Processo nº 0000913-80.2025.8.13.0191
ID: 316347662
Tribunal: TJMG
Órgão: Vara Única da Comarca de Corinto
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0000913-80.2025.8.13.0191
Data de Disponibilização:
04/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDO DE PAIVA ALVARENGA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Corinto / Vara Única da Comarca de Corinto Rua Doutor Antônio Alvarenga, 235, Fórum João Viana Fróis, Centro, Corin…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Corinto / Vara Única da Comarca de Corinto Rua Doutor Antônio Alvarenga, 235, Fórum João Viana Fróis, Centro, Corinto - MG - CEP: 39200-000 PROCESSO Nº: 0000913-80.2025.8.13.0191 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) ASSUNTO: [Constrangimento ilegal, Vias de fato, Contra a Mulher] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: DIEGO HENRIQUE PEREIRA DOS SANTOS CPF: 146.764.236-32 SENTENÇA I – RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por seu órgão de execução neste juízo, ofereceu denúncia em desfavor de DIEGO HENRIQUE PEREIRA DOS SANTOS, qualificado no ID 10399429413, imputando-lhe, respectivamente a prática dos crimes previstos no art. 129, § 13, do Código Penal, no art. 146, caput, do Código Penal e no art. 21, § 2°, do Decreto-Lei n° 3688/41, com incidência da Lei n.º 11.340/06. Narra a denúncia que, no dia 23 de janeiro de 2025, por volta das 23h00min, na rua São Francisco, n° 163, bairro Alvarenga, em Corinto/MG, o denunciado ofendeu a integridade corporal de sua ex-companheira Sarah Luíza de Almeida, prevalecendo-se da relação íntima de afeto. Sob as mesmas condições previamente mencionadas, o acusado praticou vias de fato em desfavor da sua ex-sogra, Érica Viviane de Almeida. Além disso, consta que, na mesma data e local, em horário não especificado, porém poucos minutos após o ocorrido anterior, o acusado tentou constranger, mediante grave ameaça com o uso de arma branca, a vítima Sarah Luíza de Almeida a fazer algo que a lei não manda, acompanhá-lo até sua casa, não chegando a concretizar o ato criminoso por fatores alheios à sua vontade (a vítima reagiu e conseguiu escapar). Para oferecimento da denúncia, vieram os documentos de IDs 10399504715 e 10399504716. O Ministério Público ofereceu a denúncia em 24 de fevereiro de 2025 (ID 10399429413), que foi recebida por este Juízo, conforme decisão datada de 26 de fevereiro de 2025 (ID 10400825428), oportunidade em que foi determinada a citação do acusado. Devidamente citado (ID 10411571247), o acusado apresentou resposta escrita à acusação (ID 10418254121), por meio de defensor constituído. Em audiência de instrução realizada em 10 de junho de 2025 (ID 10469909001), constatou-se a ausência da testemunha da acusação Leomar Marques Cardoso, tendo o Ministério Público dispensado a sua oitiva, com a anuência da defesa. Após, procedeu-se à oitiva das Vítimas e da Testemunha da Acusação (Erica Viviane de Almeida, Sarah Luíza de Almeida e Júlio César Modesto de Matos). Em seguida, realizou-se o interrogatório do acusado. Em sede de alegações finais orais, o Ministério Público, requereu a absolvição quanto ao delito previsto no artigo 146 do Código Penal, ao argumento de que se trata de fato atípico, uma vez que a guarda das filhas era exercida de forma conjunta pelo casal, que ainda residia sob o mesmo teto. Sustenta, ainda, que, embora tenha utilizado meio desproporcional, sua conduta não configurou ilicitude, por não violar comando legal. Quanto aos demais delitos imputados, pugna pela parcial procedência da denúncia. No tocante à dosimetria da pena, defende a incidência da agravante prevista no artigo 61, II, “f”, do Código Penal, diante da prática do fato com abuso das relações domésticas e de coabitação. Ressalta tratar-se de circunstância autônoma e diversa daquela prevista no §13 do artigo 129 do Código Penal, não havendo bis in idem, pois referem-se a fundamentos distintos e com finalidades próprias. A defesa do acusado, por sua vez, apresentou