Processo nº 1009840-63.2025.8.11.0000
ID: 262181039
Tribunal: TJMT
Órgão: Quarta Câmara Criminal
Classe: AGRAVO DE EXECUçãO PENAL
Nº Processo: 1009840-63.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO CARLOS ALVES SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1009840-63.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). JU…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1009840-63.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (AGRAVANTE), JOANA DARQUE TIBURCIO PEREIRA - CPF: 047.581.201-88 (AGRAVADO), ANTONIO CARLOS ALVES SANTOS - CPF: 854.845.471-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PENAL. DESCUMPRIMENTO DE CONDIÇÕES DO REGIME DOMICILIAR. SAÍDA SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA. FALTA NÃO CONFIGURADA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de execução penal interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra decisão do Juízo da Execução Penal que acolheu a justificativa apresentada por reeducanda quanto à sua saída sem prévia autorização do juízo para comparecimento ao velório de seu irmão, mantendo-lhe o regime de prisão domiciliar e aplicando-lhe advertência. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a saída da reeducanda de sua residência, sem autorização judicial prévia, para comparecimento a velório de irmão, configura falta grave apta a ensejar a revogação da prisão domiciliar; (ii) estabelecer se a advertência aplicada pelo juízo de origem é medida suficiente e proporcional diante da conduta praticada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência da reeducanda se deu para comparecer ao velório do irmão, tendo sido posteriormente comunicada ao juízo, e devidamente justificada mediante certidão de óbito, o que afasta a caracterização de falta injustificada. 4. O art. 120, I, da LEP autoriza a saída de presos para situações de falecimento de familiares próximos, como o irmão, tratando-se de hipótese que exige sensibilidade e ponderação judicial na análise da necessidade de autorização prévia. 5. A aplicação isolada do histórico de descumprimentos anteriores, já sancionados com a regressão ao regime fechado, configuraria bis in idem, visto que já foram utilizados para determinar a regressão do regime aberto para o fechado. 6. A conduta da reeducanda, ainda que formalmente contrária à exigência de autorização judicial prévia, não demonstra desrespeito contumaz às condições impostas, tampouco foi realizada com o intuito de burlar a execução penal, devendo prevalecer os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. 7. A advertência aplicada pelo juízo de origem se revela suficiente e adequada, cumprindo função pedagógica sem incorrer em rigor excessivo. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. “A saída eventual da reeducanda em prisão domiciliar para comparecimento ao velório de irmão, ainda que sem autorização prévia, mas posteriormente justificada com documentação idônea, não configura falta grave.” 2. “A aplicação de advertência, em casos isolados e excepcionais como o dos autos, respeita os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sendo medida suficiente para resguardar a finalidade da execução penal.” _________________________________________ Dispositivos relevantes citados: LEP, arts. 50, V; 66, VI; 118, I; 120, I e parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 906.951, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 09/08/2024. R E L A T Ó R I O QUARTA CÂMARA CRIMINAL AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) 1009840-63.