Processo nº 1000519-96.2024.8.11.0110
ID: 315535767
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000519-96.2024.8.11.0110
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIEGO JOAO DOS SANTOS GOUVEA
OAB/RJ XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000519-96.2024.8.11.0110 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Inter…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000519-96.2024.8.11.0110 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ROBERTO CARLOS FERREIRA ADORNO - CPF: 463.704.471-53 (APELANTE), DIEGO JOAO DOS SANTOS GOUVEA - CPF: 123.708.057-65 (ADVOGADO), BANCO ITAUCARD S.A. - CNPJ: 17.192.451/0001-70 (APELADO), CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES - CPF: 991.502.399-53 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. JUROS REMUNERATÓRIOS ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE CONCRETA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por consumidor em face de sentença que julgou improcedente ação revisional ajuizada contra instituição financeira, na qual se alegava a abusividade dos juros remuneratórios pactuados em contrato de financiamento de veículo, com pedidos acessórios de limitação da taxa de juros, revisão do valor das parcelas, autorização para depósito de valor tido como incontroverso, afastamento da mora e outras providências. O juízo de origem entendeu que a taxa de juros, ainda que superior à média de mercado, não configura abusividade por si só e julgou a demanda improcedente, com resolução de mérito. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há cinco questões em discussão: (i) verificar se houve cerceamento de defesa pela ausência de produção de prova pericial contábil; (ii) definir se há nulidade na ausência de apreciação do pedido de inversão do ônus da prova; (iii) apurar se houve ausência de fundamentação quanto ao indeferimento da tutela de urgência; (iv) analisar se a sentença deixou de se manifestar sobre pedidos específicos da inicial; (v) estabelecer se a taxa de juros pactuada é abusiva a ponto de justificar revisão contratual. III. RAZÕES DE DECIDIR Não há cerceamento de defesa quando a parte é intimada a especificar provas e permanece inerte, sendo legítimo o julgamento antecipado da lide com base no art. 355, I, do CPC, especialmente em causas que envolvem matéria unicamente de direito. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC não é automática, exigindo verossimilhança das alegações ou hipossuficiência do consumidor; ausentes esses pressupostos no caso concreto, é legítimo o indeferimento motivado do pedido. A decisão que indeferiu a tutela de urgência está fundamentada com base na ausência de verossimilhança das alegações e na inaplicabilidade da Súmula 380/STJ ao caso, inexistindo nulidade por omissão. A alegação de omissão quanto a pedidos da inicial é improcedente quando tais pedidos dependem logicamente da procedência do pedido principal, que foi expressamente analisado e julgado improcedente com fundamentação adequada. A estipulação de taxa de juros remuneratórios superior à média de mercado não configura abusividade automática; é necessária comprovação de discrepância relevante ou onerosidade excessiva, o que não se verificou na hipótese concreta, conforme entendimento do STJ no REsp 1.061.530/RS (Tema 27) e REsp 1.359.365. Documentos unilaterais desacompanhados de prova técnica produzida sob contraditório não são suficientes para comprovar abusividade contratual. Diante da improcedência da ação, deve ser mantida a condenação do autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios, com majoração da verba nos termos do art. 85, §11, do CPC, observada a suspensão da exigibilidade por força da gratuidade de justiça (art. 98, §3º, CPC). IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A taxa de juros remuneratórios superior à média de mercado não configura, por si só, abusividade, exigindo demonstração concreta de onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC depende da demonstração de verossimilhança das alegações ou da hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica do consumidor. Não configura cerceamento de defesa o indeferimento de prova pericial contábil quando a parte é intimada a especificar provas e permanece inerte. A fundamentação da tutela de urgência é suficiente quando demonstra, de forma clara, a ausência dos requisitos legais previstos no art. 300 do CPC. A ausência de manifestação específica sobre pedidos acessórios não acarreta nulidade da sentença quando a improcedência do pedido principal os prejudica logicamente. –––––––––––––––––– Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LIV e LV; CC, arts. 421 e 423; CDC, arts. 6º, VIII, e 54; CPC, arts. 300, 355, I, 370, 373, 489, §1º, III e IV, 492, 487, I, 98, §3º, e 85, §11. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS; STJ, REsp 1.359.365; STJ, AgInt no AREsp 1.493.171/RS; STJ, REsp 1.949.665/DF; STJ, AgInt no AREsp 1.268.423/DF; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1.992.801/SP; TJMT, ApCiv 1006019-81.2023.8.11.0045; TJMT, ApCiv 1002805-63.2024.8.11.0040. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ROBERTO CARLOS FERREIRA ADORNO contra sentença proferida nos autos da Ação Revisional c/c Pedido de Tutela de Urgência, movida em desfavor do Banco ItaúCard S.A., na qual o MM. Juiz de Direito Matheus de Miranda Medeiros, da Vara Única da Comarca de Campinápolis, julgou improcedentes os pedidos iniciais, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Na origem, o autor, servidor público estadual, alega ter firmado com o réu contrato bancário para financiamento de veículo no valor de R$ 47.126,10, com pagamento em 48 parcelas mensais de R$ 1.783,82, à taxa de juros remuneratórios de 2,76% ao mês (equivalente a 38,64% ao ano). Sustenta que referida taxa excede a média praticada no mercado no período da contratação, supostamente fixada em 1,93% ao mês (25,85% ao ano), configurando-se abusiva, por implicar elevação de mais de 43% em relação ao índice referencial. Em virtude disso, pleiteou, além da limitação da taxa de juros à média de mercado e a consequente revisão do saldo devedor e do valor das parcelas, a concessão de tutela de urgência para autorizar o depósito mensal do valor tido como incontroverso (R$ 1.495,54), bem como o afastamento da mora contratual e a proibição de inclusão de seu nome nos cadastros de inadimplentes e de busca e apreensão do veículo alienado fiduciariamente. Requereu, ainda, a inversão do ônus da prova e a produção de prova pericial contábil. A sentença recorrida indeferiu o pedido liminar e, no mérito, julgou totalmente improcedentes os pedidos formulados, ao argumento de que a simples superação da taxa média de mercado não induz à abusividade dos juros pactuados, tampouco justificaria intervenção judicial, por inexistência de demonstração concreta de onerosidade excessiva ou desproporcionalidade. Além disso, o juízo entendeu que a matéria discutida nos autos era exclusivamente de direito, razão pela qual dispensou a instrução probatória. Irresignado, o autor interpôs apelação, sustentando, em síntese: (1) a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, diante do indeferimento imotivado da produção de prova pericial contábil e da ausência de intimação prévia para manifestação sobre o julgamento antecipado da lide; (2) a omissão do juízo a quo quanto ao pedido de inversão do ônus da prova, com violação ao art. 6º, VIII, do CDC; (3) a ausência de fundamentação concreta ao indeferimento da tutela de urgência, em afronta ao art. 300 do CPC; (4) a omissão na análise das provas documentais produzidas, especialmente por ter deixado de se manifestar sobre diversos pedidos expressamente formulados pela parte autora na petição inicial; e (5) a necessidade de revisão da taxa de juros remuneratórios pactuada, por ser manifestamente superior à média do mercado, em violação aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e do equilíbrio contratual. O Banco ItaúCard S.A., por sua vez, apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso e pela manutenção integral da sentença. Argumenta que a taxa pactuada não é abusiva e se encontra dentro dos parâmetros de razoabilidade admitidos pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Ressalta que não houve cerceamento de defesa, pois a matéria discutida nos autos é de direito, e a documentação acostada foi suficiente para formação do convencimento judicial. Afirma, ainda, que não há nulidade na ausência de inversão do ônus da prova nem no indeferimento da liminar, cujos requisitos não foram comprovados nos autos. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR) – DA NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: A parte apelante suscitou preliminar de nulidade da sentença, ao argumento de cerceamento de defesa, sob a alegação de que houve indeferimento imotivado da produção de prova pericial contábil, bem como ausência de intimação prévia para manifestação sobre o julgamento antecipado da lide. Cuida-se de alegação que merece análise detida, na medida em que envolve o contraditório e a ampla defesa, garantias fundamentais consagradas nos incisos LIV e LV do art. 5º da Constituição Federal. Eventual violação a tais princípios configura vício de natureza grave, capaz de comprometer a validade do ato processual e, por conseguinte, ensejar a nulidade da decisão judicial proferida sem observância do devido processo legal. Não obstante, é igualmente certo que o devido processo legal não se confunde com o excesso de formalismo ou com a eternização da marcha processual. Sob essa perspectiva, a atuação do magistrado deve estar comprometida com a efetividade da prestação jurisdicional, a celeridade e a economia processual, bem como com o dever de conduzir o processo segundo sua utilidade prática e necessidade instrutória, nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil. Consoante dispõe o referido artigo, o juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, desde que devidamente motivado. Portanto, não há nulidade na decisão que julga antecipadamente o mérito da demanda quando, à luz do conjunto probatório já constante nos autos, entende o magistrado ser desnecessária a produção de outras provas. No caso em apreço, o apelante alega ter sido cerceado em seu direito de defesa diante do julgamento antecipado da lide, sem a realização de prova pericial contábil e sem prévia intimação para manifestação