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Caixa Economica Federal x Luiz Felipe De Andrade Kemper

ID: 311634093

Tribunal: TRF1 Órgão: 1ª Vara Federal Cível da SJAM Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1040702-03.2023.4.01.3200

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Polo Passivo:

LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER

Sentença Tipo A

Advogados:

MOISES CAVALCANTI GOUVEA DE OLIVEIRA

OAB/AM XXXXXX Desbloquear

MARCELO NEUMANN MOREIRAS PESSOA

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

RAIMUNDO BESSA JUNIOR

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Amazonas 1ª Vara Federal Cível da SJAM SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1040702-03.2023.4.01.3200 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: CAIX… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Amazonas 1ª Vara Federal Cível da SJAM SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1040702-03.2023.4.01.3200 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO NEUMANN MOREIRAS PESSOA - RJ110501 POLO PASSIVO:LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MOISES CAVALCANTI GOUVEA DE OLIVEIRA - AM5912 SENTENÇA I. Relatório A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF) propôs Ação de Cobrança (ID 1852964652) contra LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER, buscando o valor de R$ 38.782,86, referente a débitos originados dos contratos nº 0000000220766941 (cartão de crédito) e nº 3040001000419243 (Crédito Rotativo - CROT). Na petição inicial, a CEF alegou a disponibilização de crédito pré-aprovado e cartão de crédito ao réu, cuja adesão foi efetivada mediante o desbloqueio do cartão. Sustentou que o réu utilizou os créditos, mas não restituiu os valores devidos. Para comprovar suas alegações, a CEF juntou os seguintes documentos: procuração (ID 1852964653), contrato de cartão de crédito (ID 1852964654), contrato referente ao Cheque Azul (ID 1852964655), extrato de conta (ID 1852964656), faturas de cartão de crédito (ID 1852964657) e planilhas de dívida (IDs 1852964658 e 1852964659). Observa-se que a planilha de ID 1852964658 está vazia, enquanto a planilha de ID 1852964659 apresenta uma dívida de R$ 17.980,55 referente ao contrato de Crédito Rotativo. Após diversas tentativas de localização, o réu foi citado por Oficial de Justiça (ID 2149852175), conforme certidão detalhada. Em sua contestação (ID 2153631135), o réu pleiteou a concessão dos benefícios da justiça gratuita, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a inversão do ônus da prova. Preliminarmente, suscitou a inépcia da inicial, alegando a ausência de documentos essenciais e a divergência entre o valor da causa e o valor apresentado na planilha de débito. No mérito, o réu negou a existência da dívida, afirmando que possui apenas um financiamento (nº 178770092095-7) e que este se encontra em dia. Para comprovar suas alegações, o réu juntou procuração (ID 2153631147), declaração de hipossuficiência (ID 2153631162) e cópia de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) Digital (ID 2153631234). Intimada para apresentar réplica, a CEF manteve-se silente (ID 2154262897). É o relatório. II. Fundamentação 2.1. Da Competência e dos Pressupostos Processuais O presente feito foi ajuizado perante a Justiça Federal, órgão competente para processar e julgar causas em que a Caixa Econômica Federal, empresa pública federal, figura como parte, nos termos do artigo 109, inciso I, da Constituição Federal. A demanda encontra-se em ordem no que tange aos pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, uma vez que a petição inicial preenche os requisitos do artigo 319 do Código de Processo Civil, não havendo vícios insanáveis que obstem a análise do mérito da causa. As partes são legítimas e o interesse processual da autora é evidente na busca pela cobrança de supostos débitos, enquanto o réu exerce seu direito de defesa e contraditório, inclusive quanto à existência e ao valor da dívida. 