Ministério Público Do Estado Do Paraná x Estado Do Paraná
ID: 258140457
Tribunal: TJPR
Órgão: Juizado Especial da Fazenda Pública de Rio Negro
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 0003877-37.2024.8.16.0146
Data de Disponibilização:
17/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FELIPE AZEVEDO BARROS
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE RIO NEGRO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE RIO NEGRO - PROJUDI Rua Lauro Porto Lopes, 35 - ao lado do Corpo de Bombeiros - Centro - Rio Negro/PR …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE RIO NEGRO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE RIO NEGRO - PROJUDI Rua Lauro Porto Lopes, 35 - ao lado do Corpo de Bombeiros - Centro - Rio Negro/PR - CEP: 83.880-000 - Fone: (41) 3263-6500 Autos nº. 0003877-37.2024.8.16.0146 SENTENÇA I – RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou ação civil pública com pedido de tutela de urgência em favor de Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski e em face do Estado do Paraná. Alega, nessa seara, que: a) Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski foram diagnosticados com Transtorno Delirante Persistente (CID F22), sendo que estão colocando em risco as próprias subsistências e de pessoas de seu entorno, devido à apresentação de delírios persecutórios; b) a assistente social do CRAS de Quitandinha, Dirlene Resner, encaminhou relatório a esta Promotoria de Justiça informando sobre a urgência no internamento psiquiátrico do casal ‘Ivone’ e ‘Miguel, considerando que estão mantendo a genitora de ‘Ivone’, Tereza Patala, em privação de liberdade, não permitem que esta retire o dinheiro proveniente da pensão. Diante disso, não possuem renda para subsidiar os custos de alimentação, luz e água; c) ainda, informou que o casal não aceita o benefício da cesta básica do CRAS, “alegando que a comida está contaminada”, e que “são dois casos graves de psicose, os quais não aceitam intervenção da rede de atenção psicossocial, visto que ficamos limitados ao mundo ilusório deles”; d) os atestados médicos psiquiátricos, de mesmo conteúdo, confeccionados pelo Dr. Cleber C. Bearare, relataram que: Após a avaliação médica psiquiátrica, foi constatado que a paciente acima é portadora do transtorno delirante persistente (CID F 22). É uma patologia psiquiátrica que tem como principal sintoma a ocorrência de delírios (…). As pessoas com essa doença se tornam hipervigilantes, podendo se colocar em isolamento social, ao qual ocorre no momento. A paciente está apresentando delírios persecutórios afetando sua própria subsistência e de pessoas do seu entorno. (…) Verificou-se atualmente riscos para sua saúde sendo necessário internação.; e) infere-se dos espelhos de solicitação de leito que ‘Ivone’ e ‘Miguel’ são agressivos ao serem contrariados, ficam andando pelas ruas pedindo dinheiro para os vizinhos, apresentam delírios persecutórios e resistência em receberem tratamentos de saúde; f) denota-se dos documentos encaminhados pelo CREAS de Quitandinha, que Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski apresentam comportamento de grande risco para si e para terceiros, razão pela qual foram inseridos no sistema de vagas na central de leitos do Estado do Paraná em prioridade alta; g) as solicitações de vaga para internamento foram realizadas no dia 27/09/2024, conforme os espelhos de solicitação anexos. No entanto, até a presente data, as vagas não foram disponibilizadas; h) salienta-se que, não obstante se reconheça a dificuldade do Estado em prestar tal serviço de modo a atender a demanda da sociedade, fato é que Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski correm risco de vida e geram o mesmo risco às pessoas que lhe são próximas, em especial à família, composta pela genitora de ‘Ivone’, Tereza Patala, a qual é mantida em cárcere pelo casal; i) por se tratar de direito indisponível, esta Promotoria de Justiça propõe a presente ação, no intuito de que Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski sejam internados em hospital psiquiátrico o mais rápido possível. Caso não haja leito disponível na rede pública, o Estado do Paraná deverá custear todas as despesas, de qualquer natureza, na rede privada. Pleiteou liminarmente seja determinada a internação de Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski pelo SUS, no prazo máximo de 05 (cinco) dias, ou, em caso de não cumprimento da medida, em clínica particular às expensas do Estado do Paraná. No mérito, pleiteou a procedência da ação a fim de que a parte requerida fosse condenada na internação dos interessados em clínica psiquiátrica do SUS ou particular às expensas do Estado, com a infraestrutura necessária ao seu tratamento. Proferida decisão no mov. 11, sendo: a) determinada a redistribuição do feito ao Juizado