A.A.V.V.E.O. e outros x Ministério Público Do Trabalho Da 15ª Região e outros
ID: 315077412
Tribunal: TST
Órgão: Subseção II Especializada em Dissídios Individuais
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0007396-59.2018.5.15.0000
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
DR. DENY EDUARDO PEREIRA ALVES
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
DR. PEDRO DEL MONTE MARCUSSI
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
DR. GILBERTO LOPES THEODORO
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
DRA. AMANDA APARECIDA VIOLIN VICENTINI
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
A C Ó R D Ã O
Subseção II Especializada em Dissídios Individuais
GMMAR/tas
RECURSOS ORDINÁRIOS EM AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. COLUSÃO. BLINDAGEM PATRIMONIAL. FRAUDE A TERCE…
A C Ó R D Ã O
Subseção II Especializada em Dissídios Individuais
GMMAR/tas
RECURSOS ORDINÁRIOS EM AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. COLUSÃO. BLINDAGEM PATRIMONIAL. FRAUDE A TERCEIROS. CONFIGURAÇÃO. 1. A hipótese de colusão entre as partes, como fundamento autorizador do corte rescisório (art. 966, III, do CPC), diz respeito à utilização do processo como meio de fraudar a lei e prejudicar terceiros, em especial ante a natureza preferencial do crédito trabalhista, o que possibilita a constituição de blindagem patrimonial em relação a outras dívidas, inclusive tributárias ou com garantia real. 2. Considerando a notória dificuldade probatória em relação ao intuito fraudulento das partes na ação subjacente, a jurisprudência desta Corte Superior consolidou-se no sentido de admitir a prova indiciária como fundamento para desconstituir o título executivo resultado da fraude, desde que presentes elementos suficientes a atrair a constatação do desvio de finalidade na ação subjacente. 3. Assim, por exemplo, devem ser analisados, entre outros, a relação extraprocessual entre as partes (amizade, parentesco ou profissão); a existência de dívidas da reclamada que justifiquem a constituição de crédito privilegiado como proteção ao seu patrimônio; o comportamento processual das partes (seja em relação à proporção entre pedidos e valor da causa ou do acordo entabulado; seja no tocante à existência, ou não, de efetiva pretensão resistida), bem como a relação de direito material que deu origem à reclamação trabalhista. 4. No caso, trata-se de avença celebrada em conjunto por três trabalhadores com a empregadora e o Município, para pagamento dos haveres trabalhistas mediante créditos que a empresa possuía em face do Ente Público. 5. O primeiro elemento de convicção do MPT diz respeito ao fato de que os reclamantes atuaram em favor da reclamada, mesmo após a data da alegada extinção dos contratos de trabalho. 6. Com efeito, os elementos de prova evidenciam não apenas a continuidade na prestação de serviços, como também a posição de destaque e nível de fidúcia diferenciada dos reclamantes, corporificando a própria representação do empreendimento, em razão de sua atuação como prepostos em audiências trabalhistas ou na própria administração da pessoa jurídica, com poderes inclusive de firmar procurações. 7. Disso se conclui pela existência de vínculo jurídico especial entre as partes, que permaneceu para além dos contratos de trabalho rescindidos em abril de 2017, e que constitui o primeiro dos elementos indiciários de participação na fraude a credores. 8. Ademais, embora fosse praxe a celebração de acordos trabalhistas mediante utilização de créditos decorrentes de contratos administrativos firmados com diversos Municípios, o exame dos autos revela que o acordo específico dos réus ostentava particularidades para além dos padrões de normalidade. 9. Todos os acordos firmados perante a Justiça do Trabalho possuíam cifras de no máximo 20 mil reais por trabalhador. Por seu turno, a avença firmada pelos réus ostentou valor total de quase 800 mil reais, uma média superior a 260 mil reais para cada um dos réus. 10. Além disso, todos os acordos contaram com a participação do Procurador do Município, situação não verificada na avença entabulada na ação subjacente, em que referido causídico fez questão de consignar, em petição, que "não participou da entabulação de seus termos e, portanto, desconhece elementos que apontem para seu acerto e/ou viabilidade". 11. Outrossim, a reclamação trabalhista subjacente foi proposta em 5.9.2017, algumas semanas depois de terem sido determinados os primeiros bloqueios pela Justiça Comum, justamente sobre os créditos em face do Município-réu, para fazer frente a dívidas de outra natureza contra a empresa. 12. Nesse contexto, a existência de diversas penhoras determinadas no âmbito da Justiça Comum justifica a necessidade de utilização de ação simulada, com o objetivo de obtenção de crédito trabalhista privilegiado, que teria preferência sobre as constrições da Justiça Estadual. 13. Portanto, o fato de ter adimplido as diversas obrigações trabalhistas de outros reclamantes não afasta a constatação de lide simulada no caso concreto, considerada a existência de expressivas dívidas de natureza civil que justificam a propositura fraudulenta de ação trabalhista, com valores muito acima da média adotada com outros trabalhadores, tendo por objetivo a proteção do patrimônio da pessoa jurídica em face de credores. 14. Em suma, os elementos considerados em conjunto autorizam concluir pela configuração de colusão, na forma do art. 966, III, do CPC, atraindo a necessidade de desconstituição do Julgado, com extinção do processo matriz sem resolução do mérito. Recursos ordinários conhecidos e desprovidos.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário Trabalhista nº TST-ROT - 7396-59.2018.5.15.0000, em que são Recorrentes e Recorridos A. A. V. V. E. O. e A. E. E. P. S.A. e são Recorridos M. P. DO T. DA 1. R. e M. DE M. A.
Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, sob a égide do CPC/2015 com o objetivo de desconstituir sentença homologatória de acordo nos autos RT-0011954-58.2017.5.15.0146, em razão de colusão e lide simulada.
O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou procedente a ação, para "julgar extinta sem resolução de mérito a reclamação trabalhista de origem, na forma dos incisos I e VI do art. 485 do CPC, e determinar a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil - OAB".
Inconformados, os réus AAVVEO e AEEP S/A interpõem recursos ordinários.
Contrarrazoado.
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
CONHECIMENTO
Presentes os requisitos legais de admissibilidade, conheço dos recursos ordinários.
MÉRITO
SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. COLUSÃO. BLINDAGEM PATRIMONIAL. FRAUDE A TERCEIROS. CONFIGURAÇÃO
Ministério Público do Trabalho ajuizou ação rescisória com o objetivo de desconstituir sentença homologatória de acordo firmada entre os trabalhadores AMANDA, DANIELA e LUCIANO, a empresa AZALEIA e o Município de Morro Agudo/SP.
A decisão rescindenda, quando ao tema, trouxe os seguintes elementos:
"Homologo o acordo noticiado pelas partes sob Id. nº 03db888 (06/02/2018), para que surta seus legais e jurídicos efeitos.
Diante do caráter das verbas objeto da avença, haverá recolhimentos previdenciários e fiscais, devendo o reclamado MUNICÍPIO DE MORRO AGUDO efetuar o pagamento de acordo com a discriminação da minuta (item 2.1), após o fornecimento das guias pela reclamada AZALEIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A.
Custas calculadas sobre o valor do acordo (R$ 782.667,03), no importe de R$ 15.653,34 a cargo do segundo reclamado, de cujo recolhimento fica isento, na forma do art. 790-A, inciso 7c, da CLT.
Com efeito, declaro a extinção do presente feito, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso III, "b", do CPC.
Consigna-se que o reclamado MUNICÍPIO DE MORRO AGUDO efetuará o pagamento da importância líquida de R$ 782.667,03 aos reclamantes, em 10 (dez) parcelas, iniciando-se no prazo de 10 dias após a presente homologação."
