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Guilherme Alfredo Silveira Santos x Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A.

ID: 261501358

Tribunal: TJMT Órgão: 2º JUIZADO ESPECIAL DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1002321-31.2025.8.11.0002

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

GUILHERME ALFREDO SILVEIRA SANTOS

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença

Advogados:

FLAVIO IGEL

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ADRIANO DOS SANTOS COSTA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

HUDYANE MARQUES DE OLIVEIRA COSTA

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SENTENÇA Processo: 1002321-31.2025.8.11.0002 RECLAMANTE: GUILHERME ALFREDO SILVEIRA SANTOS RECLAMADA: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos, 1. SÍNTESE DOS FATOS Relatou o reclamante que, em 05/… SENTENÇA Processo: 1002321-31.2025.8.11.0002 RECLAMANTE: GUILHERME ALFREDO SILVEIRA SANTOS RECLAMADA: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos, 1. SÍNTESE DOS FATOS Relatou o reclamante que, em 05/2024, se programou para realizar uma viagem em família, bem como adquiriu passagens aéreas da reclamada. Alegou que partiria de Lisboa (Portugal) na data de 12/12/2024 às 13h00, bem como faria uma conexão em Campinas/SP às 20h25 e chegaria em Cuiabá/MT às 00h40 do dia 13/12/2024. Destacou que, em 11/12/2024, ao acessar o aplicativo da companhia para realizar o check-in, constatou que os seus voos haviam sido alterados unilateralmente pela reclamada, tendo ocorrido a antecipação da partida para às 10h00 e a chegada ao destino passou a ser representada para às 00h55 (13/12/2024). O reclamante aduziu que o 1º trecho da viagem ocorreu normalmente, contudo o voo de conexão de Campinas/SP não decolou no horário previsto. Frisou que não lhe foi proporcionada nenhuma assistência material, bem como que devido ao atraso na partida do voo de conexão, chegou ao seu destino apenas às 02h59, ou seja, com uma diferença de 02h19 em relação ao horário previsto. Ressaltou que a sua viagem teve um tempo de acréscimo total de 06h04, o que entende demonstrar a falha na prestação dos serviços da reclamada. Nos pedidos, requereu a indenização por danos morais. Na contestação, a reclamada reconheceu ter ocorrido uma alteração do itinerário original, bem como informou que tal fato foi motivado por uma alteração na malha aérea, ocorrida em 01/08/2024. Destacou que o reclamante foi comunicado por meio do sistema de alerta da companhia com 03 meses de antecedência, ocasião em que o mesmo concordou com a alteração e, por consequência, a reserva foi mantida. Aduziu que, por questões operacionais, o voo AD 4340 (Campinas/SP x Cuiabá/MT) sofreu um atraso ínfimo de 01h04. Defendeu que não pode ser responsabilizada por um fortuito externo, bem como que cumpriu o contrato de transporte em sua integralidade e ainda, que inexistem danos morais indenizáveis. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos. Dispensado o relatório mais detalhado nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95. Passo a fundamentar e a decidir. 2. FUNDAMENTOS Das preliminares. - Da assistência judiciária gratuita. Com a devida vênia à explanação da reclamada, entendo que a mesma, por ora, deve ser rechaçada, afinal, nos termos do artigo 54 da Lei nº 9.099/95, “O acesso ao Juizado Especial independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas.”. Ante o exposto, rejeito a preliminar arguida. - Da necessidade de regularização do comprovante de residência. Malgrado os argumentos da reclamada, consigno que o comprovante de residência em nome do próprio postulante não consiste em um documento imprescindível para o ajuizamento de eventual reclamação cível, tanto é que, nos termos do artigo 319, II, do CPC, basta que a inicial indique, dentre outros dados pessoais, “o domicílio e a residência do autor e do réu”. Outrossim, tenho que contemplar a tese da reclamada não só iria caracterizar um excesso de formalismo, como também, iria ferir os princípios norteadores do Juizado Especial Cível (artigo 2º da Lei nº 9.099/95). Nesse sentido, segue destacada a jurisprudência da Turma Recursal Única de MT: “RECURSO INOMINADO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL - AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA EM NOME DA AUTORA - DISPENSABILIDADE - EXCESSO DE FORMALISMO - INÉPCIA NÃO CONFIGURADA - SENTENÇA DESCONSTITUÍDA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A determinação para apresentação de comprovante de residência em nome da autora revela formalismo excessivo, mormente porque os Juizados Especiais são regidos pelos princípios da informalidade e simplicidade, de modo que a ausência do documento não resulta em indeferimento da petição inicial. 2. Assim, afasta-se a inépcia da inicial declarada pelo juízo a quo. (...) 5. Recurso conhecido e provido. (TJ-MT 10200181020218110001 MT, Relator: VALDECI MORAES SIQUEIRA, Data de Julgamento: 01/10/2021, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 06/10/2021).”. (Destaquei). Desta forma, rejeito a preliminar em debate. - Da política comercial da Azul e da qualidade do serviço prestado. Considerando que a exposição da reclamada é irrelevante para o esclarecimento dos fatos que estão sendo debatidos, o juízo deixará de analisar a “preliminar” em questão. - Da aplicabilidade da legislação internacional em detrimento do Código do Consumidor. Apesar das ponderações da reclamada, entendo que as mesmas devem ser rechaçadas, haja vista que, nos termos da narrativa de ingresso, a suposta falha na prestação dos serviços está relacionada ao voo correspondente ao trecho doméstico (Campinas/SP x Cuiabá/MT). Por amor ao debate, ainda que os alegados problemas tivessem relação com o voo do trecho internacional, entendo que não haveria como contemplar a prevalência da Convenção de Montreal sobre o CDC. Isso porque, nos termos do posicionamento perfilhado pelo STJ, as regras estabelecidas em tratados internacionais, como é o caso da Convenção de Montreal, estão atreladas unicamente às questões relacionadas aos danos materiais, ou seja, tais disposições não se aplicam às discussões envolvendo reparação por danos morais e, portanto, não prevalecem sobre o Código do Consumidor. Nesse sentido: “CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM RAZÃO DE EXTRAVIO DE BAGAGEM EM TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. A jurisprudência desta Corte, acompanhando o entendimento do STF, afastou expressamente a aplicação da Convenção de Montreal ao dano moral, uma vez que não estaria regulado pelo acordo aludido, atraindo a aplicação da lei geral, no caso, o CDC. Precedente: AgInt no REsp n. 1.944.528/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/12/2022, DJe de 14/12/2022.2. No caso dos autos, a discussão cinge-se unicamente a compensação por dano moral. Assim, tendo em vista que o extravio da bagagem ocorreu em maio de 2017, e a ação respectiva foi ajuizada em janeiro de 2020, deve ser afastada a prescrição para compensar o dano moral decorrente, já que não ultrapassado o quinquênio entre a lesão e o ajuizamento da respectiva ação, a teor do previsto no art. 27 do CDC.3. Inaplicabilidade da Súmula n. 126/STF porquanto a questão constitucional foi devida impugnada em recurso extraordinário.Agravo interno improvido. (STJ - AgInt no AREsp: 2264755 SP 2022/0388648-8, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 04/12/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/12/2023).”. (Destaquei). Destarte, rejeito a preliminar em questão. - Da aplicabilidade do Código Brasileiro da Aeronáutica em detrimento do Código de Defesa do Consumidor. Malgrado as considerações da requerida, convém rememorar à mesma que o vínculo estabelecido entre os litigantes se caracteriza como uma relação de consumo. Considerando que o cerne da lide está relacionado à responsabilidade civil proveniente de uma possível falha na prestação de serviços por parte da empresa de transporte aéreo, tenho que o Código Brasileiro da Aeronáutica não prevalece sobre o Código do Consumidor, o que, inclusive, está em conformidade com o posicionamento jurisprudencial. Nesse sentido, segue a jurisprudência do TJMT: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATRASO SIGNIFICATIVO DE VOO. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. PREVALÊNCIA DO CDC EM RELAÇÃO AO CBA. PASSAGEIRA MENOR IMPÚBERE. REPARAÇÃO DEVIDA. VALOR MANTIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. O Código de Defesa do Consumidor prevalece em relação ao Código Brasileiro de Aeronáutica nos casos de responsabilidade civil decorrente de má prestação dos serviços pela Companhia Aérea. O atraso do voo e por readequação da malha viária, cumulado com a ausência de assistência no aeroporto configura falha no serviço, impondo à companhia aérea o dever de indenizar. Deve ser mantido o valor da reparação arbitrado com razoabilidade, proporcionalidade e em observância ao grau de culpa do ofensor, à extensão dos danos e à capacidade econômica das partes. (TJ-MT 10543192820198110041 MT, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 01/06/2022, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 02/06/2022).”. (Destaquei). Ante o exposto, rejeito a última matéria preliminar. Do julgamento antecipado. Compulsando os autos, verifico que não há necessidade de serem produzidas outras provas, razão pela qual o julgamento antecipado da lide, nos moldes do art. 355, I, do CPC é a medida adequada. Do Mérito. Insta assentar que o presente caso é regulado pelo Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que a parte autora é a destinatária final da prestação do serviço de transporte aéreo, enquanto a reclamada figura como fornecedora, enquadrando-se nos conceitos legais dos artigos 2º e 3º da Lei nº 8.078/90. Embora seja um direito básico inerente à pessoa do consumidor, convém esclarecer que a inversão do ônus da prova (artigo 6º, VIII, do CDC) não pode ser interpretada de forma absoluta, a ponto de eximir o reclamante da obrigação de fornecer ao juízo provas básicas acerca dos fatos constitutivos do direito perseguido (artigo 373, I, do CPC). Acerca do tema, destaco a jurisprudência do TJMT: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULABILIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS NECESSÁRIOS. EXTRATOS BANCÁRIOS. DOCUMENTOS DE FÁCIL ACESSO AO TITULAR DA CONTA. DESOBEDIÊNCIA À ORDEM JUDICIAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUE NÃO AFASTA DEVER DE PROVA MÍNIMA. RECURSO DESPROVIDO. 1- A juntada de documento a se aferir o mínimo dos elementos que evidenciem o direito da parte autora, qual seja o extrato de sua conta pessoal, é de fácil obtenção, e a desobediência do determinado convola no indeferimento da inicial. 2- “Em termos de provas, mesmo com a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, em face da hipossuficiência da parte, deve esta demonstrar, ainda que de forma mínima, que tem o direito pretendido. Suas alegações, baseadas no CDC, não gozam de presunção absoluta de veracidade.” (N.U 1013614-32.2020.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/08/2022, Publicado no DJE 30/08/2022). (TJ-MT 10196461920218110015 MT, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 11/10/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/10/2022).”. (Destaquei) Após promover a análise das manifestações e provas vinculadas ao caderno processual, tenho que o direito não milita em favor da pretensão de ingresso. Extrai-se da narrativa do reclamante que o mesmo adquiriu passagens aéreas da reclamada no mês 05/2024 e, na data de 11/12/2024, ou seja, às vésperas do embarque em Lisboa (Portugal), o qual estava programado para às 13h00 do dia 12/12/2024, foi surpreendido pela alteração/antecipação unilateral do seu voo. Segue colacionado o itinerário das passagens outrora adquiridas pelo reclamante, as quais discriminam tanto os horários originais quanto as alterações realizadas pela companhia aérea (Id. 181844477): Com a devida vênia à versão inaugural, entendo que a mesma não conserva verossimilhança, pois, nos termos do trecho acima colacionado, o qual foi capturado do aplicativo da companhia pelo próprio autor, a última atualização das informações sobre o itinerário pela reclamada ocorreu em 03/10, ou seja, com mais de 02 (dois) meses de antecedência. Dispõe o artigo 12 da Resolução nº 400/2016 da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) que: “Art. 12. As alterações realizadas de forma programada pelo transportador, em especial quanto ao horário e itinerário originalmente contratados, deverão ser informadas aos passageiros com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas.”. Concatenando o dispositivo supra ao caso em comento, tenho que, no tocante às alterações programadas pelo transportador, a reclamada cumpriu o seu mister, pois, cientificou antecipadamente o reclamante acerca das modificações dos horários dos voos contratados. Ademais, é de bom alvitre destacar que o reclamante não chegou a direcionar absolutamente nenhuma reclamação administrativa à companhia aérea, o que, por consequência, faz emergir a sua anuência tácita com as alterações mencionadas em linhas anteriores. Destarte, com respaldo nos referidos argumentos, entendo que o tempo de antecipação do voo, de forma diversa do que tentou fazer prevalecer o reclamante, não deve ser considerado para fins de reconhecer eventual falha por parte da companhia aérea. Já no que se refere ao atraso correspondente ao voo que haveria de percorrer o trecho “Campinas/SP x Cuiabá/MT” (AD 4340), verifico que o mesmo se revelou incontroverso, pois, independentemente das provas que instruíram a inicial (Id. 181844480), tal fato foi reconhecido pela própria reclamada em sede de contestação. Conquanto a requerida tenha justificado que o atraso foi motivado por questões operacionais, saliento que não há como deixar de reconhecer que houve uma falha na prestação dos seus serviços. Ressalto que eventuais problemas operacionais até podem ser considerados como casos fortuitos, contudo imperioso registrar que tal situação não é estranha às atividades típicas desenvolvidas pela reclamada, consistindo em um verdadeiro fortuito interno. Logo, por tratar de um fato intrínseco à prestação do serviço de transporte aéreo, entendo que as considerações insertas na contestação não podem ser utilizadas como pretexto para eximir a companhia ré de suas obrigações, ou seja, cumprir o contrato de transporte aéreo nos termos originalmente pactuados, consoante artigo 737 do Código Civil, in verbis: “Art. 737. O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior.”. (Destaquei). Acerca do tema, oportuno transcrever os ensinamentos do doutrinador Bruno Miragem (Miragem, Bruno. Curso de direito do consumidor – 6. Ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 614/615): “Todavia, refira-se, que no direito do consumidor, considerando que o regime de responsabilidade objetiva tem por fundamento o profissionalismo dos fornecedores e a existência do defeito, admite-se atualmente a distinção entre caso fortuito interno e caso fortuito externo, segundo os termos que já estabelecemos acima. Nesse sentido, de regra só é considerada excludente da responsabilidade do fornecedor o chamado caso fortuito externo, ou seja, quando o evento que dá causa ao dano é estranho à atividade típica, profissional, do fornecedor. Apenas nesta condição estará apta a promover o rompimento do nexo de causalidade, afastando totalmente a conduta do fornecedor como causadora do dano sofrido pelo consumidor. (...)”. (Destaquei). Oportuno registrar que, nos termos da tela colacionada ao corpo da contestação, em decorrência do atraso mencionado em linhas anteriores, o reclamante somente desembarcou na cidade de destino (Cuiabá/MT) às 02h59 (horário local), ou seja, com uma diferença superior a pouco mais de duas horas em relação ao horário de chegada previsto no bilhete original (00h55), corroborando a narrativa do consumidor. Pois bem, não obstante a inquestionável falha na prestação dos serviços da reclamada, bem como todo o aparente inconformismo externado pelo demandante, ainda assim o juízo entende que inexistem danos morais a serem indenizados. A meu ver, o período de atraso mencionado alhures, por ser inferior a 04 (quatro) horas, com o devido respeito, não detém o condão para ter ofendido qualquer direito inerente à personalidade do consumidor e reflete apenas um dissabor ínsito à própria vida em sociedade, o qual, apesar de indesejável, não causa abalo significativo na esfera íntima da vítima e, portanto, não respalda o almejado pedido indenizatório, sob pena de banalização do instituto. Igualmente, ressalto inexistirem nos autos provas mínimas de que, em decorrência do incontroverso atraso, o requerente teve de suportar algum prejuízo ou ainda, que restou configurado eventual desvio produtivo de sua parte, corroborando o entendimento acerca da improcedência dos almejados danos morais. Visando fortalecer todo o alegado, transcrevo a jurisprudência da Segunda Turma Recursal de MT: “RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. ATRASO DE VOO. ATRASO INFERIOR AO PERÍODO DE 4 (QUATRO) HORAS. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O atraso de voo em até 4 (quatro) horas, por si só, não é causa suficiente para ensejar a responsabilização objetiva por danos morais. 2. O contexto fático-probatório não evidencia situação além das raias do tolerável. 3. Sentença mantida por seus próprios fundamentos (art. 46, Lei n. 9.099/1995). 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 1036480-68.2023.8.11.0002, Relator: ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Data de Julgamento: 16/05/2024, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: 16/05/2024).”. (Destaquei). Portanto, considerando que o atraso debatido nos autos não foi expressivo e ainda, que não foram apresentadas provas mínimas acerca de qualquer prejuízo que tenha sido suportado pelo reclamante (artigo 373, I, do CPC), reitero que o pedido de dano moral deve ser rejeitado. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, rejeito as preliminares arguidas e, no tocante ao mérito, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão deduzida na petição inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Sem custas processuais e sem honorários advocatícios neste grau de jurisdição (art. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95). Decisão sujeita à homologação do Douto Juiz de Direito, conforme o art. 40 da Lei nº 9.099/95. Intimem-se. KLEBER CORREA DE ARRUDA Juiz Leigo Vistos, HOMOLOGO, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos, o Projeto de Sentença da lavra do Juiz Leigo deste Juizado Especial. Tudo cumprido, ARQUIVE-SE, com as cautelas de estilo e baixa no estoque. Intimem-se as partes da sentença. Várzea Grande/MT, data do sistema. (Assinado Digitalmente) HUGO JOSÉ FREITAS DA SILVA Juiz de Direito em Substituição Legal

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Processo nº 0800028-98.2022.8.15.0541

ID: 332667422

Tribunal: TJPB Órgão: Vara Única de Pocinhos Classe: DIVóRCIO LITIGIOSO Nº Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

EZILMA TEODOSIO

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

DIEGO ARAUJO SOUSA

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PODER JUDICIÁRIO DA PARAÍBA VARA ÚNICA DA COMARCA DE POCINHOS Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541 Classe: DIVÓRCIO LITIGIOSO (12541) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução] REQUERENTE: E. T. REQUERIDO… PODER JUDICIÁRIO DA PARAÍBA VARA ÚNICA DA COMARCA DE POCINHOS Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541 Classe: DIVÓRCIO LITIGIOSO (12541) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução] REQUERENTE: E. T. REQUERIDO: A. M. D. S. F. SENTENÇA Vistos, etc. E. T. ajuizou a presente “AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BENS” em face de A. M. D. S. F., ambos qualificados nos autos. A requerente alega que manteve união estável com o requerido pelo período de 13 (treze) anos e 9 (nove) meses, com início em fevereiro de 2006 e término em novembro de 2019. Expõe que da união adveio o nascimento do filho Guilherme , e que a convivência era pública e com o objetivo de constituir família. Afirma, ainda, que durante o relacionamento, o casal adquiriu, onerosamente, um imóvel situado na Travessa Eurico Oliveira Neto, nº 6, Cantagalo, Niterói/RJ, além de diversos bens móveis que guarnecem a residência. Nos pedidos, requer o reconhecimento e a dissolução da união estável, a partilha do imóvel e dos bens móveis, a fixação de aluguel no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) mensais pelo uso exclusivo do imóvel pelo requerido, e a concessão da gratuidade judiciária. Devidamente citado, o requerido apresentou contestação (Id. Num. 58551231). Em sua defesa, impugnou a existência da união estável nos moldes narrados, afirmando que a relação foi esporádica e sigilosa, com início em meados de 2010 e término no final de 2018. Negou a presença dos requisitos de publicidade e objetivo de constituir família. Quanto aos bens, alegou que o imóvel era de sua propriedade antes do início da relação e que o vendeu em 2016. Contestou a lista de bens móveis, aduzindo possuir apenas o essencial, e que as roupas e calçados da autora foram devolvidos. Requereu, ao final, a total improcedência dos pedidos e o benefício da justiça gratuita. A autora apresentou impugnação à contestação (Id. Num. 64051230), oportunidade em que refutou o caráter sigiloso da relação, apontando o nascimento do filho e as fotografias em eventos sociais como provas da notoriedade e do ânimo familiar. Insistiu que o imóvel foi adquirido com esforço mútuo e que o réu o utiliza como residência e ponto comercial. Alegou que o término se deu em razão do comportamento agressivo do réu, informando, ainda, que estes se encontra ocultando patrimônio, requerendo diligências para sua comprovação. A instrução processual compreendeu a produção de prova documental, a realização de audiências e a colheita de prova oral. Foram realizadas audiências de conciliação, que restaram infrutíferas (Id. Num. 58583559 e Id. Num. 64087388). Foi realizada audiência de instrução e julgamento em 07 de dezembro de 2022 (Id. Num. 67064050), com a oitiva das testemunhas da parte autora, Srs. CÉSAR BATISTA G. CRUZ e ISABEL CRISTINA CEZAR, registradas em mídia audiovisual, tendo sido constatada a ausência do requerido e de seu patrono, embora devidamente intimados. Foram expedidos ofícios a cartórios de registro de imóveis e realizadas consultas aos sistemas conveniados. O 4º Ofício de Registro de Imóveis de Niterói informou a inexistência de registro para o imóvel no endereço indicado (Id. Num. 84262083). Juntado resultado de buscas junto ao INFOJUD - Id. Num. 92656977 e seguintes. Em alegações finais (Id. Num. 93330742), a parte autora reiterou seus pedidos, destacando a comprovação da união estável e da contribuição para a formação do patrimônio comum, estimado em R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), e propôs acordo para o pagamento de sua meação no valor de R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais). A parte requerida, embora intimada para apresentar alegações finais (Id. Num. 101161746), quedou-se inerte, conforme certificado no Id. Num. 107704093. Intimado a se manifestar sobre a proposta de acordo, o réu a rejeitou, reafirmando a inexistência de bens a partilhar (Id. Num. 111731843). É o relatório. Decido. Inicialmente, destaco que a causa se encontra madura para julgamento, ante a desnecessidade de produção de outras provas, além das carreadas aos autos. O cerne da controvérsia reside no reconhecimento de união estável entre as partes, na definição de seu termo final e na consequente partilha de bens supostamente adquiridos durante a convivência. •DO RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL A união estável é reconhecida como entidade familiar, nos termos do artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, e do artigo 1.723 do Código Civil. Para sua configuração, a lei exige a presença concomitante dos seguintes requisitos: convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família (affectio maritalis). Acompanhemos a disposição legal: “Art. 1.723, CC. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.” Não obstante a legislação utilizar a expressão “convivência pública”, Maria Berenice Dias5 afirma que o que a lei exige é a “notoriedade” da relação. Da mesma forma, para referida doutrinadora, a relação entre os conviventes deve estar amparada na “durabilidade e na continuidade do vínculo”, sendo o “objetivo de constituir família” um “pressuposto de caráter subjetivo”. Existindo tais elementos caracterizadores, não há como negar o reconhecimento da existência de união estável. É o que diz a jurisprudência mais abalizada, conforme se pode ver nesta decisão: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM. PROVA DA CONVIVÊNCIA. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. A ação de reconhecimento de união estável é uma ação de estado, assim entendida como a que se refere a uma determinada situação jurídica de alguém, no caso, o estado civil. Por se tratar de ação de estado, a procedência do pedido exige prova estreme de dúvidas. 2. Hipótese em que se discute o reconhecimento de união estável post mortem. As provas produzidas demonstraram a existência de convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família entre a autora e o falecido convivente, conforme preceitua o artigo 1.723, § 1º, do Código Civil. 3. Ao contrário do alegado pelos apelantes, as provas demonstraram que havia entre a apelada e o falecido verdadeiro ânimo de constituir família. Tal ânimo se depreende pelo comportamento de residir sob o mesmo teto, apresentar a companheira como sua mulher e contrair obrigações fornecendo o endereço da companheira ou permitindo que esta receba correspondência em seu endereço. A vontade revela-se em atitudes que denotam a comunhão de interesses, ou seja, o enlaçamento de vidas com fim que vai além do mero namoro. 4.Demonstrada a ocorrência dos requisitos para o reconhecimento da união estável post mortem, mediante prova documental e testemunhal, mantém-se a sentença que julgou procedente o pedido. 5. Apelo desprovido” (TJ-DF - APC: 20140510072770, Relator: JOÃO EGMONT, Data de Julgamento: 16/12/2015, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 21/01/2016 . Pág.: 404) Grifo nosso. “APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. Para a caracterização da união estável é imprescindível a existência de convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com objetivo de constituir família. O relacionamento que ostenta apenas contornos de um namoro, sem atender aos requisitos do art. 1.725, não caracteriza união estável. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70077885333, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 26/09/2018).” (TJ-RS - AC: 70077885333 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 26/09/2018, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/09/2018) Grifo nosso. Pois bem. A requerente sustenta que a união perdurou de fevereiro de 2006 a novembro de 2019, enquanto o requerido admite um relacionamento, porém de forma esporádica e sigilosa, entre 2010 e 2018. A prova dos autos favorece a tese da autora. O nascimento do filho do casal, Guilherme, em junho de 2013, conforme certidão de nascimento de Id. Num. 53352394, constitui robusto indício do projeto de vida em comum e do objetivo de constituir família, elemento anímico essencial para a caracterização da união estável. A alegação do réu de que a relação era "sigilosa" é infirmada pelas fotografias juntadas no Id. Num. 53352393, que retratam o casal em momentos de lazer e celebrações familiares, inclusive com o filho, demonstrando a publicidade e a notoriedade do relacionamento no meio social em que viviam. Acompanhemos algumas das fotografias que corroboram com a publicização da relação entre as partes, como casal: A prova testemunhal colhida na audiência de instrução e julgamento (Id. Num. 67064050), gravada em mídia audiovisual, foi crucial para a elucidação dos fatos. Sobre a transcrição do(s) depoimento(s) coletado(s) em sede judicial, saliento que objetivando a celeridade processual, este Juízo utilizou a ferramenta TurboScribe, cuja(s) integralidade(s) está (ão) anexa(s). Realço que eventuais incoerências e erros gramaticais deverão ser desconsideradas pelas partes, as quais deverão proceder com a escuta do(s) depoimento(s) e, consequentemente, com as respectivas correções. Em suma, as gravações colhidas são, efetivamente, as provas a serem utilizadas, sendo estas degravações apenas espelhos para as partes. As testemunhas da autora, devidamente compromissadas, ratificaram, parcialmente, a versão apresentada na petição inicial, afirmando que as partes mantiveram um relacionamento público e contínuo, reconhecido por amigos e familiares como uma entidade familiar. CÉSAR BATISTA G. CRUZ, que foi empregador da autora por uma década, de 2009 a 2019, foi fundamental para estabelecer a durabilidade e a publicidade da relação. Ele afirmou que, desde o início do vínculo empregatício em 2009, as partes já estavam juntas e "se caracterizavam como uma relação de união". A testemunha também corroborou com a coabitação do casal e a existência do filho, que se referia ao réu como pai. Por fim, relatou que o término da relação se deu por "problemas conjugais", mencionando que a autora se sentia ameaçada pelo réu, que pretendia expulsá-la da casa. Em seu depoimento pessoal, a autora, E. T., estabeleceu a cronologia do relacionamento, afirmando que este teve início em fevereiro de 2006 e que passaram a morar juntos em dezembro do mesmo ano. A autora declarou que o relacionamento terminou em 2019 devido a desavenças constantes e a um tratamento que considerava psicologicamente abusivo. A testemunha ISABEL CRISTINA CÉZAR, cabeleireira da autora por aproximadamente 13 (treze) anos, confirmou o caráter familiar da união. Declarou ter estado na residência do casal, a qual era guarnecida com móveis como sofá e televisão, e que aparentava ser a morada de uma família, não de uma única pessoa. A testemunha também afirmou ter conhecido o réu, o qual se apresentou como "marido da senhora Zilma" quando levou o filho do casal para cortar o cabelo em seu salão. Seu depoimento reforça a publicidade do relacionamento e a existência de um lar constituído. A ausência injustificada do réu e de seu advogado na referida audiência, embora devidamente intimados (Id. Num. 67064050), acarreta a presunção de veracidade dos fatos contra ele alegados, nos termos do artigo 385, §1º, do Código de Processo Civil, e enfraquece sobremaneira sua tese defensiva, que restou desprovida de qualquer suporte probatório. Dessa forma, restam preenchidos os requisitos do artigo 1.723 do Código Civil. Diante da fragilidade da tese defensiva e da robustez do conjunto probatório apresentado pela autora, fixo o período da união estável como sendo de fevereiro de 2006 a novembro de 2019, conforme requerido na inicial. •DA PARTILHA DE BENS Inexistindo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais o regime da comunhão parcial de bens, por força do artigo 1.725 do Código Civil. Neste regime, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância da união, a título oneroso, ainda que só em nome de um dos conviventes, conforme artigos 1.658 e 1.660, I, do mesmo diploma legal. CÉSAR BATISTA G. CRUZ, em seu depoimento, não soube declinar sobre o imóvel objeto dos autos, muito menos os móveis, especialmente no que tange à época e forma de aquisição, se decorreu de comum esforço ou não do casal. A parte autora, em seu depoimento, sobre o patrimônio, detalhou que o imóvel em litígio foi adquirido com esforço mútuo, explicando que ela continuou a arcar sozinha com o aluguel da moradia anterior para que o réu, com o auxílio financeiro dela, pudesse pagar pelo novo imóvel. ISABEL CRISTINA CÉZAR, em síntese, apontou que, quando esteve na residência da autora, enquanto estava se relacionando com o réu, visualizou, na sala do imóvel, bens como sofá, televisão, som etc. Contudo, semelhante depoimento, desprovido de outros elementos probatórios sobre a existência e forma de aquisição, da totalidade dos bens em comento, não são suficientes para convencer, este Juízo, sobre a partilha, na forma requerida. Especificamente sobre o bem imóvel indicado na exordial, localizado na Travessa Eurico Oliveira Neto, nº 6, em Niterói/RJ, as diligências realizadas por este juízo, notadamente a resposta do ofício encaminhado ao 4º Cartório de Registro de Imóveis (Id. Num. 84262083) e as pesquisas nos sistemas conveniados, demonstraram que o bem não possui registro formal em nome das partes, aspecto que, consequentemente, prejudica a sua partilha, já que, nos termos do art. 1.245, do CC, a existência de propriedade está condicionada ao registro do imóvel: “Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.” Poder-se-ia até tratar, a demanda, sobre a existência de direitos possessórios sobre o imóvel, o que não impede sua partilha, pois tais direitos possuem expressão econômica e integram o patrimônio do casal, conforme entendimento do STJ, no REsp: 1739042 SP 2018/0077442-0. Não obstante o réu tenha alegado, em sua contestação, que já era proprietário do bem e que o vendeu em 2016, semelhante argumento, desprovido, repito, de outros elementos probatórios, não são suficientes para fins de deferimento do pedido de partilha, ainda que da posse, considerando que as meras fotografias (Id. Num. 64051230), não atestam, com concretude, o cenário exposto pela autora em sua exordial, eis que não são provas aptas a comprovação da propriedade e/ou da posse do imóvel. Ademais, como anteriormente apontado, a prova testemunhal que o imóvel não comprova que o bem foi construído pelas partes, durante a união e que servia de moradia e ponto comercial para o réu, aspecto que competia à autora comprovar, com a juntada, a título de exemplo, de notas fiscais ou comprovantes de compras de materiais de construção destinado ao imóvel. Portanto, deve ser indeferido o pleito autoral, sobre o imóvel em comento, considerando a ausência de comprovação adequada de que a eventual aquisição decorreu dos esforços do casal, durante a relação de união estável. Em casos análogos, entende a jurisprudência: Poder Judiciário da Paraíba Gabinete 22 - Des. Carlos Eduardo Leite Lisboa ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL (198) N. 0800795-59.2023 .8.15.0911. ORIGEM: JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE SERRA BRANCA RELATOR: DESEMBARGADOR CARLOS EDUARDO LEITE LISBOA APELANTE: CARLOS ALEXANDRE DOS SANTOS Advogado do (a) APELANTE: JEFFERSON SOUSA SANTOS - PB17487-A APELADO: FRANCILENE NINO DA SILVA Advogado do (a) APELADO: IVANDRO PACELLI DE SOUSA COSTA E SILVA - PB13862-A Ementa: DIREITO DE FAMÍLIA . APELAÇÃO CÍVEL. SOBREPARTILHA DE BENS. IMÓVEL COMERCIAL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. PRESUNÇÃO DE ESFORÇO COMUM . MANUTENÇÃO NA PARTILHA. VEÍCULO AUTOMOTOR. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DA AQUISIÇÃO DURANTE O MATRIMÔNIO. IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO . RECURSOS DESPROVIDOS. [...] 4.A ausência de prova inequívoca de que o imóvel foi adquirido exclusivamente com recursos próprios do réu impõe a presunção de esforço comum, nos termos do regime de comunhão parcial de bens. Dessa forma, correta a sentença ao manter sua inclusão na partilha . [...] Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 669, I; CPC, art. 373, I; CC, art . 1.658. Jurisprudência relevante citada: TJ-SP, AC nº 1002321-77.2020 .8.26.0070, Rel. Des . Alcides Leopoldo, j. 23.10.2021; TJ-MG, AC nº 10000210497608001, Rel . Des. Armando Freire, j. 10.08 .2021. (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08007955920238150911, Relator.: Gabinete 22 - Des. Carlos Eduardo Leite Lisboa, 2ª Câmara Cível) Grifo nosso. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - PARTILHA DE BENS - VEÍCULO - AUSÊNCIA PROVA DA PROPRIEDADE E/OU POSSE - BENFEITORIAS - IMÓVEL DE TERCEIRO - AUSÊNCIA DE PROVAS DA REALIZAÇÃO DE BENFEITORIAS - DÍVIDAS - COMPROVAÇÃO - AUSÊNCIA - PARTILHA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. - O ônus da prova acerca dos bens a partilhar, adquiridos na constância do casamento em prol da sociedade conjugal, é daquele que formula a alegação e o respectivo pedido; - Não sendo o veículo de propriedade dos litigantes, nem mesmo havendo prova de que detinham a posse e que fora ele comprado, de fato, na constância do casamento, impossível a partilha, tal como determinada na sentença; - Inexistentes provas das benfeitorias, muito menos de supostos valores que teriam sido hipoteticamente investidos para melhorias no imóvel que serviu de residência do casal, então erguido em terreno de terceiros, incabível a partilha; - Eventual pretensão indenizatória por benfeitorias realizadas em imóvel de terceiros deverá ser aviada em ação própria, a ser movida em face do proprietário, assim nos termos do artigo 1.255, caput, Código Civil; - As dívidas assumidas por um dos cônjuges privativamente, por motivos outros que não sejam em proveito familiar, não integram a partilha. (TJ-MG - Apelação Cível: 50011851020238130433 1 .0000.24.161289-4/001, Relator.: Des.(a) Delvan Barcelos Júnior, Data de Julgamento: 12/07/2024, 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 15/07/2024) Grifo nosso. No que tange aos bens móveis que guarnecem a residência, na mesma esteira de pensamento supracitado, não há se falar em partilha da totalidade destes. Em verdade, a ausência de prova documental sobre a aquisição e até existência de todos os bens móveis que guarneciam a residência, não permitem este Juízo deferir a partilha na forma requerida pela autora, em sua inicial. Em verdade, somente restou comprovada, seja pelo depoimento testemunha de ISABEL CRISTINA CÉZAR, seja pelas informações trazidas pelo réu, em sua contestação, a existência dos seguintes bens, adquiridos, pelo casal, durante a união: 01 Geladeira; 01 TV; 01 Cama de casal com colchão; 01 Guarda Roupa de 02 portas; 01 Fogão e 01 Sofá de dois Lugares. Logo, considerando que os bens móveis alhures mencionados, incontroversamente, foram adquiridos durante a união das partes, devem ser partilhados em partes iguais, isto é, em 50% (cinquenta por cento) para cada parte, que deverá ocorrer em sede de liquidação de sentença, oportunidade em que as partes deverão apresentar os valores correspondentes a cada um dos bens para fins de partilha equitativa. Caberia a autora (art. 373, I, do CPC) o ônus de provar que todos os utensílios domésticos discriminados na sua exordial, existiam e que foram adquiridos mediante comunhão de esforços do casal, durante a união, contudo, não o fez. Por fim, considerando a conclusão sobre o imóvel objeto da demanda, não há se falar em fixação de aluguel pelo uso exclusivo do imóvel comum por um dos ex-conviventes. •DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento nos artigos 1.723 e seguintes do Código Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: I - RECONHECER E DECLARAR DISSOLVIDA a união estável havida entre E. T. e A. M. D. S. F., fixando como período de convivência o lapso temporal de fevereiro de 2006 a novembro de 2019; II - DETERMINAR a partilha, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada parte, dos bens: 01 Geladeira; 01 TV; 01 Cama de casal com colchão; 01 Guarda Roupa de 02 portas; 01 Fogão e 01 Sofá de dois Lugares. Devendo a efetivação da partilha ser concretizada após a liquidação de sentença, conforme anteriormente exposto; III - INDEFERIR a partilha do imóvel descrito na exordial, assim como dos bens móveis não apontados no item anterior (II). Considerando que a parte autora sucumbiu em maior parte, nos termos do art. 86, § único, do CPC, CONDENO-A, ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, suspendendo, contudo, a exigibilidade de tais verbas em razão da gratuidade judicial deferida, conforme art. 98, § 3º, do CPC. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intime-se. Decorrido o prazo recursal, sem recurso voluntário, certifique-se o trânsito em julgado e intime-se a parte ré para realizar o recolhimento das custas processuais. Por outro lado, caso seja interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazoar, caso tenha integrado a lide, e em seguida remetam-se os autos ao E. TJPB, independente de nova conclusão. Cumpra-se. Pocinhos/PB, data e assinatura eletrônicas. CARMEN HELEN AGRA DE BRITO Juíza de Direito [Documento datado e assinado eletronicamente - art. 2º, lei 11.419/2006]

