Claudio Rodrigues Pereira Galizzi e outros x Mosaic Fertilizantes P&K Ltda.
ID: 315564819
Tribunal: TRT3
Órgão: Vara do Trabalho de Araxa
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Nº Processo: 0010774-04.2021.5.03.0048
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VALTON DORIA PESSOA
OAB/MG XXXXXX
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MAICON FLAVIO DOS REIS
OAB/MG XXXXXX
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EDUARDO BORGES DE PAULA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO VARA DO TRABALHO DE ARAXA ATOrd 0010774-04.2021.5.03.0048 AUTOR: VANESSA MARIA GONCALVES RÉU: MOSAIC FERTILIZANTE…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO VARA DO TRABALHO DE ARAXA ATOrd 0010774-04.2021.5.03.0048 AUTOR: VANESSA MARIA GONCALVES RÉU: MOSAIC FERTILIZANTES P&K LTDA. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID f515bfd proferida nos autos. TERMO DE AUDIÊNCIA RELATIVO AO PROCESSO 0010774-04.2021.5.03.0048 Aos 02 dias do mês de julho do ano de 2025, o MMº. Juiz do Trabalho, Dr. Vanderson Pereira de Oliveira, nos autos da reclamatória trabalhista ajuizada por VANESSA MARIA GONÇALVES contra MOSAIC FERTILIZANTES P&K LIMITADA, proferiu a seguinte SENTENÇA I. RELATÓRIO VANESSA MARIA GONÇALVES ajuizou reclamatória trabalhista em face de MOSAIC FERTILIZANTES P&K LIMITADA, já qualificadas nos autos, formulando os pedidos arrolados na inicial, com base nas razões de fato e de direito aduzidas. Atribuiu à causa o valor de R$158.216,00 e apresentou documentos. Defesa pela reclamada (fls. 365/478 - ID. ce511ec), na qual suscitou a inépcia da inicial e pleiteou a extinção do feito, em razão de irregularidade na liquidação dos pedidos (não apresentação de planilha de cálculos); impugnou os valores e os documentos apresentados pela reclamante; pleiteou a limitação da condenação às quantias indicadas na inicial; suscitou a prescrição bienal/quinquenal; e, no mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos. Apresentou documentos. Manifestação da reclamante quanto à defesa e documentos juntados (fls. 979/1018 - ID. 801f0b4). Laudo pericial médico e esclarecimentos periciais apresentados (perito Cláudio Rodrigues Pereira Galizzi; fls. 1022/1033 - ID. 19f8397; fls. 1056/1062 - ID. de28804 e ID. d54f76e), com manifestações da reclamante (fls. 1043/1045 - ID. 7ea8359) e da reclamada (fls. 1046/1053 - ID. 6f02cd6; fls. 1065/1067 - ID. 1dfe251). Audiência de instrução realizada (fls. 1097/1102 - ID. 4aa9ff2), na qual, sem conciliação, foram colhidos os depoimentos das partes e de duas testemunhas, uma arrolada pela autora e outra pela reclamada, bem como determinada a realização de outra perícia médica, a cargo de psiquiatra. Razões finais remissivas, complementadas por memoriais pelas partes (fls. 1104/1105 - ID. f6f0b7b; fls. 1106/1126 - ID. ed935c0). Laudo pericial médico e esclarecimentos periciais apresentados (perito Neiber Fausto de Azevedo Silva; fls. 1146/1158 - ID. 41d7ee0; fl. 1175 - ID. 800bede), com manifestações da reclamante (fls. 1161/1162 - ID. f1b0888; fl. 1178 - ID. ccaf0ad) e da reclamada (fls. 1163/1169 - ID. 1d559c8; fl. 1179 - ID. acba16c). Conciliação final rejeitada/prejudicada. Sem outras provas, encerrou-se a instrução processual. Em apertada síntese, é o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO PROTESTOS Mantenho a decisão que ensejou os protestos da reclamada (fl. 1101 - ID. 4aa9ff2), pelas mesmas razões já explanadas e, ainda, diante do que prevê o artigo 765 da CLT. Em relação aos protestos de fls. 1178 (ID. ccaf0ad) e 1179 (ID. acba16c), não são o meio correto para a insurgência das partes em relação ao resultado da prova pericial, de modo que as manifestações das partes quanto a ela serão analisadas no mérito da sentença. LEI 13.467/17/ DIREITO PROCESSUAL E DIREITO MATERIAL/ CONTRATO EM CURSO/ APLICAÇÃO Ajuizada a ação quando já vigente o novo regramento processual trazido pela Lei 13.467/17, aplica-se ele de forma integral, porque o tempo rege o ato. As mudanças de direito material trazidas pela Lei 13.467/17 aplicam-se aos contratos em curso, passando a reger os fatos ocorridos na vigência da nova lei, respeitando, contudo, os efeitos jurídicos dos fatos antes dela ocorridos, uma vez que inexiste direito adquirido a um determinado regime jurídico-legal ou direito adquirido a fatos ainda não ocorridos. Assim já decidiu o TRT 3: DIREITO INTERTEMPORAL. CONTRATO DE TRABALHO VIGENTE EM PERÍODO ANTERIOR E POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 13.467/17. DIREITO MATERIAL APLICÁVEL. OBSERVÂNCIA DAS NORMAS VIGENTES À ÉPOCA DOS FATOS. Nas situações jurídicas pendentes, como no caso de empregados contratados antes da vigência da Lei 13.467/2017 e cujos contratos permanecem em vigor ou foram rescindidos após 11/11/2017, a norma revogada somente se aplica aos efeitos realizados até o início da vigência da lei nova. Não há, pois, direito adquirido, inexistindo direito subjetivo já completamente formado, uma vez que o direito assegurado exclusivamente em lei não se incorpora ao patrimônio dos indivíduos, devendo ser observado apenas enquanto subsistir a norma que o prevê. Nestes casos, a aplicação do direito material deve observar o marco inicial da vigência da Lei n. 13.467/17, qual seja, 11/11/2017. Assim, não se aplicam as novas regras de direito material trazidas pela referida norma ao período contratual anterior a 11/11/2017. A partir desta data, passa a vigorar o novo regime jurídico implementado pela "Reforma Trabalhista", sendo plenamente aplicáveis as disposições da lei nova ao caso concreto. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010991-68.2018.5.03.0075 (RO); Disponibilização: 22/08/2019, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 889; Órgão Julgador: Segunda Turma; Relator: Maristela Iris S. Malheiros). E nesse sentido foi, recentemente, julgado incidente de recurso repetitivo pelo TST fixando-se, para o Tema 23, a seguinte tese, de observância vinculada por este magistrado: “A Lei nº 13.467/2017 possui aplicação imediata aos contratos de trabalho em curso, passando a regular os direitos decorrentes de lei cujos fatos geradores tenham se efetivado a partir de sua vigência”. Não são aplicáveis, todavia, os artigos da referida norma declarados inconstitucionais pelo STF no julgamento da ADI 5766. INÉPCIA A petição inicial atendeu os requisitos previstos no art. 840, § 1º, da CLT, tendo possibilitado à reclamada o amplo exercício do direito de defesa quanto aos pedidos formulados, sem qualquer prejuízo, razão pela qual, albergado nos princípios da informalidade e da simplicidade, de acentuada aplicação no processo do trabalho, não há se falar em inépcia. Ressalto que o pedido de complementação do auxílio-doença consta no item “f” do rol de pedidos (fl. 41 - ID. 6bced6f - Pág. 40). Rejeito. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO / LIQUIDAÇÃO DOS PEDIDOS Os pedidos formulados tiveram os valores indicados e não há exigência legal de apresentação de planilha demonstrativa de cálculos para tanto. Rejeito. IMPUGNAÇÃO AOS VALORES DISCRIMINADOS NA INICIAL Não merece ser acolhida a preliminar de incorreção dos valores discriminados, uma vez que são compatíveis com os pedidos formulados e com o proveito econômico pretendido através deste pleito. Rejeito. IMPUGNAÇÃO AOS DOCUMENTOS Revela-se inócua a impugnação relativa aos documentos juntados com a exordial, pois não foram apontados vícios no conteúdo, capazes de invalidá-los como meio de prova. Ressalto que o valor da prova documental será analisado no momento da apreciação dos pedidos. LIMITAÇÃO AOS VALORES DISCRIMINADOS NA INICIAL Ao contrário do que pretende a reclamada, firmou-se a jurisprudência no TRT 3 no sentido de que a indicação de valor por estimativa aos pedidos não limita a condenação, inexistindo violação aos artigos 141 e 492 do CPC. Confira-se: LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - VALORES DESCRITOS NA INICIAL - A Tese Jurídica Prevalecente (TJP) 16 deste Regional, dispõe: "RITO SUMARÍSSIMO. VALOR CORRESPONDENTE AOS PEDIDOS, INDICADO NA PETIÇÃO INICIAL (ART. 852-B, DA CLT). INEXISTÊNCIA DE LIMITAÇÃO, NA LIQUIDAÇÃO, A ESTE VALOR. No procedimento sumaríssimo, os valores indicados na petição inicial, conforme exigência do art. 852-B, I, da CLT, configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença". Portanto, as importâncias declaradas na inicial constituem estimativas para definição do rito processual, não podendo servir de limite à condenação, quando da liquidação de sentença. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010869-40.2017.5.03.0156 (RO); Disponibilização: 17/06/2019; Órgão Julgador: Sétima Turma; Relator: Paulo Roberto de Castro). LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DECLINADOS NA INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. Conforme entendimento firmado na Tese Jurídica Prevalecente nº 16, deste Tribunal Regional do Trabalho, nas demandas submetidas ao rito sumaríssimo, o valor indicado na petição inicial não limita a apuração na fase de liquidação. Com muito mais razão as demandas que tramitam pelo rito ordinário, cujos valores são meramente estimativos. Ademais, o valor atribuído à causa tem a função de fixar o procedimento a ser seguido - seja de alçada, sumaríssimo ou ordinário, não podendo, assim, promover limitação ao direito eventual reconhecido em sentença. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0011626-87.2017.5.03.0106 (RO); Disponibilização: 23/05/2019; Órgão Julgador: Décima Turma; Relator: Taísa Maria M. de Lima). Assim, não há se falar em limitação aos valores indicados pela reclamante em sua peça exordial. PRESCRIÇÃO Considerando as datas de término do contrato de trabalho (10.06.2021) (fl. 48 - ID. 65a054a - Pág. 3), bem como do ajuizamento da demanda (08.06.2021), não há prescrição bienal a ser reconhecida. De toda forma, a autora foi reintegrada ao emprego, sem que haja notícia nos autos de nova terminação contratual, o que reforça a inexistência da prescrição total. Por outro lado, ajuizada a ação em 08.06.2021, encontra-se prescrita a pretensão em relação aos créditos exigíveis anteriores a 08.06.2016, ante os termos do artigo 7º, XXIX, da CR/88 e Súmulas 308, I e 362 do TST. Assim, extingo o processo, com resolução do mérito, em relação aos pedidos alcançados pelo lapso prescricional. UNICIDADE CONTRATUAL A parte Autora pugna pela unicidade contratual, afirmando que foi admitida pela FAGUNDES CONSTRUÇÃO E MINERAÇÃO LIMITADA; que, em 01.10.2014, a FAGUNDES CONSTRUÇÃO E MINERAÇÃO LIMITADA foi sucedida pela FACON CONSTRUÇÃO E MINERAÇÃO S.A.; e que, em 01.02.2015, a FACON CONSTRUÇÃO E MINERAÇÃO S.A. foi sucedida pela VALE FERTILIZANTES S.A. (atualmente denominada MOSAIC FERTILIZANTES P&K S.A.), a qual se manteve como sua empregadora até o término do contrato de trabalho. As anotações contidas na carteira profissional devem refletir com exatidão o período contratual, conforme dispõe o artigo 29 da CLT, e gozam de presunção relativa de veracidade (Súmula 12 do TST). Considerando a referida premissa, os registros apostos na CTPS da reclamante (fl. 48 - ID. 65a054a - Pág. 3) e a inexistência de alegação/comprovação de solução de continuidade no contrato de trabalho em discussão, tem-se que as empresas se sucederam, havendo inequívoca unicidade contratual. Portanto, os pedidos serão apreciados em face da unicidade ora reconhecida, porém, com observância de aplicação das normas coletivas firmadas por cada empregadora em seus respectivos períodos contratuais. DIFERENÇAS DE REFLEXOS DAS HORAS EXTRAS, HORAS “IN ITINERE” E ADICIONAL DE TURNO/GRATIFICAÇÃO POR TRABALHO EM TURNO PAGAS Ante a tese da defesa, caberia à parte autora comprovar a existência das diferenças alegadas na inicial, o que não fez, validamente. Isso porque a amostragem do item 6 de fls. 987/988 (ID. 801f0b4 - Pág. 9 e 10) não observa os descansos semanais remunerados efetivamente cumpridos pela obreira (fls. 783/784 - ID. fe24982 - Pág. 4 e 5), de acordo com a frequência mensal de apuração (fl. 721 - ID. 050422f - Pág. 7), prejudicando a conferência. Além disso, não houve qualquer apontamento referente às repercussões do adicional de turno/gratificação por trabalho em turno, não se desvencilhando a autora do ônus que lhe incumbia. Julgo, pois, improcedente o pedido. HORAS "IN ITINERE" Há cláusula coletiva regulamentando a parcela (por amostragem, cláusula quinquagésima sexta de fls. 153/154 - ID. c69ed5f - Pág. 18 e 19), cujo teor prevê o pagamento das horas “in itinere”, conforme origem/destino do empregado e turno trabalhado. Ressalto que o STF, quando do julgamento do Tema 1046, com repercussão geral reconhecida e que vincula as instâncias inferiores, entendeu serem constitucionais as normas coletivas que limitam ou restringem direito trabalhista não assegurado constitucionalmente, pelo que a norma coletiva em questão é válida, vez que a restrição não abrange direito absolutamente indisponível. Impende registrar que a autora não demonstra o descumprimento dos instrumentos normativos, nos termos pactuados, ou a existência de período contratual por eles não abarcado (conforme vigência estabelecida). Registro, por fim, que o deslocamento entre a portaria e o local de efetivo trabalho, feito no veículo que transportava os empregados, também é considerado “in itinere”, portanto está abarcado no que foi convencionado, ficando superada qualquer argumentação quanto a isso. Logo, o pedido improcede. JORNADA DE TRABALHO / HORAS EXTRAS / INTERVALO INTRAJORNADA / INTERVALO INTERJORNADA / ADICIONAL NOTURNO Os cartões de ponto da reclamante foram apresentados pela reclamada (fls. 780/824 - ID. fe24982), os quais gozam de força probante, por se tratarem da prova natural da jornada, na forma do artigo 74 da CLT, de modo que permaneceu com a autora o ônus de desconstituir-lhes a validade, de acordo com o artigo 818, I, da CLT, porém, na audiência de instrução, ela concordou com os registros de ponto quanto aos horários de entrada/saída e à frequência. Assim, acolho os cartões de ponto apresentados pela reclamada, nesses particulares. A partir dos cartões de ponto, verifico que a jornada contratual era cumprida em turnos de revezamento de 6h diárias ou em turno diurno fixo de 8h diárias (administrativo). As normas coletivas aplicáveis ao pacto laboral em discussão autorizam a jornada em turnos de revezamento, mesmo superior a 6h diárias, e a prática de horas extras, inclusive por meio de compensação da jornada (banco de horas), regulamentações válidas à luz do julgamento do Tema 1046 pelo STF. Dessa forma, não há invalidade da jornada praticada em virtude do trabalho extraordinário cumprido. Ante a tese da defesa, tenho por cumprida, pela reclamada, a previsão normativa referente às horas extras (turnos de revezamento e turno fixo) e ao adicional noturno, da forma como negociada e durante todo o período contratual em discussão, pois não houve demonstração, pela reclamante, quanto à inobservância dos parâmetros estabelecidos nos acordos coletivos ou à existência de período por eles não abarcado, ônus que lhe incumbia. Ademais, não houve demonstração adequada de diferenças de horas extras não quitadas ou não compensadas, com base em todos os critérios estabelecidos nos acordos coletivos para os turnos praticados e para o pagamento/compensação da sobrejornada, mormente porque inexiste indicação do dispositivo normativo descumprido, conjuntamente ao apontamento matemático das supostas diferenças, omissão que prejudica a conferência. Registro que a amostragem do item 7 de fls. 988/989 (ID. 801f0b4 - Pág. 10 e 11) não é capaz de demonstrar a existência de incorreção no pagamento da hora extra, porque ela foi cumprida em período diurno (dia 15/05; fl. 786 - ID. fe24982 - Pág. 7) e, assim, não deve ter o adicional noturno incluído em sua base de cálculo. De igual forma, caberia à reclamante demonstrar a incorreção nos pagamentos do adicional noturno, apontando a inexistência da norma coletiva suscitada ou a constatação de eventuais diferenças, levando em consideração o que estabelecem os instrumentos coletivos incidentes, o que não fez. Destaco que o apontamento realizado nas fls. 984/986 (ID. 801f0b4 - Pág. 6 a 8) não observa o disposto na norma coletiva acerca do adicional noturno (isto é, que o pagamento já engloba a redução da hora noturna; cláusula nona de fl. 138 - ID. c69ed5f - Pág. 3, por amostragem), por isso, majora o quantitativo, não sendo apto a comprovar as incorreções alegadas. Quanto ao intervalo intrajornada, as testemunhas ouvidas afirmaram que não havia óbice para a sua fruição regular, pelo que se infere que a autora usufruía de 01h de pausa intervalar intrajornada diária no turno administrativo (com jornada diária de 8h) e de 15 minutos nos turnos de revezamento (com jornada diária de 6h). Ressalto que a testemunha Arnézio Raimundo do Prado disse que “teve um período que o intervalo era só para lanche; na maioria das vezes comia enquanto aguardava o caminhão ser carregado; isso era na jornada de seis horas (...) se parasse às 11h retomava a direção do veículo às 12h (...) não tinha fiscalização do intervalo pela reclamada” e a testemunha Tassiana Barbosa Ramos Vieira asseverou que “trabalhou no turno de 6h; a depoente sempre fez o intervalo, que era de 15 minutos; podia fazer o intervalo no equipamento ou descer e escolher um local; podia escolher; desligava o equipamento para fazer esse intervalo (...) no turno de 8h o intervalo era de 1h e dava para fazer (...) no turno administrativo o intervalo era de 01h (...) os tempos de intervalo citados eram para todos” (fls. 1098/1101 - ID. 4aa9ff2). Impende registrar que a autora não demonstrou que a jornada no turno contratual de 6h fosse extrapolada para além do que permite o artigo 58, § 1º, da CLT, ônus sob sua incumbência, não havendo falar, portanto, em exigência de intervalo intrajornada de 1h, nesse particular. Relativamente ao intervalo interjornadas, incumbia à reclamante a demonstração do seu prejuízo, a partir dos cartões de ponto ora acolhidos, ônus do qual não se desvencilhou. Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos de horas extras decorrentes de sobrejornada e violação dos intervalos intrajornada/interjornada, e adicional noturno. Por outro lado, no tocante à alegação de que as integrações dos adicionais noturnos nas demais parcelas não foi correta, a autora logrou êxito em comprová-la, conforme amostragem da tabela de fl. 983 (ID. 801f0b4 - Pág. 5), pelo que julgo procedente o pedido de diferenças das repercussões de adicional noturno em repousos semanais remunerados/feriados, 13ºs salários, férias com 1/3 e FGTS, a se apurar em liquidação. Indevidas as repercussões pretendidas em aviso prévio indenizado e multa de 40% do FGTS, pois a dispensa da autora foi declarada nula, com chancelamento da decisão liminar de reintegração, conforme será analisado em tópico próprio desta decisão. Improcedem os demais pedidos de reflexos, quer porque foram postulados genericamente, quer porque não houve pagamento das parcelas principais, quer porque postulados sobre parcelas previstas em norma coletiva, sem especificação do instrumento/cláusula, ônus da autora. Autorizo a dedução das repercussões de adicional noturno pagas, na forma da OJ nº 415 da SDI-1 do TST (aplicação analógica). PLR Em relação à PLR 2015, o direito encontra-se abarcado pela prescrição (fls. 217/223 - ID. 20467ac), não havendo falar em qualquer pagamento, ante a sua extinção (conforme fundamentado em tópico próprio desta decisão). No que tange às PLRs 2016 e 2017, a reclamada afirmou o seu correto pagamento e a autora não impugnou essa assertiva em réplica. E quanto às PLRs 2018 e 2020, ante a alegação patronal de que a empregada não fez jus ao pagamento correspondente por estar afastada do trabalho em razão de doença, caberia à reclamante a demonstração de sua elegibilidade, a partir do que preveem as normas coletivas da categoria, o que não fez. Julgo, pois, improcedentes os pedidos relativos às PLRs 2016, 2017, 2018 e 2020. Noutra ponta, a reclamada aduziu que não houve o pagamento da PLR 2019 à reclamante, porquanto ela estava afastada por doença durante o período de apuração e o instrumento normativo da categoria afasta o direito nesse caso. Logo, a empregadora admitiu a existência de previsão coletiva de pagamento da PLR 2019, contudo, não apresentou o instrumento normativo correlato, não sendo possível certificar os dados que definem as regras de pagamento da PLR 2019 e a veracidade da alegação patronal. Portanto, julgo procedente o pedido de pagamento da PLR 2019 à reclamante, observando-se, no mais, os termos e condições previstas nas normas coletivas respectivas. DANOS MORAIS / ASSÉDIO SEXUAL O assédio moral tem sido objeto de estudo de vários autores, nacionais e internacionais. Na França, Marie-France Hirigoyen, precursora no seu estudo, publicou livro em que o definiu como sendo “fruto de um processo inconsciente de destruição psicológica, constituindo-se, tal processo, de atos hostis mascarados ou implícitos, de um ou vários indivíduos sobre um indivíduo específico, por meio de palavras, alusões, sugestões de ‘não-ditos’”. Conceitua-o como sendo “qualquer conduta abusiva que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”. No Brasil, Rodolfo Pamplona Filho conceitua o assédio moral como “uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social”. Para Márcia Novaes Guedes, o assédio moral ou mobbing, “significa todos aqueles atos comissivos ou omissivos, atitudes, gestos e comportamentos do patrão, da direção da empresa, de gerente, chefe, superior hierárquico ou dos colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes à condições físicas, psíquicas, morais e existenciais da vítima” (Terror psicológico no trabalho, 2ª edição, abril/05, p. 32). Entre as espécies de assédio moral há o vertical e o horizontal. O primeiro pode ser descendente, praticado de superior para subalterno hierárquico, ou ascendente, que é o praticado pelos subordinados em relação a um chefe. O segundo é o que se dá entre colegas de trabalho, sem relações de hierarquia, que estão no mesmo plano na organização empresarial. Já o assédio sexual, segundo a doutrina, é toda conduta de natureza sexual não desejada que, embora repelida pelo destinatário, é continuadamente reiterada, cerceando-lhe a liberdade sexual. No âmbito das relações trabalhistas, o assédio sexual não se limita apenas à conduta tipificada no artigo 216-A do Código Penal, caracterizado pelo constrangimento reiterado com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual. O assédio sexual vincula-se a condutas não desejadas e desagradáveis para o receptor, que apesar de não correspondidas, lhe são impostas. O assédio sexual narrado na inicial é incontroverso e, conforme tese da defesa, o empregado assediador (Rodrigo Xavier) foi dispensado por justa causa, após a conclusão do inquérito civil 00197.2018.03.004/4 - “onde se confirmaram provas cabais para a aplicação da justa causa do autor, vez que comprovado a ocorrência de assédio contra a funcionária, lastreando a modalidade de dispensa aplicada”. O boletim de ocorrência de fls. 52/54 (ID. aafd139) demonstra que a autora noticiou o fato à Polícia Militar em 03.11.2017 e, apesar de a reclamada afirmar que realizou uma sindicância depois de tomar ciência desse documento policial, não apresentou nenhuma comprovação disso. De toda forma, é de se espantar que a empresa desejasse realizar uma acareação entre a vítima e o suposto assediador, contrariando todas as boas práticas de investigação em situações dessa natureza, que devem buscar evitar a revitimização da mulher, como nesse caso: um encontro que lhe causaria mais constrangimento, sofrimento e danos psicológicos. Não há como responsabilizar a vítima pela falha patronal na sindicância - a qual, repito, não foi comprovada. Inclusive, a testemunha Arnézio afirmou que “trabalhou com Rodrigo Xavier; ele era encarregado de turno; na época da autora ele era encarregado; o depoente trabalhava no CMA e Rodrigo era operador de máquina, mas depois ele passou para encarregado (...) presenciou uma situação específica que foi a seguinte: num turno amanhecendo e o equipamento do depoente estava na oficina; o depoente ficou aguardando, a autora também estava sem equipamento; o depoente e a autora estava fumando no local próprio; a autora foi para o vestiário, dizendo que fora estava frio; passou um tempo o Rodrigo encostou a caminhonete no escritório, veio e entrou dentro do vestiário feminino; passaram uns 20/30 segundos ela saiu correndo e o depoente perguntou o que foi e ela disse que Rodrigo tinha tentado ‘agarrar ela’; depois disso a autora ficou um tempo afastada (...) a reclamada não procurou o depoente para apuração dos fatos ocorridos com a autora” (fls. 1099/1100 - ID. 4aa9ff2). Ademais, o Sr. Rodrigo Xavier só foi dispensado por justa causa em 15.01.2020 (fls. 923/924 - ID. 