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO AGRAVADO: JOANA DARQUE TIBURCIO PEREIRA R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de agravo de execução penal tempestivamente interposto [certidão no id. 277972855, p. 428] na forma dos arts. 197 e 198 da LEP, pelo Ministério Público de Mato Grosso, na pessoa do Dr. Marcelo Rodrigues da Silva, em face da decisão lavrada em 05/3/2025, nos autos do processo executivo de pena SEEU n. 2000011-75.2021.8.11.0034 [mov. 250.1], atualmente em trâmite perante o Juízo da 3ª Vara Criminal de Execuções Penais da comarca de Jaciara, que acolheu a justificativa da reeducanda Joana Darque Tibúrcio Pereira, acerca do descumprimento das condições impostas para o regime domiciliar de cumprimento de pena. Nas razões do agravo, anexas ao id. 277972855, pp. 418-427, o órgão ministerial afirma que a reeducanda se ausentou de sua residência sem prévia comunicação ao Juízo para participar do velório do irmão ocorrido em 04/02/2025, bem como deixou de justificar os motivos pelos quais se ausentou da residência também no dia 06 do mesmo mês, descumprindo condições do regime domiciliar imposto a partir do HC 1000408-20.2025.8.11.0000, vulnerando assim, as disposições do art. 317 do CPP, c/c art. 120, I, da LEP. Pede, pois, a regressão do regime domiciliar em que se encontra atualmente para o fechado. Em sede de contrarrazões, a reeducanda, ora agravada [id. 277972855, pp. 430-434], esclareceu que realmente se ausentou de sua residência para participar do velório do irmão, situação que pela urgência e impacto emocional, influenciaram na conduta omissiva enfocada no agravo ministerial, justificando o descumprimento do regime domiciliar. Além disso, afirmou que a reeducanda possui trabalho lícito, é responsável pelo cuidado da família e não há notícia de seu envolvimento em novos fatos ilícitos, registrando que há previsão de progressão de regime próxima. Assim, postulou o desprovimento do recurso ministerial. O Juízo de origem manteve a decisão invectivada por seus próprios fundamentos [id. 277972855, p. 436]. A distribuição foi realizada na modalidade prevenção, dada à presença de feitos anteriores capazes de ensejar a prevenção de cadeira [id. 278270850]. A certidão no id. 278270854 assinala que o presente feito dispensa o recolhimento de preparo, nos termos do art. 77 do RITJMT. A douta Procuradoria de Justiça, em parecer subscrito pelo eminente Dr. Gill Rosa Fechtner, opinou pelo provimento do recurso ministerial: Agravo em execução penal. Irresignação ministerial contra decisão que indeferiu o pedido de revogação da prisão domiciliar humanitária. Alegação de que a reeducanda descumpriu as condições impostas. Procedência. A apenada, beneficiada com prisão domiciliar, ausentouse de sua residência sem prévia autorização do Juízo da Execução. Hipótese que configura falta grave, nos termos do art. 50, V, da LEP. A sanção de advertência não se revela proporcional ao caso. Impositiva a revogação da prisão domiciliar e o retorno da reeducanda ao cárcere estatal. Parecer pelo provimento do recurso. [id. 280446352]. É o relatório. Peço dia para julgamento, mediante publicação em pauta. Cuiabá, data da assinatura digital. Desembargador JUVENAL PEREIRA DA SILVA Relator V O T O R E L A T O R V O T O EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR) Egrégia Câmara: Consta que a agravante Joana Darque Tibúrcio Pereira, beneficiada desde 07/01/2022 com o cumprimento em regime aberto da pena total de 04 anos e 05 meses de reclusão, por força de condenação pela prática dos crimes descritos nos arts. 157, § 2°, incisos I e II, do Código Penal, e art. 244-B do ECA, descumpriu reiterada e persistentemente as condições que lhe foram impostas em audiência, deixando de comparecer ao Juízo da Execução Penal nos meses de abril, maio, julho, setembro e novembro de 2022, bem como nos meses de fevereiro, abril, julho, setembro de 2023, e nos meses de janeiro, março, maio, julho e setembro de 2024, sem apresentar justificativa idônea para essas faltas, e por isso teve regredido o regime para o fechado, nos termos do art. 118, I, c/c art. 50, V, ambos da LEP, conforme decisão lavrada em audiência de justificação realizada em 18/12/2024 [id. 264841262, pp. 274-275], nos autos do processo executivo de pena SEEU n. 2000011-75.2021.8.11.0034, em trâmite perante o Juízo da 3ª Vara de Execuções Penais da comarca de Jaciara, confirmada nos autos de AgEx 1002041-66.2025.8.11.0000, assim