Processo nº 5976881-83.2024.8.09.0051
ID: 326859622
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 4ª UPJ Varas Cíveis e Ambientais: 13ª, 14ª, 15ª e 16ª
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5976881-83.2024.8.09.0051
Data de Disponibilização:
16/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CLÁUDIA ARANTES FERREIRA SIMÕES DE LIMA
OAB/GO XXXXXX
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CLAUDIA VIEIRA RAPPA
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE GOIÂNIA
14ª VARA CÍVEL E AMBIENTAL
Processo nº.: 5976881-83.2024.8.09.0051
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> …
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE GOIÂNIA
14ª VARA CÍVEL E AMBIENTAL
Processo nº.: 5976881-83.2024.8.09.0051
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento Comum Cível
Requerente: Valdivino Paulino Rodrigues
Requerido: Itau Unibanco S.a.
SENTENÇA
Trata-se de Ação de Conhecimento Declaratória c/c Obrigação de Fazer e Reparação de Danos Materiais e Morais proposta por Valdivino Paulino Rodrigues em face de Itaú Unibanco S.A., ambos devidamente qualificados.
Em suma, alega o autor que, ao consultar seu benefício previdenciário junto ao INSS, constatou a averbação indevida de um contrato de empréstimo consignado datado de 15/11/2020, no valor de R$ 1.409,62 (um mil quatrocentos e nove reais e sessenta e dois centavos), com parcelas mensais no valor de R$ 29,44 (vinte e nove reais e quarenta e quatro centavos) em 79 (setenta e nove) vezes, totalizando R$ 2.325,76 (dois mil trezentos e vinte e cinco reais e setenta e seis centavos), sob o Contrato/ADE nº. 0040091659920201021.
Sustentou jamais ter contratado tal empréstimo, não ter assinado qualquer documento relacionado e não ter comparecido à agência bancária para formalização do negócio jurídico, afirmando tratar-se de operação fraudulenta, que vem comprometendo significativamente sua renda mensal, causando-lhe prejuízos de ordem patrimonial e extrapatrimonial, prejudicando seu sustento e gerando constrangimento e dissabor.
Discorreu sobre o direito que entendeu aplicável ao caso e, ao final, pugnou pela declaração de inexigibilidade do contrato fraudulento; devolução em dobro dos valores descontados (R$ 4.651,52) ou, subsidiariamente, restituição simples; condenação em danos morais no valor de R$ 20.000,00; aplicação integral do CDC com inversão do ônus da prova; condenação da instituição ré em custas processuais e honorários sucumbenciais; e concessão dos benefícios da justiça gratuita.
Acompanham a inicial os documentos de evento 01.
No evento 07, foi proferida decisão por este juízo, que recebeu a inicial, deferiu os benefícios da justiça gratuita à autora e determinou a inversão do ônus da prova e a citação do banco requerido.
Citada (evento 11), a instituição financeira ré apresentou contestação e documentos (evento 15), alegando, preliminarmente, a existência de conexão entre ações ajuizadas pelo autor, em razão da semelhança de pedidos e causa de pedir, pleiteando a reunião das demandas para evitar decisões conflitantes, nos termos do artigo 55 do CPC. Adicionalmente, invocou a prescrição trienal prevista no artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil, com base no lapso temporal transcorrido desde a ciência do fato até a propositura da demanda. O réu também argumenta pela ausência de pretensão resistida, considerando que o autor não buscou previamente os canais administrativos para solucionar a controvérsia, o que caracteriza falta de interesse de agir, conforme o artigo 485, inciso VI, do CPC.
No mérito, defendeu a regularidade da contratação impugnada, realizada mediante biometria e senha pessoal, cumprindo todos os requisitos legais de validade previstos no artigo 104 do Código Civil, e ressaltou a inexistência de qualquer vício de consentimento, bem como a segurança do sistema biométrico utilizado. Esclareceu que o contrato objeto da lide refere-se a uma portabilidade de crédito regularmente processada e executada conforme normativas do Banco Central. No caso dos autos, a parte autora possuía contrato de empréstimo consignado junto à instituição financeira Banco Santander solicitando a portabilidade para a instituição ré, formalizada mediante a digitação de senha secreta e pessoal no canal EA (estação administrativa) na agência 4336. Acrescentou que o contrato anterior foi quitado, cujo saldo devedor foi migrado para o Banco Itaú e contabilizado na operação atual, nº. 400916599, por meio da qual a parte autora se obrigou a quitar. Em relação ao referido contrato, não houve a liberação de valor em conta corrente da autora, mas o valor do contrato de R$ 1.409,62, se refere ao saldo devedor do contrato anterior. Com a portabilidade, a dívida do contrato passou a ser exigida pelo banco Itaú, atual credor, em atendimento à solicitação da parte autora/devedora.