2.2. Da Preliminar de Inépcia Embora a contestação tenha suscitado a inépcia da inicial pela ausência de documentos essenciais e divergência de valores, entendo que a petição inicial, em sua essência, não é inepta por descrever os fatos e o pedido de forma suficiente para a formação da lide e a apresentação de defesa. Contudo, a ausência de clareza e detalhamento na prova da dívida, especialmente na forma de sua atualização e composição para a totalidade do valor cobrado, impacta diretamente no mérito da pretensão da autora, e não na preliminar. Assim, rejeito a preliminar de inépcia da inicial, pois o vício apontado não é de ordem formal que impeça a tramitação do processo, mas sim de ordem material, que atinge a prova do direito invocado. 2.3. Da Gratuidade de Justiça O réu LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER pleiteou os benefícios da justiça gratuita, argumentando não possuir condições financeiras para arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento e o de sua família. Para corroborar sua alegação, o réu juntou declaração de hipossuficiência (ID 2153631162) e cópia de sua Carteira de Trabalho Digital (ID 2153631234), na qual consta que sua ocupação é de Gerente Administrativo com remuneração inicial de R$ 3.090,45 e última remuneração informada de R$ 4.017,59, ambas em setembro de 2024, compatíveis com a média de dois salários mínimos mencionada na contestação. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, assegura a gratuidade de justiça aos que comprovarem insuficiência de recursos. O Código de Processo Civil, em seus artigos 98 e 99, estabelece que a pessoa natural com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça. A declaração de hipossuficiência, firmada pela própria parte ou por seu advogado com procuração com poderes específicos, goza de presunção relativa de veracidade. No caso em tela, a declaração de hipossuficiência, aliada à comprovação de renda por meio da CTPS digital, que indica um patamar de rendimento modesto, reforça a presunção legal de impossibilidade de arcar com as despesas processuais. Não houve impugnação específica ou prova em sentido contrário por parte da autora, que se quedou inerte após a contestação. Desse modo, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita ao réu é medida que se impõe, garantindo-lhe o pleno acesso à justiça. 2.4. Da Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e da Inversão do Ônus da Prova A relação jurídica estabelecida entre a Caixa Econômica Federal e o réu, na qualidade de tomador de crédito e usuário de cartão, caracteriza-se como uma relação de consumo. As instituições financeiras, como prestadoras de serviços, enquadram-se no conceito de fornecedor, e o cliente, na condição de destinatário final, no de consumidor, conforme explicitado no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. A natureza das operações bancárias, incluindo empréstimos e serviços de cartão de crédito, é inequivocamente abrangida pela legislação consumerista, dado o desequilíbrio intrínseco na relação entre o banco e o indivíduo, onde a instituição detém informações, expertise e poder econômico superiores. A contestação do réu pugna pela inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, sob o argumento de sua hipossuficiência e da dificuldade de produzir prova de fato negativo ("prova diabólica"). A inversão do ônus da prova é um mecanismo que visa restabelecer o equilíbrio processual, deslocando para o fornecedor o encargo de provar a regularidade e a conformidade do serviço prestado ou do contrato firmado, especialmente quando as alegações do consumidor são verossímeis ou quando este é hipossuficiente para produzir a prova necessária. No caso vertente, a alegada "hipossuficiência técnica e informacional" do consumidor é manifesta. O réu contesta a própria existência de um dos contratos (Cheque Azul) e a forma como a dívida total foi apurada, indicando uma falha na transparência das informações por parte da instituição financeira. A exigência de que o réu prove que não utilizou o cartão de crédito ou que não firmou determinado contrato, ou que os cálculos da dívida estão incorretos sem acesso a todas as informações e métodos de apuração do credor, configura a referida "prova diabólica". A Caixa Econômica Federal, por outro lado, detém todos os registros e documentos relacionados às operações bancárias e de crédito de seus clientes, possuindo plenas condições de demonstrar a efetiva contratação, a utilização dos serviços e a regularidade dos valores cobrados. Assim, a inversão do ônus da prova mostra-se pertinente e necessária para assegurar o direito à ampla defesa e ao contraditório do consumidor. 