Especial da Fazenda Pública; b) deferida a liminar a fim de que o Estado do Paraná disponibilize em favor de Ivone Maria Patala Rogovski e Miguel Rogovski internamento em clínica psiquiátrica da rede pública o mais próximo possível de sua residência (Quitandinha/PR) ou, alternativamente, em clínica da rede particular e sob as suas expensas, até que haja disponibilização de vaga junto a rede pública de saúde, conforme requerimento inicial, no prazo de 05 (cinco) dias; c) nomeado curador processual dos interessados; d) determinada a citação da parte requerida. No mov. 23 a parte requerida informou ter instruído a Secretaria de Saúde acerca do cumprimento da ordem judicial, comprovando seu cumprimento no mov. 24. O curador processual nomeado nos autos renunciou ao encargo (mov. 32). Ciência da parte requerida (mov. 34). No mov. 35 a parte requerida pleiteou o cancelamento da audiência de conciliação. No mov. 36 a parte requerida contestou o feito. Alegou: a) sua ilegitimidade passiva, pois os atendimentos de distúrbios mentais, como os decorrentes de dependência química, são realizados pelo CAPS gerido pelos Municípios. No mérito, discorreu sobre o sistema público de saúde e alegou que não houve negativa ou omissão do internamento. Ainda, fundamentou a necessária submissão à fila de espera do SUS. Nomeado curador processual em substituição (mov. 39). Certidão informando o cancelamento da audiência (mov. 40). Ciência da parte requerida (mov. 44). No mov. 46 o curador processual apresentou manifestação, impugnando os pleitos iniciais. Determinado o cumprimento da decisão de mov. 39, intimando-se o Ministério Público da contestação de mov. 36, bem como da petição de mov. 46 (mov. 50). Réplica (mov. 53). No mov. 56 foi informada a alta hospitalar da interessa Ivone. Determinada a intimação das partes para manifestação acerca do informado no mov. 56 (mov. 57). A parte requerida manifestou ciência (mov. 61). No mov. 63 a parte autora manifestou ciência da informação e requereu o prosseguimento do feito, pois o interessado Miguel ainda encontrava-se internado. Determinada a intimação das partes para informarem se havia o interesse na produção de outras provas (mov. 66). No mov. 69 a parte requerida informou seu desinteresse na produção de provas. Os interessados quedaram silentes (movs. 70 e 71). É o relatório. DECIDO. II – FUNDAMENTAÇÃO Julgamento antecipado Inicialmente, cumpre destacar que o feito comporta julgamento antecipado, sendo desnecessária a dilação probatória, por se tratar essencialmente de matéria de direito, impondo-se a solução célere do litígio. Ilegitimidade passiva No mov. 36 o Estado do Paraná contestou o feito alegando sua ilegitimidade passiva, pois o atendimento aos portadores de distúrbios mentais, como também os decorrentes de dependência química, é realizado pelo Centro de Atenção Psicossocial – CAPS, serviço de saúde aberto e comunitário do Sistema Único de Saúde, gerido pelos Municípios. A arguição é descabida. Com efeito, como é cediço, a obrigação no tratamento de saúde é solidária entre todos os entes da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), conforme pode ser observado do artigo 198, § 1º, da Constituição Federal. Na mesma senda, o artigo 23, inciso II, da Constituição Republicana, assentou que "É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e do Municípios (....) cuidar da saúde e da assistência pública (...)". Logo, havendo solidariedade passiva, é lícito ao credor "exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum", nos termos do artigo 275 do Código Civil. Por outro lado, é bom lembrar que o art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, reza que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação". A saúde é matéria de competência solidária da União, Estados e Municípios. Assim, obrigação comum a todos eles, pode a pessoa acometida de doença exigir medicamentos ou tratamento de qualquer um desses entes federativos. Não se desconhece que o STF, ao julgar o RE 855178/SE em março de 2015 decidiu que “O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.” Contudo, em sessão realizada em 23/05/2019, ao julgar Embargos de Declaração opostos pela União, o Supremo Tribunal Federal, inobstante rejeitasse os aclaratórios, houve por bem propor a formulação de nova tese, nos seguintes termos: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Nesse contexto, em 13/08/2019, no julgamento do agravo de instrumento nº 0039137-07.2019.8.16.0000, o Relator Desembargador Leonel Cunha decidiu que: 2. Solidariedade dos entes da Federação na obrigação de fornecimento de tratamento de saúde e o alcance da decisão prolatada no RE 855178/SE Ao julgar o RE 855178/SE, em 05 de março de 2015, o Supremo Tribunal Federal reafirmou que: “O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.”