sobre o pedido de julgamento imediato, formulado pela parte ré. Todavia, razão não lhe assiste. O exame dos autos revela que, após a apresentação da contestação (ID 176676603), o juízo de origem determinou a intimação das partes para manifestação nos termos do art. 437, § 1º, do CPC, inclusive para especificação de provas. A parte autora, devidamente intimada por meio do DJEN em 05/12/2024 (ID 177432081), manteve-se inerte, não apresentando qualquer manifestação no prazo legal. Ato contínuo, novamente foi intimada, em 31/01/2025, conforme ID 182090006, sendo-lhe oportunizada a manifestação final, inclusive quanto à produção de provas – e, mais uma vez, quedou-se silente. Em razão da inércia reiterada da parte autora, o apelado requereu o julgamento antecipado da lide (ID 185880643), o que foi acolhido pelo magistrado na sentença de mérito proferida ainda naquele mesmo mês. Destaco que o juízo de primeiro grau, ao fazê-lo, observou os princípios da celeridade, da efetividade e da economia processual, não havendo nos autos qualquer demonstração de prejuízo concreto suportado pela parte apelante. Embora não tenha sido intimado expressamente acerca do requerimento de julgamento antecipado formulado pelo banco, verifica-se que a autora já havia sido duas vezes instada a se manifestar, inclusive para especificação de provas — oportunidade processual suficiente para apresentar pedido de produção de perícia, o que não fez. Sua ausência deliberada dos autos, após a emenda à inicial, denota desídia e não configura omissão imputável ao juízo. Por conseguinte, não há como alegar surpresa processual ou violação ao contraditório quando a própria parte deixou de exercer, por diversas vezes, a faculdade processual que lhe foi amplamente assegurada. Assim, o julgamento antecipado da lide não implicou violação ao direito à ampla defesa, tratando-se de exercício legítimo da faculdade conferida ao magistrado pelo art. 355, I, do CPC, diante de matéria exclusivamente de direito e desnecessidade de dilação probatória. Rejeito, portanto, a preliminar de nulidade por cerceamento de defesa. É como voto. VOTO (PRELIMINAR) – DA NULIDADE PELO INDEFERIMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Sustenta o apelante que a sentença recorrida padece de nulidade por ausência de fundamentação quanto ao pedido de inversão do ônus da prova, formulado com base no art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Alega, ainda, que restaram demonstrados nos autos os requisitos legais para o acolhimento da medida, especialmente a hipossuficiência econômica e a verossimilhança das alegações, razão pela qual requer o reconhecimento da nulidade da sentença nesse ponto e a concessão da inversão. Sem razão, contudo. Em primeiro lugar, não se verifica omissão na prestação jurisdicional. O pedido de inversão do ônus da prova foi expressamente apreciado e indeferido pelo juízo de origem já na decisão liminar (ID 169270984), oportunidade em que se reconheceu a ausência de verossimilhança das alegações, requisito indispensável à aplicação do art. 6º, VIII, do CDC. O magistrado entendeu, com base nos elementos disponíveis naquele momento, que a prova apresentada era insuficiente para justificar qualquer medida antecipatória ou distributiva de ônus, não se configurando, portanto, o vício apontado pela parte recorrente. Ademais, é necessário destacar que a inversão do ônus da prova, ainda que prevista como direito básico do consumidor, não é automática, cabendo ao julgador, mediante análise do caso concreto, verificar a existência dos seus pressupostos legais, a saber: a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica do consumidor, nos termos da legislação e da doutrina amplamente consolidada. Conforme jurisprudência consolidada do STJ, a inversão do ônus da prova exige prudência e não se presta a beneficiar automaticamente o consumidor, sobretudo quando este já dispõe dos meios necessários à instrução de sua pretensão: “A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não é automática, dependendo da constatação, pelas instâncias ordinárias, da presença da verossimilhança das alegações ou da hipossuficiência do consumidor.” (STJ, AgInt no AREsp 2.219.849/GO, Relator.: Ministra Maria Isabel Gallotti, Data de Julgamento: 11/12/2023, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 15/12/2023) Cumpre mencionar que este Relator adota o entendimento de que “ainversãodoônusdaprova prevista no CDC não exime oconsumidorde demonstrar minimamente a plausibilidade de suas alegações, não sendo admissível presumir, de forma absoluta, averacidadedos fatos por ele narrados.” (TJMT, ApCiv 1001792-18.2025.8.11.0000, Relator.: Marcos Regenold Fernandes, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em: 17/03/2025, Publicado em: 17/03/2025) Importa ressaltar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça tem reiterado que a inversão do ônus da prova prevista no CDC configura regra de instrução e não de julgamento, devendo ser aplicada de modo a garantir às partes o pleno exercício do contraditório. Nesse sentido: “A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior, garantir à parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas.” (STJ, REsp 