Processo nº 5008443-37.2022.8.08.0048
ID: 317531895
Tribunal: TJES
Órgão: Gabinete Des. FABIO CLEM DE OLIVEIRA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5008443-37.2022.8.08.0048
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS AUGUSTO DA MOTTA LEAL
OAB/ES XXXXXX
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LEONARDO LAGE DA MOTTA
OAB/ES XXXXXX
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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO 2ª CÂMARA CÍVEL PROCESSO Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: PELICANO CONSTRUCOES S.A. e outros APELADO: ESTADO DO ESPIRITO SANTO e o…
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO 2ª CÂMARA CÍVEL PROCESSO Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: PELICANO CONSTRUCOES S.A. e outros APELADO: ESTADO DO ESPIRITO SANTO e outros RELATOR(A):HELOISA CARIELLO ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ EMENTA APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 APELANTE: PELICANO CONSTRUÇÕES S.A., MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO E ESTADO DO ESPÍRITO SANTO APELADO: PELICANO CONSTRUÇÕES S.A., MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO E ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. DESIGNAÇÃO PARA ACÓRDÃO: DES. SUBST. LUIZ GUILHERME RISSO ACÓRDÃO EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE REJEITADA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL PÚBLICO SEM LICITAÇÃO E SEM REGISTRO DE LOTEAMENTO. NULIDADE DO CONTRATO RECONHECIDA. ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS POR CONSEQUENCIALISMO JURÍDICO. MULTAS CONTRATUAIS POR DESCUMPRIMENTO E ATRASO NAS OBRAS. VALIDADE E POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS POR EQUIDADE. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. 1. Se as razões recursais da apelação são suficientes para impugnar os fundamentos contidos na sentença, não há como reconhecer violação ao princípio da dialeticidade, ou irregularidade formal do recurso, por ausência de fundamentos. Preliminar de irregularidade formal da apelação interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo rejeitada. 2. O julgamento antecipado da lide, baseado na suficiência da prova documental e na predominância de matéria de direito, não caracteriza cerceamento de defesa (art. 355, I, CPC). Preliminar rejeitada. 3. A alienação de imóvel público realizada sem prévia licitação e antes do registro do loteamento é nula, nos termos do art. 37 da CF/88, art. 17, I, da Lei nº 8.666/93 e art. 37 da Lei nº 6.766/79. 4. A nulidade declarada pode ter seus efeitos estabilizados, à luz dos arts. 20 e 21 da LINDB e do Decreto nº 9.830/2019, quando a reversão da situação fática se mostrar desproporcional e lesiva ao interesse público, especialmente diante da consolidação da ocupação, dos investimentos realizados e dos impactos econômicos e sociais envolvidos. 5. São válidas e exigíveis as multas contratuais estipuladas por descumprimento da taxa mínima de ocupação do imóvel (30% do valor do contrato) e por atraso na execução das obras (0,1% ao dia), ante previsão expressa e fatos geradores distintos, sendo legítima a sua cumulação. 6. Afasta-se o pedido de redução equitativa das penalidades, por inexistência de desproporcionalidade entre os valores fixados e a extensão do inadimplemento. 7. A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou o proveito econômico da demanda, forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide –, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa (STJ, Resp. 1.850.512/SP - Tema 1.076). Honorários Sucumbenciais fixados com base no § 3° do art. 85 do CPC, no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos incisos I a IV do § 3º do art. 85 do CPC, sobre o benefício econômico obtido pelo Estado do Espírito Santo. 8. Recursos do Ministério Público do Estado do Espírito Santo e Pelicano Construções S.A. desprovidos. Recurso do Estado do Espírito Santo provido. VISTOS, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, na conformidade da ata e notas taquigráficas, À UNANIMIDADE, REJEITAR AS PRELIMINARES DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL E DE CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA, BEM COMO PARA NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO E PELICANO CONSTRUÇÕES S.A., E, POR MAIORIA DE VOTOS, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, nos termos do voto proferido pelo Eminente Des. Substituto Luiz Guilherme Risso. Vitória,01 de abril de 2025. RELATOR ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ ACÓRDÃO Decisão: À unanimidade, rejeitar a preliminar arguida e negar provimento aos recursos de Pelicano Construções S.A. e do Ministério Público do Estado do Espírito Santo e, por maioria, dar provimento ao recurso interposto pelo Estado do Espírito Santo. Órgão julgador vencedor: 002 - Gabinete Des. FABIO CLEM DE OLIVEIRA Composição de julgamento: 029 - Gabinete Desª. HELOISA CARIELLO - HELOISA CARIELLO - Relator / 002 - Gabinete Des. FABIO CLEM DE OLIVEIRA - LUIZ GUILHERME RISSO - Vogal / 017 - Gabinete Des. JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS - JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS - Vogal / 022 - Gabinete Des. RAPHAEL AMERICANO CÂMARA - RAPHAEL AMERICANO CAMARA - Vogal / 028 - Gabinete Des. FABIO BRASIL NERY - FABIO BRASIL NERY - Vogal VOTOS VOGAIS 002 - Gabinete Des. FABIO CLEM DE OLIVEIRA - LUIZ GUILHERME RISSO (Vogal) Proferir voto escrito divergente 017 - Gabinete Des. JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS - JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar divergência 022 - Gabinete Des. RAPHAEL AMERICANO CÂMARA - RAPHAEL AMERICANO CAMARA (Vogal) Proferir voto para acompanhar divergência 028 - Gabinete Des. FABIO BRASIL NERY - FABIO BRASIL NERY (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar divergência ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ RELATÓRIO _______________________________________________________________________________________________________________________________________________ NOTAS TAQUIGRÁFICAS APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 DATA DA SESSÃO: 11/03/2025 R E L A T Ó R I O A SR. DESEMBARGADORA HELOISA CARIELLO (RELATORA):- Cuida-se de três recursos de apelação cível interpostos por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A (id. 6631199), por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (id. 6631184) e por ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (id. 6631192) em face da r. sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registro Público, Meio Ambiente de Serra, que, nos autos de ação ordinária ajuizada pela primeira apelante em face do terceiro recorrente, julgou improcedentes os pedidos autorais, consistentes (i) na outorga de escritura pública referente ao Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, sob pena de expedição de carta de adjudicação, (ii) na declaração de inexigibilidade das multas discutidas nos autos e (iii) subsidiariamente, na declaração de impossibilidade de cumulação das multas, cuja cobrança deve ser limitada à menor delas, ou na redução equitativa do valor das multas em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, até o valor da obrigação principal. Ao fim, o decisum objurgado condenou a parte autora, ora primeira apelante, ao pagamento de verba honorária sucumbencial de R$ 30.000,00, fixada equitativamente diante do alto valor da causa (R$ 1.960.129,76), sob pena de enriquecimento sem causa. Irresignada, PELICANO CONSTRUÇÕES S/A aduz, em pleito principal, a nulidade da r. sentença, por violação aos princípios da não surpresa, do contraditório e do devido processo legal, uma vez que o feito foi julgado antecipadamente, sem oportunizar a produção de provas, especialmente as de natureza oral. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença vergastada, alegando, para tanto, que (i) a SUPPIN tinha pleno conhecimento e jamais questionou a necessidade de prorrogação de prazo para conclusão das obras em virtude das dificuldades impostas pelo poder público municipal na aprovação do projeto do empreendimento, tendo havido anuência tácita com as prorrogações, diante da inércia ao longo do tempo, atraindo a aplicação da supressio e do nemo potest venire contra factum proprium; (ii) não é possível imputar descumprimento contratual à apelante se esta dependia da concessão de licenças pela municipalidade para construção, sob pena de recair em clandestinidade e violar as normas municipais; (iii) sob pena de bis in idem, um mesmo fato gerador (o suposto inadimplemento contratual) não pode ensejar a cobrança de duas penalidades pecuniárias, a saber, multa compensatória de 30% do valor atualizado do contrato e multa moratória de 0,1%, por dia de atraso, sobre o valor atualizado do imóvel; (iv) em que pese o contrato discutido nos autos ter sido firmado com a Administração Pública, deve-se aplicar, por analogia, o disposto no art. 412 do CC, segundo o qual “o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal”; (v) os honorários advocatícios sucumbenciais fixados em R$ 30.000,00 merecem ser minorados, ante as particularidades do caso concreto e a ausência de complexidade da matéria. Por sua vez, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO requer a reforma da r. sentença, a fim de que se reconheça a nulidade do negócio jurídico que ensejou a demanda, em razão de (i) ofensa ao art. 37 da Lei nº 6.766/76, que veda a venda ou a promessa de venda de parcela de loteamento ou desmembramento não registrado, e (ii) violação ao disposto no art. 37, XXI, CF/88 e no art. 17, I, da Lei Federal nº 8.666/93, uma vez que a alienação do imóvel público se deu sem a avaliação prévia e o devido processo licitatório da concorrência. Acrescenta, por fim, que (iii) o consequencialismo jurídico invocado pelo Juízo a quo para considerar hígidos os negócios jurídicos firmados é instituto não estabilizado na jurisprudência, especialmente em face de nulidades administrativas absolutas, que são insanáveis e insuscetíveis de confirmação. Por fim, em suas razões recursais (id. 6631192), ESTADO DO ESPÍRITO SANTO requer a reforma do capítulo decisório relativo à fixação da verba honorária sucumbencial, sustentando que a apreciação equitativa promovida na r. sentença afronta os parâmetros legais dispostos no art. 85, §§2º, 3º e 8º do CPC, devendo os honorários serem fixados com base no proveito econômico obtido, in casu, o valor da penalidade pecuniária contratual que restou mantida incólume (R$ 1.603.729,76). Contrarrazões de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, pelo não conhecimento do recurso do Parquet, por falta de dialeticidade; e, no mérito, pelo desprovimento (id. 6631195), pugnando, também, pelo desprovimento do apelo do ente federativo (id. 6631196). Contrarrazões de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, pelo desprovimento do recurso de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A (id. 6631204). Sem contrarrazões recursais por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (id. 6631203). É o relatório. Inclua-se em pauta de julgamento. * O SR. ADVOGADO RENAN SEABRA PEREIRA:- Boa tarde a todos. Cumprimento os excelentíssimos Desembargadores na pessoa da Desembargadora Heloísa, Relatora do Recurso. O Desembargador Risso que vota com um vogal, me recebeu em seu gabinete ontem, agradeço, excelência, mais uma vez. E Desembargador Jorge, advogados, partes, serventuários, uma boa tarde. Serei bem breve, porque tive a oportunidade de entregar memoriais nos gabinetes ontem. E para tentar contextualizar, a Pelicano, lá nos idos de 2004, assim como dezenas de outras empresas, adquiriu um lote, um imóvel, um loteamento no Civit, localizado no município da Serra, num movimento realizado pela então Supin, extinta Supin, hoje representada aqui pelo Estado do Espírito, uma tentativa de desenvolver aquela região no Civit, que hoje acabou se tornando um grande polo industrial aqui do nosso Estado. Como disse, essa operação foi realizada no ano de 2004. No caso específico da Pelicano, essa aquisição se deu por meio de um acordo num processo judicial, com a participação da Supin, com a participação da Primitiva, adquirente desse imóvel, que não teve condições de honrar com o pagamento, e foi entabulado esse acordo por meio do qual a Pelicano assumiu o pagamento das parcelas e adquiriu o direito de aquisição de propriedade desse imóvel no qual hoje ela está instalada lá no Civit, inclusive ela adquiriu alguns lotes contíguos e toda a operação da base administrativa da Pelicano foi estabelecida nesse imóvel. Assim como ocorreu com diversas vendas de imóveis, alienações de imóveis nesse loteamento no Civit, a Supin estabelecia algumas condicionantes a serem cumpridas pelas empresas que tinham interesse em adquirir imóvel naquela região, que viam basicamente previsto nos contratos, mas no caso específico aqui dos autos, essa obrigação era uma obrigação de ocupação do terreno adquirido, um percentual de 30% desse terreno em um determinado período de tempo. E como disse, essa operação foi realizada no ano de 2004. A partir de então, a empresa começou a procurar as licenças ambientais, licenças municipais para dar início ao projeto de implementamento da sua sede e encontrou muitas dificuldades. A gente sabe que a burocracia estatal Infelizmente é muito grande. Mas tudo isso, ao longo dos anos, com conhecimento, com aquiescência e participação dos representantes da Supin, até que a sede foi concluída alguns anos depois, quando a Pelicano procurou já o Estado do Espírito Santo para conseguir a outorga da escritura definitiva desse imóvel para que ela pudesse realizar a transferência da propriedade, ela foi surpresada com a exigência de pagamento de duas multas, duas penalidades contratuais, que sob a ótica do Estado seriam devidas em razão desse descumprimento do prazo inicialmente estabelecido para ocupação do imóvel. Só que a gente está falando em um transcurso de 10, 12 anos, sem que a Supin ou posteriormente o Estado, tenham tomado ou tenham demonstrado qualquer atitude que criasse, que legitimasse a exigibilidade dessas multas. Muito pelo contrário, durante toda a relação negocial, durante toda a execução do contrato, inclusive foram realizadas várias vistorias lá no imóvel para ver como é que estava o andamento da obra, enfim, para ver se as obrigações pactuadas estavam sendo cumpridas, e uma delas no ano de 2010, veja, 06 anos após o contrato inicial, chegou no relatório da vistoria a constar que por conta da burocracia, por conta da dificuldade de desenvolvimento do projeto, seria importante e necessário repactuar prazos. Contudo, com o passar dos anos, essa repactuação nunca aconteceu, formalmente dizendo. Ela aconteceu, como a gente defende, de forma tácita. Porque a partir do momento que a Supin ou o Estado do Espírito Santo não questionaram com o passar dos anos, não questionaram a necessidade de dilação de prazo para cumprimento do contrato, jamais suscitaram qualquer possibilidade de necessidade de pagar essas penalidades, gerou-se uma legítima expectativa para Pelicano, que é bom frisar, como falei, cumpriu o escopo, implementou a sede da empresa lá, quer dizer, o objetivo principal, lá inicialmente buscado com loteamento de serviços, o interesse público buscado foi implementado, milhões e milhões de reais de tributos foram recolhidos, milhares de empregos foram gerados e, por conta disso, essa legitima expectativa criada na Pelicano que passou a entender que essas penalidades não seriam exigidas. A gente até fala nas razões recursais, vou só abordar a questão da supressio e do venire contra fractum proprium, a vedação ao comportamento contraditório da Supin, em razão dessa inércia ao longo dos anos que acabou com essa surpresa lá no ano de 2016, quando o pleiteou a outorga da escritura para transferência e foi surpresada com a exigência dessas multas. Para se ter uma ideia, o Estado do Espírito Santo ajuizou uma ação para cobrar essas multas. E isso foi só no ano de 2018. Ou seja, 14 anos depois do negócio feito e muitos anos depois de concluída a obra, cujo habite foi expedido no ano de 2011. Então, isso aí dá uma ideia muito clara de tão grande, de tão efetiva que foi essa inércia da Supin a gerar essa expectativa de que as penalidades não seriam cobradas. Por conta disso, ajuizamos a ação, pleiteando a declaração de inexibilidade dessas multas, com a consequente condenação do Estado à outorga da escritura para transferência desse imóvel e, subsidiariamente, a