Quanto aos danos alegados, o réu sustenta que os descontos realizados decorrem de obrigação contratual válida, não configurando, portanto, dano material. Em relação ao dano moral, argumenta que este não foi demonstrado e que a situação descrita representa mero aborrecimento, insuficiente para ensejar indenização, conforme jurisprudência consolidada. Ressalta também a demora do autor em ajuizar a ação, após mais de três anos de inércia, o que demonstra comportamento incompatível com os princípios da boa-fé e lealdade processual, agravando eventual prejuízo.
Por fim, o réu pleiteou a improcedência integral dos pedidos do autor, a condenação em litigância de má-fé e o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
Em que pese devidamente intimado (evento 16), o autor não apresentou impugnação.
Decisão proferida ao evento 19 determinou a intimação das partes para especificação de provas.
O banco réu pugnou pela designação de Audiência de Instrução e Julgamento, para colheita do depoimento pessoal do autor, com vistas ao esclarecimento dos fatos (evento 22).
A parte autora, por sua vez, requereu, com amparo nos arts. 428 e 429, inciso II, do CPC, a realização de perícia documentoscópica, para que seja devidamente analisada a autenticidade dos contratos colacionados pelo requerido, alegando que os documentos apresentam divergências com relação à sua autenticidade (evento 23).
Audiência de Conciliação realizada sem acordo em 03/06/2025 (evento 39).
Vieram-me os autos conclusos.
É o breve relatório.
Decido.
Em detida análise do caderno processual, após o cotejo da pretensão autoral e das teses defensivas, entendo que a presente demanda está apta a receber julgamento antecipado, porquanto a matéria controvertida não necessita de produção de outras provas, incidindo o disposto no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
Nesse cenário, com relação ao pedido para a realização de perícia documental sobre a contratação digital, entendo que a parte autora busca impor prova impossível à instituição financeira requerida.
Com efeito, a parte demandante invoca os arts. 428, inciso I, e 429, inciso II, do Código de Processo Civil, além do Tema 1.061 do STJ, para amparar a sua pretensão neste ponto.
Ocorre que, em primeiro lugar, o precedente invocado não se aplica aos casos de assinatura eletrônica, mormente porque estas possuem certificação própria, regulamentada por lei.
No caso, a assinatura eletrônica por meio de biometria facial encontra respaldo normativo na Medida Provisória nº. 2.200/2001, cabendo, em sendo este o caso, tão somente a análise do preenchimento dos requisitos legais quando da sua formalização.
Destarte, a perícia em questão seria meramente protelatória, porquanto a contraprova da assinatura eletrônica poderia ser realizada por meio da simples averiguação da observância do protocolo eleito pela legislação de regência ou não.
Assim sendo, considerando que o contrato acostado aos presentes autos conta com assinatura digital, não se mostra adequado o pedido de prova pericial.
Sobre o tema, cito precedente jurisprudencial do Egrégio TJGO – Tribunal de Justiça do Estado de Goiás:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Perícia grafotécnica indeferida. Não há falar em cerceamento de defesa, em decorrência do julgamento antecipado da lide, quando a dilação probatória mostra-se desnecessária em razão da forma de contratação discutida nos autos, por ser o contrato digital, no qual se exigiu o reconhecimento via biometria facial. Portanto, sendo digital a assinatura e não física, à evidência, não comporta a análise por perícia grafotécnica. 2. Contrato de empréstimo consignado. Contratação eletrônica. Assinatura digital por ‘selfie’. Regularidade da contratação. Precedentes do STJ e desta Corte de Justiça. O art. 3º da Instrução Normativa nº 28/2008 do INSS/PRES permite que a contratação de empréstimo ocorra por meio eletrônico. Na situação em concreto, o contrato de empréstimo consignado foi assinado digitalmente, mediante biometria facial, com a apresentação dos documentos pessoais, bem como comprovado o depósito do valor do contrato por meio de TED realizado para a conta de titularidade do autor/apelante, não tendo esse, inclusive, se manifestado acerca do respectivo depósito em sua conta bancária> por meio do TED. 3. Exercício regular do direito. Negócio jurídico válido. Improcedência do pedido inicial. Restando legítimo o negócio jurídico celebrado entre os litigantes, não há falar em declaração de inexigibilidade do contrato de empréstimo consignado, nem mesmo em indenização por danos materiais ou morais RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível nº. 5593843-54.2021.8.09.0149, Relator Des. José Proto de Oliveira, 6ª Câmara Cível, julgado em 23/05/2023, DJe de 23/05/2023) (Destaquei)
Em segundo lugar, nota-se que a parte autora levanta uma série de exigências, sem apontar respaldo normativo, na busca de justificar a prova pericial e, na sua ausência, ver declarada a invalidade da contratação. No entanto, nenhuma delas é passível de elucidação por via pericial.
