Processo nº 5000869-83.2024.8.21.0127
ID: 280890553
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 22ª Câmara Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5000869-83.2024.8.21.0127
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EDSON JOSÉ MARCHIORI
OAB/RS XXXXXX
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Apelação Cível Nº 5000869-83.2024.8.21.0127/RS
TIPO DE AÇÃO:
Padronizado
RELATORA
: Desembargadora MARILENE BONZANINI
APELANTE
: VITORIA GABRIELA MACHADO COLOMBELLI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º C…
Apelação Cível Nº 5000869-83.2024.8.21.0127/RS
TIPO DE AÇÃO:
Padronizado
RELATORA
: Desembargadora MARILENE BONZANINI
APELANTE
: VITORIA GABRIELA MACHADO COLOMBELLI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (REQUERENTE)
ADVOGADO(A)
: EDSON JOSÉ MARCHIORI (OAB RS060915)
EMENTA
APELAÇÃO cível. DIREITO À SAÚDE. ECA. MEDICAMENTOS INCORPORADOs AO SUS para a doença indicada e ainda sem disponibilização: dupilumabe. PORTARIA SECTICS/MS Nº 48/2024. TEMA Nº 1.234 DO STF. PROCESSO AJUIZADO ANTES DE 19/09/2024. COMPETÊNCIA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO COM A UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO DE SUSCITAÇÃO DE CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CONFIRMAÇÃO DO IMPEDIMENTO EM PRECEDENTE RECENTE DO STF. QUESTÃO DE FUNDO. aplicação da diretriz do item 'VI' da tese supracitada. observância aos fluxos acordados. Medicamento com responsabilidade financeira ainda não pactuada na CIT. necessidade e hipossuficiência financeira comprovadas. sentença de procedência.
- O Tribunal Pleno do STF, em 13/09/2024, à unanimidade, definiu a questão afetada no Tema nº 1.234 ao homologar, em parte, três acordos extrajudiciais firmados entre os entes federados. O primeiro dos acordos diz respeito à competência jurisdicional e teve marco de incidência definido como a data da publicação do resultado de julgamento de mérito no DJE, a qual ocorreu em 19/09/2024, porém vedou a possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao marco jurídico definido. Impedimento explicitado pelo STF em julgado posterior.
- Segundo o conceito lançado no Tema nº 1.234 do STF, o medicamento já analisado pela CONITEC, com decisão de incorporação, mas ainda não efetivamente disponibilizado e sem responsabilidade financeira pactuada pela CIT, é considerado incorporado ao SUS. Nestes casos, a análise judicial deve ser feita mediante as regras do item 'VI' da tese supracitada.
- Situação dos autos em que a parte autora demonstrou a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS e a ineficácia das alternativas disponíveis na rede pública de saúde, mediante a juntada de laudo fundamentado e circunstanciado, bem como a hipossuficiência financeira para aquisição particular.
- Sentença de procedência. Sucumbência redimensionada.
APELAÇÃO PRovida.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de apelação interposta por
V. G. M. C.
, menor representada pela genitora, nos autos da ação para fornecimento do medicamento Dupilumabe que move em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, contra sentença de improcedência (
evento 49, SENT1
).
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação alegando a insuficiência da Nota Técnica do NATJUS como fundamento para improcedência do pedido. Afirmou que o parecer supracitado
não tem força vinculativa e não pode se sobrepor à prescrição médica fundamenta
. Referiu que
a negativa do fornecimento de medicamento não pode estar fundamentada exclusivamente em parecer técnico do NatJus, sendo necessária análise caso a caso, conforme a necessidade do paciente
, o que não ocorreu no caso dos autos. Mencionou que as alternativas disponíveis no SUS não têm a mesma eficácia clínica do fármaco requerido. Sustentou a incorreta aplicação do princípio da reserva do possível. Aduziu que
a sentença violou o direito fundamental à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal.
Pediu provimento.
O apelado apresentou contrarrazões defendendo a aplicação imediata dos requisitos exigidos pelo Tema nº 06 do STF aos processos em curso. Observou a conclusão desfavorável da Nota Técnica confeccionada no caso concreto. Referiu que estaria cumprindo a política pública de distribuição de medicamentos. Pugnou pelo desprovimento do recurso.