caso não fosse esse o entendimento, de que seria impossível admitir a cobrança cumulativa dessas multas. Por quê? Porque as duas têm origem no mesmo fato gerador, o que geraria aí o bis in idem. Qual seria o fato gerador dessas duas penalidades? O suposto descumprimento do prazo contratual para a conclusão da obra de instalação da sede da empresa. Seriam duas penalidades oriundas do mesmo fato gerador, ocasionando flagrante bis in idem que não pode ser admitido. Além disso, superada ainda essa hipótese, sustentamos a aplicabilidade por analogia do artigo 412 do Código Civil, que ele prevê ali a limitação das obrigações acessórias ao valor da obrigação principal. Esse imóvel lá em 2004 foi adquirido por trezentos e poucos mil reais. Quando do ajuizamento da ação, no ano de 2022, uma das multas já estava na monta de duzentos e poucos mil, e a outra de um milhão e quatrocentos e pouco, totalizando quase um milhão e setecentos mil reais, ou seja, quase quatro vezes mais do que o valor pago pela aquisição do terreno. O que revela também uma flagrante ausência de razoabilidade e proporcionalidade na fixação dessa multa e, por conseguinte, a necessidade da redução, ainda que seja subsidiária, pelo Poder Judiciário. Em resumo, são essas as razões do nosso recurso de apelação. Gostaria de lembrar também que também existe um recurso de apelação por parte do Ministério Público do Estado do Espírito Santo que sustenta que essa alienação, assim como todas as outras realizadas lá no loteamento Civit deveria ser declarada nula por violação a preceitos da lei de licitações, da lei de loteamento do solo urbano. Mas esse entendimento um tanto quanto legalista, vamos dizer assim, ele já está sendo superado, inclusive aqui no âmbito deste Tribunal, que tem entendido que a anulação do negócio, desses negócios, no caso alienação dos terrenos, dos imóveis, dos lotes lá do loteamento Civit, ela traria consequências muito mais danosas e gravosas do que a manutenção, ainda que houvesse, ainda que tenha havido alguma falha formal, alguma falha procedimental, a manutenção dos negócios, e considerando também o atingimento do alcance do interesse público buscado, isso supontaria eventual inobservância de formalidades. Então, por essa razão, o recurso do Ministério Público também não teria razão para ser acolhido. E ainda o recurso do Estado do Espírito Santo que ele é único e exclusivamente com relação às verbas de sucumbência. Ele sustenta que teria havido a violação ao artigo 85, mas entendemos que a sentença contra este particular dos honorários deve ser mantida, porque ela utilizou como fundamento o julgado do Supremo Tribunal Federal, o recurso extraordinário de relatória do ministro Barroso, que admite, por meio da qual estou assentado o entendimento de que se admite quando a Fazenda Pública estiver em um dos polos da ação, o arbitramento de honorária sucumbência por equidade, que é justamente o que ocorreu no caso dos autos. Então, em resumo, são essas as razões para o provimento do nosso recurso. Gostaria de reforçar. Essa sentença, ela julgou antecipadamente a lide antes mesmo da decisão saneadora, enfim, fixação de pontos controvertidos, etc. É uma demanda complexa que ensejaria produção de prova, ensejaria de lação probatória, mas isso não foi oportunizado às partes, que elas foram surpresadas com a prolação da sentença antes mesmo da decisão saneadora. O que ao nosso entender viola frontalmente o devido processo legal, o contraditório e ampa defesa e o princípio da nossa surpresa estampada no novo CPC e seria uma causa para decretação de nulidade dessa sentença com a remessa dos autos à origem para reabertura da instrução processual. Sobretudo porque, como disse, os pontos controvertidos, a caso estivessem fixados, eles demandariam a produção de provas. São essas as razões. Obrigado e desculpe pelo estender. * V O T O A SR. DESEMBARGADORA HELOISA CARIELLO (RELATORA):- Cumprimento o ilustre advogado e passo ao voto: Consoante relatado, insurgem-se os três recorrentes (i. PELICANO CONSTRUÇÕES S/A; ii. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e iii. ESTADO DO ESPÍRITO SANTO) em face da r. sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registro Público, Meio Ambiente de Serra, que, nos autos de ação ordinária ajuizada pela primeira apelante em face do terceiro recorrente, julgou improcedentes os pedidos autorais, consistentes (i) na outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, adquirido da extinta autarquia estadual SUPPIN (Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial); (ii) na declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel (30%) e atraso no início/conclusão das obras, conforme cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato; ou, subsidiariamente, na declaração de inacumulabilidade das multas ou à sua redução equitativa até o valor da obrigação principal. Ao fim, a parte autora, ora primeira apelante, restou condenada ao pagamento de verba honorária sucumbencial no valor de R$ 30.000,00, fixada equitativamente, sob pena de violação ao princípio da proporcionalidade, diante do alto valor da causa (R$ 1.960.129,76). Pois bem. Os recursos serão julgados em conjunto, diante do entrelaçamento das matérias devolvidas a esta instância recursal, principiando-se, em sede preliminar, pela alegação de ausência de dialeticidade do recurso interposto por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. * V O T O S O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO:- Acompanho o voto do Eminente Relator. * O SR. DESEMBARGADOR JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS:- Voto no mesmo sentido. * V O T O PRELIMINAR - FALTA DE DIALETICIDADE DA APELAÇÃO INTERPOSTA POR MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO A SR. DESEMBARGADORA HELOISA CARIELLO (RELATORA):- Inicialmente, PELICANO CONSTRUÇÕES S/A suscita, em contrarrazões, a ausência de dialeticidade do recurso aviado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, sob o fundamento de que as razões recursais não atacaram de forma específica os fundamentos da r. sentença, limitando-se a reprisar os argumentos tecidos em manifestações anteriores nos autos. Em que pese o esforço argumentativo, das razões recursais é possível depreender com clareza e precisão o pedido de reforma da sentença e os fundamentos para tanto, de modo que, ainda que haja repetição de trechos de petições anteriores, o recurso dialoga com o decisum vergastado. Com efeito, o Ministério Público Estadual deduz pedido de reforma integral da sentença, a fim de que se reconheça a nulidade do negócio jurídico e se rejeite o consequencialismo jurídico invocado pelo Juízo a quo, impugnando especificamente as razões de decidir lançadas, observando-se, portanto, o disposto nos arts. 1.010 e 1.013, § 1º, do CPC, não havendo que se falar em ausência de dialeticidade recursal. Em casos tais, a jurisprudência deste Sodalício não hesita em reconhecer a existência de diálogo entre as razões recursais e a r. sentença objurgada, como ilustram os seguintes arestos: APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. REJEITADA A PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO À DIALETICIDADE RECURSAL. MÉRITO. FRAUDE BANCÁRIA. DANOS MORAIS “IN RE IPSA”. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.1. Preliminar de violação à dialeticidade recursal arguida em contrarrazões rejeitada - Se as razões que justificam o pedido de reforma da sentença são aptos a impugnar os fundamentos da decisão recorrida e justificam o pedido de reforma, não há violação ao princípio da dialeticidade, nem irregularidade formal do recurso. (...) (TJES, Apelação 5000198-36.2022.8.08.0016, Rel. Des. RAPHAEL AMERICANO CÂMARA, Segunda Câmara Cível, DJe 04/07/2023). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES. REJEITADA. MÉRITO RECURSAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO. INADIMPLEMENTOS. VALORES DEVIDOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Preliminar Suscitada em Contrarrazões. A repetição de argumentos já formulados na exordial ou na contestação não caracteriza, por si só, óbice para o conhecimento do recurso, tampouco ofensa ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada. (…) (TJES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Número: 0015266-20.2019.8.08.0048, Magistrado: ROBSON LUIZ ALBANEZ, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Data: 01/11/2023) Do exposto, REJEITO a preliminar suscitada. * V O T O S O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO:- Acompanho o voto do Eminente Relator. * O SR. DESEMBARGADOR JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS:- Voto no mesmo sentido. * V O T O MÉRITO A SR. DESEMBARGADORA HELOISA CARIELLO (RELATORA):- No mérito, incumbe examinar, primeiramente, se, conforme alega a apelante PELICANO CONSTRUÇÕES LTDA, a r. sentença padeceria de nulidade, por violação aos princípios da não surpresa, do contraditório e do devido processo legal, uma vez que o feito fora julgado antecipadamente sem oportunizar a produção de provas, especialmente as de natureza oral. A irresignação recursal, todavia, não merece guarida, na medida em que a ausência de saneamento do feito, per si, não implica cerceamento de defesa e violação ao contraditório, o que se verificará apenas quando o órgão jurisdicional efetive o julgamento antecipado da lide sem observar o regime legal insculpido no art. 355 do CPC, que prevê, in verbis: Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349 . Como se infere da própria dicção legal do art. 357 do CPC, o saneamento e a organização do feito somente tem lugar quando inocorrer quaisquer das hipóteses previstas nos dispositivos anteriores - dentre as quais o julgamento antecipado -, in litteris: Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo: In casu, verifico que o julgamento antecipado se amolda precisamente à hipótese legal do art. 355, I, do CPC, na medida em que - conforme bem fundamentado pelo Juízo a quo, na sentença vergastada - a questão meritória é predominantemente de direito, afeta ao exame da origem da relação jurídica estabelecida entre as partes e às nuances contratuais que se desenvolveram quanto ao (in)adimplemento contratual, sendo a farta prova documental produzida suficiente ao deslinde da controvérsia. Em casos tais, a jurisprudência do c. STJ rechaça o alegado cerceamento de defesa, verbis: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO REGRESSIVA. FALHA NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INCÊNDIO EM IMÓVEL SEGURADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. NO CASO, FOI OPORTUNIZADA A DILAÇÃO PROBATÓRIA E HOUVE PEDIDO EXPRESSO DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. REVISÃO. NÃO CABIMENTO. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE SANEAMENTO, POR SI SÓ, NÃO IMPLICA NULIDADE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO IMPROVIDO. (...) 2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não é nula a sentença proferida em julgamento antecipado, sem prolação de despacho saneador, desde que estejam presentes nos autos elementos necessários e suficientes à solução da lide. (...) (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.490.098/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA AUTORA. (...) 4. Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o Tribunal de origem entender adequadamente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção probatória, por se tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado documentalmente. (...) (AgInt no AREsp n. 1.675.648/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 28/9/2020, DJe de 1/10/2020) O mesmo entendimento ecoa neste Sodalício, como ilustra o seguinte aresto proveniente desta c. 2ª Câmara Cível, in verbis: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. VEÍCULO. PROCEDÊNCIA. RECONVENÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não configura o cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide sem a produção de provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado valorar as provas com base na formação do seu convencimento. 2. O julgamento antecipado guarda observância aos princípios da celeridade e economia processual, abreviando a marcha processual por se cuidar de questão de direito e de fato que não necessita da produção de outras provas. 3. No caso concreto, a prova documental anexada aos autos é suficiente para o reconhecimento do direito da recorrida à busca e apreensão do veículo e improcedência do pedido reconvencional da recorrente. 4. Recurso desprovido. (Data: 18/May/2024, Órgão julgador: 2ª Câmara Cível, Número: 0000852-64.2020.8.08.0021, Magistrado: SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, Classe: APELAÇÃO CÍVEL) Assim, não viceja o argumento de nulidade da r. sentença, tendo o Juízo a quo conferido legítima e adequada operabilidade ao disposto no art. 355, I e, ainda, dos arts. 370 e 371, todos do CPC, à luz do princípio do convencimento motivado. Em evolução, a fim de verificar a ocorrência dos errores in judicando alegados pelas partes e pelo Parquet, considero útil contextualizar que o feito tem por pano de fundo fático-jurídico uma cadeia de alienações e transferências do imóvel “Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, em Serra/ES” por parte da extinta autarquia estadual SUPPIN (Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial), que culminou, ao fim, já no ano de 2004, na formalização de promessa de compra e venda com a ora apelante PELICANO CONSTRUÇÕES LTDA. E é justamente a outorga de escritura pública definitiva de compra e venda do referido imóvel que constitui o objeto da demanda, ao passo que o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO sustenta a nulidade do negócio jurídico de compra e venda firmado, em razão de (i) ofensa ao art. 37 da Lei nº 6.766/76, porquanto prometeu-se a venda e compra de parcela de loteamento não registrado, e (ii) violação ao disposto no art. 37, XXI, CF/88 e no art. 17, I, da Lei nº 8.666/93, uma vez que a alienação do imóvel público se deu sem avaliação e o devido processo licitatório. Quanto a este capítulo decisório, após exame acurado o caderno processual, concluo que a r. sentença vergastada não merece qualquer retoque, na medida em que, efetivamente, se depreende que o negócio jurídico de promessa de compra e venda firmado entre a apelante PELICANO e a SUPPIN compõe uma cadeia sucessiva de contratos nulos, por violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/76, que veda a compra e venda de loteamento ou desmembramento não registrado - como bem elucidado pelo Juízo a quo. Vale conferir, in litteris: A presente demanda cinge-se à análise do contrato de promessa de compra e venda do lote nº 12, da quadra VII, Setor II, do Loteamento Empresarial CIVIT, situado em Carapina, no Município de Serra-ES, celebrado em 17 de março de 2004 entre a extinta autarquia estadual SUPPIN (promitente vendedora) e a autora (promitente compradora) e eventual descumprimento de obrigação contratual por parte desta a ensejar a incidência de cláusula penal, impedindo, com isso, a outorga da escritura definitiva de compra e venda. Consta nos autos que, no bojo do procedimento administrativo nº 39083/1983, posteriormente renumerado para os n.ºs 071/04 e 44725086/09, foi celebrada inicialmente uma promessa de compra e venda entre a SUPPIN (promitente vendedora) e a empresa SEMERC - SERVIÇOS MECÂNICOS LTDA (promitente compradora) referente a um imóvel de 18.000 m² (dezoito mil metros quadrados) , situado no loteamento denominado CIVIT, Setor II, datado de 24 de outubro de 1979. Posteriormente, a promitente compradora mencionada no parágrafo imediatamente acima manifestou expressa desistência da promessa de compra e venda em 27.03.1984, sendo então feita a rescisão amigável do negócio jurídico entre as contratantes. Adiante, em 7 de maio de 1984, a SUPPIN celebrou por escritura pública uma nova promessa de compra e venda versando sobre o mesmo bem citado acima com a OXIGÊNIO DO BRASIL S/A. Em razão da inércia da OXIGÊNIO DO BRASIL S/A em recolher os emolumentos para registro do imóvel, nos autos da Ação Ordinária nº 048.010.042.520, foi formalizado acordo pelo qual a ARLÍQUIDO COMERCIAL LTDA (nova denominação da OXIGÊNIO DO BRASIL S/A) autorizava a alienação do bem imóvel para a empresa, ora demandada. Com isso, em 17 de março de 2004, foi formalizada a promessa de compra e venda, objeto destes autos, entre a SUPPIN e a Pelicano Construções e Incorporações Ltda. (...) De acordo com a informação prestada pela oficiala do Cartório do 1º Ofício da 2ª Zona de Serra às fls. 527-544 dos autos do processo em apenso (0029560-14.2018.8.08.0048), o Loteamento CIVIT II, encontra-se registrado naquela serventia desde 24 de junho de 1986, na matrícula n.