O Tribunal Regional julgou a pretensão rescisória procedente, na esteira dos seguintes fundamentos:
"O autor, em sua peça vestibular, alega, em síntese, que, consoante as informações da petição inicial da reclamação trabalhista de origem (RT n.º 0011954-58.2017.5.15.0146), os réus Daniela, Amanda e Luciano foram dispensados pela ré Azaleia em 04/04/2017, depois de serem transferidos internamente entre empresas do mesmo grupo empresarial (Grupo Leão), dentre as quais, as empresas CBN Construtora, Leão & Leão, Prime Infraestrutura, Sanetech, Leão Ambiental (que posteriormente alterou sua razão social para "ESTRE SPI"), todos em cargos de chefia e gerência. Após a dispensa, os réus trabalhadores ingressaram, em litisconsórcio ativo, com a reclamação trabalhista em questão, em face da ex-empregadora Azaleia, tendo o Município réu como responsável subsidiário, na qual pleiteavam o pagamento de um total estimado em R$ 900.687,40, inclusive tendo requerido medida cautelar de arresto deste valor, diante da ciência de que a ré Azaleia, em situação pré-falimentar, possuiria junto ao Município de Morro Agudo um crédito no valor líquido de R$ 1.196.546,21.
Prossegue o D. Parquet laboral descrevendo o andamento do processo, destacando que um dia antes da audiência inaugural foi apresentada a primeira petição de acordo entre os reclamantes e a reclamada Azaleia, no valor líquido de R$ 782.667,03, a ser pago diretamente pelo Município com os créditos devidos à ex-empregadora. No entanto, noticia que em 11/09/2017 o Município rejeitou o primeiro acordo formalizado, assim como também rejeitou nova proposta em 23/10/2017, bem assim, que em minutas de acordo posteriores, que passaram a contar com a assinatura também do Sr. Prefeito do Município, o Sr. Procurador Municipal fez questão de manifestar a sua não participação na avença.
Em 29/01/2018 houve nova manifestação do Município, desistindo das minutas de acordo anteriormente assinadas, e, em 06/02/2018, apresentada nova minuta, também assinada pelo Sr. Prefeito Municipal, no entanto, novamente com a ressalva do Sr. Procurador do Município quanto ao seu conteúdo e sua participação na entabulação de seus termos. Este acordo foi homologado em 20/02/2018, por meio da r. Decisão rescindenda.
Posteriormente, em maio de 2018, quando do processamento de Agravo de Petição na reclamação trabalhista de origem, o MM. Juiz da Vara do Trabalho de Orlândia expediu ofício ao D. Ministério Público do Trabalho com a notícia de suspeitas de fraude nos presentes autos, em especial pelo envolvimento de empresas do grupo empresarial Leão nas operações "Purgamentum" e "Eminência Parda", deflagradas pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual para o combate ao crime organizado.
Além disso, foi informado que as então reclamantes continuavam a representar as empresas do grupo Leão como prepostos e/ou advogados em diversos processos, mesmo muitos meses após a mencionada rescisão contratual, inclusive indicando endereço profissional idêntico ao de diversas empresas do Grupo Leão.
Concomitantemente à ocorrência de tais fatos, ressalta o autor, correm dezenas de outras reclamações trabalhistas legítimas nas quais os trabalhadores não logram êxito em localizar bens das empresas para a execução, o que, mais uma vez, reforça a conclusão de que o acordo entabulado na reclamação trabalhista n.º 0011954-58.2017.5.15.0146 constitui simulação com o intuito de desviar recursos públicos e fraudar credores, em especial os trabalhistas.
Em contestação, o Município réu reconheceu os pedidos iniciais e requereu seja julgada procedente a ação rescisória.
Os réus Daniela, Amanda e Luciano, em suas peças de defesa, atribuem o imbróglio referente aos acordos ao modus operandi do Município, que somente busca se esquivar do adimplemento de suas obrigações, em especial das reclamações trabalhistas das quais é alvo. Ainda, esclarecem que passaram a prestar serviços ao grupo empresarial Leão como pessoas jurídicas premidos pela necessidade de sustento próprio e de suas famílias, que várias execuções vinham sendo pagas por meio dos créditos da empresa junto a municípios da região, que todo o procedimento foi acompanhado pelas entidades sindicais e pelo MM. Juízo Trabalhista local, que as partes não possuem envolvimento para o cometimento de fraudes e que os valores envolvidos decorrem de verbas salariais e rescisórias incontroversas.
A ré Azaleia, por seu turno, se opõe aos pedidos do Ministério Público do Trabalho, alegando que não compõe grupo econômico com as demais empresas mencionadas, que realizou diversos acordos nos mesmos moldes e que o acordo objeto da presente ação preenche todos os requisitos de validade, devendo ser integralmente mantido.
Pois bem.
Ainda que não se possa proibir os réus de firmarem novos contratos de trabalho com a ex-empregadora, e mesmo diante de todas as alegações defensivas, a situação trazida à baila contém uma série de particularidades que levanta grave suspeita acerca da colusão que lhes foi imputada.
A prova documental apresentada pelo autor, junto à petição inicial, demonstra que, apesar dos réus Amanda, Daniela e Luciano terem sido dispensados em 04/04/2017, continuaram a prestar serviços para as empresas do Grupo Leão em postos-chave, de elevada confiança, tais como os de prepostos e procuradores jurídicos e administrativos, inclusive em audiências de reclamações trabalhistas.
Em especial, verifico que as rés Amanda e Daniela funcionaram como prepostas das empresas em audiência realizada na 1ª Vara do Trabalho de Orlândia, na reclamação trabalhista n.º 0011080-78.2014.5.15.0146, na data de 30/08/2017, processo que reúne dezenas de execuções em face da ré Azaleia e de suas empresas coligadas, sendo certo que a carta de preposição para a ré Amanda foi firmada pelo réu Luciano na data de 17/08/2017.
Destas provas, revela-se especialmente grave o fato de que o réu Luciano assinou a carta de preposição em nome da empresa, o que torna pouco crível que não possuísse forte ligação com a ex-empregadora, mesmo quase 5 meses após o suposto desligamento.
Outro fato que se destaca é o de que os réus Amanda, Daniela e Luciano se reuniram para ingressar com reclamação trabalhista conjunta em face da ré Azaleia, de modo que, baseados nas informações privilegiadas que possuíam, os pedidos cumulados atingissem quase a totalidade do crédito remanescente da empresa junto ao Município réu.
Em outras palavras, as partes possuíam amplo conhecimento das execuções promovidas pelos demais trabalhadores e dos créditos remanescentes, e o ajuizamento da reclamação trabalhista conjunta visou amealhar o máximo possível deste montante, em manifesto prejuízo das dezenas de trabalhadores que buscam satisfazer os seus créditos em outras reclamações.
Ainda que as testemunhas ouvidas a convite dos réus pessoas físicas tenham demonstrado que era procedimento comum a realização de acordos para o pagamento do acerto rescisório, a testemunha Vera Lúcia Lopes Gonçalves de Souza (ID fef5425), que informou ter substituído a ré Amanda como Gerente de RH após a sua dispensa, disse que a sua própria rescisão somou em torno de R$ 25.000,00, enquanto outros empregados recebiam valores de até R$ 10.000,00.
Enquanto isso, os três réus então reunidos ajuizaram reclamação trabalhista com valor estimado de R$ 900.687,40, diante da ciência de um crédito da empregadora junto ao Município réu no valor de R$ 1.196.546,21 (portanto, 75,27% do total), e fecharam acordo antes mesmo da primeira audiência, no valor de R$ 782.667,03 (65,41% do total do crédito do Município).
A questão dos valores, por si, poderia ser justificada pelos maiores salários e maior tempo de permanência nas empresas do grupo, muito embora, como bem observou o Ministério Público do Trabalho em suas razões finais, ao menos em tese, parte desses débitos poderiam ter sido atingidos por prescrição quinquenal ou bienal.
No entanto, as ocorrências se mostram mais suspeitas à medida em que o acordo homologado foi firmado entre os ora réus através de minuta na qual o Sr. Prefeito Municipal negociou e assinou pessoalmente em nome do Município, sem participação do Sr. Procurador Jurídico, Dr. Davilson dos Reis Gomes.