. Entretanto, na sessão realizada em 23.05.2019, ao julgar Embargos de Declaração opostos pela UNIÃO (acórdão ainda não publicado), o Supremo Tribunal Federal, inobstante rejeitasse os aclaratórios, houve por bem propor a formulação de nova tese, nos seguintes termos: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Apesar de, como dito, ainda não publicada a decisão, constam dos Autos de Rec. Extraordinário pedidos formulados por diversas autoridades judiciárias de que lhes sejam apresentadas a notas taquigráficas do julgamento, a fim de subsidiar julgamentos de outras demandas e recursos, haja vista que a redação da tese, tal como está, gera dúvidas, porque, de um lado, reafirma a tese de que o Particular pode demandar contra qualquer Ente Público inexistindo litisconsórcio passivo necessário, e, por outro, indica a necessidade de direcionar o cumprimento da obrigação ou determinar o ressarcimento a quem não compôs o polo passivo da demanda. Assim, ao menos até que o STF esclareça o que, afinal, pretendeu decidir com o texto fixado na tese, não parece defensável a conclusão de que, de agora em diante, a UNIÃO deverá ser sempre a Ré em demandas que tenham por objeto o fornecimento de tratamento oncológico, já que uma tal conclusão, inarredavelmente, retirará da solidariedade reiteradamente confirmada o seu efeito prático, que é o de garantir ao “credor” a possibilidade de exigir de qualquer dos entes o seu direito. Menos razoável ainda parece ser a conclusão de que todas as demandas já ajuizadas devam ser remetidas, em bloco, à Justiça Federal. E assim é porque, da leitura da tese, resulta evidente a sensibilidade dos Senhores Ministros à questão financeira dos Estados e Municípios que, apesar de solidariamente responsáveis, acabam por enfrentar grandes problemas pela excessiva demora da UNIÃO FEDERAL em observar os critérios constitucionais de descentralização e hierarquização e efetuar os repasses devidos por conta das condenações judiciais sofridas, o que é frequentemente relatado nas demandas. E tal demora, cabe destacar, inobstante a existência da previsão legal impondo ao ente administrativamente competente o repasse da verba eventualmente despendida por outro ente com o adimplemento de obrigação que, novamente administrativamente, é sua, tal como descrito na Lei nº 8080/90, em seu art. 35, VII: Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: ... VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo”. Ou seja, eventual assunção pelo Estado de ônus que, administrativamente, incumbiria à União, é hipótese prevista e item que irá compor o valor a ser repassado ao ente estadual, bastando que demonstre as despesas que efetuou no lugar da União e exija, mesmo que judicialmente, na esfera competente, seu ressarcimento. Fazer recair sobre Cidadão – pior, àquele em perigo de vida –, os efeitos da recalcitrância da União em repassar aos Estados a verba devida, não parece que ser a melhor medida, inobstante a calamidade fiscal dos Estados. Enfim, fato é que, no momento, o bem mais relevante a ser tutelado é a vida do Paciente e, portanto, quaisquer outras providências ou acertos processuais advindos das orientações das teses fixadas pelas Cortes Superiores, não poderão ocorrer em detrimento daquele bem maior. Nesse contexto, até que se tenha total compreensão dos exatos termos do Embargos de Declaração, deve-se observar o entendimento reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, acerca da solidariedade dos Entes Públicos (União, Estado ou Município) na obrigação de garantir os serviços de saúde, este indiscutivelmente posto e de clara compreensão. Deve ser destacado, por fim, que por estar o recurso conforme o RE 855178/SE, possível o provimento, de plano, a teor do que dispõe o art. 932, inciso V, alínea “b” do CPC/2015. ANTE O EXPOSTO, com esteio no artigo 932, inciso IV, alínea “b”, do CPC/2015, dou provimento ao Agravo de Instrumento, para determinar o prosseguimento da Ação em primeiro grau, sem a necessária inclusão da União no pólo passivo.” A meu ver, os fundamentos utilizados, de forma bastante razoável, na decisão retro ementada devem ser aplicados ao presente feito. Saliento também que o TJPR decidiu que eventual pedido de ressarcimento em face do outro Ente poderá e deverá ser intentado administrativamente ou por ação própria, a fim de não obstaculizar o direito à saúde: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO PAZOPANIBE (VOTRIENT®) À PESSOA IDOSA QUE PADECE DE CÂNCER RENAL METASTÁTICO (CID 10 C64). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.PRELIMINARES. NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA EM VIRTUDE DO SUPOSTO CERCEAMENTO DE DEFESA QUANTO À PRODUÇÃO DE PROVAS. NÃO ACOLHIMENTO. CABIMENTO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE, CONSIDERANDO QUE O MAGISTRADO, VALENDO-SE DO PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO, MOTIVOU A DISPENSA DE PRODUÇÃO PROBATÓRIA. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DA UNIÃO FEDERAL. REJEITADA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. ENUNCIADO Nº 16 DAS 4ª E 5ª CÂMARAS CÍVEIS DESTE TRIBUNAL.MÉRITO. QUESTIONAMENTO ACERCA DA IMPRESCINDIBILIDADE DO TRATAMENTO. DESCABIMENTO. PROVAS COLACIONADAS QUE APONTAM O CARÁTER IMPRESCINDÍVEL DO MEDICAMENTO PLEITEADO JUDICIALMENTE. ADEMAIS, AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO INDICAM QUE SE TRATA DE PACIENTE IDOSO, AMPARADO PELA LEI Nº 10.741/03 E SUAS DIRETRIZES DE PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORIDADE ABSOLUTA NA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE. DETERMINAÇÃO, NOS PRÓPRIOS AUTOS, DO RESSARCIMENTO PELA UNIÃO, DECORRENTE DO CUSTO DO REMÉDIO EM DESTAQUE. PEDIDO REJEITADO. OBRIGAÇÃO INEXISTENTE. OS ENTES FEDERATIVOS ACIONADOS DEVEM ARCAR INTEGRALMENTE COM AS DESPESAS ORIUNDAS DA AQUISIÇÃO DO FÁRMACO, EM VIRTUDE DA SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES PÚBLICOS NO TOCANTE À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE. PRETENSÃO DE REEMBOLSO QUE DEVE SER DISCUTIDA NA ESFERA ADMINISTRATIVA, OU EM AÇÃO JUDICIAL PRÓPRIA. APELAÇÃO CÍVEL PARCIALMENTE PROVIDA PARA MODIFICAR A BASE DE CÁLCULO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS, QUE DEVERÃO SER CALCULADOS COM BASE NO VALOR DOS PRIMEIROS 3 MESES DE FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO, PERÍODO APÓS O QUAL A NECESSIDADE DE USO SERÁ REAVALIADA, CONSOANTE RELATÓRIO MÉDICO JUNTADO AOS AUTOS. DEFINIÇÃO DO PERCENTUAL APLICÁVEL AOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS, INCLUSIVE RECURSAIS, POSTERGADA PARA A FASE DE LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA, NOS TERMOS DO ART. 85, §4º, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PARCIAL PROVIMENTO TAMBÉM PARA FINS DE SE DETERMINAR A APRESENTAÇÃO DE RELATÓRIO TRIMESTRAL PELO APELADO ACERCA DA EFETIVIDADE E NECESSIDADE DA CONTINUAÇÃO DO TRATAMENTO. DEMAIS PONTOS DA SENTENÇA MANTIDOS EM REMESSA NECESSÁRIA.APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE MANTIDA EM REMESSA NECESSÁRIA. (TJPR - 4ª C.Cível - 0001747-06.2018.8.16.0075 - Cornélio Procópio - Rel.: Desembargadora Maria Aparecida Blanco de Lima - J. 16.07.2019) Assim, sendo flagrante a solidariedade, afasto a alegada ilegitimidade passiva. Da perda superveniente do interesse de agir da parte autora em relação a interessada Ivone Segundo Nelson Nery Jr. e Rosa Maria Andrade Nery, “Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático” [1]. Portanto, o interesse processual é formado pela congregação do binômio necessidade/utilidade. Sob a ótica da necessidade, se inexistente conflito de interesses antes da propositura da ação, carece o autor de interesse processual, pois os efeitos pretendidos seriam alcançados sem a intervenção judicial. Já, sob a ótica da utilidade, o provimento judicial deve representar um proveito prático ao autor. Nas palavras de Adroaldo Furtado Fabrício: “Do ponto de vista da necessidade, a imposição da restrição visa impedir que alguém provoque a atividade jurisdicional do Estado por mero capricho ou comodismo, quiçá com o só propósito de molestar o réu, quando estava apto a obter o mesmo resultado por seus próprios meios e sem resistência. Na perspectiva da utilidade, supõe-se que a sentença almejada represente um proveito efetivo para o autor, no sentido de assegurar-lhe uma posição jurídica mais vantajosa do que a anterior” [2]. Apesar de alguns autores apontarem para a existência de um terceiro elemento – a adequação – entendo que se trata de um mero desdobramento da utilidade, pois uma vez escolhida via processual inadequada, o provimento jurisdicional não terá qualquer utilidade prática. Acrescento ainda que: "O direito de agir, direito de ação, já o dissemos, é distinto do direito material que visa tutelar. A ação se propõe a obter uma providência jurisdicional quanto a uma pretensão e, pois, quanto a um bem jurídico pretendido pelo autor. Há, assim, na ação, como seu objeto, um interesse de direito substancial consistente no bem jurídico, material ou incorpóreo, pretendido pelo autor. Chamamo-lo de interesse primário. Mas há um interesse outro, que move a ação. É o interesse em obter uma providência jurisdicional quanto àquele interesse. Por outras palavras, há o interesse de agir, de reclamar a atividade jurisdicional do Estado, para que este tutele o interesse primário, que de outra forma não seria protegido. Por isso mesmo o interesse de agir se confunde, de ordinário, com a necessidade de se obter o interesse primário ou direito material pelos órgãos jurisdicionais. Diz-se, pois, que o interesse de agir é um interesse secundário, instrumental, subsidiário, de natureza processual, consistente