º 7.563, Livro 2, n.º 2 de ordem, fls. 3-verso, constando na matrícula que o loteamento se deu em conformidade com o Decreto-lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979. Denota-se, assim, que o negócio jurídico originário firmado entre SUPPIN e SEMERC, em 24.10.1979, é anterior ao registro do loteamento, que se deu em 1986. Da mesma forma, o negócio jurídico formalizado entre SUPPIN e ARLÍQUIDO COMERCIAL LTDA (OXIGÊNIO DO BRASIL S/A). Com isso, patente a nulidade de tais avenças, por inobservância ao disposto no artigo 37, da Lei nº 6.766, de 19.12.1979. Sendo nulos os negócios jurídicos originários, por consectário lógico, mostra-se igualmente nula a promessa de compra e venda delas derivadas, objeto dos presentes autos. Não bastasse isso, verificando-se que a promessa de compra e venda se efetivou independente de deflagração de licitação, porquanto celebrada em acordo judicial formalizado entre a pessoa jurídica Oxigênio do Brasil S/A e a SUPPIN, violou-se também o disposto no art. 37, XXI, da CF e no art. 17, I, da Lei nº 8.666/93, que dispõem, in verbis: Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: Ato contínuo, considero que tampouco merece censura o decisum ao reconhecer que as consequências da declaração de nulidade do negócio jurídico necessitam ser temperadas - impondo-se, nesse sentir, o desprovimento do recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e, uma vez mais, a manutenção da r. sentença vergastada. É que, conquanto seja cediço que a declaração de nulidade dos negócios jurídicos imponha, em regra, a restituição das partes ao status quo ante, verifico que a nulificação traria imensuráveis prejuízos não apenas à pessoa jurídica PELICANO, que está completamente instalada há mais de 1 década no local, mas também ao interesse público primário, uma vez que a recorrente é importante fonte de desenvolvimento econômico e social para a região, gerando empregos e renda, além de arrecadação tributária. Não apenas a PELICANO, mas também o ESTADO DO ESPIRITO SANTO, aliás, manifestaram-se expressamente neste sentido, pugnando pela estabilização dos efeitos do negócio jurídico (ids. 6631177 e id. 6631174), trazendo aos autos relevantes e substanciosas considerações a respeito dos impactos advindos de eventual retorno das partes ao estado anterior. Assentou o Estado do Espírito Santo o seguinte, in litteris (id. 6631177): “(...) não obstante, em tese, sejam nulas as alienações de imóveis feitas pela SUPPIN sem prévia licitação, nas hipóteses em que o desfazimento do negócio jurídico se mostrar mais gravoso ao interesse público, será admitida a estabilização de seus efeitos. Pois bem. O caso em comento se amolda perfeitamente nessa situação excepcional, na qual o desfazimento do negócio jurídico em testilha representará um prejuízo significativamente maior do que a estabilização dos efeitos da promessa de compra e venda que ora se analisa. Isso porque o CIVIT II se trata de um dos mais antigos e mais importantes polos industriais da Serra, e os estabelecimentos lá instalados têm grande relevância social e econômica, haja vista seu impacto na geração de empregos, no desenvolvimento e na arrecadação de receitas pelo Poder Público (...) Ademais, a empresa autora, apesar de estar em dívida perante o Estado do Espírito Santo, encontra-se devidamente instalada e em funcionamento no local, conforme se nota de imagem retirada do programa Google Street View. Com isso em vista, importa consignar que a declaração de nulidade do contrato entre as partes ensejará a restituição ao status quo ante, o que pressuporia, necessariamente, a devolução do lote livre e desimpedido pela autora ao Estado. Isso quer dizer que caberia àquela promover a demolição de todas as construções e estruturas erguidas no terreno, cuja posse retornaria ao Poder Público Estadual, e o que poderia prejudicar significativamente o funcionamento da empresa”. Assim, sem prejuízo das válidas considerações a respeito do consequencialismo jurídico invocadas pelo Parquet, tenho que a r. sentença encontra amparo no disposto nos arts. 20 e 21 da LINDB, bem como no art. 4º do Decreto regulamentador da LINDB (Decreto nº 9.830/2019), que dispõem: LINDB Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos. DECRETO Nº 9.830/2019 Art. 4º A decisão que decretar invalidação de atos, contratos, ajustes, processos ou normas administrativos observará o disposto no art. 2º e indicará, de modo expresso, as suas consequências jurídicas e administrativas. (...) § 3º Quando cabível, a decisão a que se refere o caput indicará, na modulação de seus efeitos, as condições para que a regularização ocorra de forma proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais. § 4º Na declaração de invalidade de atos, contratos, ajustes, processos ou normas administrativos, o decisor poderá, consideradas as consequências jurídicas e administrativas da decisão para a administração pública e para o administrado: I - restringir os efeitos da declaração; ou II - decidir que sua eficácia se iniciará em momento posteriormente definido. A jurisprudência deste Sodalício já caminhou, diante de caso similar, nessa mesma linha de entendimento, confira-se: APELAÇÃO CÍVEL - NULIDADE DA SENTENÇA - QUESTÃO NÃO FOMENTADA PELAS PARTES - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - ANÁLISE DE OFÍCIO - POSSIBILIDADE - ADMINISTRATIVO - COMPRA DE BEM PROVENIENTE DA SUPPIN - AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO - NULIDADE ABSOLUTA - PRECEITOS ESTABELECIDOS PELO ART. 17 DA LEI 8.666⁄93 - PONDERAÇÃO DOS EFEITOS DA NULIDADE - ESTABILIZAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO - IRREVERSIBILIDADE FÁTICA - EXTERNALIDADES A SEREM CONSIDERADAS - SEGURANÇA JURÍDICA - PRINCÍPIO DA BOA-FÉ - COMPROVADO NOS AUTOS - RESPEITO A INTERPRETAÇÃO TÓPICA DA QUESTÃO - MANUTENÇÃO DO BEM NA POSSE DO COMPRADOR - INTERESSE PÚBLICO PREPONDERANTE (...) 1) A atual leitura dos dispositivos legais deve ser empreendida à luz de princípios constitucionais, no sentido de se efetivar o emprego da norma com o desiderato pretendido pelo legislador. 2) A venda de bem imóvel por autarquia está condicionada ao respeito dos preceitos estabelecidos no 17 da lei 8.666⁄93, devendo ser precedida de autorização legislativa, interesse público devidamente justificado, avaliação prévia e licitação. 3) Havendo sido violado o dispositivo legal, art. 17 da lei 8.666⁄93, é de se reconhecer a nulidade quanto ao ato de alienação do bem imóvel. 4) A estabilização dos efeitos do ato administrativo deve ser reconhecida quando as externalidades, os efeitos concretos derivados do reconhecimento da nulidade, impuserem danos maiores a administração, no que se observa o respeito ao interesse público. 5) A segurança jurídica deriva de toda análise do conjunto probatório encontrado nos autos, eis que a autarquia fomentou o processo de alienação e até a prolação da sentença, olvidou informar ao administrado que o procedimento estabelecido estava em desconformidade com a lei. 6) A proteção da confiança representa a observância das expectativas de comportamentos pelas instâncias estatais, independentemente de se tratar do legislador, do executivo ou do judiciário (Gilmar Mendes, informativo do STF, 625). (...) (TJES, Classe: Apelação, 048100265031, Relator Designado: WALACE PANDOLPHO KIFFER, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL , Data de Julgamento: 15/12/2014, Data da Publicação no Diário: 30/01/2015) Ato contínuo, irresigna-se a apelante PELICANO em relação às multas contratuais que lhe foram impostas sob o fundamento de inadimplemento contratual, por não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel (30%) e atraso no início/conclusão das obras, nos termos das cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato. Alega, para tanto, que (i) a SUPPIN tinha pleno conhecimento e jamais questionou a necessidade de prorrogação de prazo para conclusão das obras em virtude das dificuldades impostas pelo poder público municipal na aprovação do projeto do empreendimento, tendo havido anuência tácita com as prorrogações, diante da inércia ao longo do tempo, atraindo a aplicação da supressio e do nemo potest venire contra factum proprium; (ii) não é possível imputar descumprimento contratual à apelante se esta dependia da concessão de licenças pela municipalidade para construção, sob pena de recair em clandestinidade e violar as normas municipais; (iii) sob pena de bis in idem, um mesmo fato gerador (o suposto inadimplemento contratual) não pode ensejar a cobrança de duas penalidades pecuniárias, a saber, multa compensatória de 30% do valor atualizado do contrato e multa moratória de 0,1%, por dia de atraso, sobre o valor atualizado do imóvel; (iv) em que pese o contrato discutido nos autos ter sido firmado com a Administração Pública, deve-se aplicar, por analogia, o disposto no art. 412 do CC, segundo o qual “o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal”. Em que pese o esforço argumentativo da apelante, dos autos se depreende que as multas contratuais impostas encontram lastro nas cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato de promessa de compra e venda, que dispõem: CLÁUSULA SEGUNDA O preço do lote, calculado com base na taxa de ocupação de 30% (trinta por cento), localização e declividade da área do terreno, objeto deste CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA, é de R$ 356.400,00 (trezentos e cinquenta e seis mile quatrocentos reais). Sendo que o valor acima referido será pago pela COMPRADORA à empresa ARLIQUIDO COMERCIAL LTDA (atual denominação da empresa OXIGÊNIO DO BRASIL S/A), tendo em vista ACORDO JUDICIAL realizado pela VENDEDORA constante do Processo N° 5154/01 (048.010.042.520) Vara das Fazendas Públicas Estadual, Municipal e dos Registros Públicos da Serra/ES. a) Caso a COMPRADORA não venha a atingir o coeficiente de ocupação de 30% da área adquirida, no prazo de 26(vinte seis) meses contados da data de assinatura deste CONTRATO, e ainda, nas condições dispostas nas Normas de Vendas de Terrenos da Suppin, a VENDEDORA não emitirá a Escritura Definitiva da área, ficando a COMPRADORA devedora à VENDEDORA do valor equivalente a multa contratual no percentual de 30% do valor do presente CONTRATO, e ainda, constituirá motivo justo e acordado entre as partes para a realização da Rescisão deste contrato, com retorno da área adquirida à VENDEDORA. CLÁUSULA SÉTIMA O não cumprimento dos prazos estabelecidos na cláusula anterior para inicio e conclusão das obras facultará à VENDEDORA a considerar rescindido o presente Instrumento, sem prejuízo das demais penalidades. CLÁUSULA DÉCIMA SEXTA O descumprimento de quaisquer das obrigações e/ou condições estabelecidas nas cláusulas 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª, 12.ª, e 14.ª, sujeitará a COMPRADORA à multa diária equivalente a 0,1% (um décimo por cento), calculado sobre o valor atualizado da área negociada, devida desde a data em que se tornar inadimplente a COMPRADORA, sem prejuízo da VENDEDORA poder exigir o cumprimento das obrigações ou condições, ou rescindir o presente instrumento, excetuando-se os casos de aplicação das cláusulas 3.ª, 4.ª e 13ª. O inadimplemento contratual, por sua vez, é inferido da farta prova documental, conforme detalhada linha do tempo traçada na r. sentença vergastada, valendo sua reprodução, ipsis litteris: “O projeto apresentado pela autora foi aprovado pela autarquia em 4 de outubro de 2004 (fl. 85), contudo, nas fiscalizações realizadas pela SUPPIN, observa-se que até 27 de março de 2006 a autora sequer havia iniciado as obras (ID 13629920 – fl. 17). Em 5.5.2006, a demandante protocolizou requerimento de prorrogação do prazo previsto na cláusula segunda (ID 13629220 – fls. 31/33) junto à SUPPIN sob o fundamento de ter encontrado entraves para aprovação do projeto arquitetônico na Prefeitura Municipal de Serra, o que ensejou a lavratura do Termo Aditivo, firmado em 18 de junho de 2006, prorrogando o prazo para a conclusão das obras até o dia 30 de maio de 2007 (ID 13629220 – fls. 21-26) . Fato é que a autora somente deu início às obras em 14 de julho de 2006, posteriormente ao aditivo, vindo a concluir as obras apenas em janeiro de 2012 (ID 13629231 – fl. 12). Nos anos de 2006 e 2007, a SUPPIN realizou diversas diligências no imóvel para verificar o andamento da obra, sendo constatada em diversas ocasiões a paralisação da construção, e, em vistoria realizada no dia de vencimento do prazo (31.05.2007), foi atestada a não conclusão das obras (ID 13629220 – fls. 29), constatando-se a inadimplência da empresa. Diante disso, a autora postulou nova prorrogação do prazo, prevista na alínea “a” da cláusula segunda do contrato pelo período de vinte e quatro (24) meses a contar de 30 de maio de 2007. Registro, no entanto, que o novo pedido de prorrogação foi protocolado em 8 de outubro de 2007 (ID 13629220 – fls. 31-34 ), momento em que a demandante já encontrava-se inadimplente, tendo em vista o decurso de quase 5 (cinco) meses do término do prazo previsto no aditivo (30.5.2007). Portanto, o pedido de prorrogação foi protocolado quando já havia expirado o prazo estabelecido no Aditivo contratual. Em razão de tal pleito, a autora foi notificada em duas oportunidades (ID 13629226 – em 09/08 e em 11/08) para justificar os alegados entraves burocráticos na Administração Pública Municipal que a estariam impedindo de concluir a obra na data aprazada. A resposta a tais notificações somente foi prestada em 14 de novembro de 2008 (ID 13629226 – fls.09-10). Em face da insuficiência dos documentos apresentados, em 26 de janeiro de 2009, novos ofícios foram encaminhados à autora, solicitando que comprovasse a aprovação do projeto arquitetônico perante a Prefeitura Municipal de Serra (ID 13629226 – fl. 24). A autora foi devidamente notificada, nos anos de 2008 e 2009, para comprovação dos fatos alegados no pedido de prorrogação de prazo. A prorrogação do prazo, por meio de novo Aditivo Contratual, restou prejudicada justamente porque a demandante não comprovou os entraves burocráticos alegados. Às fls. 4, do documento ID 13629231, consta a informação de que em vistoria realizada pela SUPPIN no imóvel, em 24 de maio de 2010, a empresa havia atingido o coeficiente de ocupação do imóvel de apenas 8,45% (oito vírgula quarenta e cinco por cento). Portanto, 3 (três) anos após vencido o prazo contratual (31.05.2007), a taxa de ocupação mínima não havia sido cumprida pela empresa. Ainda em 03.09.2010, um dos sócios da autora, em reunião com a Comissão de Vistoria da SUPPIN, foi notificado quanto à urgência para regularizar a sua inadimplência contratual (ID 13629231 – fl. 11). Em resposta, a requerente encaminhou à autarquia o ofício de fls. 14 – ID 13629231 , em 6 de setembro de 2010, no qual comunicou a necessidade de aquisição de novo lote (n.º 14) para atingir o coeficiente de ocupação de 30% (trinta por cento) estabelecido no contrato, apresentando projeto arquitetônico aprovado pela Prefeitura da Serra. Portanto, verifica-se que no período de 2006 a 2010, a autora não cumpriu a sua obrigação contratual relativa ao atingimento da taxa de ocupação de 30% (trinta por cento) da área do terreno, vencida em 30.05.2007, o que somente foi viabilizado, conforme informado pela própria requerente, após a aquisição do imóvel contíguo (Lote 14), sendo as obras finalmente concluídas no ano de 2012.” Não há que se falar, ademais, em surrectio/supressio ou venire contra factum proprium, na medida em que a SUPPIN, de forma próxima e reiterada, desabonava o descumprimento dos prazos contratuais, não se inferindo comportamento contrário à boa-fé objetiva ou frustração de legítima expectativa da parte apelante ao impor a penalidade contratual expressamente pactuada. Na mesma esteira, o condicionamento da outorga da escritura pública definitiva ao adimplemento da multa contratual também encontra lastro contratual expresso, conforme cláusula 2ª, alínea “a”, in verbis: “a) Caso a COMPRADORA não venha a atingir o coeficiente de ocupação de 30% da área adquirida, no prazo de 26(vinte seis) meses contados da data de assinatura deste CONTRATO, e ainda, nas condições dispostas nas Normas de Vendas de Terrenos da Suppin, a VENDEDORA não emitirá a Escritura Definitiva da área, ficando a COMPRADORA devedora à VENDEDORA do valor equivalente a multa contratual no percentual de 30% do valor do presente CONTRATO, e ainda, constituirá motivo justo e acordado entre as partes para a realização da Rescisão deste contrato, com retorno da área adquirida à VENDEDORA.” Quanto à suposta inacumulabilidade das multas moratória e compensatória previstas no contrato, a irresignação recursal esbarra no sedimentado entendimento de que “é possível a cumulação de multa moratória com cláusula penal compensatória, desde que ambas estejam previstas no contrato e incidam sobre fatos geradores distintos” (TJES, APELAÇÃO CÍVEL número 0024092-40.2016.8.08.0048, Rel. Des. ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA, 4ª Câmara Cível, Data: 18/Aug/2023). In casu, as multas previstas na cláusula 2ª, alínea “a” e na cláusula 16ª, além de expressas, têm fatos geradores distintos: a primeira, o não atingimento do coeficiente mínimo de 30% de ocupação da área adquirida; a segunda, o atraso no início/conclusão das obras. Neste ponto, aliás, registro que o início das obras ocorreu apenas em julho de 2006, após o transcurso do prazo de 180 dias da assinatura do contrato (em 17 de março de 2004), atraindo a aplicação das cláusulas 6ª, 7ª e 16ª. Do mesmo modo, o prazo final de conclusão das obras - postergado, mediante aditivo contratual, para 30/05/2007 - não restou observado, vez que, como supramencionado, as obras findaram no ano de 2012, a legitimar a aplicação das cláusulas 7ª e 16ª do contrato. Tampouco merece guarida a pretensão de redução equitativa das multas, na medida em que expressam precisa e exatamente o quanto pactuado pelas partes (cláusulas 2ª, 7ª e 16ª), não se mostrando desproporcional a alíquota percentual de 30% por não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel, nem tampouco a multa moratória, quando comparada à extensa mora incorrida pela apelante PELICANO, que se protraiu por quase 5 anos, até que ao imóvel se tenha dado a destinação adequada. Assim, embora a jurisprudência do c. STJ e deste eg. TJES tenha ampliado a redoma de exame jurisdicional dos atos administrativos para além da legalidade estrita - à luz dos princípios da juridicidade, razoabilidade e proporcionalidade -, fato é que, no caso em tela, não verifico a desproporcionalidade e a irrazoabilidade das penalidades contratuais impostas, ante a significativa extensão da mora e os consequentes impactos em âmbito micro (relação jurídica interpartes) e macro (fomento da atividade industrial e econômica da região) do inadimplemento no empreendimento de polarização industrial subjacente. A jurisprudência pátria, em casos tais, encampa a legitimidade das penalidades contratualmente previstas, mutatis mutandis: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA. DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO. Processo administrativo levado a efeito pela ARTESP, com imposição de multa à Concessionária de serviço público em virtude de não realização de serviços de corte e remoção de árvores e arbustos. MÉRITO. Dever de manutenção da rodovia não observado pela concessionária. Descumprimento de contrato administrativo caracterizado. Inexistência de má-fé pela agência reguladora. Cumprimento da obrigação contratual, que envolve a execução de serviço previsível e rotineiro, que é exigível da concessionária sem qualquer tipo de condicionamento. Concessionária que não se desincumbiu de comprovar, conforme lhe incumbia (art. 373, I, CPC), a existência de eventuais causas excludentes de responsabilidade, consoante disposto no edital. Procedimento administrativo que garantiu o direito de ampla defesa e contraditório (art. 5º, LIV e LV, da CF). Presunção de veracidade, legalidade e legitimidade do ato administrativo não elididos pela parte autora. Poder Judiciário que não pode rever o mérito da decisão administrativa. Multa fixada com expressa previsão no edital e no contrato, e que era de prévia ciência da Concessionária. Aplicação de penalidade realizada nos termos do contrato e do edital, observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Manutenção da r. sentença que julgou o pedido improcedente. VERBA HONORÁRIA. Majoração em grau recursal. Art. 85, §11, do CPC/2015. Observação neste sentido. RECURSO DESPROVIDO, com observação. (TJSP; Apelação Cível 1082099-45.2023.8.26.0053; Relator (a): Flora Maria Nesi Tossi Silva; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 5ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 03/10/2024; Data de Registro: 03/10/2024) AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO – MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO – REPINTURA OU REAPLICAÇÃO DE SINALIZAÇÃO HORIZONTAL - Pretensão objetivando a declaração de nulidade do ato administrativo que aplicou a sanção por inadimplemento contratual, pela não repintura e reaplicação da sinalização horizontal em trechos da Rodovia SP-270, nos prazos e termos estabelecidos – Alegação de apuração irregular de não-conformidade contratual tendo em vista a não utilização de equipamento adequado para aferir o índice de retrorrefletância das sinalizações que deram ensejo à penalidade – Sentença de improcedência mantida – Constatação pela ARTESP de sinalização horizontal em desacordo com os padrões estabelecidos no Edital da Concessão, pois estava desgastada em vários locais na rodovia SP-270 – Conjunto probatório que permite entrever a ausência de pintura nos trechos apontados, a desbordar na irrelevância da utilização de equipamento específico para apuração da retrorrefletância – Medições de retrorrefletância que competem, outrossim, à concessionária, nos termos do edital – Multa arbitrada com razoabilidade e proporcionalidade, com espeque em cláusula contratual, com a finalidade de preservação da segurança dos usuários - Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1046611-63.2022.8.26.0053; Relator (a): Bandeira Lins; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 10ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 09/12/2024; Data de Registro: 09/12/2024) DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO ADMINISTRATIVO. RESCISÃO UNILATERAL. ALEGADA COISA JULGADA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME. 1. Apelação interposta contra a sentença da Vara Única da Comarca de Miradouro, que, nos autos de ação ordinária movida pelo Município de Miradouro, julgou procedente o pedido inicial, rescindindo o contrato administrativo nº 033/2014 e condenando a ré ao pagamento de perdas e danos no valor de R$ 29.825,06, além da multa contratual de R$ 12.521,89. A ré alega a ocorrência de coisa julgada e defende a regular execução do contrato. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se há coisa julgada em razão de ação anterior envolvendo as partes; (ii) estabelecer se a rescisão unilateral do contrato e a condenação da ré por descumprimento contratual são legítimas. III. RAZÕES DE DECIDIR. 3. A coisa julgada não se configura, pois a ação anterior discutia a retirada de estrutura metálica defeituosa, sem abordar o descumprimento do contrato de nº 033/2014, objeto da presente ação. 4. O artigo 58, II, da Lei 8.666/1993 confere à Administração Pública a prerrogativa de rescindir unilateralmente contratos administrativos, quando há inexecução por parte do contratado. 5. Constatou-se a inexecução do contrato pela ré, que abandonou a obra e deixou de corrigir irregularidades apontadas pelo Município, como falhas estruturais na construção da quadra poliesportiva. 6. O Poder Judiciário, ao analisar atos administrativos, deve se ater à legalidade, não cabendo adentrar no mérito administrativo, o que foi respeitado na decisão de rescisão do contrato. 7. A rescisão contratual e a aplicação de penalidades encontram respaldo nos termos da Lei 8.666/1993 e nas cláusulas do contrato celebrado, que preveem tais medidas em caso de descumprimento contratual. IV. DISPOSITIVO E TESE. 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A coisa julgada não se verifica quando as ações envolvem causas de pedir diversas, ainda que entre as mesmas partes. 2. A Administração Pública pode rescindir unilateralmente contrato administrativo por inexecução contratual, nos termos da Lei 8.666/1993. 3. A rescisão contratual e a aplicação de penalidades administrativas são válidas quando comprovado o descumprimento contratual por parte da empresa contratada. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 337, VII, §§1º e 4º; Lei 8.666/1993, arts. 58, I, II, 78 e 79. Jurisprudência relevante citada: TJMG, Agravo de Instrumento-Cv nº 1.0000.24.208565-2/001, Rel. Des. Manoel dos Reis Morais, 1ª Câmara Cível, j. 09/07/2024. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.205133-2/001, Relator(a): Des.(a) Juliana Campos Horta , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/11/2024, publicação da súmula em 14/11/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - MULTA - DEVIDA - PROCESSO ADMINISTRATIVO - LEGALIDADE OBSERVADA - DECISÃO MANTIDA. 1-É consabido que em decorrência do princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º, CR/88) ao Judiciário somente é dado fazer um controle de legalidade em relação à atuação da Administração Pública, sem adentrar ao mérito do ato administrativo. 2 - Evidenciada a existência de irregularidades, revela-se devido o pagamento de multa prevista contratualmente para a hipótese de descumprimento das especificações técnicas constantes do contrato. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.361842-8/001, Relator(a): Des.(a) Jair Varão , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/10/2024, publicação da súmula em 31/10/2024) Também neste ponto, portanto, entendo que deva ser mantida incólume a r. sentença objurgada. Por fim, resta a análise da insurgência recursal aviada pelo ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - que se circunscreve a impugnar a fixação da verba honorária sucumbencial de forma equitativa, o que, segundo alega, afronta os parâmetros legais dispostos no art. 85, §§2º, 3º e 8º do CPC. Requer, assim, que os honorários sejam fixados com base no proveito econômico obtido, in casu, o valor da penalidade pecuniária contratual que restou mantida incólume (R$ 1.603.729,76), ao passo em que PELICANO sustenta, em sentido diverso, que os honorários fixados em R$ 30.000,00 merecem ser minorados, ante as particularidades do caso concreto e a ausência de complexidade da matéria. Neste tocante, sem ignorar que o c. STJ firmou precedente vinculante no sentido de que “a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados” (Tema nº 1.076), ressalto que o E. STF, ao enfrentar a questão similar posteriormente à fixação do Tema nº 1076 pelo STJ, decidiu pela fixação da verba honorária por equidade, em virtude do elevado valor da causa e com supedâneo nos §§ 2º e 8º do mencionado dispositivo, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Na ocasião, assim elucidou o Eminente Ministro Relator LUÍS ROBERTO BARROSO, no julgamento do RE 1415786/PE, in litteris: “(...) 17. Nada obstante o inegável zelo dos profissionais que atuaram na causa, entendo que a natureza do processo e o trabalho exigido para o seu encaminhamento não justificam a fixação de honorários em quantia exorbitante, tendo em vista que o valor atualizado da causa supera os 15 milhões de reais. 18. A questão versada nos autos era exclusivamente de direito, de modo que não houve instrução probatória, perícias ou diligências. Ademais, o desenvolvimento processual ocorreu de forma regular, sem a necessidade de trabalhos excessivos pelos representantes judiciais das partes. Em vista dessas circunstâncias, a fixação dos honorários em percentual do valor da causa gera à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta. 19. Além disso, a presença da Fazenda Pública em um dos polos impõe que os honorários de sucumbência sejam fixados com parcimônia. Isso porque a condenação levada a efeito nos termos do art. 85, § 3º, do CPC/2015, tem o condão de comprometer a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade, em razão do elevado ônus financeiro. 20. Vislumbro, dessa forma, a possibilidade de revisão do valor dos honorários de sucumbência, para que sejam fixados por equidade, conforme autoriza o art. 85, § 8º, do CPC/2015, transcrito acima”. Ressalto, por fim, que do julgamento realizado pelo c. STJ no enfrentamento do Tema nº 1.076, a Corte Superior de Justiça admitiu o processamento de Recurso Extraordinário no REsp 1.644.077/PR (que, entre outros, compõe o plexo de recursos reunidos no referido Tema), tendo o E. STF reconhecido Repercussão Geral sobre a questão, por meio da fixação do Tema nº 1255, cujo objeto é justamente o reexame da interpretação dada pelo Tribunal da Cidadania ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do CPC: “Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 2º, 3º, I e IV, 5º, caput, XXXIV e XXXV, 37, caput, e 66, § 1º, da Constituição Federal, a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do Código de Processo Civil, em julgamento de recurso especial repetitivo, no sentido de não ser permitida a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa nas hipóteses de os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda serem elevados, mas tão somente quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo (Tema 1.076/STJ).” (RE 1412069 RG, Relator(a): MINISTRA PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 08-08-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 23-05-2024 PUBLIC 24-05-2024) Nesse contexto, tendo em vista o elevado valor da causa e do proveito econômico, que alcança aproximadamente dois milhões de reais, impositivo reconhecer que a fixação da verba honorária em percentual - ainda que no mínimo legal - imporia condenação deveras elevada, incompatível com a atividade empreendida pelos ilustres procuradores no feito. O montante fixado (R$ 30.000,00), por sua vez, se afigura razoável e proporcional à complexidade da demanda, à atividade empreendida pelos procuradores, considerando-se o tempo de tramitação do feito e a localização dos atos, bem como a desnecessidade de dilação probatória (oral, pericial). Do exposto, CONHEÇO dos recursos interpostos por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e LHES NEGO PROVIMENTO, mantendo incólume a r. sentença vergastada, nos termos da fundamentação supra. Com fulcro no art. 85, §11, do CPC, MAJORO de R$ 30.000,00 para R$ 31.000,00 a verba honorária sucumbencial devida pela recorrente PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, deixando de fixar honorários recursais em desfavor do ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, ante a ausência de fixação na origem (REsp n. 1.864.633/RS, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, julgado em 9/11/2023, DJe de 21/12/2023). É como voto. * V I S T A O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO:- Respeitosamente, peço vista dos autos. * rpm* DATA DA SESSÃO: 18/03/2025 V O T O (PEDIDO DE VISTA) O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO:- Senhor Presidente. Cuida-se de apelações cíveis interpostas por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e ESTADO DO ESPÍRITO SANTO contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registro Público, Meio Ambiente de Serra, que, na ação ordinária ajuizada pela primeira apelante em face do terceiro recorrente, julgou improcedentes os pedidos autorais, consistentes na outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, e na declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de descumprimento de obrigações contratuais. A sentença recorrida ainda condenou a parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais fixados equitativamente no valor de R$ 30.000,00, considerando-se o alto valor da causa (R$ 1.960.129,76), sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade Em sessão pretérita, a Eminente Relatora rejeitou a preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo, bem como rejeitou a arguição de nulidade da sentença por ausência de saneamento e cerceamento de defesa. E no mérito, Sua Excelência negou provimento aos recursos interpostos por Pelicano Construções S/A, Ministério Público do Estado do Espírito Santo e Estado do Espírito Santo, sob o fundamento de que (1) é nulo o contrato de promessa de compra e venda firmado entre Pelicano e a extinta autarquia estadual SUPPIN, ante a violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/79, decorrente da alienação de loteamento não registrado, bem como pela inobservância do art. 37, XXI, da Constituição Federal