alegações finais de forma oral, oportunidade em que requereu a absolvição do réu quanto aos crimes que lhe foram imputados e, subsidiariamente, em caso de condenação, que a pena seja fixada no mínimo legal. É o relatório. DECIDO. II – FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal pública, que possui como titular o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, na qual se imputa ao réu DIEGO HENRIQUE PEREIRA DOS SANTOS o cometimento das infrações penais previstas no art. 129, §13, do Código Penal, no art. 146, caput, do Código Penal e no art. 21, § 2°, do Decreto-Lei n° 3688/41, com incidência da Lei n.º 11.340/06. De início, verifica-se que não se implementou qualquer prazo prescricional. Ademais, não foram suscitadas questões preliminares e, pela análise dos autos, não se vislumbra a ocorrência de qualquer nulidade ou irregularidade a ser declarada de ofício. Assim, passo ao exame do mérito. II.1 – Da imputação da prática do crime previsto no art. 129, §13º, do Código Penal praticado em desfavor da vítima Sarah Luíza de Almeida Quanto ao crime de lesão corporal praticada contra a mulher, por razões do sexo feminino, dispõe o artigo 129, §13, do Código Penal: Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: (…) § 13. Se a lesão é praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código: (Redação dada pela Lei nº 14.994, de 2024) Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (Redação dada pela Lei nº 14.994, de 2024) O bem jurídico protegido é a incolumidade física, compreendida como integridade corporal (inteireza do corpo humano) ou a saúde (normalidade das funções orgânicas, físicas e mentais do ser humano). O verbo ofender comanda o tipo penal e significa lesar, fazer mal a alguém ou a alguma coisa. Trata-se de crime material em que se exige um resultado naturalístico, qual seja a lesão à vítima. Em outras palavras, o crime se consuma com a efetiva lesão ao bem juridicamente tutelado. A materialidade delitiva restou comprovada pelo Boletim de ocorrência (ID 10399504715 – págs. 21/26), no Auto de Prisão em Flagrante Delito (ID 10399504715-págs. 01/09), Relatório médico para auto de corpo de delito (ID 10399504715 – págs.15/17), bem como pela prova testemunhal produzida nos autos. A autoria também restou demonstrada pelos depoimentos colhidos em juízo e pela prova documental coligida nos autos. A vítima, Sarah Luíza de Almeida, ouvida em audiência de instrução e julgamento, declarou o seguinte: “que o Diego Henrique é meu companheiro, não somos casados; que temos duas filhas, de 4 e 2 anos; que ele morava comigo, morava eu, minha mãe, as meninas e meu irmão; que isso aconteceu porque ele tava bebendo na porta, que ele tinha muito ciúmes também, que ele estava sob efeito de drogas pois ele usa cocaína; que ele pegou as meninas e levou para casa dele; que ele me agrediu no olho com murro, que ficou roxo; que ele tirou as meninas a força e me ameaçou dizendo que se eu fosse buscar elas ele iria me bater; que os vizinhos presenciaram essas agressões, mas não quis dar testemunho não; que minha mãe entrou para poder ajudar, e ele empurrou ela; sobre o facão não sei falar porque eu estava no pronto socorro na hora, que ele voltou na minha casa para ver se ele me achava mas o vizinho já tinha me levado para o pronto socorro porque eu estava machucada, mas eu não cheguei a ver o facão, quem falou do facão foi me levou, ele se chama pocotó, um vizinho que mora na rua de cima; que o Diego é muito bom pai, que o problema dele é só a bebida mesmo; que ele ajuda muito as filhas, que não agredi ele também ao tentar defender”.