no interesse ou necessidade de obter uma providência jurisdicional quanto ao interesse substancial contido na pretensão. Basta considerar que o exercício do direito de ação, para ser legítimo, pressupõe um conflito de interesse, uma lide, cuja composição se solicita do Estado. Sem que ocorra a lide, o que importa numa pretensão resistida, não há lugar à invocação da atividade jurisdicional. O que move a ação é o interesse na composição da lide (interesse de agir), não o interesse em lide (interesse substancial)". (Moacyr Amaral Santos, in Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 1º volume, Ed. Saraiva, 2005, 24ª edição, págs. 176/177) No caso, não vislumbro resultado prático útil com a demanda, no tocante à interessada Ivone, diante da informação prestada pelo Hospital no mov. 56. Vejamos: E ainda: Logo, tendo a parte interessada recebido alta em razão de sua melhora, deve a presente ação ser julgada pela perda do interesse de agir. Por analogia: DECISÃO MONOCRÁTICA. MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DE TRANSFERÊNCIA PARA HOSPITAL QUE ATENDA AS NECESSIDADES DO PACIENTE. INTERNAMENTO COM ALTA HOSPITALAR APÓS A IMPETRAÇÃO DO WRIT. AUSÊNCIA DO INTERESSE PROCESSUAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO DO WRIT. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. CUSTAS PROCESSUAIS PELA AUTORIDADE IMPETRADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. WRIT EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. (TJPR - 4ª Câmara Cível - 0047903-78.2021.8.16.0000 - * Não definida - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ TARO OYAMA - J. 19.07.2022) – sem grifos no original Ante o exposto, JULGO EXTINTO o processo, notadamente em relação ao pleito inicial em favor da interessada Ivone, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil. Mérito No caso em tela, a prova testemunhal não se mostra de grande valia, porque não se prestaria a dirimir pontos controvertidos essenciais ao deslinde da causa. Já a prova pericial é suprida pela existência de parecer do médico responsável pelo tratamento do representado. Quanto ao ponto, insta transcrever a lição da Desembargadora Anny Mary Kuss que, no julgamento da apelação cível com reexame necessário nº 387.800-8, em 19/06/2007, pela 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, assim assentou: A indicação do medicamento foi realizada por profissional habilitado, que possui conhecimento científico sobre o trato com a doença que acomete seu paciente, portanto, apto a lhe prescrever o melhor tratamento. Ademais, se trata de profissional regularmente inscrito no CRM e, portanto, detentor de crédito, até prova em contrário. Não seria plausível submeter o substituído à perícia ou a qualquer espécie de teste para comprovação da necessidade de utilização do medicamento pleiteado ou da possibilidade de sua substituição por outro, tendo em vista que, este requisito já está preenchido com a própria declaração médica, feita pelo profissional capacitado que prescreveu referido fármaco. Como há prova concreta e indicação nos autos, segundo declaração médica de que, a utilização do medicamento requerido se mostra mais eficaz ao tratamento do paciente, não se pode falar em inexistência de direito líquido e certo ou na necessidade de dilação probatória. Ainda, por analogia o TJPR entendeu: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLEITO DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. IDOSO ACOMETIDO POR DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA. NECESSIDADE COMPROVADA. PACIENTE SEM CONDIÇÕES FINANCEIRAS.OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO POR PARTE DO PODER PÚBLICO. DIREITO À VIDA, INDISPONÍVEL. MEDICAMENTO NÃO PREVISTO NOS PROTOCOLOS CLÍNICOS. IRRELEVÂNCIA.OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO POR PARTE DO PODER PÚBLICO. RECEITUÁRIO MÉDICO CAPAZ DE COMPROVAR A NECESSIDADE DE UTILIZAÇÃO. SAÚDE É DEVER DO PODER PÚBLICO E DIREITO DO CIDADÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.SENTENÇA MANTIDA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - 5ª C.Cível - ACR - 1228506-0 - Região Metropolitana de Londrina - Foro Regional de Ibiporã - Rel.: Edison de Oliveira Macedo Filho - Unânime - - J. 01.07.2014) Com efeito, ninguém melhor que o médico que vem acompanhando o desenrolar do tratamento do paciente para dizer-lhe qual o tratamento é mais ou menos adequado para o combate à doença, ou sua amenização. Ainda que se nomeasse perito para tanto, teria ele muito menos subsídios para fazer a indicação. De resto, tem entendido o Tribunal de Justiça do Paraná ser plenamente possível o julgamento antecipado da lide em casos como o presente, o que, inclusive, restou pleiteado pelas partes nos presentes autos (movs. 53 e 69). Nesse sentido: I. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO DE NEOPLASIA MALIGNA DE RIM. PRELIMINARES ARGÜIDAS PELO ESTADO DO PARANÁ (ILEGITIMIDADE PASSIVA - CHAMAMENTO AO PROCESSO DA UNIÃO E DO MUNICÍPIO DE CURITIBA - INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO) AFASTADAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES PÚBLICOS - "A competência administrativa para cuidar da saúde pública é concorrente entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, cabendo-lhes o dever de atuação em uma das áreas mais sensíveis do Estado Moderno. Assim, administrativamente, todos os entes federativos possuem competência para assegurar a efetividade e plenitude da saúde pública." (ALEXANDRE DE MORAES, CONSTITUIÇÃO DO BRASIL INTERPRETADA, 2ª. ed., Atlas: São Paulo, p. 1.932). II. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO EVIDENCIADO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 330, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - O julgamento antecipado não constitui cerceamento de defesa quando a questão é predominantemente de direito e a prova de eventual questão de fato dispensa dilação probatória, a teor do disposto no artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. III. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO INDISPENSÁVEL À SOBREVIDA DA PACIENTE. IMPETRANTE PORTADORA DE NEOPLASIA MALIGNA DE RIM. DEVER DO ESTADO. DIREITO FUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE - O artigo 196 da Constituição Federal estabelece como dever do Estado o fornecimento gratuito de medicamentos indispensáveis à sobrevivência. IV. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DE FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ATRAVÉS DE PROGRAMA GOVERNAMENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE RESTRINGIR-SE DIREITO FUNDAMENTAL ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE AO CIDADÃO - As Portarias, como atos administrativos editados pelo Ministério da Saúde, não podem restringir direito assegurado em norma hierarquicamente superior. V. ALEGAÇÃO DE LIMITAÇÃO DO ESTADO QUANTO AO USO DE VERBAS PÚBLICAS. INCABÍVEL A SUA JUSTAPOSIÇÃO FRENTE À DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO À SAÚDE. APLICAÇÃO DI PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - Deve-se atentar ao princípio da proporcionalidade, buscando em cada caso concreto uma solução que não resulte na supressão de um direito fundamental, mas que também não inviabiliza o sistema de prestação de serviços do Estado. Assim, se o mínimo existencial está atrelado ao fornecimento de medicamento indispensável à saúde de um cidadão, impõe-se o dever do Estado em fornecê-lo, em conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana. APELO DESPROVIDO. SENTENÇA CONFIRMADA EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO.” (TJPR - 4ª C.Cível - ACR 0470701-1 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Abraham Lincoln Calixto - Unânime - J. 12.08.2008) (aqui destacado) A presente ação civil tem como objetivo assegurar o cumprimento a direito entabulado na Constituição da República Federativa do Brasil. A utilização deste instrumento processual encontra respaldo na legislação constitucional e infraconstitucional pátrias, inclusive sendo reconhecida a legitimidade do Ministério Público para tanto. Apesar da polêmica doutrinária acerca da justiciabilidade dos direitos sociais, deve ser reconhecido que o próprio caráter jusfundamental do direito à saúde fala em favor de sua eficácia como direito subjetivo. Contra isso se pode alegar que, nas hipóteses em que a prestação estatal requerida demanda gastos excessivamente altos ao erário, de modo a produzir insuportável intervenção judicial na destinação das verbas da saúde - é dizer, nos casos em que a providência judicial acarretar prejuízos comprovados ao serviço público de saúde - o direito prima facie à saúde, invocado pelo jurisdicionado, haverá de ceder frente ao princípio formal do primado do Legislativo e do Executivo na formulação e implementação de políticas públicas de saúde. Cumpre ao Judiciário, portanto, o estabelecimento de parâmetros de racionalidade argumentativa por meio dos quais se poderá afirmar a prevalência episódica de um ou outro princípio colidente. Analisando-se os documentos constantes dos autos (mov. 1.10), denota-se que o médico psiquiatra, Dr. Cleber C. Bearare, relatou: Dessa forma, conforme consignado na decisão de mov. 11, “...