ementado: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PENAL. REGRESSÃO PER SALTUM. DESCUMPRIMENTO REITERADO DE CONDIÇÕES DO REGIME ABERTO. POSSIBILIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. NÃO CONHECIMENTO. QUESTÃO JÁ DISCUTIDA NO HC 1000408-20.2025.8.11.0000. AGRAVO PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de execução penal interposto contra decisão da 3ª Vara de Execuções Penais da comarca de Jaciara/MT, que determinou a regressão definitiva do regime aberto para o fechado, nos termos do art. 118, I, c/c art. 50, V, ambos da LEP, em razão do descumprimento reiterado das condições impostas. Subsidiariamente, a defesa pleiteia a concessão de prisão domiciliar, nos termos dos arts. 117 da LEP e 318, V, do CPP, por ser mãe de criança menor de 12 anos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de regressão per saltum do regime aberto para o fechado em razão de descumprimento reiterado das condições impostas; (ii) a viabilidade da concessão de prisão domiciliar à agravante, à luz do art. 117 da LEP. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Concedida liminar em habeas corpus onde se discute a viabilidade de concessão do regime domiciliar de cumprimento de pena, há perda do objeto do recurso que colimava, dentre outras medidas, a mesma providência. 4. O descumprimento reiterado das condições impostas para o regime aberto configura falta grave, nos termos do art. 50, V, da LEP, autorizando a regressão de regime, conforme o disposto no art. 118, I, do mesmo diploma legal. 5. A regressão per saltum encontra amparo na jurisprudência, sendo possível a transferência direta do regime aberto para o fechado quando evidenciado o desrespeito às condições impostas, especialmente pela ausência injustificada da reeducanda em diversas ocasiões. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso parcialmente conhecido, e, nessa extensão, desprovido. Tese de julgamento: 1. “A concessão de liminar em habeas corpus determinando a colocação da agravante em regime domiciliar de cumprimento de pena esvazia o conteúdo de parte do recurso aviado com idêntico pedido, tornando-o prejudicado pela perda do objeto.” 2. “O descumprimento reiterado das condições do regime aberto configura falta grave e autoriza a regressão de regime, inclusive por salto, nos termos dos arts. 50, V, e 118, I, da LEP.” _______________________________________________ Dispositivos relevantes citados: LEP, arts. 50, V, 118, I, e 117; CP, art. 157, § 2º, I e II. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 967663/PE, relator Ministro Joel Ilan Parcionik, DJe 19/12/2024, AgRg no HC n. 802.006/SP, rel. Min. Messod Azulay Neto, Quinta Turma, j. 26/02/2024, DJe 29/02/2024; TJMT, HC 1000408-20.2025.8.11.0000, 4ª Câmara Criminal, relator Des. Lídio Modesto da Silva Filho; AgEx 1011225-80.2024.8.11.0000, 4ª Câmara Criminal, relator Des. Lídio Modesto da Silva Filho, j. 02/7/2024, DJe 05/7/2024. [TJMT, AgEx 1002041-66.2025.8.11.0000, minha relatoria, julgado em 05/3/2025, DJe 10/3/2025, trânsito em julgado final em 26/3/2025]. Consta que a agravada cumpria o regime fechado em regime domiciliar desde 24/01/2025, por força de decisão lavrada nos autos de HC PJe 1000408-20.2025.8.11.0000, em razão de sua condição de mãe de filho menor de 12 anos de idade, estando assim ementada: DIREITO PENAL. EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. REGRESSÃO DE REGIME. DESCUMPRIMENTO DE CONDIÇÕES DO REGIME ABERTO. FALTAS INJUSTIFICADAS. REGRESSÃO PER SALTUM PARA O REGIME FECHADO. PRINCÍPIO DA PROGRESSIVIDADE. FILHO MENOR. PRISÃO DOMICILIAR. CONCESSÃO DE OFÍCIO. I. CASO EM EXAME Habeas corpus impetrado em favor de Joana Darque Tiburcio Pereira, condenada à pena de 4 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, por infração ao art. 157, incisos I e II, do Código Penal, e ao art. 244-B, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente. A paciente cumpria pena em regime aberto, mas deixou de comparecer periodicamente em