(Depoimento da vítima Sarah Luíza de Almeida. Disponível no Pje mídias) Corroborando as declarações prestadas por Sarah Luíza de Almeida, tem-se o depoimento de sua genitora, Érica Viviane de Almeida, que presenciou todos os fatos, nos seguintes termos: “que minha relação com o Diego era boa; que eu era sogra dele; que ele morava lá em casa, mas estava trabalhando fora, que aí ele chegou alterado de bebida, e ele tinha usado droga, no caso a cocaína, mas ele não era agressivo, mas esse dia ele saiu do sério; que pelejei com ele para não brigar, não discutir, para não chegar ao ponto que chegou; que o negócio dele eram as meninas, as meninas são as filhas dele; que ele queria levar as meninas para a casa da mãe dele, para atingir a Sara, pois o ponto fraco dela são as meninas, que aí ela também alterou, discutiu, por isso entrei no meio; que ele ameaçou a Sara por meio de palavras; que ele tava muito agressivo e como estava só nós duas de mulheres, ficamos com medo de entrar na casa e acontecer algo pior, por isso nós deixamos ele levar as meninas para casa da mãe dele, mas ele não agrediu elas; que ele não portava faca; que ele voltou depois que levou as meninas, enquanto estávamos fazendo o corpo delito, ele utilizou um facão que estava na minha casa e quebrou as coisas da Sara; mas ele não utilizou o facão para ameaçá-la; perguntada sobre quais foram os tipos de agressões que ele fez com a Sara, responde que foi com murros, que agrediu ela com a coberta das meninas, que ela ficou com marcas; que estávamos tentando ligar para a militar, mas não estávamos conseguindo, uma afastadinha que eu dei de uma esquina para outra para tentar arrumar um telefone para ligar, ele agrediu ela com socos e murros; que isso foi muito rápido; que minha filha ficou com hematoma nos olhos; que isso já aconteceu pela segunda vez; que da primeira vez ele ficou preso por 05 dias, que ela ainda era de menor na época, que eu vinha e respondia por ela; que aí eles voltaram e tiveram outra filha porque só tinham uma; que ele morava com a gente há uns dois anos; que ele trabalhava fora, mas todo final de semana ela tava aqui; que eu como sempre fui pedir para ele não discutir para não chegar ao extremo, que aí ele me acertou, me empurrou para o meio da rua, que cair no chão, mas não teve nenhuma lesão aparente”.(Depoimento de Érica Viviane de Almeida. Disponível no Pje mídias) (grifos nosso) Os depoimentos são claros e coerentes e comprovam de maneira indene de dúvida as agressões perpetradas pelo acusado. No caso em análise, verifico que o crime foi praticado contra a mulher por razões do sexo feminino. Em tais contextos, predomina em nossos tribunais o entendimento de que a palavra da vítima adquire especial valor probante, razão pela qual, seus depoimentos, quando firmes, coerentes e em consonância com os demais elementos probatórios carreados aos autos, são suficientes para embasar um decreto condenatório. Ademais, é aplicável ao caso as disposições da Lei 11.340/06, que em seu art. 12, §3º, determina que “serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde”. Assim, havendo nos autos relatório médico firmado por profissional integrante do SUS, tenho que resta devidamente comprovada a materialidade delitiva. Desse modo, diante das provas coligidas aos autos, forçoso concluir que o acusado praticou o delito tipificado no artigo 129, §13, do Código Penal, em desfavor da vítima Sarah Luiza de Almeida, sendo sua conduta antijurídica e culpável, impondo, assim, a aplicação das sanções correspondentes. II.2 – Da imputação da prática do crime previsto no art. 146, caput, do Código Penal Art. 146 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa. A materialidade delitiva e a autoria restaram duvidosas, não havendo provas suficientes para a condenação. Em sede de alegações finais, o Ministério Público requereu a absolvição do réu quanto ao crime de constrangimento ilegal, previsto no artigo 146 do Código Penal, ao argumento de se tratar de fato atípico. Com razão o Parquet. A análise dos autos revela que, embora o denunciado tenha, de fato, adotado conduta desproporcional ao tentar levar as suas filhas para casa de sua mãe, tal comportamento não se amolda ao tipo penal em questão. Conforme apurado, à época dos fatos, o réu e a genitora das crianças residiam no mesmo imóvel e exerciam, de forma conjunta, a guarda das filhas. Dessa forma, inexistia impedimento