13719b0), mesmo que o Ministério Público do Trabalho tenha notificado a reclamada em 25.07.2019 para informá-la acerca da conclusão de que ele teria praticado assédio moral e sexual contra a reclamante (fls. 493/497 - ID. 70b4666 e ID. 3cf3404). Ante o exposto, houve comprovação do assédio sexual e o assediador não sofreu, de imediato, nenhum revés em sua situação na empresa, que não adotou medida tendente a fazer cessar tais comportamentos impróprios ao ambiente de trabalho. Como é sabido, é responsabilidade do empregador fornecer ambiente de trabalho seguro e sadio, isento de perseguições e humilhações, explícitas ou veladas. Não o fazendo, resulta sua culpa, objetivamente pela falta de um ambiente de trabalho sadio para a autora. O ambiente de trabalho na reclamada não observou estas premissas em relação à reclamante, causando-lhe danos de ordem imaterial, pelo constrangimento, já que a situação excede o mero aborrecimento ou dissabor, com reflexos na saúde mental, conforme resultado pericial (fl. 1152 - ID. 41d7ee0). Se o ambiente de trabalho é agressivo e hostil, ainda que disso não participe diretamente as chefias ou proprietários da empresa, a responsabilidade continua sendo do ente corporativo, que tem como parte de sua estrutura os empregados participantes da prática ilícita. A conduta do empregado da reclamada, capaz de agredir a personalidade da autora, atrai a responsabilidade patronal, por força do disposto no artigo 932, III do CCB, responsabilidade esta que é objetiva (artigo 933 do CCB), inclusive quando isso ocorre em razão do trabalho. O dano moral é aquele que atinge bens imateriais da vítima, como a honra, o decoro, a boa fama, a imagem, a intimidade ou qualquer outro inerente à personalidade, como no presente caso. Trata-se de dano que existe “in re ipsa”, porque não requer prova da dor, do sofrimento, do constrangimento, todos aspectos que se passam no âmbito íntimo da pessoa. Daí dizer-se que o dano moral decorre “ipso facto” da conduta lesiva. Diante disso e considerando que a quantificação do dano moral deve atender às necessidades do ofendido e aos recursos do ofensor, de modo que o valor da indenização não se torne demasiadamente alto, acarretando um enriquecimento sem causa daquele que a recebe, mas também não tão insignificante a ponto de ser inexpressivo para quem o paga, tendo em vista o caráter lenitivo da indenização para o ofendido e o escopo inibidor de reiteração da conduta faltosa pelo ofensor, bem como o período da lesão, fixo o valor da compensação em R$15.000,00. A atualização da indenização por dano moral será a partir da data desta sentença (Súmula 439 do TST). DANOS MORAIS / ASSÉDIO MORAL No presente caso, ficou comprovado, pelo depoimento da testemunha Arnézio, que após o retorno da autora do afastamento previdenciário “ela não mais operou, ou seja, não mais guiou o veículo; ela ficava aguardando um local, num banco; no entender do depoente ‘deram um castigo nela’” (item 8 de fl. 1099 - ID. 4aa9ff2). Ressalto que a obreira, de fato, retornou ao trabalho entre um afastamento previdenciário e outro (fl. 804 - ID. fe24982 - Pág. 25, por amostragem). Ora, os danos gerados pelos fatos constatados são presumíveis, estando implícitos na própria gravidade do ato ilícito verificado, que afeta o equilíbrio psicológico, o bem-estar e a normalidade da vida, em face da ociosidade à qual a obreira foi submetida. Isso porque lhe foi retirado o sentimento de ser útil, somado aos olhares questionadores dos colegas (como da própria testemunha acima referida). Está presente a culpa da reclamada, que negligenciou em seu dever de fornecer trabalho à autora, dentro do que era esperado e foi contratado, que é uma das principais obrigações do contrato, retirando-lhe perspectivas no âmbito laboral. Nada justifica manter um trabalhador sem atribuições. Seja pelo decurso do tempo sem acesso ao labor, para além do razoável, seja em razão de olhares desaprovadores, referida situação expôs a reclamante a constrangimento perante os colegas de trabalho, causando-lhe ofensa em sua honra, imagem e dignidade. Nesse sentido, são reiteradas as decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, a exemplo do acórdão abaixo citado: OCIOSIDADE FORÇADA. AFETAÇÃO DA DIGNIDADE, AUTOESTIMA, SAÚDE MENTAL E RECONHECIMENTO SOCIAL DO TRABALHADOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. I - Não se admite o contrato de inação e a submissão de empregados aptos para o trabalho ao ócio contínuo durante sua jornada laboral.Com efeito, o esvaziamento das funções, com colocação do reclamante em posição de ociosidade, à espera de recolocação em novo posto de trabalho, por meses, atenta contra a preservação da dignidade humana (art. 1o, III, da CF), afetando sobremaneira a autoestima, saúde mental e reconhecimento social do trabalhador. II- O fato de o reclamante receber "normalmente seus ganhos mensais", durante o período em que foi relegado a uma situação de inação, não eliminam o abuso do poder diretivo pelo empregador no uso de suas prerrogativas direcionadas à organização da estrutura e do processo de trabalho adotado no estabelecimento, no que tange à prestação de serviços - " destinação correta das energias de trabalho " - contraposta ao pagamento dos salários, bem como a violação da dignidade, da integridade psíquica e do bem-estar individual do trabalhador - bens imateriais que compõem seu patrimônio moral protegido pela Constituição - , circunstâncias capazes de gerar constrangimento passível de indenização (RRAg-1001657-79.2016.5.02.0466, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 19/04/2024). III- Induvidosa a prática discriminatória adotada pela ré, sendo devida a indenização por danos morais daí decorrentes, conforme arts. 186 e 927 do Código Civil, e 223-B, 223-C e 223-G da CLT. Ante as premissas já referidas no tópico precedente, fixo o valor da compensação em R$5.000,00. A atualização da indenização por dano moral será a partir da data desta sentença (Súmula 439 do TST). DOENÇA OCUPACIONAL Como é sabido, em seu artigo 7º, XXVIII, a Constituição Federal de 1988 assegura aos trabalhadores urbanos e rurais o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa. O aludido seguro contra acidentes de trabalho (SAT), agora com denominação de RAT (Risco de Acidente de Trabalho), é calculado sobre a folha de salários da empresa e recolhido à Previdência Social para o custeio dos benefícios pagos em casos de acidentes de trabalho, os quais são devidos sem se cogitar da existência de culpa patronal. A previsão constitucional e a contribuição do empregador para o seguro contra acidentes de trabalho afastam a possibilidade de reconhecimento de responsabilidade patronal objetiva em caso de acidente de trabalho ou doença ocupacional. Mesmo se entendendo de forma diversa, não estamos diante de situação que autorize a aplicação da responsabilidade objetiva do empregador, ainda que por analogia ao disposto no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil. Em suma, o dever de reparação por danos materiais e morais decorrentes, requer a comprovação do acidente de trabalho/doença ocupacional, os danos efetivamente sofridos, o nexo causal e a culpa ou o dolo do empregador pelo ilícito. Pois bem. Para apuração da alegada doença ocupacional foi determinada a realização de perícias médicas. Os peritos médicos do Juízo, após examinarem a reclamante, analisarem as atividades por ela desenvolvidas, sua história clínica e documentos carreados aos autos, concluíram que (fl. 1029 - ID. 19f8397; fl. 1060 - ID. d54f76e; fl. 1152 - ID. 41d7ee0): “VIII – CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÃO: A Reclamante alega que em decorrência de assédio por parte de seu superior desenvolveu distúrbios psiquiátricos diagnosticados como estado de estresse pós-traumático e transtorno de ansiedade e que consequentemente estaria incapacitada para o trabalho. Primeiramente os transtornos da Reclamante têm origem multicausal, com fatores hereditários, endógenos e de susceptibilidade individual. Os fatos ocorridos no trabalho podem ter agido apenas como um gatilho, ou seja, concausa, mas necessita de comprovação por outros meios de prova da alegação de assédio, para que possa estabelecer a real relação dos transtornos como o trabalho. Diante do diagnóstico de distúrbios psiquiátricos a Reclamante procurou atendimento especializado, iniciou tratamento protocolar, ficando licenciada em benefício previdenciário (INSS) pelo tempo necessários para sua estabilização clínica e emocional com recuperação de sua aptidão laboral. A manutenção do tratamento ainda é necessária, mas não impede a Reclamante de realizar suas atividades laborativas, autonômicas, sócias e de lazer.” “1) Pode o senhor Perito descrever se o Reclamante é portador de alguma patologia? Resposta: Desenvolveu distúrbios psiquiátricos diagnosticados como estado de estresse pós-traumático e transtorno de ansiedade 2) Descreva desde quando o Reclamante é portador da suposta patologia relacionada ao trabalho. Resposta: aproximadamente agosto/2017” “Discussão e Conclusão Psiquiátrica-Forense Do exposto, extrai-se que o periciando apresenta quadro composto predominantemente por sintomas depressivos e ansiosos, porém de forma insuficiente para preencher, isoladamente, o diagnóstico de Episódio Depressivo ou de Transtorno de Ansiedade Generalizada. A tal patologia dá-se o nome de Transtorno Misto de Ansiedade e Depressão, classificado, de acordo com a 10ª edição da Classificação Internacional de Doenças, como CID 10 F 41.2. Pericianda apresenta tal patologia há aproximadamente 8 anos, iniciando os sintomas logo após o referido assédio. Conclui-se, ainda, que há nexo concausal com o referido assédio.” Em relação ao laudo pericial de Cláudio Rodrigues Pereira Galizzi, as partes o impugnaram, inicialmente, porém, após a apresentação das respostas do perito aos quesitos suplementares, não mais se insurgiram. Já no tocante à conclusão pericial do Dr. Neiber Fausto de Azevedo Silva, houve discordância parcial da autora e discordância integral da reclamada. Contudo, os laudos dos peritos judiciais encontram-se bem elaborados, com ampla e detalhada fundamentação, e, apesar de o Juiz não estar a eles adstrito, podendo adotar solução diversa daquela contida nas provas técnicas, não há outras provas nos autos que as infirmem, sendo importante registrar que tiveram resultados equivalentes. A documentação médica apresentada com a inicial, impugnada de forma genérica pela reclamada (sem alegação de vícios de vontade que lhes retire a validade), corrobora os resultados periciais, comprovando que, após o assédio sexual, a reclamante foi diagnosticada com estresse pós-traumático, sintomas depressivo-ansiosos intensos e pânico. Ademais, os depoimentos da própria vítima (fls. 498/500 - ID. e4208a4), de Arnézio Raimundo do Prado (fls. fls. 501/502 - ID. e593a87) e de Paulo Márcio Leão (fls. 503/504 - ID. fddeb86) ao Ministério Público do Trabalho demonstram o quanto ela foi perseguida e ficou abalada com o assédio sexual sofrido, tendo, inclusive, que alterar a sua rotina pessoal diária para evitar o contato com o assediador. Portanto, não há dúvidas do nexo concausal entre as doenças psiquiátricas de que padece a reclamante e o assédio sexual sofrido nas dependências da reclamada. Ante o exposto, tenho por presentes o ilícito, o nexo causal e a culpa. Sucumbente no objeto relativo às perícias médicas, a reclamada arcará com os honorários periciais, ora arbitrados em R$1.500,00 para cada um dos peritos, atualizáveis até final pagamento, na forma da OJ 198 da SDI-1 do TST. REINTEGRAÇÃO / ESTABILIDADE / ARTIGO 118 DA LEI 8.213/91 Em decorrência do reconhecimento da doença ocupacional (nexo concausal) e nos termos da Súmula 378 do TST, tem direito a autora à estabilidade provisória prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91 (por doze meses após a cessação do benefício previdenciário) e, por isso, não poderia ter sido dispensada em 20.04.2021, pelo que declaro nula essa dispensa. Em virtude da decisão de fls. 73/76 (ID. f5847ab), a qual fica aqui chancelada, a reclamante foi reintegrada ao emprego em 29.06.2021 (fl. 213 - ID. edf4fa7), nas mesmas condições existentes na data da dispensa, sem notícias de novo término contratual. Remanesce, assim, o prejuízo dos salários e consectários referentes ao período de 21.04.2021 a 28.06.2021, pelo que julgo procedente o pedido de pagamento à autora dos salários devidos para a função (mês