Deveras, a discussão acerca do atendimento ou não dos parâmetros normativos (eventualmente) impostos pelo legislador para a manifestação de vontade nesse tipo de contratação, questão eminentemente objetiva e verificável pela simples leitura do documento anexado pela instituição requerida.
Em terceiro lugar, a parte autora assevera desconhecer a dívida, mas não adotou ou demonstrou ter adotado providências para apurar eventual fraude realizada contra si, como, por exemplo, o registro de boletim de ocorrência perante a autoridade policial.
Em quarto lugar, entendo que a parte autora sequer teria interesse jurídico na produção da prova pericial, uma vez que, como ela bem pontuou, os dispositivos do CPC (arts. 428 e 429) por ela indicados são claros ao estabelecer que, na eventualidade de ser impugnada a autenticidade dos documentos, cabe à parte adversária o ônus de demonstrar a sua veracidade.
Em razão disto, entendo que a valoração da fidedignidade dos documentos carreados ao feito pela parte ré deve ser realizada quando da análise do mérito, momento em que todo o contexto probatório será aquilatado, a fim de se concluir se o questionamento acerca da validade destes é legítimo ou não.
Por fim, importante destacar que, como visto, a contraprova aos documentos jungidos pela instituição financeira requerida seria extremamente fácil para a parte autora, haja vista se tratar de documentos ao seu alcance, circunstância que afastam, nestes pontos, o reconhecimento da vulnerabilidade técnica/probatória consumerista.
Portanto, indefiro o pedido, por se revelar medida protelatória ao encerramento do feito – art. 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil –, mas também porque restou evidenciado que o intuito é apenas dificultar o exercício do direito de defesa da instituição requerida, impondo-lhe ônus desproporcional aos contornos da demanda.
Igualmente, revela-se desnecessária a produção de prova oral requerida pela parte ré, haja vista que o negócio jurídico supostamente celebrado entre as partes pode ser facilmente comprovado pela instituição financeira.
Indefiro, pois, o pedido de depoimento pessoal, já que não traria nada de novo para o deslinde do feito, possivelmente apenas ratificando os termos da inicial.
Logo, indefiro ambos os pedidos de produção de prova apresentados.
Para o caso em análise, portanto, da verificação do contexto probatório, infere-se a desnecessidade de outras provas, sejam documentais, perícia ou oitiva de testemunhas/depoimento pessoal.
Assentada tal premissa, observo que o processo se encontra em ordem e as partes representadas, não havendo irregularidades ou nulidades a serem sanadas.
Ressalto que o feito teve tramitação normal e que foram observadas as garantias dos sujeitos da relação processual quanto ao contraditório e ampla defesa. Além disso, estão presentes os pressupostos de existência e validade processuais.
Nestes termos, deve o processo receber julgamento no estado em que se encontra.
Deste modo, na ordem de enfrentamento das matérias submetidas a apreciação, passo à análise das preliminares arguidas em defesa.
De início, no que se refere à conexão, considerando que nos outros processos ajuizados pelo autor discute-se relações jurídicas diversas (outros contratos), afigura-se desnecessária a reunião dos feitos.
Ademais, conforme preceitua o artigo 55 do Código de Processo Civil, reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. Sendo pedidos diversos, não há falar em conexão.
Segue, pois, afastada a aludida prefacial.
De igual forma, não prospera a alegada ausência de interesse de agir no que concerne à ausência de pedido administrativo do autor para resolução da presente lide.
A escolha da postulação direta perante o Poder Judiciário, nesse caso, não pode ser considerada como indevida, como sustenta o banco requerido, pois encontra-se albergada pela garantia constitucional de livre acesso ao Poder Judiciário, conforme o previsto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição da República, segundo o qual nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída da apreciação do Poder Judiciário.
