Processo nº 1002282-11.2024.8.11.0021
ID: 294758381
Tribunal: TJMT
Órgão: 2ª VARA CÍVEL DE ÁGUA BOA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 1002282-11.2024.8.11.0021
Data de Disponibilização:
10/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MONICA LARISSE ALVES ARAUJO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CÍVEL DE ÁGUA BOA SENTENÇA Processo: 1002282-11.2024.8.11.0021. REQUERENTE: LUZIA SOARES DA SILVA SOUZA REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CÍVEL DE ÁGUA BOA SENTENÇA Processo: 1002282-11.2024.8.11.0021. REQUERENTE: LUZIA SOARES DA SILVA SOUZA REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Vistos, etc. I – RELATÓRIO Trata-se de Ação para Concessão de Aposentadoria Rural por Idade ajuizada por LUZIA SOARES DA SILVA SOUZA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, ambos devidamente qualificados nos autos. A parte requerente, em sua petição inicial (ID 160266169), narrou ser trabalhadora rural desde sua mocidade, residindo e laborando no Projeto de Assentamento Santa Maria, Lote n.º 94, Sítio Esplanada, zona rural do município de Água Boa-MT, desde o ano de 1990, acompanhado da sua irmã, Luzeni Soares de Souza, que é aposentada por invalidez na condição de segurada especial. Afirmou ter nascido em 29 de maio de 1964, preenchendo, assim, o requisito etário para a aposentadoria rural por idade. Alegou que seu Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) não apresenta nenhum registro de vínculo urbano, e que, embora tenha tido um breve enlace matrimonial, permaneceu longo período separada de fato e, posteriormente, divorciou-se, mantendo-se na exploração do lote rural com sua irmã e familiares. A parte autora informou que seu primeiro pedido administrativo protocolado em 07/06/2019, foi indeferido sob a alegação de falta de comprovação de atividade rural em número de meses idênticos à carência do benefício, e que já havia protocolado outros quatro requerimentos administrativos. Diante do indeferimento administrativo, pleiteou a concessão da aposentadoria rural por idade, em valor não inferior a um salário mínimo mensal, com o pagamento dos valores devidos desde a data do primeiro requerimento administrativo (07/06/2019), acrescidos de juros e correção monetária. Adicionalmente, requereu a concessão de tutela de urgência para o pagamento imediato do benefício, bem como a condenação da autarquia ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. A justiça gratuita foi concedida à requerente por meio da decisão de ID 160513973, que também recebeu a petição inicial e determinou a citação do INSS para, querendo, apresentar contestação e manifestar interesse na autocomposição. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS apresentou contestação (ID 161582138), acompanhada de extrato de dossiê previdenciário (ID 161582139). Em sua defesa, o INSS arguiu preliminar de ausência de início de prova material, sustentando que a parte autora não teria juntado documentos exigidos pela legislação previdenciária. Afirmou que a prova exclusivamente testemunhal não seria suficiente, e que documentos em nome de integrante do núcleo familiar que exerça trabalho incompatível com o labor rurícola, declaração de sindicato rural após a MP n.º 871/2019, e autodeclaração rural sem ratificação administrativa não poderiam ser considerados como início de prova material. O INSS também destacou que o marido da requerente possuía vínculos urbanos, o que, em tese, descaracterizaria a condição de segurada especial. No mérito, defendeu a improcedência do pedido, alegando a não comprovação do cumprimento da carência de 180 meses exigida pela Lei n.º 8.213/91. Requereu, ainda, a observância da prescrição quinquenal, a intimação da parte autora para firmar autodeclaração, a renúncia a valores excedentes ao teto dos Juizados Especiais Federais, a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula n.º 111 do STJ e a isenção de custas. O INSS manifestou desinteresse na audiência de conciliação. A parte autora apresentou impugnação à contestação (ID 169133721), reiterando os termos da exordial e refutando as alegações do INSS. Afirmou que os documentos anexados são contemporâneos e constituem início de prova material suficiente, que seria complementado pela prova testemunhal. Arrolou as testemunhas Joana Darc Paixão, Eliane Souza de Oliveira e Rute Goulart Mariano. Por meio da decisão de ID 173615877, foi deferida a produção de provas orais, com a designação de audiência de instrução por videoconferência para o dia 03 de fevereiro de 2025. A requerente manifestou ciência da decisão e informou que o rol de testemunhas já havia sido apresentado (ID 175114903). A audiência de instrução e julgamento foi realizada em 03 de fevereiro de 2025, conforme termo de audiência (ID 182653147) e relatório de mídias (ID 182637422). Na ocasião, verificou-se a ausência do Procurador Federal, e a advogada da parte requerente desistiu da oitiva da testemunha Eliane Souza de Oliveira. Foram ouvidas as testemunhas Joana Darc Paixão e Rute Goulart Mariano, cujos depoimentos foram gravados em mídia. Encerrada a instrução processual, a advogada da parte requerente manifestou-se pela apresentação de alegações finais remissivas, e o Juízo declarou prejudicado o oferecimento de memoriais pelo polo passivo em razão de sua ausência. Os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO Não havendo preliminares ou questões processuais pendentes de análise, passo ao julgamento do mérito. Pois bem. No tocante ao benefício de aposentadoria rural, o art. 48, § 1º, da Lei n. 8.213/91 estabelece: Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. § 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. Por sua vez, o art. 39, inciso I, da Lei n. 8.213/91, garante ao trabalhador rural (segurado especial) a concessão de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio doença, auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário-mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondente à carência do benefício requerido. Assim, a concessão de aposentadoria por idade ao trabalhador rural tido como segurado especial pressupõe o atendimento dos seguintes requisitos: 1. idade mínima de 55 (mulheres) e 60 (homens) anos; 2. qualidade de segurado; e 3. comprovação do efetivo exercício da atividade rural – individualmente ou em regime de economia familiar – ainda que de forma descontinuada, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício ou ao implemento da idade, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência. Destarte, entende-se como imediatamente anterior a atividade rural cessada até 36 (trinta e seis) meses antes da data de cumprimento do requisito etário. Sob esse viés: Entende-se por "imediatamente anterior" a atividade rural cessada até 36 meses antes da data de cumprimento do requisito etário, por analogia ao maior período de graça previsto no art. 15 da Lei nº 8.213/91 (TRF-3 - RECURSO INOMINADO CÍVEL: 50096322220234036310 SP, Relator.: Juiz Federal CAIO MOYSES DE LIMA, Data de Julgamento: 23/09/2024, 10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, Data de Publicação: DJEN DATA: 27/09/2024) No que se refere a carência, sua comprovação independe do recolhimento de contribuições previdenciárias para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade. No entanto, faz-se necessário o efetivo exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento, nos meses de contribuição correspondentes à carência do benefício, representada pelo número mínimo de contribuições indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consoante se depreende dos arts. 24, 39, inciso I, e 143, todos da Lei n. 8.213/91. Ainda, nos termos do art. 55, § 5º, da Lei n. 8.213/91, o trabalho rural pode ser comprovado por meio de prova documental e ser complementada por prova testemunhal idônea. Nesse sentido, dispõe a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário. Diante do exposto, exige-se um início de prova material, a ser complementado pela prova oral, possibilitando um juízo de valor adequado sobre os fatos que se busca comprovar. Sobre o tema: É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. (TRF-4 - AC: 50192188620194049999, Relator.: ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Data de Julgamento: 17/02/2023, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA). Da idade mínima: No caso em tela, a requerente, LUZIA SOARES DA SILVA SOUZA, nasceu em 29 de maio de 1964. Na data do primeiro requerimento administrativo, em 07/06/2019 (ID 160266176), a autora já possuía 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, satisfazendo, portanto, o requisito etário previsto na legislação previdenciária para a mulher trabalhadora rural. Da atividade rural pelo período de carência exigido: O segundo requisito, e o ponto central da controvérsia, é a comprovação do período de carência. Para o segurado especial, o artigo 39, inciso I, da Lei n.º 8.213/91, dispõe que a aposentadoria por idade será devida ao segurado que comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício ou à data em que implementou todas as condições, por tempo igual ao número de meses de carência correspondente à tabela progressiva do artigo 142 da mesma lei. Para a requerente, que implementou a idade mínima em 2024, o período de carência exigido é de 180 (cento e oitenta) meses, ou seja, 15 (quinze) anos de atividade rural. Para a comprovação da atividade rural, para fins de aposentadoria por idade, como dito, se exige um início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal idônea, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo em casos de força maior ou caso fortuito, conforme o artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça. O rol de documentos aptos a configurar o início de prova material, previsto no artigo 106 da Lei nº 8.213/91, é meramente exemplificativo, admitindo-se outros documentos que, em conjunto com a prova oral, formem um juízo de convicção seguro sobre o labor rural. Analisando o conjunto probatório acostado aos autos, verifica-se que o autor apresentou um robusto início de prova material, abrangendo um longo período de sua vida laboral. Dentre eles, destacam-se: - Certidão de Ocupação fornecida pelo INCRA, dando conta da ocupação de “agricultora”, da irmã LUZENI, ocupante o lote nº 049, no Projeto de Assentamento “SANTA MARIA”, no município de Água Boa-MT, desde 22/10/1988 (ID 160266177, pg. 1). - Notas fiscais de aquisição de produtos agrícolas em nome da irmã LUZENI, de 12/12/2013 e 06/06/2018, 24/03/2018, 21/11/2018, 23/04/2018, 03/11/2016, 29/05/2013, 05/10/2012, 12/12/2010, 02/03/2009, 15/12/1998, 04/12/2008, 10/10/2003 (ID 160266177, pg. 2, 23/35 e 37). - Atestados de vacinação contra brucelose em nome da irmã LUZENI, de 04/12/2012, 01/06/2013, 18/12/2007 (ID 160266177, pg. 3 e 36). - Ficha de inscrição e controle do Sindicato dos Trabalhadores Rurais em nome da irmã LUZENI com admissão em 09/09/1990 (ID 160266177, pg. 5/8). - Certidão do INCRA constatando que a irmã LUZENI é assentada no PA SANTA MARIA, localizada no município de Água Boa-MT, onde desenvolve atividades rurais em regime de economia familiar, no lote/gleba/parcela rural nº 0049, que lhe foi destinada desde 30/05/1997 (ID 160266177, pg. 16). - Nota fiscal de produtos rurais em nome da requerente de 24/08/2017, 21/11/2018, 06/06/2019 (ID 160266177, pg. 19/22). - O contrato de comodato firmado entre a autora a e irmã Luzeni em 09/09/1990 (ID 160266179), que, embora não registrado, acompanhado das demais provas reforçam a ocupação da terra para fins rurais. - O extrato do CNIS da requerente (ID 160266177, pg. 44), que não apresenta registros de vínculos urbanos em seu nome, corroborando a alegação de dedicação exclusiva à atividade rural. As provas documentais apresentadas pela requerente, embora não cubram todo o período de forma exaustiva, são suficientes para configurar o início de prova material exigido. A alegação de que a autora reside e trabalha com sua irmã, que é segurada especial, reforça a caracterização do regime de economia familiar, especialmente considerando a informação de que a autora estava separada de fato (circunstância ratificada pela prova oral) e, posteriormente, divorciada de seu marido com vínculos urbanos. A documentação anexada, como visto, dentre elas, a Certidão de Ocupação do INCRA, em nome da irmã, somado ao contrato de comodato firmado, as notas fiscais de produtos agrícolas e o registro no Sindicato dos Trabalhadores Rurais em nome da irmã, somados à ausência de vínculos urbanos no CNIS da autora, demonstram uma ligação consistente com o meio rural. No tópico, relevante notar que embora a maioria dos documentos anexados estejam em nome da irmã da requerente, Sra LUZENI SOARES DE SOUZA, com a qual a requerente possui contrato de comodato rural no Assentamento Santa Maria desde 09/09/1990 (ID 160266179), a jurisprudência, nesse sentido, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido, consolidou o entendimento de que o rol de documentos do art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo e que documentos em nome de membros do grupo familiar são admitidos como início de prova material, conforme entendimento jurisprudencial consolidado. Vejamos: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUTORA QUER RECONHECER LABOR RURAL ANTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. DOCUMENTOS EM NOME DO ESPOSO ESTENDEM A CONDIÇÃO DE LAVRADOR À AUTORA . PROVA ORAL INCONTROVERSA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA PARTE RÉ DESPROVIDO. (TRF-3 - RecInoCiv: 00076216620184036315 SP, Relator.: Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA, Data de Julgamento: 01/07/2022, 15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, Data de Publicação: DJEN DATA: 06/07/2022) (grifei) Nestes termos, a própria Instrução Normativa nº 128/2022, em seu art. 116, § 3º, I, estabelece que "todo e qualquer instrumento ratificador vale para qualquer membro do grupo familiar, devendo o titular do documento possuir condição de segurado especial no período pretendido". O extrato de dossiê previdenciário (ID 160266178, p. 83) confirma que a irmã da autora, Luzeni Soares de Souza, é aposentada por invalidez na condição de segurada especial rural, o que fortalece a alegação de que a requerente integrava um grupo familiar rural. A prova testemunhal, colhida em audiência de instrução e julgamento (ID 182653147), foi fundamental para corroborar o início de prova material. As testemunhas Joana Darc Paixão e Rute Goulart Mariano, ouvidas sob compromisso, confirmaram a dedicação da requerente à atividade rural em regime de economia familiar no Projeto de Assentamento Santa Maria, desde o período alegado na inicial. Os depoimentos foram uníssonos e coerentes, preenchendo as lacunas temporais da prova documental e atestando a continuidade do labor rural da autora. Vejamos: A testemunha Rute Goulart relatou que conhece a autora desde 1991 do PA Santa Maria, onde ela residia, em uma casinha, próxima a irmã. No local a autora mora sozinha e planta mandioca, mexe com horta, tira leite, faz queijo, para sobreviver. Não tem funcionários ou maquinários, trabalhando com enxada e foice. A testemunha Joana Darc declarou que conhece a requerente desde 1995 e ela já morava no PA Santa Maria há uns 5 anos. A autora tem um pedacinho de terra que a irmã cedeu para ela seguir a vida e trabalhar e no local ajuda a tirar leite, faz queijo e planta mandioca, faz farinha, polvilho, vende frango. Não tem empregados ou maquinários. A autora é divorciada. No local a autora mora sozinha em uma casa e a irmã mora em outra. A requerente tem filhos, que moram em Água Boa. Considerando o conjunto probatório, tanto documental quanto testemunhal, restou devidamente comprovado que a requerente exerceu atividade rural em regime de economia familiar por período superior aos 180 meses de carência exigidos pela legislação. A atividade rural da autora, iniciada em 1990, estende-se até a data do requerimento administrativo (04/06/2019) e, até a data da implementação do requisito etário (29/05/2024), totalizando mais de 30 anos de labor rural, o que supera em muito o período de carência necessário. Das alegações do INSS em contestação: Da declaração do sindicato rural: No tocante as alegações do INSS em contestação (ID 161582138) quanto ausência de início de prova material pela falta de valor probante da declaração do sindicato rural após a MP n.º 871/2019, e a necessidade de ratificação da autodeclaração, não se sustentam. No tópico, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado no sentido de que a declaração do sindicato de trabalhadores rurais (ou mesmo a carteira de filiação), ainda que não homologada pelo INSS, afigura-se como documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, prestando-se a prova testemunhal para ampliar sua força probante. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE AGRÍCOLA. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. Não se configura ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal de origem aprecia integralmente a controvérsia, apontando as razões de seu convencimento, mesmo que em sentido contrário ao postulado, circunstância que não se confunde com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. Na esteira do REsp 1.348.633/SP, sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, a Primeira Seção reafirmou a orientação de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço rural mediante a apresentação de início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. 3. "A jurisprudência deste Superior Tribunal admite como início de prova material, para fins de comprovação de atividade rural, certidões de casamento e nascimento dos filhos, nas quais conste a qualificação como lavrador e, ainda, contrato de parceria agrícola em nome do segurado, desde que o exercício da atividade rural seja corroborado por idônea e robusta prova testemunhal" (AgInt no AREsp 1.939.810/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 11/4/2022, DJe de 19/4/2022). 4. "A título de início de prova material, a declaração do sindicato de trabalhadores rurais, ou mesmo a carteira de filiação, erige-se em documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, prestando-se a prova testemunhal para complementar e ampliar a força probante do referido documento" (AgRg no AREsp 577.360/MS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 7/6/2016, D Je de 22/6/2016). 5. Hipótese em que o acórdão recorrido concluiu consignou que a prova testemunhal não havia ampliando a eficácia da documentação apresentada, circunstância que esbarra no óbice da Súmula 7 do STJ. 6. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 2.487.697/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 24/2/2025, DJEN de 28/2/2025.) (grifei) Da autodeclaração: Quanto a autodeclaração se verifica que a exigência para que a parte firme autodeclaração rural não se aplica na esfera judicial, mas somente no âmbito administrativo (porquanto trata-se de procedimento da entidade autárquica no âmbito administrativo), sendo que para a via judicial exige-se, como já dito, o prévio requerimento administrativo. Juntada a autodeclaração pela parte na via judicial e, ausente ratificação administrativa, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material, o que, como visto, foi plenamente atendido pela requerente, diante da vasta documentação apresentada. Dos vínculos urbanos do cônjuge: No que diz respeito a alegação do INSS de que o marido da requerente possuía vínculos urbanos, o que, em tese, descaracterizaria a condição de segurada especial, não merece acolhida. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. No caso, o casamento da autora e do cônjuge JOSÉ DE PAULA E SOUZA ocorreu em 12/01/2005 (ID 160266177, pg. 13/14). Embora hajam vínculos urbanos do cônjuge apresentados no CNIS (ID 160266178, pg. 51/52), não há provas das remunerações percebidas a demonstrar a capacidade de subsistência familiar desvinculada da atividade rural e a repercussão importante destes rendimentos no grupo, de modo a tornar o trabalho rural dispensável ou meramente complementar. No presente caso, como visto, não foram anexadas provas quanto aos rendimentos urbanos do cônjuge, a fim de identificar se eram expressivos a indicar que a subsistência do núcleo familiar não dependia exclusivamente ou predominantemente da atividade rural. Ademais, a petição inicial esclarece que a autora teve um enlace matrimonial por curto período, estando separada de fato, residindo desde então no PA Santa Maria com sua irmã e familiares. Embora não haja uma informação específica quanto ao prazo de duração do matrimônio, já que não foi anexada a averbação do divórcio e as testemunhas não referiram, exatamente, qual período o desenlace ocorreu, o fato é que a prova oral é no sentido de que a autora residia sozinha, desde, aproximadamente, o ano de 1990, no PA SANTA MARIA, trabalhando em regime de economia familiar em uma casa cedida pela irmã e que estaria divorciada. Dessa forma, entendo suficientemente comprovado nos autos a qualidade de segurada especial da autora, sendo a procedência do pedido medida de rigor. Da Data de Início do Benefício (DIB). Uma vez reconhecido o direito ao benefício, a Data de Início do Benefício (DIB) deve ser fixada na data do primeiro requerimento administrativo, que, conforme comprovado nos autos (ID 160266176 e ID 160266178), ocorreu em 07 de junho de 2019 (NB 192.908.214-0) (ID 160266178, pg. 1). Naquela data, a autora já contava com 55 anos de idade. Assim, o benefício é devido desde a data do requerimento administrativo, uma vez que os requisitos para a concessão foram preenchidos. III – DISPOSITIVO Diante de todo o exposto e com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial para CONDENAR o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS a conceder à requerente LUZIA SOARES DA SILVA SOUZA o benefício de APOSENTADORIA RURAL POR IDADE, no valor de um salário mínimo mensal, com Data de Início do Benefício (DIB) fixada em 07 de junho de 2019, data do primeiro requerimento administrativo (NB 192.908.214-0), devendo o INSS pagar as parcelas vencidas desde então. Consigna-se, desde já, que poderão ser abatidas eventuais quantias pagas administrativamente pela Autarquia ré de valores recebidos por meio de benefícios inacumuláveis com o presente benefício reconhecido por meio da presente sentença. No cálculo dos valores pretéritos devidos incidem juros de mora da caderneta de poupança, a contar da citação, nos termos do art. 1º-F, da Lei nº 9.494/1997, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009 e correção monetária, desde o vencimento de cada parcela, pelo IPCA-E (Tema, 810 STF e Tema 905, STJ) até o dia 9 de dezembro de 2021. Após a referida data, incidir-se-á, única e exclusivamente, a Taxa Selic, nos termos da EC 113/2021 para fins de atualizar os créditos mensais não adimplidos. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431, com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17. Tendo em vista a verossimilhança dada pelas próprias razões da sentença e o perigo da demora consistente no nítido caráter alimentar do benefício e a própria idade avançada da parte autora CONCEDO TUTELA ANTECIPADA para o fim específico de DETERMINAR ao INSS que implante o benefício ora concedido, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, independentemente do trânsito em julgado, juntando aos autos o comprovante do cumprimento do referido comando. CONDENO a demandada ao pagamento de custas judiciais, devendo ser observado que referida autarquia federal não possui mais isenção legal de custas no Estado de Mato Grosso, consoante art. 3º, I, da Lei Estadual 7.603/2001, na redação dada pela Lei Estadual 11.077/2020, com vigência desde 14/04/2020. CONDENO a demandada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (valores devidos até a data desta sentença), nos termos da Súmula 111, do STJ e artigo 85, § 2º, do CPC. Por não exceder a condenação o valor de 1.000 (mil) salários-mínimos, DEIXO de determinar a remessa à instância superior, nos termos do artigo 496, § 3.º, inciso I, do CPC. Havendo recurso: Na hipótese de interposição do recurso de apelação, certifique-se acerca da tempestividade e, em seguida, intime-se a parte recorrida para, no prazo 15 (quinze) dias, apresentar suas contrarrazões de apelação, na forma do artigo 1.010, §1º do CPC. Após, com ou sem contrarrazões recursais, voltem para análise do recurso. Havendo pedido de cumprimento de sentença: a) Intime-se o devedor para pagamento no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa de 10% sobre o valor da condenação. No mandado deverá, ainda, constar a faculdade de, querendo, o executado impugnar o cumprimento de sentença, nos termos do art. 535, do CPC/15; b) Transcorrido o prazo para pagamento voluntário, intime-se a parte exequente para que apresente, no prazo de 05 (cinco) dias, memória atualizada e discriminada do débito, incluídas as sanções constantes do art. 523, §1º, do CPC; c) Apresentada impugnação, intime-se a parte contrária para manifestação em 15 dias; após, conclusos para decisão. e arquive-se com as baixas e cautelas de estilo. Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se com as baixas e cautelas de estilo. Publique-se. Registre-se. Cumpra-se, providenciando e expedindo o necessário, servindo a presente decisão como mandado/ofício/requisição. Às providências. Água Boa-MT, data da assinatura eletrônica. LUÍS OTÁVIO TONELLO DOS SANTOS Juiz de Direito Substituto
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