Subiram os autos a este Tribunal.
Houve redistribuição por sorteio.
O Ministério Público opinou pelo provimento do apelo.
Vieram conclusos.
É a síntese.
Decido.
Efetuo julgamento monocrático
com fulcro no art. 206, XXX V e XXXVI, do RITJRS e 932, III, do CPC. Registro que não se trata de mera faculdade, mas de imposição legal (art. 139, II, CPC), que vem a concretizar as garantias constitucionais da celeridade processual e duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF).
No caso dos autos, a parte autora tem 08 anos de idade (
evento 1, ANEXO3
) e busca o fornecimento do medicamento Dupilumabe para o tratamento de Dermatite Atópica Grave (CID10 L20) (
evento 1, LAUDO4
). A ação foi ajuizada em 09/04/2024 e a sentença proferida em 23/01/2025.
Pois bem.
O Tribunal Pleno do STF finalizou o julgamento virtual do Tema nº 1.234, em 13/09/2024, decidindo, à unanimidade, por negar provimento ao recurso extraordinário e por homologar, em parte, acordos firmados no curso dos autos do Tema supracitado. E sobre aquele relativo à competência, houve a seguinte modulação de efeitos, quanto às lides que buscam medicamentos:
"(...) Por fim, modulou os efeitos da presente decisão, unicamente quanto ao deslocamento de competência (item 1 do acordo firmado na Comissão Especial nesta Corte), determinando que somente se apliquem aos feitos que forem ajuizados após a publicação do resultado de julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico. (...)"
A publicação acima referida ocorreu em 19/09/2024, conforme consulta ao site da Suprema Corte, sendo este o marco para aplicação do primeiro acordo do Tema nº 1.234 do STF.
Em sede de embargos de declaração, a mesma Corte acolheu parcialmente o recurso da União para estender as determinações de competência aos medicamentos incorporados ao SUS:
Decisão
:
(ED-sextos) O Tribunal, por unanimidade, 1) não conheceu dos embargos opostos pelos
amici curiae
e por Vinícius Aluísio de Moraes, como assistente, por ausência dos requisitos legais; 2) rejeitou os embargos de declaração opostos pelo Estado de Santa Catarina, mas os acolheu a título de esclarecimentos e sem efeitos modificativos para constar do item 1, referente à Competência, a seguinte redação: 1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS e medicamentos oncológicos, ambos com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC; e
3) acolheu parcialmente os embargos opostos pela União, tão somente quanto à modulação dos efeitos da decisão no que se refere à competência, para abarcar também os medicamentos incorporados, devendo ser suprimido do Capítulo 5 do voto condutor do acórdão embargado a remissão ao
"item 1 do acordo firmado na Comissão Especial"
, por referir-se unicamente aos medicamentos não incorporados.
Consequentemente, os efeitos do tema 1234, quanto à competência, somente se aplicam às ações que forem ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico. Tudo nos termos do voto do Relator. O Ministro Luiz Fux acompanhou o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 6.12.2024 a 13.12.2024. (grifo meu)
Desta feita, restou esclarecido que não há mais diferenciação quanto à incidência do primeiro dos acordos fixados pela tese do Tema supracitado entre as lides que buscam
medicamentos não incorporados ou incorporados.
Todavia, outra questão relacionada à competência de julgamento acabou por gerar entendimentos divergentes pelos Julgadores. Explico.
No corpo do acórdão do Tema nº 1.234 do STF restou definido que os feitos ajuizados até o marco para aplicação do primeiro acordo - 19/09/2024 - deveriam atender os efeitos da Tutela Provisória Incidental anteriormente proferida. As determinações provisórias lá fixadas possibilitavam o encaminhamento de certas lides à Justiça Federal ante a necessidade de participação da União no polo passivo da demanda.
Assim foram resumidas:
"(...)