A propósito, os seguintes precedentes extraídos do E. Tribunal de Justiça de Goiás:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE DESCONTO INDEVIDO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. CONTESTAÇÃO APRESENTADA. 1. Não prospera a alegação de falta de interesse de agir (carência de ação), em razão da ausência de requerimento administrativo quando inexiste lei específica assim exigindo, além de aplicável a garantia constitucional de livre acesso ao Poder Judiciário. 2. Do mesmo modo, a apresentação de contestação de mérito pelo requerido, arguindo o não cabimento do pedido inaugural e não realizando a restituição devida, se afigura suficiente para suprir eventual ausência de prévio requerimento administrativo e, por consequência, demonstrar o interesse de agir da parte autora e a resistência à pretensão autoral. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA”. (TJGO, APELAÇÃO 0417601-03.2014.8.09.0174, REL. CAMILA NINA ERBETTA NASCIMENTO E MOURA, 5ª Câmara Cível, julgado em 20/05/2019, DJe de 20/05/2019) (Destaquei)
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. AÇÃO DE NATUREZA PESSOAL. PRESCRIÇÃO AFASTADA. DESNECESSIDADE DE EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. ARTIGO 5º, INCISO XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERA. 1. A ação de prestação de contas é de natureza pessoal e, desse modo, sua prescrição é estabelecida pelo artigo 205 do Código Civil, ocorrendo no prazo de 10 (dez) anos, a contar da data em que houve a violação do direito, conforme estabelece o artigo 189 da mesma lei. 2. Não há necessidade de qualquer providência prévia na via administrativa para a parte pleitear a prestação de contas da sua movimentação bancária, em atenção ao princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA”. (TJGO, APELAÇÃO CÍVEL 214960-78.2015.8.09.0113, Rel. Dr. FERNANDO DE CASTRO MESQUITA, 5A CÂMARA CÍVEL, julgado em 17/08/2017, DJe 2346 de 12/09/2017) (Destaquei)
Desse modo, é garantia basilar do jurisdicionado o pleno acesso à prestação jurisdicional, cujo exercício, na espécie, não se condiciona ao prévio exaurimento da via administrativa, ante a ausência de exigência legal nesse sentido.
Logo, rejeito a preliminar supra.
Na sequência, analiso a prejudicial de mérito arguida pela casa bancária, de que a pretensão do autor foi acobertada pelo manto da prescrição, a qual, antecipo, não prospera.
Isso porque a prescrição para o caso concreto em análise, que se assenta na revisão/declaração de nulidade de contrato e repetição de indébito, é decenal, nos moldes do art. 205 do Código Civil, cujo lapso temporal não fora alcançado, tendo em vista que o contrato foi firmado entre as partes (nº. 400916599) foi baixado em 17/05/2021 e a presente demanda ajuizada em 20/10/2024 (evento 01).
Nesse sentido, é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a qual se alinha ao entendimento do E. TJGO:
“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDEFERIMENTO. CONTRATOS BANCÁRIOS. PRESCRIÇÃO. REPETIÇÃO DE PAGAMENTO INDEVIDO. PRAZO DECENAL. (...) 1. Nos termos da jurisprudência do STJ, a pretensão de repetição de valores pagos indevidamente em função de contrato bancário está sujeita ao prazo prescricional vintenário na vigência do CC/1916 e ao decenal na vigência do CC/2002, contado da efetiva lesão, ou seja, do pagamento (...) 4. Agravo interno desprovido.” (AgInt no REsp n. 1.884.493/PR, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 11/10/2021, DJe de 17/11/2021) (Destaquei)
“APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO. EQUIPARAÇÃO DA AVENÇA DISCUTIDA ÀS DEMAIS OPERAÇÕES DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPRAS OU SAQUES. SÚMULA 63 DO TJGO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO A PARTIR DA PUBLICAÇÃO DO JULGADO EARESP nº 676.608/RS DO STJ. JUROS. TAXA MÉDIA DO MERCADO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. 1. Tendo em vista que o prazo prescricional para as ações que visam a revisão/anulação e repetição de indébito decorrente de contrato é de 10 (dez) anos, não há que se falar em sua configuração no caso em apreço. (…). PRIMEIRA APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SEGUNDA APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA.” (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5650791-44.2021.8.09.0172, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR LEOBINO VALENTE CHAVES, 2ª Câmara Cível, julgado em 01/02/2023, DJe de 01/02/2023) (Destaquei)
Nesse passo, rejeito a prejudicial arguida, não havendo falar em prescrição da pretensão autoral.
Superadas tais questões, passo de pronto ao julgamento do mérito.
A controvérsia instaurada se resume em perquirir a legalidade da relação jurídica de empréstimo consignado entre as partes e se a eventual ilegalidade, caso constatada, enseja sua nulidade, a repetição do indébito na forma dobrada e a compensação por dano moral.
Considerando a relação jurídica firmada entre os sujeitos processuais, é indubitável a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC), especialmente em razão do entendimento jurisprudencial cristalizado no verbete da Súmula 297 do STJ – Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
No que se refere às questões de fato, isto é, à comprovação dos acontecimentos, ressalto que o art. 14, § 3º, do CDC, diversamente da regra estatuída pelo art. 6º, VIII, do CDC, estabeleceu a inversão legal do ônus da prova (‘ope legis’), não judicial (‘ope iudicis’), nos casos de fato do serviço, distribuindo ao fornecedor o encargo de provar que o prestou de maneira adequada ou que o consumidor ou terceiro agiram com culpa exclusiva.
O sistema criado pelo Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade objetiva dos prestadores de serviço, especialmente nos artigos 3º, § 2º, e 14 daquele Diploma Legal.