O Sr. Procurador, frise-se, por medida de cautela que chama a atenção, fez questão de manifestar em audiência e em petições de juntada das sucessivas minutas de acordo que não havia participado de sua negociação e que desconhecia "elementos que apontem para seu acerto e/ou viabilidade" (ID 6430f6a, como amostragem).
Em seu depoimento (ID 5375c5d), embora tenha sido ouvido apenas como informante, o Sr. Procurador assim declarou:
"Testemunha informante Dr Davilson dos Reis Gomes
1 - que o depoente confirma a existência de créditos que a empresa Azaléia possuía em face do município em razão do contrato de prestação de serviços de recolhimento de lixo doméstico; que esses créditos são em um valor aproximado de um milhão de reais; que os acordos realizados em ações trabalhistas que tramitaram por esta Vara do Trabalho foram pactuados entre os reclamantes e a empresa Azaléia e o valor foi pago mediante dedução dos créditos da referida empresa com o município, razão pela qual o município efetuou depósitos de valores nas ações trabalhistas;
2 - no caso do acordo que motivou a ação rescisória os valores a serem pagos aos reclamantes também são de titularidades da AZALEIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A e seriam depositados pelo município e deduzidos do crédito que referida empresa tem com o município;
3 - que todos os acordos celebrados entre reclamantes e a empresa Azaléia nos moldes relatados nos itens 1 e 2 tiveram a participação do depoente. Indagado pelo Juízo qual o motivo da menção de que ele não participou da entabulação do acordo realizado nos autos da ação trabalhista 11954-58.2017 e que motivou a ação rescisória disse o depoente que acredita que este acordo foi celebrado entre os reclamantes e o prefeito, sem a participação do depoente; que acredita que a negociação foi com o prefeito porque ele assinou a petição;
4 - indagado se o depoente sabe dizer se havia algum problema nesta negociação disse se abstende a responder em razão de sigilo profissional mas declara que desconhece algum problema;
5 - que se lembra de haver uma petição dos autos relativo ao acordo que foi homologado em que o depoente declara que não participou da negociação e que ele queria deixar consignado que não tinha certeza da viabilidade financeira e técnica para a celebração da avença;
6 - que uma parte dos acordos das ações trabalhistas foi feita por petição dirigida aos autos e outra parte mediante conciliação lavrada em ata na própria audiência;
Perguntas da AZALEIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A.
7 - que o prefeito municipal participou de alguns acordos realizados em ações trabalhistas cujos trabalhadores eram coletores de lixo, funcionários da reclamada Azaléia; que ao que se lembra o depoente ele solicitou a presença do prefeito municipal nas audiências para verificar questões orçamentárias, uma vez que embora houvesse crédito era necessário ver com o prefeito se havia dinheiro em caixa para o pagamento;
Perguntas da representante dos reclamados
8 - que houve ações trabalhistas em que foram calculadas as verbas rescisórias dos trabalhadores, de maneira aproximada, e o município fez depósito para a Azaléia, deduzindo-se dos créditos em seu poder, para pagamento das verbas rescisórias dos trabalhadores, que isso ocorreu no curso dos processos; que o depoente não pode afirmar se a Azaléia pagou os trabalhadores;
9 - que não havia nenhuma restrição que os acordos celebrados fossem para pagar apenas verbas rescisória;
10 - que a época em que foi homologado o acordo objeto da ação rescisória, descontando-se o valor respectivo dos créditos da Azaléia, ainda havia sobra de numerário da referida empresa, conforme informação da contabilidade do município;
11 - que a Azaléia não presta mais serviços ao município; que o município rescindiu o contrato com a Azaléia e o depoente não se lembra com precisão mas acredita que a segunda colocada no processo de licitação é que passou a prestar os serviços de coleta de lixo urbana;
12 - que o depoente não sabe informar se a contratação da empresa Azaléia ocorreu na gestão do atual prefeito ou do prefeito anterior;
13 - que havia ações civeis de outros Juízos, lembrando-se de uma que tramitava na cidade de São Paulo, nas quais houve expedição de mandado de penhora de créditos da Azaléia em poder do município;
14 - que as ações trabalhistas vieram após da rescisão unilateral do município com a Azaléia;
15 - que o depoente, como procurador do município, ajuizou várias ações civis públicas em face do prefeito municipal sobre improbidade administrativa;" (destacamos - ID 5375c5d)
Da transcrição integral de seu depoimento, acima, verifica-se nitidamente que o Sr. Procurador participou da negociação de todos os acordos firmados, menos do que ora se discute (item 3), e justamente aquele cujo valor possui a maior relevância, como já mencionado. Além disso, quando questionado sobre se havia algum problema nessa negociação, o informante preferiu não responder em razão de sigilo profissional. Trata-se, a toda evidência, de silêncio que diz muito mais do que uma simples negativa de que alguma dúvida pairasse sobre a negociação do acordo.
Aliás, o próprio Sr. Procurador Municipal informou ter ajuizado "várias ações civis públicas em face do prefeito municipal sobre improbidade administrativa" (item 15 do depoimento), informação que vai ao encontro do quanto apurado e demonstrado nestes autos acerca das operações "Purgamentum" e "Eminência Parda", que levaram ao afastamento do Sr. Prefeito Municipal (signatário do acordo ressalvado pelo Sr. Procurador Municipal) de suas funções em face da suspeita de envolvimento no crime organizado.
Ressalto que as investigações das operações referidas recaem também sobre empresas integrantes do grupo empresarial réu, o que faz coro a toda prova dos presentes autos e às alegações do Ministério Público do Trabalho na peça de ingresso.
Oportuno mencionar que a realização de nebulosos acordos individuais, à revelia do próprio Procurador Municipal, como o noticiado nos autos, constitui um acinte à ética e à transparência exigidas de toda a sociedade, e, em especial, dos entes da Administração Pública (art. 37, caput, da CF). Com efeito, tendo a empregadora reconhecido o débito junto aos trabalhadores e o Município reconhecido a existência de crédito da empresa, seria de bom alvitre que esses valores fossem depositados em juízo para que pudessem ser adequadamente direcionados à satisfação das execuções trabalhistas, evitando-se favorecimentos e desvios como os que ora se apresentam. Recursos para isso não faltam aos envolvidos.
Diante desse panorama, concluo que o acordo firmado na reclamação trabalhista n.º 0011954-58.2017.5.15.0146, em trâmite perante o Posto Avançado da Justiça do Trabalho em Morro Agudo, vinculado à Vara do Trabalho de Orlândia, decorre de colusão entre as partes rés da ação rescisória, com o intuito de fraudar credores e o erário, o que autoriza o corte rescisório, consoante a hipótese prevista no inciso III do art. 966 do CPC.
Cabe observar a OJ 94 da SDI-II do C. TST, que determina que, reconhecida a colusão ou simulação, o juízo rescisório deve extinguir sem resolução de mérito o processo simulado, nestes termos:
"OJ-SDI2-94 - AÇÃO RESCISÓRIA. COLUSÃO. FRAUDE À LEI. RECLAMATÓRIA SIMULADA EXTINTA (inserida em 27.09.2002).
A decisão ou acordo judicial subjacente à reclamação trabalhista, cuja tramitação deixa nítida a simulação do litígio para fraudar a lei e prejudicar terceiros, enseja ação rescisória, com lastro em colusão. No juízo rescisório, o processo simulado deve ser extinto."
Nesses termos, julgo procedente a presente ação rescisória para desconstituir a r. sentença homologatória do acordo firmado nos autos da reclamação trabalhista n.º 0011954-58.2017.5.15.0146, com esteio no art. 966, III, do CPC e, em sede de juízo rescisório, julgar extinta sem resolução de mérito a reclamação trabalhista de origem, na forma dos incisos I e VI do art. 485 do CPC.
2. Expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil
Em decorrência das irregularidades apuradas nos autos, defiro a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil para ciência dos fatos e adoção das providências cabíveis, como requerido no item "d" do rol de pedidos."
Inconformados, os réus Amanda, Daniela e Luciano aduzem inaplicável a hipótese do art. 966, III, do CPC, por se tratar de homologação de acordo, em que não há parte vencedora e vencida (Súmula 403, II, do TST), de modo que necessária a propositura de ação anulatória.