1.286.273/SP, Relator.: Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 08/06/2021, DJe 22/06/2021) No caso concreto, a verossimilhança foi afastada desde a análise liminar, tendo o magistrado consignado expressamente que a planilha de cálculo apresentada foi produzida unilateralmente e que não havia prova idônea do alegado excesso ou abusividade contratual. Da mesma forma, entendeu não haver qualquer impedimento técnico ou fático ao acesso das provas relevantes, visto que os próprios documentos constantes dos autos – como o demonstrativo de parcelas emitido pela instituição financeira e juntado pela parte autora – continham os principais parâmetros do financiamento impugnado. Posteriormente, com a apresentação da contestação, a parte ré anexou aos autos o próprio contrato objeto da demanda, contendo as cláusulas contratuais em debate e os encargos pactuados. Ou seja, mesmo ausente a inversão formal do ônus da prova, o documento que, em tese, o consumidor não teria acesso (o contrato bancário) foi efetivamente trazido aos autos pelo banco apelado, de modo que não houve qualquer prejuízo concreto à parte autora, tampouco violação ao contraditório ou à ampla defesa. Como se não bastasse, ainda que se considerasse a inversão do ônus da prova, esta não exime a parte autora do dever de produzir prova mínima das alegações fáticas constitutivas do seu direito, como exige o art. 373, I, do CPC. Isso porque a redistribuição do ônus da prova não afasta o dever do juiz de formar seu convencimento com base em uma análise crítica e fundamentada do conjunto probatório, tampouco conduz, de forma automática, à procedência das alegações da parte consumidora. Assim, o indeferimento da inversão, fundado na ausência de verossimilhança e na inexistência de obstáculo para a produção de provas por parte do autor, encontra respaldo na legislação aplicável e na jurisprudência, não havendo nulidade a ser reconhecida. Conclui-se, portanto, que o juízo de origem analisou adequadamente o pedido de inversão, justificando sua rejeição com base na ausência de probabilidade do direito. Ainda que o magistrado, ao fundamentar, tenha se equivocado ao afirmar que o contrato havia sido juntado pelo autor (quando na verdade o documento se tratava de um demonstrativo de parcelas), tal erro não compromete a conclusão da decisão, porquanto a ausência de dificuldade na obtenção da prova restou suprida no curso do processo, não sendo possível identificar prejuízo relevante à parte recorrente. De todo modo, não há nulidade a ser reconhecida, pois o contrato foi devidamente juntado aos autos e não houve qualquer prejuízo à instrução ou ao contraditório. Incide, na espécie, o princípio do pas de nullité sans grief, segundo o qual não se anula ato processual sem demonstração de efetivo prejuízo (CPC, art. 282, § 1º). Rejeito, pois, a alegação de nulidade da sentença quanto à inversão do ônus da prova. É como voto. VOTO (PRELIMINAR) – DA NULIDADE POR OMISSÃO NA FUNDAMENTAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: A parte autora sustenta que a sentença recorrida incorreu em nulidade ao indeferir o pedido de tutela de urgência sem apresentar fundamentação concreta, em afronta aos artigos 300 e 489, §1º, III, do Código de Processo Civil. Defende que o magistrado de origem deixou de analisar os documentos acostados e os elementos fáticos que demonstrariam a verossimilhança das alegações e o perigo de dano irreparável. Todavia, suas ilações não merecem acolhimento. Da leitura da decisão proferida no ID 169270984, observa-se que o magistrado enfrentou de forma expressa os argumentos da parte autora, destacando, entre outros pontos, que a planilha de cálculo apresentada consistia em prova unilateral, sem comprovação de verossimilhança robusta quanto à abusividade contratual, e que o pedido de depósito do valor incontroverso não produziria efeitos liberatórios nem impediria os meios de cobrança previstos em contrato, como a busca e apreensão ou a negativação do nome do consumidor. Ressaltou, ainda, que a simples propositura da ação revisional não descaracteriza a mora, conforme entendimento consolidado na Súmula 380 do STJ, tampouco suspende automaticamente os efeitos do inadimplemento. Desse modo, não se verifica a alegada omissão na análise dos requisitos legais para concessão da tutela de urgência. Além disso, a decisão está devidamente motivada e embasada na ausência de elementos que demonstrassem, naquele momento, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Não se ignora o dever de fundamentação previsto no art. 489, §1º, III, do CPC. Contudo, esse dispositivo visa coibir decisões que sejam meramente genéricas ou desprovidas de qualquer enfrentamento argumentativo, o que não se verifica no caso concreto. No caso em apreço, o juízo de primeiro grau, embora tenha decidido de forma contrária aos interesses da parte autora, fundamentou suficientemente sua negativa, com base nos elementos constantes dos autos. Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, consignando que “não viola o art.489doCódigo de Processo Civil de 2015nem importa em omissão a decisão que adota, para a resolução da causa, fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pelo recorrente.” (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1.992.801/SP, Relator.: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Julgado em: 24/10/2022, T3 - Terceira Turma, Publicado em: 28/10/2022) Portanto, não há nulidade a ser reconhecida, tampouco razões para a reforma da decisão que indeferiu a tutela de urgência, motivo pelo qual rejeito a referida preliminar. É como voto. VOTO (PRELIMINAR) – DA NULIDADE POR OMISSÃO NO ENFRENTAMENTO DOS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: O apelante sustenta que a sentença recorrida incorreu em nulidade parcial por ausência de manifestação quanto a diversos pedidos formulados na petição inicial, em violação ao disposto no art. 489, §1º, IV, e ao art. 492 do Código de Processo Civil. Alega, em síntese, que o juízo a quo teria deixado de se pronunciar sobre requerimentos específicos como a revisão da parcela contratual, a compensação ou devolução de valores pagos a maior, o afastamento da mora, a manutenção da posse do bem e a inexigibilidade de eventual saldo remanescente. Todavia, razão não assiste ao apelante. Em primeiro lugar, observa-se que todos os pedidos apontados como “não analisados” derivam, em essência, do pedido principal de revisão contratual, e foram, portanto, abarcados pela fundamentação da sentença ao reconhecer a regularidade das cláusulas do contrato firmado entre as partes, julgando improcedente a pretensão autoral. A decisão recorrida analisou detidamente a taxa de juros contratada, reconhecendo que, ainda que superior à média divulgada pelo BACEN, não configuraria, por si só, abusividade, à luz da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. Tal conclusão, por si, afasta a pretensão de revisão da parcela, de devolução de valores e de afastamento da mora, pois pressupõe a validade dos encargos contratados. Observa-se, ainda, que os pedidos acessórios reiterados no mérito, como a manutenção da posse do bem e o afastamento da mora, não foram desconsiderados pelo juízo a quo, mas sim resultam prejudicados pela improcedência da pretensão revisional, a qual foi examinada de forma fundamentada. Ressalte-se que a documentação acostada aos autos pelo autor – como o parecer técnico contábil e as planilhas de cálculo – consubstancia prova unilateral, desacompanhada de assinatura por profissional habilitado ou de qualquer chancela oficial que lhe confira confiabilidade técnica. Trata-se, portanto, de elemento que não possui, por si só, força probatória suficiente para infirmar os termos do contrato firmado, especialmente diante da ausência de comprovação de abusividade concreta nos encargos pactuados. Cumpre registrar, também, que esta colenda Quinta Câmara de Direito Privado já prolatou decisão no sentido de que “laudos unilaterais e inconclusivos, sem comprovação técnica adequada, não são suficientes para configurar o nexo causal necessário à responsabilização objetiva da concessionária de energia elétrica.” (TJMT, ApCiv 1002805-63.2024.8.11.0040, Relator.: Des. Márcio Vidal, Julgado em: 22/10/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Publicado em: 25/10/2024) A fim de ratificar este entendimento, destaca-se: “Eventual laudo unilateral apresentado nos autos, sem a participação da parte contrária e sem o acompanhamento do perito oficial, não possui validade probatória, a justificar condenação pelos eventuais vícios apontados em tal documento, impondo-se a validação apenas do laudo pericial oficial realizado pelo perito e no acompanhamento efetivo da vistoria pelo mesmo empreendida.” (TJMG, ApCiv 10024121825657001 Belo Horizonte, Relator.: Luiz Carlos Gomes da Mata, Data de Julgamento: 07/07/2022, Câmaras Cíveis / 13ª Câmara Cível, Data de Publicação: 11/07/2022) “Os laudos apresentados foram elaboradosunilateralmente, sem qualificação técnica comprovada, e não foram corroborados por perícia judicial ouprovaproduzida em contraditório. [...] Laudosunilaterais, genéricos e sem respaldo técnico formal não são suficientes para comprovar o nexo causal.” (TJMT, ApCiv 1006019-81.2023.8.11.0045, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/05/2025, Publicado no DJE 09/05/2025) Ademais, verifica-se que o contrato foi regularmente juntado aos autos pela instituição financeira, o que afasta a necessidade de inversão do ônus da prova e confirma a suficiência documental para a formação do convencimento judicial. Não se constata, pois, qualquer prejuízo à parte autora, tampouco cerceamento de defesa. Neste ponto, convém lembrar que o Código de Processo Civil exige a apreciação de todos os pedidos relevantes e potencialmente capazes de infirmar a conclusão adotada pelo julgador (art. 489, §1º, IV, CPC), o que não equivale à obrigação de resposta ponto a ponto de cada consequência jurídica pleiteada, quando estas forem logicamente prejudicadas pela improcedência do pedido central. Ainda, no que tange à suposta nulidade, não se verifica violação ao art. 492 do CPC, uma vez que a sentença guardou estrita correlação com os pedidos formulados, tendo se limitado a julgá-los improcedentes, sem extrapolar os limites do pedido nem deixar de apreciá-lo. Por todo o exposto, não se verifica omissão, contradição ou ausência de fundamentação apta a ensejar a nulidade parcial da sentença, razão pela qual rejeito a preliminar. É como voto. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação cível interposto por Roberto Carlos Ferreira Adorno contra sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais da ação revisional movida em desfavor do Banco ItaúCard S.A., nos seguintes termos: “[...] No mérito, a demanda deve ser julgada improcedente. A teoria contratual encontra sua razão de ser no cumprimento compulsório das obrigações livremente assumidas. É o que se chama de força obrigatória dos contratos, desaguando no princípio do pacta sunt servanda, que indica que o contrato faz lei entre as partes. A moderna concepção contratual sustenta que a obrigatoriedade do cumprimento do contrato, que domina a concepção clássica dos contratos, passará pela análise da boa-fé das partes envolvidas, bem como da função social que a avença deve apresentar. Os deveres anexos do contrato implicam o adequado desenvolvimento da relação obrigacional e à satisfação dos interesses envolvidos, com eticidade, socialidade e operabilidade. São de origem independente da vontade das partes. Não estão diretamente relacionados ao cumprimento do dever principal de prestação, mas visam a garantir o correto desenvolvimento da relação contratual. Primeiramente, no que concerne à alegação de aplicação de taxa de juros abusiva, o Superior Tribunal de Justiça, desde há muito, já assentou que osimples fato de os juros remuneratórios contratados serem superiores à taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade, verbis:[...] O próprio STJsumulou a legalidade da taxa efetivamente contratada, através do Enunciado nº. 541, verbis: "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". (STJ. 2ª Seção. Aprovada em 10/06/2015, Dje 15/06/2015). É certo que a parte autora poderia se valer de outros agentes bancários para consecução de seu financiamento, pois vige no país a livre concorrência. Entretanto, volitivamente, escolheu contratar com o réu. Não há notícia - nem prova - de nenhum vício de consentimento na formulação da avença, mormente dolo, coação, estado de perigo ou lesão. Novamente, repise-se, não foi provada a existência de qualquer vício de consentimento na contratação. O autor aderiu voluntariamente ao financiamento e, por consequência, deve arcar com o ônus decorrente de sua escolha. O conceito de taxa média de juros é parâmetro e não medida certa, cujo excedente deve ser considerado, de imediato, como abusivo. É necessário que haja o mínimo de indícios de que, no caso concreto, além do razoável, a instituição financeira extrapolou o âmbito de incidência considerado proporcional e aplicável no caso concreto, o que não se pode constatar. Em relação ao pedido e a controvérsia dos autos, ressurge-se que apenas foram questionados os juros remuneratórios, sendo estes abusivos e que superariam o valor médio e justo. Analisando mais profundamente, a jurisprudência admite como razoável, até uma vez e meia superior que a taxa média prevista para a o período em que foram acertados os termos contratuais (ID 176676612 e 176676613), o que não significa, como já dito, que o excedente, automaticamente o seria, mas há este parâmetro que é seguido por algumas cortes estaduais: [...] Este também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que sequer estabeleceu um limite pré-determinado: [...] Destarte, analisando o contrato e segundo as próprias alegações autorais, a taxa de juros é de2,76 % a.m. e 38,64 % a.a. O correto, ainda, segundo aduna, seria1,93 % ao mês e 25,85 %. Ou seja, não há, evidentemente, um incremento que, por si só, demonstre excessiva onerosidade ou abusividade a ensejar a revisão contratual. DISPOSITIVO Ante o exposto, REJEITO a(s) preliminar(es) arguidas pelo réu e, no mérito, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos constantes da inicial; e assim o faço com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado, ora fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa na forma do art. 98, § 3º, do CPC. [...]” Irresignado, o autor interpôs apelação, sustentando, em síntese: (1) a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, diante do indeferimento imotivado da produção de prova pericial contábil e da ausência de intimação prévia para manifestação sobre o julgamento antecipado da lide; (2) a omissão do juízo a quo quanto ao pedido de inversão do ônus da prova, com violação ao art. 6º, VIII, do CDC; (3) a ausência de fundamentação concreta ao indeferimento da tutela de urgência, em afronta ao art. 300 do CPC; (4) a omissão na análise das provas documentais produzidas, especialmente por ter deixado de se manifestar sobre diversos pedidos expressamente formulados pela parte autora na petição inicial; e (5) a necessidade de revisão da taxa de juros remuneratórios pactuada, por ser manifestamente superior à média do mercado, em violação aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e do equilíbrio contratual. O Banco ItaúCard S.A., por sua vez, apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso e pela manutenção integral da sentença. Argumenta que a taxa pactuada não é abusiva e se encontra dentro dos parâmetros de razoabilidade admitidos pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Ressalta que não houve cerceamento de defesa, pois a matéria discutida nos autos é de direito, e a documentação acostada foi suficiente para formação do convencimento judicial. Afirma, ainda, que não há nulidade na ausência de inversão do ônus da prova nem no indeferimento da liminar, cujos requisitos não foram comprovados nos autos. Pois bem. A controvérsia posta nos autos se insere no contexto de relação contratual bancária firmada entre as partes, cujos efeitos são regulados, além da legislação civil, pelo Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece a aplicabilidade das normas consumeristas às instituições financeiras, nos termos da Súmula 297/STJ. Nesse cenário, admite-se a revisão judicial de cláusulas contratuais, desde que presentes elementos concretos que revelem onerosidade excessiva, abusividade de encargos ou violação aos princípios da boa-fé objetiva, da transparência e do equilíbrio contratual. Ressalta-se, todavia, que tal intervenção judicial se reveste de caráter excepcional, demandando prova efetiva da desvantagem excessiva ou da desproporcionalidade nas prestações. Com efeito, embora o princípio do pacta sunt servanda, segundo o qual os contratos fazem lei entre as partes, possa ser relativizado nas hipóteses em que configurada abusividade ou desequilíbrio substancial, não se pode admitir sua mitigação de forma apriorística ou automática, sob pena de afronta à segurança jurídica e à própria função social do contrato. DA ABUSIVIDADE DA TAXA DE JUROS No caso em apreço, a parte autora pleiteia a revisão contratual sob o argumento de abusividade na taxa de juros remuneratórios, requerendo sua limitação à média de mercado divulgada pelo Banco Central à época da contratação, bem como a devolução dos valores supostamente pagos a maior e os efeitos jurídicos decorrentes. Não merece acolhimento a pretensão. O Superior Tribunal de Justiça tem orientação pacífica no sentido de que a simples estipulação de juros acima da taxa média de mercado não configura, por si só, abusividade, sendo necessária a demonstração de discrepância significativa, apta a justificar intervenção judicial. Nos termos do REsp 1.061.530/RS (Tema 27/STJ), julgado sob o rito dos repetitivos, admite-se a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que evidenciada a relação de consumo e comprovada, de forma cabal, a abusividade contratual à luz das peculiaridades do caso concreto. No presente caso, o contrato prevê a aplicação de juros remuneratórios de 2,59% ao mês (35,91% ao ano), enquanto a taxa média apurada pelo Banco Central para a modalidade, em fevereiro de 2024, foi de 1,93% ao mês (25,85% ao ano). A diferença, embora existente, não alcança o patamar considerado relevante pela jurisprudência da Corte Superior para justificar revisão, como quando a taxa contratada supera uma vez e meia, o dobro ou mesmo o triplo da média de mercado (REsp 1.359.365). Ressalte-se que a taxa média de mercado é apenas referencial interpretativo, não constituindo teto absoluto. Ela reflete uma média ponderada de operações com variados níveis de risco e condições negociais, não servindo como critério único para apuração da onerosidade excessiva. Conforme entendimento do STJ: “A média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros.” (STJ, AgInt no AREsp 1.493.171/RS, Relator: Ministro Raul Araújo, Data de Julgamento: 17/11/2020, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: 10/03/2021) Ademais, as cláusulas contratuais foram redigidas de forma clara e objetiva, não se verificando violação aos princípios da boa-fé, da transparência ou do equilíbrio contratual. O contrato foi formalizado de forma regular e voluntária, com encargos expressamente pactuados e divulgados, não havendo vício de consentimento nem ausência de informação. Ainda, o fato de se tratar de contrato de adesão, por si só, não implica abusividade. Nos termos do art. 423 do Código Civil e art. 54 do Código de Defesa do Consumidor, é possível a revisão de cláusulas que coloquem o aderente em desvantagem exagerada, o que não se verifica na hipótese, sobretudo diante da inexistência de indícios mínimos de conduta abusiva por parte da instituição financeira. O princípio do pacta sunt servanda, embora mitigável em situações de desequilíbrio contratual, deve prevalecer sempre que ausente prova da onerosidade excessiva ou de cláusulas leoninas. Nesse sentido: “Se livremente negociado e aceito, o contrato faz lei entre as partes, devendo, por isso, prevalecer sob pena de violação ao princípio do pacta sunt servanda. Entendimento contrário só serviria para provocar insegurança aos contratantes, acarretando inegável desequilíbrio à relação jurídica.” (TJSP, ApCiv 1082870-86.2017.8.26.0100, Relator: Renato Sartorelli, Data de Julgamento: 09/08/2018, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 10/08/2018) Além disso, o autor não apresentou prova pericial ou técnica com validade processual que demonstrasse a alegada abusividade. Os documentos juntados (inclusive planilhas e parecer contábil unilateral, sem assinatura de profissional habilitado) não se revestem de força probatória suficiente para infirmar a legalidade dos encargos pactuados, tampouco para afastar o princípio da legalidade e