Maria Lenice Freire De Abreu Costa
Maria Lenice Freire De Abreu Costa
Número da OAB:
OAB/TO 002307
📋 Resumo Completo
Dr(a). Maria Lenice Freire De Abreu Costa possui 64 comunicações processuais, em 16 processos únicos, com 58 comunicações nos últimos 30 dias, processos entre 2016 e 2025, atuando em TJGO, TRF1, TJTO e especializado principalmente em APELAçãO CíVEL.
Processos Únicos:
16
Total de Intimações:
64
Tribunais:
TJGO, TRF1, TJTO
Nome:
MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA
📅 Atividade Recente
0
Últimos 7 dias
58
Últimos 30 dias
63
Últimos 90 dias
64
Último ano
⚖️ Classes Processuais
APELAçãO CíVEL (24)
APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA (14)
AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (9)
INTERDIçãO (8)
PETIçãO CíVEL (3)
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Processos do Advogado
Mostrando 10 de 64 intimações encontradas para este advogado.
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoJUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: UNIÃO FEDERAL e outros POLO PASSIVO:JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S RELATOR(A):SOLANGE SALGADO DA SILVA PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CÍVEL (198) 0001933-82.2016.4.01.4300 R E L A T Ó R I O A Exma Sra Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Relatora): Trata-se de remessa necessária, tida por interposta, e de recursos de apelação interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, ESTADO DO TOCANTINS e UNIÃO FEDERAL (ID 108493602 - Pág. 03/27 c/c ID 108493602 - Pág. 39/40 e Pág. 45), por JOSÉ GASTÃO ALMADA NEDER (ID 108494526), por MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA (ID 108494529) e por VANDA MARIA GONÇALVES PAIVA (ID 108494532) em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Tocantins que, nos autos da Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, em litisconsórcio com a União Federal e o Estado do Tocantins, e em desfavor dos apelantes e de Erislene Floriano Nunes, Iara Suzana Schmitz Bulcão, João Aparecido da Cruz, Luiz Renato Pedra Sá, Marco Aurélio Vieira Dias, Monalício Alves Almeida, Naragleice Carneiro, Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, Vanessa Schmitz Bulcão e Willer Costa Silva Mata julgou parcialmente procedente o pedido para condenar os réus apelantes e Luiz Renato Pedra Sá pelo ato de improbidade administrativa capitulado no art. 10, inciso VIII, da Lei 8.429/1992, absolvendo os demais réus (ID 108493601 - Pág. 101/138). Aos demandados foram impostas as seguintes sanções: (i) perda da função pública; (ii) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05 (cinco) anos; e (iii) proibição de contratar com o poder público pelo prazo de 05 (cinco) anos. Em razões recursais, o Ministério Público Federal afrma que foi realizada contratação direta da empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, havendo fraude ao processo licitatório. Afirma que houve desvio de recursos públicos decorrentes da contratação da referida empresa, para que a sócia Vanessa Schmitz Bulcão, ré absolvida, fosse favorecida, e que os servidores lotados no estoque regulador da Secretaria de Saúde, Erislene Floriano Nunes, Marco Aurélio Vieira Dias e Monalício Alves Almeida, também absolvidos, teriam inserido informação falsa em nota fiscal (de número 7364) para facilitarem o desvio de dinheiro público. Aduz o MPF que os réus supramencionados praticaram ato de improbidade administrativa, conforme provas juntadas aos autos. Requer, assim, a reforma da sentença para que sejam condenados os réus Erislene Floriano Nunes, Marco Aurélio Vieira Dias, Monalício Alves Almeida, Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, Vanessa Schmitz Bulcão e Willer Costa Silva Malta (ID 108493602, Pág. 03/27). A União Federal e o Estado do Tocantins, litisconsortes ativos, ratificaram a apelação do MPF (ID 108493602 - Págs. 39/40 e 45). José Gastão Almada Neder também apresentou razões de apelação, alegando, preliminarmente, nulidades insanáveis resultantes da incompetência absoluta da Justiça Federal, em razão do recurso utilizado no processo ser unicamente estadual, e do cerceamento de defesa, decorrente da ausência de concessão de oportunidade para produção de provas testemunhal e pericial por ele requeridas. No mérito, sustenta insuficiência probatória de autoria, pois não restou demonstrado que o apelante obteve vantagem financeira ilícita, nem que agiu com dolo de causar dano ao erário. Afirma que não houve dispensa de licitação, mas sim reconhecimento de dívida, devido à urgência da ocasião, pois a única intenção era obter materiais e medicamentos para os hospitais regionais do Estado do Tocantins de forma rápida, para evitar o desabastecimento. Argumenta inexistir prejuízo ao erário, já que houve a efetiva entrega dos produtos adquiridos. Alega que a auditoria realizada pelo DENASUS foi tendenciosa, posto que os auditores responsáveis por ela foram acomodados, de forma obrigatória, na sede do MPF, emitindo relatório com juízos de valores e críticas abusivas que refogem ao trabalho de auditoria. Requer, assim, a reforma da sentença para que seja absolvido e seja revogado o bloqueio de seus bens. Pugna, também, pela gratuidade de justiça (ID 108494526). Maria Lenice Freire de Abreu Costa também apelou, alegando, preliminarmente, cerceamento de defesa, em razão de o Juízo de origem não ter aproveitado as provas presentes na Ação Penal 0004315-48.2016.4.01.4300. No mérito, afirma que não restou comprovado seu conluio para realizar qualquer contratação, pois apenas emitiu parecer jurídico opinativo de inexigibilidade de licitação, redigido por equipe de pareceristas. Sustenta que a razão de haver rapidez na emissão dos pareceres se deve ao fato de que os processos chegavam com pedido de urgência preferencial, pois tinham por objeto a entrega de medicamentos e insumos para o SUS. Pugna pela concessão da gratuidade de justiça (ID 108494529). Vanda Maria Gonçalves Paiva interpôs recurso de apelação, aduzindo, preliminarmente, incompetência da justiça federal e cerceamento de defesa, diante do indeferimento de produção de provas testemunhal e pericial, além de afirmar que “as mídias acostadas as fls. 73/74 do processo, a saber, processo administrativo de compra e oitivas” não foram juntadas aos autos após migração para o PJe. No mérito, também afirmou que foram preenchidos todos os requisitos legais para aquisição dos insumos e medicamentos de forma direta, sem licitação, devido à urgência da situação, não tendo sido demonstrado o dolo em sua conduta, nem comprovado o dano ao erário, já que os produtos foram efetivamente adquiridos (ID 108494532). Diante da juntada aos autos da certidão de óbito do réu Luiz Renato Pedra Sá (ID 108494527 e ID 108494534), o MPF pugnou pelo prosseguimento do feito, tendo em vista a ausência de condenação do falecido em sanções de natureza pecuniária (ID 108494552). O Juízo a quo determinou a intimação do MPF para promover a habilitação dos herdeiros e/ou espólio de Luiz Renato Pedra Sá (ID 108494561), o que foi cumprido pelo Parquet Federal (ID 108494565 - Pág. 1). Em decisão, o Juízo de origem deferiu o pedido e determinou a habilitação do Espólio de Luiz Renato Pedra Sá nos autos, na pessoa de sua filha e herdeira Renata Leitão Gomes Sá (ID 108494566 c/c ID 108494582). O Espólio de Luiz Renato Pedra Sá manifestou ciência da habilitação nos autos, ratificando os atos praticados nos autos pelo de cujus, quando em vida (ID 108494577), e apresentou contrarrazões à apelação do MPF (ID 108494588). Willer Costa Silva apresentou contrarrazões à apelação ministerial, pugnando pela manutenção da sentença (ID 108493602, Pág. 29-35). A União Federal apresentou contrarrazões aos recursos dos demandados, pugnando pela manutenção da sentença nos pontos por eles combatidos (ID 108494564). O Parquet Federal também apresentou contrarrazões aos apelos dos réus, pugnando pelo não provimento dos recursos (ID 108494565). Marco Aurélio Vieira Dias e Monalício Alves Almeida apresentaram contrarrazões à apelação do Parquet Federal, requerendo a manutenção da sentença (ID 108494554). Maria Lenice Freire de Abreu Costa também apresentou contrarrazões ao apelo do MPF, requerendo o seu não provimento (ID 108494556). João Aparecido da Cruz manifestou ciência da apelação interposta pelo MPF, reiterando as alegações já apresentadas nos autos (ID 108494558). Demais réus não apresentaram contrarrazões ao recurso do órgão ministerial (ID 108494600). Em Parecer, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região manifestou pelo provimento do recurso de apelação do MPF e pelo não provimento dos apelos dos réus (ID 151510531). Intimadas as partes acerca das alterações que a Lei 14.230/2021 promoveu na Lei 8.429/1992 (ID 220890544), (i) José Gastão Almada Neder e o Espólio de Luiz Renato Pedra Sá requerem a improcedência da