Acrescentam, de todo modo, ser necessária a apresentação de prova robusta e inequívoca da colusão, dolo ou simulação, cujo ônus incumbe ao MPT, do qual não se desvencilhou.
Argumentam que suas testemunhas demonstram que a conduta adotada pela empresa na celebração de acordos junto com os Municípios "foi uma boa estratégia para saldar suas dívidas trabalhistas", e que não seria possível cogitar de conluio com mais de 700 empregados.
Relatam que "quando tomaram conhecimento de a empresa ficaria sem qualquer operação e com chance reduzida de receber seus haveres rescisórios por terem sido colegas e terem exercido a mesma função dentro da empresa buscaram ingressar com ação trabalhista perante a última cidade que tinha acabado de rescindir o contrato com a empresa".
Ponderam não haver falar em conluio, uma vez que "ainda existem crédito da empresa a receber, o que afasta a alegação de desvio e salvaguarda de valores e inacessibilidade por terceiros credores", além de ter sido comprovado que as duas primeiras parcelas dos valores acordados já foram utilizadas em seu próprio benefício.
Enumeram, em suma, que:
- As operações do GAECO utilizadas pelo douto magistrado da Vara de Orlândia não têm relação alguma com os réus;
- Está demonstrado documentalmente que a empresa Seleta, que é a empresa investigadas nas operações do GAECO, não possui relação com as empresas do grupo da Azaleia;
- Que o acordo utilizou o crédito que a empresa ré detinha com a Prefeitura de Morro Agudo e que sobrou saldo;
- Que todos os empregados da empresa ré receberam suas verbas rescisórias diretamente do crédito que esta possuía com as prefeituras;
- Que não houve continuidade do vínculo laboral após a rescisão contratual, vez que houve clara mudança na relação, que passou ser eventual, de forma autônoma;
- Que a recorrente Amanda defendeu os interesses da empresa ré e de outra empresa do grupo como advogada correspondente (avulsa);
- Que a recorrente Amanda, após a dispensa, passou a prestar serviços para terceiros, inclusive para outra advogada, com sala própria, estando hoje advogando exclusivamente para escritório de advocacia desta comarca;
- Que o endereço indicado na procuração era procedimento da própria empresa ré, adotado para os correspondentes, com intuito de concentrar todas as correspondências no mesmo local e, que inclusive as procurações eram produzidas pelo RH da empresa;
- Que a procuração juntada no processo 0011080-78.2014.5. 15.0146 foi confeccionada pelo setor do RH da empresa ré sendo inserida assinatura digital antiga do SR. Luciano o que foi feita sem anuência ou concordância deste, conforme demonstrado em instrução processual;
- Que o processo 0011080-78.2014.5.15.0146 está garantido com bem suficiente para satisfação de todos os créditos;
- Que não houve intenção de desviar crédito ou fraudar terceiros para salvaguardar patrimônio da empresa já que restou saldo junto a Prefeitura a ser pago para empresa ré;
- Que todos os ex-empregados da empresa ré receberam suas veras rescisórias e que ações em tramite versam sobre verbas controvertidas.
Da mesma forma, a Azaleia Empreendimentos e Participações defende não ter sido comprovada a fraude processual, uma vez que o mesmo crédito discutido nesta ação foi utilizado para o pagamento de várias outras reclamações trabalhistas, e que não guarda qualquer relação com a empresa Seleta Meio Ambiente, investigada nas operações do GAECO.
Postula a reforma para julgar improcedente a ação, com consequente revogação da ordem de expedição de ofícios para a OAB.
Ao exame.
I - Adequação da via eleita
O Tribunal Pleno desta Corte, no julgamento do Incidente de Recursos de Revista Repetitivos 1000-71.2012.5.06.0018 (Tema nº 18) adotou a compreensão de que "O ato homologatório, uma vez praticado, acarreta a extinção do processo e, por ficção legal, resolve o mérito da causa (artigo 487, III, "c", do CPC), produz coisa julgada material, atinge a relação jurídica que deu origem ao processo, somente é passível de desconstituição por ação rescisória (CPC, arts. 525, § 15, 535, § 8º, e 966) ou ainda pela via da impugnação à execução (CPC, art. 525, §12) ou dos embargos à execução (CPC, art. 535, § 5º)".
Com efeito, no Processo do Trabalho, por força do art. 831, parágrafo único, da CLT, a homologação de acordo configura decisão judicial irrecorrível, produzindo coisa julgada material de imediato e, por consequência, atraindo o cabimento de ação rescisória para sua desconstituição.
Destaque-se, ademais, que o óbice contido na Súmula 403, II, do TST ("Se a decisão rescindenda é homologatória de acordo, não há parte vencedora ou vencida, razão pela qual não é possível a sua desconstituição calcada no inciso III do art. 485 do CPC, pois constitui fundamento de rescindibilidade que supõe solução jurisdicional para a lide") diz respeito à hipótese específica de "dolo da parte vencedora em detrimento da vencida", contida na parte inicial do art. 966, III, do CPC.
Contudo, referido dispositivo traz ainda outra hipótese, em sua parte final: "simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei", perfeitamente aplicável ao caso concreto, em que se discute alegada utilização do processo como instrumento de fraude a credores e blindagem patrimonial.
Correto, portanto, o instrumento processual utilizado.
II - Configuração de colusão
A hipótese de colusão entre as partes, como fundamento autorizador do corte rescisório (art. 966, III, do CPC), diz respeito à utilização do processo como meio de fraudar a lei e prejudicar terceiros, em especial ante a natureza preferencial do crédito trabalhista, o que possibilita a constituição de blindagem patrimonial em relação a outras dívidas, inclusive tributárias ou com garantia real.
Considerando a notória dificuldade probatória em relação ao intuito fraudulento das partes na ação subjacente, a jurisprudência desta Corte Superior consolidou-se no sentido de admitir a prova indiciária como fundamento para desconstituir o título executivo resultado da fraude, desde que presentes elementos suficientes a atrair a constatação do desvio de finalidade na ação subjacente.
Assim, por exemplo, devem ser analisados, entre outros, a relação extraprocessual entre as partes (amizade, parentesco ou profissão); a existência de dívidas da reclamada que justifiquem a constituição de crédito privilegiado como proteção ao seu patrimônio; o comportamento processual das partes (seja em relação à proporção entre pedidos e valor da causa ou do acordo entabulado; seja no tocante à existência, ou não, de efetiva pretensão resistida), bem como a relação de direito material que deu origem à reclamação trabalhista.
Pois bem.
No caso, trata-se de avença celebrada em conjunto por três trabalhadores (AMANDA, DANIELA e LUCIANO) com a empresa AZALEIA e o Município de Morro Agudo, para pagamento dos haveres trabalhistas mediante créditos que a empresa possuía em face do Ente Público.
A tese de colusão defendida pelo Ministério Público do Trabalho, na petição inicial, baseia-se em três enfoques principais: a) que os contratos de trabalho dos reclamantes não foram extintos, conforme provas de que continuam atuando como representantes da Azaleia e de outras empresas do mesmo grupo econômico (Grupo Leão), "servindo o processo trabalhista 0011954-58.2017.5.15.0146 apenas como instrumento para desviar créditos da empresa e fraudar os cofres públicos e terceiros"; b) que dezenas de trabalhadores concentrados na execução nos autos 0011080-78.2014.5.15.0146 "buscam, em vão, patrimônio da empresa para que sejam adimplidas verbas rescisórias e direitos trabalhistas", a evidenciar o intuito de blindagem patrimonial; e c) que operações conduzidas pelo GAECO ("Purgamentum" e "Eminência Parda") "não deixam dúvidas acerca do esquema criminoso por trás da empresa ré, que envolve lavagem de dinheiro, corrupção, peculato e organização criminosa".