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Processo nº 0800028-98.2022.8.15.0541

ID: 332667429

Tribunal: TJPB Órgão: Vara Única de Pocinhos Classe: DIVóRCIO LITIGIOSO Nº Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANTONIO MARTINS DA SILVA FILHO

Sentença

Advogados:

CLAUDIO ALEXANDRE DE ALMEIDA FEITOSA

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

DIEGO ARAUJO SOUSA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DA PARAÍBA VARA ÚNICA DA COMARCA DE POCINHOS Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541 Classe: DIVÓRCIO LITIGIOSO (12541) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução] REQUERENTE: E. T. REQUERIDO… PODER JUDICIÁRIO DA PARAÍBA VARA ÚNICA DA COMARCA DE POCINHOS Processo: 0800028-98.2022.8.15.0541 Classe: DIVÓRCIO LITIGIOSO (12541) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução] REQUERENTE: E. T. REQUERIDO: A. M. D. S. F. SENTENÇA Vistos, etc. E. T. ajuizou a presente “AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BENS” em face de A. M. D. S. F., ambos qualificados nos autos. A requerente alega que manteve união estável com o requerido pelo período de 13 (treze) anos e 9 (nove) meses, com início em fevereiro de 2006 e término em novembro de 2019. Expõe que da união adveio o nascimento do filho Guilherme , e que a convivência era pública e com o objetivo de constituir família. Afirma, ainda, que durante o relacionamento, o casal adquiriu, onerosamente, um imóvel situado na Travessa Eurico Oliveira Neto, nº 6, Cantagalo, Niterói/RJ, além de diversos bens móveis que guarnecem a residência. Nos pedidos, requer o reconhecimento e a dissolução da união estável, a partilha do imóvel e dos bens móveis, a fixação de aluguel no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) mensais pelo uso exclusivo do imóvel pelo requerido, e a concessão da gratuidade judiciária. Devidamente citado, o requerido apresentou contestação (Id. Num. 58551231). Em sua defesa, impugnou a existência da união estável nos moldes narrados, afirmando que a relação foi esporádica e sigilosa, com início em meados de 2010 e término no final de 2018. Negou a presença dos requisitos de publicidade e objetivo de constituir família. Quanto aos bens, alegou que o imóvel era de sua propriedade antes do início da relação e que o vendeu em 2016. Contestou a lista de bens móveis, aduzindo possuir apenas o essencial, e que as roupas e calçados da autora foram devolvidos. Requereu, ao final, a total improcedência dos pedidos e o benefício da justiça gratuita. A autora apresentou impugnação à contestação (Id. Num. 64051230), oportunidade em que refutou o caráter sigiloso da relação, apontando o nascimento do filho e as fotografias em eventos sociais como provas da notoriedade e do ânimo familiar. Insistiu que o imóvel foi adquirido com esforço mútuo e que o réu o utiliza como residência e ponto comercial. Alegou que o término se deu em razão do comportamento agressivo do réu, informando, ainda, que estes se encontra ocultando patrimônio, requerendo diligências para sua comprovação. A instrução processual compreendeu a produção de prova documental, a realização de audiências e a colheita de prova oral. Foram realizadas audiências de conciliação, que restaram infrutíferas (Id. Num. 58583559 e Id. Num. 64087388). Foi realizada audiência de instrução e julgamento em 07 de dezembro de 2022 (Id. Num. 67064050), com a oitiva das testemunhas da parte autora, Srs. CÉSAR BATISTA G. CRUZ e ISABEL CRISTINA CEZAR, registradas em mídia audiovisual, tendo sido constatada a ausência do requerido e de seu patrono, embora devidamente intimados. Foram expedidos ofícios a cartórios de registro de imóveis e realizadas consultas aos sistemas conveniados. O 4º Ofício de Registro de Imóveis de Niterói informou a inexistência de registro para o imóvel no endereço indicado (Id. Num. 84262083). Juntado resultado de buscas junto ao INFOJUD - Id. Num. 92656977 e seguintes. Em alegações finais (Id. Num. 93330742), a parte autora reiterou seus pedidos, destacando a comprovação da união estável e da contribuição para a formação do patrimônio comum, estimado em R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), e propôs acordo para o pagamento de sua meação no valor de R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais). A parte requerida, embora intimada para apresentar alegações finais (Id. Num. 101161746), quedou-se inerte, conforme certificado no Id. Num. 107704093. Intimado a se manifestar sobre a proposta de acordo, o réu a rejeitou, reafirmando a inexistência de bens a partilhar (Id. Num. 111731843). É o relatório. Decido. Inicialmente, destaco que a causa se encontra madura para julgamento, ante a desnecessidade de produção de outras provas, além das carreadas aos autos. O cerne da controvérsia reside no reconhecimento de união estável entre as partes, na definição de seu termo final e na consequente partilha de bens supostamente adquiridos durante a convivência. •DO RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL A união estável é reconhecida como entidade familiar, nos termos do artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, e do artigo 1.723 do Código Civil. Para sua configuração, a lei exige a presença concomitante dos seguintes requisitos: convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família (affectio maritalis). Acompanhemos a disposição legal: “Art. 1.723, CC. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.” Não obstante a legislação utilizar a expressão “convivência pública”, Maria Berenice Dias5 afirma que o que a lei exige é a “notoriedade” da relação. Da mesma forma, para referida doutrinadora, a relação entre os conviventes deve estar amparada na “durabilidade e na continuidade do vínculo”, sendo o “objetivo de constituir família” um “pressuposto de caráter subjetivo”. Existindo tais elementos caracterizadores, não há como negar o reconhecimento da existência de união estável. É o que diz a jurisprudência mais abalizada, conforme se pode ver nesta decisão: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM. PROVA DA CONVIVÊNCIA. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. A ação de reconhecimento de união estável é uma ação de estado, assim entendida como a que se refere a uma determinada situação jurídica de alguém, no caso, o estado civil. Por se tratar de ação de estado, a procedência do pedido exige prova estreme de dúvidas. 2. Hipótese em que se discute o reconhecimento de união estável post mortem. As provas produzidas demonstraram a existência de convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família entre a autora e o falecido convivente, conforme preceitua o artigo 1.723, § 1º, do Código Civil. 3. Ao contrário do alegado pelos apelantes, as provas demonstraram que havia entre a apelada e o falecido verdadeiro ânimo de constituir família. Tal ânimo se depreende pelo comportamento de residir sob o mesmo teto, apresentar a companheira como sua mulher e contrair obrigações fornecendo o endereço da companheira ou permitindo que esta receba correspondência em seu endereço. A vontade revela-se em atitudes que denotam a comunhão de interesses, ou seja, o enlaçamento de vidas com fim que vai além do mero namoro. 4.Demonstrada a ocorrência dos requisitos para o reconhecimento da união estável post mortem, mediante prova documental e testemunhal, mantém-se a sentença que julgou procedente o pedido. 5. Apelo desprovido” (TJ-DF - APC: 20140510072770, Relator: JOÃO EGMONT, Data de Julgamento: 16/12/2015, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 21/01/2016 . Pág.: 404) Grifo nosso. “APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. Para a caracterização da união estável é imprescindível a existência de convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com objetivo de constituir família. O relacionamento que ostenta apenas contornos de um namoro, sem atender aos requisitos do art. 1.725, não caracteriza união estável. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70077885333, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 26/09/2018).” (TJ-RS - AC: 70077885333 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 26/09/2018, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/09/2018) Grifo nosso. Pois bem. A requerente sustenta que a união perdurou de fevereiro de 2006 a novembro de 2019, enquanto o requerido admite um relacionamento, porém de forma esporádica e sigilosa, entre 2010 e 2018. A prova dos autos favorece a tese da autora. O nascimento do filho do casal, Guilherme, em junho de 2013, conforme certidão de nascimento de Id. Num. 53352394, constitui robusto indício do projeto de vida em comum e do objetivo de constituir família, elemento anímico essencial para a caracterização da união estável. A alegação do réu de que a relação era "sigilosa" é infirmada pelas fotografias juntadas no Id. Num. 53352393, que retratam o casal em momentos de lazer e celebrações familiares, inclusive com o filho, demonstrando a publicidade e a notoriedade do relacionamento no meio social em que viviam. Acompanhemos algumas das fotografias que corroboram com a publicização da relação entre as partes, como casal: A prova testemunhal colhida na audiência de instrução e julgamento (Id. Num. 67064050), gravada em mídia audiovisual, foi crucial para a elucidação dos fatos. Sobre a transcrição do(s) depoimento(s) coletado(s) em sede judicial, saliento que objetivando a celeridade processual, este Juízo utilizou a ferramenta TurboScribe, cuja(s) integralidade(s) está (ão) anexa(s). Realço que eventuais incoerências e erros gramaticais deverão ser desconsideradas pelas partes, as quais deverão proceder com a escuta do(s) depoimento(s) e, consequentemente, com as respectivas correções. Em suma, as gravações colhidas são, efetivamente, as provas a serem utilizadas, sendo estas degravações apenas espelhos para as partes. As testemunhas da autora, devidamente compromissadas, ratificaram, parcialmente, a versão apresentada na petição inicial, afirmando que as partes mantiveram um relacionamento público e contínuo, reconhecido por amigos e familiares como uma entidade familiar. CÉSAR BATISTA G. CRUZ, que foi empregador da autora por uma década, de 2009 a 2019, foi fundamental para estabelecer a durabilidade e a publicidade da relação. Ele afirmou que, desde o início do vínculo empregatício em 2009, as partes já estavam juntas e "se caracterizavam como uma relação de união". A testemunha também corroborou com a coabitação do casal e a existência do filho, que se referia ao réu como pai. Por fim, relatou que o término da relação se deu por "problemas conjugais", mencionando que a autora se sentia ameaçada pelo réu, que pretendia expulsá-la da casa. Em seu depoimento pessoal, a autora, E. T., estabeleceu a cronologia do relacionamento, afirmando que este teve início em fevereiro de 2006 e que passaram a morar juntos em dezembro do mesmo ano. A autora declarou que o relacionamento terminou em 2019 devido a desavenças constantes e a um tratamento que considerava psicologicamente abusivo. A testemunha ISABEL CRISTINA CÉZAR, cabeleireira da autora por aproximadamente 13 (treze) anos, confirmou o caráter familiar da união. Declarou ter estado na residência do casal, a qual era guarnecida com móveis como sofá e televisão, e que aparentava ser a morada de uma família, não de uma única pessoa. A testemunha também afirmou ter conhecido o réu, o qual se apresentou como "marido da senhora Zilma" quando levou o filho do casal para cortar o cabelo em seu salão. Seu depoimento reforça a publicidade do relacionamento e a existência de um lar constituído. A ausência injustificada do réu e de seu advogado na referida audiência, embora devidamente intimados (Id. Num. 67064050), acarreta a presunção de veracidade dos fatos contra ele alegados, nos termos do artigo 385, §1º, do Código de Processo Civil, e enfraquece sobremaneira sua tese defensiva, que restou desprovida de qualquer suporte probatório. Dessa forma, restam preenchidos os requisitos do artigo 1.723 do Código Civil. Diante da fragilidade da tese defensiva e da robustez do conjunto probatório apresentado pela autora, fixo o período da união estável como sendo de fevereiro de 2006 a novembro de 2019, conforme requerido na inicial. •DA PARTILHA DE BENS Inexistindo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais o regime da comunhão parcial de bens, por força do artigo 1.725 do Código Civil. Neste regime, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância da união, a título oneroso, ainda que só em nome de um dos conviventes, conforme artigos 1.658 e 1.660, I, do mesmo diploma legal. CÉSAR BATISTA G. CRUZ, em seu depoimento, não soube declinar sobre o imóvel objeto dos autos, muito menos os móveis, especialmente no que tange à época e forma de aquisição, se decorreu de comum esforço ou não do casal. A parte autora, em seu depoimento, sobre o patrimônio, detalhou que o imóvel em litígio foi adquirido com esforço mútuo, explicando que ela continuou a arcar sozinha com o aluguel da moradia anterior para que o réu, com o auxílio financeiro dela, pudesse pagar pelo novo imóvel. ISABEL CRISTINA CÉZAR, em síntese, apontou que, quando esteve na residência da autora, enquanto estava se relacionando com o réu, visualizou, na sala do imóvel, bens como sofá, televisão, som etc. Contudo, semelhante depoimento, desprovido de outros elementos probatórios sobre a existência e forma de aquisição, da totalidade dos bens em comento, não são suficientes para convencer, este Juízo, sobre a partilha, na forma requerida. Especificamente sobre o bem imóvel indicado na exordial, localizado na Travessa Eurico Oliveira Neto, nº 6, em Niterói/RJ, as diligências realizadas por este juízo, notadamente a resposta do ofício encaminhado ao 4º Cartório de Registro de Imóveis (Id. Num. 84262083) e as pesquisas nos sistemas conveniados, demonstraram que o bem não possui registro formal em nome das partes, aspecto que, consequentemente, prejudica a sua partilha, já que, nos termos do art. 1.245, do CC, a existência de propriedade está condicionada ao registro do imóvel: “Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.” Poder-se-ia até tratar, a demanda, sobre a existência de direitos possessórios sobre o imóvel, o que não impede sua partilha, pois tais direitos possuem expressão econômica e integram o patrimônio do casal, conforme entendimento do STJ, no REsp: 1739042 SP 2018/0077442-0. Não obstante o réu tenha alegado, em sua contestação, que já era proprietário do bem e que o vendeu em 2016, semelhante argumento, desprovido, repito, de outros elementos probatórios, não são suficientes para fins de deferimento do pedido de partilha, ainda que da posse, considerando que as meras fotografias (Id. Num. 64051230), não atestam, com concretude, o cenário exposto pela autora em sua exordial, eis que não são provas aptas a comprovação da propriedade e/ou da posse do imóvel. Ademais, como anteriormente apontado, a prova testemunhal que o imóvel não comprova que o bem foi construído pelas partes, durante a união e que servia de moradia e ponto comercial para o réu, aspecto que competia à autora comprovar, com a juntada, a título de exemplo, de notas fiscais ou comprovantes de compras de materiais de construção destinado ao imóvel. Portanto, deve ser indeferido o pleito autoral, sobre o imóvel em comento, considerando a ausência de comprovação adequada de que a eventual aquisição decorreu dos esforços do casal, durante a relação de união estável. Em casos análogos, entende a jurisprudência: Poder Judiciário da Paraíba Gabinete 22 - Des. Carlos Eduardo Leite Lisboa ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL (198) N. 0800795-59.2023 .8.15.0911. ORIGEM: JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE SERRA BRANCA RELATOR: DESEMBARGADOR CARLOS EDUARDO LEITE LISBOA APELANTE: CARLOS ALEXANDRE DOS SANTOS Advogado do (a) APELANTE: JEFFERSON SOUSA SANTOS - PB17487-A APELADO: FRANCILENE NINO DA SILVA Advogado do (a) APELADO: IVANDRO PACELLI DE SOUSA COSTA E SILVA - PB13862-A Ementa: DIREITO DE FAMÍLIA . APELAÇÃO CÍVEL. SOBREPARTILHA DE BENS. IMÓVEL COMERCIAL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. PRESUNÇÃO DE ESFORÇO COMUM . MANUTENÇÃO NA PARTILHA. VEÍCULO AUTOMOTOR. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DA AQUISIÇÃO DURANTE O MATRIMÔNIO. IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO . RECURSOS DESPROVIDOS. [...] 4.A ausência de prova inequívoca de que o imóvel foi adquirido exclusivamente com recursos próprios do réu impõe a presunção de esforço comum, nos termos do regime de comunhão parcial de bens. Dessa forma, correta a sentença ao manter sua inclusão na partilha . [...] Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 669, I; CPC, art. 373, I; CC, art . 1.658. Jurisprudência relevante citada: TJ-SP, AC nº 1002321-77.2020 .8.26.0070, Rel. Des . Alcides Leopoldo, j. 23.10.2021; TJ-MG, AC nº 10000210497608001, Rel . Des. Armando Freire, j. 10.08 .2021. (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08007955920238150911, Relator.: Gabinete 22 - Des. Carlos Eduardo Leite Lisboa, 2ª Câmara Cível) Grifo nosso. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - PARTILHA DE BENS - VEÍCULO - AUSÊNCIA PROVA DA PROPRIEDADE E/OU POSSE - BENFEITORIAS - IMÓVEL DE TERCEIRO - AUSÊNCIA DE PROVAS DA REALIZAÇÃO DE BENFEITORIAS - DÍVIDAS - COMPROVAÇÃO - AUSÊNCIA - PARTILHA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. - O ônus da prova acerca dos bens a partilhar, adquiridos na constância do casamento em prol da sociedade conjugal, é daquele que formula a alegação e o respectivo pedido; - Não sendo o veículo de propriedade dos litigantes, nem mesmo havendo prova de que detinham a posse e que fora ele comprado, de fato, na constância do casamento, impossível a partilha, tal como determinada na sentença; - Inexistentes provas das benfeitorias, muito menos de supostos valores que teriam sido hipoteticamente investidos para melhorias no imóvel que serviu de residência do casal, então erguido em terreno de terceiros, incabível a partilha; - Eventual pretensão indenizatória por benfeitorias realizadas em imóvel de terceiros deverá ser aviada em ação própria, a ser movida em face do proprietário, assim nos termos do artigo 1.255, caput, Código Civil; - As dívidas assumidas por um dos cônjuges privativamente, por motivos outros que não sejam em proveito familiar, não integram a partilha. (TJ-MG - Apelação Cível: 50011851020238130433 1 .0000.24.161289-4/001, Relator.: Des.(a) Delvan Barcelos Júnior, Data de Julgamento: 12/07/2024, 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 15/07/2024) Grifo nosso. No que tange aos bens móveis que guarnecem a residência, na mesma esteira de pensamento supracitado, não há se falar em partilha da totalidade destes. Em verdade, a ausência de prova documental sobre a aquisição e até existência de todos os bens móveis que guarneciam a residência, não permitem este Juízo deferir a partilha na forma requerida pela autora, em sua inicial. Em verdade, somente restou comprovada, seja pelo depoimento testemunha de ISABEL CRISTINA CÉZAR, seja pelas informações trazidas pelo réu, em sua contestação, a existência dos seguintes bens, adquiridos, pelo casal, durante a união: 01 Geladeira; 01 TV; 01 Cama de casal com colchão; 01 Guarda Roupa de 02 portas; 01 Fogão e 01 Sofá de dois Lugares. Logo, considerando que os bens móveis alhures mencionados, incontroversamente, foram adquiridos durante a união das partes, devem ser partilhados em partes iguais, isto é, em 50% (cinquenta por cento) para cada parte, que deverá ocorrer em sede de liquidação de sentença, oportunidade em que as partes deverão apresentar os valores correspondentes a cada um dos bens para fins de partilha equitativa. Caberia a autora (art. 373, I, do CPC) o ônus de provar que todos os utensílios domésticos discriminados na sua exordial, existiam e que foram adquiridos mediante comunhão de esforços do casal, durante a união, contudo, não o fez. Por fim, considerando a conclusão sobre o imóvel objeto da demanda, não há se falar em fixação de aluguel pelo uso exclusivo do imóvel comum por um dos ex-conviventes. •DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento nos artigos 1.723 e seguintes do Código Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: I - RECONHECER E DECLARAR DISSOLVIDA a união estável havida entre E. T. e A. M. D. S. F., fixando como período de convivência o lapso temporal de fevereiro de 2006 a novembro de 2019; II - DETERMINAR a partilha, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada parte, dos bens: 01 Geladeira; 01 TV; 01 Cama de casal com colchão; 01 Guarda Roupa de 02 portas; 01 Fogão e 01 Sofá de dois Lugares. Devendo a efetivação da partilha ser concretizada após a liquidação de sentença, conforme anteriormente exposto; III - INDEFERIR a partilha do imóvel descrito na exordial, assim como dos bens móveis não apontados no item anterior (II). Considerando que a parte autora sucumbiu em maior parte, nos termos do art. 86, § único, do CPC, CONDENO-A, ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, suspendendo, contudo, a exigibilidade de tais verbas em razão da gratuidade judicial deferida, conforme art. 98, § 3º, do CPC. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intime-se. Decorrido o prazo recursal, sem recurso voluntário, certifique-se o trânsito em julgado e intime-se a parte ré para realizar o recolhimento das custas processuais. Por outro lado, caso seja interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazoar, caso tenha integrado a lide, e em seguida remetam-se os autos ao E. TJPB, independente de nova conclusão. Cumpra-se. Pocinhos/PB, data e assinatura eletrônicas. CARMEN HELEN AGRA DE BRITO Juíza de Direito [Documento datado e assinado eletronicamente - art. 2º, lei 11.419/2006]

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Processo nº 5028613-62.2020.8.09.0051

ID: 312678047

Tribunal: TJGO Órgão: 1ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5028613-62.2020.8.09.0051

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

CELG DISTRIBUIÇÃO S/A - CELG D

Polo Passivo:

Voto

Advogados:

JOSE MUNIZ NETO

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GUILHERME HENRIQUE FERREIRA DIAS

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

GEORGE MUNIZ RIBEIRO REIS

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LIVIA MORAIS AZEVEDO

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EDUARDO PORANGABA TEIXEIRA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