e art. 17, inciso I, da Lei nº 8.666/93, em razão da ausência de prévia licitação e avaliação do imóvel público alienado; (2) reputa-se necessária a estabilização dos efeitos concretos do negócio jurídico celebrado, com fundamento nos arts. 20 e 21 da LINDB e art. 4º do Decreto nº 9.830/2019, considerando-se, especialmente, as consequências jurídicas, econômicas e sociais desfavoráveis que decorreriam da invalidação plena do negócio, em consonância com o interesse público e o princípio da segurança jurídica; (3) é legítima a aplicação das multas contratuais (moratória e compensatória) em desfavor da Pelicano Construções Ltda., dada a comprovação do inadimplemento das obrigações assumidas contratualmente, não havendo que se falar em supressio, vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), violação à boa-fé objetiva e bis in idem e; (4) que as multas previstas contratualmente são razoáveis, proporcionais e decorrem expressamente da avença celebrada entre as partes, mostrando-se adequadas diante da extensão temporal do inadimplemento apurado nos autos; e (5) que se figura adequada a fixação equitativa dos honorários, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fundamentando-se na razoabilidade e proporcionalidade da condenação, bem como em precedente recente do Supremo Tribunal Federal que flexibilizou entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 1.076. Pedi vista dos autos e trago o meu voto para a continuação do julgamento. Assim como concluiu a eminente relatora, também concluo pela rejeição da preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo, rejeição da arguição de nulidade da sentença por cerceamento do direito de defesa e violação ao contraditório, bem como por negar provimento aos recursos de Pelicano Construções S.A. e Ministério Público do Estado do Espírito santo. De outro lado, respeitosamente divirjo da conclusão alcançada em relação à questão devolvida pelo recurso do Estado do Espírito Santo, circunscrita ao parâmetro de fixação dos honorários sucumbenciais. Sabe-se que no julgamento do Tema 1.076, a Corte Especial do STJ definiu ser inviável a fixação de honorários de sucumbência por apreciação equitativa na hipótese em que o valor da condenação ou o proveito econômico forem elevados. Vale recordar, por sua vez, que no julgamento do REsp 1746072/PR, o STJ consolidou entendimento no sentido de que “os honorários advocatícios só podem ser fixados com base na equidade de forma subsidiária, quando não for possível o arbitramento pela regra geral ou quando inestimável ou irrisório o valor da causa”. Concluiu-se, na oportunidade, que “o §2º do art. 85 do CPC/2015 veicula a regra geral e obrigatória, relegado ao §8º do art. 85 a instituição de regra excepcional, de aplicação subsidiária. Assim, a incidência, pela ordem, de uma das hipóteses do art. 85, §2º, impede que o julgador prossiga com sua análise a fim de investigar eventual enquadramento no §8º do mesmo dispositivo, porque a subsunção da norma ao fato já se terá esgotado”. Anote-se, outrossim, que em 09/08/2023 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário n° 1412069 (TEMA n° 1.255) visando discutir “à luz dos artigos 2º, 3º, I e IV, 5º, caput, XXXIV e XXXV, 37, caput, e 66, § 1º, da Constituição Federal, a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do Código de Processo Civil, em julgamento de recurso especial repetitivo, no sentido de não ser permitida a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa nas hipóteses de os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda serem elevados, mas tão somente quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo (Tema 1.076/STJ)”, sem, no entanto, determinar a suspensão dos processos afetos à questão ou à eficácia do precedente de observância obrigatória estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça. Não obstante a relevante discussão acerca da possibilidade de aplicação do §8º do art. 85 do CPC também aos casos em que o proveito econômico ou o valor da causa forem de grande monta1, tratando-se de precedente de observância obrigatória (CPC, art. 927, inc. V) e considerando que, no caso, a questão relacionada aos honorários advocatícios sucumbenciais não está preclusa, a aplicação da referida tese é medida que se impõe. Por estas razões, rejeito a preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo e nego provimento aos recursos de Pelicano Construções S.A. e Ministério Público do Estado do Espírito Santo. Outrossim, dou provimento ao recurso do Estado do Espírito Santo para reformar parcialmente a sentença e fixar os honorários sucumbenciais, com base no § 3° do art. 85 do CPC, no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos incisos I a IV do § 3º do art. 85 do CPC, sobre o benefício econômico obtido pelo Estado do Espírito Santo. Em consequência do desprovimento do recurso de Pelicano Construções S.A., majoro os honorários sucumbenciais, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC, em 1% (um por cento) sobre os percentuais mínimos definidos. É como voto. * V O T O O SR. DESEMBARGADOR RAPHAEL AMERICANO CÂMARA (NO EXERCÍCIO DA PRESIDÊNCIA):- Acompanho o voto do Eminente Relator. * V I S T A O SR. DESEMBARGADOR RAPHAEL AMERICANO CÂMARA (NO EXERCÍCIO DA PRESIDÊNCIA):- Em razão da divergência encaminharei os autos ao gabinete de eminente Desembargador Jorge Henrique Valle dos Santos. * tnsr* DATA DA SESSÃO: 25/03/2025 V O T O (PEDIDO DE VISTA) O SR. DESEMBARGADOR JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS:- Eminentes Desembargadores, os autos tratam de outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, e de declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de descumprimento de obrigações contratuais. O pleito deduzido por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A foi julgado improcedente, tendo a sentença, ainda, condenado a parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais fixados equitativamente no valor de R$ 30.000,00, considerando-se o alto valor da causa (R$ 1.960.129,76), sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade. A douta Relatora, Desª. Heloísa Cariello, ao que consta das notas lançadas nestes autos, manteve a sentença tal como proferida “sob o fundamento de que (1) é nulo o contrato de promessa de compra e venda firmado entre Pelicano e a extinta autarquia estadual SUPPIN, ante a violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/79, decorrente da alienação de loteamento não registrado, bem como pela inobservância do art. 37, XXI, da Constituição Federal e art. 17, inciso I, da Lei nº 8.666/93, em razão da ausência de prévia licitação e avaliação do imóvel público alienado; (2) reputa-se necessária a estabilização dos efeitos concretos do negócio jurídico celebrado, com fundamento nos arts. 20 e 21 da LINDB e art. 4º do Decreto nº 9.830/2019, considerando-se, especialmente, as consequências jurídicas, econômicas e sociais desfavoráveis que decorreriam da invalidação plena do negócio, em consonância com o interesse público e o princípio da segurança jurídica; (3) é legítima a aplicação das multas contratuais (moratória e compensatória) em desfavor da Pelicano Construções Ltda., dada a comprovação do inadimplemento das obrigações assumidas contratualmente, não havendo que se falar em supressio, vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), violação à boa-fé objetiva e bis in idem e; (4) que as multas previstas contratualmente são razoáveis, proporcionais e decorrem expressamente da avença celebrada entre as partes, mostrando-se adequadas diante da extensão temporal do inadimplemento apurado nos autos; e (5) que se figura adequada a fixação equitativa dos honorários, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fundamentando-se na razoabilidade e proporcionalidade da condenação, bem como em precedente recente do Supremo Tribunal Federal que flexibilizou entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 1.076”. O Des. Substituto Luiz Guilherme Risso apresentou voto divergente exclusivamente no tocante à temática dos honorários: deu provimento ao recurso do Estado do Espírito Santo para reformar parcialmente a sentença e fixar os honorários sucumbenciais no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos incisos I a IV do § 3º do art. 85 do CPC, sobre o benefício econômico obtido pelo Estado do Espírito Santo, afastando a aplicação do §8º. Alinho-me à divergência, eis que entendo ser subsidiária, restrita e inaplicável à hipótese a dicção do §8º do artigo 85 do CPC, o que vai ao encontro das mais recentes decisões do colendo Superior Tribunal de Justiça (cf.: REsp nº 2.103.715/SP, publicado em 27/2/2025). Sem qualquer delonga, a partir da detida fundamentação apresentada pela eminente Relatora Desª. Heloísa Cariello, voto pelo desprovimento dos recursos de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A e de MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Quanto ao recurso de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, respeitosamente, acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Substituto Luiz Guilherme Risso, eis que dou-lhe provimento para fixar os honorários sucumbenciais à luz do § 3° do artigo 85 do CPC no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos seus incisos, a incidir sobre o benefício econômico obtido, afastando a aplicação do §8º. É como voto. * V O T O O SR. DESEMBARGADOR RAPHAEL AMERICANO CÂMARA:- Sr. Presidente tenho condições de voto até porque a matéria já debatida na Câmara e pedindo todas as vênias a eminente Relatora, acompanho a divergência. * V I S T A O SR. DESEMBARGADOR FÁBIO BRASIL NERY:- Sr. Presidente não tenho condições de votar e respeitosamente, peço vista dos autos. * rpm CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO: 01/04/2025 V O T O (PEDIDO DE VISTA) O SR. DESEMBARGADOR FÁBIO BRASIL NERY:- Acompanho a eminente Desembargadora Heloísa Cariello no sentido de conhecer e negar provimento aos recursos de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A e de MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Quanto ao recurso de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, respeitosamente, acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Substituto Luiz Guilherme Risso, no que pertine a fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais com base no §3º, do art. 85, CPC. É como voto. * 1STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 1967127 RJ 2021/0236261-9, Data de Julgamento: 07/06/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2022 ________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTO VENCEDOR APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 APELANTE: PELICANO CONSTRUÇÕES S.A., MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO E ESTADO DO ESPÍRITO SANTO APELADO: PELICANO CONSTRUÇÕES S.A., MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO E ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. RELATOR: DESEMBARGADORA HELOISA CARIELLO VOTO: DES. SUBST. LUIZ GUILHERME RISSO VOTO Senhor Presidente. Cuida-se de apelações cíveis interpostas por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e ESTADO DO ESPÍRITO SANTO contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registro Público, Meio Ambiente de Serra, que, na ação ordinária ajuizada pela primeira apelante em face do terceiro recorrente, julgou improcedentes os pedidos autorais, consistentes na outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, e na declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de descumprimento de obrigações contratuais. A sentença recorrida ainda condenou a parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais fixados equitativamente no valor de R$ 30.000,00, considerando-se o alto valor da causa (R$ 1.960.129,76), sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade Em sessão pretérita, a Eminente Relatora rejeitou a preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo, bem como rejeitou a arguição de nulidade da sentença por ausência de saneamento e cerceamento de defesa. E no mérito, Sua Excelência negou provimento aos recursos interpostos por Pelicano Construções S/A, Ministério Público do Estado do Espírito Santo e Estado do Espírito Santo, sob o fundamento de que (1) é nulo o contrato de promessa de compra e venda firmado entre Pelicano e a extinta autarquia estadual SUPPIN, ante a violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/79, decorrente da alienação de loteamento não registrado, bem como pela inobservância do art. 37, XXI, da Constituição Federal e art. 17, inciso I, da Lei nº 8.666/93, em razão da ausência de prévia licitação e avaliação do imóvel público alienado; (2) reputa-se necessária a estabilização dos efeitos concretos do negócio jurídico celebrado, com fundamento nos arts. 20 e 21 da LINDB e art. 4º do Decreto nº 9.830/2019, considerando-se, especialmente, as consequências jurídicas, econômicas e sociais desfavoráveis que decorreriam da invalidação plena do negócio, em consonância com o interesse público e o princípio da segurança jurídica; (3) é legítima a aplicação das multas contratuais (moratória e compensatória) em desfavor da Pelicano Construções Ltda., dada a comprovação do inadimplemento das obrigações assumidas contratualmente, não havendo que se falar em supressio, vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), violação à boa-fé objetiva e bis in idem e; (4) que as multas previstas contratualmente são razoáveis, proporcionais e decorrem expressamente da avença celebrada entre as partes, mostrando-se adequadas diante da extensão temporal do inadimplemento apurado nos autos; e (5) que se figura adequada a fixação equitativa dos honorários, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fundamentando-se na razoabilidade e proporcionalidade da condenação, bem como em precedente recente do Supremo Tribunal Federal que flexibilizou entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 1.076. Pedi vista dos autos e trago o meu voto para a continuação do julgamento. Assim como concluiu a eminente relatora, também concluo pela rejeição da preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo, rejeição da arguição de nulidade da sentença por cerceamento do direito de defesa e violação ao contraditório, bem como por negar provimento aos recursos de Pelicano Construções S.A. e Ministério Público do Estado do Espírito santo. De outro lado, respeitosamente divirjo da conclusão alcançada em relação à questão devolvida pelo recurso do Estado do Espírito Santo, circunscrita ao parâmetro de fixação dos honorários sucumbenciais. Sabe-se que no julgamento do Tema 1.076, a Corte Especial do STJ definiu ser inviável a fixação de honorários de sucumbência por apreciação equitativa na hipótese em que o valor da condenação ou o proveito econômico forem elevados. Vale recordar, por sua vez, que no julgamento do REsp 1746072/PR, o STJ consolidou entendimento no sentido de que “os honorários advocatícios só podem ser fixados com base na equidade de forma subsidiária, quando não for possível o arbitramento pela regra geral ou quando inestimável ou irrisório o valor da causa”. Concluiu-se, na oportunidade, que “o §2º do art. 85 do CPC/2015 veicula a regra geral e obrigatória, relegado ao §8º do art. 85 a instituição de regra excepcional, de aplicação subsidiária. Assim, a incidência, pela ordem, de uma das hipóteses do art. 85, §2º, impede que o julgador prossiga com sua análise a fim de investigar eventual enquadramento no §8º do mesmo dispositivo, porque a subsunção da norma ao fato já se terá esgotado”. Anote-se, outrossim, que em 09/08/2023 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário n° 1412069 (TEMA n° 1.255) visando discutir “à luz dos artigos 2º, 3º, I e IV, 5º, caput, XXXIV e XXXV, 37, caput, e 66, § 1º, da Constituição Federal, a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do Código de Processo Civil, em julgamento de recurso especial repetitivo, no sentido de não ser permitida a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa nas hipóteses de os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda serem elevados, mas tão somente quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo (Tema 1.076/STJ)”, sem, no entanto, determinar a suspensão dos processos afetos à questão ou à eficácia do precedente de observância obrigatória estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça. Não obstante a relevante discussão acerca da possibilidade de aplicação do §8º do art. 85 do CPC também aos casos em que o proveito