O Município de Morro Agudo, embora indicado como réu, apresentou manifestação pela procedência da ação rescisória (fls. 308/309):
"(...) considerando que as manifestações do Senhor Procurador Jurídico Municipal já no bojo da ação cuja sentença homologatória se pretende desconstituir já evidenciava um malferimento do interesse público, bem ainda que são fortes os indícios relativos à colusão entre as partes com vistas a obtenção de créditos decorrentes de direitos trabalhistas que sequer existiram, em nítida violação da boa-fé e da legalidade, o Município de Morro Agudo deixa de contestar a ação rescisória para com ela CONCORDAR em todos os seus termos, RECONHECENDO EXPRESSAMENTE A PROCEDÊNCIA DO PEDIDO, pugnando pelo seu julgamento de procedência.
Ao já dito pelo i. membro do Ministério Público acresça-se que o acordo entabulado individualmente pelo então Prefeito Municipal, GILBERTO CÉSAR BARBETTI, afronta ainda a Lei Municipal nº 3.070, de 10 de agosto de 2017, que "dispõe sobre a autorização para promover acordos judiciais e extrajudiciais em processos administrativos e judiciais em que o Município de Morro Agudo for interessado ou parte e dá outras providências"."
Apresentou cópia da Lei Municipal em questão, em que prevista a possibilidade de celebração de acordo somente em valores que não excedam a 5 salários mínimos (art. 1º, "caput", fl. 312).
- Histórico processual da ação trabalhista subjacente
Do exame da ação trabalhista subjacente (RT-0011954-58.2017.5.15.0146), verifica-se que Amanda, Daniela e Luciano promoveram reclamação conjunta, em 5.9.2017, alegando os seguintes históricos contratuais:
Amanda
Contrato de março/2011 a abril/2017
Função: Gerente de RH
Última remuneração: R$ 8.072,67
Daniela
Contrato de setembro/2013 a abril/2017
Função: Coordenadora de Controladoria
Última remuneração: R$ 6.162,33
Luciano
Contrato de março/2009 a abril/2017
Função: Gerente Comercial
Última remuneração: R$ 9.985,27
Os reclamantes alegaram terem sido dispensados sem receber as verbas rescisórias, diferenças de FGTS, tampouco os salários e vale-alimentação de fevereiro e março de 2017, além de ostentarem direito ao recebimento de gratificação de função no período em que laboraram para outras empresas do grupo econômico.
Atribuíram aos pedidos os seguintes valores:
Amanda
Salários e alimentação:não individualizado
Verbas rescisórias:R$ 154.046,29
Gratificação de função:R$ 83.132,48
FGTS + 40%:R$ 40.712,19
Multa do art. 477 da CLT:R$ 8.072,67
Dano moral:R$ 10.000,00
Daniela
Salários e alimentação:não individualizado
Verbas rescisórias:R$ 75.939,01
Gratificação de função:R$ 62.090,88
FGTS + 40%:R$ 27.054,43
Multa do art. 477 da CLT:R$ 6.162,33
Dano moral:R$ 10.000,00
Luciano
Salários e alimentação:não individualizado
Verbas rescisórias:R$ 192.756,10
Gratificação de função:R$ 113.172,00
FGTS + 40%:R$ 60.685,74
Multa do art. 477 da CLT:R$ 9.985,27
Dano moral:R$ 10.000,00
Os TRCT's juntados às fls. 430/436 registram os montantes postulados e indicam que os valores expressivos decorrem do pagamento de rubrica "Indenização Grat. Função".
Os instrumentos de aviso prévio (fls. 439, 449 e 461) consignam a dispensa "em virtude da empresa não necessitar mais de seus serviços";
Os extratos do FGTS (fls. 442, 453 e 462) revelam a ausência de depósitos desde, pelo menos, outubro de 2016.
Já as fichas de registro (fls. 468/474) atestam a contratação entre empresas do mesmo grupo: DANIELA e LUCIANO, pela Leão e Leão Ltda.; e AMANDA, pela CBN Calil Oliveira Construtora Ltda.
Todas as contratações e demissões foram registradas em CTPS (fls. 503/514), inclusive com menção às empresas Sanetech Ambiental Ltda. e Limpus Soluções Ambientais Ltda.
Os holerites (fls. 602/607) confirmam as remunerações declaradas, tendo sido também posteriormente apresentados os recibos e comprovantes de transferência bancária relativos ao período entre agosto/2015 e dezembro/2016 (fls. 643/724), além de ofício do Banco Itaú com cópia dos extratos bancários dos reclamantes (fls. 729/736 e 777/796), em que efetivamente indicado o registro da rubrica "REMUNERAÇÃO/SALÁRIO" nos valores apontados.
O Município reconheceu a prestação de serviços pela AZALEIA em seu benefício (contrato de execução de "serviços de coleta, transporte, transbordo e destinação de lixo domiciliar"), mas contestou a ação (fls. 43/46) com base na ausência de demonstração de culpa "in eligendo" ou "in vigilando", e no fato de que os reclamantes atuaram na gestação de contratos outros mantidos com "um número considerável de Municípios".
Os reclamantes e a AZALEIA propuseram a celebração de acordo mediante a utilização de créditos que a empresa possuía junto ao Município.
O Município se opôs ao acordo (fl. 69).
As partes então propuseram novo acordo (17.11.2017), dessa vez assinado também pelo Município.
Contudo, intimado para se manifestar, o Município mais uma vez afirmou não poder ratificar seus termos, porque "não terá condições de cumpri-lo" (fl. 87).
Por fim, em 6.2.2018, novo instrumento de acordo foi protocolado (fls. 91/93), assinado pelo Prefeito, Sr. Gilberto César Barbeti, e dessa vez homologado (decisão rescindenda), no valor total de R$ 782.667,03.
- Lide simulada - manutenção de vínculo jurídico mesmo após a rescisão contratual que levou ao ajuizamento da ação trabalhista subjacente
O primeiro elemento de convicção do MPT diz respeito ao fato de que os reclamantes AMANDA, DANIELA e LUCIANO atuaram em favor da AZALEIA e de outras empresas do mesmo grupo (Limpus Soluções Ambientais Ltda., Prime Infraesturura S/A e CBN Construtora Ltda.), como prepostos das empresas, em outras reclamações trabalhistas, mesmo após a data da alegada extinção dos contratos de trabalho (1.4.2017).
Com efeito, foi apresentada carta de preposição assinada por LUCIANO, como representante da AZALEIA, em 17.8.2017 (fl. 224), nos autos RT-0011080-78.2014.5.15.0146, nomeando como preposta justamente AMANDA.
No mesmo processo, DANIELA atuou como preposta da Prime Infraestrutura, ao passo em que AMANDA figurou também como preposta da Limpus Soluções Ambientais (ata de audiência de 30.8.2017, fls. 219/220).
Ademais, AMANDA recebeu procuração para atuar como advogada da CBN Construtora, em 6.4.2018 (fl. 227), nos autos RT-0010192-60.2015.5.15.0151, em que indicado como endereço profissional a Av. Thomaz Alberto Whately, nº 5005, Ribeirão Preto/SP, justamente o local em que sediada AZALEIA, além da CBN Construtora Ltda., Leão e Leão Ltda., Estre SPI Ambiental S/A, R.I. Participações Ltda., ARCBB Participações Ltda., Leão Ambiental Ltda., Luma - Limpeza Urbana e Meio Ambiente Ltda., NGA - Núcleo de Gerenciamento Ambiental Ltda. e CGR Participações S.A. (conforme indicado às fls. 224, 227, 474, 546, 803, 804, 935, 1015, 1659), integrantes do que o Regional denomina "GRUPO LEÃO".
Idêntica dinâmica pode ser verificada no instrumento de procuração assinado por LUCIANO, em nome da AZALEIA, conferindo poderes a AMANDA, em 28.4.2017 (fl. 2088), nos autos RT-0000035-57.2017.5.08.0117.
Há também registro de que AMANDA atuou com preposta da AZALEIA em 17.11.2017 (fl. 1803).
Foi determinada, mediante cartas de ordem, a oitiva de testemunhas no âmbito da ação rescisória.