juízo sem justificativa, levando à determinação judicial de regressão per saltum para o regime fechado. A defesa sustenta a ilegalidade da regressão, sob o argumento de violação ao princípio da progressividade e da Súmula 491 do STJ, requerendo o retorno ao regime aberto ou, subsidiariamente, a concessão de prisão domiciliar, em razão de a paciente ser responsável por filho menor de 12 anos. O Ministério Público manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus, alegando que a via eleita não substitui o recurso adequado e que não há flagrante ilegalidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) se a regressão per saltum do regime aberto para o fechado, determinada em razão do descumprimento das condições impostas, configura ilegalidade passível de correção por habeas corpus; e (ii) se a condição de mãe de filho menor justifica a substituição da pena pelo regime de prisão domiciliar. III. RAZÕES DE DECIDIR Habeas corpus não é a via adequada para impugnar regressão de regime, salvo em casos de flagrante ilegalidade, devendo ser manejado o recurso próprio, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A jurisprudência admite a regressão de regime quando o apenado comete falta grave, nos termos do art. 118, inciso I, da Lei de Execução Penal. Entretanto, a regressão per saltum deve ser devidamente fundamentada, especialmente diante da inexistência de reincidência faltosa. A regressão imediata ao regime fechado, sem escalonamento progressivo e sem a devida ponderação sobre a gravidade da infração disciplinar, contraria o princípio da proporcionalidade e a Súmula 491 do STJ, que veda a regressão automática sem justificativa concreta. A existência de filho menor de 12 anos impõe a análise da possibilidade de prisão domiciliar, conforme os precedentes do Supremo Tribunal Federal (HC 143.641/SP) e o entendimento consolidado na ADPF 347. Diante da inexistência de outras infrações disciplinares e considerando a proteção à criança como princípio fundamental, a concessão de prisão domiciliar à paciente é medida adequada, com a imposição de medidas cautelares para garantir a fiscalização do cumprimento da pena. Assim, não se conhece do habeas corpus, pois a via eleita não é adequada para questionar a regressão de regime, devendo a impugnação ocorrer por meio de agravo em execução penal. No entanto, diante da peculiaridade do caso e da necessidade de proteção ao filho menor, concede-se a ordem de ofício para que a paciente cumpra a pena em prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico e restrições de deslocamento. IV. DISPOSITIVO E TESE Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para a conversão do regime fechado em prisão domiciliar, com aplicação de medidas cautelares. Tese de julgamento: O habeas corpus não é a via adequada para impugnar regressão de regime, salvo em casos de flagrante ilegalidade, devendo ser manejado o recurso próprio. A regressão per saltum do regime aberto para o fechado exige fundamentação concreta e observância ao princípio da proporcionalidade, sendo vedada sua imposição automática. A condição de mãe de filho menor de 12 anos pode justificar a conversão da pena privativa de liberdade em prisão domiciliar, nos termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores, especialmente quando não há reiteração de faltas graves. Dispositivos relevantes citados: CP, art. 157, I e II; ECA, art. 244-B; LEP, art. 118, I; CPP, art. 647; CF/1988, art. 5º, LXVIII. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 491; STF, HC 143.641/SP; STF, ADPF 347; STJ, HC 720222/GO, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 09/05/2022. [TJMT, HC 1000408-20.8.11.0000, minha relatoria, julgado em 05/3/2025, DJe 10/3/2025, trânsito em julgado final em 26/3/2025.] Esta c. 4ª Câmara Criminal, ao conceder tal beneplácito à paciente, estabeleceu que o cumprimento do regime domiciliar estaria adstrito à observância dos seguintes requisitos: a) a proibição de ausentar-se da Comarca onde reside sem a prévia comunicação ao juízo de execuções penais e sua autorização; b) a saída da residência apenas será permitida para unidades de saúde, com prévia comunicação ao juízo de origem; c) o uso de tornozeleira eletrônica (monitoramento eletrônico); d) o cumprimento das demais medidas eventualmente fixadas pelo juízo a quo. De acordo com o assinalado nas razões do agravo sob debate, durante o cumprimento da prisão-pena domiciliar, reeducanda descumpriu as condições impostas por esta Quarta Câmara Criminal e se ausentou de sua residência sem a prévia comunicação e autorização do Juízo da Execução. Em justificativa [id. 277972855, p. 394], a apenada alegou que a violação ocorreu em razão de sua necessidade de comparecer ao velório de seu irmão. A escusa foi acolhida pelo Juízo a quo nos seguintes termos: [...] A reeducanda foi beneficiada com a prisão domiciliar no Habeas Corpus n. 1000408- 20.2025.8.11.0000, assim, deve a condenada permanecer em sua residência, podendo ausentar-se dela somente com prévia autorização do Juízo. Nota-se, que a reeducanda JOANA DARQUE TIBURCIO PEREIRA ausentou-se de sua residência, a fim de comparecer ao velório do seu irmão, comunicando posteriormente este Juízo. Desta forma, acolho a justificativa apresentada pela condenada (seq. 247) e a ADVIRTO para que episódios como este não volte a ocorrer, sob pena de revogação da prisão domiciliar. ADVIRTO que a autorização para deslocamento deve ser previamente direcionada ao Juízo. Com relação as condições fixadas pelo Juízo da Vara de Execuções Penais de Rondonópolis/MT (seq. 217), entendo que o pedido formulado pelo Ministério Público merece acolhimento, a fim de delimitar as hipóteses de saída da recuperanda de seu domicílio. [id. 277972855, pp. 409-410] Irresignado, o órgão do Ministério Público agravou da decisão requerendo a revogação da prisão domiciliar, ao argumento de que ela descumpriu condição previamente imposta, a seu ver, injustificadamente, já que não houve prévio pedido e autorização judicial da saída de sua residência, registrando que “[...] da certidão de óbito que o Sr. Vanderlei Tiburcio Pereira, irmão da apenada, faleceu no dia 04 de fevereiro de 2025 (mov. 238.2). Inobstante, a defesa da apenada quedou-se a informar nos autos acerca da violação das condições da prisão domiciliar no dia 06 de fevereiro do corrente ano (mov. 238.1).” [id. 277972855, p. 426]. Assinalou, ademais, que “[...] mesmo diante de uma ordem recente de regressão de regime, a apenada continua demonstrando irresponsabilidade com o cumprimento da pena, tendo em vista que, de forma contumaz, descumpre as condições estabelecidas para o cumprimento da reprimenda a ela imposta” [idem]. Nesse mesmo sentido, o nobre parecerista enfoca que o descumprimento dos deveres inerentes ao regime domiciliar desaconselha a sua mantença, já que a medida por si só se apresenta absolutamente excepcional, exigindo do beneficiário comportamento compatível com a confiança que lhe foi depositada pelo Estado. Prossegue, adiante: Com efeito, a imposição da sanção de advertência, conforme previsto na decisão ora agravada, revela-se desproporcional e destituída de razoabilidade diante da gravidade da conduta praticada pela apenada. A medida adotada não cumpre sua função pedagógica e disciplinar, demonstrando-se insuficiente para a finalidade de resguardar a integridade do regime de cumprimento da pena. Observa-se que a reeducanda ainda não assimilou, de forma adequada, a condição de que se encontra em cumprimento de pena privativa de liberdade, ainda que em regime domiciliar excepcional, o qual, por sua própria natureza, exige elevado grau de responsabilidade, disciplina e observância rigorosa das condições impostas. Dessarte, diante do reconhecimento da falta grave – consubstanciada na violação das condições estabelecidas para o cumprimento da pena na modalidade de prisão domiciliar humanitária – impõe-se a reforma da decisão agravada, com a consequente revogação do benefício anteriormente concedido e o imediato