Por consequência, o demandado deve responder pelos defeitos resultantes do negócio independentemente de culpa, nos moldes do art. 14, ‘caput’, do CDC, verbis:
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”
Trata-se de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco do empreendimento, segundo a qual, consoante doutrina de Sérgio Cavalieri Filho: “(...) todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, decorrendo a responsabilidade do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade e executar determinados serviços. Em suma, os riscos do empreendimento correm por conta do fornecedor (de produtos e serviços) e não do consumidor”.
Os requisitos, portanto, para a configuração da responsabilidade são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.
Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o nexo causal, enunciadas no § 3º do art. 14 do CDC, quais sejam,
“(...)
§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”
No caso concreto, o autor narra ser pessoa idosa, sendo pensionista do Regime Geral de Previdência Social e, com tal, percebe seu benefício previdenciário, onde percebeu os descontos relativos ao empréstimo consignado averbado em seu benefício no dia 15/11/2020, pelo ora requerido Banco Itaú S/A, Contrato/ADE nº. 0040091659920201021, com parcelas mensais de R$ 29,44, em 79 vezes, sendo que o valor total do contrato corresponde R$ 2.325,76.
Nesse contexto, atenta à distribuição do ônus da prova realizada pela própria lei, mas também por este juízo (evento 07), competia à parte requerida apresentar provas da efetiva contratação.
Analisando todo o conjunto fático probatório, com relação aos documentos colacionados aos autos, conclui-se que a parte ré comprovou a devida contratação realizada pelo autor, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC e art. 6º, inciso VIII, do CDC.
O banco réu juntou com a contestação os documentos que comprovam que a cobrança questionada nos autos pela parte autora se refere à operação de portabilidade (modalidade de transferência de operações de crédito entre bancos) relativa ao Contrato de Crédito Consignado número 400916599, contratada em 21/10/2020, no valor de R$ 1.409,62, formalizada no canal EA – mesa do gerente, com imposição de biometria e mediante digitação da senha de caráter pessoal e intransferível.
Infere-se da documentação apresentada pelo banco réu que a parte autora possuía contrato de empréstimo consignado perante o Banco Santander e solicitou a portabilidade para a instituição financeira ré, operação essa formalizada pessoalmente, em uma das agências do banco requerido, junto ao gerente, mediante a digitação de senha secreta e pessoal, transação autenticada por meio de biometria.
Tratando-se de contrato migrado, não houve a liberação de valor em conta corrente do autor, mas o contrato anterior foi quitado, sendo o saldo devedor, no valor de R$ 1.409,62, transferido para o banco réu e contabilizado na operação atual, nº. 400916599, impugnada nos autos.
Em que pese a alegação de não contratação pelo autor, deve-se destacar que o contrato foi firmado pela via eletrônica, a denotar que não há a possibilidade de se determinar a exibição de instrumento contratual subscrito pelas partes.
Em se tratando de operação eletrônica, de fato, a apresentação de contratos escritos assinados manualmente pelo autor, como meio de prova da autorização desta para o lançamento das operações discutidas, não se mostra possível, uma vez que é cediço que, atualmente, a maioria das operações financeiras são efetuadas mediante sistema eletrônico, de validação do chip do cartão magnético e da autenticação da senha eletrônica fornecida no momento da operação, com a cadastrada pelo correntista.
Ressalta-se que não há óbice para a contratação eletrônica, sendo esta permitida, tratando-se de hipótese prevista no art. 3º, inciso III, da Instrução Normativa do INSS nº. 28/2008, alterada pela Instrução Normativa nº. 39/2009, in verbis:
“Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que:
(...)
III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência”.
Ainda, nos termos da Lei nº. 14.063/2020, as assinaturas eletrônicas podem ser classificadas em simples, avançada ou qualificada, necessária a depender do tipo de documento que se assina. Desta forma, são válidas as operações de empréstimo apresentadas pelo banco, com assinatura digital e verificação de autenticidade por meio do uso de senha pessoal eletrônica e intransferível.
Dispõe o art. 441 do atual CPC que:
“Serão admitidos documentos eletrônicos produzidos e conservados com a observância da legislação específica”.
Por outro lado, não há exigência legal que condicione a validade da assinatura eletrônica à empresa certificadora cadastrada pela ICP-Brasil (“Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira”).
Note-se que a legislação autoriza a coexistência de assinaturas eletrônicas, estando previstas as duas hipóteses na Lei Federal nº. 14.063, de 23/09/2020, em seu art. 4º, incisos II e III. Confira-se:
“Art. 4º Para efeitos desta Lei, as assinaturas eletrônicas são classificadas em:
(...);
II - assinatura eletrônica avançada: a que utiliza certificados não emitidos pela ICP-Brasil ou outro meio de comprovação da autoria e da integridade de documentos em forma eletrônica, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento, com as seguintes características:
(...);
III - assinatura eletrônica qualificada: a que utiliza certificado digital, nos termos do § 1º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001”.