(i)
nas demandas judiciais envolvendo medicamentos ou tratamentos
padronizados
: a composição do polo passivo deve observar a reparticipação de responsabilidades estruturada no Sistema Único de Saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência, cabendo ao magistrado verificar a correta formação da relação processual, sem prejuízo da concessão de provimento de natureza cautelar ainda que antes do deslocamento de competência, se o caso assim exigir;
(ii)
nas demandas judiciais relativas a medicamentos
não incorporados
: devem ser processadas e julgadas pelo Juízo, estadual ou federal, ao qual foram direcionadas pelo cidadão, sendo vedada, até o julgamento definitivo do Tema 1234 de Repercussão Geral, a declinação da competência ou determinação de inclusão da União no polo passivo;
(iii) diante da necessidade de evitar cenário de insegurança jurídica, esses parâmetros devem ser observados pelo processos
sem sentença prolatada
; diferentemente, os processos
com sentença prolatada até a data desta decisão
(17 de abril de 2023)
devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução (adotei essa regra de julgamento em: RE 960429 ED-segundos Tema 992, de minha relatoria, DJe de 5.2.2021);
(iv) ficam mantidas as demais determinações contidas na decisão de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário.
(...)"
Alguns julgadores, porém, entendiam que prevalecia o disposto na tese, em si, onde determinado que não havia mais possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico.
A celeuma, portanto, veio resolvida por meio do recentíssimo julgado do Min. Gilmar Mendes, também relator do Tema nº 1.234:
Agravo regimental na reclamação. 2. Direito Constitucional e Administrativo. 3. Saúde. Fornecimento de medicamento. 4. RE 1.366.243 (Tema 1.234-RG) e Súmula Vinculante 60. 5. Medicamento incorporado pelo SUS. Grupo 1-A. Responsabilidade da União. Ação ajuizada na Justiça Estadual. 6. Modulação dos efeitos da decisão, complementada pelo julgamento dos embargos de declaração opostos pela União.
Medicamento incorporados e não incorporados. Alteração de competência apenas das ações ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento (19.9.2024). 7.
Ação ajuizada em 12.4.2024 e, portanto, antes do marco temporal. Manutenção do processo na Justiça Estadual
. 8. Negado provimento ao agravo regimental.
(Rcl 71705 AgR, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 22-02-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 28-02-2025 PUBLIC 05-03-2025) (grifo meu)
No corpo do voto, o Ministro relator deixou claro que a modificação da competência de julgamento somente deve ocorrer nas ações ajuizadas após o marco de 19/09/2024, devendo os feitos anteriores serem mantidos na Justiça onde tramitam. Ainda, extrai-se do julgamento que a limitação é aplicável ainda que se tratem de fármacos incorporados pelo SUS e financiados pela União, como é o caso concreto:
"(...)
Cumpre registrar que o medicamento Natalizumabe 300mg já foi incorporado pelo SUS, incluído no Grupo 1A do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica.
Diante do apresentado, entendo que é caso de manutenção dos autos na Justiça Estadual, tendo em vista a modulação do efeitos determinada pelo Pleno no julgamento do mérito do Tema 1.234 e complementada pelo julgamento dos embargos de declaração opostos pela União.
Conforme já demonstrado, modularam-se os efeitos da decisão para assentar que
apenas haverá alteração da competência, nos termos estabelecidos pelo referido paradigma, das ações ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento, que ocorreu em 19.9.2024, tanto para medicamentos incorporados quanto para medicamentos não incorporados.
Sendo assim, reitero que não obstante tratar-se de medicamento incorporado ao SUS e constante do Grupo 1A, a ação foi ajuizada, em 12.4.2024 (eDOC 2, p.1), antes, portanto, de 19.9.2024, de modo que o processo deve ser mantido na Justiça Estadual.
Ante o exposto,
nego provimento
ao agravo regimental.