a mês apurado), mais a média das parcelas variáveis recebidas, desde o dia posterior à dispensa (21.04.2021) até a sua reintegração (29.06.2021), além de 13º salário, FGTS e férias com 1/3 desse mesmo período, por força do dever de restituição integral, conforme se apurar em liquidação. A fim de se evitar o enriquecimento ilícito da autora, deverão ser deduzidas da presente condenação as verbas rescisórias (“stricto sensu”) a ela pagas (fls. 49/50 - ID. 3cad391), a título de aviso prévio (e suas projeções: rubricas 69, 70 e 71 do TRCT) e multa de 40% sobre o FGTS, ficando ativo o vínculo como se dispensada não tivesse sido naquela data. Eventual terminação do contrato a partir de agora fica sob o direito potestativo de cada parte se ausente impedimento legal. Caso os valores pagos sejam superiores aos créditos da autora nestes autos, fica autorizada a dedução do remanescente quando da terminação do contrato dela (fato que virá a ocorrer no futuro), ficando vedada a cobrança nos autos para além do seu crédito. Deverá ser observada a Súmula 187 do TST e a dedução dos valores deverá ocorrer na data do acerto rescisório, quando ocorrer. Sobre eventual remanescente incidirá apenas a correção monetária, sem juros de mora. Caso a autora, espontaneamente, queria fazer o pagamento da dívida, evitando o arrastamento dela para o futuro, fica autorizada. COMPLEMENTAÇÃO DO AUXÍLIO DOENÇA A cláusula vigésima quinta do ACT 2016/2017 (fls. 145/146 - ID. c69ed5f - Pág. 10 e 11), aplicável ao caso, prevê o pagamento de complementação do auxílio doença durante os doze primeiros meses do afastamento, assim considerando a diferença relativa à remuneração integral do empregado afastado e o benefício previdenciário efetivamente recebido. Ante o exposto, comprovado o início do recebimento do auxílio doença pela autora no período de vigência da norma coletiva em questão, sem comprovação de sua inelegibilidade pela empregadora, é devido o benefício complementar à obreira. Logo, julgo o pedido de complementação do auxílio doença procedente, nos termos previstos no ACT 2016/2017, a se apurar em liquidação. DANOS MATERIAIS Não há falar em pensão vitalícia, na medida em que não houve perda ou redução da capacidade laboral, pelo que julgo improcedente esse pedido. Contudo, a autora tem direito à indenização dos salários que deixou de receber ao longo da convalescença/recuperação. Assim, é devida a indenização dos períodos dos afastamentos da autora, relativos à doença ocupacional ora reconhecida (distúrbios psiquiátricos diagnosticados como estado de estresse pós-traumático e transtorno de ansiedade), de 14.08.2017 (fl. 63 - ID. c456851) até a alta previdenciária correlata (a se apurar a partir dos períodos descritos na declaração de benefícios previdenciários da autora e dos laudos periciais do INSS, a serem juntados aos autos na fase de liquidação). Essa indenização não se confunde com o pagamento feito a título de benefício previdenciário, visto que possuem causas distintas. O primeiro fundado na responsabilidade civil do empregador e o segundo na responsabilidade objetiva do órgão previdenciário, para quem empregado e empregador contribuíram durante a relação de emprego. Nesse sentido, a parte final do artigo 7°, XXVIII, da CR/88 e o artigo 121 da Lei 8.213/91. Essa indenização equivale ao que a autora deixou de ganhar enquanto estava recebendo benefícios previdenciários em virtude da doença ocupacional, devendo corresponder ao salário devido para a função (mês a mês apurado), mais a média das parcelas variáveis recebidas nos 3 meses inteiros anteriores ao início do benefício, por força do princípio da restituição integral. DANOS MORAIS A Constituição da República protege os direitos imateriais (artigos 5º, V e X da CR/88), como corolário da dignidade da pessoa humana, princípio basilar da ordem jurídica e fundamento do Estado Democrático de Direito (artigo 1°, III, da CR/88). Por isso, causada a lesão de forma culposa, tem o lesado direito à reparação por danos morais. O dano moral é dano “in re ipsa”, porque emerge como consequência natural do fato capaz e suficiente para causá-lo. Não requer, portanto, prova de sua ocorrência, porque resulta da dor, sofrimento, angústia e irresignação, sentidos na alma, que é o que ordinariamente ocorre. É dano provocado em direitos extrapatrimoniais, sem aferição econômica, mas da esfera personalíssima do indivíduo, tutelados constitucionalmente (artigo 5°, V e X, da CR/88). Nesse sentido leciona Sérgio Cavalieri: “O dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ato ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras de experiência comum”. (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil, 2007, p. 83.) No caso, o dano moral é inerente ao próprio fato da doença ocupacional, que, notoriamente, causa dor e angústia, não necessitando de prova, ainda que não tenha havido perda/redução permanente da capacidade laborativa. De todo modo, o assédio sexual sofrido pela reclamante, o tempo de afastamento e a manutenção dos sintomas até os tempos hodiernos permitem inferir o sofrimento pelo qual ela passou e ainda passa. Considerando que a quantificação do dano moral deve atender às necessidades do ofendido e aos recursos do ofensor, de modo que o valor da indenização não se torne demasiadamente alto, acarretando um enriquecimento sem causa daquele que a recebe, mas também não tão insignificante a ponto de ser inexpressivo para quem o paga, tendo em vista o caráter lenitivo da indenização para o ofendido e o escopo inibidor de reiteração da conduta faltosa pelo ofensor, fixo o valor da compensação em R$30.000,00. A correção monetária em relação à indenização pelo dano moral incidirá a partir dessa decisão e os juros serão contados desde o ajuizamento da ação (Súmula 439 do TST). LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Não vislumbro situação no processo que se enquadre nas hipóteses de litigância de má-fé, tendo a reclamante exercido seu direito de ação sem abuso, sob sua perspectiva da relação controvertida. Indefiro. GRATUIDADE DE JUSTIÇA Nos moldes do que preceitua o artigo 790, § 3°, da CLT, é facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Considerando que não há provas de que o reclamante aufira rendimento superior a 40% do teto do Regime Geral de Previdência Social, artigo 790, § 3º, da CLT, bem como a declaração de miserabilidade jurídica (fl. 45 - ID. 5634a18), que possui presunção de veracidade, não ilidida por outros meios de prova, defiro ao autor, com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 790 da CLT, o benefício da justiça gratuita. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Condeno a reclamada a pagar honorários advocatícios a favor do advogado do reclamante, no importe equivalente a 5% sobre o crédito apurado em liquidação, observado o teor da OJ 348 da SDI-1 do TST. Condeno o autor a pagar aos advogados da reclamada honorários de 5% sobre o valor dos pedidos julgados integralmente improcedentes. A exigibilidade fica suspensa, visto que a parte autora é beneficiária da justiça gratuita, conforme acórdão proferido na ADI 5766/STF e Recl. 60.142/STF. OUTROS PARÂMETROS DE LIQUIDAÇÃO Autoriza-se a dedução de valores recebidos pela autora, evitando o enriquecimento sem causa, conforme acima especificado. A correção monetária será aplicada observando o decidido pelo STF nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 58 e 59 e Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 5867 e 6021, quando definiu que na atualização do crédito trabalhista deve ser aplicado o índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) na fase pré-judicial (aquela compreendida entre o vencimento da obrigação e o momento da citação), e, a partir da citação, a taxa Selic, esta já englobando os juros de mora. Em face da particularidade trabalhista, em que os juros de mora são devidos desde o ajuizamento da ação, este será o marco inicial de aplicação da Selic. Observe-se a OJ 302, da SDI-1, do TST, para atualização do FGTS. Nos termos da tese vinculante definida pelo TST em fevereiro/25 e diante dos termos do artigo 26 da Lei 8.036/90, os valores devidos a título de FGTS (parcelas principais e/ou reflexas) deverão ser depositadas em conta vinculada da autora (já existente ou a ser aberta para esse fim). A reclamada recolherá e comprovará nos autos, sob pena de execução, as contribuições previdenciárias incidentes sobre as parcelas salariais da condenação, cota patronal e do empregado. As contribuições devidas pela parte autora serão deduzidas do seu crédito. As parcelas de natureza indenizatória não sofrem incidência dessas contribuições, mesmo quando apuradas como reflexos de outros títulos, quais sejam: férias com 1/3 indenizadas; FGTS; PLR 2019; indenização por danos morais; complementação do auxílio doença; indenização dos períodos dos afastamentos da autora, relativos à doença ocupacional ora reconhecida. A retenção do imposto de renda é obrigatória, conforme determinado na Lei 8.541/92, em seu art. 46 e art. 43 da Lei 8.212/91, ficando desde já autorizado. Será deduzido do crédito do reclamante e recolhido o imposto de renda devido na fonte sobre os honorários advocatícios sucumbenciais, na forma legal, observado o Decreto 9.580/2018, as IN 1500/2014 e 1928/2020 da RFB, o teor da OJ 400 da SBDI-1 do TST e Súmulas 125 e 386 do STJ. A falta de recolhimento do imposto de renda, quando devido, importará em ofício à Receita Federal. PROVIMENTOS FINAIS Objetivando evitar atos processuais desnecessários, com dispêndio para as partes e para a máquina judiciária, ressalto que o juiz não está adstrito à manifestação sobre todos os pontos levantados pelos litigantes, mas tão somente à indicação dos motivos determinantes da sua convicção. A lei processual não prevê a possibilidade do juiz, depois de publicar a sentença, modificá-la em sede de embargos de declaração para retificar alegado erro na apreciação das provas ou na aplicação do direito. Eventual recurso ordinário devolverá ao Tribunal a apreciação de todas as questões, consoante o artigo 1013, Código de Processo Civil, de inegável aplicação subsidiária. ARTIGO 523 DO CPC A discussão sobre eventual aplicação do artigo 523 do CPC é afeta à fase de execução, se for o caso. III. CONCLUSÃO Ante o exposto na fundamentação supra, que integra este dispositivo: 1) rejeito as preliminares arguidas; 2) pronuncio a prescrição das pretensões exigíveis anteriores a 08.06.2016, extinguindo o processo, com resolução do mérito, quanto a elas; 3) julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por VANESSA MARIA GONÇALVES, condenando a reclamada MOSAIC FERTILIZANTES P&K LIMITADA, a pagar-lhe, após o trânsito em julgado, no prazo legal, as seguintes parcelas: a) diferenças das repercussões de adicional noturno em repousos semanais remunerados/feriados, 13ºs salários, férias com 1/3 e FGTS; b) PLR 2019; c) indenização por danos morais (R$15.000,00), pelo assédio sexual; d) indenização por danos morais (R$5.000,00), pelo assédio moral; e) complementação do auxílio-doença; f) indenização dos períodos dos afastamentos da autora, relativos à doença ocupacional ora reconhecida, até a alta previdenciária; g) indenização por danos morais (R$30.000,00), pela doença ocupacional. Os valores serão apurados em regular liquidação, com juros e correção monetária, na forma dos fundamentos. Autoriza-se a dedução de valores recebidos pela autora, evitando o enriquecimento sem causa, conforme acima especificado. Honorários advocatícios, imposto de renda, contribuição previdenciária e demais parâmetros de liquidação também conforme a fundamentação. Concedida à reclamante a gratuidade de justiça. A reclamada arcará com os honorários periciais médicos, ora arbitrados em R$1.500,00 para cada um dos peritos, com atualização na forma da OJ 198 da SDI-1 do TST. Nos termos da tese vinculante definida pelo TST em fevereiro/25 e diante dos termos do artigo 26 da Lei 8.036/90, os valores devidos a título de FGTS (parcelas principais e/ou reflexas) deverão ser depositadas em conta vinculada da autora (já existente ou a ser aberta para esse fim). Custas processuais de R$2.000,00 pela reclamada, calculadas sobre R$100.000,00, valor ora arbitrado à condenação. Intimem-se as partes. Nada mais. vpo/jdrn ARAXA/MG, 02 de julho de 2025. VANDERSON PEREIRA DE OLIVEIRA Juiz Titular de Vara do Trabalho
Intimado(s) / Citado(s)
- VANESSA MARIA GONCALVES
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