O aludido art. 10, § 2º, da Medida Provisória nº. 2.200-2/2001, por sua vez, tem esta redação:
“O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento”.
Este dispositivo nada menciona sobre exigência de prévia pactuação expressa sobre assinaturas digitais. Pelo contrário, categoricamente ressalva a validade de outros meios eleitos pelas partes, visto que a prática bancária é adaptada ao dinamismo das relações financeiras correntes e admite a contratação de certas linhas de empréstimos bancários até mesmo via caixa eletrônico.
Seria inclusive algo excêntrico se exigir dois contratos, um para a assinatura eletrônica e outro para o mútuo, sendo que este já contém assinatura eletrônica. Com essa lógica, a redação da parte final do preceito trasladado é enfática no sentido de que somente à parte a quem foi oposto o documento caberia a impugnação de sua validade.
Impossível ignorar o avanço tecnológico na formalização de negócios jurídicos eletrônicos ou digitais, formalizados por exemplo em terminais de autoatendimento e aplicativos de celular, sendo elementar que os contratos celebrados por meios eletrônicos, sem a presença das partes e sem as assinaturas dos contratantes.
Logo, este tipo de transação é admitido e, especialmente quando documentadas as informações, não havendo questionamento quanto ao repasse da quantia, é de se considerar legítima.
Nesse sentido, colhem-se os seguintes julgados, extraídos da jurisprudência dos Tribunais de Justiça pátrios:
“APELAÇÃO CÍVEL - INEXIGIBILIDADE DE CONTRATO - DANOS MORAIS E MATERIAIS - EMPRÉSTIMOS E TRANSFERÊNCIAS DE VALORES - MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA MEDIANTE USO DE APLICATIVO DO BANCO E SENHA PESSOAL - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DO BANCO - INOCORRÊNCIA. O correntista bancário é responsável pela preservação de sua senha pessoal, não podendo ser penalizada a instituição financeira pelas movimentações bancárias realizadas mediante o uso de cartão magnético, bem como aplicativo de celular, e respectiva senha, ainda que os saques e transferências ou empréstimos tenham sido contestados pelo consumidor”. (TJ-MG - AC: 10000230031650001 MG, Relator: Fernando Caldeira Brant, Data de Julgamento: 01/03/2023, Câmaras Cíveis/20ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/03/2023) (Destaquei)
“APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. FORMALIZAÇÃO DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE APLICATIVO INSTALADO EM TELEFONE CELULAR. VALIDADE. AS MÍDIAS DIGITAIS E DOCUMENTOS ELETRÔNICOS SÃO MEIO DE PROVA– ART. 439, CPC. SISTEMA QUE EXIGE A INSERÇÃO DE DADOS PESSOAIS E SENHA. DOCUMENTOS ANEXADOS AOS AUTOS QUE COMPROVAM A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO VIA APLICATIVO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, CUJO VALOR MUTUADO FOI DEPOSITADO EM CONTA-CORRENTE TITULADA PELA DEMANDANTE. AUSÊNCIA DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES. VALIDADE DO DESCONTO MENSAL DAS PARCELAS. PERFECTIBILIZAÇÃO DA CONTRATAÇÃO.DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO IMPROCEDENTE. RECURSO PROVIDO. UNÂNIME”. (TJ-RS - AC: 50020303520218210095 ESTÂNCIA VELHA, Relator: Jorge Alberto Vescia Corssac, Data de Julgamento: 06/02/2023, Vigésima Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: 09/02/2023) (Destaquei)
“APELAÇÕES CÍVEIS DA PARTE AUTORA E DO BANCO REQUERIDO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO POR MEIO ELETRÔNICO (MOBILE BANK) COM UTILIZAÇÃO DE SENHA PESSOAL E INTRANSFERÍVEL – CONTRATAÇÃO VÁLIDA - REPASSE DE VALORES COMPROVADO - AUSÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR DANOS MATERIAIS E MORAIS – SENTENÇA REFORMADA - RECURSO DE APELAÇÃO DO BANCO RÉU CONHECIDO E PROVIDO - RECURSO DA PARTE AUTORA PREJUDICADO. Demonstrado que houve o empréstimo e que seu produto foi disponibilizado à parte autora, que inclusive efetuou transferência da quantia, não há como considerar válida a justificativa de que não celebrou a relação contratual e tampouco de que não se beneficiou do mútuo. Caso em que houve regular contratação de empréstimo via dispositivo móvel (aplicativo do banco no celular), através da utilização de senha pessoal, não se verificando qualquer ilegalidade”. (TJ-MS - AC: 08004098120218120038 Nioaque, Relator: Juiz José Eduardo Neder Meneghelli, Data de Julgamento: 29/11/2022, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/11/2022) (Destaquei)
Assim, ainda que alegue não ter autorizado ou solicitado a contratação do empréstimo, fato é que foi celebrado de forma digital, com uso de senha pessoal e intransferível.