(...)" (grifos originais)
No mesmo sentido:
AGRAVO INTERNO. APELAÇÕES CÍVEIS. DECISÃO MONOCRÁTICA. DIREITO À
SAÚDE
(ECA E IDOSO). ESTADO. PARTE AUTORA DIAGNOSTICADA COM RETINOPATIA DIABÉTICA. PLEITO DE DISPENSAÇÃO DO FÁRMACO AFLIBERCEPTE (LUCENTIS®). MEDICAÇÃO PREVISTA NO PCDT PARA O TRATAMENTO DE FINALIDADE DIVERSA (MOLÉSTIA CATALOGADA EM OUTRO CID). ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE
MEDICAMENTO
NÃO INCORPORADO AO SUS. INCIDÊNCIA DAS TESES FIXADAS NO RE 1.366.243 (TEMA 1234) E RE 566.741 (TEMA 06). SÚMULAS VINCULANTES N.º 60 E 61 DO STF. DEMANDA AJUIZADA ANTES DE 19/09/2024. PROSSEGUIMENTO DA TRAMITAÇÃO NO JUÍZO ESCOLHIDO PELA PARTE LITIGANTE. SÚMULA VINCULANTE Nº 60 DO STF. MODULAÇÃO DE EFEITOS QUANTO AO DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA. VEDADA A FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO COM A
UNIÃO
. Versa a espécie pedido de fornecimento do fármaco aflibercepte, porquanto o autor apresenta diagnóstico de retinopatia diabética (CID-10 H 36.0). Consoante se depreende do teor da Portaria SECTICS/MS n.º 18, o
medicamento
postulado na inicial não é fornecido pela rede pública de
saúde
para o tratamento da moléstia de que padece o autor. Trata-se, portanto, de medicação não padronizada.Ao julgar o Tema
1.234
da repercussão geral, o Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal definiu o seguinte: "os efeitos do Tema 1234, quanto à competência, somente se aplicam às ações que forem ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico".A concessão judicial de medicamentos não incorporados às listas de dispensação do Sistema Único de
Saúde
foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o RE 566.741 (Tema 06). As teses firmadas no julgamento foram sintetizadas no enunciado da Súmula Vinculante n.º 61, publicada em 03/10/2024: “a concessão judicial de
medicamento
registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de
Saúde
, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471)”.Portanto, tendo em vista que o resultado do julgamento desse precedente qualificado foi divulgado no DJE em 27/09/2024 e possui aplicação imediata aos processos não sentenciados até essa data, impõe-se desconstituir a decisão recorrida e oportunizar que a parte autora se manifeste, no juízo de origem, acerca dos requisitos exigidos pela Suprema Corte, elencados no item 2 do mencionado julgamento. Ademais, o Juízo a quo deverá apreciar o pedido de tutela de urgência atentando às exigências contidas no item 3, sob pena de nulidade da decisão judicial. Desconstituída a decisão e, de ofício, determinado o retorno dos autos à origem para cumprimento do item 1 da tese fixada no RE 1.366.243/SC e itens 2 e 3 da tese fixada no RE 566.471/RN, prejudicada a análise de ambos os apelos interpostos. AGRAVO INTERNO PROVIDO. AMBOS OS APELOS PREJUDICADOS. (Apelação Cível, Nº 50012699120208210142, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em: 10-04-2025)
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. PACIENTE DIAGNOSTICADO COM DOENÇA DE HODGKIN. FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO
BRENTUXIMABE VEDOTINA. FÁRMACO INCLUÍDO NO SUS PARA CONDIÇÃO CLÍNICA DE
SAÚDE
DIVERSA. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO. DESCABIMENTO. CONFLITO DE COMPETÊNCIA JULGADO NO CASO CONCRETO. OBSERVÂNCIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO DO TEMA Nº 1.234/STF NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.366.243/SC. MODULAÇÃO DE EFEITOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. 1. Hipótese em que o apelo do Município deve ser conhecido apenas em parte, uma vez que apresentou inovadoramente em grau recursal matéria não submetida à dialeticidade das partes. 2. Questão da competência para julgamento e processamento da causa decidida pelo Superior Tribunal de Justiça no curso da ação. 3. Medicação incorporada, porém restrita a pacientes já submetidos a transplante autólogo de células tronco hematopoéticas, conforme Portaria SCTIE/MS nº 12/2019, de modo que o
medicamento
postulado enquadra-se na situação de não incorporado observada a específica condição clínica da parte autora de não transplantado. 4. Segundo o julgamento de mérito do Recurso Extraordinário 1.366.243/SC - Tema nº
1.234
, realizado na sessão virtual de 13/09/2024 (publicado o acórdão no DJE em 11/10/2024), o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por meio da técnica da modulação de efeitos, estabeleceu acerca da competência jurisdicional para o enfrentamento da matéria que "somente haverá alteração aos feitos que forem ajuizados após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco,
sem
possibilidade
de
suscitação
de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco". Logo, não é caso de inclusão da União no presente feito. 5. A cobertura parcial da parte autora por plano de
saúde
privado não afasta a responsabilidade dos entes públicos quanto ao fornecimento do tratamento de
saúde
postulado. 6. As ações que visam à prestação de assistência farmacológica/tratamento de
saúde
não apresentam conteúdo econômico imediatamente aferível, tendo em vista a natureza do bem jurídico tutelado (preservação da vida/
saúde
), de valor inestimável, a autorizar, então, o arbitramento dos honorários advocatícios de sucumbência por apreciação equitativa, nos moldes do art. 85, §8º, do CPC. Verba honorária advocatícia reduzida em conformidade com o patamar estabelecido por este Órgão Fracionário em processos dessa natureza. 7. Ação julgada procedente na origem. APELAÇÃO DO MUNICÍPIO CONHECIDA EM PARTE. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.(Apelação / Remessa Necessária, Nº 50017234420188210109, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em: 24-02-2025)
A par de tais premissas, ciente de que o feito foi ajuizado em 09/04/2024, ou seja, antes do marco da competência (19/09/2024), por certo que desnecessária a inclusão da União no polo passivo da demanda,
restando confirmada a competência da Justiça Estadual.