A testemunha Vera Lúcia Lopes Gonçalves de Souza afirmou que (fl. 2276/2278):
1 "que trabalhou para a reclamada de agosto de 2016 a setembro de 2017, como analista de folha de pagamento no RH; 2 que a Sra. Amanda exerceu a função de gerente de RH e a Sra. Daniela trabalhava no departamento financeiro da ré; que ambas se desligaram em abril de 2017, no mesmo dia, logo no início do mês, não sabendo precisar exatamente; 3 que a Sra. Amanda atuou em varias audiências da requerida AZALEIA como advogada e a Sra. Daniela, as vezes como advogada e as vezes como preposta; 4 que a depoente sugeriu ao diretor Carlos Alvim que contratasse a Sra. Amanda como correspondente da requerida, ante o grande volume e a experiência da mesma; que o mesmo aconteceu, embora muito pouco, com a Sra. Daniela; 5 que a Sra. Daniela seguiu prestando serviços junto a recuperação judicial na área contábil, pois tinha contato com a contadora, serviço que fazia da sua própria residência; 6 que ambas estavam procurando colocação profissional, o que sabe informar através de comentários; 7 que a Sra. Amanda chegou a locar um espaço para se estabelecer profissionalmente, não sabendo precisar o endereço, mas fica nas proximidades do Fórum; 8 que ambas saíram sem receber as verbas rescisórias, tendo o acordo de parcelamento para tais verbas sido descumprido pela ré; 9 que a Sra. Amanda funcionava como correspondente para outras empresas do mesmo grupo econômico que a requerida; 10 que o réu Luciano, após se desligar, não prestou mais serviços a requerida ou a empresas do mesmo grupo; (...) 13 que com a dispensa das Sras. Daniela e Amanda e Sr. Luciano, o jurídico da requerida foi assumido pelo Dr. Pedro Del Monte Marcussi; 14 que as procurações de todos os advogados contratados ou associados eram feitas pelo RH da requerida, com endereço da empresa; 15 que na qualidade de gerente de RH a Sra. Amanda tinha as seguintes atribuições: contratar e dispensar empregados, resolver qualquer problema envolvendo empregados e sindicato da requerida AZALEIA, atividades que não desenvolveu após o desligamento; (...) 27 que a Dra. Amanda se instalou em um escritório de advocacia em 2018, não sabendo quanto a Sra. Daniela; 28 que "se aconteceu de o réu Luciano ter assinado procuração em nome da ré, tratouse de um engano"; que não sabe informar se é possível, após o desligamento de determinado empregado, ser usado pela requerida AZALEIA a sua assinatura eletrônica, podendo tratarse de um arquivo antigo; 29 que era responsável pelo lançamento dos valores nas folhas de empregado; 30 que em dezembro de 2016 a requerida Amanda pediu a depoente que passasse a efetuar o pagamento de seus salários na conta de sua mãe, alegando problemas particulares em razão de sua separação judicial; 31 que algumas vezes atuou como preposta da requerida em audiências trabalhistas; 32 que depois do desligamento da Sra. Amanda, em razão do alto número de audiências, foram contratados muitos correspondentes, podendo citar Dra. Rosângela, em Sertãozinho, Dr. Vicari, em Morro Agudo e Dr. Tiago, em Matão; 33 que não sabe precisar o valor da paga a Sra. Amanda, após se tornar correspondente, sendo o pagamento feito por ato e o volume muito grande; que a Sra. Daniela atuou muito pouco como correspondente; (...)". Nada mais.
A testemunha Roberta Terra Cury disse que (fl. 2278):
1 "que trabalhou para a AZALEIA de 2015/2016 até final de 2017, como analista de contratos com prefeituras e o da própria comercialização da ré; que atuava internamente na reclamada; 2 que continua na reclamada prestando serviços; 3 que a Sra. Daniela era responsável pela parte financeira, a Sra. Amanda pelo RH e o Sr. Luciano pelo setor comercial; que todos foram dispensados juntos em 2017; 4 que a requerida Amanda prestou serviços como advogada correspondente e preposta após o seu desligamento; 5 que a Sra. Daniela prestou serviços de conciliação para recuperação judicial para a empresa LEAO & LEAO, do mesmo grupo econômico; que acredita que o Sr. Luciano não prestou outros serviços; 6 que as requeridas Amanda e Daniela, após o desligamento, não prestaram serviços em suas funções anteriores; 7 que a Sra. Daniela foi substituída pela Sra. Renata e a Sra. Amanda pela testemunha anterior". Nada mais. ".
A testemunha Helane Serpa Roberti Garcia relatou que (fls. 2278/2279):
1 "que conhece a requerida Amanda desde 2009 ou 2010, com quem fazia serviços esporádicos de advocacia, período em que a requerida tinha um emprego fixo; 2- que em 2017 foi procurada pela requerida, que informou ter se desligado do emprego e que queria sublocar uma sala da depoente de maneira fixa, já que tinha se afastado do emprego; 3 que a parceria durou até 2018 em razão de uma necessidade pessoal da depoente até por volta de março de 2018; 4 que após isso a requerida Amanda se vinculou a outro escritório de advocacia; 5 que a combinação remuneratória feita com a Sra. Amanda era de que, para atender os clientes fixos da depoente, estaria isenta do pagamento da locação da sala, recebendo por audiência que realizasse; 6 que para a requerida Amanda a depoente indicava diligências que originariamente seriam feitas por ela". Nada mais."
As depoentes Vera e Roberta confirmam que, após a rescisão contratual, AMANDA e DANIELA continuaram prestando serviços para a AZALEIA, ainda que em funções distintas daquelas anteriormente laboradas.
Por outro lado, embora afirmem que LUCIANO não mais prestou serviços, é certo que as cartas de preposição e instrumentos de procuração foram assinados fisicamente, em papel, por LUCIANO (e não mediante assinatura eletrônica), em datas posteriores à rescisão contratual, conforme documentos juntados aos autos.
Note-se, ademais, que as atividades prestadas por AMANDA, DANIELA e LUCIANO em favor da AZALEIA revelavam posição de destaque e nível de fidúcia diferenciada, corporificando a própria representação do empreendimento, em razão de sua atuação como prepostas em audiências trabalhistas ou, no caso de LUCIANO, como o próprio administrador da pessoa jurídica, com poderes inclusive de firmar procurações.
Disso se conclui pela existência de vínculo jurídico especial entre as partes, que permaneceu para além dos contratos de trabalho rescindidos em abril de 2017, e que constitui o primeiro dos elementos indiciários de participação na fraude a credores.
- Operações da GAECO: "Eminência Parda" e "Purgamentum"
Notícia jornalística juntada à fl. 105 revela que o Prefeito do Município de Morro Agudo/SP, Sr. Gilberto Barbeti, foi afastado do cargo no âmbito da Operação Eminência Parda. À fl. 107, relatado que referida operação "investiga um esquema de fraudes em licitações envolvendo secretários municipais, vereadores, funcionários públicos e um ex-servidor", e que "teve início após Operação Purgamentum (...) que levou para a prisão o ex-prefeiro de Passos/MG, Ataíde Vilela (PSDB), por suspeita de fraudes em contratos de coleta de lixo".
AZALEIA aduz que não era investigada nas operações do GAECO, mas tão-somente a empresa Seleta, e que "O que se sabe é que a empresa Seleta e a Azaleia (cindida da Estre) são empresas publicamente concorrentes no mercado de limpeza urbana, estão em constantes disputas, o que se conclui que não possuem qualquer vínculo entre elas" (fl. 157).
Com efeito, cópia do Diário Oficial Municipal (fl. 498) registra rescisão do contrato administrativo firmado com a AZALEIA, em 21.7.2017, e convocação da segunda colocada da licitação, Seleta Meio Ambiente Ltda. para assumir os serviços.
Contudo, não consta dos autos indício algum de que a empresa Seleta Meio Ambiente Ltda. integre o mesmo grupo econômico da AZALEIA. Não foram apresentadas cópias dos inquéritos policiais, nem qualquer outro elemento que pudesse atestar que a AZALEIA estivesse sendo investigada no âmbito das operações da GAECO.