Logo, este tipo de transação é admitido e, especialmente quando documentadas as informações, não havendo questionamento quanto ao repasse da quantia, é de se considerar legítima.
É sabido que incumbe ao titular da conta a guarda e segurança de seus dados pessoais, sob pena de arcar com os prejuízos da utilização por terceiro. Logo, ante a existência do mecanismo de segurança no sistema disponibilizado pelo banco demandado, que exige o uso de senha para realizar operações no caixa eletrônico ou mesmo para contratar digitalmente e habilitar novo dispositivo (via app), resta afastada a possibilidade de impor ao réu qualquer espécie de condenação.
Ora, a senha pessoal é de inteira responsabilidade do correntista, não podendo a instituição financeira ser responsabilizada por seu uso e assunção de compromissos por aquele.
Sem que exista nem mesmo suposto furto do cartão ou fraude interna no sistema do banco réu, não poderá ser responsabilizada a instituição financeira pelas movimentações realizadas na conta da requerente mediante o uso do cartão físico e senha pessoal no terminal eletrônico.
A propósito, é este o entendimento do STJ:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. SAQUE EM CONTA CORRENTE MEDIANTE USO DE CARTÃO MAGNÉTICO E SENHA PESSOAL. ACÓRDÃO ESTADUAL QUE DECIDIU COM BASE NAS PROVAS DOS AUTOS ALINHADO À JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS NºS 7 E 83 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Tribunal local que, com amparo nos elementos de convicção dos autos, entendeu não estar provado o fato constitutivo do direito da autora, decidindo pela ausência dos requisitos ensejadores da reparação civil. O uso do cartão magnético com sua respectiva senha é exclusivo do correntista e, portanto, eventuais saques irregulares na conta somente geram responsabilidade para o Banco se provado ter agido com negligência, imperícia ou imprudência na entrega do numerário, o que não ocorreu na espécie (...)”. (AgInt no AREsp 1399771/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 02/04/2019, DJe 08/04/2019) (Destaquei)
“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. SAQUES. COMPRAS A CRÉDITO. CONTRAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. CONTESTAÇÃO. USO DO CARTÃO ORIGINAL E DA SENHA PESSOAL DO CORRENTISTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DEFEITO. INEXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE AFASTADA. (...) 2. Controvérsia limitada a definir se a instituição financeira deve responder por danos decorrentes de operações bancárias que, embora contestadas pelo correntista, foram realizadas com o uso de cartão magnético com" chip "e da senha pessoal. 3. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade da instituição financeira deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que, embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista. 4. Hipótese em que as conclusões da perícia oficial atestaram a inexistência de indícios de ter sido o cartão do autor alvo de fraude ou ação criminosa, bem como que todas as transações contestadas foram realizadas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista. 5. O cartão magnético e a respectiva senha são de uso exclusivo do correntista, que deve tomar as devidas cautelas para impedir que terceiros tenham acesso a eles. 6. Demonstrado na perícia que as transações contestadas foram feitas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros. Precedentes. 7. Recurso especial provido”. (REsp 1633785/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017) (Destaquei)
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO (ART. 1.042 DO NCPC) - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS - CONTRATAÇÃO DE MÚTUO E SAQUE DE NUMERÁRIO EM CONTA CORRENTE MEDIANTE UTILIZAÇÃO DE CARTÃO MAGNÉTICO E SENHA - EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. 1. Tribunal local que, com amparo nos elementos de convicção dos autos, entendeu não estar provado o fato constitutivo do direito da autora, decidindo pela ausência dos requisitos ensejadores da reparação civil. O uso do cartão magnético com sua respectiva senha é exclusivo do correntista e, portanto, eventuais saques irregulares na conta somente geram responsabilidade para o Banco se provado ter agido com negligência, imperícia ou imprudência na entrega do numerário, o que não ocorreu na espécie (...)". ( AgInt no AREsp 1063511/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 12/06/2017) (Destaquei)
Não há, pois, comprovação de qualquer ilícito praticado pelo banco réu. Dessa forma, a parte autora não comprovou o fato constitutivo de seu direito, conforme dispõe o artigo 373, inciso I, do CPC e o réu, por sua vez, desincumbiu-se do encargo previsto no art. 373, inciso II, do CPC, demonstrando a origem e a contratação do empréstimo.
Portanto, diante do conjunto fático-probatório produzido nos autos, sabendo-se que todas as movimentações bancárias na conta corrente do autor dependeram além da biometria (via digital), de senha pessoal, tendo em vista a inexistência de vício a macular as operações bancárias debatidas na lide, há que ser considerado que instituição financeira não praticou ato ilícito a justificar a apontada falha na prestação de seus serviços.