Passo ao mérito, em si.
Como já dito acima, a paciente é uma criança que conta hoje com 08 anos de idade e por ter sido diagnosticada com Dermatite Atópica Grave necessita utilizar o medicamento Dupilumabe, o qual foi incorporado ao SUS recentemente para o tratamento de crianças com a doença supracitada
1
:
Em se tratando de medicamento incorporado, cabe a aplicação da diretriz do item 'VI' do Tema nº 1.234 do STF:
VI. MEDICAMENTOS INCORPORADOS
6)
Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em
seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I
, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido. (grifei)
6.1)
A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, Estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, integrantes do presente acórdão.
Segundo o conceito definido no acórdão do Tema nº 1.234 do STF, considera-se incorporado ao SUS o medicamento em processo de disponibilização, como é o caso em discussão:
4.7)
Medicamento incorporado mas ainda não disponibilizado, em razão de não ter decorrido o prazo fixado no artigo 19-R da Lei 8.080/90.
4.7.2)
Medicamentos com responsabilidade financeira ainda não pactuada na CIT: em relação à competência, ao ressarcimento e ao financiamento, devem ser utilizados o valor do tratamento e definida a competência nos mesmos termos em que definidos nos itens 4.2, 4.3 e 4.4 acima.
Neste caso, a atuação do Poder Judiciário restou assim estabelecida:
Atuação do Poder Judiciário no item 4.7
: Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, §1º, ambos do CPC):
(...)
(v) tratando-se de
medicamento já analisado pela Conitec, com decisão de incorporação, mas ainda não efetivamente disponibilizado
- nada obstante já tenha sido, portanto, demonstrada a segurança e a eficácia do fármaco, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências -,
é ônus do autor demonstrar a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS que possa ser utilizado, até que o novo medicamento esteja efetivamente disponível administrativamente, devendo juntar laudo fundamentado e circunstanciado descrevendo o tratamento realizado (constar cada medicamento utilizado, posologia e tempo de uso)
. (grifei)
Em suma, nos casos em que o medicamento está incorporado ao SUS, porém ainda não está sendo disponibilizado, cabe a análise da prova dos autos quanto à inexistência de fármaco substituto e da incapacidade financeira para custeio particular. E caso comprovados os requisitos supracitados, cabe a verificação do ente federado responsável pelo fornecimento do medicamento, nos mesmos termos em que definidos nos itens 4.2, 4.3 e 4.4, qual seja, o valor da medicação.
Na situação em tela, os laudos médicos (
1.4
) confeccionados por profissional da medicina especialista em alergia e imunologia, em atendimento pelo SUS junto ao Hospital de Clínicas de Passo Fundo, são claros em atestar que a paciente já fez uso das opções disponíveis no SUS sem sucesso, quais sejam, corticóides orais e tópicos, antibióticos, antivirais e anti-histamínicos, bem como que não há outra medicação
com mesma eficácia e mecanismo de ação que o Dupilumabe autorizados para uso nessa faixa etária.