MAYARANI LOPES SOUZA E SILVA

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RODRIGO BARBOSA MACÊDO DO NASCIMENTO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

ALEXANDRE ALENCASTRO VEIGA HSIUNG

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ANNA VITÓRIA GOMES CAIADO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIOTribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Átila Naves AmaralDUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL Nº 5028613-62.2020.8.09.0051COMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE : MU… PODER JUDICIÁRIOTribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Átila Naves AmaralDUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL Nº 5028613-62.2020.8.09.0051COMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE : MUNICÍPIO DE GOIÂNIAAPELADA : CELG DISTRIBUIÇÃO S/A - CELG DRELATOR : DESEMBARGADOR ÁTILA NAVES AMARAL VOTO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso e da remessa necessária. 1. Síntese da demanda Conforme relatado, trata-se de remessa obrigatória e recurso de apelação cível (mov. 78), interposto pelo MUNICÍPIO DE GOIÂNIA, contra a sentença (mov. 63) proferida pela Juíza de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal e de Registros Públicos da Comarca de Goiânia, Dra. Patrícia Machado Carrijo, figurando como apelada a CELG DISTRIBUIÇÃO S/A - CELG D, todos qualificados. Extrai-se de inicial que a autora CELG DISTRIBUIÇÃO S.A ajuizou ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária em face do MUNICÍPIO DE GOIÂNIA, questionando a Lei Municipal nº 10.411/2019 que a atribuiu responsabilidade de substituição tributária em relação à COSIP - Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública. Relata que, anteriormente à lei questionada, a cobrança da COSIP era regulada pelo Convênio 010/2005 entre a CELG e o Município. Pelo convênio, a CELG recebia 2% do valor da COSIP a título de contraprestação pelos serviços de faturamento e arrecadação. A Lei Municipal 10.411/2019 alterou a Lei Complementar Municipal 119/2002, revogando o Convênio 010/2005 e instituindo a CELG como substituta tributária da COSIP, sem previsão de contraprestação pelos serviços de arrecadação. Destaca que a Lei Municipal determinou que a CELG deveria repassar antecipadamente os valores arrecadados, independentemente do pagamento pelos contribuintes e proibiu a compensação de créditos e débitos da CELG com o Município. Diante do exposto, a CELG pleiteia judicialmente: o reconhecimento da inexistência de relação jurídico-tributária entre a CELG e o Município no que tange à responsabilidade pelo pagamento da COSIP; a declaração de inconstitucionalidade e ilegalidade da Lei Municipal nº 10.411/2019, especialmente nos pontos que impõem a responsabilidade tributária à CELG; a suspensão imediata da exigibilidade da cobrança, via tutela de urgência; e a condenação do Município ao pagamento das custas e honorários advocatícios. A juíza de primeira instância julgou procedente a ação, nos seguintes termos (mov. 63): Na confluência do exposto, julgo procedentes os pedidos deduzidos em juízo, extingo o feito, com resolução de mérito (ex vi do art. 487, I, do CPC), e:(i) reconheço, pela via incidental, a inconstitucionalidade dos arts. 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/02, que atribuem a responsabilidade tributária, por substituição, pelo pagamento da COSIP à concessionária do serviço público de distribuição de energia elétrica com atuação no Município de Goiânia;(ii) declaro a inexistência de relação jurídico-tributária (responsabilidade) da parte autora no que diz respeito ao adimplemento da COSIP de forma antecipada;(iii) declaro que a prestação, pela parte autora, dos serviços de inclusão na fatura de energia elétrica, recebimento e repasse ao Município de Goiânia do valor da COSIP somente poderá ocorrer mediante a celebração de contrato entre as partes que contenha previsão de remuneração pelo auxílio arrecadatório prestado;(iv) determino que, até que sobrevenha nova avença entre as partes, a remuneração pelo serviço auxiliar de operacionalização da arrecadação da COSIP veiculada na fatura de energia elétrica se pautará nos termos ínsitos no Convênio nº 010/2005, firmado em 04/04/2005; e(v) condeno o Município de Goiânia no pagamento de indenização à parte autora pelo auxílio arrecadatório prestado sem remuneração – desde quando esta deixou de ser paga, até o retorno de seu adimplemento -, cujos parâmetros indenizatórios serão aqueles fixados no Convênio nº 010/2005, firmado em 04/04/2005.Corolário da presente decisão, condeno o Município de Goiânia no pagamento de honorários advocatícios, cujo percentual será fixado após a liquidação da condenação – nos termos do art. 85, §4º, inciso III do CPC -, e no ressarcimento das despesas processuais adiantadas.Eventuais custas remanescentes não isentas a cargo da parte ré.Duplo grau de jurisdição obrigatório, tendo em vista a iliquidez da condenação. Irresignado, o réu, MUNICÍPIO DE GOIÂNIA, interpõe o presente recurso (mov. 78). Em suas razões recursais, o apelante alega que a Contribuição para o Custeio dos Serviços de Iluminação Pública – COSIP está prevista no art. 149-A da Constituição Federal, o qual confere aos Municípios e Distrito Federal competência para instituí-la, bem como promover a sua cobrança na fatura de energia elétrica. Pontua ainda que o art. 150, § 7º da CF/88 e os arts. 121, inciso II, e 128 do CTN preveem a possibilidade da atribuição da responsabilidade tributária a terceiro vinculado ao fato gerador. Sustenta que a Lei Municipal nº 10.411/2019 alterou o regime de arrecadação da COSIP, colocando a concessionária como “responsável tributária” pelo tributo em questão, o que estaria em consonância com as normas constitucionais e legais supracitadas. Argumenta sobre a necessidade de que os honorários sejam fixados por equidade, nos casos em que o proveito econômico ou o valor dado à causa seja muito elevado. Por essas razões, requer seja reformada a sentença recorrida, a fim de julgar improcedentes os pedidos iniciais ou, subsidiariamente, que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 10.411/2019 não sejam retroativos, passando a surtir apenas após o trânsito em julgado da referida decisão, bem como que os honorários de sucumbência sejam fixados por apreciação equitativa. Passo a analisar o recurso. 2. Do julgamento do incidente de arguição de inconstitucionalidade Tendo havido a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/02 na sentença, determinei, de início, a remessa do feito ao Órgão Especial, para análise da questão constitucional, nos termos do artigo 97, da Constituição Federal. No julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade (mov. 302), o Órgão Especial deste Tribunal de Justiça, por maioria de votos, rejeitou a arguição de inconstitucionalidade alegada pela CELG dos artigos 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/2002 (alterados pela Lei Municipal nº 10.411/2019), determinando o retorno dos autos à Primeira Câmara Cível para o julgamento do apelo e da remessa necessária. Na ocasião, o Órgão Especial, sob a relatoria do Desembargador Luiz Eduardo de Sousa, concluiu que a matéria não envolve inconstitucionalidade, mas sim crise de legalidade. Fundamentou que o artigo 149-A da Carta Magna, ao facultar aos municípios a instituição da COSIP e sua cobrança na fatura de energia elétrica, não é diretamente violado pela norma municipal que define a concessionária como substituta tributária. Consignou o relator, corroborando o parecer ministerial, que, na hipótese, o que se vislumbra é uma possível contrariedade entre a lei municipal e o regramento infraconstitucional relativo à responsabilidade tributária por substituição, notadamente quanto à necessária vinculação ao fato gerador do tributo, exigência prevista no artigo 128 do CTN. Assim, pontuou que a análise da controvérsia referente à responsabilidade tributária pela COSIP demanda interpretação de legislação infraconstitucional, revelando ofensa reflexa ou indireta à Constituição, inviável em sede de controle de constitucionalidade. Confira-se os seguintes trechos do aludido acórdão: “A questão apontada como inconstitucional diz respeito a Lei nº 10.411/2019 do Município de Goiânia que modificou a redação dos arts. 6º e 6-A da Lei Complementar Municipal n° 119/2002.A referida alteração legislativa atribuiu à concessionária autora, a responsabilidade, na condição de substituta tributária, pela arrecadação e repasse da COSIP (Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública) ao Município de Goiânia.Também lhe impôs a obrigação solidária quanto ao pagamento da contribuição, vez que estipulou que a substituição independe do efetivo pagamento pelo contribuinte.(...)A autora, então, aponta que a inconstitucionalidade da norma municipal encontra-se no fato de que a faculdade de realizar o faturamento da COSIP por meio na fatura de consumo de energia elétrica (art. 149-A, parágrafo único da CF), não autoriza a substituição tributária da concessionária para o pagamento das faturas dos contribuintes,já que não há vínculo entre a concessionária de energia elétrica e o fato gerador da COSIP (iluminação pública).Tal hipótese, segundo a autora, não se coaduna com o sistema de substituição tributária disposto nos arts. 121 e 128 do Código Tributário Nacional, justamente pela ausência de vinculação ao fato gerador da obrigação.(...)No caso em discussão, em que pese os argumentos apresentados por ambas as partes a respeito da suposta inconstitucionalidade da substituição tributária definida na Lei Municipal nº 10.411/2019, é inconteste que não houve a indicação de parâmetros de aferição da constitucionalidade da norma.O art. 149-A que faculta aos municípios a instituição da COSIP bem como sua cobrança na fatura de energia elétrica, não pode ser apontada como norma do texto constitucional violada, pois a questão é de crise de legalidade e não de inconstitucionalidade.Ora, o que se vislumbra é que a lei municipal supostamente violaria o regramento quanto a responsabilidade tributária por substituição, estabelecida no art. 128 do Código Tributário Nacional, especificamente quanto a vinculação ou não ao fato gerador do tributo.Desse modo, o texto constitucional que apenas faculta a instituição e a forma de cobrança da COSIP não é violado pela norma municipal que define a concessionária como substituta tributária.(...)Como visto, portanto, a solução do caso em exame impõe o confronto entre normas infraconstitucionais não envolvendo diretamente o texto da Constituição.Assim, à míngua de afronta ao artigo 149-A, da Constituição Federal, impõe-se a rejeição do incidente de arguição de inconstitucionalidade.Ante o exposto, acolhendo o parecer ministerial de cúpula, REJEITO a presente arguição de inconstitucionalidade e determino o retorno dos autos à Primeira Câmara Cível para o julgamento do apelo e da remessa necessária.” (mov. 302) Desse modo, restou afastada a possibilidade de reconhecimento da alegada inconstitucionalidade dos artigos 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/2002, que, portanto, continua válido e em vigor. 3. Da competência legislativa para instituição da COSIP e do alegado conflito normativo entre a Lei Complementar Municipal nº 119/2002 e os artigos 121, II, e 128, do Código Tributário Nacional A Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (COSIP) foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Emenda Constitucional nº 39/2002, que acrescentou o artigo 149-A à Constituição Federal, estabelecendo expressamente a competência dos Municípios e do Distrito Federal para institui-la. Confira-se: "CF, Art. 149-A. Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica." A competência legislativa para instituir a COSIP é, portanto, exclusiva dos Municípios e do Distrito Federal, caracterizando-se como manifestação da autonomia federativa assegurada pela Constituição Federal em seu artigo 30, que atribui aos Municípios a competência para legislar sobre assuntos de interesse local e instituir e arrecadar os tributos de sua competência. Nesse contexto, vale ressaltar que a Constituição Federal estabelece, em seu artigo 146, que cabe à lei complementar federal estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:"Art. 146. Cabe à lei complementar:III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;" Entretanto, esta competência da União para editar normas gerais não esvazia a competência tributária constitucionalmente atribuída aos Municípios, afinal, o sistema constitucional brasileiro adota o federalismo cooperativo, em que as competências são distribuídas de forma a garantir autonomia aos entes federativos. No caso específico da COSIP, por se tratar de tributo cuja competência foi expressamente outorgada pela Constituição aos Municípios, estes possuem ampla liberdade para disciplinar seus aspectos fundamentais, desde que observados os princípios constitucionais tributários, como a legalidade, a anterioridade e a não-confiscatoriedade. Dessa forma, a norma municipal somente pode ser limitada pela norma federal no que diz respeito a normas gerais, o que não é o caso dos autos, já que se trata de fixação, pela Lei Complementar Municipal, de substituição tributária fixada em concreto. 4. Da substituição tributária A substituição tributária constitui mecanismo essencial para a operacionalização eficiente do sistema tributário nacional. Este instituto jurídico atende primordialmente a princípios de racionalização e efetividade da tributação, proporcionando simplificação de procedimentos arrecadatórios e redução das possibilidades de inadimplemento fiscal, conferindo maior praticabilidade à tributação. O fundamento normativo da substituição tributária encontra-se consagrado no Código Tributário Nacional, notadamente em seu artigo 121, inciso II, que estabelece a figura do responsável tributário como sujeito passivo da obrigação principal que, “sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei”. O artigo 128 do CTN, por sua vez, delimita os contornos da responsabilidade tributária, dispondo que “sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação”. O legislador, portanto, implementa a substituição tributária nas situações em que um terceiro, em virtude de suas relações específicas com o contribuinte original, possui condições favoráveis para colaborar com a administração tributária. Este terceiro, denominado substituto tributário, assume a responsabilidade de verificar a ocorrência do fato gerador praticado pelo contribuinte, realizar o cálculo do tributo devido e proceder ao seu recolhimento, utilizando recursos obtidos junto ao próprio contribuinte, seja mediante exigência direta ou por retenção na fonte. Vale ressaltar que a vinculação ao fato gerador, requisito expresso no artigo 128 do CTN, não necessita ser direta, podendo manifestar-se de forma indireta, desde que suficiente para justificar, sob o prisma da praticabilidade e eficiência da arrecadação, a atribuição da responsabilidade pelo recolhimento do tributo ao terceiro. Esse vínculo pode decorrer de relações jurídicas, econômicas ou operacionais que coloquem o substituto em posição privilegiada para fiscalizar a ocorrência do fato gerador ou para reter o valor do tributo. Dessa forma, a relação jurídica que vincula o substituto ao Fisco não possui natureza contributiva, mas essencialmente colaborativa. Sobre o assunto, o doutrinador Leandro Paulsen ensina que: “A substituição tributária existe para atender a princípios de racionalização e efetividade da tributação, ora simplificando os procedimentos, ora diminuindo as possibilidades de inadimplemento. Cuida-se de instituto que dá maior praticabilidade à tributação.O legislador pode estabelecer a substituição tributária nas hipóteses em que terceiro, em razão das suas particulares relações com o contribuinte, tenha a possibilidade de colaborar com o Fisco, verificando a ocorrência do fato gerador praticado pelo contribuinte e procedendo ao cálculo e ao recolhimento do tributo com recursos obtidos junto ao contribuinte, mediante exigência ou retenção.Pressupõe, assim, que o substituto efetivamente tenha “capacidade de colaboração”, ou seja, que esteja em situação que o habilite a proceder ao pagamento sem que tenha de suportar pessoalmente o ônus tributário. Isso porque a relação contributiva se dá entre o Fisco e o contribuinte, servindo o substituto como um facilitador do recolhimento do tributo, forte no seu dever de colaboração. A relação que vincula o substituto ao Fisco não tem natureza contributiva, mas colaborativa. A obrigação de retenção e de recolhimento “caracteriza-se como uma prestação de fazer preordenada ao cumprimento da obrigação tributária”. O substituto só poderá ser chamado a recolher o tributo com recursos próprios quando tenha descumprido suas obrigações de colaboração com o Fisco (retenção e recolhimento), pois tal o coloca na posição de garante pela satisfação do crédito tributário.O substituto tributário é o terceiro que a lei obriga a apurar o montante devido e cumprir a obrigação de pagamento do tributo “em lugar” do contribuinte. Mas, embora o substituto seja obrigado “em lugar” do contribuinte, não há o afastamento automático da responsabilidade do próprio contribuinte, o que depende de ter suportado a retenção ou de a lei expressamente afastar a sua responsabilidade.Note-se que, na substituição tributária, a obrigação surge diretamente para o substituto, a quem cabe substituir o contribuinte na apuração e no cumprimento da obrigação de pagar, total ou parcialmente, o tributo devido pelo contribuinte, mas com recursos alcançados pelo próprio contribuinte ou dele retidos (arts. 150, § 7º, da CF, 45, parágrafo único, e 128 do CTN e diversas leis ordinárias).” (PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário, São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 320, 321). Assim, conceitualmente, o substituto tributário é o terceiro que a lei obriga a apurar o montante devido e cumprir a obrigação de pagamento “em lugar” do contribuinte. Essa substituição, conforme dito, não afasta automaticamente a responsabilidade do contribuinte original, que permanece responsável a menos que tenha suportado a retenção ou que a lei expressamente exclua sua responsabilidade, conforme a parte final do artigo 128 do CTN. A doutrina classifica a substituição tributária em três categorias principais: substituição para frente, substituição para trás e substituição simultânea. Esta classificação considera tanto a posição do responsável na cadeia econômica quanto o momento da retenção em relação à ocorrência do fato gerador. Importante ressaltar que, em qualquer das modalidades de substituição tributária, devem ser observados os requisitos estabelecidos no artigo 128 do CTN, especialmente a vinculação ao fato gerador e a previsão legal expressa, garantindo-se assim a legitimidade do instituto e a segurança jurídica na relação tributária entre Fisco, contribuinte e substituto. Nessa mesma esteira, o Supremo Tribunal Federal já reconheceu, no julgamento do RE 603.191/MT, que: "EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. RETENÇÃO DE 11% ART. 31 DA LEI 8.212/91, COM A REDAÇÃO DA LEI 9.711/98. CONSTITUCIONALIDADE. 1. Na substituição tributária, sempre teremos duas normas: a) a norma tributária impositiva, que estabelece a relação contributiva entre o contribuinte e o fisco; b) a norma de substituição tributária, que estabelece a relação de colaboração entre outra pessoa e o fisco, atribuindo-lhe o dever de recolher o tributo em lugar do contribuinte. 2. A validade do regime de substituição tributária depende da atenção a certos limites no que diz respeito a cada uma dessas relações jurídicas. Não se pode admitir que a substituição tributária resulte em transgressão às normas de competência tributária e ao princípio da capacidade contributiva, ofendendo os direitos do contribuinte, porquanto o contribuinte não é substituído no seu dever fundamental de pagar tributos. A par disso, há os limites à própria instituição do dever de colaboração que asseguram o terceiro substituto contra o arbítrio do legislador. A colaboração dele exigida deve guardar respeito aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não se lhe podendo impor deveres inviáveis, excessivamente onerosos, desnecessários ou ineficazes. 3. Não há qualquer impedimento a que o legislador se valha de presunções para viabilizar a substituição tributária, desde que não lhes atribua caráter absoluto. (...) 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 7. Aos recursos sobrestados, que aguardavam a análise da matéria por este STF, aplica-se o art. 543-B, § 3º, do CPC." (STF, RE 603191, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, DJe 05-09-2011) Diante de todo esse contexto normativo, entendo que a concessionária, ao realizar a cobrança da COSIP junto a fatura de energia elétrica, detém, por força de expressa previsão legal (lei complementar municipal), vinculação indireta com o próprio fato gerador da exação, qual seja, o custeio do serviço de iluminação pública. Convém destacar que a Lei Municipal nº 10.411/2019, ao alterar a redação do artigo 6º da Lei Complementar Municipal nº 119/2002, estabeleceu expressamente a responsabilidade tributária por substituição à concessionária de energia elétrica, atendendo ao primeiro requisito legal. Tal atribuição deu-se de forma clara e inequívoca: “Art. 6º Fica atribuída a responsabilidade, na condição de substituta tributária, à empresa concessionária de serviço público de distribuição de energia elétrica que atue no Município de Goiânia, pelo recolhimento antecipado da Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública – COSIP, que é devida pelos contribuintes do art. 3º desta lei e que é cobrada juntamente com o talão tarifário, devendo o referido recolhimento antecipado ser realizado para a conta do Tesouro Municipal especialmente designada para tal fim, nos termos fixados em regulamento.” A exigência formal de lei expressa, portanto, prevista nos artigos 121, II, e 128 do CTN, encontra-se plenamente atendida pela legislação municipal em comento. As múltiplas vinculações existentes entre a concessionária de energia elétrica e o serviço de iluminação pública atendem ao requisito previsto no artigo 128 do CTN, legitimando sua eleição como responsável tributário. É dizer, há uma relação intrínseca entre a forma de cobrança prevista em lei (fatura de energia) e o fato gerador da contribuição, pois é justamente por meio dessa específica modalidade de arrecadação que se viabiliza e concretiza, em última análise, a própria finalidade do tributo. Tanto é assim que a possibilidade de se promover a cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica foi elevada à categoria constitucional (art. 149-A, parágrafo único), reforçando o entendimento de que a atuação da concessionária como responsável tributária em nada afronta a ordem jurídica vigente. A cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica, conforme facultado pelo art. 149-A da Constituição, estabelece uma vinculação jurídica entre a concessionária de energia e o fato gerador da contribuição, qual seja, a prestação do serviço de iluminação pública. Isso porque, ao utilizar a fatura de energia como veículo para a cobrança, o legislador constitucional reconheceu a estreita relação entre o fornecimento de energia elétrica e a viabilização do serviço de iluminação pública. Afinal, a distribuição de energia realizada pela concessionária é pressuposto indispensável para o funcionamento da iluminação pública, de modo que, ainda que não seja a responsável direta pela prestação do serviço, a concessionária acaba por assumir um papel essencial para a sua concretização. A partir do momento em que a concessionária passa a incluir a COSIP em suas faturas, por força de lei, ela se torna partícipe da relação jurídico-tributária, atuando não apenas como mera arrecadadora, mas como facilitadora da fiscalização e do recolhimento da contribuição. Essa participação, chancelada pelo texto constitucional, evidencia o vínculo, ainda que indireto, entre a atividade desempenhada pela concessionária e o fato gerador da COSIP. Registre-se que essa vinculação se justifica pela essencialidade do serviço de iluminação pública, que atende ao interesse de toda a coletividade. Nesse contexto, mostra-se razoável e legítima a imposição de obrigações instrumentais e de colaboração aos agentes que, de alguma forma, contribuem para a prestação do serviço, no caso as empresas responsáveis pelo fornecimento de energia elétrica. Assim, ao prever a cobrança da COSIP na fatura de energia, a própria Constituição, em seu art. 149-A, reconhece a existência desse vínculo entre a concessionária e a contribuição, chancelando a sua participação na relação jurídico-tributária para além da mera arrecadação, como agente facilitador da fiscalização e do recolhimento do tributo. Para frisar o que foi dito, temos que: "Vinculação operacional direta: A concessionária de energia