Com efeito, embora a documentação juntada seja unilateral do banco requerido, não houve qualquer impugnação às informações nela apostas, as quais, portanto, servem ao embasamento da pretensão ressarcitória.
Nestes termos, não comprovada a ocorrência de dolo ou qualquer outro vício na negociação, deve-se rejeitar o pedido de declaração de inexistência da dívida e repetição de indébito formulado na petição inicial.
Igualmente, incabível a condenação da financeira requerida ao pagamento de indenização por danos morais, já que não é possível atribuí-la a prática de qualquer conduta ilícita capaz de ensejar o dever de reparação.
Por fim, em que pese a improcedência dos pleitos autorais, não há falar em multa por litigância de má-fé, tendo em vista que o consumidor/autor apenas exerceu seu direito de ação e não incorreu em qualquer das hipóteses do art. 80 do CPC.
Reputa-se litigante de má-fé a parte que, maliciosamente, adultera a verdade dos fatos com o fito de obter vantagem material ou processual indevida, deixando de proceder, como de seu dever, com lealdade e boa-fé, o que não restou comprovado na hipótese, porquanto não evidenciada a alteração da realidade fática com intuito de induzir o juízo a erro ou a intenção de atingir objetivo ilegal com a propositura da demanda.
Sobre o tema em comento, importante ressaltar que a boa-fé é presumida, ou seja, eventual responsabilização das partes pela violação ao dever de probidade processual depende da existência de elementos suficientes para se afirmar que a parte agiu de má-fé mediante análise pormenorizada das circunstâncias de cada caso concreto.
Logo, no caso dos autos, o comportamento do autor não configura a hipótese prevista no inciso II do artigo 80 do Código de Processo Civil, diante da ausência de demonstração inequívoca do intuito do demandante em induzir o juízo em erro ou da utilização da máquina judiciária de forma temerária. Explico.
Compulsando-se os documentos acostados aos autos, não se pode desconsiderar que o autor se valeu de seu direito de sanar em juízo a dúvida acerca da legalidade do contrato de empréstimo consignado averbado pela casa bancária requerida em seu benefício previdenciário.
Ademais, de salutar importância ressaltar o texto da nossa Carta Magna/88, precisamente no art. 5º, inciso XXXV: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”
Nesse diapasão, não verifico, nesse momento, comprovação de conduta maliciosa do autor, eis que inexistem elementos que comprovem que esta modificou intencionalmente a verdade dos fatos apresentados.
Destarte, em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, até o presente momento processual também não se verifica a existência de efetivo prejuízo à instituição financeira. Veja-se:
“Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial. Processual Civil. Impugnação do cumprimento de sentença. Litigância de má-fé não demonstrada. Aplicação da sanção civil prevista no art. 940 do Código Civil. Inviabilidade. Ausência de má-fé. Agravo não provido. (...). A aplicação da penalidade por litigância de má-fé exige comprovação do dolo da parte, ou seja, da intenção de obstrução do trâmite regular do processo ou de causar prejuízo à parte contrária, o que não ocorre na hipótese em exame. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp nº 1.455.010/DF – Rel. Min. Raul Araújo – 4ª Turma – DJe 1º-7-2019) (Destaquei)
Assim sendo, não há falar em litigância de má-fé.
É o quanto basta.
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial.
Por conseguinte, EXTINGO o processo, com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora, sucumbente, ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC), contudo a exigibilidade de sua execução fica sobrestada, pelo prazo de 05 (cinco) anos, nos moldes do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transcorrido o prazo recursal, não havendo requerimentos, arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo.
No caso de oposição de embargos de declaração, havendo possibilidade de serem aplicados efeitos infringentes, deverá a parte contrária ser intimada para manifestação no prazo legal.
Interposto recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões, no prazo legal de 15 (quinze) dias, conforme preconiza o art. 1.010, § 1º, do Código de Processo Civil.
Se apresentada apelação adesiva pela parte recorrida, na forma do art. 997 do Código de Processo Civil, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, de acordo com o art. 1.010, § 2º, do CPC.
Caso as contrarrazões do recurso principal ou do adesivo ventilem matérias elencadas no art. 1.009, § 1º, do Código de Processo Civil, intime-se a parte recorrente para se manifestar, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o art. 1.009, § 2º, do Código de Processo Civil.
Após, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, com as homenagens de estilo, ressaltando-se que o juízo de admissibilidade do recurso será efetuado direta e integralmente pela Corte, segundo o teor do art. 932 do Código de Processo Civil.
Cumpra-se.
Goiânia/GO, data da assinatura eletrônica.
(assinado digitalmente)
Tatianne Marcella Mendes Rosa Borges Mustafa
Juíza de Direito
03
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