econômico ou o valor da causa forem de grande monta1, tratando-se de precedente de observância obrigatória (CPC, art. 927, inc. V) e considerando que, no caso, a questão relacionada aos honorários advocatícios sucumbenciais não está preclusa, a aplicação da referida tese é medida que se impõe. Por estas razões, rejeito a preliminar de ausência de dialeticidade recursal do recurso inteposto pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo e nego provimento aos recursos de Pelicano Construções S.A. e Ministério Público do Estado do Espírito Santo. Outrossim, dou provimento ao recurso do Estado do Espírito Santo para reformar parcialmente a sentença e fixar os honorários sucumbenciais, com base no § 3° do art. 85 do CPC, no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos incisos I a IV do § 3º do art. 85 do CPC, sobre o benefício econômico obtido pelo Estado do Espírito Santo. Em consequência do desprovimento do recurso de Pelicano Construções S.A., majoro os honorários sucumbenciais, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC, em 1% (um por cento) sobre os percentuais mínimos definidos. É como voto. Des. Subst. Luiz Guilherme Risso 1STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 1967127 RJ 2021/0236261-9, Data de Julgamento: 07/06/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2022 _________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTOS ESCRITOS (EXCETO VOTO VENCEDOR) APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008443-37.2022.8.08.0048 APELANTE: PELICANO CONSTRUCOES S.A., ESTADO DO ESPIRITO SANTO APELADO: ESTADO DO ESPIRITO SANTO, PELICANO CONSTRUCOES S.A RELATORA: DESª. HELOISA CARIELLO VOTO Eminentes Desembargadores, os autos tratam de outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, e de declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de descumprimento de obrigações contratuais. O pleito deduzido por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A foi julgado improcedente, tendo a sentença, ainda, condenado a parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais fixados equitativamente no valor de R$ 30.000,00, considerando-se o alto valor da causa (R$ 1.960.129,76), sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade. A douta Relatora, Desª. Heloísa Cariello, ao que consta das notas lançadas nestes autos, manteve a sentença tal como proferida “sob o fundamento de que (1) é nulo o contrato de promessa de compra e venda firmado entre Pelicano e a extinta autarquia estadual SUPPIN, ante a violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/79, decorrente da alienação de loteamento não registrado, bem como pela inobservância do art. 37, XXI, da Constituição Federal e art. 17, inciso I, da Lei nº 8.666/93, em razão da ausência de prévia licitação e avaliação do imóvel público alienado; (2) reputa-se necessária a estabilização dos efeitos concretos do negócio jurídico celebrado, com fundamento nos arts. 20 e 21 da LINDB e art. 4º do Decreto nº 9.830/2019, considerando-se, especialmente, as consequências jurídicas, econômicas e sociais desfavoráveis que decorreriam da invalidação plena do negócio, em consonância com o interesse público e o princípio da segurança jurídica; (3) é legítima a aplicação das multas contratuais (moratória e compensatória) em desfavor da Pelicano Construções Ltda., dada a comprovação do inadimplemento das obrigações assumidas contratualmente, não havendo que se falar em supressio, vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), violação à boa-fé objetiva e bis in idem e; (4) que as multas previstas contratualmente são razoáveis, proporcionais e decorrem expressamente da avença celebrada entre as partes, mostrando-se adequadas diante da extensão temporal do inadimplemento apurado nos autos; e (5) que se figura adequada a fixação equitativa dos honorários, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fundamentando-se na razoabilidade e proporcionalidade da condenação, bem como em precedente recente do Supremo Tribunal Federal que flexibilizou entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 1.076”. O Des. Substituto Luiz Guilherme Risso apresentou voto divergente exclusivamente no tocante à temática dos honorários: deu provimento ao recurso do Estado do Espírito Santo para reformar parcialmente a sentença e fixar os honorários sucumbenciais no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos incisos I a IV do § 3º do art. 85 do CPC, sobre o benefício econômico obtido pelo Estado do Espírito Santo, afastando a aplicação do §8º. Alinho-me à divergência, eis que entendo ser subsidiária, restrita e inaplicável à hipótese a dicção do §8º do artigo 85 do CPC, o que vai ao encontro das mais recentes decisões do colendo Superior Tribunal de Justiça (cf.: REsp nº 2.103.715/SP, publicado em 27/2/2025). Sem qualquer delonga, a partir da detida fundamentação apresentada pela eminente Relatora Desª. Heloísa Cariello, voto pelo desprovimento dos recursos de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A e de MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Quanto ao recurso de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, respeitosamente, acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Substituto Luiz Guilherme Risso, eis que dou-lhe provimento para fixar os honorários sucumbenciais à luz do § 3° do artigo 85 do CPC no percentual mínimo de cada uma das faixas de escalonamento previstas nos seus incisos, a incidir sobre o benefício econômico obtido, afastando a aplicação do §8º. É como voto. DES. JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS V O T O Consoante relatado, insurgem-se os três recorrentes (i. PELICANO CONSTRUÇÕES S/A; ii. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e iii. ESTADO DO ESPÍRITO SANTO) em face da r. sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registro Público, Meio Ambiente de Serra, que, nos autos de ação ordinária ajuizada pela primeira apelante em face do terceiro recorrente, julgou improcedentes os pedidos autorais, consistentes (i) na outorga de escritura pública de compra e venda do Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, Serra/ES, adquirido da extinta autarquia estadual SUPPIN (Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial); (ii) na declaração de inexigibilidade das multas impostas a título de inadimplemento contratual, sob o fundamento de não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel (30%) e atraso no início/conclusão das obras, conforme cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato; ou, subsidiariamente, na declaração de inacumulabilidade das multas ou à sua redução equitativa até o valor da obrigação principal. Ao fim, a parte autora, ora primeira apelante, restou condenada ao pagamento de verba honorária sucumbencial no valor de R$ 30.000,00, fixada equitativamente, sob pena de violação ao princípio da proporcionalidade, diante do alto valor da causa (R$ 1.960.129,76). Pois bem. Os recursos serão julgados em conjunto, diante do entrelaçamento das matérias devolvidas a esta instância recursal, principiando-se, em sede preliminar, pela alegação de ausência de dialeticidade do recurso interposto por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. PRELIMINAR - FALTA DE DIALETICIDADE DA APELAÇÃO INTERPOSTA POR MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO Inicialmente, PELICANO CONSTRUÇÕES S/A suscita, em contrarrazões, a ausência de dialeticidade do recurso aviado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, sob o fundamento de que as razões recursais não atacaram de forma específica os fundamentos da r. sentença, limitando-se a reprisar os argumentos tecidos em manifestações anteriores nos autos. Em que pese o esforço argumentativo, das razões recursais é possível depreender com clareza e precisão o pedido de reforma da sentença e os fundamentos para tanto, de modo que, ainda que haja repetição de trechos de petições anteriores, o recurso dialoga com o decisum vergastado. Com efeito, o Ministério Público Estadual deduz pedido de reforma integral da sentença, a fim de que se reconheça a nulidade do negócio jurídico e se rejeite o consequencialismo jurídico invocado pelo Juízo a quo, impugnando especificamente as razões de decidir lançadas, observando-se, portanto, o disposto nos arts. 1.010 e 1.013, § 1º, do CPC, não havendo que se falar em ausência de dialeticidade recursal. Em casos tais, a jurisprudência deste Sodalício não hesita em reconhecer a existência de diálogo entre as razões recursais e a r. sentença objurgada, como ilustram os seguintes arestos: APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. REJEITADA A PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO À DIALETICIDADE RECURSAL. MÉRITO. FRAUDE BANCÁRIA. DANOS MORAIS “IN RE IPSA”. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.1. Preliminar de violação à dialeticidade recursal arguida em contrarrazões rejeitada - Se as razões que justificam o pedido de reforma da sentença são aptos a impugnar os fundamentos da decisão recorrida e justificam o pedido de reforma, não há violação ao princípio da dialeticidade, nem irregularidade formal do recurso. (...) (TJES, Apelação 5000198-36.2022.8.08.0016, Rel. Des. RAPHAEL AMERICANO CÂMARA, Segunda Câmara Cível, DJe 04/07/2023). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES. REJEITADA. MÉRITO RECURSAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO. INADIMPLEMENTOS. VALORES DEVIDOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Preliminar Suscitada em Contrarrazões. A repetição de argumentos já formulados na exordial ou na contestação não caracteriza, por si só, óbice para o conhecimento do recurso, tampouco ofensa ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada. (…) (TJES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Número: 0015266-20.2019.8.08.0048, Magistrado: ROBSON LUIZ ALBANEZ, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Data: 01/11/2023) Do exposto, REJEITO a preliminar suscitada. MÉRITO No mérito, incumbe examinar, primeiramente, se, conforme alega a apelante PELICANO CONSTRUÇÕES LTDA, a r. sentença padeceria de nulidade, por violação aos princípios da não surpresa, do contraditório e do devido processo legal, uma vez que o feito fora julgado antecipadamente sem oportunizar a produção de provas, especialmente as de natureza oral. A irresignação recursal, todavia, não merece guarida, na medida em que a ausência de saneamento do feito, per si, não implica cerceamento de defesa e violação ao contraditório, o que se verificará apenas quando o órgão jurisdicional efetive o julgamento antecipado da lide sem observar o regime legal insculpido no art. 355 do CPC, que prevê, in verbis: Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349 . Como se infere da própria dicção legal do art. 357 do CPC, o saneamento e a organização do feito somente tem lugar quando inocorrer quaisquer das hipóteses previstas nos dispositivos anteriores - dentre as quais o julgamento antecipado -, in litteris: Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo: In casu, verifico que o julgamento antecipado se amolda precisamente à hipótese legal do art. 355, I, do CPC, na medida em que - conforme bem fundamentado pelo Juízo a quo, na sentença vergastada - a questão meritória é predominantemente de direito, afeta ao exame da origem da relação jurídica estabelecida entre as partes e às nuances contratuais que se desenvolveram quanto ao (in)adimplemento contratual, sendo a farta prova documental produzida suficiente ao deslinde da controvérsia. Em casos tais, a jurisprudência do c. STJ rechaça o alegado cerceamento de defesa, verbis: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO REGRESSIVA. FALHA NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INCÊNDIO EM IMÓVEL SEGURADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. NO CASO, FOI OPORTUNIZADA A DILAÇÃO PROBATÓRIA E HOUVE PEDIDO EXPRESSO DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. REVISÃO. NÃO CABIMENTO. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE SANEAMENTO, POR SI SÓ, NÃO IMPLICA NULIDADE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO IMPROVIDO. (...) 2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não é nula a sentença proferida em julgamento antecipado, sem prolação de despacho saneador, desde que estejam presentes nos autos elementos necessários e suficientes à solução da lide. (...) (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.490.098/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA AUTORA. (...) 4. Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o Tribunal de origem entender adequadamente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção probatória, por se tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado documentalmente. (...) (AgInt no AREsp n. 1.675.648/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 28/9/2020, DJe de 1/10/2020) O mesmo entendimento ecoa neste Sodalício, como ilustra o seguinte aresto proveniente desta c. 2ª Câmara Cível, in verbis: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. VEÍCULO. PROCEDÊNCIA. RECONVENÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não configura o cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide sem a produção de provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado valorar as provas com base na formação do seu convencimento. 2. O julgamento antecipado guarda observância aos princípios da celeridade e economia processual, abreviando a marcha processual por se cuidar de questão de direito e de fato que não necessita da produção de outras provas. 3. No caso concreto, a prova documental anexada aos autos é suficiente para o reconhecimento do direito da recorrida à busca e apreensão do veículo e improcedência do pedido reconvencional da recorrente. 4. Recurso desprovido. (Data: 18/May/2024, Órgão julgador: 2ª Câmara Cível, Número: 0000852-64.2020.8.08.0021, Magistrado: SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, Classe: APELAÇÃO CÍVEL) Assim, não viceja o argumento de nulidade da r. sentença, tendo o Juízo a quo conferido legítima e adequada operabilidade ao disposto no art. 355, I e, ainda, dos arts. 370 e 371, todos do CPC, à luz do princípio do convencimento motivado. Em evolução, a fim de verificar a ocorrência dos errores in judicando alegados pelas partes e pelo Parquet, considero útil contextualizar que o feito tem por pano de fundo fático-jurídico uma cadeia de alienações e transferências do imóvel “Lote 12, Quadra VII, do CIVIT II, em Serra/ES” por parte da extinta autarquia estadual SUPPIN (Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial), que culminou, ao fim, já no ano de 2004, na formalização de promessa de compra e venda com a ora apelante PELICANO CONSTRUÇÕES LTDA. E é justamente a outorga de escritura pública definitiva de compra e venda do referido imóvel que constitui o objeto da demanda, ao passo que o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO sustenta a nulidade do negócio jurídico de compra e venda firmado, em razão de (i) ofensa ao art. 37 da Lei nº 6.766/76, porquanto prometeu-se a venda e compra de parcela de loteamento não registrado, e (ii) violação ao disposto no art. 37, XXI, CF/88 e no art. 17, I, da Lei nº 8.666/93, uma vez que a alienação do imóvel público se deu sem avaliação e o devido processo licitatório. Quanto a este capítulo decisório, após exame acurado o caderno processual, concluo que a r. sentença vergastada não merece qualquer retoque, na medida em que, efetivamente, se depreende que o negócio jurídico de promessa de compra e venda firmado entre a apelante PELICANO e a SUPPIN compõe uma cadeia sucessiva de contratos nulos, por violação ao art. 37 da Lei nº 6.766/76, que veda a compra e venda de loteamento ou desmembramento não registrado - como bem elucidado pelo Juízo a quo. Vale conferir, in litteris: A presente demanda cinge-se à análise do contrato de promessa de compra e venda do lote nº 12, da quadra VII, Setor II, do Loteamento Empresarial CIVIT, situado em Carapina, no Município de Serra-ES, celebrado em 17 de março de 2004 entre a extinta autarquia estadual SUPPIN (promitente vendedora) e a autora (promitente compradora) e eventual descumprimento de obrigação contratual por parte desta a ensejar a incidência de cláusula penal, impedindo, com isso, a outorga da escritura definitiva de compra e venda. Consta nos autos que, no bojo do procedimento administrativo nº 39083/1983, posteriormente renumerado para os n.