A situação é corroborada pela ausência de apontamento de fármaco alternativo na negativa administrativa (
1.5
). Acerca da Nota Técnica (
12.2
), destaco que foi elaborada antes da avaliação do fármaco pela CONITEC.
Afora isso, adoto os fundamentos lançados no Parecer (
9.1
), pois complementares às razões já lançadas:
"(...)
E, embora a Nota Técnica do NatJus tenha se manifestado de forma desfavorável ao uso do Dupilumabe, recomendando a ciclosporina, o atestado médico emitido pelo corpo clínico do Hospital de Clínicas de Passo Fundo, assinado pelo médico responsável, Dr. Arnaldo Carlos Porto Neto – MD/PHD, parte acima transcrita, demonstra a ineficácia dessa alternativa para o tratamento pretendido pela r ecorrente, devendo sobrepor-se à Nota Técnica (
Agravo de Instrumento, Nº 53765043920248217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eliane Garcia Nogueira, Julgado em: 07-03-2025)
Dessa forma, suficientemente demonstrada a necessidade do fármaco postulado pela recorrente, já incorporado ao SUS e de eficácia comprovada, devendo o ente fornecê -lo na forma como receitada, para administração subcutânea , imediatamente , a fim de garantir o tratamento integral da criança, conforme lhe assegura o art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei nº 12.764/2012
2
.
Relativamente à gratuidade judiciária , necessária a manutenção do benefício, tendo em vista que recorrente comprovou sua incapacidade financeira para arcar com o custo do tratamento , o que também evidencia a impossibilidade de arcar com o custo do tratamento pretendido.
Por outro outro, é assente na jurisprudência que, para que o Poder Público seja compelido à disponibilização de fármacos, não se exige a comprovação de pobreza ou miserabilidade, mas sim a demonstração de que aquele que postula as medicações não possui condições de adquiri-las (Apelação Cível, Nº 50158678720228210010, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em: 22 -04-20 24).
Dessarte, a decisão vergastada comporta reparo.
(...)"
No mesmo sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE (ECA E IDOSO). AÇÃO COMINATÓRIA. PRETENSÃO ENVOLVENDO FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO
INCORPORADO
AO SUS.
DUPILUMABE
200MG. CRIANÇA DIAGNOSTICADA COM DERMATITE ATÓPICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. REQUISITOS DA CONCESSÃO JUDICIAL DO FÁRMACO. 1. APELO DO MUNICÍPIO PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. Conquanto o art. 369 do CPC confira às partes o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados em lei, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa, o art. 370 do mesmo diploma legal estabelece que incumbe ao juiz, enquanto destinatário da prova, determinar as provas necessárias à instrução da causa, indeferindo aquelas que considerar inúteis ou meramente protelatórias, em decisão fundamentada. No caso, não está configurado o cerceamento de defesa, na medida em que as provas pleiteadas pelo Município eram impertinentes para o propósito almejado pelo ente municipal. 2. APELO DO ESTADO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. UNIÃO FEDERAL. DESNECESSIDADE. TEMAS 1234 E 793 DE REPERCUSSÃO GERAL.
MEDICAMENTO
INCORPORADO
. Tratando-se de demanda ajuizada antes da publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico (11/10/2024), aplicável ao caso a modulação dos efeitos determinada pelo Ministro Relator do RE 1.366.243/SC (Tema 1.234). Conforme entendimento recentemente firmado no julgamento do tema 1234 do STF, com relação aos medicamentos incorporados, "a(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos (...)”. Hipótese em que, versando a pretensão sobre
medicamento
recentemente
incorporado
ao SUS, mas cuja responsabilidade de custeio e grupo de enquadramento ainda não foi definida, é de ser mantido o polo passivo eleito pela parte autora, com a consequente competência da Justiça Estadual para processamento e julgamento da demanda. 3. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO JUDICIAL DO
MEDICAMENTO
. Tratando-se de
medicamento
incorporado
ao SUS, basta que o cidadão demonstre a necessidade de fornecimento do
medicamento
, lastreado em laudo médico que esclareça seu quadro de saúde e o tratamento clínico recomendado. Documentos médicos carreados aos autos que denotam o diagnóstico da criança com dermatite atópica, cujo quadro vem evoluindo de forma negativa ao longo dos anos. Indicação de uso do
Dupilumabe
200mg para fins de controle clínico da dermatite atópica. Prescindibilidade da elaboração de nota técnica pelo NatJus. RECURSOS DESPROVIDOS.(Apelação Cível, Nº 50019151320248210029, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 10-04-2025)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO.