é latente a necessidade de que (...) Miguel sejam internados em clínica apropriada, tendo em vista o risco que apresentam para terceiros e para si”. A Lei n° 10.216/2001, corroborando direito assegurado constitucionalmente, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. A lei prevê que: Art. 6º - A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. Cumpre ressaltar que o STJ já decidiu sobre a necessidade de parecer médico que fundamente a internação compulsória. Vejamos: HABEAS CORPUS - AÇÃO CIVIL DE INTERDIÇÃO CUMULADA COM INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA - COMPETÊNCIA DAS TURMAS DA SEGUNDA SEÇÃO - VERIFICAÇÃO - INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA - POSSIBILIDADE - NECESSIDADE DE PARECER MÉDICO E FUNDAMENTAÇÃO NA LEI 10.216/2001 - EXISTÊNCIA, NA ESPÉCIE - EXIGÊNCIA DE SUBMETER O PACIENTE A RECURSOS EXTRA-HOSPITALARES ANTES DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO - DISPENSA EM HIPÓTESES EXCEPCIONAIS - EXAME DE PERICULOSIDADE E INEXISTÊNCIA DE CRIME IMPLICAM DILAÇÃO PROBATÓRIA - VEDAÇÃO PELA VIA DO PRESENTE REMÉDIO HEROICO - HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDO PARA DENEGAR A ORDEM. I - A questão jurídica relativa à possibilidade de internação compulsória, no âmbito da Ação Civil de Interdição, submete-se a julgamento perante os órgãos fracionários da Segunda Seção desta a. Corte; II - A internação compulsória, qualquer que seja o estabelecimento escolhido ou indicado, deve ser, sempre que possível, evitada e somente empregada como último recurso, na defesa do internado e, secundariamente, da própria sociedade. III - São modalidades de internação psiquiátrica: a voluntária, que é aquela que se dá a pedido ou com o consentimento do paciente (mediante declaração assinada no momento da internação); a involuntária, que é a que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e, por fim, a internação compulsória, determinada por ordem judicial. IV - Não há constrangimento ilegal na imposição de internação compulsória, no âmbito da Ação de Interdição, desde que baseada em parecer médico e fundamentada na Lei 10.216/2001. Observância, na espécie. V - O art. 4º da Lei nº 10.216/2001, fruto de uma concepção humanística, traduz modificação na forma de tratamento daqueles que são acometidos de transtornos mentais, evitando-se que se entregue, de plano, aquele, já doente, ao sistema de saúde mental. VI - Todavia, a ressalva da parte final do art. 4º da Lei nº 10.216/2001, dispensa a aplicação dos recursos extra-hospitalares se houver demonstração efetiva da insuficiência de tais medidas. Hipótese dos autos, ocorrência de agressividade excessiva do paciente. VII - A via estreita do habeas corpus não comporta dilação probatória, exame aprofundado de matéria fática ou nova valoração dos elementos de prova. VIII - Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário conhecido para denegar a ordem. (HC 130.155/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 14/05/2010) Do documento de mov. 1.10 o médico deixa clara a necessidade da internação. Assim, é latente a necessidade de que o interessado seja internado em clínica apropriada, tendo em visto o risco que apresenta para terceiros e para si. Veja-se que em 27/09/2024 foi solicitada a internação em caráter de urgência (mov. 1.11 – fl. 2), a qual até a data do ingresso da ação não havia sido analisada. Nesse contexto, está suficientemente demonstrado pelos documentos que instruem a inicial que o interessado necessita ser internado para tratamento, mormente porque, além de colocar em risco sua integridade física, coloca em risco a integridade de terceiras pessoas. Do documento de mov. 1.10 é relatado que o interessado encontra-se apresentando delírios persecutórios afetando sua própria subsistência e de pessoas de seu entorno. Quanto à capacidade econômica do representado, é oportuno destacar, neste ponto, que está assistido por equipe médica de unidade de saúde vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS), bem como, juridicamente, pelo Ministério Público, circunstâncias que fazem pressupor a impossibilidade de arcar com os altos custos do tratamento. Assim, uma vez verificado que, em favor da concessão da prestação estatal requerida pesam argumentos mais fortes que os argumentos contrários à pretensão autoral, deve ser reconhecido ao paciente o direito ao acesso do tratamento demandado. Quanto ao fundamento jurídico, impende apontar que dentre os direitos sociais, a saúde, hoje erigida a preceito constitucional, é concebida como direito de todos. Para garantia de tal direito, o constituinte estabeleceu, ainda, que é dever do Estado garantir mediante a implementação de políticas sociais e econômicas a redução do risco de doenças e de outros agravos (artigo 196 da Constituição Federal). Neste sentido, imperioso ressaltar que o direito à saúde é regido pelos princípios da universalidade e igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem, protegem e recuperam. A referida norma possui eficácia plena, provida de efeitos concretos. Não se cuida de norma programática, e mesmo que assim fosse, cabe observar que a melhor e mais recente doutrina tem emprestado a essas normas, mais genéricas, a produção de efeitos no plano