ºs 071/04 e 44725086/09, foi celebrada inicialmente uma promessa de compra e venda entre a SUPPIN (promitente vendedora) e a empresa SEMERC - SERVIÇOS MECÂNICOS LTDA (promitente compradora) referente a um imóvel de 18.000 m² (dezoito mil metros quadrados) , situado no loteamento denominado CIVIT, Setor II, datado de 24 de outubro de 1979. Posteriormente, a promitente compradora mencionada no parágrafo imediatamente acima manifestou expressa desistência da promessa de compra e venda em 27.03.1984, sendo então feita a rescisão amigável do negócio jurídico entre as contratantes. Adiante, em 7 de maio de 1984, a SUPPIN celebrou por escritura pública uma nova promessa de compra e venda versando sobre o mesmo bem citado acima com a OXIGÊNIO DO BRASIL S/A. Em razão da inércia da OXIGÊNIO DO BRASIL S/A em recolher os emolumentos para registro do imóvel, nos autos da Ação Ordinária nº 048.010.042.520, foi formalizado acordo pelo qual a ARLÍQUIDO COMERCIAL LTDA (nova denominação da OXIGÊNIO DO BRASIL S/A) autorizava a alienação do bem imóvel para a empresa, ora demandada. Com isso, em 17 de março de 2004, foi formalizada a promessa de compra e venda, objeto destes autos, entre a SUPPIN e a Pelicano Construções e Incorporações Ltda. (...) De acordo com a informação prestada pela oficiala do Cartório do 1º Ofício da 2ª Zona de Serra às fls. 527-544 dos autos do processo em apenso (0029560-14.2018.8.08.0048), o Loteamento CIVIT II, encontra-se registrado naquela serventia desde 24 de junho de 1986, na matrícula n.º 7.563, Livro 2, n.º 2 de ordem, fls. 3-verso, constando na matrícula que o loteamento se deu em conformidade com o Decreto-lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979. Denota-se, assim, que o negócio jurídico originário firmado entre SUPPIN e SEMERC, em 24.10.1979, é anterior ao registro do loteamento, que se deu em 1986. Da mesma forma, o negócio jurídico formalizado entre SUPPIN e ARLÍQUIDO COMERCIAL LTDA (OXIGÊNIO DO BRASIL S/A). Com isso, patente a nulidade de tais avenças, por inobservância ao disposto no artigo 37, da Lei nº 6.766, de 19.12.1979. Sendo nulos os negócios jurídicos originários, por consectário lógico, mostra-se igualmente nula a promessa de compra e venda delas derivadas, objeto dos presentes autos. Não bastasse isso, verificando-se que a promessa de compra e venda se efetivou independente de deflagração de licitação, porquanto celebrada em acordo judicial formalizado entre a pessoa jurídica Oxigênio do Brasil S/A e a SUPPIN, violou-se também o disposto no art. 37, XXI, da CF e no art. 17, I, da Lei nº 8.666/93, que dispõem, in verbis: Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: Ato contínuo, considero que tampouco merece censura o decisum ao reconhecer que as consequências da declaração de nulidade do negócio jurídico necessitam ser temperadas - impondo-se, nesse sentir, o desprovimento do recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e, uma vez mais, a manutenção da r. sentença vergastada. É que, conquanto seja cediço que a declaração de nulidade dos negócios jurídicos imponha, em regra, a restituição das partes ao status quo ante, verifico que a nulificação traria imensuráveis prejuízos não apenas à pessoa jurídica PELICANO, que está completamente instalada há mais de 1 década no local, mas também ao interesse público primário, uma vez que a recorrente é importante fonte de desenvolvimento econômico e social para a região, gerando empregos e renda, além de arrecadação tributária. Não apenas a PELICANO, mas também o ESTADO DO ESPIRITO SANTO, aliás, manifestaram-se expressamente neste sentido, pugnando pela estabilização dos efeitos do negócio jurídico (ids. 6631177 e id. 6631174), trazendo aos autos relevantes e substanciosas considerações a respeito dos impactos advindos de eventual retorno das partes ao estado anterior. Assentou o Estado do Espírito Santo o seguinte, in litteris (id. 6631177): “(...) não obstante, em tese, sejam nulas as alienações de imóveis feitas pela SUPPIN sem prévia licitação, nas hipóteses em que o desfazimento do negócio jurídico se mostrar mais gravoso ao interesse público, será admitida a estabilização de seus efeitos. Pois bem. O caso em comento se amolda perfeitamente nessa situação excepcional, na qual o desfazimento do negócio jurídico em testilha representará um prejuízo significativamente maior do que a estabilização dos efeitos da promessa de compra e venda que ora se analisa. Isso porque o CIVIT II se trata de um dos mais antigos e mais importantes polos industriais da Serra, e os estabelecimentos lá instalados têm grande relevância social e econômica, haja vista seu impacto na geração de empregos, no desenvolvimento e na arrecadação de receitas pelo Poder Público (...) Ademais, a empresa autora, apesar de estar em dívida perante o Estado do Espírito Santo, encontra-se devidamente instalada e em funcionamento no local, conforme se nota de imagem retirada do programa Google Street View. Com isso em vista, importa consignar que a declaração de nulidade do contrato entre as partes ensejará a restituição ao status quo ante, o que pressuporia, necessariamente, a devolução do lote livre e desimpedido pela autora ao Estado. Isso quer dizer que caberia àquela promover a demolição de todas as construções e estruturas erguidas no terreno, cuja posse retornaria ao Poder Público Estadual, e o que poderia prejudicar significativamente o funcionamento da empresa”. Assim, sem prejuízo das válidas considerações a respeito do consequencialismo jurídico invocadas pelo Parquet, tenho que a r. sentença encontra amparo no disposto nos arts. 20 e 21 da LINDB, bem como no art. 4º do Decreto regulamentador da LINDB (Decreto nº 9.830/2019), que dispõem: LINDB Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos. DECRETO Nº 9.830/2019 Art. 4º A decisão que decretar invalidação de atos, contratos, ajustes, processos ou normas administrativos observará o disposto no art. 2º e indicará, de modo expresso, as suas consequências jurídicas e administrativas. (...) § 3º Quando cabível, a decisão a que se refere o caput indicará, na modulação de seus efeitos, as condições para que a regularização ocorra de forma proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais. § 4º Na declaração de invalidade de atos, contratos, ajustes, processos ou normas administrativos, o decisor poderá, consideradas as consequências jurídicas e administrativas da decisão para a administração pública e para o administrado: I - restringir os efeitos da declaração; ou II - decidir que sua eficácia se iniciará em momento posteriormente definido. A jurisprudência deste Sodalício já caminhou, diante de caso similar, nessa mesma linha de entendimento, confira-se: APELAÇÃO CÍVEL - NULIDADE DA SENTENÇA - QUESTÃO NÃO FOMENTADA PELAS PARTES - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - ANÁLISE DE OFÍCIO - POSSIBILIDADE - ADMINISTRATIVO - COMPRA DE BEM PROVENIENTE DA SUPPIN - AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO - NULIDADE ABSOLUTA - PRECEITOS ESTABELECIDOS PELO ART. 17 DA LEI 8.666⁄93 - PONDERAÇÃO DOS EFEITOS DA NULIDADE - ESTABILIZAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO - IRREVERSIBILIDADE FÁTICA - EXTERNALIDADES A SEREM CONSIDERADAS - SEGURANÇA JURÍDICA - PRINCÍPIO DA BOA-FÉ - COMPROVADO NOS AUTOS - RESPEITO A INTERPRETAÇÃO TÓPICA DA QUESTÃO - MANUTENÇÃO DO BEM NA POSSE DO COMPRADOR - INTERESSE PÚBLICO PREPONDERANTE (...) 1) A atual leitura dos dispositivos legais deve ser empreendida à luz de princípios constitucionais, no sentido de se efetivar o emprego da norma com o desiderato pretendido pelo legislador. 2) A venda de bem imóvel por autarquia está condicionada ao respeito dos preceitos estabelecidos no 17 da lei 8.666⁄93, devendo ser precedida de autorização legislativa, interesse público devidamente justificado, avaliação prévia e licitação. 3) Havendo sido violado o dispositivo legal, art. 17 da lei 8.666⁄93, é de se reconhecer a nulidade quanto ao ato de alienação do bem imóvel. 4) A estabilização dos efeitos do ato administrativo deve ser reconhecida quando as externalidades, os efeitos concretos derivados do reconhecimento da nulidade, impuserem danos maiores a administração, no que se observa o respeito ao interesse público. 5) A segurança jurídica deriva de toda análise do conjunto probatório encontrado nos autos, eis que a autarquia fomentou o processo de alienação e até a prolação da sentença, olvidou informar ao administrado que o procedimento estabelecido estava em desconformidade com a lei. 6) A proteção da confiança representa a observância das expectativas de comportamentos pelas instâncias estatais, independentemente de se tratar do legislador, do executivo ou do judiciário (Gilmar Mendes, informativo do STF, 625). (...) (TJES, Classe: Apelação, 048100265031, Relator Designado: WALACE PANDOLPHO KIFFER, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL , Data de Julgamento: 15/12/2014, Data da Publicação no Diário: 30/01/2015) Ato contínuo, irresigna-se a apelante PELICANO em relação às multas contratuais que lhe foram impostas sob o fundamento de inadimplemento contratual, por não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel (30%) e atraso no início/conclusão das obras, nos termos das cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato. Alega, para tanto, que (i) a SUPPIN tinha pleno conhecimento e jamais questionou a necessidade de prorrogação de prazo para conclusão das obras em virtude das dificuldades impostas pelo poder público municipal na aprovação do projeto do empreendimento, tendo havido anuência tácita com as prorrogações, diante da inércia ao longo do tempo, atraindo a aplicação da supressio e do nemo potest venire contra factum proprium; (ii) não é possível imputar descumprimento contratual à apelante se esta dependia da concessão de licenças pela municipalidade para construção, sob pena de recair em clandestinidade e violar as normas municipais; (iii) sob pena de bis in idem, um mesmo fato gerador (o suposto inadimplemento contratual) não pode ensejar a cobrança de duas penalidades pecuniárias, a saber, multa compensatória de 30% do valor atualizado do contrato e multa moratória de 0,1%, por dia de atraso, sobre o valor atualizado do imóvel; (iv) em que pese o contrato discutido nos autos ter sido firmado com a Administração Pública, deve-se aplicar, por analogia, o disposto no art. 412 do CC, segundo o qual “o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal”. Em que pese o esforço argumentativo da apelante, dos autos se depreende que as multas contratuais impostas encontram lastro nas cláusulas 2ª, alínea “a”, 7ª e 16ª do contrato de promessa de compra e venda, que dispõem: CLÁUSULA SEGUNDA O preço do lote, calculado com base na taxa de ocupação de 30% (trinta por cento), localização e declividade da área do terreno, objeto deste CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA, é de R$ 356.400,00 (trezentos e cinquenta e seis mile quatrocentos reais). Sendo que o valor acima referido será pago pela COMPRADORA à empresa ARLIQUIDO COMERCIAL LTDA (atual denominação da empresa OXIGÊNIO DO BRASIL S/A), tendo em vista ACORDO JUDICIAL realizado pela VENDEDORA constante do Processo N° 5154/01 (048.010.042.520) Vara das Fazendas Públicas Estadual, Municipal e dos Registros Públicos da Serra/ES. a) Caso a COMPRADORA não venha a atingir o coeficiente de ocupação de 30% da área adquirida, no prazo de 26(vinte seis) meses contados da data de assinatura deste CONTRATO, e ainda, nas condições dispostas nas Normas de Vendas de Terrenos da Suppin, a VENDEDORA não emitirá a Escritura Definitiva da área, ficando a COMPRADORA devedora à VENDEDORA do valor equivalente a multa contratual no percentual de 30% do valor do presente CONTRATO, e ainda, constituirá motivo justo e acordado entre as partes para a realização da Rescisão deste contrato, com retorno da área adquirida à VENDEDORA. CLÁUSULA SÉTIMA O não cumprimento dos prazos estabelecidos na cláusula anterior para inicio e conclusão das obras facultará à VENDEDORA a considerar rescindido o presente Instrumento, sem prejuízo das demais penalidades. CLÁUSULA DÉCIMA SEXTA O descumprimento de quaisquer das obrigações e/ou condições estabelecidas nas cláusulas 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª, 12.ª, e 14.ª, sujeitará a COMPRADORA à multa diária equivalente a 0,1% (um décimo por cento), calculado sobre o valor atualizado da área negociada, devida desde a data em que se tornar inadimplente a COMPRADORA, sem prejuízo da VENDEDORA poder exigir o cumprimento das obrigações ou condições, ou rescindir o presente instrumento, excetuando-se os casos de aplicação das cláusulas 3.ª, 4.ª e 13ª. O inadimplemento contratual, por sua vez, é inferido da farta prova documental, conforme detalhada linha do tempo traçada na r. sentença vergastada, valendo sua reprodução, ipsis litteris: “O projeto apresentado pela autora foi aprovado pela autarquia em 4 de outubro de 2004 (fl. 85), contudo, nas fiscalizações realizadas pela SUPPIN, observa-se que até 27 de março de 2006 a autora sequer havia iniciado as obras (ID 13629920 – fl. 17). Em 5.5.2006, a demandante protocolizou requerimento de prorrogação do prazo previsto na cláusula segunda (ID 13629220 – fls. 31/33) junto à SUPPIN sob o fundamento de ter encontrado entraves para aprovação do projeto arquitetônico na Prefeitura Municipal de Serra, o que ensejou a lavratura do Termo Aditivo, firmado em 18 de junho de 2006, prorrogando o prazo para a conclusão das obras até o dia 30 de maio de 2007 (ID 13629220 – fls. 21-26) . Fato é que a autora somente deu início às obras em 14 de julho de 2006, posteriormente ao aditivo, vindo a concluir as obras apenas em janeiro de 2012 (ID 13629231 – fl. 12). Nos anos de 2006 e 2007, a SUPPIN realizou diversas diligências no imóvel para verificar o andamento da obra, sendo constatada em diversas ocasiões a paralisação da construção, e, em vistoria realizada no dia de vencimento do prazo (31.05.2007), foi atestada a não conclusão das obras (ID 13629220 – fls. 29), constatando-se a inadimplência da empresa. Diante disso, a autora postulou nova prorrogação do prazo, prevista na alínea “a” da cláusula segunda do contrato pelo período de vinte e quatro (24) meses a contar de 30 de maio de 2007. Registro, no entanto, que o novo pedido de prorrogação foi protocolado em 8 de outubro de 2007 (ID 13629220 – fls. 31-34 ), momento em que a demandante já encontrava-se inadimplente, tendo em vista o decurso de quase 5 (cinco) meses do término do prazo previsto no aditivo (30.5.2007). Portanto, o pedido de prorrogação foi protocolado quando já havia expirado o prazo estabelecido no Aditivo contratual. Em razão de tal pleito, a autora foi notificada em duas oportunidades (ID 13629226 – em 09/08 e em 11/08) para justificar os alegados entraves burocráticos na Administração Pública Municipal que a estariam impedindo de concluir a obra na data aprazada. A resposta a tais notificações somente foi prestada em 14 de novembro de 2008 (ID 13629226 – fls.09-10). Em face da insuficiência dos documentos apresentados, em 26 de janeiro de 2009, novos ofícios foram encaminhados à autora, solicitando que comprovasse a aprovação do projeto arquitetônico perante a Prefeitura Municipal de Serra (ID 13629226 – fl. 24). A autora foi devidamente notificada, nos anos de 2008 e 2009, para comprovação dos fatos alegados no pedido de prorrogação de prazo. A prorrogação do prazo, por meio de novo Aditivo Contratual, restou prejudicada justamente porque a demandante não comprovou os entraves burocráticos alegados. Às fls. 4, do documento ID 13629231, consta a informação de que em vistoria realizada pela SUPPIN no imóvel, em 24 de maio de 2010, a empresa havia atingido o coeficiente de ocupação do imóvel de apenas 8,45% (oito vírgula quarenta e cinco por cento). Portanto, 3 (três) anos após vencido o prazo contratual (31.05.2007), a taxa de ocupação mínima não havia sido cumprida pela empresa. Ainda em 03.09.2010, um dos sócios da autora, em reunião com a Comissão de Vistoria da SUPPIN, foi notificado quanto à urgência para regularizar a sua inadimplência contratual (ID 13629231 – fl. 11). Em resposta, a requerente encaminhou à autarquia o ofício de fls. 14 – ID 13629231 , em 6 de setembro de 2010, no qual comunicou a necessidade de aquisição de novo lote (n.