2.5. A Ausência de Contrato e a Divergência no Valor da Dívida A análise das nuances do caso revela pontos cruciais que comprometem a pretensão autoral. Em primeiro lugar, a própria Autora admite que "o contrato original firmado foi extraviado/não-formalizado" (Petição Inicial, Doc. 1852964652, Pág. 2). Embora a jurisprudência admita a comprovação da dívida por outros meios, na ausência do contrato principal, é imprescindível que esses outros documentos sejam robustos e suficientes para reconstituir os termos do negócio jurídico, especialmente no que tange aos encargos e à evolução do débito. Os documentos apresentados pela CAIXA como "contratos" (Contrato de Prestação Serviços de Cartão de Crédito, Doc. 1852964654 e Contrato ou Cédula de Crédito Bancário ou Aditivo(s), Doc. 1852964655) são, na verdade, cláusulas gerais de contrato padrão, sem qualquer assinatura ou indicação de que o Réu tenha aderido especificamente a essas condições. Tais documentos são genéricos e não podem, por si só, comprovar a efetiva formalização do crédito rotativo ou do cartão de crédito com o Réu, nem os termos específicos pactuados (como limites, taxas de juros, multas, etc.). A Autora juntou faturas de cartão de crédito e extratos de conta (Fatura de Cartão de Crédito, Doc. 1852964657; Extrato de Conta, Doc. 1852964656) que indicam movimentação e saldos. Contudo, esses documentos, embora demonstrem uso, são produzidos unilateralmente pela instituição financeira e, sem o lastro de um contrato assinado ou de uma proposta de adesão com aceite inequívoco do consumidor, não servem como prova cabal da contratação de todas as condições aplicadas, especialmente as relativas a juros e outros encargos específicos de um "Cheque Azul" ou crédito rotativo. A mera utilização do cartão não convalida, por si só, a adesão a todas as cláusulas gerais de um contrato não formalizado. A inferência lógica aqui é clara: a ausência do contrato original, aliada à apresentação de meras cláusulas gerais e documentos unilaterais (extratos e faturas) que não explicitam a concordância do consumidor com os termos específicos do crédito rotativo e suas taxas, torna a pretensão autoral carente de lastro probatório suficiente. A inversão do ônus da prova, já deferida, agrava ainda mais a posição da Autora, que não conseguiu demonstrar a existência e a legalidade das condições contratuais alegadas. A análise holística do caso revela uma preocupante deficiência na atuação da instituição financeira. A gestão de contratos e a clareza nas cobranças são responsabilidades fundamentais de qualquer banco. Admitir o extravio ou a não formalização de um contrato central para a cobrança de uma dívida tão expressiva, e basear a ação em documentos genéricos e unilaterais, denota uma falha grave na guarda e na transparência das informações. O princípio da boa-fé objetiva, que permeia as relações contratuais, exige que as partes ajam com lealdade e transparência. A Caixa Econômica Federal, como fornecedora de serviços financeiros e parte detentora de maior poder e conhecimento técnico na relação, tem o dever de ser diligente na formalização e guarda dos documentos contratuais. A incapacidade de apresentar o contrato assinado pelo Réu impede que este exerça plenamente seu direito de verificar a legalidade e a conformidade das cláusulas, taxas e encargos aplicados, o que é um direito fundamental do consumidor. Ademais, e talvez o ponto mais crítico da presente demanda, reside na discrepância abissal entre o valor da causa e a planilha de débito. A Autora pleiteia o montante de R$ 38.782,86 na Petição Inicial. Contudo, a planilha detalhada de cálculo de dívida também anexada pela autora, aponta um total de R$ 17.980,55 para um dos contratos (3040.001.00041924-3, o "Cheque Especial Caixa"), atualizado até 11/09/2023 (Planilha, Doc. 1852964659, Pág. 1). Essa diferença superior a 20 mil reais não pode ser considerada um mero erro material. Constitui uma grave inconsistência na própria quantificação do débito. Tal falha compromete a liquidez e a certeza da dívida cobrada, tornando a petição inicial inepta, na medida em que o Réu fica impossibilitado de compreender, de forma clara e precisa, qual é o valor real da dívida que lhe está sendo imputada e como esse valor foi calculado. A jurisprudência, inclusive citada pelo