fático, mesmo ausente a regulamentação normativa reclamada. Tal disposição constitucional está lastreada em um princípio ainda maior, qual seja, o da dignidade da pessoa humana, inserto na Constituição da República como um dos fundamentos da República, consoante seu art. 1º, inciso III. Assim, visa-se garantir à pessoa uma sobrevivência cidadã, não só no sentido político da palavra, mas também democrático. Ou seja, espera-se que ela possa viver com um mínimo de independência e autodeterminação. Por certo, tais princípios não estarão atendidos se a pessoa não puder medicar-se com o remédio que se torna sua última esperança de manter uma razoável condição de vida. Lembre-se de que a Lei nº 8.080/90, conhecida como Lei Orgânica da Saúde, regulamentando o SUS, estabeleceu em seu art. 2º que: “Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.” Mais adiante, a citada Lei, que estabelece as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, em seu artigo 6º, inciso I, alínea 'd', que estão incluídas no campo de atuação do Sistema Único de Saúde a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica: “Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS): I - a execução de ações: [...] d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;” Não obstante o Estado conte com um Sistema Único de Saúde, a própria Constituição Federal descentralizou aos Estados, Distrito Federal e Municípios a competência para regulamentação e implantações de serviços públicos de proteção e defesa da saúde (CF, artigo 24, XII e artigo 196). Assim, competem a todas as esferas do Poder Executivo ações visando uma política pública uniforme de saúde, de modo a atender de maneira igualitária e digna a todos os cidadãos. Portanto, nesse aspecto, melhor sorte não está reservada ao requerido, visto que já é pacífico o entendimento de que é dever do Estado, entendido aqui no seu sentido lato, a internação de pacientes que não disponham de condições para dele fazer frente sem prejuízo de seu sustento. III – DISPOSITIVO Ante o exposto: a) JULGO EXTINTO o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil, no tocante ao pedido formulado na inicial em favor da parte interessada Ivonete; b) JULGO PROCEDENTE o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC para, confirmando a liminar, determinar que o Estado do Paraná disponibilize em favor do interessado Miguel internamento em clínica psiquiátrica da rede pública o mais próximo possível de sua residência ou, alternativamente, em clínica da rede particular (igualmente em local mais próximo possível da sua residência) e sob as suas expensas, até que haja disponibilização de vaga junto a rede pública de saúde. Caso noticiado o descumprimento do determinado nesta sentença, e apresentado o orçamento por parte do Ministério Público especificando os valores cobrados pela clínica e com os dados da conta bancária da instituição beneficiária para posterior transferência, determino o sequestro “on line” mensal do valor necessário para cobertura dos custos com a internação, através do sistema SISBAJUD, pois entendo ser tal medida muito mais eficaz à proteção do direito perseguido e muito menos onerosa aos cofres públicos do que a aplicação de multa diária. Efetuada a constrição do valor pelo sistema SISBAJUD, expeça-se ofício de transferência do valor bloqueado para a conta a ser indicada pelo Ministério Público, com prazo de 10 dias. Posteriormente, deve a parte autora juntar aos autos a competente nota fiscal/recibo, a fim de comprovar que o valor transferido foi usado para custear o tratamento. Ainda, para controle dos gastos realizados às expensas do Poder Público, deverá ser apresentado a este juízo, planilha de custos mensal do tratamento. Sem custas e honorários, pois incabíveis conforme artigo 55 da Lei n° 9.099/95 e artigo 27 da Lei n° 12.153/2009. Dispensado o reexame necessário, conforme artigo 11 da Lei n° 12.153/2009. Ainda, em favor do curador especial nomeado a parte interessada, Dr. Carlos Alberto Soares Nolli II, fixo honorários no importe de R$ 800,00 (oitocentos reais), conforme Tabela da Resolução Conjunta n° 06/2024-PGE/SEFA, a serem pagos pelo Estado do Paraná, levando em conta a inexistência de defensoria pública nesta Comarca. Publicada e registrada eletronicamente, intimem-se. Cumpram-se as demais disposições pertinentes do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça. Transitada em julgado, intimem-se as partes para que requeiram o que entender de direito no prazo de 15 dias. Nada sendo requerido, arquive-se. [1] Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 7. Ed. São Paulo: RT, 2003. P. 629. [2] Extinção do Processo e Mérito da Causa. Revista de Processo nº 58 - grifei. Rio Negro, 15 de abril de 2025. ALEXANDRO CESAR POSSENTI Juiz de Direito
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