legal para que o réu saísse com as crianças, não havendo que se falar em constrangimento ilegal, pois o exercício da guarda compartilhada pressupõe a possibilidade de ambos os genitores tomarem decisões e realizarem atos da vida cotidiana com os filhos.. Desta forma, acolho o pedido formulado pelo Ministério Público, reconhecendo a atipicidade da conduta, nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, com a consequente absolvição do réu. II.3 – Da imputação da prática da contravenção penal prevista no artigo 21, §2º, do Decreto-Lei 3.688/41 praticada em desfavor de Érica Viviane de Almeida Art. 21. Praticar vias de fato contra alguem: Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de cem mil réis a um conto de réis, se o fato não constitue crime. (…) § 2º Se a contravenção é praticada contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), aplica-se a pena em triplo. (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024) A materialidade delitiva restou comprovada pelo Boletim de ocorrência (ID 10399504715 – págs. 21/26), pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (ID 10399504715-págs. 01/09), pelo Relatório médico para auto de corpo de delito (ID 10399504715 – págs.15/17), bem como pela prova testemunhal produzida nos autos. A autoria, de igual forma, também restou demonstrada. Colaciono trecho do depoimento da vítima Érica Viviane de Almeida, no qual relata que foi empurrada pelo réu, vindo a cair ao chão em decorrência da agressão sofrida. Veja-se: “(…) que eu como sempre fui pedir para ele não discutir para não chegar ao extremo, que aí ele me acertou, me empurrou para o meio da rua, que cair no chão, mas não teve nenhuma lesão aparente”. (grifos nosso) Corroborando as declarações da vítima, destaca-se o depoimento de Sarah, filha de Érica, que confirmou ter sua mãe sido agredida pelo denunciado na data dos fatos. Sua narrativa reforça a veracidade dos relatos apresentados pela vítima, conferindo-lhes ainda mais credibilidade. Veja-se trecho de seu depoimento: “(…) que minha mãe entrou para poder ajudar, e ele empurrou ela; sobre o facão não sei falar porque eu estava no pronto socorro na hora (…) ”. (grifos nosso) Além disso, tem-se o depoimento do policial militar Júlio César Modesto de Mattos, que assim declarou: “que fomos acionados a comparecer no hospital, ela já estava internada, medicada, e ela foi e nos revelou o que tinha acontecido, que fomos fazer os rastreamento, meu colega já conhecia o Diego, que deslocamos até a casa dele, batemos no portão; que fiquei de um lado meu colega de outro, que quando ele viu a gente correu e saiu saltando o muro e escondeu lá dentro; que a mãe dele veio, atendeu o portão e franqueou nossa entrada; que quando chegamos ele tava deitado na cama, todo suado até pingando suor, as meninas dele estava dormindo do lado; que no início ele desconversou, mas também ele falou que realmente teve uma briga; que tive com a vítima lá no APS, que ela relatou as agressões, que o olho dela estava muito roxo, que achei que ela ia ficar até cega de tão feio que estava o olho dela; que ela falou que ele deu socos e chutes na face dela; que recorda que ele queria pegar a força as meninas, que ela não quis deixar, aí ele ficou nervoso, aí ele saiu e voltou com uma faca, e ela se escondeu na casa de uma vizinha, mas isso após ela deixar ele levar para evitar mais confusão; que em relação a mãe da Sarah eu lembro que ela disse que tentou separar e ele agrediu ela também; que não visualizou a faca, pois o momento do fatos até o momento que localizamos ele, já tinha passado muito tempo, e ele desfez dessa faca”. Diante do exposto, verifica-se que as declarações prestadas pela vítima, em juízo, revelam-se firmes, coerentes e detalhadas, sendo corroboradas pelo testemunho de sua filha e do policial militar responsável pela ocorrência, o que confere robustez à versão acusatória. Assim, restam suficientemente comprovadas a materialidade e a autoria da contravenção penal prevista no artigo 