demanda, diante das mudanças ocorridas na LIA e em razão da não demonstração do dolo e do enriquecimento ilícito dos demandados (ID 277689648); (ii) o Estado do Tocantins pugna pelo prosseguimento do feito, afirmando que, com o advento da Lei 14.230/2021, devem ser extintas eventuais imputações culposas feitas pelo MPF, prosseguindo o feito quanto às dolosas (ID 277689650); (iii) a União requer o não provimento dos recursos dos demandados, tendo em vista o caráter doloso das condutas por eles perpetradas, nos termos da tese firmada pelo STF no Tema 1.199 (ID 277689652); (iv) Vanessa Schmitz Bulcão, Iara Suzana Schmitz Bulcão, Naragleice Carneiro e Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda requerem o não provimento do apelo do MPF, afirmando que não praticaram qualquer ato ímprobo, seja de forma dolosa ou culposa, baseando-se na tese do Tema 1.199 do STF (ID 277689654); (v) João Aparecido da Cruz afirma que as alterações promovidas pela Lei 14.20/2021 devem retroagir para beneficiar o réu, diante do entendimento majoritário jurisprudencial e doutrinário, não havendo que se falar mais em conduta culposa (ID 277689655); (vi) o MPF requer o reconhecimento da irretroatividade das disposições da Lei 14.230/2021, de modo que se verifique a ausência de prescrição intercorrente no caso em comento e se mantenham as constrições deferidas e executadas nos autos em face dos réus condenados, pugnando pelo não provimento dos recursos dos réus. Por fim, afirma que, ainda que se entenda pela não aplicação do art. 10, inciso VIII, da LIA, em razão da não comprovação da “perda patrimonial efetiva”, a fraude à licitação permanece capitulada no inciso V do art. 11 da LIA (ID 277689656); (vii) Monalício Alves Almeida requer a certificação do trânsito em julgado do capítulo da sentença que o absolveu, afirmando que não houve recurso em face de sua absolvição (ID 277689662); (viii) Marco Aurélio Vieira Dias pugna pela aplicação retroativa das alterações promovidas na Lei 8.429/1992 para que a demanda seja julgada improcedente, diante da nova exigência de efetiva perda patrimonial do erário para os fins de condenação por ato ímprobo do art. 10, além do não cabimento de imputação de dolo eventual (ID 277689664); (ix) Erislene Floriano Nunes pugna pela aplicação retroativa das disposições da Lei 14.230/2021, trazendo os mesmos argumentos de Marco Aurélio Vieira Dias (ID 277689666); (x) Vanda Maria Gonçalves Paiva, Maria Lenice Freire de Abreu Costa e Willer Costa Silva não se manifestaram (ID 277689668); e (xi) a PRR1 pugna pelo prosseguimento do feito, reiterando o Parecer exarado, no qual opina pelo provimento do recurso do MPF e pelo não provimento dos apelos dos réus (ID 333114160). Diante da ampliação do quadro de Desembargadores Federais do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o feito foi redistribuído em 13/05/2023 para este Gabinete 31. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CÍVEL (198) 0001933-82.2016.4.01.4300 V O T O A Exma Sra Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Relatora): Ressalvada a opinião pessoal desta julgadora, curvo-me ao posicionamento majoritário que se formou na sessão de julgamento presencial de 23/04/2025 da 2ª Seção deste Tribunal, ocasião em que, por maioria, vencidos no Conflito de Jurisdição 1029201-15.2024.4.01.0000 os Juízes Marcelo Elias Vieira, em substituição ao Desembargador Leão Alves, e José Magno Linhares Moraes, em minha substituição; No Conflito de Jurisdição 1027509-78.2024.4.01.0000 vencido o Juiz Federal José Magno Linhares, em minha substituição; e no conflito de competência 1023852-31.2024.4.01.0000 vencidos os Desembargadores Federais Leão Alves e José Magno Linhares, a 2ª Seção declarou a competência desta Desembargadora Federal suscitada, sob a compreensão de que a redistribuição - para os novos Gabinetes em razão da criação de novos cargos de desembargador - é válida mesmo quando houver relator da 3ª ou 4ª Turma originariamente preventos. Firmada a competência desta julgadora para a relatoria, prossigo. 