O único elemento concreto apresentado diz respeito ao fato de que o Prefeito do Município de Morro Agudo, que assinou o acordo homologado na ação subjacente, foi preso no âmbito das operações da GAECO, em razão de fraudes em processos licitatórios para contratação de empresas de coleta de lixo.
Não há, contudo, indicativo de que a AZALEIA fizesse parte do mesmo esquema, ou de que os créditos desta em face do MUNICÍPIO tivessem origem também em esquema de corrupção.
Portanto, quanto a esse aspecto específico, nenhuma influência há sobre a configuração de colusão ou lide simulada na demanda subjacente.
- Blindagem patrimonial
AZALEIA afirmou que o crédito em face do MUNICÍPIO foi utilizado também para o pagamento de diversas outras dívidas trabalhistas, nos seguintes processos:
Erivan Borges Cavalcante - 0011708-62.2017.5.15.0146
Antonio Carlos do Nascimento -0011706-92.2017.5.15.0146
Jose Augusto da Silva Sousa - 0012266-68.2016.5.15.0146
Jose Francisco da Silva Sousa - 0012267-53.2016.5.15.0146
Joao Batista de Souza Costa - 0012265-83.2016.5.15.0146
Reginaldo Pereira 0011705-10.2017.5.15.0146
Jorge Cleiton Martins Freitas - 0011709-47.2017.5.15.0146
Edilson Murgi - 0011707-77.2017.5.15.0146
As cópias de atas daqueles processos evidenciam efetivamente a celebração de acordos mediante pagamento das verbas trabalhistas pelo MUNICÍPIO. Contudo, em valores muito menos expressivos: José Augusto da Silva Sousa recebeu R$ 23.278,49 (fls. 1195/1196 e 1849/1851); Edilson Murgi, R$ 20.895,16 (fls. 1198/1200 e 1837/1839); Reginaldo Pereira, R$ 27.074,86 (fls. 1201/1203 e 1855/1857); Antonio Carlos do Nascimento, R$ 19.109,18 (fls. 1204/1206 e 1834/1836); Erivan Borges Cavalcante, R$ 17.159,85 (fls. 1207/1210 e 1840/1842); Jorge Cleiton Martins Freitas, R$ 19.285,37 (fls. 1211/1213 e 1846/1848); João Batista de Souza Costa, R$ 16.422,49 (fls. 1843/1845); José Francisco da Silva Sousa, R$ 22.446,86 (fls. 1852/1854).
A ré apontou, ainda, ser praxe a utilização de créditos em face de outros Municípios para o pagamento de dívidas trabalhistas:
Município de Matão - 0010105-52.2017.5.15.0081
Município de Cravinhos - 0011272-91.2017.5.15.0150
Município de Sertãozinho - 1001328-10.2017.8.26.0597
As atas de audiência nesses autos consignam, por exemplo, que o Município de Cravinhos firmou acordo para pagamento de verbas rescisórias dos empregados da AZALEIA, mas até o limite de R$ 10.000,00 por trabalhador (fls. 1803/1804). Também o Município de Matão comprometeu-se ao pagamento do valor total de R$ 2.072.889,24 (fls. 1809/1810), mas no âmbito de ação coletiva ajuizada por entes sindicais representando um sem-número de trabalhadores.
Constam ainda cópias de cheques assinados pelo Município de Cajuru a diversos trabalhadores (fls. 1215/1216), além de ordens de pagamento (fls. 1298/1395), porém, mais uma vez, em valores muito inferiores (entre três e onze mil reais) do que aqueles pactuados com AMANDA, DANIELA e LUCIANO.
Por outro lado, DANIELA reconheceu (fl. 360) que o valor do crédito junto ao MUNICÍPIO já era alvo de outras penhoras em ações cíveis (1022827-86.2017.8.26.0100; 1001839-08.2017.8.26.0037; 1014501-69.2016.8.26.0037; 1016257-16.2016.8.26.0037).
A esse respeito, observe-se decisão proferida pelo Juízo Cível da Comarca de Araraquara (fl. 1310), de 11.8.2017, nos autos 1016257-16.2016.8.26.0037, em que executada a AZALEIA e determinado que "O débito atualizado descansa em R$ 270.092,02. Assim, num primeiro momento, deverá o Município de Morro Agudo reservar o valor devido em favor da exequente, informando o Juízo qual a previsão de pagamento à executada, se total ou de forma parcelada".
Em mesmo sentido, decisão do Juízo Cível da Comarca de Araraquara (fl. 1227), de 17.8.2017, nos autos 1014501-69.2016.8.26.0037, em que determinado "o bloqueio dos créditos que a executada porventura tenha a receber junto às Prefeituras Municipal de Morro Agudo e Cravinhos, até o limite do valor em execução nestes autos, ou seja R$ 305.688,69 ( trezentos e cinco mil, seiscentos e sessenta e oito reais e sessenta e nove centavos)".
Também nos autos 1022827-86.2017.8.26.0100, o Juízo Cível da Comarca de São Paulo, em 6.9.2017 (fl. 1233) determinou a expedição de ofício "às Prefeituras de Morro Agudo e Cravinhos, para intimá-las acerca da penhora dos créditos da executada Azaléia Empreendimentos e Participações S.A., de modo que todo e qualquer provento financeiro a ser conferido em favor da executada seja depositado perante este juízo, limitado a 15% dos recebíveis mensais a que a executada faça jus, até o limite do valor atualizado do débito, que perfaz o valor de R$ 1.755.817,81".
A testemunha Vera Lúcia Lopes Gonçalves de Souza afirmou que (fl. 2276/2278):
1 "que trabalhou para a reclamada de agosto de 2016 a setembro de 2017, como analista de folha de pagamento no RH; (...) 11 que as demissões em massa começaram em outubro de 2016 na requerida, em razão de atrasos no pagamento por algumas prefeituras; 12 que com a perda do contrato com a prefeitura de Lins, cerca de três meses antes, a requerida passou a atrasar salários e demais obrigações contratuais com seus empregados; (...) 16 que o primeiro município que pagou diretamente os créditos trabalhistas da requerida AZALEIA foi Matão, após envolvimento do Sindicato dos Trabalhadores; que a proposta não foi aceita pelo município de Lins; que o mesmo procedimento aconteceu em outras cidades, cerca de quatro ou cinco; que em Morro Agudo o fato aconteceu em agosto de 2017, e por último em Cravinhos, em setembro de 2017; 17 que as verbas rescisórias da depoente foram pagas mediante o mesmo procedimento, junto ao Juízo Trabalhista de Cravinhos, e sem intermediação de advogado; 18 que como os valores que a requerida AZALEIA possuía em Cravinhos era insuficiente para quitar todas as rescisões, foi celebrado acordo de pagar integral e primeiramente as rescisões de até R$10.000,00; que o acerto rescisório da depoente era de cerca de R$25.000,00, tendo recebido em Cravinhos cerca de R$9.000,00, e o restante através de ofício expedido ao município de Serrana, onde a requerida ainda possuía crédito; (...); 21 que a depoente substituiu a Sra. Amanda quando da dispensa da mesma; (...) 34 que o valor dos acordos feitos com os empregados era normalmente o que estava sendo pedido na inicial". Nada mais.