21,§2º, do Decreto-Lei nº 3.688/41. Dessa forma, diante da prova firme e harmônica dos autos, conclui-se pela prática da infração penal de vias de fato, sendo a conduta do acusado antijurídica e culpável, impondo-se, portanto, a aplicação das sanções penais cabíveis. II.4 Da agravante prevista no artigo 61, II, f, do Código Penal Dispõe o art. 61, inciso II, alínea f, do Código Penal, ser circunstância que sempre agrava a pena, quando não constitui ou qualifica o crime, ter o agente praticado-o “com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica”. No tocante ao crime previsto no artigo 129, §13, do Código Penal, e à contravenção penal prevista no artigo 21,§2º, do Decreto-Lei 3.688/41, observo que a circunstância de ser as infrações penais praticadas prevalecendo-se de relações domésticas já qualificam as infrações, não podendo ser novamente valorada como agravante, sob pena de incorrer em bis in idem. Ainda que o Ministério Público tenha defendido, em alegações finais, a incidência da agravante com base na autonomia entre as circunstâncias de coabitação e a violência doméstica tipificada, entendo que tal distinção não se sustenta, pois a elementar já está contemplada no tipo penal, o que impede sua valoração em duplicidade. Apesar de o STJ possui entendimento consolidado quanto à possibilidade de incidência da referida agravante em relação à lesão corporal qualificada no §9º, do art. 129, entendo que a redação do §13º incluiu a violência contra mulher em suas elementares, de modo que o reconhecimento da agravante não se mostra possível. Ante a semelhança na redação, também não se mostra possível a aplicação da agravante na contravenção de vias de fato qualificada pelo §2º do art. 21. Nesse sentido, é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LESÃO CORPORAL POR RAZÕES DO SEXO FEMININO E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA - VALIDADE PROBATÓRIA - JULGAMENTO SOB A ÓTICA DO PROTOCOLO PARA JULGAMENTOS DE PERSPECTIVA DE GÊNERO - DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - CONSUNÇÃO - INVIÁVEL - DECOTE DA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, II, "F", DO CP - ACOLHE PARCIALMENTE - RECONHECIMENTO DO CONCURSO FORMAL DE CRIMES - NÃO CONFIGURAÇÃO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. - Imperiosa a manutenção da condenação pela prática dos crimes previsto no art. 129, §13º, do Código Penal e art. 24-A da Lei Maria da Penha, quando o conjunto probatório coleado aos autos demonstra a materialidade e autoria delitiva em face do acusado. - A palavra da vítima possui especial relevância probatória nos crimes praticados no contexto de violência doméstica, para fins de comprovação da autoria e da materialidade delitiva, mormente quando elas são coerentes e harmônicas com o conjunto probatório presente nos autos, em observância as diretrizes relacionadas ao Protocolo de Julgamento de Perspectiva de Gênero, nos termos da Resolução nº 492/2023 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ. - Comprovada ofensa à integridade física da vítima, incabível a desclassificação da lesão corporal contra a mulher por razões do sexo feminino para a contravenção penal prevista no art. 21 da LC. - Inaplicável o princípio da consunção quando o alegado crime-meio é mais grave que o crime-fim e, ainda, verifica-se que as condutas decorreram de desígnios autônomos. - Consoante entendimento firmado pelo c. STJ no REsp n. 2.027.794/MS, submetido ao rito dos repetitivos (tema repetitivo nº 1197), a incidência da agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea "f" do Código Penal em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), não configura bis in idem. - Entretanto incorre em bis in idem a cumulação da qualificadora prevista no art. 129, § 13, do CP com a agravante constante no art. 61, II, "f", da referida Lei, uma vez que a ambas punem a violência contra a mulher. - Nos termos do art. 70, caput, do CP, aplica-se o concurso formal apenas "Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não. (TJMG - Apelação Criminal 1.0000.25.026459-5/001, Relator(a): Des.