retorno da apenada ao cárcere estatal. Pelo exposto, o parecer é pelo provimento do recurso, com a revogação da prisão domiciliar humanitária e a determinação de retorno da apenada ao regime fechado. [id. 280446352, p. 5]. Analisando percucientemente as aduções postas no anseio acusatório, não vejo motivo para a reforma da decisão invectivada. Inicialmente, é necessário enfatizar que o descumprimento reiterado das condições do regime aberto não pode ser utilizado para a avaliação da necessidade da revogação do regime domiciliar, utilizado anteriormente para validar a regressão do cumprimento da pena em regime aberto para o fechado, de modo que sua nova valoração implicaria abominado bis in idem. No fato subjacente, que é a ausência da agravada de sua residência para comparecer ao velório de seu irmão, falecido em 04/02/2025, há prova do falecimento do irmão da agravada, conforme consta da certidão de óbito encartada aos autos. Embora a lei de execução penal exija o cumprimento de todas as condições impostas para a preservação do regime domiciliar, inquestionavelmente, como bem observa a culta defesa, nas contrarrazões [id. 277972855, p. 433], é certo que nem sempre as saídas temporárias podem ser planejadas. Situações como doenças graves e de morte de ente próximo e querido, são bons exemplos de situações imprevisíveis que podem justificar a saída temporária despida de autorização judicial, pois, nessa senda, a premência da saída – devidamente justificada documentalmente a posteriori – poderá ser comunicada ao Juízo da Execução Penal, a quem caberá analisar se reflete ou não verdadeira ofensa ao dever imposto a priori, consoante previsão do art. 66, inciso VI, da Lei de Execução Penal, de acordo com as situações delimitadas no art. 50 do mesmo Diploma Repressivo. Nessa senda, como a própria acusação enaltece, a saída temporária nos casos de falecimento de irmão está autorizada no art. 120, I, da LEP: Art. 120. Os condenados que cumprem pena em regime fechado ou semi-aberto e os presos provisórios poderão obter permissão para sair do estabelecimento, mediante escolta, quando ocorrer um dos seguintes fatos: I - falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão; [...] Parágrafo único. A permissão de saída será concedida pelo diretor do estabelecimento onde se encontra o preso. De acordo com o parágrafo único, do mesmo dispositivo legal, antes transcrito, a permissão de saída será concedida pelo responsável pela custódia, e, a rigor, quando ausentes circunstâncias concretas que determinem o indeferimento da medida, cuida-se de preceptivo legal de natureza cogente. Por sua vez, a interpretação do art. 50, V, da LEP, resulta a conclusão de que o descumprimento de obrigações no regime domiciliar somente enseja falta disciplinar quando ocorra injustificadamente, no que não é o caso. Não houve no caso em tela a demonstração de que a saída temporária da agravada pudesse colocar em risco a execução da pena, tampouco demonstrar qualquer ato de indolência ou irresponsabilidade no cumprimento da pena, visto que a duração da ausência se deu estritamente pelo tempo necessário à finalidade para a qual ocorreu. Ainda, de acordo com o que se estabelece nos autos, nenhum outro vetor desfavorável aportou aos autos desde então, a permitir deduzir que, fora esse evento trágico e imprevisível, a agravada continua a cumprir as condições do regime domiciliar sem quaisquer intercorrências. Aliás, é bom que se diga, foi a própria defesa da agravada, no exercício de seu múnus e investida na boa-fé processual, quem comunicou a ausência ocasional da agravada da residência, consoante se depreende da petição anexa ao id. 277972855, p. 394, e respectiva certidão de óbito, p. 395 e com base neste documento, o órgão do Ministério Público tomou conhecimento da ausência e requereu a revogação do benefício. Em nenhum momento houve qualquer informação de que a ausência da agravada teria ocorrido no dia 06/02/2025, data considerada pelo órgão ministerial como sendo ao do