º 14) para atingir o coeficiente de ocupação de 30% (trinta por cento) estabelecido no contrato, apresentando projeto arquitetônico aprovado pela Prefeitura da Serra. Portanto, verifica-se que no período de 2006 a 2010, a autora não cumpriu a sua obrigação contratual relativa ao atingimento da taxa de ocupação de 30% (trinta por cento) da área do terreno, vencida em 30.05.2007, o que somente foi viabilizado, conforme informado pela própria requerente, após a aquisição do imóvel contíguo (Lote 14), sendo as obras finalmente concluídas no ano de 2012.” Não há que se falar, ademais, em surrectio/supressio ou venire contra factum proprium, na medida em que a SUPPIN, de forma próxima e reiterada, desabonava o descumprimento dos prazos contratuais, não se inferindo comportamento contrário à boa-fé objetiva ou frustração de legítima expectativa da parte apelante ao impor a penalidade contratual expressamente pactuada. Na mesma esteira, o condicionamento da outorga da escritura pública definitiva ao adimplemento da multa contratual também encontra lastro contratual expresso, conforme cláusula 2ª, alínea “a”, in verbis: “a) Caso a COMPRADORA não venha a atingir o coeficiente de ocupação de 30% da área adquirida, no prazo de 26(vinte seis) meses contados da data de assinatura deste CONTRATO, e ainda, nas condições dispostas nas Normas de Vendas de Terrenos da Suppin, a VENDEDORA não emitirá a Escritura Definitiva da área, ficando a COMPRADORA devedora à VENDEDORA do valor equivalente a multa contratual no percentual de 30% do valor do presente CONTRATO, e ainda, constituirá motivo justo e acordado entre as partes para a realização da Rescisão deste contrato, com retorno da área adquirida à VENDEDORA.” Quanto à suposta inacumulabilidade das multas moratória e compensatória previstas no contrato, a irresignação recursal esbarra no sedimentado entendimento de que “é possível a cumulação de multa moratória com cláusula penal compensatória, desde que ambas estejam previstas no contrato e incidam sobre fatos geradores distintos” (TJES, APELAÇÃO CÍVEL número 0024092-40.2016.8.08.0048, Rel. Des. ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA, 4ª Câmara Cível, Data: 18/Aug/2023). In casu, as multas previstas na cláusula 2ª, alínea “a” e na cláusula 16ª, além de expressas, têm fatos geradores distintos: a primeira, o não atingimento do coeficiente mínimo de 30% de ocupação da área adquirida; a segunda, o atraso no início/conclusão das obras. Neste ponto, aliás, registro que o início das obras ocorreu apenas em julho de 2006, após o transcurso do prazo de 180 dias da assinatura do contrato (em 17 de março de 2004), atraindo a aplicação das cláusulas 6ª, 7ª e 16ª. Do mesmo modo, o prazo final de conclusão das obras - postergado, mediante aditivo contratual, para 30/05/2007 - não restou observado, vez que, como supramencionado, as obras findaram no ano de 2012, a legitimar a aplicação das cláusulas 7ª e 16ª do contrato. Tampouco merece guarida a pretensão de redução equitativa das multas, na medida em que expressam precisa e exatamente o quanto pactuado pelas partes (cláusulas 2ª, 7ª e 16ª), não se mostrando desproporcional a alíquota percentual de 30% por não atingimento do coeficiente mínimo de ocupação do imóvel, nem tampouco a multa moratória, quando comparada à extensa mora incorrida pela apelante PELICANO, que se protraiu por quase 5 anos, até que ao imóvel se tenha dado a destinação adequada. Assim, embora a jurisprudência do c. STJ e deste eg. TJES tenha ampliado a redoma de exame jurisdicional dos atos administrativos para além da legalidade estrita - à luz dos princípios da juridicidade, razoabilidade e proporcionalidade -, fato é que, no caso em tela, não verifico a desproporcionalidade e a irrazoabilidade das penalidades contratuais impostas, ante a significativa extensão da mora e os consequentes impactos em âmbito micro (relação jurídica interpartes) e macro (fomento da atividade industrial e econômica da região) do inadimplemento no empreendimento de polarização industrial subjacente. A jurisprudência pátria, em casos tais, encampa a legitimidade das penalidades contratualmente previstas, mutatis mutandis: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA. DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO. Processo administrativo levado a efeito pela ARTESP, com imposição de multa à Concessionária de serviço público em virtude de não realização de serviços de corte e remoção de árvores e arbustos. MÉRITO. Dever de manutenção da rodovia não observado pela concessionária. Descumprimento de contrato administrativo caracterizado. Inexistência de má-fé pela agência reguladora. Cumprimento da obrigação contratual, que envolve a execução de serviço previsível e rotineiro, que é exigível da concessionária sem qualquer tipo de condicionamento. Concessionária que não se desincumbiu de comprovar, conforme lhe incumbia (art. 373, I, CPC), a existência de eventuais causas excludentes de responsabilidade, consoante disposto no edital. Procedimento administrativo que garantiu o direito de ampla defesa e contraditório (art. 5º, LIV e LV, da CF). Presunção de veracidade, legalidade e legitimidade do ato administrativo não elididos pela parte autora. Poder Judiciário que não pode rever o mérito da decisão administrativa. Multa fixada com expressa previsão no edital e no contrato, e que era de prévia ciência da Concessionária. Aplicação de penalidade realizada nos termos do contrato e do edital, observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Manutenção da r. sentença que julgou o pedido improcedente. VERBA HONORÁRIA. Majoração em grau recursal. Art. 85, §11, do CPC/2015. Observação neste sentido. RECURSO DESPROVIDO, com observação. (TJSP; Apelação Cível 1082099-45.2023.8.26.0053; Relator (a): Flora Maria Nesi Tossi Silva; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 5ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 03/10/2024; Data de Registro: 03/10/2024) AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO – MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO – REPINTURA OU REAPLICAÇÃO DE SINALIZAÇÃO HORIZONTAL - Pretensão objetivando a declaração de nulidade do ato administrativo que aplicou a sanção por inadimplemento contratual, pela não repintura e reaplicação da sinalização horizontal em trechos da Rodovia SP-270, nos prazos e termos estabelecidos – Alegação de apuração irregular de não-conformidade contratual tendo em vista a não utilização de equipamento adequado para aferir o índice de retrorrefletância das sinalizações que deram ensejo à penalidade – Sentença de improcedência mantida – Constatação pela ARTESP de sinalização horizontal em desacordo com os padrões estabelecidos no Edital da Concessão, pois estava desgastada em vários locais na rodovia SP-270 – Conjunto probatório que permite entrever a ausência de pintura nos trechos apontados, a desbordar na irrelevância da utilização de equipamento específico para apuração da retrorrefletância – Medições de retrorrefletância que competem, outrossim, à concessionária, nos termos do edital – Multa arbitrada com razoabilidade e proporcionalidade, com espeque em cláusula contratual, com a finalidade de preservação da segurança dos usuários - Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1046611-63.2022.8.26.0053; Relator (a): Bandeira Lins; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 10ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 09/12/2024; Data de Registro: 09/12/2024) DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO ADMINISTRATIVO. RESCISÃO UNILATERAL. ALEGADA COISA JULGADA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME. 1. Apelação interposta contra a sentença da Vara Única da Comarca de Miradouro, que, nos autos de ação ordinária movida pelo Município de Miradouro, julgou procedente o pedido inicial, rescindindo o contrato administrativo nº 033/2014 e condenando a ré ao pagamento de perdas e danos no valor de R$ 29.825,06, além da multa contratual de R$ 12.521,89. A ré alega a ocorrência de coisa julgada e defende a regular execução do contrato. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se há coisa julgada em razão de ação anterior envolvendo as partes; (ii) estabelecer se a rescisão unilateral do contrato e a condenação da ré por descumprimento contratual são legítimas. III. RAZÕES DE DECIDIR. 3. A coisa julgada não se configura, pois a ação anterior discutia a retirada de estrutura metálica defeituosa, sem abordar o descumprimento do contrato de nº 033/2014, objeto da presente ação. 4. O artigo 58, II, da Lei 8.666/1993 confere à Administração Pública a prerrogativa de rescindir unilateralmente contratos administrativos, quando há inexecução por parte do contratado. 5. Constatou-se a inexecução do contrato pela ré, que abandonou a obra e deixou de corrigir irregularidades apontadas pelo Município, como falhas estruturais na construção da quadra poliesportiva. 6. O Poder Judiciário, ao analisar atos administrativos, deve se ater à legalidade, não cabendo adentrar no mérito administrativo, o que foi respeitado na decisão de rescisão do contrato. 7. A rescisão contratual e a aplicação de penalidades encontram respaldo nos termos da Lei 8.666/1993 e nas cláusulas do contrato celebrado, que preveem tais medidas em caso de descumprimento contratual. IV. DISPOSITIVO E TESE. 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A coisa julgada não se verifica quando as ações envolvem causas de pedir diversas, ainda que entre as mesmas partes. 2. A Administração Pública pode rescindir unilateralmente contrato administrativo por inexecução contratual, nos termos da Lei 8.666/1993. 3. A rescisão contratual e a aplicação de penalidades administrativas são válidas quando comprovado o descumprimento contratual por parte da empresa contratada. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 337, VII, §§1º e 4º; Lei 8.666/1993, arts. 58, I, II, 78 e 79. Jurisprudência relevante citada: TJMG, Agravo de Instrumento-Cv nº 1.0000.24.208565-2/001, Rel. Des. Manoel dos Reis Morais, 1ª Câmara Cível, j. 09/07/2024. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.205133-2/001, Relator(a): Des.(a) Juliana Campos Horta , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/11/2024, publicação da súmula em 14/11/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - MULTA - DEVIDA - PROCESSO ADMINISTRATIVO - LEGALIDADE OBSERVADA - DECISÃO MANTIDA. 1-É consabido que em decorrência do princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º, CR/88) ao Judiciário somente é dado fazer um controle de legalidade em relação à atuação da Administração Pública, sem adentrar ao mérito do ato administrativo. 2 - Evidenciada a existência de irregularidades, revela-se devido o pagamento de multa prevista contratualmente para a hipótese de descumprimento das especificações técnicas constantes do contrato. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.361842-8/001, Relator(a): Des.(a) Jair Varão , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/10/2024, publicação da súmula em 31/10/2024) Também neste ponto, portanto, entendo que deva ser mantida incólume a r. sentença objurgada. Por fim, resta a análise da insurgência recursal aviada pelo ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - que se circunscreve a impugnar a fixação da verba honorária sucumbencial de forma equitativa, o que, segundo alega, afronta os parâmetros legais dispostos no art. 85, §§2º, 3º e 8º do CPC. Requer, assim, que os honorários sejam fixados com base no proveito econômico obtido, in casu, o valor da penalidade pecuniária contratual que restou mantida incólume (R$ 1.603.729,76), ao passo em que PELICANO sustenta, em sentido diverso, que os honorários fixados em R$ 30.000,00 merecem ser minorados, ante as particularidades do caso concreto e a ausência de complexidade da matéria. Neste tocante, sem ignorar que o c. STJ firmou precedente vinculante no sentido de que “a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados” (Tema nº 1.076), ressalto que o E. STF, ao enfrentar a questão similar posteriormente à fixação do Tema nº 1076 pelo STJ, decidiu pela fixação da verba honorária por equidade, em virtude do elevado valor da causa e com supedâneo nos §§ 2º e 8º do mencionado dispositivo, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Na ocasião, assim elucidou o Eminente Ministro Relator LUÍS ROBERTO BARROSO, no julgamento do RE 1415786/PE, in litteris: “(...) 17. Nada obstante o inegável zelo dos profissionais que atuaram na causa, entendo que a natureza do processo e o trabalho exigido para o seu encaminhamento não justificam a fixação de honorários em quantia exorbitante, tendo em vista que o valor atualizado da causa supera os 15 milhões de reais. 18. A questão versada nos autos era exclusivamente de direito, de modo que não houve instrução probatória, perícias ou diligências. Ademais, o desenvolvimento processual ocorreu de forma regular, sem a necessidade de trabalhos excessivos pelos representantes judiciais das partes. Em vista dessas circunstâncias, a fixação dos honorários em percentual do valor da causa gera à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta. 19. Além disso, a presença da Fazenda Pública em um dos polos impõe que os honorários de sucumbência sejam fixados com parcimônia. Isso porque a condenação levada a efeito nos termos do art. 85, § 3º, do CPC/2015, tem o condão de comprometer a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade, em razão do elevado ônus financeiro. 20. Vislumbro, dessa forma, a possibilidade de revisão do valor dos honorários de sucumbência, para que sejam fixados por equidade, conforme autoriza o art. 85, § 8º, do CPC/2015, transcrito acima”. Ressalto, por fim, que do julgamento realizado pelo c. STJ no enfrentamento do Tema nº 1.076, a Corte Superior de Justiça admitiu o processamento de Recurso Extraordinário no REsp 1.644.077/PR (que, entre outros, compõe o plexo de recursos reunidos no referido Tema), tendo o E. STF reconhecido Repercussão Geral sobre a questão, por meio da fixação do Tema nº 1255, cujo objeto é justamente o reexame da interpretação dada pelo Tribunal da Cidadania ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do CPC: “Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 2º, 3º, I e IV, 5º, caput, XXXIV e XXXV, 37, caput, e 66, § 1º, da Constituição Federal, a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça ao art. 85, §§ 2º, 3º e 8º, do Código de Processo Civil, em julgamento de recurso especial repetitivo, no sentido de não ser permitida a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa nas hipóteses de os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda serem elevados, mas tão somente quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo (Tema 1.076/STJ).” (RE 1412069 RG, Relator(a): MINISTRA PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 08-08-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 23-05-2024 PUBLIC 24-05-2024) Nesse contexto, tendo em vista o elevado valor da causa e do proveito econômico, que alcança aproximadamente dois milhões de reais, impositivo reconhecer que a fixação da verba honorária em percentual - ainda que no mínimo legal - imporia condenação deveras elevada, incompatível com a atividade empreendida pelos ilustres procuradores no feito. O montante fixado (R$ 30.000,00), por sua vez, se afigura razoável e proporcional à complexidade da demanda, à atividade empreendida pelos procuradores, considerando-se o tempo de tramitação do feito e a localização dos atos, bem como a desnecessidade de dilação probatória (oral, pericial). Do exposto, CONHEÇO dos recursos interpostos por PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e LHES NEGO PROVIMENTO, mantendo incólume a r. sentença vergastada, nos termos da fundamentação supra. Com fulcro no art. 85, §11, do CPC, MAJORO de R$ 30.000,00 para R$ 31.000,00 a verba honorária sucumbencial devida pela recorrente PELICANO CONSTRUÇÕES S/A, deixando de fixar honorários recursais em desfavor do ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, ante a ausência de fixação na origem (REsp n. 1.864.633/RS, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, julgado em 9/11/2023, DJe de 21/12/2023). É como voto. Acompanho a eminente Desembargadora Heloísa Cariello no sentido de conhecer e negar provimento aos recursos de PELICANO CONSTRUÇÕES S/A e de MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Quanto ao recurso de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, respeitosamente, acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Substituto Luiz Guilherme Risso, no que pertine a fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais com base no §3º, do art 85, CPC. É como voto.
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