DUPILUMABE
. DERMATITE ATÓPICA GRAVE. PORTARIA SECTICS/MS N.º 48/2024. REQUISITOS DOS TEMAS N.º 06 E 1.234 DO STF. INAPLICABILIDADE. FÁRMACO PADRONIZADO. APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 50083794120248210033, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em: 28-02-2025)
Por fim, ciente de que o receituário médico (
1.7
) indicou o uso de 02 injeções de 300mg da medicação e de mais 01 injeção mensal a cada quatro semanas, o número anual de injeções alcança 13 unidades. E, considerando que na Tabela de Preços Máximos de Medicamentos por Princípio Ativo
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o valor indicado na alíquota 0% é de R$ 6.329,62, alcança-se R$ 82.285,06, o que representa 54 salários mínimos.
Desta feita, o valor anual da medicação é maior do que 07 salários mínimos (R$ 10.626,00) e menor do que 210 salários mínimos (R$ 318.780,00), razão pela qual aplicável a regra abaixo:
4.3) Medicamento não incorporado cujo tratamento anual custe mais que 7 salários mínimos e menos que 210 salários mínimos
: competência da Justiça Estadual e custeio do Estado nos autos, com posterior ressarcimento pela União no percentual de 65% (medicamentos não incorporados em geral) e 80% (do valor total pago por Estados e por Municípios, independente do seu trânsito em julgado, no caso de medicamentos oncológicos não incorporados).
Sendo assim,
a sentença vai reformada, no sentido da procedência do pedido, observada a regra do custeio supracitada
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custeio do Estado nos autos, com posterior ressarcimento pela União no percentual de 65%
. O ônus sucumbencial, por sua vez, recai sobre o ente estadual demandado, da seguinte forma:
Há isenção quanto à Taxa Única, nos termos do art. 5º, I e parágrafo único, da Lei n.º 14.634/14, observadas as exceções quanto à condução ao Oficial de Justiça e as custas de reembolso (despesas processuais), se existentes.
Os honorários advocatícios são devidos em favor do procurador particular da parte autora, nos termos do art. 85, §8º-A, do CPC, o qual está em consonância com a tese fixada no Tema nº 1.076 do STJ. A utilização da Tabela da OAB/RS se dá apenas com o viés de orientação, informação e referência, com o fito de alcançar o fim pretendido pela norma em ações de saúde com alto custo.
No mesmo sentido o recente julgado desta 22ª Câmara Cível:
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PÚBLICA. AÇÃO COMINATÓRIA. IPE-SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PARTE AUTORA DIAGNOSTICADA COM NEOPLASIA MALIGNA DA MAMA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA DEMANDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. PROCURADOR PARTICULAR. PROVEITO ECONÔMICO INESTIMÁVEL. TEMA 1.076 DO STJ. INCIDÊNCIA DA REGRA INSCRITA NO § 8º-A DO ART. 85 DO CPC. VALOR. REDEFINIÇÃO. Verba arbitrada com observância dos vetores dos §§ 2º, 8º e 8º-A do art. 85 do CPC. APELO PROVIDO EM PARTE.(Apelação Cível, Nº 50410623320248210001, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em: 24-04-2025)
Desta forma, considerando que o valor indicado pela Tabela da OAB nos casos de ajuizamento de demanda cível pelo procedimento ordinário é de R$ 8.441,84
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, bem como que a ação perdura há pouco mais de um ano e o trabalho não demandou maiores providências, como a realização de perícia judicial ou audiências, fixo a verba honorária no montante de
R$ 7.000,00
, com atualização pela Taxa SELIC a partir do arbitramento, conforme o disposto no art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação.
Intimem-se.
1. https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/relatorios/portaria/2024/portaria-sectics-ms-no-48-de-3-de-outubro-de-2024
2. Política Nacional de Proteção aos Direitos das Pessoas com Transtorno de Espectro Autista (TEA).
3. https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/medicamentos/cmed/precos
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