descumprimento. Pelo contrário, da leitura dos autos, percebe-se que a petição da defesa foi subscrita nessa data, e nela não se informa qual foi o dia da ausência, sendo assim, absolutamente contraproducente tomar como verdadeira a premissa ministerial de que a agravada não justificou a ausência do dia 06 de fevereiro embora o falecimento haja ocorrido no dia 04. Assim, por todos esses fundamentos, infiro que, em observância aos postulados da proporcionalidade e razoabilidade, e, ainda, com base no preceptivo constante do art. 120, I, e parágrafo único, da LEP, a revogação da prisão domiciliar da agravada é medida desaconselhada, já que não há evidência de transgressão injustificada aos limites impostos para a mantença do benefício em questão, sendo suficiente a advertência feita pelo magistrado de origem no sentido de que nova incursão em fato análogo poderá ensejar a revogação do benefício. Leciona Cezar Roberto Bitencourt, a esse respeito: O modelo político consagrado pelo Estado Democrático de Direito determina que todo o Estado em seus três Poderes, bem como nas funções essenciais à Justiça resulta vinculado em relação aos fins eleitos para a prática dos atos legislativos, judiciais e administrativos. Em outros termos, toda atividade estatal é sempre vinculada axiomaticamente pelos princípios constitucionais explícitos e implícitos. As consequências jurídicas dessa constituição dirigente são visíveis. A primeira delas verifica-se pela consagração do princípio da proporcionalidade, não como simples critério interpretativo, mas como garantia legitimadora/limitadora de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional. Assim, deparamo-nos com um vínculo constitucional capaz de limitar os fins de um ato estatal e os meios eleitos para que tal finalidade seja alcançada. Conjuga-se, pois, a união harmônica de três fatores essenciais: a) adequação teleológica: todo ato estatal passa a ter uma finalidade política ditada não por princípios do próprio administrador, legislador ou juiz, mas sim por valores éticos deduzidos da Constituição Federal vedação do arbítrio (Ubermassverbot); b) necessidade (Erforderlichkeit): o meio não pode exceder os limites indispensáveis e menos lesivos possíveis à conservação do fim legítimo que se pretende; c) proporcionalidade "stricto sensu": todo representante do Estado está, ao mesmo tempo, obrigado a fazer uso de meios adequados e de abster-se de utilizar meios ou recursos desproporcionais. [in Tratado de Direito Penal, Parte Geral 1. 17ª Edição. Editora Saraiva. 2012. p. 64-65.] No mesmo sentido, há precedentes no sentido de relativizar a regra do art. 118 da LEP quando, pelo bom senso e a observância dos postulados da razoabilidade e proporcionalidade assim recomendarem. [...] o descumprimento das condições impostas à execução da pena é considerado falta grave, o que, a princípio, justificaria a regressão de regime. Entretanto, excepcionalmente, deve ser mitigada a interpretação do art. 118 da LEP à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. O bom senso indica que encarcerar a condenada, neste momento, frustraria a própria finalidade da execução penal. [STJ, HC n. 906.951, Ministro Rogerio Schietti Cruz, DJe de 09/08/2024.] Assim, se o objetivo da execução penal é efetivar as disposições de sentença criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado (art. 1º), em um país onde a dignidade da pessoa humana é fundamento da República, constituindo-se em Estado Democrático de Direito, cumpre concluir que falta grave a apenada não praticou. Nessa esteira, não se tratando de conduta reiterada de descumprimento injustificado das condições do regime domiciliar, o reclamo acusatório é de todo improcedente. Ante o exposto, em dissenso ao parecer, NEGO PROVIMENTO ao agravo de execução penal interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, mantendo incólume a r. decisão invectivada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025
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