A testemunha José Carlos Marcondes Soares descreveu que:
(...) que o depoente é proprietário da empresa LIMPEZA URBANA, que atua na área de prestação de serviços para diversas Prefeituras do Norte do Rio de Janeiro e Estado do E. Santo, como Presidente Kennedy/ES, Marataízes/ES, Piúma/ES, Jaguaré/ES, Conceição de Macabu/RJ; que ficou sabendo que a empresa AZALÉIA, no final de 2017, estava sendo colocada à venda, havendo interesse de sua parte; que o depoente viajou, então para cidade de Campinas/SP para averiguar a potencialidade do negócio, tendo tomado todas as cautelas de estilo, verificando as pendências trabalhistas, previdenciárias e fiscais e, praticamente, chegou a 99% de probabilidade de fechar o negócio. Ocorre que por problemas particulares, a doença de sua esposa (câncer no esôfago, ainda em tratamento), preferiu recuar no negócio, sendo que este foi o último fato de que participou dentro dos fatos mencionados na presente Ação Rescisória; que durante a investigação que fez para aquisição dessa empresa, inclusive contando com a ajuda de um escritório de advogados, constatou a existência de créditos suficientes para pagamento de todo passivo trabalhista existente até então, não notando qualquer irregularidade no funcionamento dessa empresa; que esse procedimento, por parte da empresa AZALÉIA, de utilizar créditos de Prefeituras para pagamento de ações trabalhistas foi, inclusive, utilizado em outras ações envolvendo outras Prefeituras da região; que depois disso não teve mais contato com esses empresários; que seus advogados fizeram levantamento minucioso de todas as pendências para a futura aquisição dessa empresa, o que não se concretizou, como já dito, por motivos particulares; que nessas viagens para São Paulo teve contato somente com o Sr. Luiz Cláudio, proprietário da empresa, bem como com alguns de seus diretores.
O informante Davilson dos Reis Gomes, Procurador do Município de Morro Agudo, narrou (fls. 2384/2387):
1 - que o depoente confirma a existência de créditos que a empresa Azaléia possuía em face do município em razão do contrato de prestação de serviços de recolhimento de lixo doméstico; que esses créditos são em um valor aproximado de um milhão de reais; que os acordos realizados em ações trabalhistas que tramitaram por esta Vara do Trabalho foram pactuados entre os reclamantes e a empresa Azaléia e o valor foi pago mediante dedução dos créditos da referida empresa com o município, razão pela qual o município efetuou depósitos de valores nas ações trabalhistas; 2 - no caso do acordo que motivou a ação rescisória os valores a serem pagos aos reclamantes também são de titularidades da AZALEIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A e seriam depositados pelo município e deduzidos do crédito que referida empresa tem com o município; 3 - que todos os acordos celebrados entre reclamantes e a empresa Azaléia nos moldes relatados nos itens 1 e 2 tiveram a participação do depoente. Indagado pelo Juízo qual o motivo da menção de que ele não participou da entabulação do acordo realizado nos autos da ação trabalhista 11954-58.2017 e que motivou a ação rescisória disse o depoente que acredita que este acordo foi celebrado entre os reclamantes e o prefeito, sem a participação do depoente; que acredita que a negociação foi com o prefeito porque ele assinou a petição; 4 - indagado se o depoente sabe dizer se havia algum problema nesta negociação disse se abstém de responder em razão de sigilo profissional mas declara que desconhece algum problema; 5 - que se lembra de haver uma petição dos autos relativo ao acordo que foi homologado em que o depoente declara que não participou da negociação e que ele queria deixar consignado que não tinha certeza da viabilidade financeira e técnica para a celebração da avença; 6 - que uma parte dos acordos das ações trabalhistas foi feita por petição dirigida aos autos e outra parte mediante conciliação lavrada em ata na própria audiência; Perguntas da AZALEIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A. 7 - que o prefeito municipal participou de alguns acordos realizados em ações trabalhistas cujos trabalhadores eram coletores de lixo, funcionários da reclamada Azaléia; que ao que se lembra o depoente ele solicitou a presença do prefeito municipal nas audiências para verificar questões orçamentárias, uma vez que embora houvesse crédito era necessário ver com o prefeito se havia dinheiro em caixa para o pagamento; Perguntas da representante dos reclamados 8 - que houve ações trabalhistas em que foram calculadas as verbas rescisórias dos trabalhadores, de maneira aproximada, e o município fez depósito para a Azaléia, deduzindo-se dos créditos em seu poder, para pagamento das verbas rescisórias dos trabalhadores, que isso ocorreu no curso dos processos; que o depoente não pode afirmar se a Azaléia pagou os trabalhadores; 9 - que não havia nenhuma restrição que os acordos celebrados fossem para pagar apenas verbas rescisória; 10 - que a época em que foi homologado o acordo objeto da ação rescisória, descontando-se o valor respectivo dos créditos da Azaléia, ainda havia sobra de numerário da referida empresa, conforme informação da contabilidade do município; 11 - que a Azaléia não presta mais serviços ao município; que o município rescindiu o contrato com a Azaléia e o depoente não se lembra com precisão mas acredita que a segunda colocada no processo de licitação é que passou a prestar os serviços de coleta de lixo urbana; 12 - que o depoente não sabe informar se a contratação da empresa Azaléia ocorreu na gestão do atual prefeito ou do prefeito anterior; 13 - que havia ações cíveis de outros Juízos, lembrando-se de uma que tramitava na cidade de São Paulo, nas quais houve expedição de mandado de penhora de créditos da Azaléia em poder do município; 14 - que as ações trabalhistas vieram após da rescisão unilateral do município com a Azaléia; 15 - que o depoente, como procurador do município, ajuizou várias ações civis públicas em face do prefeito municipal sobre improbidade administrativa;
Os relatos trazidos nos depoimentos apenas ratificam o teor da prova documental extraída dos autos das diversas reclamações trabalhistas formuladas em face da AZALEIA.
Embora fosse praxe a celebração de acordos trabalhistas mediante utilização de créditos decorrentes de contratos administrativos firmados com diversos Municípios, o exame dos autos revela que o acordo específico dos réus ostentava particularidades para além dos padrões de normalidade.
Todos os acordos firmados perante a Justiça do Trabalho possuíam cifras inferiores a 30 mil reais por trabalhador. Por seu turno, a avença firmada pelos réus ostentou valor total de quase 800 mil reais, uma média superior a 260 mil reais para cada um dos réus.
Note-se que a testemunha Vera declarou ter substituído AMANDA após sua dispensa, exercendo suas atribuições, mas, mesmo assim, recebeu apenas 25 mil reais de haveres rescisórios mediante acordo judicial, dez vezes menos do que AMANDA.
Além disso, todos os acordos contaram com a participação do Procurador do Município, situação não verificada na avença entabulada na ação subjacente, em que referido causídico fez questão de consignar, em petição, que "não participou da entabulação de seus termos e, portanto, desconhece elementos que apontem para seu acerto e/ou viabilidade" (fl. 88).
Existe, ademais, um elemento temporal importante que revela a intenção de blindagem patrimonial.
A reclamação trabalhista subjacente foi proposta em 5.9.2017, algumas semanas depois de terem sido determinados os primeiros bloqueios pela Justiça Comum, justamente sobre os créditos da AZALEIA em face do MUNICÍPIO, para fazer frente a dívidas de outra natureza contra a AZALEIA.
Observe-se que as ordens judiciais da Justiça Comum apresentadas nos autos totalizam valor superior a dois milhões de reais, sem contar outras ordens de penhora em processos mencionados por DANIELA, mas não reproduzidas nesta ação.
Nesse contexto, a existência de diversas penhoras determinadas no âmbito da Justiça Comum sobre o crédito da AZELEIA em face do MUNICÍPIO justifica a necessidade de utilização de ação simulada, com o objetivo de obtenção de crédito trabalhista privilegiado, que teria preferência sobre as constrições da Justiça Estadual.
Portanto, o fato de ter adimplido as diversas obrigações trabalhistas de outros reclamantes não afasta a constatação de lide simulada no caso concreto, considerada a existência de expressivas dívidas de natureza civil que justificam a propositura fraudulenta de ação trabalhista, com valores muito acima da média adotada com outros trabalhadores, tendo por objetivo a proteção do patrimônio da pessoa jurídica em face de credores.
Em suma, os elementos considerados em conjunto autorizam concluir pela configuração de colusão, na forma do art. 966, III, do CPC, atraindo a necessidade de desconstituição do Julgado, com extinção do processo matriz sem resolução do mérito.
Irreparável a decisão regional de procedência da ação.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer dos recursos ordinários e, no mérito, negar-lhes provimento.
Brasília, 1 de julho de 2025.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
MORGANA DE ALMEIDA RICHA
Ministra Relatora
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear