se em sessenta mil reais para cada um dos recorrentes, o valor da compensação por danos morais. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
Em casos fático jurídicos semelhantes observei que a jurisprudência do TST tem fixado o dano moral coletivo e entendido como patamar razoável a fixação do valor da indenização entre R$1.000.000,00 (um milhão de reais) a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), quando há demonstração do descumprimento de normas relativas à saúde e à segurança do trabalhador.
Nesse sentido RRAg-1559-84.2016.5.22.0004, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 18/09/2020, cuja ementa e as razões de decidir transcrevo para demonstrar a identidade morfofuncional com a presente demanda. A saber:
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. 1. NULIDADE DO DESPACHO DENEGATÓRIO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 1.1. O trancamento do recurso, na origem, nenhum preceito viola, na medida em que exercitado o juízo de admissibilidade dentro dos limites da lei (CLT, art. 896, § 1°). O despacho agravado, no precário exame da admissibilidade recursal, não impede a devolução à Corte superior da análise de todos os pressupostos de cabimento do apelo. 1.2. De outra sorte, deixando a parte de provocar a Presidência do Tribunal Regional, por meio dos embargos declaratórios, com a finalidade de obter pronunciamento sobre a matéria, está preclusa a oportunidade de arguir a nulidade do despacho por negativa de prestação jurisdicional (art. 1º, § 1º, da IN 40/TST). 2. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROPAGANDISTA DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS. DEGUSTAÇÃO DE MEDICAMENTOS DAS EMPRESAS CONCORRENTES. DESCUMPRIMENTO DE NORMAS RELATIVAS À SEGURANÇA E À SAÚDE DO TRABALHADOR. DANO MORAL COLETIVO. CONFIGURAÇÃO. 2.1. O Tribunal Regional deu provimento ao recurso ordinário do MPT, para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, sob o fundamento de que restou demonstrado o descumprimento de normas relativas à segurança e à saúde do trabalhador. 2.2. No caso, o sistemático e reiterado desrespeito às normas trabalhistas (determinar aos propagandistas de produtos farmacêuticos a degustação de medicamentos de empresas concorrentes) demonstra que a lesão perpetrada foi significativa e que, efetivamente, ofendeu a ordem jurídica, ultrapassando a esfera individual. 2.3. As empresas que se lançam no mercado, assumindo o ônus financeiro de cumprir a legislação trabalhista, perdem competitividade em relação àquelas que reduzem seus custos de produção à custa dos direitos mínimos assegurados aos empregados. 2.4. Diante desse quadro, tem-se que a deliberada e reiterada desobediência do empregador à legislação trabalhista ofende a população e a Carta Magna, que tem por objetivo fundamental construir sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da CF). 2.5. Tratando-se de lesão que viola bens jurídicos indiscutivelmente caros a toda a sociedade, surge o dever de indenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP). Agravo de instrumento conhecido e desprovido. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO DO MPT. PROVIMENTO. DANO MORAL COLETIVO. INDENIZAÇÃO. VALOR. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. MAJORAÇÃO. A potencial ofensa ao art. 944 do Código Civil autoriza o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. III - RECURSO DE REVISTA DO MPT. DANO MORAL COLETIVO. INDENIZAÇÃO. VALOR. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. MAJORAÇÃO. A indenização por dano moral guarda conteúdo de interesse público. O valor fixado deve observar a extensão do dano sofrido, o grau de comprometimento dos envolvidos no evento, os perfis financeiros do autor do ilícito e da vítima, além de aspectos secundários pertinentes a cada caso. Incumbe ao juiz fixá-lo com prudência, bom senso e razoabilidade. Recurso de revista conhecido e provido. IV - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. DANO MORAL COLETIVO. INDENIZAÇÃO. VALOR. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. REDUÇÃO. A análise do recurso no tópico fica prejudicada ante o que restou decidido no recurso de revista do MPT (RRAg-1559-84.2016.5.22.0004, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 18/09/2020).
(...)
No caso dos autos, conforme ja? assinalado, o Tribunal Regional deu provimento ao recurso ordina?rio interposto pelo MPT, para condenar a demandada ao pagamento de indenizac?a?o por dano moral coletivo, sob o fundamento de que restou demonstrado o descumprimento de normas relativas a? seguranc?a e a? sau?de do trabalhador.
(...)
DANO MORAL COLETIVO. CRITE?RIOS PARA QUANTIFICAC?A?O. EXTENSA?O DO DANO O MPT busca dano moral coletivo no valor de R$ 10.000.000,00 (dez milho?es de reais) a ser revertido em benefi?cio conforme a ser especificado quando da execuc?a?o apo?s aprovac?a?o deste Jui?zo.
Afirma ter verificado a gravidade dos danos a? coletividade, grau de culpa do ofensor, ause?ncia de risco ao bom e normal funcionamento da empresa.
Destaca lucro li?quido da re? no valor de R$ 191 milho?es de reais, em 2015 e ao longo dos u?ltimos tre?s anos um lucro li?quido de R$ 532 milho?es, sendo R$ 158 milho?es, em 2013 e R$ 183 milho?es em 2014.
(...)
No caso, os relato?rios de administrac?a?o, financeiros e conta?beis de 2015 apontam o lucro li?quido da re? de R$ 193.983.435,84, sendo 9.699.171,79 para reserva legal, 138.213.198,04 para reserva de lucros e 46.071.066,01 para distribuic?a?o de lucros (Id. 53c32fb, p. 99/100).
O preposto revela atuac?a?o em ni?vel nacional e que ha? aproximadamente no Brasil 1500 propagandistas (Id. 50622c4, p. 233).
(...)
A C Ó R D Ã O
1.2 - ME?RITO.
Caracterizada a violac?a?o do art. 944 do Co?digo Civil, dou parcial provimento ao recurso de revista, para majorar o valor da indenizac?a?o para R$1.000.000,00 (um milha?o de reais).
Por sua vez, no ARR-101900-85.2005.5.05.0131, 1ª Turma, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, DEJT 02/10/20201, o Tribunal Regional majorou o valor da indenização por dano moral coletivo, em ação civil pública, de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), em decorrência de "constantes violações aos direitos coletivos, sua natureza (meio ambiente sadio e integridade física dos trabalhadores)", considerou, para tanto, as condições econômicas da empresa ré, Ford Motor Company Brasil Ltda ., o caráter punitivo e pedagógico da indenização, além da lesão causada à coletividade. In verbis:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 5ª REGIÃO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. "QUANTUM " INDENIZATÓRIO ARBITRADO. MAJORAÇÃO. Impõe-se confirmar a decisão que denegou seguimento ao recurso de revista, porquanto não comprovado pressuposto intrínseco de admissibilidade previsto no art. 896 da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA EMPRESA RÉ NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E DA LEI Nº 13.105/2015 (NOVO CPC). DESTINAÇÃO DA INDENIZAÇÃO AO FUNTRAD E NÃO AO FAT. JULGAMENTO "EXTRA PETITA". Impõe-se confirmar a decisão que denegou seguimento ao recurso de revista, porquanto não restou configurado julgamento fora dos limites da demanda. A ré interpôs embargos de declaração sem veicular o tema (Súmula nº 297 do TST), e, ademais, não se trata de violação nascida no acórdão regional, pois a própria empresa se insurgiu no recurso ordinário quanto à destinação da indenização ao FAT, o que levou a Corte Regional a destinar o valor ao sindicato dos trabalhadores vinculados à FORD. Agravo de instrumento a que se nega provimento. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA EMPRESA RÉ NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 . AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESRESPEITO ÀS NORMAS ATINENTES À SEGURANÇA DO TRABALHO. DANO MORAL COLETIVO. "QUANTUM " INDENIZATÓRIO ARBITRADO. REDUÇÃO . 1. Na hipótese, o Tribunal Regional majorou o valor da indenização por dano moral coletivo, em ação civil pública, de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), em decorrência de "constantes violações aos direitos coletivos, sua natureza (meio ambiente sadio e integridade física dos trabalhadores)", considerou, para tanto, as condições econômicas da empresa ré, Ford Motor Company Brasil Ltda . , o caráter punitivo e pedagógico da indenização, além da lesão causada à coletividade. 2. A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais deste Tribunal Superior , nos autos do Processo nº E-RR- 1564-41.2012.5.09.0673, (DEJT de 2/2/2018), consolidou entendimento no sentido de que a revisão dos valores atribuídos à indenização por dano moral pelas instâncias ordinárias somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada, em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se divisa , na espécie, consideradas as premissas fáticas constantes do acórdão regional. Pertinência da Súmula nº 126 do TST, que não admite o reexame de fatos e provas na via recursal de natureza extraordinária. Recurso de revista de que não se conhece" (ARR-101900-85.2005.5.05.0131, 1ª Turma, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, DEJT 02/10/2020).