(a) Maria das Graças Rocha Santos , 9ª Câmara Criminal Especializa, julgamento em 14/05/2025, publicação da súmula em 15/05/2025) Dessa forma, não é possível aplicar a agravante do artigo 61, II, 'f', do Código Penal quando a circunstância de violência doméstica já integra o tipo penal. II.5 – Da agravante da reincidência Ao analisar a CAC e a FAC do acusado, constato a existência de uma condenação com trânsito em julgado em 29/08/2022, nos autos nº 0011067-02.2021.8.13.0019, o que caracteriza a reincidência. Assim, referida condenação será considerada como circunstância agravante na segunda fase da dosimetria da pena. III – DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a denúncia para: a) SUBMETER o acusado DIEGO HENRIQUE PEREIRA DOS SANTOS às sanções do art. 129, §13, do Código Penal e art. 21,§2º, do Decreto-Lei nº 3.688/41; b) ABSOLVER do acusado DIEGO HENRIQUE PEREIRA DOS SANTOS, das sanções do art. 146, caput, do Código Penal. Passo a dosar-lhe a pena, atento ao comando do artigo 68 e à análise das circunstâncias judiciais insertas no artigo 59, ambos do Código Penal. IV – DOSIMETRIA IV.1) Do crime previsto no art. 129, §13, do Código Penal praticado em desfavor da vítima, Sarah Luiza de Almeida i) Da pena-base: Na primeira fase da dosimetria, examino as circunstâncias judiciais. A culpabilidade do acusado, expressada pelo grau de reprovabilidade de sua conduta, não ultrapassou aquela inerente ao próprio tipo penal, razão pela qual não pode ser valorada negativamente. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o acusado é reincidente, conforme CAC (ID 10465848963) e FAC (ID 10465844014), agravante que será analisada na segunda fase da dosimetria, portanto, nada a valorar no momento. A conduta social do denunciado, por seu turno, não pode ser reputada inadequada, haja vista inexistirem elementos capazes de influir negativamente nesse aspecto, não sendo razoável que tal circunstância judicial seja-lhe sopesada desfavoravelmente. A personalidade do agente é delineada pela conjugação de elementos hereditários e socioambientais, entendida como síntese das qualidades morais e sociais do indivíduo. No caso em apreço, não se produziu prova técnica apta a apontar eventual desvio de personalidade por parte do acusado. No que tange aos motivos, estes não extrapolam a objetividade jurídica do tipo penal respectivo, nada tendo a ser valorado. Quanto às circunstâncias do crime, que dizem respeito aos aspectos laterais, periféricos, que circundam o fato propriamente dito, mostram-se graves, uma vez que a agressão foi praticada na presença das crianças, filhas do denunciado, propagando traumas decorrentes do delito para além da vítima direta das lesões. As consequências do delito dizem respeito à maior ou menor danosidade decorrente da ação delituosa praticada, o que também se mostrou inerente ao tipo penal. Finalmente, quanto ao comportamento da vítima, que, em nada contribui para a prática do delito. Considerando uma circunstância judicial desfavorável, aplico a fração de 1/8 sobre o intervalo entre a pena mínima e máxima e fixo a pena-base no patamar de 02 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. ii) Da pena provisória Na segunda fase da dosimetria, verifico a presença da agravante da reincidência e a ausência de atenuantes. Assim, utilizando a fração de 1/6, fixo a pena intermediária em 02 (dois) anos, 09 (nove) meses e 07 (sete) dias de reclusão. iii) Da pena definitiva: Na terceira fase da dosimetria, verifica-se inexistirem causas de aumento ou diminuição da pena, motivo pela qual fica a pena definitiva fixada em 02 (dois) anos, 09 (nove) meses e 07 (sete) dias de reclusão. IV.2) Da infração penal prevista no art. 21, §2º, do Decreto-Lei nº 3.688/41 praticada em desfavor da vítima Érica Viviane de Almeida i) Da pena-base: Na primeira fase da dosimetria, examino as circunstâncias judiciais. A culpabilidade do acusado, expressada pelo grau de reprovabilidade de sua conduta, não ultrapassou aquela inerente ao próprio tipo penal, razão pela qual não pode ser valorada negativamente. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o acusado é reincidente, conforme CAC e FAC, agravante que será analisada na segunda fase da dosimetria, portanto, nada a valorar no momento. A conduta social do denunciado, por seu turno, não pode ser reputada inadequada, haja vista inexistirem elementos capazes de influir negativamente nesse aspecto, não sendo razoável que tal circunstância judicial seja-lhe sopesada desfavoravelmente. A personalidade do agente é delineada pela conjugação de elementos hereditários e socioambientais, entendida como síntese das qualidades morais e sociais do indivíduo. No caso em apreço, não se produziu prova técnica apta a apontar eventual desvio de personalidade por parte do acusado. No que tange aos motivos, estes não extrapolam a objetividade jurídica do tipo penal respectivo, nada tendo a ser valorado. Quanto às circunstâncias da contravenção, que dizem respeito aos aspectos laterais, periféricos, que circundam o fato propriamente dito, mostram-se graves, uma vez que a agressão foi praticada na presença das crianças, filhas do denunciado, propagando traumas decorrentes do delito para além da vítima direta das lesões. As consequências da infração dizem respeito a maior ou menor danosidade decorrente da ação delituosa praticada, o que também se mostrou inerente ao tipo penal. Finalmente, quanto ao comportamento da vítima, que, em nada contribui para a prática da infração. Considerando uma circunstância judicial desfavorável, aplico a fração de 1/8 sobre o intervalo entre a pena mínima e máxima e fixo a pena-base no patamar de 24 (vinte e quatro) dias de prisão simples. ii) Da pena provisória Na segunda fase da dosimetria, constato a incidência da agravante da reincidência, não havendo causas atenuantes a serem reconhecidas. Diante disso, elevo a pena provisória utilizando o coeficiente de 1/6, fixando-a em 28 (vinte e oito) dias de prisão simples. iii) Da pena definitiva: Na terceira fase da dosimetria, verifico a incidência da causa de aumento prevista no §2º do artigo 21 da LCP, que estabelece a aplicação da pena em triplo quando a contravenção é cometida contra a mulher por razões da condição do sexo feminino. Assim, majoro a pena definitiva sendo fixada em 02 (dois) meses e 24 (vinte e quatro) dias de prisão simples. VI.3) Do concurso material Nos termos do artigo 69, reconheço o concurso material de crimes, razão pela qual aplico cumulativamente as penas do acusado, ficando condenado à pena total de 02 (DOIS) ANOS, 09 (NOVE) MESES E 07 (SETE) DIAS DE RECLUSÃO E 02 (DOIS) MESES E 24 (VINTE E QUATRO) DIAS DE PRISÃO SIMPLES. O regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade para o acusado será o SEMIABERTO, nos termos do artigo 33, §2º, do Código Penal, em razão do quantum da pena e da reincidência do acusado. Atenta ao artigo 44 do Código Penal, deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, uma vez que não verifico o preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos, visto que o crime foi praticado com violência à pessoa. Na mesma esteira, não permito a suspensão condicional da pena privativa de liberdade, por estarem ausentes os pressupostos necessários para tanto, o que afirmo com fulcro no artigo 77 do Código Penal, visto que ao acusado foi imposta pena privativa de liberdade superior a dois anos. Em razão da gravidade concreta das condutas pelas quais o réu está sendo condenado, bem como a necessidade de resguardar a integridade física e psicológica das vítimas, não concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. No entanto, a prisão preventiva deverá ser compatibilizada com regime ao qual o réu está sendo submetido, qual seja, o semiaberto, nos termos da jurisprudência do TJMG: EMENTA: HABEAS CORPUS - TRÁFICO DE DROGAS - SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA - DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE DENEGADO - UTILIZAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM - ADMISSÃO - PRESENÇA ATUAL DOS REQUISITOS DOS ARTIGOS 312 E 313, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - MANUTENÇÃO DA PRISÃO - REGIME INICIAL SEMIABERTO - COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE A PRISÃO CAUTELAR E O REGIME MENOS GRAVOSO - ORDEM DENEGADA. Subsistindo os motivos que ensejaram a decretação da segregação cautelar, não há constrangimento ilegal na decisão que mantém a medida extrema, ratificando/adotando as razões de decidir apresentadas anteriormente. Não há ilegalidade na decisão que nega à Paciente o direito de recorrer em liberdade quando prevalece, com base em fatos concretos, a necessidade da segregação cautelar. O regime semiaberto e a prisão preventiva são compatíveis, desde que haja a devida adequação da forma de cumprimento do cárcere. (TJMG - Habeas Corpus Criminal 1.0000.25.135593-9/000, Relator(a): Des.(a) Anacleto Rodrigues , 8ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 15/05/2025, publicação da súmula em 16/05/2025). Tendo em vista que, na Comarca de Corinto, o referido regime é executado por meio de prisão domiciliar com monitoração eletrônica, entendo que a manutenção da prisão cautelar deve ser feita por prisão domiciliar com monitoração eletrônica. A monitoração eletrônica do réu será cumprida com recolhimento domiciliar das 20h às 6h, inclusive em feriados, domingos, folgas e dias sem trabalho, salvo autorização judicial, devendo manter endereço e telefone atualizados, atender às ligações e visitas do órgão de monitoração e da Polícia Militar. Destaco que é proibido remover, danificar ou desligar o equipamento, devendo mantê-lo sempre recarregado e funcional, comunicando falhas imediatamente ao NMRE. Mudanças no trabalho ou domicílio devem ser informadas e comprovadas nos autos. Em emergências, deverá comunicar imediatamente ao NMRE e comprovar nos autos em até cinco dias. O descumprimento das condições poderá resultar em prisão preventiva. Nos termos do art. 387, IV, do CPP e em atenção à tese firmada no Tema 983 do STJ, fixo o valor mínimo de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização pelos danos morais causados pela infração, conforme requerido pelo Ministério Público. V – DISPOSIÇÕES FINAIS Custas pelo condenado, nos termos do artigo 804, do Código de Processo Penal. Contudo, por analogia ao artigo 98 do CPC, concedo de ofício ao denunciado o benefício da justiça gratuita, por ser reconhecidamente pobre, de modo que fica suspensa a exigibilidade de custas e despesas processuais. Expeça-se alvará de soltura e oficie-se à Diretoria do Estabelecimento Prisional onde se encontra o réu, comunicando-lhe a concessão da monitoração eletrônica a Diego Henrique, bem como para providenciar o deslocamento dele, com urgência, até o NRME ou órgão competente, para a instalação do equipamento de monitoramento eletrônico e posterior liberação. Oficie-se ao Comandante da Polícia Militar local para ciência e fiscalização do cumprimento das condições ora impostas, especialmente o recolhimento noturno e em dias de folga. Expeça-se guia de execução provisória. Intimem-se, pessoalmente, o acusado e as vítimas. O defensor constituído será intimado pelo PJe. - Transitada em julgado esta sentença, bem como de eventual acórdão, determino: INSIRAM-SE os dados desta condenação nos sistemas. EXPEÇA-SE a competente guia de execução definitiva e crie-se processo de execução no SEEU. COMUNIQUE-SE ao TRE, para deliberação quanto à suspensão dos direitos políticos, prevista no art. 15, III da CR/88. PREENCHA-SE o boletim individual, com respectiva remessa e cumprimento de demais recomendações da CGJ e do CNJ. Tome a Secretaria todas as demais providências pertinentes à execução da sentença. Publique-se. Intimem-se. Corinto, data da assinatura eletrônica. GUSTAVO DUARTE VIEIRA Juiz de Direito Vara Única da Comarca de Corinto
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