Réu, tem sido uníssona em casos semelhantes: TRF-3 - ApCiv: 50001395820184036128 SP (Luiz Paulo Cotrim Guimarães, Data de Julgamento: 06/06/2019, 2ª Turma), que afirma: "É certo que para a constituição do débito em ação monitória, além dos contratos originais, é necessária a juntada de demonstrativos de débito. III – No entanto, não basta a simples juntada desses documentos, mas é necessário que os demonstrativos sirvam de fundamento para compreensão da evolução da dívida, devendo ser acompanhados de planilhas de cálculo, ausente no presente processo, e aptos a oportunizar aos devedores a ampla defesa e o contraditório." (Contestação, Doc. 2153631135, Pág. 4) A impossibilidade de aferir a evolução da dívida e os critérios de cálculo aplicados para chegar ao valor pleiteado na inicial é um óbice intransponível ao direito de defesa do Réu. Não cabe ao Judiciário suprir a falha do Autor em delimitar, de forma coesa e clara, o objeto de sua própria pretensão. Adicionalmente, o fato de a Autora ter "extraviado/não-formalizado" o contrato impede a verificação da pactuação expressa de juros remuneratórios e sua capitalização mensal. Conforme preceitos consolidados na jurisprudência, como o TRF-4 - AC: 50748585020194047000 (SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, Data de Julgamento: 04/05/2022, QUARTA TURMA), a ausência de pactuação expressa de juros e capitalização resulta na limitação dos juros à média de mercado e no afastamento da capitalização mensal. Contudo, essa discussão sequer pode ser aprofundada, dada a inconsistência do valor principal da dívida. A alegação do Réu de que "não se pode atribuir ao réu a prova de que não utilizou o cartão de crédito (prova "diabólica"), dada a evidente dificuldade de se provar o que não fez" (Contestação, Doc. 2153631135, Pág. 2), citando TRF-5 Ap: 08146738520184058300, é plenamente aplicável ao contexto de ausência de contrato e inconsistência nos valores. Diante de todo o exposto, as falhas na instrução da petição inicial da Autora são patentes e comprometem a regularidade do processo. A falta do contrato original, a apresentação de cláusulas gerais que não vinculam o Réu de forma expressa aos termos específicos do suposto crédito rotativo, e, principalmente, a gritante inconsistência entre o valor da causa e o montante discriminado na planilha de cálculo da dívida, configuram a inépcia da inicial por impossibilidade de o Réu exercer seu direito ao contraditório e à ampla defesa de maneira efetiva. Ainda que se considerasse a possibilidade de emendar a inicial, a magnitude da divergência e a confissão da Autora sobre o extravio/não formalização do contrato demonstram uma fragilidade probatória fundamental que não pode ser facilmente sanada sem comprometer a segurança jurídica da relação. O Poder Judiciário não pode chancelar uma cobrança que não se sustenta em bases sólidas e transparentes. Nesse cenário, a improcedência da demanda é medida que se impõe, não apenas pela ausência de prova da contratação específica dos termos do crédito rotativo, mas principalmente pela inépcia da petição inicial decorrente da manifesta iliquidez e incerteza do valor cobrado. III. Dispositivo Ante o exposto e considerando a fundamentação pormenorizada, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL em face de LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER. Considerando a sucumbência integral da parte autora, condeno a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, em observância aos critérios de complexidade da demanda, tempo de tramitação e trabalho despendido pelos advogados da parte ré. Defiro o pedido de justiça gratuita ao réu LUIZ FELIPE DE ANDRADE KEMPER. Interposto eventual recurso, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões e encaminhem-se os autos para o competente julgador. Ocorrendo o trânsito em julgado desta sentença ou de eventual v. Acordão de Instância Superior, intimem-se as partes para ciência e eventuais manifestações, no prazo de 10 dias. Esclareço às partes que eventual pedido de cumprimento de sentença definitivo deverá ser realizado nos próprios autos. Decorrido o prazo sem manifestação, arquivem-se estes autos com as cautelas de praxe. Intimações necessárias Manaus, data da assinatura eletrônica Assinado eletronicamente

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