da presunção de veracidade das cláusulas expressamente contratadas. Dessa forma, a pretensão revisional deve ser rejeitada, assim como os pedidos acessórios de restituição de valores, compensações, afastamento da mora e inexigibilidade de saldo residual, todos logicamente dependentes do reconhecimento de cláusula abusiva, o que não se verificou. Portanto, ausente a demonstração de abusividade ou de desequilíbrio contratual, impõe-se a manutenção da sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS A pretensão de readequação da verba honorária igualmente não merece acolhimento. Nos termos do art. 85, §§ 2º e 6º, do Código de Processo Civil, os honorários sucumbenciais constituem verba de natureza alimentar, devida ao advogado da parte vencedora como remuneração pelo trabalho prestado, considerando-se, entre outros critérios, o grau de zelo profissional, a natureza e importância da causa, o tempo exigido para o serviço e o lugar da prestação. Conforme dispõe expressamente o art. 85 do CPC – observando-se, ainda, o princípio da causalidade –, a fixação da verba honorária é consectário lógico da sucumbência, sendo incabível sequer cogitar a exclusão da condenação com base na alegada boa-fé processual da parte vencida, tampouco em razão da gratuidade de justiça concedida, pois esta, nos termos do art. 98, § 3º, do mesmo diploma, apenas suspende a exigibilidade da verba, mas não a afasta. O Superior Tribunal de Justiça já estabeleceu entendimento no sentido de que a condenação ao pagamento dos honorários de sucumbência é corolário lógico do resultado do julgamento, conforme se extrai dos seguintes precedentes: “A condenação nas verbas desucumbênciadecorre do fato objetivo da derrota no processo, cabendo ao juiz condenar, de ofício, a parte vencida, independentemente de provocação expressa do autor, porquanto trata-se de pedido implícito, cujo exame decorre da lei processual civil” (REsp 886.178/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial, julgado em 02/12/2009, publicado em 25/02/2010) “Ademais, a fixação dos honorários advocatícios é matéria que deve ser conhecida de ofício, porquanto é consectário lógico da sucumbência, não se encontrando subordinada a pedido contraposto ou reconvencional.” (STJ, AgInt no AREsp 1.268.423/DF, Relator.: Ministro Luis Felipe Salomão, Data de Julgamento: 18/02/2020, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: 03/03/2020) Sobre a possibilidade, ou não, de isenção ao pagamento de custas judiciais e honorários advocatícios à parte beneficiária da justiça gratuita, a Corte Superior já se manifestou: “Esta Corte sufragou o entendimento de que o beneficiário da justiça gratuita não faz jus a isenção do pagamento das custas processuais, mas tão somente a suspensão da exigibilidade destas, pelo período de 5 anos, a contar da sentença final, quando então, em não havendo condições financeiras de o recorrente quitar o débito, restará prescrita a obrigação.” (STJ, AgInt no REsp 1.637.275/RJ, Relatora.: Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Data de Julgamento: 06/12/2016, T6 - Sexta Turma, Data de Publicação: 16/12/2016) “1. O beneficiário da justiça gratuita, quando vencido na demanda, deverá ser condenado ao pagamento dos ônus sucumbenciais, aí incluídos os honorários advocatícios e as custas judicias. 2. As custas judiciais adiantadas pela parte autora compõem as verbas sucumbenciais, que, por sua vez, são parte integrante da condenação da parte vencida, conforme dispõe o art. 82, § 2º, do Código de Processo Civil. 3. A suspensão da exigibilidade disposta no § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil refere-se a todas as verbas sucumbenciais. No caso, ausente justificativa para afastar de tal previsão o valor das custas iniciais adiantas pela parte vencedora. 4. Recurso especial provido.” (STJ, REsp 1.949.665/DF, Relator.: Ministro Marco Aurélio Bellizze, Data de Julgamento: 17/10/2023, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: 25/10/2023) “O beneficiário da justiça gratuita não é isento do pagamento dos ônus sucumbenciais, apenas sua exigibilidade fica suspensa até que cesse a situação de hipossuficiência ou se decorridos cinco anos, conforme prevê o art. 12 da Lei 1.060/1950” (STJ, AgRg no REsp 1.386.100/RS, Relator.: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 11/02/2020, T1 - Primeira Turma, Data de Publicação: DJe 14/02/2020) De igual modo, considerando-se que a sentença julgou improcedentes os pedidos iniciais e não havendo reforma do julgado, não há falar em redistribuição da sucumbência ou em inversão do ônus, sendo o autor, parte integralmente vencida, o responsável pela verba honorária fixada, ainda que sua exigibilidade esteja suspensa. CONCLUSÃO Ante todo o exposto, REJEITO todas as preliminares aventadas e, no mérito, NEGO PROVIMENTO ao recurso da parte consumidora, mantendo inalterada a sentença de improcedência por estes e seus próprios fundamentos. Desprovido o recurso, majoro os honorários de sucumbência para 15% sobre o valor da causa, atento, ainda, ao disposto no art. 98, § 3º, do CPC, tendo em vista que a parte recorrente é beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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