1. Remessa necessária Verifica-se que o Juízo de origem submeteu a sentença à remessa necessária (ID 108493601 - Pág. 135). Esta Décima Turma possui posicionamento firme quanto à atual impossibilidade de reexame necessário de sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021 em demandas de improbidade em que a pretensão foi julgada improcedente ou houve a extinção do feito sem resolução de mérito, citando-se, por exemplo, precedentes firmados no julgamento do REO 1001186-49.2018.4.01.3200, (então) JUIZ FEDERAL SAULO JOSÉ CASALI BAHIA (CONV.), TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 14/09/2023; EDAC 0005658-32.2013.4.01.3703, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 15/10/2024; RemNecCiv 0002025-69.2016.4.01.4200, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1, PJE 28/01/2025; REO 1001746-77.2017.4.01.3700, DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHAO COSTA, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 26/03/2025; e RemNecCiv 1000502-90.2019.4.01.3200, JUIZ FEDERAL JOSE MAGNO LINHARES MORAES, TRF1, PJe 07/04/2025. Tal compreensão fundamenta-se no fato de que não há que se falar em remessa necessária em ações de improbidade administrativa, pois, embora a Lei 8.429/1992, na redação anterior à Lei 14.230/2021, não dispunha sobre a questão da remessa necessária, com o advento da Lei 14.230/2021, que alterou de forma substancial a Lei 8.429/1992, a questão relativa ao cabimento ou não da remessa necessária recebeu tratamento expresso, uma vez que a própria Lei trouxe dispositivos no sentido de que não haverá remessa necessária nas sentenças proferidas em ação de improbidade administrativa (art. 17, § 19, IV, e art. 17-C, VII, § 3º, ambos da Lei 8.429/1992, com a redação dada pela Lei 14.230/2021). E, em reforço de fundamentação, na compreensão de que, em sessão realizada em 26/04/2023, a Primeira Seção do STJ, ante a supracitada vedação à remessa necessária introduzida pela Lei 14.230/2021 na Lei 8.429/1992, decidiu desafetar o Tema Repetitivo 1042 – cuja questão que seria submetida a julgamento era a discussão se há remessa de ofício nas ações típicas de improbidade administrativa, ajuizadas com esteio na alegada prática de condutas previstas na Lei 8.429/1992, cuja pretensão é julgada improcedente em primeiro grau –, na compreensão de que a lei, agora, expressamente afasta a necessidade de reexame necessário. Ocorre que recentemente (11/6/2025) a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 2117355/MG, REsp 2118137/MG e REsp 2120300/MG, submetidos ao julgamento pela sistemática dos recursos repetitivos - Tema Repetitivo 1284 - aprovou, por unanimidade, a seguinte tese nesse tema repetitivo: A vedação ao reexame necessário da sentença de improcedência ou de extinção do processo sem resolução do mérito, prevista pelos art. 17, § 19º, IV c/c art. 17-C, § 3º, da Lei de Improbidade Administrativa, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021, não se aplica aos processos em curso, quando a sentença for anterior à vigência da Lei 14.230/21. Resta verificar, ainda, o alcance da compreensão firmada em casos de improbidade administrativa sentenciados (i) antes da vigência da Lei 14.230/2021 e (ii) quando presente hipótese de sentença que (ii.1) extingue o processo sem resolução de mérito ou (ii.2) julga improcedentes os pedidos. No ponto, a orientação doutrinária à qual se filiou o STJ foi no sentido de que "a semelhança da ação de improbidade com a ação civil pública e com a ação popular [...] determinam, no particular, a aplicação analógica de regras que regulamentam essas ações" (ZAVASCKI, Teori Albino. A tutela do direito transindividual à probidade da administração pública: A ação de improbidade. In: Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 128). Por via de consequência, e antes da vigência da Lei 14.230/2021 (que expressamente afastou a remessa necessária dos procedimentos regulados pela Lei 8.429/1992), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) havia pacificado o entendimento de que o art. 19 da Lei 4.717/1965 era aplicado subsidiariamente à ação de improbidade administrativa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965. É FIRME O ENTENDIMENTO NO STJ DE QUE O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DEVE SER APLICADO SUBSIDIARIAMENTE À LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRECEDENTES. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. Verifica-se que, no acórdão embargado, a Primeira Turma decidiu que não há falar em aplicação subsidiária do art. 19 da Lei 4.717/65, mormente por ser o reexame necessário instrumento de exceção no sistema processual. 2. Já o v. acórdão paradigma da Segunda Turma decidiu admitir o reexame necessário na Ação de Improbidade. 