elétrica é a fornecedora da energia que viabiliza o funcionamento do sistema de iluminação pública, estabelecendo relação direta com o elemento material do serviço prestado. Sem o fornecimento de energia elétrica, inexiste iluminação pública, evidenciando-se o nexo causal entre a atividade da concessionária e a consecução do serviço público em questão.Vinculação técnica: Conforme estabelece a Resolução Normativa ANEEL nº 1000/2021, as redes de iluminação pública frequentemente utilizam a infraestrutura de distribuição de energia elétrica, com instalação de luminárias em postes da concessionária, uso de sistemas de medição, entre outros elementos técnicos que evidenciam a interconexão física entre os serviços.Vinculação cadastral: A concessionária de energia elétrica dispõe de cadastro atualizado dos usuários/consumidores, o que permite a identificação precisa dos contribuintes da COSIP, estabelecendo relação instrumental direta com a gestão tributária da contribuição.Vinculação arrecadatória: O parágrafo único do art. 149-A da Constituição Federal expressamente faculta a cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica, reconhecendo a existência de relação jurídica que viabiliza a arrecadação eficiente do tributo.Vinculação finalística: Ambos os serviços - fornecimento de energia elétrica e iluminação pública - convergem para finalidade comum de prover energia e luminosidade aos usuários, estabelecendo nexo finalístico entre as atividades." No sentido da validade de normas semelhantes à aqui tratada, quanto a relação, ainda que indireta, da concessionária com o fato gerador, transcreve-se o seguinte precedente: "EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. Contribuição de Iluminação Pública (CIP). Município de Teodoro Sampaio. LCM nº 150/2021 que atribuiu à impetrante a responsabilidade tributária pela contribuição em apreço. Natureza jurídica tributária da contribuição (RE 573.675), definição do responsável tributário através da edição de legislação específica e relação da impetrante com o fato gerador, ainda que indireta, que validam a aludida atribuição. Exegese do artigo 149-A da Constituição Federal e dos artigos 121, Parágrafo único, II, e 128, ambos do CTN. Precedentes jurisprudenciais. Segurança denegada. Recurso desprovido." (Apelação Cível nº 1002170-55.2021.8.26.0627, 12ª Câmara de Direito Público, rel. Des. Osvaldo de Oliveira, DJe. 6.2.2024) Assim, a instituição da substituição tributária para a COSIP alinha-se aos princípios da praticabilidade e eficiência arrecadatória que norteiam o Direito Tributário contemporâneo. A concessionária de energia elétrica, ao incluir a contribuição nas faturas que emite, viabiliza arrecadação eficiente, com menores custos administrativos e maior alcance dos contribuintes. Esta sistemática encontra amparo no princípio constitucional da eficiência administrativa (art. 37, caput, CF) e no próprio parágrafo único do art. 149-A da Constituição Federal, que ao facultar a cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica, reconheceu a legitimidade deste mecanismo arrecadatório. O § 6º do artigo 6º da Lei Complementar Municipal nº 119/2002, com redação dada pela Lei nº 10.411/2019, estabelece que “a substituição tributária instituída no caput deste artigo independe do efetivo pagamento por parte do contribuinte do art. 3º desta Lei do talão tarifário da concessionária de energia elétrica, onde é cobrada a Contribuição desta Lei”. Este dispositivo, ao determinar que a responsabilidade da concessionária subsiste mesmo diante da inadimplência do contribuinte, alinha-se à natureza da substituição tributária em sentido estrito, na qual o substituto assume integralmente a posição do contribuinte perante o Fisco. A sistemática adotada pelo legislador municipal encontra respaldo no princípio da indisponibilidade do interesse público e na garantia de continuidade do serviço de iluminação pública, essencial à segurança e bem-estar da coletividade. Ademais, a concessionária dispõe de mecanismos próprios para minimizar o risco de inadimplência, como a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica aos consumidores inadimplentes (observados os requisitos legais), o que lhe confere posição privilegiada para garantir o adimplemento das obrigações constantes da fatura, inclusive a COSIP. A independência do efetivo pagamento pelo contribuinte é característica inerente a diversas modalidades de substituição tributária no ordenamento jurídico brasileiro, como se verifica, por exemplo, na retenção do IRRF pelos empregadores ou na substituição tributária do ICMS, onde o substituto responde pelo tributo independentemente do efetivo recebimento do valor correspondente do substituído. Portanto, à luz dessas considerações e em consonância com o que restou decidido pelo Órgão Especial deste Tribunal no julgamento da arguição de inconstitucionalidade, a Lei Municipal Complementar nº 119/2002, com redação dada pela Lei Municipal nº 10.411/2019, ao atribuir à concessionária de energia a responsabilidade tributária pela COSIP, não extrapolou os limites do art. 128 do CTN, haja vista a presença de uma vinculação, ainda que indireta, entre a atividade desempenhada pela empresa e o fato gerador da contribuição, o que confere sustentação à opção legislativa adotada pelo município de Goiânia. Esse é o entendimento que vem se firmando nos Tribunais pátrios, senão vejamos: "PROCESSO Energia elétrica – Fornecimento – Concessionária – CIP – Substituição tributária – Afastamento – Impossibilidade: – O plenário do STF, ao apreciar o RE 573.675, com repercussão geral reconhecida (Tema nº 44) decidiu pela constitucionalidade da exigência da CIP . – A responsabilidade tributária por substituição, atribuída à empresa concessionária de serviço público de distribuição de energia, não ofende os princípios constitucionais nem a legislação." (TJSP, AC 1002321-94.2017.8.26.0066, Rel. Des. Teresa Ramos Marques, 10ª Câmara de Direito Público, DJe 30/04/2020, g.) "APELAÇÃO - Município de Bauru - Contribuição para Custeio de Iluminação Pública (CIP) - Natureza tributária da CIP - Constitucionalidade da lei municipal que a instituiu - Regime de substituição tributária instituído pelo art. 6º da Lei Municipal nº 6.475/2013 que alterou a Lei Municipal nº 5.075/2003 - Constitucionalidade e sintonia com o Código Tributário Nacional - Inteligência dos arts. 121, II e 128, ambos do CTN, e do art. 149-A, parágrafo único, da CF. Recurso desprovido. 1. O pleno do C. STF, ao apreciar Recurso Extraordinário (RE nº 573.675-0), com repercussão geral reconhecida, decidiu pela constitucionalidade da exigência da CIP. 2. Para a CIP, a responsabilidade tributária por substituição, atribuída à empresa concessionária de serviço público de distribuição de energia pelo art. 6º da Lei Municipal nº 6.475/2013 do Município de Bauru, não ofende a Constituição Federal nem a legislação infraconstitucional, mas tem harmonia com o prescrito nos arts. 121, II, e 128, ambos do CTN e 149-A, parágrafo único, da Constituição Federal, observado os pressupostos jurídicos do instituto: (a) natureza jurídica tributária da COSIP, (b) expressa responsabilidade do terceiro decorrente de lei; (c) vinculação da empresa concessionária ao fato jurígeno do substituído, atento, no caso, ao especial regime jurídico do contribuinte." (TJSP, AC 1001141-96.2015.8.26.0071 Rel. Des. Vicente de Abreu Amadei, 1ª Câmara de Direito Público, DJe 13/12/2017, g.) "APELAÇÃO – CONTRIBUIÇÃO PARA CUSTEIO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – MUNICÍPIO DE DIRCE REIS – Municipalidade que almeja compelir a concessionária de serviço público a reter e repassar à Administração o valor pecuniário correspondente à contribuição – Possibilidade – Natureza tributária da contribuição já reconhecida pelo C. STF – Previsão da arrecadação do tributo pela concessionária de serviço público prevista na legislação municipal – Vinculação da ré com o fato gerador, por fim, evidenciado na espécie – Sentença de procedência confirmada – Negado provimento ao recurso." (TJSP, AC 1007162-89.2015.8.26.0297, Rel. Des. Rubens Rihl, 1ª Câmara de Direito Público, DJe 02/02/2017) Assim, à toda evidência, não há falar em afronta aos artigos 121, inciso II e 128 do CTN, vez que positivada de maneira expressa, via lei complementar municipal, a responsabilidade por substituição tributária da concessionária no que concerne à arrecadação da COSIP, com a qual guarda vinculação, na forma acima explicitada. Nesse contexto, a Lei Municipal Complementar nº 119/2002, com redação dada pela Lei Municipal nº 10.411/2019, ao atribuir à CELG a responsabilidade tributária pela COSIP, atuou dentro dos limites constitucionais e legais. A norma municipal encontra respaldo tanto no art. 149-A da Constituição Federal quanto no art. 128 do CTN. Ademais, a atribuição de responsabilidade tributária à concessionária atende ao princípio da praticidade da tributação, viabilizando a arrecadação eficiente do tributo. Relativamente à pretensão subsidiária deduzida, uma vez constatada a legitimidade da atribuição da responsabilidade tributária à apelada, não há que se cogitar da modulação dos efeitos da norma municipal, com a fixação do termo inicial da exigibilidade apenas após o trânsito em julgado. A apelada sustenta, ainda, que não poderia ser compelida a prestar o serviço de arrecadação da COSIP sem a devida contraprestação financeira, argumentando que tal imposição violaria princípios constitucionais e o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão. Ocorre que o artigo 6ª.A, da Lei Municipal Complementar nº 119/2002, com redação dada pela Lei Municipal nº 10.411/2019 exclui, expressamente qualquer possibilidade de contraprestação financeira pelo serviço de arrecadação da COSIP: “Art. 6º-A O recolhimento mencionado no caput do art. 6º desta Lei deverá ser realizado pela concessionária de serviço público de distribuição de energia elétrica em favor do Tesouro Municipal em seu valor bruto, ficando proibida qualquer retenção de valores para fins de compensação de créditos e débitos recíprocos da Concessionária e do Município.” A apelada argumenta também que a política tarifária regulada pela ANEEL impediria o repasse dos custos operacionais advindos da responsabilidade tributária, gerando desequilíbrio econômico-financeiro. A questão, contudo, deve ser analisada sob a ótica do direito regulatório. Eventuais impactos nos custos operacionais da concessionária devem ser endereçados no âmbito dos mecanismos de revisão tarifária previstos no contrato de concessão, não constituindo óbice à atribuição de responsabilidade tributária legalmente instituída. Inexiste no ordenamento jurídico vigente dispositivo legal que estabeleça a obrigatoriedade de celebração de instrumento contratual ou contraprestação pecuniária para a referida atividade arrecadatória. Em sede normativa infralegal, a Resolução Normativa nº 414/2010 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), com alterações introduzidas pela Resolução Normativa nº 888/2020 da mesma autarquia reguladora, preceituava em seu art. 26-C que “a contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, instituída pela legislação do poder municipal ou distrital, deve ser cobrada pelas distribuidoras nas faturas de energia elétrica nas condições previstas nessa legislação e demais atos normativos desses poderes”, estabelecendo expressamente em seu § 1º que “a arrecadação de que trata o caput deve ser realizada pela distribuidora de forma não onerosa ao poder público municipal ou distrital.” No contexto normativo atual, impende salientar que o artigo 476, § 1º, da Resolução Normativa nº 1.000/2021 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), diploma normativo que revogou a supramencionada Resolução nº 414/2010, manteve o caráter não oneroso da atividade arrecadatória ao dispor que “a arrecadação disposta no caput deve ser realizada pela distribuidora de forma não onerosa ao poder público municipal, com os custos tratados pela metodologia de custos operacionais regulatórios definida nos Procedimentos de Regulação Tarifária – PRORET”, conforme redação conferida pela REN ANEEL 1.115, de 01.04.2025. Em face do exposto, resta inequívoco o afastamento de qualquer pretensão concernente à contraprestação pecuniária pela atividade arrecadatória da COSIP. O arcabouço normativo vigente, materializado tanto na legislação pretérita quanto na atual regulamentação emanada da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), estabelece de forma cristalina o caráter não oneroso dessa atividade em relação ao poder público municipal. A exegese sistemática das disposições normativas supramencionadas não comporta interpretação diversa, haja vista a expressa previsão de que tais custos operacionais já se encontram contemplados na metodologia regulatória tarifária estabelecida nos Procedimentos de Regulação Tarifária – PRORET. Destarte, improcede qualquer pleito de remuneração adicional, sob pena de caracterizar enriquecimento sem causa e violação ao princípio da legalidade estrita que norteia a Administração Pública. Conclui-se, portanto, pela total improcedência da pretensão de contraprestação financeira pela atividade arrecadatória em comento, devendo ser mantida a gratuidade expressamente prevista no ordenamento jurídico-regulatório aplicável à espécie. A existência do Convênio nº 010/2005 não impede a instituição do novo regime legal de responsabilidade tributária. O poder-dever de instituir e arrecadar tributos é indisponível e não pode ser limitado por acordos administrativos pretéritos. A Lei Municipal Complementar nº 119/2002, com redação dada pela Lei Municipal nº 10.411/2019, ao estabelecer novo regime jurídico para a arrecadação da COSIP, revogou tacitamente as disposições em contrário, inclusive aquelas previstas em convênios anteriores, por se tratar de norma posterior hierarquicamente superior. Embora a apelada questione os efeitos retroativos da lei, é princípio basilar que as normas que estabelecem sujeição passiva tributária têm aplicação imediata, respeitados os princípios da anterioridade e nonagesimal quando cabíveis. No caso específico da COSIP, por não haver limitação constitucional quanto à anterioridade nonagesimal (art. 149-A c/c art. 150, III, da CF), a nova sistemática de responsabilidade tributária passa a viger no exercício financeiro seguinte ao da publicação da lei. Por fim, não há que se falar em invasão da competência regulatória da ANEEL. A atribuição de responsabilidade tributária é matéria tipicamente tributária, inserida na competência constitucional dos Municípios, não se confundindo com a regulação do serviço de energia elétrica. O próprio parecer da Procuradoria Federal junto à ANEEL (Parecer nº 00322/2016/PFANEEL/PGF/AGU) reconheceu a possibilidade jurídica da atribuição de responsabilidade tributária às concessionárias, desde que por lei, como ocorre no presente caso. Portanto, deve se dar provimento ao apelo do município. 4. Dos honorários sucumbenciais No caso dos honorários sucumbenciais, ressalto que o apelante postulou pela aplicação da equidade no caso de manutenção dos termos da sentença, logo, diante de sua modificação, não há que se acolher o pedido do Município. Portanto, passo a analisar a sucumbência com base nos critérios de fixação dos honorários sucumbenciais. Quanto aos honorários advocatícios, com a reforma da sentença, deve ser analisado a luz do art. 85, § 2º do CPC e do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 1076: “O § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 se aplica apenas quando o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem inestimáveis ou irrisórios; não se admitindo a sua aplicação por equidade quando inaplicáveis os §§ 2º ou 3º do mesmo artigo, os quais reservam ao juízo a fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais segundo o trabalho desenvolvido, dentro dos limites percentuais estabelecidos” (REsp 1.906.618/SP). No caso em análise, o valor atribuído à causa é de R$ 4.514.466,75 (quatro milhões, quinhentos e quatorze mil, quatrocentos e sessenta e seis reais e setenta e cinco centavos), conforme retificação realizada pela parte autora após impugnação do Município. Sendo estimável o valor da causa e expressivo o proveito econômico, não há como afastar a aplicação do art. 85, § 2º do CPC, que estabelece: “Art. 85. Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:I - o grau de zelo do profissional;]II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.” Considerando os critérios legais: a) O grau de zelo dos profissionais que atuaram no feito foi adequado, com apresentação de peças bem fundamentadas; O serviço foi prestado na capital do Estado, não demandando deslocamentos; c) A causa possui relevância significativa, envolvendo questão tributária de interesse público; d) O trabalho realizado pelos advogados envolveu a elaboração de petição inicial, resposta à contestação e participação nos demais atos processuais, sem necessidade de produção de outras provas ou incidentes complexos. Assim, considerando as peculiaridades do caso e os parâmetros legais, fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, atendendo ao patamar mínimo previsto no art. 85, § 2º do CPC, o que resulta em R$ 451.446,67 (quatrocentos e cinquenta e um mil, quatrocentos e quarenta e seis reais e sessenta e sete centavos). Este valor, embora expressivo em termos absolutos, decorre da aplicação objetiva dos critérios legais e do entendimento vinculante do STJ, que não mais admite a fixação por equidade em causas de valor elevado quando possível a aplicação do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC. Ante o exposto, CONHEÇO da APELAÇÃO CÍVEL e da REMESSA NECESSÁRIA e DOU-LHES PROVIMENTO para: a) Reformar a sentença, julgando IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, reconhecendo a legalidade da Lei Municipal nº 10.411/2019 que alterou a Lei Municipal Complementar nº 119/2002, e a legitimidade da atribuição de responsabilidade tributária à CELG; b) Condenar a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor dado à causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, considerando a natureza da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido para o seu serviço. É como voto. Goiânia, data da assinatura eletrônica. Desembargador ÁTILA NAVES AMARALRELATOR(Assinado conforme Resolução n.º 59/2016) DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL Nº 5028613-62.2020.8.09.0051COMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE : MUNICÍPIO DE GOIÂNIAAPELADA : CELG DISTRIBUIÇÃO S/A - CELG DRELATOR : DESEMBARGADOR ÁTILA NAVES AMARALEMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA (COSIP). CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. LEGALIDADE.I. CASO EM EXAME Apelação cível e remessa necessária interpostas pelo Município contra sentença que julgou procedente ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária ajuizada por concessionária de distribuição de energia elétrica. A sentença declarou a inconstitucionalidade incidental dos artigos 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/02, que atribuíram à concessionária a responsabilidade tributária, por substituição, pelo pagamento da COSIP, além de determinar a remuneração pelo serviço auxiliar de arrecadação.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Determinar se (i) é constitucional a atribuição de responsabilidade tributária por substituição à concessionária de distribuição de energia elétrica para arrecadação da COSIP; (ii) a Lei Municipal nº 10.411/2019, que alterou a Lei Complementar Municipal nº 119/2002, viola os artigos 121, II, e 128 do CTN; (iii) o serviço de arrecadação da COSIP pela concessionária deve ser necessariamente remunerado.III. RAZÕES DE DECIDIR 1. O Órgão Especial do Tribunal de Justiça, no julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, rejeitou a tese de inconstitucionalidade dos artigos 6º e 6º-A da Lei Complementar Municipal nº 119/2002, por entender que a matéria envolve crise de legalidade e não de constitucionalidade. 2. A Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (COSIP) foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda Constitucional nº 39/2002, que acrescentou o artigo 149-A à Constituição Federal. 3. A competência legislativa para instituir a COSIP é exclusiva dos Municípios e do Distrito Federal, como manifestação da autonomia federativa assegurada pela Constituição Federal. 4. A substituição tributária constitui mecanismo de racionalização e efetividade da tributação, proporcionando simplificação de procedimentos arrecadatórios e redução das possibilidades de inadimplemento fiscal. 5. A vinculação ao fato gerador, requisito expresso no artigo 128 do CTN, não necessita ser direta, podendo manifestar-se de forma indireta, desde que suficiente para justificar a atribuição da responsabilidade pelo recolhimento do tributo ao terceiro. 6. A concessionária, ao realizar a cobrança da COSIP junto à fatura de energia elétrica, detém vinculação indireta com o próprio fato gerador da exação, qual seja, o custeio do serviço de iluminação pública. Precedente: “(…) Ante a natureza jurídica tributária da contribuição (RE 573.675), a definição do responsável tributário através da edição de legislação específica, a saber, a Lei Complementar Municipal nº 150/20211, e a relação da impetrante com o fato gerador, ainda que indireta, uma vez que a cobrança está atrelada ao consumo, pelo substituído, da energia elétrica fornecida, tem-se por constitucional a condição imputada à impetrante pela norma municipal.” (Apelação Cível nº 1002170-55.2021.8.26.0627, 12ª Câmara de Direito Público, rel. Des. Osvaldo de Oliveira, DJe. 6.2.2024) 7. A Lei Municipal nº 10.411/2019, ao alterar a redação do artigo 6º da Lei Complementar Municipal nº 119/2002, estabeleceu expressamente a responsabilidade tributária por substituição à concessionária de energia elétrica. 8. Existe relação intrínseca entre a forma de cobrança prevista em lei (fatura de energia) e o fato gerador da contribuição, pois é por meio dessa específica modalidade de arrecadação que se viabiliza a finalidade do tributo. 9. A atribuição de responsabilidade tributária à concessionária atende ao princípio da praticidade da tributação, viabilizando a arrecadação eficiente do tributo. 10. Inexiste no ordenamento jurídico vigente dispositivo legal que estabeleça a obrigatoriedade de celebração de instrumento contratual ou contraprestação pecuniária para a atividade arrecadatória. 11. O artigo 476, § 1º, da Resolução Normativa nº 1.000/2021 da ANEEL dispõe que a arrecadação deve ser realizada pela distribuidora de forma não onerosa ao poder público municipal.IV. TESES 1. É legal a atribuição, por lei municipal, de responsabilidade tributária por substituição à concessionária de serviço público de distribuição de energia elétrica para arrecadação da COSIP, desde que expressamente prevista. 2. A vinculação entre a concessionária de energia elétrica e o fato gerador da COSIP pode ser indireta, em razão da relação intrínseca entre a forma de cobrança e a finalidade do tributo. 3. A arrecadação da COSIP pela concessionária de energia elétrica deve ser realizada de forma não onerosa ao poder público municipal, conforme previsto na regulamentação da ANEEL.V. DISPOSITIVO Recurso conhecido e provido.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 149-A, art. 150, § 7º; CTN, arts. 121, II, e 128; Lei Complementar Municipal nº 119/2002, arts. 6º e 6º-A; Lei Municipal nº 10.411/2019; Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021, art. 476, § 1º.Jurisprudência relevante citada: STF, RE 603191, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, DJe 05-09-2011; TJSP, AC 1002321-94.2017.8.26.0066, Rel. Des. Teresa Ramos Marques, 10ª Câmara de Direito Público, DJe 30/04/2020; TJSP, AC 1001141-96.2015.8.26.0071 Rel. Des. Vicente de Abreu Amadei, 1ª Câmara de Direito Público, DJe 13/12/2017; TJSP, AC 1007162-89.2015.8.26.0297, Rel. Des. Rubens Rihl, 1ª Câmara de Direito Público, DJe 02/02/2017; TJSP, AC 1002170-55.2021.8.26.0627, 12ª Câmara de Direito Público, rel. Des. Osvaldo de Oliveira, DJe 06/02/2024). A C Ó R D Ã O VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos do Duplo Grau de Jurisdição e Apelação Cível n. 5028613-62.2020.8.09.0051, Comarca de Goiânia, sendo apelante MUNICÍPIO DE GOIÂNIA e apelada CELG DISTRIBUIÇÃO S/A - CELG D. ACORDAM os componentes da Segunda Turma Julgadora da 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, em votação ampliada, por maioria, em conhecer e prover parcialmente da Remessa Necessária e Apelação Cível, nos termos do voto do Redator. VOTOU, com o Relator, a Desembargadora Sirlei Martins da Costa ACOMPANHAM A DIVERGÊNCIA, os Desembargadores William Costa Mello e Héber Carlos de Oliveira. PRESIDIU o julgamento o Desembargador Altair Guerra da Costa. PRESENTE o Dr. Mozart Brum Silva, Procurador de Justiça. Goiânia, 24 de junho de 2025. Desembargador ÁTILA NAVES AMARALRELATOR(Datado e assinado conforme Resolução nº 59/2016)