(...)
2. MÉRITO
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO. "QUANTUM" INDENIZATÓRIO ARBITRADO. MAJORAÇÃO
O Tribunal Regional denegou seguimento ao recurso de revista interposto pelo Ministério Público do Trabalho da 5ª Região, nos seguintes termos:
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO / INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO / INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL / VALOR ARBITRADO.
Alegação(ões): - violação do(s) Código Civil, artigo 944.
- divergência jurisprudencial.
- Manual de aplicação da NR - 17 Insurge-se o Ministério Público contra o valor arbitrado a título de danos morais coletivos. Aduz que não foram observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como a extensão do dano, para a fixação do quantum indenizatório.
Consta da ementa e trechos do acórdão: MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS O Ministério Público tem legitimidade para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
(...) VALOR DA INDENIZAÇÃO Tanto a Reclamada, quanto o MPT, apelam da decisão que fixou a indenização por danos coletivos em R$1.000.000,00 (hum milhão de reais).
A Demandada pede a redução deste valor. Já o MPT pede a sua majoração.
In casu, considerando as constantes violações aos direitos coletivos, sua natureza (meio ambiente sadio e integridade fisica dos trabalhadores) e as condições econômicas da Reclamada, de um lado, e do outro, a conduta da Reclamada em buscar, ao longo do processo, adotar procedimentos tendentes à observância das regras de proteção, observando, porém, o princípio da razoabilidade e diante das funções punitivas e pedagógicas desta prestação, parece-nos que o valor fixado pelo Juízo a quo mereça ser ampliado. Isso porque o valor fixado (cerca de 430 mil dólares hoje) é insignificativo em face da lesão causada à coletividade dos empregados e demais trabalhadores prestadores de serviços para a Demandada. Tal valor, portanto, não repara, integralmente, os danos causados, nem sequer cumpre eventual função de punir, nem de servir de cunho educativo.
Outrossim, o valor pedido na inicial, de cinqüenta milhões de reais, revela-se desproporcional à lesão constatada, considerando que elas se estancaram em parte ao longo do processo.
Em sendo assim, parece-nos mais razoável elevar essa indenização para o valor de R$4.000.000,00 (quatro milhões de reais), com época própria na data da conclusão do julgamento deste recurso.
(...) VOTO DIVERGENTE DA JUÍZA HELIANA NEVES.
Inicialmente, provejo o recurso da reclamada para reduzir o valor da indenização por danos morais coletivos para a quantia de R$. 300.000,00. Outrossim, entendo que não carece de modificação a sentença que destinou a indenização pelo dano moral coletivo ao FAT, sugerindo, entretanto, que o valor respectivo seja encaminhado em favor do Fundo de Promoção do Trabalho Decente - FUNTRAD, vinculado à Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte - SETRE - do Estado da Bahia.
Da análise do julgado recorrido, observa-se que o entendimento foi adotado com lastro no livre convencimento motivado, nos termos do art. 131 do CPC.
A análise das questões discutidas neste tópico enseja a revisão de matéria fática e probatória, inviável em sede extraordinária, nos termos da Súmula n° 126 do TST.
Destaque-se que arestos provenientes de Turma do TST, deste Tribunal ou de órgão não elencado no art. 896, "a", da CLT, são inservíveis ao confronto de teses - Orientação Jurisprudencial 111, da SDI-I, do TST.
Desatendidos, nessas circunstâncias, os requisitos de admissibilidade do recurso, encontra-se desaparelhada a revista, nos termos do art.
896 da CLT.
CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista.
Nas razões do agravo de instrumento, às fls. 3.788-3.796, o Ministério Público do Trabalho da 5ª Região reitera que o valor arbitrado a título de indenização por danos morais coletivos se mostrou irrisório, revelando-se desproporcional ante a capacidade econômica da reclamada e o dano causado. Argumenta que fora reconhecido que a empresa ré descumpriu quinze obrigações relativas ao meio ambiente do trabalho. Pretende a majoração do valor da indenização para R$ 50.000.000, 00 (cinquenta milhões de reais). Indica ofensa ao art. 944 do Código Civil.
Razão não lhe assiste.
No tocante ao valor da reparação por dano moral coletivo, o Tribunal Regional adotou o seguinte entendimento, às fls. 3.588-3.589, verbis:
VALOR DA INDENIZAÇÃO
Tanto a Reclamada, quanto o MPT, apelam da decisão que fixou a indenização por danos coletivos em R$1.000.000,00 (hum milhão de reais).
A Demandada pede a redução deste valor. Já o MPT pede a sua majoração.
In casu, considerando as constantes violações aos direitos coletivos, sua natureza (meio ambiente sadio e integridade física dos trabalhadores) e as condições econômicas da Reclamada, de um lado, e do outro, a conduta da Reclamada em buscar, ao longo do processo, adotar procedimentos tendentes à observância das regras de proteção, observando, porém, o princípio da razoabilidade e diante das funções punitivas e pedagógicas desta prestação, parece-nos que o valor fixado pelo Juízo a quo mereça ser ampliado. Isso porque o valor fixado (cerca de 430 mil dólares hoje) é insignificativo em face da lesão causada à coletividade dos empregados e demais trabalhadores prestadores de serviços para a Demandada. Tal valor, portanto, não repara, integralmente, os danos causados, nem sequer cumpre eventual função de punir, nem de servir de cunho educativo.
Outrossim, o valor pedido na inicial, de cinqüenta milhões de reais, revela-se desproporcional à lesão constatada, considerando que elas se estancaram em parte ao longo do processo.
Em sendo assim, parece-nos mais razoável elevar essa indenização para o valor de R$4.000.000,00 (quatro milhões de reais), com época própria na data da conclusão do julgamento deste recurso.
Pelo provimento parcial do recurso do MPT e não provimento daquele interposto pela reclamada.
Conforme se observa, a Corte Regional majorou o quantum indenizatório de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) a título de dano moral coletivo, em Ação Civil Pública, em decorrência de "constantes violações aos direitos coletivos, sua natureza (meio ambiente sadio e integridade física dos trabalhadores)", por entender que o novo valor fixado mostra-se adequado à situação verificada, considerando, para tanto, as condições econômicas da ré, a conduta da empresa que, ao longo do processo, buscou adotar procedimentos tendentes à observância das regras de proteção do trabalho, o caráter punitivo e pedagógico da indenização, além da lesão causada à coletividade.
A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais deste Tribunal Superior, relativamente ao quantum indenizatório fixado pelas instâncias ordinárias, consolidou a orientação no sentido de que a revisão do valor da indenização somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada a título de reparação de dano moral, em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se verifica, na espécie, consideradas as premissas fáticas constantes do acórdão regional.
Nesse sentido, os seguintes precedentes:
(...)
Assim, não há como reconhecer a alegada ofensa ao art. 944 do Código Civil, incólume.
Constata-se, pois, que o agravante não expende nenhum argumento capaz de desconstituir a decisão agravada.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
Como regra a jurisprudência da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais não admite a revisão do valor fixado a título de danos morais, salvo em situações extremas, nas quais os valores sejam excessivamente módicos ou estratosféricos. Nesse sentido, precedentes da SbDI-I:
(...) DANOS MORAIS. INDENIZAC?A?O. VALOR. CRITE?RIOS PARA ARBITRAMENTO. NA?O CONFIGURAC?A?O DE DIVERGE?NCIA JURISPRUDENCIAL. SU?MULA No 296, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. A jurisprude?ncia desta Subsec?a?o firmou-se no sentido de que, salvo situac?o?es extremas, de valores excessivamente mo?dicos ou estratosfe?ricos, na?o cabe recurso de embargos destinado a rever o valor fixado a? indenizac?a?o por danos morais, em virtude da impossibilidade de identificac?a?o de elementos fa?ticos que permitam aferir a especificidade dos arestos colacionados. Isso porque a dina?mica pro?pria da vida, em que um segundo na?o e? igual a outro, faz com que cada episo?dio nela vivido tenha a sua pro?pria caracterizac?a?o; cada momento, ainda que singelo, e? u?nico em si mesmo e irrepeti?vel; na?o ha? um instante igual a outro, ainda que, objetivamente, possam parecer iguais. Por outro lado, as pessoas sa?o diferentes. Cada uma, em sua singularidade, possui caracteri?sticas que a diferenciam dos demais seres humanos, embora sejam ide?nticos os atributos que compo?em a sua personalidade e que gozam de protec?a?o constitucional, na forma prevista no artigo 1o, IV, da Constituic?a?o Federal. Por tudo isso, sera? impossi?vel identificar aco?rda?os que permitam aferir a especificidade a que alude a interpretac?a?o consolidada na Su?mula n° 296, I, do TST. Por outro lado, na?o se pode perder de vista a func?a?o preci?pua desta Subsec?a?o, que e? a uniformizac?a?o de teses juri?dicas diversas em mate?ria trabalhista, o que na?o se verifica nessas hipo?teses. Correta a aplicac?a?o do referido o?bice, mante?m-se o decidido. Agravo interno conhecido e na?o provido. (Ag-E-RR - 1366-25.2011.5.15.0106, Ac. Subsec?a?o I Especializada em Dissi?dios Individuais, Relator Ministro Cla?udio Mascarenhas Branda?o, in DEJT 16.11.2018)
AGRAVO INTERPOSTO CONTRA DECISA?O DE PRESIDENTE DE TURMA DENEGATO?RIA DE SEGUIMENTO DE EMBARGOS REGIDOS PELA LEI No 13.015/2014. INDENIZAC?A?O POR DANOS MORAIS. DOENC?A PROFISSIONAL. SILICOSE. QUANTUM INDENIZATO?RIO (R$50.000,00). PEDIDO DE REDUC?A?O. Trata-se de pedido de indenizac?a?o por danos morais decorrentes de doenc?a profissional denominada silicose, que foi adquirida na atividade de extrac?a?o de outro em mina subterra?nea e ceifou a vida do ex-empregado da reclamada, pai e marido dos autores (viu?va e cinco filhos). A Turma entendeu que o valor fixado nas insta?ncias ordina?rias de R$10.000,00 para cada autor na?o observou os crite?rios da proporcionalidade, raza?o pela qual majorou o quantum indenizato?rio para R$50.000,00 para cada reclamante. Inicialmente, cumpre esclarecer que o conhecimento do recurso de embargos por contrariedade a? Su?mula no 126 do TST e?, em princi?pio, incompati?vel com a nova func?a?o exclusivamente uniformizadora desta SbDI-1, prevista no artigo 894 da CLT. Ressalta-se, por oportuno, que, da forma como apreciada a questa?o pela Turma, na?o se demonstra inobserva?ncia a? Su?mula no 126 do TST, pois foram considerados fatos incontroversos nos autos para concluir o julgamento. Nesta Subsec?a?o, prevalece o entendimento de que na?o e? possi?vel, em tese, conhecer de recurso de embargos por diverge?ncia jurisprudencial quanto a pedido de redimensionamento de indenizac?a?o por danos morais, diante da dificuldade de haver dois fatos objetivamente iguais, envolvendo pessoas distintas, cada uma com suas particularidades. Essa tese foi reafirmada, por maioria de votos, no julgamento do Processo no E-RR - 1564-41.2012.5.09.0673, na SbDI-1, em 16/11/2017, aco?rda?o publicado no DEJT de 2/2/2018, da lavra deste Relator, ocasia?o em que ficou vencido quanto a? possibilidade de conhecimento do recurso de embargos para analisar pedido de redimensionamento de indenizac?a?o por danos morais e refluiu na sua proposta original para adotar o entendimento da maioria dos membros da SbDI-1 para na?o conhecer dos embargos, em face da inespecificidade dos arestos paradigmas. Assim, permanece majorita?rio o entendimento de que, quando o valor atribui?do na?o for teratolo?gico, deve esta insta?ncia extraordina?ria abster-se de rever o sopesamento fa?tico para arbitrar o valor da indenizac?a?o proporcional ao dano moral causado pelo empregador. Desse modo, neste caso, e? despicienda a ana?lise dos julgados paradigmas, diante da impossibilidade de ser demonstrada a necessa?ria identidade fa?tica entre eles e a hipo?tese dos autos, nos termos em que exige a Su?mula no 296, item I, desta Corte. Agravo desprovido." (AgR-E-ED-RR - 409240-84.2005.5.03.0091, Ac. Subsec?a?o I Especializada em Dissi?dios Individuais, Relator Ministro Jose? Roberto Freire Pimenta, in DEJT 16.11.2018)
No caso dos autos, a fixação do quantum indenizatório por empresa com capital social bilionário é incontroversa.
Ademais, importa ressaltar que as empresas que se lançam no mercado, assumindo o ônus financeiro de cumprir a legislação trabalhista, perdem competitividade em relação àquelas que reduzem seus custos de produção à custa dos direitos mínimos assegurados aos empregados.
Diante desse quadro, comprovada a deliberada e reiterada desobediência do empregador à legislação trabalhista, em afronta à Constituição da República, que tem por objetivo fundamental construir sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da CF), tratando-se de lesão que viola bens jurídicos indiscutivelmente caros a toda a sociedade, surge o dever de indenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP).
Para verificar se o valor foi ínfimo ou exorbitante é preciso levar em consideração as peculiaridades do caso concreto, conforme método bifásico adotado pelo STJ.
Há jurisprudência em casos com identidade morfofuncional fixando o quantum indenizatório no patamar de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais). Essa é a regra geral.
No caso concreto, restou consignado no acórdão regional que o montante de irregularidades observadas pelo setor pericial da Regional, totalizaram-se o expressivo número de 8.871 (oito mil, oitocentas e setenta e uma) ocorrências, o que demonstra a recalcitrância e o descumprimento reiterado das obrigações trabalhistas, razão pela qual a redução do quantum indenizatório no patamar de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), nestes autos, se mostra ínfimo.
Nesse contexto, tendo em vista o critério bifásico adotado pelo STJ, além da concepção aristotélica de justiça corretiva, que leva em consideração a correlatividade e a personalidade, por entender que a redução dos danos morais não foi equitativa, bem como, tendo em vista as particularidades já mencionadas do caso concreto, peço vênia para divergir.
Diante do exposto, conheço do recurso de revista da parte reclamante para fins de majoração dos danos morais fixados reduzido pelo Tribunal Regional, para majorá-los no importe de quatro milhões de reais, por entender que houve violação aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, bem como da reparação integral, além dos seguintes dispositivos, em interpretação sistemática: arts. 186, 927 e 944 do Código Civil 2002 e 5°, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República (conforme apontado à fl. 19.114 do recurso de revista do Ministério Público do Trabalho).
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, após o voto-vista do Ex.mo Ministro Alexandre Agra Belmonte:
I - por unanimidade, com acréscimos de fundamentação, NEGAR PROVIMENTO ao agravo de instrumento da ré;
II - por maioria, CONHECER do recurso de revista do Ministério Público do Trabalho por violação ao princípio da proporcionalidade, da razoabilidade, bem como da reparação integral, além dos seguintes dispositivos, em interpretação sistemática: arts. 186, 927, 944 do Código Civil 2002 e 5°, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República, no tema "DANOS MORAIS COLETIVOS. INDENIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRO. VALOR ARBITRADO. DO PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. DOS PARÂMETROS PARA FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA (PUNITIVE DAMAGES). JUSTIÇA CORRETIVA (CORRELATIVIDADE E PERSONALIDADE)/CRITÉRIO COMPENSATÓRIO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. CRITÉRIO BIFÁSICO DE MENSURAÇÃO DOS DANOS MORAIS", e, no mérito, dar-lhe provimento para majorar os danos morais e fixá-los em quatro milhões de reais, nos termos da fundamentação. Vencida a Ex.ma Desembargadora convocada Ana Paola Machado Diniz, Relatora.
Brasília, 21 de agosto de 2024.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
EVANDRO VALADÃO
Ministro Relator
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