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Processo nº 1020556-26.2025.8.11.0041

ID: 333428116

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS Classe: AçãO POPULAR Nº Processo: 1020556-26.2025.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

VIA BRASIL MT 320 CONCESSIONARIA DE RODOVIAS S.A.

Intimação

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS DA COMARCA DE CUIABÁ-MT PROCESSO: 1020556-26.2025.8.11.0041 Vistos, Trata-se de Ação Popular ajuizada por FAISSAL JORGE CA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS DA COMARCA DE CUIABÁ-MT PROCESSO: 1020556-26.2025.8.11.0041 Vistos, Trata-se de Ação Popular ajuizada por FAISSAL JORGE CALIL FILHO em face de VIA BRASIL MT CONCESSIONÁRIA DE RODOVIAS S.A., ESTADO DE MATO GROSSO e AGÊNCIA ESTADUAL DE REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DELEGADOS DO ESTADO DE MATO GROSSO — AGER/MT, com pedido de tutela de urgência, objetivando a suspensão do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA, em razão de supostas ilegalidades que causariam prejuízo ao patrimônio público e afrontado princípios constitucionais. Consoante narrado na petição inicial, o contrato original teve como objeto a administração, manutenção, recuperação, operação e implantação de melhorias nos trechos das rodovias MT-320 e MT-208, com previsão de investimentos iniciais de aproximadamente R$ 1,9 bilhão, além de previsão de outorga variável em favor do Estado. Segundo expõe o autor, a concessionária VIA BRASIL MT venceu a licitação e assumiu os riscos ordinários do negócio, conforme previsto no contrato e na matriz de riscos. Entretanto, a empresa teria descumprido reiteradamente suas obrigações contratuais, deixando de realizar obras essenciais e comprometendo a segurança viária, situação confirmada inclusive em sentença proferida na Ação Civil Pública nº 1002321-84.2023.8.11.0007, que tramitou na 5ª Vara da Comarca de Alta Floresta e condenou a concessionária ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. O autor afirma que, em 2 de janeiro de 2025, foi celebrado o 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão, pelo qual foram promovidas alterações substanciais em favor da concessionária, como a isenção da obrigação de recolher a outorga variável, a exclusão de obras obrigatórias e a prorrogação antecipada do contrato, medidas que implicariam desvio de finalidade e lesão ao erário. Aduz que a concessionária apresentava evolução positiva nas receitas, inexistindo justificativa técnica ou contábil que embasasse a alegação de desequilíbrio econômico-financeiro. Sustenta que, ao participar do certame, a empresa já tinha pleno conhecimento das normas que tratavam da isenção de eixos suspensos, não podendo invocar posteriormente tal circunstância para pleitear reequilíbrio. O autor alega ainda que a isenção da outorga variável “não apenas viola os princípios da moralidade, eficiência e interesse público, mas também impõe ao Estado um ônus financeiro desproporcional e injustificado”, bem como que “a exclusão da pavimentação dos acostamentos e demais obras essenciais é juridicamente insustentável, moralmente inadmissível e socialmente danosa, revelando uma afronta direta à dignidade dos usuários da via, ao erário público e ao próprio Estado de Direito” (Id. 188712176 - Pág. 8 e 10). Afirma que “a motivação apresentada para o aditivo configura hipótese clássica de inexistência dos motivos, conforme previsto no art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65 (Lei da Ação Popular), segundo o qual são nulos os atos administrativos fundamentados em matéria de fato ou de direito materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido” (Id. 188712176 - Pág. 11). Argumenta que o reequilíbrio econômico-financeiro “não pode ser deturpado para compensar riscos inerentes ao negócio ou falhas de planejamento e gestão da própria concessionária”, assim como que “somente se justifica diante de eventos supervenientes, imprevisíveis e alheios à vontade das partes, nos termos do art. 124, II, "d", da Lei nº 14.133/2021” (Id. 188712176 - Pág. 25). Ao final, o autor popular requer a concessão de liminar para suspender imediatamente os efeitos do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA e, no mérito, a procedência do pedido para declarar a nulidade do referido termo aditivo e, subsidiariamente, a rescisão do próprio contrato de concessão. Em decisão inicial, este Juízo entendeu pela necessidade de oportunizar o contraditório, determinando a oitiva prévia do Estado de Mato Grosso e da AGER/MT antes da análise do pedido de tutela de urgência, com subsequente intimação do Ministério Público para manifestação como fiscal do ordenamento jurídico. Em cumprimento ao despacho, a AGER/MT apresentou manifestação prévia na qual suscitou preliminar de ilegitimidade passiva e, no mérito, defendeu a regularidade do 4º Termo Aditivo, argumentando que o reequilíbrio econômico-financeiro era necessário para compensar eventos extraordinários, como a isenção de tarifas na “Praça P3” para moradores de Alta Floresta e a proibição nacional de cobrança de pedágio sobre eixos suspensos. O Ministério Público, ao ser intimado, apresentou manifestação na qual opinou pelo deferimento da tutela de urgência para suspender os efeitos do 4º Termo Aditivo, destacando a presença de indícios de violação aos princípios da legalidade, moralidade, eficiência e supremacia do interesse público, previstos no art. 37 da Constituição Federal, além de possíveis desvios de finalidade e inexistência de motivos válidos, nos termos do art. 2º da Lei nº 4.717/65. O Estado de Mato Grosso, devidamente intimado, não apresentou manifestação no prazo legal, conforme certificado nos autos (Id. 192758820). É a síntese. DECIDO. 1. Ilegitimidade Passiva da AGER/MT: A AGER/MT, em sua manifestação prévia, arguiu sua ilegitimidade passiva para figurar na presente ação popular, sob o argumento de que, na condição de interveniente anuente, não possui poder decisório sobre o conteúdo contratual, atuando apenas na regulação e fiscalização do contrato. Em que pese os argumentos apresentados, em sede de cognição sumária, entendo que a alegação de ilegitimidade passiva da AGER/MT não merece prosperar neste momento processual. Isso porque, conforme narrado na petição inicial, a AGER/MT, na qualidade de Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Estado de Mato Grosso, é responsável por fiscalizar e regular a execução do contrato de concessão, inclusive no que se refere ao cumprimento das obrigações contratuais e à preservação do equilíbrio econômico-financeiro. Consoante o disposto no art. 6º da Lei nº 4.717/65, a “ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo”. E, consoante se extrai do próprio termo aditivo, a AGER/MT figurou como interveniente-anuente, tendo inclusive emitido a Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER (Id. 192533435 – Pág. 46), que foi referida no Parecer Jurídico nº 3364/SGAC/PGE/2024, o qual, por sua vez, consta dos fundamentos do termo aditivo (Id. 188712190 - Pág. 1). Ademais, a análise da responsabilidade da agência demanda uma instrução probatória mais aprofundada, a fim de verificar se a agência atuou de forma diligente na fiscalização e regulação do contrato, ou se houve alguma omissão ou falha que tenha contribuído para a ocorrência dos prejuízos alegados pelo autor. Portanto, em sede de cognição sumária, entendo que a AGER/MT possui legitimidade passiva para figurar na presente ação popular, sem prejuízo de uma análise mais aprofundada da questão após a instrução probatória. 2. Tutela de Urgência: Segundo a sistemática processual, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência, sendo que a tutela provisória de urgência pode ser de natureza cautelar ou satisfativa, assim como ser concedida em caráter antecedente ou incidental (art. 294, CPC). No que se refere especificamente à tutela de urgência, o regime geral está preconizado nos artigos 300 e 301 do Código de Processo Civil, que unificou os pressupostos fundamentais para a sua concessão, seja na sua natureza satisfativa, seja na cautelar. Veja-se: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito”. E, nos termos dos artigos 7º e 22 da Lei nº 4.717/65, aplicam-se na Ação Popular, no que for cabível, o procedimento ordinário e as demais regras do Código de Processo Civil. Ademais, por expressa disposição contida no art. 5º, § 4º, da Lei nº 4.717/65, “caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado” na defesa do patrimônio público. Portanto, para a concessão de tutela antecipada em Ação Popular, mister que estejam presentes os robustos requisitos legais, quais sejam, a probabilidade do direito, a inexistência de perigo de irreversibilidade do provimento a ser concedido e, finalmente, um dos requisitos alternativos, que são receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Além dos requisitos supracitados, por força do disposto na Lei nº8.437/1992, que dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público,“não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação” (art. 1º, § 3º). É com enfoque nessas normativas que se aprecia o pedido de tutela antecipada em questão. Consoante exposto no relatório, o objeto da presente demanda é o 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA e, subsidiariamente, o próprio contrato. O autor alega, em síntese, que houve descumprimento contratual pela concessionária, assim como alterações substanciais no contrato por meio do 4º Termo Aditivo (isenção de outorga, exclusão de obras, prorrogação do contrato), sem justificativa válida para o reequilíbrio econômico-financeiro No caso em tela, após análise minuciosa dos autos, entendo que os requisitos autorizadores da medida liminar pleiteada foram suficientemente demonstrados, de modo a justificar a intervenção judicial imediata, conforme exposto nos tópicos a seguir. 2.1. Exclusão da Outorga Variável: O 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019, celebrado entre a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (SINFRA), a Agência Estadual de Regulação - AGER e a concessionária Via Brasil MT 320, de fato, procedeu com a exclusão da obrigação de pagamento da outorga variável a partir do sexto ano de concessão (Cláusula 1.1.3, Id. 188712190 - Pág. 4). De acordo com o contrato original, até o quinto ano, a concessionária deveria repassar ao Poder Concedente o valor correspondente a 1% (um por cento) da receita tarifária bruta, mas a partir do sexto ano, esse percentual foi reduzido a 0% (zero por cento), isentando completamente a empresa desta obrigação futura. Insta anotar que, ao contrário do sustentado pela AGER em sua manifestação prévia, o impacto econômico aos cofres públicos tem efeito imediato. Com efeito, de acordo com os documentos anexos extraídos do site oficial da AGER (https://www.ager.mt.gov.br/contratos), é possível confirmar que o 6º ano da concessão já se iniciou. Conforme a Cláusula 5.1 do contrato de concessão, o prazo da concessão é de 30 (trinta) anos, contados da data de assinatura do Termo de Transferência do Sistema Rodoviário, sendo possível sua prorrogação em hipóteses previstas no contrato e na legislação aplicável. E, em consulta ao Termo de Transferência disponível no referido site, observa-se que a formalização do ato de transferência ocorreu em 27 de maio de 2019, data em que se deu o efetivo início da contagem do prazo contratual, marcando o ponto de partida para todos os prazos contratuais, inclusive os de execução de obras, cumprimento de etapas e pagamento da outorga variável. Portanto, considerando que a contagem do prazo começou em maio de 2019, o 6º ano da concessão teve início em maio de 2025, momento em que passou a vigorar a nova redação do termo aditivo que zerou o pagamento da outorga variável. Ocorre que, com base nos demonstrativos financeiros de 2022 e no balanço intermediário de 2023 acostados à petição inicial (Id. 188714545 e Id. 188714546), a receita operacional com a arrecadação de pedágio foi de R$ 49,6 milhões em 2022 (Id. 188714545 - Pág. 33) e alcançou R$ 37,7 milhões apenas no primeiro semestre de 2023, indicando tendência de crescimento consistente. Por simples raciocínio matemático, considerando apenas a receita de 2022 (sem qualquer projeção de crescimento futuro), é possível concluir que a exclusão da outorga variável implicará numa perda de aproximadamente R$ 490.000,00 (quatrocentos e noventa mil reais) por ano ao erário estadual, considerando apenas a faixa histórica de receita. Ao longo dos aproximadamente trinta anos restantes de contrato, a perda acumulada pode superar quatorze milhões em valores correntes, sem considerar a evolução do tráfego, o que pode potencializar o impacto negativo para o Estado. Presente neste aspecto, portanto, a probabilidade do direito alegado pelo autor, uma vez que os documentos e dados financeiros juntados aos autos demonstram de forma concreta a existência de potencial e imediata lesão ao patrimônio público, decorrente da exclusão imediata da outorga variável. 2.2. Prorrogação do Prazo Contratual: O termo aditivo em análise também prevê a extensão do prazo da concessão em cinco anos e meio (5,58 anos), consoante se extrai da Cláusula 1.1.1, segundo a qual o “PRAZO DA CONCESSÃO é de 35,58 (trinta e cinco vírgula cinquenta e oito anos), contados da data de assinatura do TERMO DE TRANSFERÊNCIA do SISTEMA RODOVIÁRIO (Id. 188712190 - Pág. 3). Essa prorrogação foi justificada como contrapartida financeira para a concessionária, no contexto do alegado reequilíbrio econômico-financeiro, porém implica alongamento do período de arrecadação de pedágio sem a correspondente contrapartida proporcional de investimentos em melhorias originalmente previstas. Além disso, como já exposto no tópico anterior, os demonstrativos financeiros de 2022 e do primeiro semestre de 2023 demostram que a concessionária mantém arrecadação robusta, com tendência de crescimento anual e aumento de fluxo de veículos. Destarte, o alongamento do prazo contratual, como alteração aceita pela concessionária, reforça o potencial econômico da concessão e, aliado à exclusão da outorga variável, reduz o retorno financeiro ao Estado, ferindo o interesse público. 2.3. Supressão e postergação de Obras Essenciais: Além da exclusão da outorga e da prorrogação contratual, verifico que o aditivo promoveu uma ampla reestruturação no cronograma e no escopo das obras previstas, conforme previsto na Cláusula 1.1.4 (Id. 188712190 - Pág. 4). Diversos acostamentos foram excluídos em praticamente todos os segmentos da rodovia, como no trecho entre Nova Santa Helena e Colíder, em que 29,7 km de acostamentos pavimentados foram suprimidos. O mesmo ocorreu no trecho entre Nova Canaã do Norte e Vila Del Rey, onde estavam previstos 48,7 km de acostamentos que também foram retirados. Não há dúvidas de que a exclusão desses acostamentos impacta diretamente a segurança dos usuários, já que eles são elementos fundamentais para a fluidez do tráfego e para emergências. Além disso, as obras de travessias de pedestres, originalmente previstas para ocorrer entre os anos 3 e 5, foram postergadas para o ano 6 ou além, dependendo do segmento. As readequações de interseções, que seriam executadas majoritariamente nos primeiros cinco anos, tiveram prazos estendidos, chegando em alguns casos a serem previstas apenas para o ano 12. Em segmentos como o perímetro urbano de Colíder e de Nova Canaã do Norte, baias para ônibus e vias marginais também foram adiadas para anos posteriores, quando anteriormente constavam no cronograma inicial para execução imediata. Anoto que, muito embora o aditivo contenha previsão no sentido de que a concessionária deve avaliar periodicamente a necessidade de reinserção das obras excluídas (Cláusulas 1.1.4.1, 1.1.4.2 e 1.1.4.3), essa obrigação de reinserção não tem caráter vinculativo imediato, o que, na prática, significa que as obras poderão nunca ser retomadas. Nesse diapasão, entendo que as supressões e postergações de obras essenciais, especialmente aquelas relacionadas à segurança viária, representam verdadeira diminuição das contrapartidas inicialmente assumidas pela concessionária, comprometendo diretamente a proteção dos usuários e a qualidade da prestação do serviço, razão pela qual se confirma a probabilidade do direito invocado pelo autor também neste aspecto. 2.4. Ausência de Motivo Válido: O autor sustenta, ainda, a nulidade do ato administrativo por ausência de motivo válido, na forma do art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65, que prevê a nulidade dos atos administrativos baseados em motivos materialmente inexistentes ou juridicamente inadequados ao resultado obtido. Com efeito, a Lei de Ação Popular aponta as hipóteses de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público, in verbis: “Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.” Ademais, a Constituição Federal, em seu artigo 37, resguarda os princípios norteadores da Administração Pública, os quais devem ser observados em toda e qualquer conduta administrativa. Assim, os atos administrativos devem observar os princípios constitucionais, quais sejam: legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade. In casu, infere-se, ao menos nessa seara inaugural, a possível violação ao princípio da proporcionalidade, além de aparente vício na motivação do ato. Em primeiro lugar, a análise do conjunto probatório revela que o alegado desequilíbrio econômico-financeiro que teria fundamentado o 4º Termo Aditivo não encontra respaldo em dados objetivos, haja vista os relatórios financeiros apresentados, que demonstram crescimento consistente das receitas de pedágio, afastando a tese de inviabilidade ou necessidade urgente de recomposição. Em segundo lugar, do processo administrativo que resultou na celebração do 4º Termo Aditivo, extrai-se que a revisão ordinária do contrato, motivada pelo desequilíbrio econômico-financeiro teria advindo, em primeiro plano, das isenções tarifárias concedidas aos veículos de carga que trafegam sem carga (com eixos suspensos), conforme disposições da Lei Federal n. 13.711/2018; e, em segundo plano, da isenção de cobrança de tarifa de pedágio na praça n.º 03 (Praça 3 – P3), situada no Município de Alta Floresta, em razão de decisão judicial emanada nos autos nº 1006566-46.2020.8.11.0007. Inicialmente, no que se refere à isenção decorrente da praça de pedágio 3, importante destacar que a supracitada ação se trata de Ação de Execução de Título Executivo Extrajudicial, sobre a qual foram opostos os Embargos à Execução nº 1001119-43.2021.8.11.0007, cuja sentença de procedência reconheceu a nulidade absoluta do título, com efeitos ex tunc, em razão de ausência de participação da Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso. E, em consulta aos autos nº 1006566-46.2020.8.11.0007 no Sistema PJe, este magistrado verificou que, no dia 07 do corrente mês, o Juízo competente exarou decisão que suspendeu o curso da execução, ante a atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto nos autos dos embargos. Logo, isenção de cobrança de tarifa de pedágio na Praça 3 se trata de matéria ainda sub judice, com efeito temporariamente suspenso. Por sua vez, no tocante às isenções decorrentes de disposição legal (eixos suspensos), há fator determinante que atesta a presença da probabilidade do direito alegado pela parte autora, qual seja, o fato de que a concessionária detinha plena ciência da alteração legislativa antes mesmo da assinatura do contrato. Consoante expôs o autor popular, a “isenção da cobrança de pedágio sobre eixos suspensos foi instituída ainda em 2018, por meio da Medida Provisória nº 833, internalizada no Estado de Mato Grosso pela Portaria SINFRA nº 074/2018”, sendo que a referida “norma já estava plenamente vigente quando, em 24 de agosto de 2018, a concessionária VIA BRASIL MT foi formalmente convocada a revalidar sua proposta de preço e posteriormente consolidada pela Lei Federal nº 13.711/2018” (Id. 188712176 - Pág. 17 e Id. 188714549). Com efeito, a Lei Federal nº 13.711/2018, que incluiu a isenção de cobrança de pedágio para veículos de carga com eixos suspensos, foi publicada em 24 de agosto de 2018, enquanto a assinatura do contrato de concessão em exame ocorreu apenas em 12 de abril de 2019 (Id. 192533438 - Pág. 278). Portanto, houve lapso superior a sete meses entre a mudança legislativa e a efetiva assinatura do contrato, período suficiente para que a concessionária tivesse não apenas conhecimento formal do novo regime jurídico, como também pudesse deliberar, de modo consciente e estratégico, sobre a conveniência da assinatura do contrato nos moldes originalmente propostos. Aliás, como bem ressaltado pelo autor popular, a concessionária foi formalmente convocada a revalidar sua proposta de preço em razão da superveniência da Lei Federal nº 13.711/2018, tendo confirmado a manutenção de sua proposta original, mesmo diante da alteração legislativa. Tal confirmação revela que a concessionária, ciente do novo regime de isenção dos eixos suspensos, assumiu o contrato de forma livre e informada, afastando qualquer alegação de surpresa ou imprevisibilidade quanto ao impacto econômico decorrente da referida legislação. Nesse ponto, é crucial destacar que, conforme disposto no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei nº. 8.666/1993 (vigente à época da assinatura do contrato, Id. 192533438 - Pág. 160), a equação econômico-financeira do contrato é protegida de uma série de fatores, desde fatos imputáveis à Administração Pública a fatos econômicos imprevisíveis que repercutem no contrato. Sob esse aspecto, tanto a doutrina administrativa quanto a jurisprudência vêm reconhecendo que o risco ordinário do negócio é transferido ao concessionário, cabendo a esse, de acordo com as características do ramo em que atua e dos riscos envolvidos à atividade mercantil, avaliar todos os riscos envolvidos desde o ato de elaboração de sua proposta até o momento da assinatura do contrato. Nesse sentido, esclarece a doutrina que: “Enquanto na teoria da imprevisão, conforme visto, há incidentes econômicos que alteram o equilíbrio econômico do contrato, as denominadas interferências ou sujeições imprevistas são, de acordo com definição de Hely Lopes Meirelles, “ocorrências materiais não cogitadas pelas partes na celebração do contrato mas que surgem na sua execução de modo surpreendente e excepcional, dificultando e onerando extraordinariamente o prosseguimento e a conclusão dos trabalhos. Esclarece Celso Antônio Bandeira de Mello, apoiado em Benoît, que as sujeições imprevistas têm seu domínio de aplicação, por excelência, nos contratos de obras públicas. São situações anômalas, excepcionais, que não puderam ser previstas pelas partes, de forma razoável, quando da contratação, mas que tornam a execução contratual muito mais onerosa, permitindo, portanto, sua revisão. É exemplo de sujeição imprevista a descoberta de lençol d’água, quando da escavação de um túnel. Em suma, (...), a teoria da imprevisão aplica-se, conforme visto, em face de: (1) situações econômicas externas ao contrato, mas que nele repercutem, por exemplo, uma crise econômica anômala, que acaba desmantelando os preços de insumos relevantes para o equilíbrio contratual; (2) fatos, portanto, supervenientes, isto é, que geralmente não existiam, diferentemente das sujeições imprevistas que decorrem de fatos preexistentes; e (3) imprevisíveis, quando da contração, ou de consequências incalculáveis."[1] Da mesma forma caminha a jurisprudência pátria, in verbis: “DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ISENÇÃO TARIFÁRIA. LEI MUNICIPAL. CONTRATO DE CONCESSÃO. RODOVIA FEDERAL. INTERFERÊNCIA INDEVIDA. 1. A concessão de isenção de pedágio a determinados veículos afeta o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão de exploração de rodovia federal, criando imposição lesiva à concessionária que não existia à época da assinatura do contrato. 2. Hipótese de contrato de concessão celebrado com a União, a quem compete legislar sobre contratos de concessão administrativa, nos termos do art. 22, inc. XXVII, da Constituição Federal, sendo indevida interferência de município na política tarifária de serviço explorado pela União. 3. Agravo de instrumento desprovido”. (TRF 4ª R.; AG 5012789-54.2024.4.04.0000; Décima Segunda Turma; Rel. Des. Fed. João Pedro Gebran Neto; Julg. 21/08/2024; Publ. PJe 22/08/2024). Exatamente esse o caso dos autos, tendo em vista que a concessionária requerida, conhecendo previamente a existência de norma já vigente antes da assinatura do contrato que impactaria diretamente o equilíbrio da equação econômico-financeira, ainda assim optou por subscrever o contrato. Destarte, em consonância com os princípios administrativos da legalidade e da razoabilidade, a concessionária não pode ser beneficiada pelos valores que se consagrou vencedora, para depois, com base em fator preexistente à assinatura do contrato, do qual detinha pleno conhecimento, pedir a revisão dos preços ofertados. Aliás, muito embora a AGER, em sua manifestação prévia, tenha sustentado que a concessionária “deixou claro, ainda antes de assinar o contrato, que a isenção de eixos suspensos afetou o modelo proposto e que seria necessária a apuração para reequilibrá-lo” (Id. 192567312 - Pág. 10/11), tal observação, ao invés de servir como fundamento de legitimidade, reforça que se tratava de fato previsível, conhecido antes da assinatura do contrato, não caracterizando evento extraordinário ou imprevisível que justificasse o reequilíbrio nos moldes adotados. Essa interpretação é corroborada pela regra do art. 49 da Lei nº. 8.666/1993, que expressamente condicionava a revogação da licitação à verificação de fatos supervenientes. Portanto, ao assumir os compromissos do contrato com tais informações já públicas e vigentes, a concessionária o fez de forma consciente e voluntária, afastando, ao menos em sede de cognição sumária, a alegação de que a isenção dos eixos suspensos configuraria fato superveniente ou imprevisível apto a justificar a supressão da outorga variável ou outras medidas de reequilíbrio que onerem o interesse público. Com efeito, nos termos do art. 49 da Lei nº 8.666/1993, vigente à época da licitação, a Administração Pública somente poderia revogar o certame “por razões de interesse público decorrentes de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta”. Assim, uma vez identificado fato superveniente relevante — como a promulgação da Lei nº 13.711/2018 —, e convocados os licitantes para que, cientes da nova realidade normativa, pudessem decidir, de forma expressa, se manteriam suas propostas ou se delas desistiriam, competiria à autora ter se recusado a mater a proposta inicial. Nesse contexto, a resposta da concessionária à convocação para revalidação de sua proposta, nos termos do edital, revestiu-se de inequívoca manifestação de vontade, revelando plena aceitação das novas condições vigentes. Logo, ou a concessionária revalidava formalmente a proposta (como de fato o fez), assumindo integralmente os riscos legais já conhecidos, ou se recusava, hipótese em que o processo licitatório deveria ser anulado, na forma do art. 49, §1º, da mesma lei. Destarte, ao optar livremente pela revalidação, a VIA BRASIL assumiu os efeitos jurídicos decorrentes, não podendo, posteriormente, invocar o mesmo fato superveniente — já absorvido por sua manifestação de vontade — como fundamento para pleitear o reequilíbrio econômico-financeiro contratual. Por oportuno, anoto que se extrai do acervo probatório até então acostado aos autos que a concessionária requerida deu início à execução do contrato e prosseguiu na prestação dos serviços por mais de 02 (dois) anos sem sequer requerer fundamentadamente a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro em razão da isenção decorrente dos eixos suspensos. De fato, constou no OFÍCIO Nº 02453/2023/COGACR/SINFRA que, “acerca do evento de desequilíbrio relativo à Isenção de Eixos Suspensos em virtude da Medida Provisória n.° 833/2018 e Portaria n.° 081/2018/SINFRA, destaca-se que, até o momento a Concessionária não apresentou o requerimento fundamentado, conforme dispõe à cláusula supracitada do Contrato de Concessão, tendo um lapso temporal de 2 (dois) anos entre a comunicação do evento de desequilíbrio pela concessionária e o presente momento” (Id. 192533429 - Pág. 4). Cumpre salientar, ainda, que a assinatura do contrato, nesses moldes, configura verdadeiro ato jurídico perfeito, consubstanciando manifestação inequívoca de vontade do particular quanto aos riscos do negócio, nos termos do artigo 104, I e III, do Código Civil. Logo, a alegação de desequilíbrio fundado em fato conhecido à época da celebração implicaria violação aos princípios da boa-fé objetiva, da segurança jurídica e do pacta sunt servanda, consagrados no ordenamento jurídico pátrio. Dessa forma, ao menos nesta fase de cognição sumária, não se vislumbra a existência de motivos juridicamente adequados para sustentar o ato administrativo que aprovou o 4º Termo Aditivo com base em pretenso desequilíbrio decorrente de fatos previsíveis ou já consolidados no tempo. Corrobora ainda a presença da probabilidade do direito os demais documentos contidos no processo administrativo juntado aos autos pela AGER, dentre os quais estão a Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER, datada de 18/12/2024, que foi elaborada pela Superintendência Reguladora de Estudos Econômicos (SREE) da AGER para validar os cálculos de reequilíbrio econômico-financeiro apresentados pelo Verificador Independente, especialmente no chamado "Cenário 2". Este cenário foi utilizado como base para justificar o 4º Termo Aditivo ao contrato. Destarte, a referida nota técnica analisou o documento AGER-TER-2024/11483, protocolado pelo Verificador Independente, apontando a existência de 05 (cinco) possíveis cenários de reequilíbrio econômico-financeiro (Id. 192533435 - Pág. 50). Veja-se: Contudo, a referida nota técnica não fez análise detalhada e comparativa entre as opções de cenários existentes. Apenas listou os cinco cenários de recomposição, sem demonstrar tecnicamente a superioridade do “Cenário 02” ou justificar, em termos de proporcionalidade e vantajosidade ao interesse público, os motivos para a sua adoção. Destarte, o documento se limitou a apresentar os cenários e, em seguida, passou a analisar os aspectos relativos apenas ao “Cenário 02”, tendo assentado que, em atendimento ao “OFÍCIO Nº 07661/2024/COGACR/SINFRA (fls. 5164-5165), emitido aos 03/12/24, direcionado a esta Agência Reguladora, vem definir e estabelecer o cenário 2” (Id. 192533435 - Pág. 48). Ocorre que o mencionado Ofício nº 07661/2024/COGACR/SINFRA, constante no movimento de Id. 192533430 - Pág. 109, também não apresenta fundamentação detalhada ou técnica que motive a escolha do chamado “cenário 2”. O citado ofício apenas comunica a escolha da Administração, sem justificar, em termos de eficiência econômica, vantajosidade ao interesse público ou proporcionalidade, as razões pelas quais as demais opções não teriam sido mais adequadas ou menos gravosas ao erário. Prosseguindo, o Parecer nº 3364/SGAC/PGE/2024, que consta dos fundamentos do termo aditivo (Id. 188712190 - Pág. 1), não adentrou no mérito da escolha do cenário, nem realizou avaliação independente ou aprofundada. Ao contrário, o próprio parecer, ao final, solicitou expressamente a “complementação da justificativa lançada para a escolha do cenário apresentado, trazendo as razões do exercício da escolha (discricionária) realizada, de forma a complementar a instrução processual” (Id. 192533435 - Pág. 98). Tal solicitação demonstra que a motivação apresentada era insuficiente até mesmo do ponto de vista jurídico consultivo. Por fim, o Despacho nº 00018/2025/GSEIL/SINFRA, ao consolidar a adoção do “Cenário 2”, se limitou a apresentar as seguintes razões para escolha do “Cenário 02”: “Diante do exposto, justifica-se a escolha do Cenário 02 pois esse é a prerrogativa de equilíbrio econômico-financeiro que não afeta os valores tarifários, prorroga o prazo da concessão e mantém o investimento em obras prioritárias, reduzindo o impacto do reequilíbrio no Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA. Os demais cenários apresentaram aumento de tarifa, o que viola a previsão legal acerca do reequilíbrio decorrente de eixos suspensos, com exceção do Cenário 01. No entanto, o Cenário 1 demonstrou não ser o mais equilibrado em tratativas com a concessionária. Sendo assim, em comparação com todos os cinco cenários apresentados, o Cenário 02 foi o mais viável para a manutenção do equilíbrio econômico financeiro do Contrato e uma distribuição equânime entre as partes dos impactos do reequilíbrio” (Id. 192533435 - Pág. 110). Como se vê, as justificativas apresentadas se mostram, no mínimo, genéricas e não acompanhadas de análise técnica detalhada, contentando-se o despacho em reafirmar a escolha administrativa, o que fragiliza a motivação do ato administrativo e pode configurar ausência de motivo válido, conforme art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65. Isso porque, em nenhum dos atos administrativos foi sopesado estudo técnico robusto que justificasse a escolha do “Cenário 02” dentre os 05 possíveis. No caso concreto, a opção exclusão da outorga variável, a prorrogação do contrato e a supressão de obras fundamentais, sem comprovação de motivação robusta, revela-se aparentemente desproporcional e contrária ao dever de proteção ao patrimônio público e à segurança dos usuários. Dessa forma, verifica-se que, em sede de cognição sumária, os motivos indicados para a adoção do “Cenário 2” mostram-se, ao menos por ora, materialmente insuficientes e juridicamente inadequados ao resultado obtido, nos termos do art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65. Para além disso, mister se faz destacar que não há como este Juízo aferir, sem uma dilação probatória detalhada, com possível necessidade de produção de prova técnica pericial, se os motivos apontados pela Administração Pública e ratificados nos documentos mencionados podem ser considerados, em definitivo, juridicamente adequados para o resultado obtido. Tal exame dependerá de instrução probatória ampla, a ser oportunamente realizada no curso da demanda. 2.5. Discricionariedade Administrativa: Para além da presença da probabilidade do direito alegado, importante ressaltar que a discricionariedade administrativa não é absoluta. Ela está limitada pelos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, eficiência, moralidade administrativa e supremacia do interesse público. Por certo, nos contratos de concessão, assim como nos administrativos em geral, há espaço jurídico para o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, desde que se preserve a relação de proporcionalidade entre encargos assumidos e benefícios percebidos pelo concessionário. Assento que, no caso em apreço, o próprio contrato, em sua Cláusula 38.1, assegura ao Poder Concedente a faculdade de escolha entre as alternativas previstas, não havendo ainda vedação à adoção de medidas diversas, desde que aptas a recompor a equação econômico-financeira e em consonância com os princípios da Administração Pública e com a legislação aplicável. Entretanto, mesmo que o Estado tenha margem para escolher o instrumento de recomposição, no caso concreto, a opção pela eliminação de obras essenciais e supressão de receitas públicas (via exclusão da outorga variável), tudo em favor da concessionária, ofende os princípios supracitados, sendo medida desproporcional, sobretudo quando não demonstrado tecnicamente que inexistia alternativas menos gravosas ao interesse coletivo nos outros 04 (quatro) cenários apresentados. Com efeito, a Administração tem o dever de motivar sua decisão para aditar o contrato administrativo, tendo em vista os princípios norteadores da atividade administrativa e, especialmente, da licitação. Sem motivação será inválida a unilateral alteração do contrato administrativo. Pelos mesmos motivos, a motivação não poderá consistir na simples invocação da discricionariedade administrativa ou na necessidade de preservação de algum “interesse público”, de conteúdo material indeterminado. Ao contrário, a Administração deverá indicar o motivo concreto, real e definido que impõe a modificação. Ademais, deverá demonstrar que este motivo não existia ao tempo da contratação, bem como que a modificação introduzida no contrato guarda proporcionalidade com a modificação verificada nas circunstâncias subjacentes. Na hipótese em apreço, o ato administrativo aponta que o Cenário 2 foi escolhido em primeiro lugar para preservar a modicidade tarifária, ou seja, para não onerar diretamente os usuários da rodovia com aumento de tarifa. Não obstante, conforme amplamente analisado nos tópicos anteriores, não restou demonstrado, de forma técnica e documental, que essa opção seria a mais adequada para atender ao interesse público, tampouco se mostrou justificada a completa exclusão de alternativas intermediárias previstas contratualmente, como a revisão tarifária gradual, o escalonamento de investimentos ou a adoção de medidas compensatórias menos gravosas. Frise-se: a discricionariedade administrativa, mesmo dentro de sua razoável amplitude, encontra limites que podem ser controlados pelo Poder Judiciário, especialmente quando evidenciado desvio de finalidade ou ausência de motivo válido capaz de sustentar a escolha do administrador. Aliás, pela teoria dos motivos determinantes, quando a Administração indica os motivos que a levaram a praticar o ato, este somente será válido se os motivos forem verdadeiros. Assim, ao Poder Judiciário compete examinar os pressupostos de fato e as provas da ocorrência do motivo. Portanto, observados os elementos fáticos e jurídicos expostos, cabível a intervenção judicial corretiva para, ao menos nesta seara inaugural, assegurar que o ato administrativo seja suspenso para que possa ser melhor avaliado dentro dos contornos legais e constitucionais. Isso porque, sem prejuízo de ulterior aprofundamento probatório, resta configurada a probabilidade do direito alegado pelo autor, não apenas em razão da ausência de comprovação de desequilíbrio econômico-financeiro efetivo, mas também pela aparente desproporcionalidade das medidas adotadas para o reequilíbrio, à luz do ordenamento jurídico e dos princípios que regem a Administração Pública. 2.6. Perigo de Dano e Irreversibilidade: Além da probabilidade do direito, igualmente se faz presente o requisito do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, conforme exige o art. 300 do Código de Processo Civil. No presente caso, a própria Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER apontou expressamente que, “dentre os eventos que causaram desequilíbrio no Contrato, a isenção dos eixos suspensos são responsáveis por 98% do montante devido em desequilíbrio, calculados no total de R$ 30.010,43 milhões” (Original sem destaque, Id. 192533435 - Pág. 51), o que, ante o já assentado no tocante à isenção decorrente de disposição legal, corrobora não só a probabilidade do direito como atesta principalmente a presença do requisito do periculum in mora. Isso porque, já estando vigente a alteração contratual e trazendo efeitos concretos imediatos, inclusive em razão da exclusão do percentual anteriormente definido à título de outorga variável, a não concessão da tutela de urgência neste momento acarreta risco concreto de frustrar o resultado útil do presente processo. Com efeito, a vigência imediata do 4º Termo Aditivo já produz efeitos concretos ao patrimônio público, inclusive pela exclusão do percentual anteriormente destinado à outorga variável, o que acarreta impacto direto na arrecadação estadual e, consequentemente, limita investimentos públicos futuros. Além disso, o prolongamento contratual e a supressão de obras essenciais igualmente resultam em riscos concretos à segurança viária e à integridade dos usuários das rodovias MT-320 e MT-208. Por conseguinte, a não concessão da tutela de urgência neste momento possibilita a continuidade da execução de um aditivo que altera substancialmente as obrigações contratuais da concessionária, transfere ônus financeiros ao Estado e posterga investimentos essenciais, resultando em risco concreto e iminente de lesão grave e de difícil reparação ao erário e à coletividade. Ressalte-se que o periculum in mora, no caso, não decorre apenas de prejuízos financeiros, mas também de potenciais danos irreversíveis à segurança pública, caso obras fundamentais sejam adiadas ou suprimidas, conforme comprovado pelos cronogramas modificados e pelos documentos anexados. Por fim, no tocante à irreversibilidade, a suspensão dos efeitos do termo aditivo não implica dano irreversível à concessionária, pois eventual revalidação poderá ser feita após instrução probatória mais aprofundada, inclusive com eventual compensação de eventuais prejuízos comprovados. Destarte, presente o requisito do perigo de dano, somado à probabilidade do direito já demonstrada, autoriza-se a concessão da tutela antecipada para resguardar o patrimônio público, a segurança dos usuários e a efetividade do processo. 3. Valor da Causa: Consoante já exposto, trata-se de Ação Popular proposta por Faissal Jorge Calil Filho, com pedido de tutela de urgência, na qual se pretende a suspensão e, ao final, a anulação do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA, bem como, subsidiariamente, a rescisão do próprio contrato de concessão, em razão de supostas ilegalidades que implicariam lesão ao patrimônio público e violação a princípios constitucionais. O autor popular atribuiu à causa o valor de R$ 71.000.000,00 (setenta e um milhões de reais), porém sem apresentar qualquer fundamentação técnica ou exposição detalhada que justifique a adoção desse montante. Pois bem. Em regra, o valor da causa deve equivaler ao do benefício patrimonial buscado ou do prejuízo que se quer evitar, conforme disposto nos arts. 291 e 292 do Código de Processo Civil. É certo que, ao se considerar a pretensão deduzida na exordial como de tutela coletiva, o art. 292 não estabelece parâmetros objetivos para a atribuição do valor da causa. Entretanto, a jurisprudência pátria é firme no sentido de que o valor da causa deve refletir o conteúdo econômico da demanda[2], assim como que a fixação deve ser por estimativa quando a demanda coletiva não possuir proveito econômico certo ou imediato[3]. Nesse sentido, vide ementa a seguir, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POPULAR. VALOR DA CAUSA EM AÇÃO POPULAR. VALOR DA CAUSA DE DIFÍCIL DETERMINAÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO FIRMADO PELO MUNICÍPIO PARA FORNECIMENTO DE SANEAMENTO E FORNECIMENTO DE ÁGUA. VIOLAÇÃO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO DEMONSTRADA. RECURSO DESPROVIDO. I - No tocante ao valor da causa, considerando que na presente demanda não é possível determinar o valor do proveito econômico perseguido, vez que se trata de ação popular para controle de ato administrativo, tem-se como correta a adequação promovida do valor da causa pelo Magistrado a quo, para o patamar de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos de alçada. II - A singela afirmação acerca da inexistência de cláusula contratual dirigida à ampliação do serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto não se revela o bastante para a pretensa anulação do contrato firmado entre a concessionária e o município, na medida em que se mostram ausentes a descrição de elementos objetivos e concretos que demonstram a violação à moralidade administrativa, revelada em suposto ato ilegal praticado pela administração pública, sobretudo se levarmos em conta a inexistência de demonstração acerca da prática do ato dissociado do interesse público. III - A despeito da combatividade do Apelante, é preciso ter em vista que ao propor a ação, o autor popular age no interesse coletivo de fiscalização dos atos públicos para garantir uma administração pública pautada nos princípios da legalidade e moralidade-probidade. Assim, malgrado a Ação Popular possa ser empregada para a impugnação do ato lesivo ao patrimônio moral, pressupõe seja descrita conduta que, em concreto, viole a moralidade-probidade administrativa, o que não ocorreu no caso. lV - Recurso desprovido”. (TJES; AC 0001715-49.2017.8.08.0013; Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Jorge do Nascimento Viana; Julg. 19/04/2021; DJES 17/05/2021). No caso vertente, a ação popular visa proteger o interesse público e não busca um proveito patrimonial direto imediato, o que afasta a necessidade de vinculação estrita ao valor integral da relação contratual impugnada. Destarte, o autor não indicou de que forma chegou ao valor atribuído, tampouco especificou quais parcelas ou prejuízos concretos ao erário teriam sido considerados para fixar a quantia indicada. Como exposto, a presente demanda não visa buscar ressarcimento imediato de valores certos e líquidos, mas sim resguardar o patrimônio público e assegurar a adequada execução do contrato de concessão, inclusive no tocante ao cumprimento integral das obras essenciais, à manutenção da outorga variável e à preservação do prazo contratual originário. Ainda que os fatos e fundamentos apresentados indiquem um potencial prejuízo acumulado, com a exclusão de aproximadamente R$ 490.000,00 (quatrocentos e noventa mil reais) anuais de outorga variável e possíveis perdas superiores a R$ 14 milhões ao longo do restante do contrato, não há, neste momento processual, definição precisa de um valor patrimonial certo a ser restituído ou reparado. Ademais, o valor atribuído à causa pelo autor supera demasiadamente os R$ 14 milhões das perdas acumuladas supracitadas. Por tal razão, assim como tendo em vista o entendimento jurisprudencial consolidado, entendo que o valor da causa deve ser fixado em valor estimativo simbólico, sem vinculação direta ao valor integral do contrato administrativo ou ao montante total de eventuais prejuízos futuros estimados. Destarte, considerando a ausência de explicação técnica do autor e a natureza difusa do direito tutelado, revela-se razoável fixar o valor da causa em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), apenas para fins de alçada e processamento, sem prejuízo de eventual apuração posterior em liquidação ou cumprimento de sentença. 4. Deliberações Finais: Diante do exposto, uma vez que presentes todos os requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil, DEFIRO o pedido de tutela provisória de urgência, o que faço para suspender os efeitos do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão até ulterior deliberação judicial, notadamente em razão da recomposição tarifária fundada na alegação de desequilíbrio econômico-financeiro causado pelas isenções previstas na Lei Federal n.º 13.711/2018. CORRIJO, de ofício, o valor da causa para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), nos termos do art. 292, § 3º, do Código de Processo Civil. PROCEDA-SE com a alteração necessária no Sistema PJe. DEFIRO parcialmente o pedido de Id. 192574065, o que faço para determinar a exclusão das petições de Ids. 192567312, 192536024, 192533968 e 192532279 e dos documentos que a acompanharam, mantendo-se tão somente a petição de Id. 192533422 e seus respectivos documentos, posto que foram os primeiros a serem juntados nos autos. DÊ-SE ciência ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso (artigo 7º, I, “a”, da Lei nº 4.717/65). Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. BRUNO D’OLIVEIRA MARQUES Juiz de Direito [1] NOHARA, Irene. 1. Áleas Contratuais In: NOHARA, Irene. Licitação e Contratos Administrativos - Vol. 6 - Ed. 2022. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/licitacao-e-contratos-administrativos-vol-6-ed-2022/1712827906. Acesso em: 9 de Julho de 2025. [2] REsp n. 1.712.504/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/4/2018, DJe de 14/6/2018. [3] AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO POPULAR. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. IMPROCENDENTE. INCERTEZA DO PROVEITO ECONÔMICO. VALOR POR ESTIMATIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. STJ. RECURSO DESPROVIDO. (...) 1. A jurisprudência desta corte superior é no sentido de ser admissível a fixação do valor da causa por estimativa, quando constatada a incerteza do proveito econômico perseguido na demanda. (...). ” (AgRg no AREsp 583.180/rj, Rel. Ministro Paulo de Tarso Tanseverino, Terceira Turma, julgado em 20/08/2015, dje 27/08/2015). (TJMT; AI 44295/2015; Capital; Relª Desª Nilza Maria Pôssas de Carvalho; Julg. 10/11/2015; DJMT 23/11/2015; Pág. 70). Gabinete do Juízo Titular I da Vara de Ações Coletivas - 20001 - Contato Assessoria: (65) 3648-6413, via telefone ou Whats'App Business

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Processo nº 1020556-26.2025.8.11.0041

ID: 333428128

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS Classe: AçãO POPULAR Nº Processo: 1020556-26.2025.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

FAISSAL JORGE CALIL FILHO

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

FAISSAL JORGE CALIL FILHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CARLOS EDUARDO VIANA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS DA COMARCA DE CUIABÁ-MT PROCESSO: 1020556-26.2025.8.11.0041 Vistos, Trata-se de Ação Popular ajuizada por FAISSAL JORGE CA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS DA COMARCA DE CUIABÁ-MT PROCESSO: 1020556-26.2025.8.11.0041 Vistos, Trata-se de Ação Popular ajuizada por FAISSAL JORGE CALIL FILHO em face de VIA BRASIL MT CONCESSIONÁRIA DE RODOVIAS S.A., ESTADO DE MATO GROSSO e AGÊNCIA ESTADUAL DE REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DELEGADOS DO ESTADO DE MATO GROSSO — AGER/MT, com pedido de tutela de urgência, objetivando a suspensão do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA, em razão de supostas ilegalidades que causariam prejuízo ao patrimônio público e afrontado princípios constitucionais. Consoante narrado na petição inicial, o contrato original teve como objeto a administração, manutenção, recuperação, operação e implantação de melhorias nos trechos das rodovias MT-320 e MT-208, com previsão de investimentos iniciais de aproximadamente R$ 1,9 bilhão, além de previsão de outorga variável em favor do Estado. Segundo expõe o autor, a concessionária VIA BRASIL MT venceu a licitação e assumiu os riscos ordinários do negócio, conforme previsto no contrato e na matriz de riscos. Entretanto, a empresa teria descumprido reiteradamente suas obrigações contratuais, deixando de realizar obras essenciais e comprometendo a segurança viária, situação confirmada inclusive em sentença proferida na Ação Civil Pública nº 1002321-84.2023.8.11.0007, que tramitou na 5ª Vara da Comarca de Alta Floresta e condenou a concessionária ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. O autor afirma que, em 2 de janeiro de 2025, foi celebrado o 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão, pelo qual foram promovidas alterações substanciais em favor da concessionária, como a isenção da obrigação de recolher a outorga variável, a exclusão de obras obrigatórias e a prorrogação antecipada do contrato, medidas que implicariam desvio de finalidade e lesão ao erário. Aduz que a concessionária apresentava evolução positiva nas receitas, inexistindo justificativa técnica ou contábil que embasasse a alegação de desequilíbrio econômico-financeiro. Sustenta que, ao participar do certame, a empresa já tinha pleno conhecimento das normas que tratavam da isenção de eixos suspensos, não podendo invocar posteriormente tal circunstância para pleitear reequilíbrio. O autor alega ainda que a isenção da outorga variável “não apenas viola os princípios da moralidade, eficiência e interesse público, mas também impõe ao Estado um ônus financeiro desproporcional e injustificado”, bem como que “a exclusão da pavimentação dos acostamentos e demais obras essenciais é juridicamente insustentável, moralmente inadmissível e socialmente danosa, revelando uma afronta direta à dignidade dos usuários da via, ao erário público e ao próprio Estado de Direito” (Id. 188712176 - Pág. 8 e 10). Afirma que “a motivação apresentada para o aditivo configura hipótese clássica de inexistência dos motivos, conforme previsto no art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65 (Lei da Ação Popular), segundo o qual são nulos os atos administrativos fundamentados em matéria de fato ou de direito materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido” (Id. 188712176 - Pág. 11). Argumenta que o reequilíbrio econômico-financeiro “não pode ser deturpado para compensar riscos inerentes ao negócio ou falhas de planejamento e gestão da própria concessionária”, assim como que “somente se justifica diante de eventos supervenientes, imprevisíveis e alheios à vontade das partes, nos termos do art. 124, II, "d", da Lei nº 14.133/2021” (Id. 188712176 - Pág. 25). Ao final, o autor popular requer a concessão de liminar para suspender imediatamente os efeitos do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA e, no mérito, a procedência do pedido para declarar a nulidade do referido termo aditivo e, subsidiariamente, a rescisão do próprio contrato de concessão. Em decisão inicial, este Juízo entendeu pela necessidade de oportunizar o contraditório, determinando a oitiva prévia do Estado de Mato Grosso e da AGER/MT antes da análise do pedido de tutela de urgência, com subsequente intimação do Ministério Público para manifestação como fiscal do ordenamento jurídico. Em cumprimento ao despacho, a AGER/MT apresentou manifestação prévia na qual suscitou preliminar de ilegitimidade passiva e, no mérito, defendeu a regularidade do 4º Termo Aditivo, argumentando que o reequilíbrio econômico-financeiro era necessário para compensar eventos extraordinários, como a isenção de tarifas na “Praça P3” para moradores de Alta Floresta e a proibição nacional de cobrança de pedágio sobre eixos suspensos. O Ministério Público, ao ser intimado, apresentou manifestação na qual opinou pelo deferimento da tutela de urgência para suspender os efeitos do 4º Termo Aditivo, destacando a presença de indícios de violação aos princípios da legalidade, moralidade, eficiência e supremacia do interesse público, previstos no art. 37 da Constituição Federal, além de possíveis desvios de finalidade e inexistência de motivos válidos, nos termos do art. 2º da Lei nº 4.717/65. O Estado de Mato Grosso, devidamente intimado, não apresentou manifestação no prazo legal, conforme certificado nos autos (Id. 192758820). É a síntese. DECIDO. 1. Ilegitimidade Passiva da AGER/MT: A AGER/MT, em sua manifestação prévia, arguiu sua ilegitimidade passiva para figurar na presente ação popular, sob o argumento de que, na condição de interveniente anuente, não possui poder decisório sobre o conteúdo contratual, atuando apenas na regulação e fiscalização do contrato. Em que pese os argumentos apresentados, em sede de cognição sumária, entendo que a alegação de ilegitimidade passiva da AGER/MT não merece prosperar neste momento processual. Isso porque, conforme narrado na petição inicial, a AGER/MT, na qualidade de Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Estado de Mato Grosso, é responsável por fiscalizar e regular a execução do contrato de concessão, inclusive no que se refere ao cumprimento das obrigações contratuais e à preservação do equilíbrio econômico-financeiro. Consoante o disposto no art. 6º da Lei nº 4.717/65, a “ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo”. E, consoante se extrai do próprio termo aditivo, a AGER/MT figurou como interveniente-anuente, tendo inclusive emitido a Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER (Id. 192533435 – Pág. 46), que foi referida no Parecer Jurídico nº 3364/SGAC/PGE/2024, o qual, por sua vez, consta dos fundamentos do termo aditivo (Id. 188712190 - Pág. 1). Ademais, a análise da responsabilidade da agência demanda uma instrução probatória mais aprofundada, a fim de verificar se a agência atuou de forma diligente na fiscalização e regulação do contrato, ou se houve alguma omissão ou falha que tenha contribuído para a ocorrência dos prejuízos alegados pelo autor. Portanto, em sede de cognição sumária, entendo que a AGER/MT possui legitimidade passiva para figurar na presente ação popular, sem prejuízo de uma análise mais aprofundada da questão após a instrução probatória. 2. Tutela de Urgência: Segundo a sistemática processual, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência, sendo que a tutela provisória de urgência pode ser de natureza cautelar ou satisfativa, assim como ser concedida em caráter antecedente ou incidental (art. 294, CPC). No que se refere especificamente à tutela de urgência, o regime geral está preconizado nos artigos 300 e 301 do Código de Processo Civil, que unificou os pressupostos fundamentais para a sua concessão, seja na sua natureza satisfativa, seja na cautelar. Veja-se: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito”. E, nos termos dos artigos 7º e 22 da Lei nº 4.717/65, aplicam-se na Ação Popular, no que for cabível, o procedimento ordinário e as demais regras do Código de Processo Civil. Ademais, por expressa disposição contida no art. 5º, § 4º, da Lei nº 4.717/65, “caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado” na defesa do patrimônio público. Portanto, para a concessão de tutela antecipada em Ação Popular, mister que estejam presentes os robustos requisitos legais, quais sejam, a probabilidade do direito, a inexistência de perigo de irreversibilidade do provimento a ser concedido e, finalmente, um dos requisitos alternativos, que são receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Além dos requisitos supracitados, por força do disposto na Lei nº8.437/1992, que dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público,“não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação” (art. 1º, § 3º). É com enfoque nessas normativas que se aprecia o pedido de tutela antecipada em questão. Consoante exposto no relatório, o objeto da presente demanda é o 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA e, subsidiariamente, o próprio contrato. O autor alega, em síntese, que houve descumprimento contratual pela concessionária, assim como alterações substanciais no contrato por meio do 4º Termo Aditivo (isenção de outorga, exclusão de obras, prorrogação do contrato), sem justificativa válida para o reequilíbrio econômico-financeiro No caso em tela, após análise minuciosa dos autos, entendo que os requisitos autorizadores da medida liminar pleiteada foram suficientemente demonstrados, de modo a justificar a intervenção judicial imediata, conforme exposto nos tópicos a seguir. 2.1. Exclusão da Outorga Variável: O 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019, celebrado entre a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (SINFRA), a Agência Estadual de Regulação - AGER e a concessionária Via Brasil MT 320, de fato, procedeu com a exclusão da obrigação de pagamento da outorga variável a partir do sexto ano de concessão (Cláusula 1.1.3, Id. 188712190 - Pág. 4). De acordo com o contrato original, até o quinto ano, a concessionária deveria repassar ao Poder Concedente o valor correspondente a 1% (um por cento) da receita tarifária bruta, mas a partir do sexto ano, esse percentual foi reduzido a 0% (zero por cento), isentando completamente a empresa desta obrigação futura. Insta anotar que, ao contrário do sustentado pela AGER em sua manifestação prévia, o impacto econômico aos cofres públicos tem efeito imediato. Com efeito, de acordo com os documentos anexos extraídos do site oficial da AGER (https://www.ager.mt.gov.br/contratos), é possível confirmar que o 6º ano da concessão já se iniciou. Conforme a Cláusula 5.1 do contrato de concessão, o prazo da concessão é de 30 (trinta) anos, contados da data de assinatura do Termo de Transferência do Sistema Rodoviário, sendo possível sua prorrogação em hipóteses previstas no contrato e na legislação aplicável. E, em consulta ao Termo de Transferência disponível no referido site, observa-se que a formalização do ato de transferência ocorreu em 27 de maio de 2019, data em que se deu o efetivo início da contagem do prazo contratual, marcando o ponto de partida para todos os prazos contratuais, inclusive os de execução de obras, cumprimento de etapas e pagamento da outorga variável. Portanto, considerando que a contagem do prazo começou em maio de 2019, o 6º ano da concessão teve início em maio de 2025, momento em que passou a vigorar a nova redação do termo aditivo que zerou o pagamento da outorga variável. Ocorre que, com base nos demonstrativos financeiros de 2022 e no balanço intermediário de 2023 acostados à petição inicial (Id. 188714545 e Id. 188714546), a receita operacional com a arrecadação de pedágio foi de R$ 49,6 milhões em 2022 (Id. 188714545 - Pág. 33) e alcançou R$ 37,7 milhões apenas no primeiro semestre de 2023, indicando tendência de crescimento consistente. Por simples raciocínio matemático, considerando apenas a receita de 2022 (sem qualquer projeção de crescimento futuro), é possível concluir que a exclusão da outorga variável implicará numa perda de aproximadamente R$ 490.000,00 (quatrocentos e noventa mil reais) por ano ao erário estadual, considerando apenas a faixa histórica de receita. Ao longo dos aproximadamente trinta anos restantes de contrato, a perda acumulada pode superar quatorze milhões em valores correntes, sem considerar a evolução do tráfego, o que pode potencializar o impacto negativo para o Estado. Presente neste aspecto, portanto, a probabilidade do direito alegado pelo autor, uma vez que os documentos e dados financeiros juntados aos autos demonstram de forma concreta a existência de potencial e imediata lesão ao patrimônio público, decorrente da exclusão imediata da outorga variável. 2.2. Prorrogação do Prazo Contratual: O termo aditivo em análise também prevê a extensão do prazo da concessão em cinco anos e meio (5,58 anos), consoante se extrai da Cláusula 1.1.1, segundo a qual o “PRAZO DA CONCESSÃO é de 35,58 (trinta e cinco vírgula cinquenta e oito anos), contados da data de assinatura do TERMO DE TRANSFERÊNCIA do SISTEMA RODOVIÁRIO (Id. 188712190 - Pág. 3). Essa prorrogação foi justificada como contrapartida financeira para a concessionária, no contexto do alegado reequilíbrio econômico-financeiro, porém implica alongamento do período de arrecadação de pedágio sem a correspondente contrapartida proporcional de investimentos em melhorias originalmente previstas. Além disso, como já exposto no tópico anterior, os demonstrativos financeiros de 2022 e do primeiro semestre de 2023 demostram que a concessionária mantém arrecadação robusta, com tendência de crescimento anual e aumento de fluxo de veículos. Destarte, o alongamento do prazo contratual, como alteração aceita pela concessionária, reforça o potencial econômico da concessão e, aliado à exclusão da outorga variável, reduz o retorno financeiro ao Estado, ferindo o interesse público. 2.3. Supressão e postergação de Obras Essenciais: Além da exclusão da outorga e da prorrogação contratual, verifico que o aditivo promoveu uma ampla reestruturação no cronograma e no escopo das obras previstas, conforme previsto na Cláusula 1.1.4 (Id. 188712190 - Pág. 4). Diversos acostamentos foram excluídos em praticamente todos os segmentos da rodovia, como no trecho entre Nova Santa Helena e Colíder, em que 29,7 km de acostamentos pavimentados foram suprimidos. O mesmo ocorreu no trecho entre Nova Canaã do Norte e Vila Del Rey, onde estavam previstos 48,7 km de acostamentos que também foram retirados. Não há dúvidas de que a exclusão desses acostamentos impacta diretamente a segurança dos usuários, já que eles são elementos fundamentais para a fluidez do tráfego e para emergências. Além disso, as obras de travessias de pedestres, originalmente previstas para ocorrer entre os anos 3 e 5, foram postergadas para o ano 6 ou além, dependendo do segmento. As readequações de interseções, que seriam executadas majoritariamente nos primeiros cinco anos, tiveram prazos estendidos, chegando em alguns casos a serem previstas apenas para o ano 12. Em segmentos como o perímetro urbano de Colíder e de Nova Canaã do Norte, baias para ônibus e vias marginais também foram adiadas para anos posteriores, quando anteriormente constavam no cronograma inicial para execução imediata. Anoto que, muito embora o aditivo contenha previsão no sentido de que a concessionária deve avaliar periodicamente a necessidade de reinserção das obras excluídas (Cláusulas 1.1.4.1, 1.1.4.2 e 1.1.4.3), essa obrigação de reinserção não tem caráter vinculativo imediato, o que, na prática, significa que as obras poderão nunca ser retomadas. Nesse diapasão, entendo que as supressões e postergações de obras essenciais, especialmente aquelas relacionadas à segurança viária, representam verdadeira diminuição das contrapartidas inicialmente assumidas pela concessionária, comprometendo diretamente a proteção dos usuários e a qualidade da prestação do serviço, razão pela qual se confirma a probabilidade do direito invocado pelo autor também neste aspecto. 2.4. Ausência de Motivo Válido: O autor sustenta, ainda, a nulidade do ato administrativo por ausência de motivo válido, na forma do art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65, que prevê a nulidade dos atos administrativos baseados em motivos materialmente inexistentes ou juridicamente inadequados ao resultado obtido. Com efeito, a Lei de Ação Popular aponta as hipóteses de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público, in verbis: “Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.” Ademais, a Constituição Federal, em seu artigo 37, resguarda os princípios norteadores da Administração Pública, os quais devem ser observados em toda e qualquer conduta administrativa. Assim, os atos administrativos devem observar os princípios constitucionais, quais sejam: legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade. In casu, infere-se, ao menos nessa seara inaugural, a possível violação ao princípio da proporcionalidade, além de aparente vício na motivação do ato. Em primeiro lugar, a análise do conjunto probatório revela que o alegado desequilíbrio econômico-financeiro que teria fundamentado o 4º Termo Aditivo não encontra respaldo em dados objetivos, haja vista os relatórios financeiros apresentados, que demonstram crescimento consistente das receitas de pedágio, afastando a tese de inviabilidade ou necessidade urgente de recomposição. Em segundo lugar, do processo administrativo que resultou na celebração do 4º Termo Aditivo, extrai-se que a revisão ordinária do contrato, motivada pelo desequilíbrio econômico-financeiro teria advindo, em primeiro plano, das isenções tarifárias concedidas aos veículos de carga que trafegam sem carga (com eixos suspensos), conforme disposições da Lei Federal n. 13.711/2018; e, em segundo plano, da isenção de cobrança de tarifa de pedágio na praça n.º 03 (Praça 3 – P3), situada no Município de Alta Floresta, em razão de decisão judicial emanada nos autos nº 1006566-46.2020.8.11.0007. Inicialmente, no que se refere à isenção decorrente da praça de pedágio 3, importante destacar que a supracitada ação se trata de Ação de Execução de Título Executivo Extrajudicial, sobre a qual foram opostos os Embargos à Execução nº 1001119-43.2021.8.11.0007, cuja sentença de procedência reconheceu a nulidade absoluta do título, com efeitos ex tunc, em razão de ausência de participação da Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso. E, em consulta aos autos nº 1006566-46.2020.8.11.0007 no Sistema PJe, este magistrado verificou que, no dia 07 do corrente mês, o Juízo competente exarou decisão que suspendeu o curso da execução, ante a atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto nos autos dos embargos. Logo, isenção de cobrança de tarifa de pedágio na Praça 3 se trata de matéria ainda sub judice, com efeito temporariamente suspenso. Por sua vez, no tocante às isenções decorrentes de disposição legal (eixos suspensos), há fator determinante que atesta a presença da probabilidade do direito alegado pela parte autora, qual seja, o fato de que a concessionária detinha plena ciência da alteração legislativa antes mesmo da assinatura do contrato. Consoante expôs o autor popular, a “isenção da cobrança de pedágio sobre eixos suspensos foi instituída ainda em 2018, por meio da Medida Provisória nº 833, internalizada no Estado de Mato Grosso pela Portaria SINFRA nº 074/2018”, sendo que a referida “norma já estava plenamente vigente quando, em 24 de agosto de 2018, a concessionária VIA BRASIL MT foi formalmente convocada a revalidar sua proposta de preço e posteriormente consolidada pela Lei Federal nº 13.711/2018” (Id. 188712176 - Pág. 17 e Id. 188714549). Com efeito, a Lei Federal nº 13.711/2018, que incluiu a isenção de cobrança de pedágio para veículos de carga com eixos suspensos, foi publicada em 24 de agosto de 2018, enquanto a assinatura do contrato de concessão em exame ocorreu apenas em 12 de abril de 2019 (Id. 192533438 - Pág. 278). Portanto, houve lapso superior a sete meses entre a mudança legislativa e a efetiva assinatura do contrato, período suficiente para que a concessionária tivesse não apenas conhecimento formal do novo regime jurídico, como também pudesse deliberar, de modo consciente e estratégico, sobre a conveniência da assinatura do contrato nos moldes originalmente propostos. Aliás, como bem ressaltado pelo autor popular, a concessionária foi formalmente convocada a revalidar sua proposta de preço em razão da superveniência da Lei Federal nº 13.711/2018, tendo confirmado a manutenção de sua proposta original, mesmo diante da alteração legislativa. Tal confirmação revela que a concessionária, ciente do novo regime de isenção dos eixos suspensos, assumiu o contrato de forma livre e informada, afastando qualquer alegação de surpresa ou imprevisibilidade quanto ao impacto econômico decorrente da referida legislação. Nesse ponto, é crucial destacar que, conforme disposto no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei nº. 8.666/1993 (vigente à época da assinatura do contrato, Id. 192533438 - Pág. 160), a equação econômico-financeira do contrato é protegida de uma série de fatores, desde fatos imputáveis à Administração Pública a fatos econômicos imprevisíveis que repercutem no contrato. Sob esse aspecto, tanto a doutrina administrativa quanto a jurisprudência vêm reconhecendo que o risco ordinário do negócio é transferido ao concessionário, cabendo a esse, de acordo com as características do ramo em que atua e dos riscos envolvidos à atividade mercantil, avaliar todos os riscos envolvidos desde o ato de elaboração de sua proposta até o momento da assinatura do contrato. Nesse sentido, esclarece a doutrina que: “Enquanto na teoria da imprevisão, conforme visto, há incidentes econômicos que alteram o equilíbrio econômico do contrato, as denominadas interferências ou sujeições imprevistas são, de acordo com definição de Hely Lopes Meirelles, “ocorrências materiais não cogitadas pelas partes na celebração do contrato mas que surgem na sua execução de modo surpreendente e excepcional, dificultando e onerando extraordinariamente o prosseguimento e a conclusão dos trabalhos. Esclarece Celso Antônio Bandeira de Mello, apoiado em Benoît, que as sujeições imprevistas têm seu domínio de aplicação, por excelência, nos contratos de obras públicas. São situações anômalas, excepcionais, que não puderam ser previstas pelas partes, de forma razoável, quando da contratação, mas que tornam a execução contratual muito mais onerosa, permitindo, portanto, sua revisão. É exemplo de sujeição imprevista a descoberta de lençol d’água, quando da escavação de um túnel. Em suma, (...), a teoria da imprevisão aplica-se, conforme visto, em face de: (1) situações econômicas externas ao contrato, mas que nele repercutem, por exemplo, uma crise econômica anômala, que acaba desmantelando os preços de insumos relevantes para o equilíbrio contratual; (2) fatos, portanto, supervenientes, isto é, que geralmente não existiam, diferentemente das sujeições imprevistas que decorrem de fatos preexistentes; e (3) imprevisíveis, quando da contração, ou de consequências incalculáveis."[1] Da mesma forma caminha a jurisprudência pátria, in verbis: “DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ISENÇÃO TARIFÁRIA. LEI MUNICIPAL. CONTRATO DE CONCESSÃO. RODOVIA FEDERAL. INTERFERÊNCIA INDEVIDA. 1. A concessão de isenção de pedágio a determinados veículos afeta o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão de exploração de rodovia federal, criando imposição lesiva à concessionária que não existia à época da assinatura do contrato. 2. Hipótese de contrato de concessão celebrado com a União, a quem compete legislar sobre contratos de concessão administrativa, nos termos do art. 22, inc. XXVII, da Constituição Federal, sendo indevida interferência de município na política tarifária de serviço explorado pela União. 3. Agravo de instrumento desprovido”. (TRF 4ª R.; AG 5012789-54.2024.4.04.0000; Décima Segunda Turma; Rel. Des. Fed. João Pedro Gebran Neto; Julg. 21/08/2024; Publ. PJe 22/08/2024). Exatamente esse o caso dos autos, tendo em vista que a concessionária requerida, conhecendo previamente a existência de norma já vigente antes da assinatura do contrato que impactaria diretamente o equilíbrio da equação econômico-financeira, ainda assim optou por subscrever o contrato. Destarte, em consonância com os princípios administrativos da legalidade e da razoabilidade, a concessionária não pode ser beneficiada pelos valores que se consagrou vencedora, para depois, com base em fator preexistente à assinatura do contrato, do qual detinha pleno conhecimento, pedir a revisão dos preços ofertados. Aliás, muito embora a AGER, em sua manifestação prévia, tenha sustentado que a concessionária “deixou claro, ainda antes de assinar o contrato, que a isenção de eixos suspensos afetou o modelo proposto e que seria necessária a apuração para reequilibrá-lo” (Id. 192567312 - Pág. 10/11), tal observação, ao invés de servir como fundamento de legitimidade, reforça que se tratava de fato previsível, conhecido antes da assinatura do contrato, não caracterizando evento extraordinário ou imprevisível que justificasse o reequilíbrio nos moldes adotados. Essa interpretação é corroborada pela regra do art. 49 da Lei nº. 8.666/1993, que expressamente condicionava a revogação da licitação à verificação de fatos supervenientes. Portanto, ao assumir os compromissos do contrato com tais informações já públicas e vigentes, a concessionária o fez de forma consciente e voluntária, afastando, ao menos em sede de cognição sumária, a alegação de que a isenção dos eixos suspensos configuraria fato superveniente ou imprevisível apto a justificar a supressão da outorga variável ou outras medidas de reequilíbrio que onerem o interesse público. Com efeito, nos termos do art. 49 da Lei nº 8.666/1993, vigente à época da licitação, a Administração Pública somente poderia revogar o certame “por razões de interesse público decorrentes de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta”. Assim, uma vez identificado fato superveniente relevante — como a promulgação da Lei nº 13.711/2018 —, e convocados os licitantes para que, cientes da nova realidade normativa, pudessem decidir, de forma expressa, se manteriam suas propostas ou se delas desistiriam, competiria à autora ter se recusado a mater a proposta inicial. Nesse contexto, a resposta da concessionária à convocação para revalidação de sua proposta, nos termos do edital, revestiu-se de inequívoca manifestação de vontade, revelando plena aceitação das novas condições vigentes. Logo, ou a concessionária revalidava formalmente a proposta (como de fato o fez), assumindo integralmente os riscos legais já conhecidos, ou se recusava, hipótese em que o processo licitatório deveria ser anulado, na forma do art. 49, §1º, da mesma lei. Destarte, ao optar livremente pela revalidação, a VIA BRASIL assumiu os efeitos jurídicos decorrentes, não podendo, posteriormente, invocar o mesmo fato superveniente — já absorvido por sua manifestação de vontade — como fundamento para pleitear o reequilíbrio econômico-financeiro contratual. Por oportuno, anoto que se extrai do acervo probatório até então acostado aos autos que a concessionária requerida deu início à execução do contrato e prosseguiu na prestação dos serviços por mais de 02 (dois) anos sem sequer requerer fundamentadamente a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro em razão da isenção decorrente dos eixos suspensos. De fato, constou no OFÍCIO Nº 02453/2023/COGACR/SINFRA que, “acerca do evento de desequilíbrio relativo à Isenção de Eixos Suspensos em virtude da Medida Provisória n.° 833/2018 e Portaria n.° 081/2018/SINFRA, destaca-se que, até o momento a Concessionária não apresentou o requerimento fundamentado, conforme dispõe à cláusula supracitada do Contrato de Concessão, tendo um lapso temporal de 2 (dois) anos entre a comunicação do evento de desequilíbrio pela concessionária e o presente momento” (Id. 192533429 - Pág. 4). Cumpre salientar, ainda, que a assinatura do contrato, nesses moldes, configura verdadeiro ato jurídico perfeito, consubstanciando manifestação inequívoca de vontade do particular quanto aos riscos do negócio, nos termos do artigo 104, I e III, do Código Civil. Logo, a alegação de desequilíbrio fundado em fato conhecido à época da celebração implicaria violação aos princípios da boa-fé objetiva, da segurança jurídica e do pacta sunt servanda, consagrados no ordenamento jurídico pátrio. Dessa forma, ao menos nesta fase de cognição sumária, não se vislumbra a existência de motivos juridicamente adequados para sustentar o ato administrativo que aprovou o 4º Termo Aditivo com base em pretenso desequilíbrio decorrente de fatos previsíveis ou já consolidados no tempo. Corrobora ainda a presença da probabilidade do direito os demais documentos contidos no processo administrativo juntado aos autos pela AGER, dentre os quais estão a Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER, datada de 18/12/2024, que foi elaborada pela Superintendência Reguladora de Estudos Econômicos (SREE) da AGER para validar os cálculos de reequilíbrio econômico-financeiro apresentados pelo Verificador Independente, especialmente no chamado "Cenário 2". Este cenário foi utilizado como base para justificar o 4º Termo Aditivo ao contrato. Destarte, a referida nota técnica analisou o documento AGER-TER-2024/11483, protocolado pelo Verificador Independente, apontando a existência de 05 (cinco) possíveis cenários de reequilíbrio econômico-financeiro (Id. 192533435 - Pág. 50). Veja-se: Contudo, a referida nota técnica não fez análise detalhada e comparativa entre as opções de cenários existentes. Apenas listou os cinco cenários de recomposição, sem demonstrar tecnicamente a superioridade do “Cenário 02” ou justificar, em termos de proporcionalidade e vantajosidade ao interesse público, os motivos para a sua adoção. Destarte, o documento se limitou a apresentar os cenários e, em seguida, passou a analisar os aspectos relativos apenas ao “Cenário 02”, tendo assentado que, em atendimento ao “OFÍCIO Nº 07661/2024/COGACR/SINFRA (fls. 5164-5165), emitido aos 03/12/24, direcionado a esta Agência Reguladora, vem definir e estabelecer o cenário 2” (Id. 192533435 - Pág. 48). Ocorre que o mencionado Ofício nº 07661/2024/COGACR/SINFRA, constante no movimento de Id. 192533430 - Pág. 109, também não apresenta fundamentação detalhada ou técnica que motive a escolha do chamado “cenário 2”. O citado ofício apenas comunica a escolha da Administração, sem justificar, em termos de eficiência econômica, vantajosidade ao interesse público ou proporcionalidade, as razões pelas quais as demais opções não teriam sido mais adequadas ou menos gravosas ao erário. Prosseguindo, o Parecer nº 3364/SGAC/PGE/2024, que consta dos fundamentos do termo aditivo (Id. 188712190 - Pág. 1), não adentrou no mérito da escolha do cenário, nem realizou avaliação independente ou aprofundada. Ao contrário, o próprio parecer, ao final, solicitou expressamente a “complementação da justificativa lançada para a escolha do cenário apresentado, trazendo as razões do exercício da escolha (discricionária) realizada, de forma a complementar a instrução processual” (Id. 192533435 - Pág. 98). Tal solicitação demonstra que a motivação apresentada era insuficiente até mesmo do ponto de vista jurídico consultivo. Por fim, o Despacho nº 00018/2025/GSEIL/SINFRA, ao consolidar a adoção do “Cenário 2”, se limitou a apresentar as seguintes razões para escolha do “Cenário 02”: “Diante do exposto, justifica-se a escolha do Cenário 02 pois esse é a prerrogativa de equilíbrio econômico-financeiro que não afeta os valores tarifários, prorroga o prazo da concessão e mantém o investimento em obras prioritárias, reduzindo o impacto do reequilíbrio no Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA. Os demais cenários apresentaram aumento de tarifa, o que viola a previsão legal acerca do reequilíbrio decorrente de eixos suspensos, com exceção do Cenário 01. No entanto, o Cenário 1 demonstrou não ser o mais equilibrado em tratativas com a concessionária. Sendo assim, em comparação com todos os cinco cenários apresentados, o Cenário 02 foi o mais viável para a manutenção do equilíbrio econômico financeiro do Contrato e uma distribuição equânime entre as partes dos impactos do reequilíbrio” (Id. 192533435 - Pág. 110). Como se vê, as justificativas apresentadas se mostram, no mínimo, genéricas e não acompanhadas de análise técnica detalhada, contentando-se o despacho em reafirmar a escolha administrativa, o que fragiliza a motivação do ato administrativo e pode configurar ausência de motivo válido, conforme art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65. Isso porque, em nenhum dos atos administrativos foi sopesado estudo técnico robusto que justificasse a escolha do “Cenário 02” dentre os 05 possíveis. No caso concreto, a opção exclusão da outorga variável, a prorrogação do contrato e a supressão de obras fundamentais, sem comprovação de motivação robusta, revela-se aparentemente desproporcional e contrária ao dever de proteção ao patrimônio público e à segurança dos usuários. Dessa forma, verifica-se que, em sede de cognição sumária, os motivos indicados para a adoção do “Cenário 2” mostram-se, ao menos por ora, materialmente insuficientes e juridicamente inadequados ao resultado obtido, nos termos do art. 2º, alínea “d”, da Lei nº 4.717/65. Para além disso, mister se faz destacar que não há como este Juízo aferir, sem uma dilação probatória detalhada, com possível necessidade de produção de prova técnica pericial, se os motivos apontados pela Administração Pública e ratificados nos documentos mencionados podem ser considerados, em definitivo, juridicamente adequados para o resultado obtido. Tal exame dependerá de instrução probatória ampla, a ser oportunamente realizada no curso da demanda. 2.5. Discricionariedade Administrativa: Para além da presença da probabilidade do direito alegado, importante ressaltar que a discricionariedade administrativa não é absoluta. Ela está limitada pelos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, eficiência, moralidade administrativa e supremacia do interesse público. Por certo, nos contratos de concessão, assim como nos administrativos em geral, há espaço jurídico para o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, desde que se preserve a relação de proporcionalidade entre encargos assumidos e benefícios percebidos pelo concessionário. Assento que, no caso em apreço, o próprio contrato, em sua Cláusula 38.1, assegura ao Poder Concedente a faculdade de escolha entre as alternativas previstas, não havendo ainda vedação à adoção de medidas diversas, desde que aptas a recompor a equação econômico-financeira e em consonância com os princípios da Administração Pública e com a legislação aplicável. Entretanto, mesmo que o Estado tenha margem para escolher o instrumento de recomposição, no caso concreto, a opção pela eliminação de obras essenciais e supressão de receitas públicas (via exclusão da outorga variável), tudo em favor da concessionária, ofende os princípios supracitados, sendo medida desproporcional, sobretudo quando não demonstrado tecnicamente que inexistia alternativas menos gravosas ao interesse coletivo nos outros 04 (quatro) cenários apresentados. Com efeito, a Administração tem o dever de motivar sua decisão para aditar o contrato administrativo, tendo em vista os princípios norteadores da atividade administrativa e, especialmente, da licitação. Sem motivação será inválida a unilateral alteração do contrato administrativo. Pelos mesmos motivos, a motivação não poderá consistir na simples invocação da discricionariedade administrativa ou na necessidade de preservação de algum “interesse público”, de conteúdo material indeterminado. Ao contrário, a Administração deverá indicar o motivo concreto, real e definido que impõe a modificação. Ademais, deverá demonstrar que este motivo não existia ao tempo da contratação, bem como que a modificação introduzida no contrato guarda proporcionalidade com a modificação verificada nas circunstâncias subjacentes. Na hipótese em apreço, o ato administrativo aponta que o Cenário 2 foi escolhido em primeiro lugar para preservar a modicidade tarifária, ou seja, para não onerar diretamente os usuários da rodovia com aumento de tarifa. Não obstante, conforme amplamente analisado nos tópicos anteriores, não restou demonstrado, de forma técnica e documental, que essa opção seria a mais adequada para atender ao interesse público, tampouco se mostrou justificada a completa exclusão de alternativas intermediárias previstas contratualmente, como a revisão tarifária gradual, o escalonamento de investimentos ou a adoção de medidas compensatórias menos gravosas. Frise-se: a discricionariedade administrativa, mesmo dentro de sua razoável amplitude, encontra limites que podem ser controlados pelo Poder Judiciário, especialmente quando evidenciado desvio de finalidade ou ausência de motivo válido capaz de sustentar a escolha do administrador. Aliás, pela teoria dos motivos determinantes, quando a Administração indica os motivos que a levaram a praticar o ato, este somente será válido se os motivos forem verdadeiros. Assim, ao Poder Judiciário compete examinar os pressupostos de fato e as provas da ocorrência do motivo. Portanto, observados os elementos fáticos e jurídicos expostos, cabível a intervenção judicial corretiva para, ao menos nesta seara inaugural, assegurar que o ato administrativo seja suspenso para que possa ser melhor avaliado dentro dos contornos legais e constitucionais. Isso porque, sem prejuízo de ulterior aprofundamento probatório, resta configurada a probabilidade do direito alegado pelo autor, não apenas em razão da ausência de comprovação de desequilíbrio econômico-financeiro efetivo, mas também pela aparente desproporcionalidade das medidas adotadas para o reequilíbrio, à luz do ordenamento jurídico e dos princípios que regem a Administração Pública. 2.6. Perigo de Dano e Irreversibilidade: Além da probabilidade do direito, igualmente se faz presente o requisito do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, conforme exige o art. 300 do Código de Processo Civil. No presente caso, a própria Nota Técnica nº 00105/2024/SREE/AGER apontou expressamente que, “dentre os eventos que causaram desequilíbrio no Contrato, a isenção dos eixos suspensos são responsáveis por 98% do montante devido em desequilíbrio, calculados no total de R$ 30.010,43 milhões” (Original sem destaque, Id. 192533435 - Pág. 51), o que, ante o já assentado no tocante à isenção decorrente de disposição legal, corrobora não só a probabilidade do direito como atesta principalmente a presença do requisito do periculum in mora. Isso porque, já estando vigente a alteração contratual e trazendo efeitos concretos imediatos, inclusive em razão da exclusão do percentual anteriormente definido à título de outorga variável, a não concessão da tutela de urgência neste momento acarreta risco concreto de frustrar o resultado útil do presente processo. Com efeito, a vigência imediata do 4º Termo Aditivo já produz efeitos concretos ao patrimônio público, inclusive pela exclusão do percentual anteriormente destinado à outorga variável, o que acarreta impacto direto na arrecadação estadual e, consequentemente, limita investimentos públicos futuros. Além disso, o prolongamento contratual e a supressão de obras essenciais igualmente resultam em riscos concretos à segurança viária e à integridade dos usuários das rodovias MT-320 e MT-208. Por conseguinte, a não concessão da tutela de urgência neste momento possibilita a continuidade da execução de um aditivo que altera substancialmente as obrigações contratuais da concessionária, transfere ônus financeiros ao Estado e posterga investimentos essenciais, resultando em risco concreto e iminente de lesão grave e de difícil reparação ao erário e à coletividade. Ressalte-se que o periculum in mora, no caso, não decorre apenas de prejuízos financeiros, mas também de potenciais danos irreversíveis à segurança pública, caso obras fundamentais sejam adiadas ou suprimidas, conforme comprovado pelos cronogramas modificados e pelos documentos anexados. Por fim, no tocante à irreversibilidade, a suspensão dos efeitos do termo aditivo não implica dano irreversível à concessionária, pois eventual revalidação poderá ser feita após instrução probatória mais aprofundada, inclusive com eventual compensação de eventuais prejuízos comprovados. Destarte, presente o requisito do perigo de dano, somado à probabilidade do direito já demonstrada, autoriza-se a concessão da tutela antecipada para resguardar o patrimônio público, a segurança dos usuários e a efetividade do processo. 3. Valor da Causa: Consoante já exposto, trata-se de Ação Popular proposta por Faissal Jorge Calil Filho, com pedido de tutela de urgência, na qual se pretende a suspensão e, ao final, a anulação do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 001/2019/00/00-SINFRA, bem como, subsidiariamente, a rescisão do próprio contrato de concessão, em razão de supostas ilegalidades que implicariam lesão ao patrimônio público e violação a princípios constitucionais. O autor popular atribuiu à causa o valor de R$ 71.000.000,00 (setenta e um milhões de reais), porém sem apresentar qualquer fundamentação técnica ou exposição detalhada que justifique a adoção desse montante. Pois bem. Em regra, o valor da causa deve equivaler ao do benefício patrimonial buscado ou do prejuízo que se quer evitar, conforme disposto nos arts. 291 e 292 do Código de Processo Civil. É certo que, ao se considerar a pretensão deduzida na exordial como de tutela coletiva, o art. 292 não estabelece parâmetros objetivos para a atribuição do valor da causa. Entretanto, a jurisprudência pátria é firme no sentido de que o valor da causa deve refletir o conteúdo econômico da demanda[2], assim como que a fixação deve ser por estimativa quando a demanda coletiva não possuir proveito econômico certo ou imediato[3]. Nesse sentido, vide ementa a seguir, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POPULAR. VALOR DA CAUSA EM AÇÃO POPULAR. VALOR DA CAUSA DE DIFÍCIL DETERMINAÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO FIRMADO PELO MUNICÍPIO PARA FORNECIMENTO DE SANEAMENTO E FORNECIMENTO DE ÁGUA. VIOLAÇÃO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO DEMONSTRADA. RECURSO DESPROVIDO. I - No tocante ao valor da causa, considerando que na presente demanda não é possível determinar o valor do proveito econômico perseguido, vez que se trata de ação popular para controle de ato administrativo, tem-se como correta a adequação promovida do valor da causa pelo Magistrado a quo, para o patamar de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos de alçada. II - A singela afirmação acerca da inexistência de cláusula contratual dirigida à ampliação do serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto não se revela o bastante para a pretensa anulação do contrato firmado entre a concessionária e o município, na medida em que se mostram ausentes a descrição de elementos objetivos e concretos que demonstram a violação à moralidade administrativa, revelada em suposto ato ilegal praticado pela administração pública, sobretudo se levarmos em conta a inexistência de demonstração acerca da prática do ato dissociado do interesse público. III - A despeito da combatividade do Apelante, é preciso ter em vista que ao propor a ação, o autor popular age no interesse coletivo de fiscalização dos atos públicos para garantir uma administração pública pautada nos princípios da legalidade e moralidade-probidade. Assim, malgrado a Ação Popular possa ser empregada para a impugnação do ato lesivo ao patrimônio moral, pressupõe seja descrita conduta que, em concreto, viole a moralidade-probidade administrativa, o que não ocorreu no caso. lV - Recurso desprovido”. (TJES; AC 0001715-49.2017.8.08.0013; Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Jorge do Nascimento Viana; Julg. 19/04/2021; DJES 17/05/2021). No caso vertente, a ação popular visa proteger o interesse público e não busca um proveito patrimonial direto imediato, o que afasta a necessidade de vinculação estrita ao valor integral da relação contratual impugnada. Destarte, o autor não indicou de que forma chegou ao valor atribuído, tampouco especificou quais parcelas ou prejuízos concretos ao erário teriam sido considerados para fixar a quantia indicada. Como exposto, a presente demanda não visa buscar ressarcimento imediato de valores certos e líquidos, mas sim resguardar o patrimônio público e assegurar a adequada execução do contrato de concessão, inclusive no tocante ao cumprimento integral das obras essenciais, à manutenção da outorga variável e à preservação do prazo contratual originário. Ainda que os fatos e fundamentos apresentados indiquem um potencial prejuízo acumulado, com a exclusão de aproximadamente R$ 490.000,00 (quatrocentos e noventa mil reais) anuais de outorga variável e possíveis perdas superiores a R$ 14 milhões ao longo do restante do contrato, não há, neste momento processual, definição precisa de um valor patrimonial certo a ser restituído ou reparado. Ademais, o valor atribuído à causa pelo autor supera demasiadamente os R$ 14 milhões das perdas acumuladas supracitadas. Por tal razão, assim como tendo em vista o entendimento jurisprudencial consolidado, entendo que o valor da causa deve ser fixado em valor estimativo simbólico, sem vinculação direta ao valor integral do contrato administrativo ou ao montante total de eventuais prejuízos futuros estimados. Destarte, considerando a ausência de explicação técnica do autor e a natureza difusa do direito tutelado, revela-se razoável fixar o valor da causa em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), apenas para fins de alçada e processamento, sem prejuízo de eventual apuração posterior em liquidação ou cumprimento de sentença. 4. Deliberações Finais: Diante do exposto, uma vez que presentes todos os requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil, DEFIRO o pedido de tutela provisória de urgência, o que faço para suspender os efeitos do 4º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão até ulterior deliberação judicial, notadamente em razão da recomposição tarifária fundada na alegação de desequilíbrio econômico-financeiro causado pelas isenções previstas na Lei Federal n.º 13.711/2018. CORRIJO, de ofício, o valor da causa para R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), nos termos do art. 292, § 3º, do Código de Processo Civil. PROCEDA-SE com a alteração necessária no Sistema PJe. DEFIRO parcialmente o pedido de Id. 192574065, o que faço para determinar a exclusão das petições de Ids. 192567312, 192536024, 192533968 e 192532279 e dos documentos que a acompanharam, mantendo-se tão somente a petição de Id. 192533422 e seus respectivos documentos, posto que foram os primeiros a serem juntados nos autos. DÊ-SE ciência ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso (artigo 7º, I, “a”, da Lei nº 4.717/65). Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. BRUNO D’OLIVEIRA MARQUES Juiz de Direito [1] NOHARA, Irene. 1. Áleas Contratuais In: NOHARA, Irene. Licitação e Contratos Administrativos - Vol. 6 - Ed. 2022. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/licitacao-e-contratos-administrativos-vol-6-ed-2022/1712827906. Acesso em: 9 de Julho de 2025. [2] REsp n. 1.712.504/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/4/2018, DJe de 14/6/2018. [3] AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO POPULAR. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. IMPROCENDENTE. INCERTEZA DO PROVEITO ECONÔMICO. VALOR POR ESTIMATIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. STJ. RECURSO DESPROVIDO. (...) 1. A jurisprudência desta corte superior é no sentido de ser admissível a fixação do valor da causa por estimativa, quando constatada a incerteza do proveito econômico perseguido na demanda. (...). ” (AgRg no AREsp 583.180/rj, Rel. Ministro Paulo de Tarso Tanseverino, Terceira Turma, julgado em 20/08/2015, dje 27/08/2015). (TJMT; AI 44295/2015; Capital; Relª Desª Nilza Maria Pôssas de Carvalho; Julg. 10/11/2015; DJMT 23/11/2015; Pág. 70). Gabinete do Juízo Titular I da Vara de Ações Coletivas - 20001 - Contato Assessoria: (65) 3648-6413, via telefone ou Whats'App Business

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Processo nº 5120279-79.2021.8.09.0029

ID: 337011985

Tribunal: TJGO Órgão: 5ª Câmara Cível Classe: EMBARGOS à EXECUçãO FISCAL Nº Processo: 5120279-79.2021.8.09.0029

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

ITAú UNIBANCO S/A

Polo Passivo:

Relatório e Voto

Advogados:

SIMONE RODRIGUES COSTA BARRETO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

MARCELA MEDRADO PASSOS GOMES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete da Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo APELAÇÃO CÍVEL Nº 5120279-79.2021.8.09.0029 COMARCA DE CATALÃO APELANTE: M… PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete da Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo APELAÇÃO CÍVEL Nº 5120279-79.2021.8.09.0029 COMARCA DE CATALÃO APELANTE: MUNICÍPIO DE CATALÃO APELADO: ITAÚ UNIBANCO S/A RELATORA: DESª. MÔNICA CEZAR MORENO SENHORELO 5ª CÂMARA CÍVEL EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA (ISSQN) SOBRE OPERAÇÕES BANCÁRIAS. NÃO INCIDÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Apelação Cível interposta por Município contra sentença que julgou procedentes Embargos à Execução Fiscal opostos por instituição financeira, declarando a inexigibilidade do crédito tributário referente ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre determinadas operações bancárias. O Município alega erro na valoração da prova pericial e violação da presunção de legitimidade dos atos administrativos fiscais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão são: (i) a correta valoração da prova pericial, especificamente a análise da natureza das operações bancárias em relação à incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN); (ii) a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre rendas de empréstimos e financiamentos, financiamentos rurais e recuperações de créditos compensados como prejuízo, considerando a legislação pertinente e a jurisprudência e; (iii) a possibilidade de interpretação extensiva da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Não merecem ser conhecidas as matérias recursais já preclusas; que não resultaram em prejuízo à parte insurgente e que configuram inovação recursal. 4. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (Súmula 424 e Tema Repetitivo 132) firmou que a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre serviços bancários deve ser analisada caso a caso, considerando a natureza do serviço e a lista anexa à Lei Complementar 116/2003, admitindo-se interpretação extensiva. No caso, as operações em questão são tipicamente financeiras (operações de crédito), não se enquadrando como serviços tributáveis pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). 5. O Princípio da Essência sobre a Forma foi considerado na análise das operações, mas a classificação contábil, somada à natureza financeira das operações, comprova a inexistência de prestação de serviços tributáveis. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso parcialmente conhecido e na parte conhecida, desprovido. Tese de Julgamento: "1. A matéria deduzida exclusivamente na Apelação configura inovação recursal, impossibilitando o conhecimento do recurso nessa parte, sob pena de Violação ao Princípio do Duplo Grau de Jurisdição. 2. As operações bancárias em questão, sendo de natureza financeira, não constituem fato gerador do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). 3. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça orienta a não incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre operações de crédito.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 156, III; LC 116/2003, art. 1º, § 4º; art. 2º, III; CPC, art. 1.014; art. 479; art. 85, § 11; Lei nº 6.830/80, art. 3º; CTN, art. 204. Jurisprudências relevantes citadas: Súmula 424 do STJ; Tema Repetitivo 132 do STJ. ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as mencionadas anteriormente. ACORDAM os componentes da Terceira Turma julgadora da 5ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, EM CONHECER PARCIALMENTE DA APELAÇÃO CÍVEL E, NESTA PARTE, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da Relatora. VOTARAM, além da Relatora, o Desembargador Algomiro Carvalho Neto e o Desembargador Fernando de Mello Xavier. PRESIDIU a sessão o Desembargador Guilherme Gutemberg Isac Pinto. PRESENTE o Doutor Wagner de Pina Cabral, Procurador de Justiça. VOTO Cuida-se, como visto, de Apelação Cível interposta por Município de Catalão, em face da sentença proferida pela Juíza de Direito da Vara da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Catalão, Dra. Cibelle Karoline Pacheco, nos autos dos “Embargos à Execução Fiscal” opostos por Itaú Unibanco S/A, ora apelado. Após processado o feito, a Magistrada singular proferiu sentença nos seguintes termos (evento nº 111): “(…) Ante todo o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, e art. 920, inciso III, ambos do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os embargos à execução opostos, extinguindo-se o processo com a resolução do mérito, para declarar a inexigibilidade do crédito tributário informado no Auto de Infração nº 014/2019, bem como na Certidão de Dívida Ativa Municipal nº 20200000062, em razão da não incidência do ISS sobre as contas contábeis referentes às operações de rendas de empréstimos e financiamentos (COSIF 7.1.1.05.00.6 e 7.1.1.15.00.3), rendas de financiamentos rurais (COSIF 7.1.1.40.00.9) e recuperações de créditos compensados como prejuízo (COSIF 7.1.9.20.00.9). Consequentemente, com fundamento no art. 485, inciso IV, bem como nos arts. 924, inciso III, e 925 do Código de Processo Civil, DECLARO extinta a execução fiscal nº 5139066-93.2020.8.09.0029, em apenso. Promova-se a juntada de cópia desta sentença nos autos da execução fiscal referida. Em observância ao princípio da causalidade, condeno o embargado na restituição das custas processuais adiantadas pelo embargante, bem como no pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência, que fixo no patamar mínimo previsto nos incisos do art. 85, § 3º, do Código de Processo Civil, em sendo o caso, observando-se as faixas de escalonamento indicadas no referido dispositivo, nos termos do art. 85, § 5º, do Código de Processo Civil1, cujo percentual deverá incidir sobre o proveito econômico obtido pelo embargante. Irresignado, o Município de Catalão, interpôs Apelação Cível (evento nº 120), no qual alega, preliminarmente, erro na valoração da prova pericial, argumentando que a sentença se fundamentou de forma excessiva nas conclusões do perito judicial, que teria extrapolado sua competência técnico-contábil ao emitir juízo de valor jurídico sobre a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), matéria de competência exclusiva do Juízo. No mérito, aponta que a sentença ignorou a presunção de legitimidade, certeza e liquidez dos atos administrativos fiscais, especialmente o Auto de Infração e a Certidão de Dívida Ativa, conforme previsto nos artigos 204 do Código Tributário Nacional e 3º da Lei nº 6.830/80. Defende a interpretação extensiva da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003, de acordo com a Súmula 424 do Colendo Superior Tribunal de Justiça e o Tema Repetitivo 132, apontando que o juízo de origem, embora tenha reconhecido a jurisprudência, afastou a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as operações em análise ao tratá-las como operações financeiras, sem avaliar adequadamente os componentes de serviço envolvidos. Reitera que a incidência do imposto independe da classificação formal ou da denominação dada pelo contribuinte, em conformidade com o § 4º do artigo 1º da Lei Complementar nº 116/2003, e sustenta que as contas COSIF registradas como “rendas” incluem tarifas, comissões e encargos por serviços bancários acessórios enquadráveis no item 15.08 da referida Lei. Defende também que o juízo de origem ignorou o Princípio Contábil da Essência Sobre a Forma, privilegiando a classificação formal das receitas contábeis em detrimento da análise da natureza efetiva das operações tributadas. Além disso, alega que o juízo se equivocou ao tratar indistintamente todas as rendas autuadas como juros remuneratórios, sem distinguir os juros puros, que são excluídos pela Lei Complementar 116/2003, das tarifas e comissões decorrentes de serviços vinculados às operações de crédito, que seriam tributáveis. Quanto às “recuperações de créditos baixados como prejuízo”, afirma que essas atividades envolvem serviços ativos, como cobrança, notificação e negociação, enquadráveis no item 15.10 da Lei Complementar nº 116/2003, e que a classificação contábil utilizada não descaracteriza a natureza da atividade como prestação de serviços. Por fim, refuta a alegação de bitributação entre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), sustentando que os fatos geradores e competências constitucionais são distintos, sendo o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) aplicável aos serviços acessórios das operações financeiras, enquanto o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incide sobre a operação financeira principal, inexistindo sobreposição tributária. Ao final, requer o provimento do recurso para reformar integralmente a sentença, reconhecendo a legitimidade da cobrança do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as tarifas, comissões e encargos bancários, além da improcedência dos Embargos à Execução Fiscal e o prosseguimento da cobrança integral do crédito tributário, com condenação da parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Passo a análise. Em proêmio, deixo de conhecer parte do recurso, pois há evidente inovação recursal, já que a tese apresentada não foi suscitada ao longo da demanda e foi trazida à discussão apenas em sede recursal, configurando supressão de instância e violação ao Princípio do Duplo Grau de Jurisdição. O Código de Processo Civil prevê em seu artigo 1.014 a proibição do “ius novorum”, no qual estabelece que as questões não abordadas em primeira instância não poderão ser debatidas em sede recursal, excetuado a hipótese de força maior, vejamos: Art. 1.014. As questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior. Com efeito, no presente caso, quanto às alegações da apelante acerca da pretensão de reanálise fática do resultado do exame pericial, verifica-se que a matéria está preclusa, já que a parte não manifestou insurgência, no tempo e modo apropriados, em relação ao teor do laudo apresentado, apesar de ter sido devidamente intimada para esse fim. Extrai-se dos autos que o prazo para impugnação dos laudos escoou em branco, aí resultando a preclusão do tema, ora em embate. Destarte, cientificada a parte quanto ao teor do laudo pericial, o transcurso do prazo de impugnação sem manifestação contrária torna-o incontroverso, não cabendo levantar matéria preclusa em sede recursal. Dessa forma, impõe-se o reconhecimento da inovação recursal, a impedir a cognição da matéria intempestivamente suscitada, já que a questão não foi aventada pela parte em momento oportuno, obstando a discussão pela instância antecedente. A propósito, a impossibilidade de inovação recursal se encontra em consonância com a jurisprudência desta Corte, vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE DEPENDÊNCIA POR INVALIDEZ COM PEDIDO DE PENSÃO POR MORTE. TESE ALEGAÇÃO SOLTEIRA. INOVAÇÃO RECURSAL. LAUDO PERICIAL. IMPUGNAÇÃO. PRECLUSÃO. I - Como o objeto do recurso deve estar limitado às questões ventiladas na primeira instância, não merece conhecimento tese e pedido inaugurado no apelo, porquanto materializa indevida inovação recursal, sob pena de supressão de instância e ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. II - A parte apelante concordou com o laudo pericial acostado aos autos, tornando-se preclusa a possibilidade de discussão acerca de sua validade, diante da ausência de impugnação no momento oportuno por vias próprias, nos termos dos artigos 477 e 507, ambos do CPC. Apelo conhecido em parte e desprovido. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0415249-58.2011.8.09.0051, Rel. Des(a). ALICE TELES DE OLIVEIRA, Assessoria para Assunto de Recursos Constitucionais, julgado em 10/04/2023, DJe de 10/04/2023). Desta feita, presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele parcialmente conheço. Por conseguinte, sobre o tema em questão, o artigo 156 da Constituição Federal define que compete aos Municípios instituir impostos sobre os serviços de qualquer natureza, nos seguintes termos: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (…) III. Serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. O fato gerador do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por seu turno, está definido no artigo 1°, caput, da Lei Complementar federal n° 116, de 31 de julho de 2003, da seguinte forma, ad litteram: Art. 1°. O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. Nesses termos, o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) contempla os serviços de qualquer natureza definidos em Lei Complementar da União Federal, e tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa à Lei Complementar. Nesse sentido, pacificou-se a compreensão de que a própria Lei que rege esse imposto teria optado por tributar o gênero e autorizar a aplicação da interpretação extensiva em razão da impossibilidade de se prever todas as espécies e derivações de um mesmo serviço. A propósito: TRIBUTÁRIO - SERVIÇOS BANCÁRIOS - ISS - LISTA DE SERVIÇOS - TAXATIVIDADE - INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento de que é taxativa a Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei 406/68, para efeito de incidência de ISS, admitindo-se, aos já existentes apresentados com outra nomenclatura, o emprego da interpretação extensiva para serviços congêneres. 2. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08. (REsp n. 1.111.234/PR, relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 23/9/2009, DJe de 8/10/2009) No mesmo trilho, e, tratando especificamente de serviços bancários congêneres, tem-se o entendimento consolidado no preceito sumulado n. 424 e na tese fixada quando do julgamento do REsp n. 1.111.234/PR, pelo rito dos recursos repetitivos (Tema 132), respectivamente: Súmula n. 424/STJ: É legítima a incidência de ISS sobre os serviços bancários congêneres da lista anexa ao DL n. 406/1968 e à LC n. 56/1987. Tema Repetitivo 132 STJ: É legítima a incidência de ISS sobre os serviços bancários congêneres da lista anexa ao DL n. 406/1968 e à LC n. 56/1987. Endossando essa hermenêutica, a doutrina de José Antonio Patrocínio, verbo ad verbum: 12. Atividade-fim e atividade-meio – Qual delas tributar? […] Por fim, fechando a questão da classificação dos fatos geradores, temos aqueles considerados como complexos. Nestes casos, além do núcleo da prestação dos serviços, temos ainda um conjunto de atos, fatos ou situações jurídicas da mesma espécie que estão sempre vinculadas entre si. E é justamente neste contexto que estão inseridas as chamadas “atividades-meio” e “atividades-fim”. No caso em comento, utilizando-se destes pressupostos, o STJ decidiu que os serviços auxiliares, quais sejam, a preparação e conferência de numerário transportado, a soma de cheques, o envelopamento e o acondicionamento em cofre, integram um único fato gerador complexo (transporte de valores). São atividades acessórias que não possuem autonomia e justamente por isso devem ser oferecidas para tributação juntamente com a atividade principal. Vamos então estudar mais um pouco o assunto. Como dissemos, existem fatos geradores complexos ou serviços complexos que, além do núcleo da prestação dos serviços (atividade-fim), contam também com algumas atividades acessórias. Essas atividades acessórias, também conhecidas como “atividades-meio”, não possuem autonomia capaz de atrair a incidência tributária de forma isolada e independente. Por outro lado, também não podem ser excluídas da tributação da operação principal (atividade-fim). Nestes casos, tanto a “atividade-fim” quanto as “atividades-meio” ou “atividades acessórias” integram uma única operação de prestação de serviços. O trecho abaixo, extraído do julgado em comento ilustra bem o que estamos falando. Vejamos: “Isto porque, os serviços de preparação e conferência de numerário, soma de cheques, e acondicionamento, a meu sentir, são atividades-meio para a prestação da atividade-fim, que é o transporte de valores. Impossível pensar na prestação do serviço de transporte de valores sem essas precauções prévias, que não importam em serviços autônomos. Assim, o serviço de transporte de valores, forma ampla, não significa apenas conduzir o bem de um lugar a outro, mas toda a preparação para atingir o fim maior que é o de transportar os valores constantes da carga. Destarte, começa desde a contagem, separação, envelopamento, soma de valores e acondicionamento para o efetivo transporte. Como pensar em transporte de valores se estes não estão referidos e devidamente acondicionados”. Abordando a questão de forma genérica, o Ministro relator ensina-nos que: “Certamente não haverá fato gerador autônomo relativamente a serviço- meio prestado e cobrado em conjunto com outro serviço, o serviço-fim. Esse último é que poderá ser tributado, se for o caso. Todavia, configura fato gerador a prestação de serviço, ainda que possa ser qualificado como integrante de atividade-meio ou não preponderante do prestador, quando prestado e cobrado autônoma e individualmente do tomador. Entendimento contrário permitiria a deformação do tributo mediante a repartição da cobrança separada das várias etapas de um mesmo serviço. Não se pode, com efeito, confundir serviço-meio com serviço-fim, ainda que esse se constitua em atividade complementar ou subsidiária do prestador”. O Prof. Aires Fernandino Barreto, citado pelo relator, aborda a questão da seguinte maneira: “Os leigos tendem a confundir o exercício de atividades-meio com prestação de serviço. Calcados na nomenclatura dos serviços – cuja tributação pelo Município é sugerida pela LC 56/1987 – misturam, embaralham, confundem, equiparam, tarefas-meio com serviços. Na sua simplicidade ingênua, não distinguem a consistência do esforço humano prestado a outrem, sob regime de direito privado, com conteúdo econômico, das ações intermediárias que tornam possível o fazer para terceiros. Reúnem o que não se amalgama. Tratam, como iguais, fatos absolutamente díspares. A designação da ação humana pode representar: (a) um ato, fato ou obra constitutivo de passo ou etapa para a consecução de um fim; (b) o próprio fim ou objeto. A concreta indicação de uma ação (datilografia, programação, organização, manutenção, operação, administração) é, muitas vezes, configuradora de atos, fatos ou obras meramente constitutivos de etapas necessárias para alcançar um fim. É inafastável – ainda que disso muitos não se deem conta – que o atingir um fim qualquer exija, empírica ou cientificamente, atividades de planejamento, organização, administração, controle, não obstante essas ações nada tenham a ver com o fim perseguido que, por hipótese, poderia ser o de transportar pessoas. Outras vezes, essas mesmas ações humanas não mais se caracterizam como atividades condicionantes da concretização de um fim, mas demarcam, ao revés, o próprio objeto colimado. Nesses casos, a razão última dessas ações é a sua própria produção como utilidade, para terceiros” (Aires Fernandino Barreto, ISS – Atividade-meio e serviço-fim, Revista Dialética de Direito Tributário 5/81-82, São Paulo: Dialética, 1996). Nesta mesma linha de raciocínio, a questão da tributação da “atividade-meio” também mereceu comentários do Prof. Kiyoshi Harada. Tratando da impossibilidade de fracionamento do fato gerador complexo ele assim se manifestou: “Se isso fosse possível, o serviço de advocacia, por exemplo, previsto no item 17.14, por abranger múltiplas atividades, como pesquisas doutrinárias e jurisprudências, datilografia ou digitação, cobrança de valores, elaboração de ficha cadastral de clientes, reprografia, interpretação de textos legais, revisão de peças, pareceres etc. também poderia ser desdobrado em vários itens autônomos de serviços como os itens 13.04 (reprografia, digitalização); 15.05 (elaboração de ficha cadastral); 15.10 (serviços relacionados a cobranças, recebimentos ou pagamento); 17.02 (datilografia, redação, interpretação, revisão e congêneres) etc. Em todas essas hipóteses, haveria confusão entre atividade-meio e atividade-fim. Não há como prestar o serviço de advocacia, sem interpretação de textos legais, datilografia ou digitalização e revisão de petições e pareceres, bem como elaboração de ficha cadastral de clientes, para controle e acompanhamento dos serviços contratados. Devem ser consideradas de forma global e única, afastando-se qualquer possibilidade de fracionamento em serviços isolados ou independentes. Fato gerador complexo não pode ser desmembrado”. Como vimos, os chamados fatos geradores complexos são constituídos de uma atividade principal ou “atividade-fim”, que é o núcleo da prestação dos serviços e de várias “atividades-meio” tidas como acessórias. Na verdade, essas atividades acessórias são aquelas que dão o suporte necessário para a realização da atividade principal. Justamente por isso é que são absolutamente indissociáveis uma da outra. Por tudo isto, recomendamos muita cautela por parte do aplicador da Lei quando estiver diante de serviços cujos fatos geradores sejam considerados complexos. Uma análise equivocada do caso pode gerar muitos conflitos com o Fisco municipal, especialmente quanto a composição de sua base de cálculo e a definição do local do pagamento do imposto. (PATROCÍNIO, José Antônio. ISS: Teoria, Prática e Jurisprudência. Lei complementar 116/2003 anotada e comentada . 5. ed. São Paulo: Thomson Reuters Revista dos Tribunais, 2023, E-Book, Page RB-2.12, g.) Nessa linha, considerando que o apelado é uma instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central, legitima a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) nas hipóteses contempladas na lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003, admitida, também, a interpretação extensiva para tributação de outros serviços. In casu, o Fisco Municipal instaurou o Termo de Início de Fiscalização – TIAF 007/2019, no intuito de apurar as atividades exercidas pelo apelado no período de 01 de janeiro de 2014 a 30 de junho de 2019. Em decorrência, foi procedida a lavratura do Auto de Infração nº 014/2019, em que se exigiu o pagamento de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) supostamente incidente sobre atividades bancárias (receitas de juros nas operações de empréstimos e financiamentos; receitas de juros de financiamentos rurais; e recuperações de créditos compensados como prejuízo), acrescido dos encargos legais e multa sobre o valor do tributo. Posteriormente, o débito foi inscrito em Dívida Ativa Municipal sob o nº 20200000062 e, ato seguinte, o Município de Catalão ajuizou a Ação de Execução Fiscal, perfazendo o valor, à época, de R$ 280.683,51 (duzentos e oitenta mil, seiscentos e oitenta e três reais e cinquenta e um centavos). Por sua vez, o embargante sustentou que não seria aplicável a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as rubricas autuadas, correspondentes as contas contábeis referentes às rendas de empréstimos e financiamentos (COSIF 7.1.1.05.00.6 e 7.1.1.15.00.3), rendas de financiamentos rurais (COSIF 7.1.1.40.00.9) e recuperações de créditos compensados como prejuízo (COSIF 7.1.9.20.00.9). Passo a análise. In casu, conforme exposto, a controvérsia reside em analisar a validade do Auto de Infração nº 014/2019 e da Certidão de Dívida Ativa nº 20200000062, bem como em verificar a ocorrência do fato gerador para a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as operações financeiras realizadas pelo embargante. Portanto, para avaliar a legalidade da incidência do imposto sobre as rendas de empréstimos e financiamentos (COSIF 7.1.1.05.00.6 e 7.1.1.15.00.3), rendas de financiamentos rurais (COSIF 7.1.1.40.00.9) e recuperações de créditos baixados como prejuízo (COSIF 7.1.9.20.00.9), torna-se indispensável a análise específica de cada atividade a fim de determinar se possuem, ou não, natureza de serviço tributável. 1. Operações de empréstimos e financiamentos As rubricas 7.1.1.05.00-6 (Rendas de Empréstimos) e 7.1.1.15.00-3 (Rendas de Financiamentos) são classificadas pela Instrução Normativa BCB n° 273 como rendas oriundas de operações de crédito, com as funções especificadas para registrar as rendas que constituem receita efetiva da instituição financeira no período: 7 .1 .1 .0 5.0 0 – 6 RENDAS DE EMPRÉSTIMOS, cuja função é registrar as rendas de empréstimos que constituam receita efetiva da instituição no período; 7 .1 .1.1 5.0 0 - 3 RENDAS DE FINANCIAMENTOS, cuja função é registrar as rendas de financiamentos que constituam receita efetiva da instituição no período, segregadas em subtítulos de uso interno a fim de identificar as rendas sobre cada um dos fundos, programas ou linhas de crédito; Essas rubricas são direcionadas para as operações que envolvem empréstimos, desconto de direitos creditórios e financiamentos, todas categorizadas como operações de crédito. Conforme o entendimento jurídico prevalente e a interpretação da legislação tributária, especialmente no que tange à Lei Complementar nº 116/2003, operações de crédito propriamente ditas não se enquadram nas definições de serviços passíveis de tributação pelo Imposto Sobre Serviços (ISS). Isso se deve ao fato de que o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) incide sobre a prestação de serviços de qualquer natureza, conforme definido na lista anexa à Lei Complementar 116/2003, não abrangendo as operações de crédito, que são reguladas e tributadas sob legislações específicas, como o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Nesse sentido: EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES E REMESSA NECESSÁRIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ISS SOBRE SERVIÇOS BANCÁRIOS. COSIF. MULTAS E JUROS DE MORA. ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO MUNICIPAL E JURISPRUDÊNCIA APLICÁVEL. 1. O pedido de efeito suspensivo à apelação não será conhecido se não for apresentado de forma adequada e no momento oportuno, através de uma petição separada, contendo um requerimento específico endereçado ao relator da apelação, conforme estabelecido nos §§ 3º e 4º do art. 1.012 do Código de Processo Civil. 2. Preliminarmente, rejeitam-se as alegações de nulidade da sentença por ausência de fundamentação e contradição. As decisões judiciais que, mesmo contrárias aos interesses da parte, examinam de maneira adequada as questões propostas não se configuram como omissas ou contraditórias. Precedentes do STJ e do TJGO corroboram tal entendimento. 3. Na ausência de pagamento, a aplicação do art. 173, inciso I, do Código Tributário Nacional (CTN) é pertinente, estabelecendo que o prazo de decadência tem início no primeiro dia do exercício fiscal subsequente ao que o lançamento tributário poderia ter sido efetuado. Tal entendimento está em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que distingue os contextos de aplicabilidade entre o art. 150, §4º, e o art. 173, inciso I, do CTN. 4. A análise das contas COSIF questionadas, sob a luz da LC 116/03 e da jurisprudência do STJ, orienta a exclusão de determinadas rubricas da base de cálculo do ISS, em virtude de sua natureza não configurar prestação de serviço tributável. 5. As multas aplicadas excederam o limite legal, justificando a redução para adequação aos percentuais estipulados pela legislação municipal e princípios constitucionais, garantindo a proporcionalidade da sanção. 6. A cobrança de juros e correção monetária deve alinhar-se ao índice adotado pela União, especialmente quando os índices municipais os superam, seguindo precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse contexto, a Taxa Selic deve ser adotada em substituição à metodologia estabelecida pelo município. 7. A desnecessidade de declarar a nulidade da CDA, mesmo diante do reconhecimento de excesso na cobrança, é fundamentada na jurisprudência do STJ, que permite a correção dos valores indevidamente incluídos por meio de simples cálculos aritméticos, sem comprometer a liquidez e certeza do título executivo. 8. Considerando a sucumbência recíproca, os honorários advocatícios deverão ser fixados na fase de liquidação de sentença, observando-se o proveito econômico obtido por cada parte, conforme determinação do CPC. Conheço parcialmente do primeiro recurso e integralmente do segundo recurso, bem como do reexame necessário, decidindo negar provimento ao segundo apelo e por dar parcial provimento ao primeiro recurso e ao reexame necessário. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação / Remessa Necessária 5180640-96.2020.8.09.0029, Rel. Des(a). RODRIGO DE SILVEIRA, 10ª Câmara Cível, julgado em 20/03/2024, DJe de 20/03/2024). APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL- ADIANTAMENTO A DEPOSITANTE, CONTRATAÇÃO DE OPERAÇÕES ATIVAS E RENDAS DE OPERAÇÃO DE CRÉDITO- ATIVIDADES BANCÁRIAS TIPICAMENTE FINANCEIRAS- ATIVIDADES-MEIO- ISSQN- NÃO INCIDÊNCIA- RECURSO PROVIDO. - Não incide ISSQN sobre a renda das operações de adiantamento a depositantes, de empréstimos ou contratações de operações ativas, porquanto tais operações tem natureza apenas de disponibilização de crédito, não constituindo obrigação de fazer para com o consumidor. - "Os serviços bancários auxiliares e acessórios, apropriados à atividade-fim, não individualizados como finalidade por si mesmo, por submissão ao principio do numerus clausus, respeitado como limite normativo, não constituem fato gerador do ISS" (REsp 24.243/RS, Rel. Ministro Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, Julgado em 31/08/1994, Dj 26/09/1994, P. 25603). (g). APELAÇÃO CÍVEL – Embargos à execução fiscal - Município de Cosmorama - ISS do período de setembro de 2011 a janeiro de 2016 - Sentença de improcedência - Preliminares de nulidade da sentença, cerceamento de defesa e nulidade das CDA´s - Não ocorrência – Sentença que valorou as provas suficientes à instrução da demanda - Atendimento dos pressupostos legais insculpidos no § 5º, do art. 2º, da Lei 6.830/80 e do art. 202 do CTN – ISS sobre serviços bancários – Legitimidade da tributação – Incidência da Súmula 424 do STJ – Possibilidade de interpretação extensiva dos itens constantes da lista de serviços – Ausência de correlação com os serviços tributáveis pelo ISSQN e não incidência do imposto nas seguintes Contas COSIF´s: 7 .1.1.05.00-6 (rendas de empréstimos); 7 .1.1.15.00-3 (rendas de financiamentos); 7 .1.9.30.00-6 (recuperação de encargos e despesas); 7 .1.1.10.00-8 (rendas de títulos descontados); 7 .1.9.99.00-9 (outras rendas operacionais); 7 .1.1.03.00-8 (rendas de adiantamentos a depositantes); 7 .3.9.90.99-6 (outras receitas não operacionais) e 7 .3.9.99.00-7 (outras rendas não operacionais) – Possibilidade de tributação de atividades previstas expressamente no item 15 da lista de serviços da LC 116/03 na Conta COSIF 7 .1.7.40.00-7 (rendas de cobrança) - Embargos à execução parcialmente procedentes - Recurso parcialmente provido . (TJ-SP - AC: 10023213320168260615 SP 1002321-33.2016.8.26 .0615, Relator.: Raul De Felice, Data de Julgamento: 29/03/2021, 15ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 29/03/2021). Operações de crédito, dada a sua natureza financeira específica e tratamento tributário distinto, estão fora do escopo desse imposto, reforçando a necessidade de uma análise criteriosa das atividades bancárias para a correta aplicação da legislação tributária municipal. Ademais, a respeito da questão aventada, o laudo pericial (evento 54) indicou que: (…) as receitas provenientes de rendas de empréstimos, renda de financiamentos e de financiamentos rurais são diferentes das rendas de prestação de serviços, sendo essas últimas sem a incidência de IOF por sua natureza tributária, conforme definido no DECRETO Nº 6.306, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2007. (...) as contas de rendas de empréstimos e rendas de financiamentos, como mencionado, quando efetivamente contabilizadas mediante a entrega/disponibilidade de recurso financeiro ao contratante, constitui fato gerador do IOF, previsto na legislação, devendo este ser provisionado contabilmente nas operações realizadas.” Assim, tais rubricas deveriam ser excluídas da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) na Certidão de Dívida Ativa (CDA), não constituindo fatos geradores legítimos para a cobrança desse imposto. 2. Operações de financiamentos rurais A rubrica 7.1.1.40.00-9, relacionada aos financiamentos rurais, é classificada como operações de crédito de acordo com a circular 1.273 do Banco Central do Brasil (Bacen). As descrições dessas contas indicam que elas registram as rendas provenientes de financiamentos rurais, constituindo receita efetiva da instituição financeira no período contábil em questão. Dado que essas operações são identificadas como de crédito, seguindo a lógica apresentada anteriormente em relação a outras rubricas de operações de crédito, estas também não se enquadram na lista de serviços sujeitos à tributação pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), conforme previsto na Lei Complementar nº 116/2003. Repita-se, o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) incide sobre a prestação de serviços de qualquer natureza, conforme definido na referida Lei, excluindo expressamente as operações de crédito, que possuem tratamento tributário distinto e específico. Ademais, conforme consignado no Laudo Pericial (evento 54): “(...) esta conta é de resultado credor (RENDAS) e tem sua origem baseada em registro de reconhecimento de receitas efetivas da instituição financeira, que em período anterior foi contabilizada e não recebida, sendo baixada como prejuízo pela inadimplência e que em momento posterior possa haver determinado recebimento, sendo o valor nesse período reconhecido como recuperação de crédito baixado como prejuízo, conforme a descrição do COSIF.”. Portanto, seguindo o Princípio de que apenas as atividades listadas ou aquelas que sejam analogamente consideradas como serviços de acordo com a Lei Complementar nº 116/2003 devem ser tributadas pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), conclui-se que a rubrica 7.1.1.40.00-9, por representar operações de crédito relacionadas a financiamentos rurais, não deve compor a base de cálculo desse imposto. Nessa linha: TRIBUTÁRIO. ISS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. RENDAS DE TÍTULOS DESCONTADOS. EXCLUSÃO. Descabe a incidência do ISS quanto a receitas decorrentes de operações de crédito. Assim, relativamente ao apelo da instituição financeira, cumpre afastar da tributação do ISS as rendas de títulos descontados, COSIF 7.1 .1.10.00-8, como já acenara laudo pericial.RUBRICAS RENDAS DE ADIANTAMENTO A DEPOSITANTES, RENDAS DE EMPRÉSTIMOS E RENDAS DE FINANCIAMENTO RURAIS .As rendas de adiantamentos a depositantes correspondem à remuneração do capital adiantado, por empréstimo, ao solicitante, não configuram, portanto, prestação de serviço tipicamente bancário a atrair a incidência do ISS, raciocínio que também alcança as rubricas “rendas de empréstimo” e “rendas de financiamento rurais”, nada havendo a alterar na sentença a tal respeito.APELAÇÃO DO BRADESCO PROVIDA, EM PARTE, E APELAÇÃO DO MUNICÍPIO DE DOIS IRMÃOS DESPROVIDA, POR MAIORIA. (TJ-RS - AC: 50005958020158210145 DOIS IRMÃOS, Relator.: Marco Aurélio Heinz, Data de Julgamento: 13/03/2023, Vigésima Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 20/03/2023) 3. Da recuperação de créditos compensados como prejuízo Por sua vez, a conta 7.1.9.20.00-9 reflete aspectos das operações bancárias relacionadas à recuperação de valores. Conforme descrito na Circular 1.273/87 do Banco Central do Brasil (Bacen), a função é registrar as recuperações de créditos compensados como prejuízo, constituindo receita efetiva da instituição financeira no período. A análise da rubrica 7.1.9.20.00-9 indica que ela está vinculada à recuperação de créditos anteriormente classificados como prejuízo. Essa operação, por sua natureza, não se enquadra na lista de serviços tributáveis pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), conforme estabelecido pela Lei Complementar nº 116/03. Portanto, receitas provenientes dessa atividade não deveriam compor a base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), uma vez que não se caracterizam como prestação de serviços na acepção prevista na referida Lei complementar. Em trecho de julgamento sobre o tema, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná reconheceu que a recuperação mencionada não configura serviço passível de incidência do referido tributo. Confira-se: “[...] Para dirimir as dúvidas, passo a examinar as receitas, com descrição das correspondentes atividades, para possível identificação com a natureza jurídica da imposição tributária, ou seja, prestação de serviços, com o auxílio da norma do Banco Central do Brasil - COSIF: a) Recuperação de créditos baixados como prejuízo (conta do apelante nº 50.66, correspondente à Cosif nº: 7.1.9.20.00-9) Função: Registrar as recuperações de créditos compensados como prejuízo, que constituam receita efetiva da instituição, no período. O registro se faz nesta conta inclusive tendo como contrapartida bens não de uso próprio, títulos de renda variável ou outra conta adequada. O Apelante, ao não receber pelas operações de créditos que são sua atividade principal, lança tais eventos como prejuízo em um exercício fiscal, podendo, recuperar tais créditos no futuro, com o respectivo lançamento contábil que se refere esta conta. Certamente a conta registra a receita do Banco, mas não se pode perder de vista que nem toda receita é passível de tributação por ISS, mas apenas aquelas oriundas da prestação de serviços. Obviamente, recuperar prejuízo de ano anterior não pode ser classificado como serviço prestado a terceiros. Como a norma se refere a prejuízo, não se pode deixar de considerar tal expressão como representativa daquilo que se perde (por exemplo, mútuo não pago pelo cliente), ou seja, a quantia que saiu da contabilidade do banco e não retornou no momento contratado. Vale observar que o não recebimento por serviços prestados não equivale à perda, pois o dinheiro correspondente nunca esteve com o banco. A Lei Complementar nº 116/2003, cujo teor dispõe sobre a cobrança do ISSQN sobre os fatos geradores ocorridos a partir de 01/08/2003, dispõe em seu art. 2º: "Art. 2º - O imposto não incide sobre: III ... o principal, juros e acréscimos moratórios relativos a operações de crédito realizadas por instituições financeiras", diversamente das "taxas e contribuições de melhoria", tem como característica a competência privativa e não admite a competência comum, razão pela qual o mesmo fato gerador não pode ser tributado duas vezes por entes públicos distintos. Entendimento diverso daria ensejo à invasão de competência em matéria tributária e, por conseguinte, à prática de bitributação, assim compreendida como a imposição fiscal indevida, por autoridades diferentes, relativamente ao mesmo fato gerador, conduta esta vedada pela Constituição Federal ante a ausência de previsão de competência comum na instituição de impostos. Em síntese, a sentença merece reforma no que diz respeito à cobrança de ISSQN sobre as operações de recuperação de crédito de exercícios anteriores. Desse modo, considerando que as operações de créditos registrados sob a rubrica “Recuperação de Créditos Baixados como Prejuízo” não configuram serviços prestados a terceiros, não incide o ISS, pois é conduta atípica tributário, razão pela qual a sentença deve ser reformada. (TJ-PR 8788547 PR 878854-7 (Acórdão), Relator: Pericles Bellusci de Batista Pereira, Data de Julgamento: 03/04/2012, 2ª Câmara Cível) ” (g). Assim, tendo em vista que a dita operação não se trata de receita proveniente de serviços prestados a terceiros, de rigor a manutenção do acolhimento do pedido da parte embargante, a fim de que seja afastada a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre a Conta nº 7.1.9.20.00.9 (Recuperação de Créditos Baixados como Prejuízo). Portanto, conforme bem registrado pela juíza sentenciante, ao se constatar que as rubricas contábeis autuadas não correspondem à prestação de serviços, mas sim a operações de crédito, resta afastada a presunção relativa (juris tantum) de legalidade do ato de tributação praticado pelo fisco, assim como seus efeitos decorrentes. Sendo assim, na ausência de comprovação do fato gerador necessário para legitimar a instituição e cobrança do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) no caso em discussão, a manutenção do reconhecimento da invalidade da exação fiscal imposta é a medida que se impõe. Desta feita, ante a estas considerações, deve ser mantido o édito sentencial, em todos os seus termos. Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE do apelo e na parte conhecida, NEGO-LHE PROVIMENTO, para manter integramente a sentença recorrida, por estes e por seus próprios fundamentos. Desprovido o recurso, majoram-se os honorários recursais para 12% (doze por cento) sobre o proveito econômico obtido, conforme artigo 85, §11 do Código de Processo Civil. É o voto. Após o trânsito em julgado, determino a remessa dos autos ao juízo de origem, com as respectivas baixas necessárias, retirando o feito do acervo desta relatoria. Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo Relatora Datado e Assinado Digitalmente Conforme Arts. 10 e 24 da Resolução nº 59/2016 do TJGO DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA (ISSQN) SOBRE OPERAÇÕES BANCÁRIAS. NÃO INCIDÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Apelação Cível interposta por Município contra sentença que julgou procedentes Embargos à Execução Fiscal opostos por instituição financeira, declarando a inexigibilidade do crédito tributário referente ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre determinadas operações bancárias. O Município alega erro na valoração da prova pericial e violação da presunção de legitimidade dos atos administrativos fiscais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão são: (i) a correta valoração da prova pericial, especificamente a análise da natureza das operações bancárias em relação à incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN); (ii) a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre rendas de empréstimos e financiamentos, financiamentos rurais e recuperações de créditos compensados como prejuízo, considerando a legislação pertinente e a jurisprudência e; (iii) a possibilidade de interpretação extensiva da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Não merecem ser conhecidas as matérias recursais já preclusas; que não resultaram em prejuízo à parte insurgente e que configuram inovação recursal. 4. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (Súmula 424 e Tema Repetitivo 132) firmou que a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre serviços bancários deve ser analisada caso a caso, considerando a natureza do serviço e a lista anexa à Lei Complementar 116/2003, admitindo-se interpretação extensiva. No caso, as operações em questão são tipicamente financeiras (operações de crédito), não se enquadrando como serviços tributáveis pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). 5. O Princípio da Essência sobre a Forma foi considerado na análise das operações, mas a classificação contábil, somada à natureza financeira das operações, comprova a inexistência de prestação de serviços tributáveis. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido. Tese de Julgamento: "1. A matéria deduzida exclusivamente na Apelação configura inovação recursal, impossibilitando o conhecimento do recurso nessa parte, sob pena de Violação ao Princípio do Duplo Grau de Jurisdição. 2. As operações bancárias em questão, sendo de natureza financeira, não constituem fato gerador do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). 3. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça orienta a não incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre operações de crédito.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 156, III; LC 116/2003, art. 1º, § 4º; art. 2º, III; CPC, art. 1.014; art. 479; art. 85, § 11; Lei nº 6.830/80, art. 3º; CTN, art. 204. Jurisprudências relevantes citadas: Súmula 424 do STJ; Tema Repetitivo 132 do STJ.

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