3. A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que o Código de Processo Civil deve ser aplicado subsidiariamente à Lei de Improbidade Administrativa. Nesse sentido: REsp 1.217.554/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 22/8/2013, e REsp 1.098.669/GO, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 12/11/2010. 4. Portanto, é cabível o reexame necessário na Ação de Improbidade Administrativa, nos termos do artigo 475 do CPC/1973. Nessa linha: REsp 1556576/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 31/5/2016. 5. Ademais, por "aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário" (REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, j. 19.5.2009, DJe 29.5.2009). Nesse sentido: AgRg no REsp 1219033/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 25/04/2011. 6. Ressalta-se, que não se desconhece que há decisões em sentido contrário. A propósito: REsp 1115586/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 22/08/2016, e REsp 1220667/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 20/10/2014. 7. Diante do exposto, dou provimento aos Embargos de Divergência para que prevaleça a tese do v. acórdão paradigma de que é cabível o reexame necessário na Ação de Improbidade Administrativa, nos termos do artigo 475 do CPC/1973, e determino o retorno dos autos para o Tribunal de origem a fim de prosseguir no julgamento. (EREsp n. 1.220.667/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24/5/2017, DJe de 30/6/2017) (sem destaque no original) Posteriormente, em 2019, a Primeira Seção do STJ afetou quatro processos para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, a fim de definir a possibilidade ou não da aplicação do reexame necessário nas ações de improbidade administrativa julgadas improcedentes em primeira instância, cadastrando o assunto como Tema 1.042 no sistema de recursos repetitivos (STJ, REsp 1.553.124/SC, REsp 1.605.586/DF, REsp 1.502.635/PI, REsp 1.601.804/TO, rel. min. Napoleão Nunes Maia Filho. Primeira Seção, afetação na sessão eletrônica iniciada em 11/12/2019 e finalizada em 17/12/2019, DJe de 19/12/2019). Ocorre que, diante da posterior supressão da remessa necessária em ações de improbidade administrativa, promovida pela superveniente Lei 14.230/2021: - a Primeira Seção do STJ, ante a supracitada vedação à remessa necessária introduzida pela Lei 14.230/2021 na Lei 8.429/1992, decidiu, em sessão realizada em 26/04/2023, desafetar o supracitado Tema Repetitivo 1042 – cuja questão que seria submetida a julgamento era a discussão se há remessa de ofício nas ações típicas de improbidade administrativa, ajuizadas com esteio na alegada prática de condutas previstas na Lei 8.429/1992, cuja pretensão é julgada improcedente em primeiro grau –, na compreensão de que a lei, agora, expressamente afasta a necessidade de reexame necessário; - ocorre que a mesma Primeira Seção do STJ novamente se posicionou a respeito desse tema, precisamente em 11/6/2025, quando, no Tema Repetitivo 1284, firmou a seguinte tese: A vedação ao reexame necessário da sentença de improcedência ou de extinção do processo sem resolução do mérito, prevista pelos art. 17, § 19º, IV c/c art. 17-C, § 3º, da Lei de Improbidade Administrativa, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021, não se aplica aos processos em curso, quando a sentença for anterior à vigência da Lei 14.230/21. Prevaleceu, ao final e no âmbito da Primeira Seção do STJ, a compreensão de que a sentença que extingue o processo sem resolução de mérito, ou julga improcedentes os pedidos antes (da vigência) das alterações processuais trazidas pela Lei 14.230/2021 está submetida ao regime até então vigorante no microssistema das ações coletivas de proteção aos direitos e interesses difusos, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e tornadas vinculantes na recente tese firmada no Tema Repetitivo 1284. Por via de consequência, é cabível o reexame necessário em casos tais. E para evitar a interposição de embargos de declaração, registra-se, oportunamente, que o STJ entende possível a aplicação imediata dos precedentes firmados em julgamentos submetidos à sistemática do recurso repetitivo ou da repercussão geral, independentemente da publicação do acórdão paradigma ou do julgamento de eventuais embargos de declaração opostos (AgInt no REsp 1.866.971/RS, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 7/4/2025, DJEN de 28/4/2025; AgInt no REsp 2.044.906/PR, relator Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 8/4/2024, DJe de 11/4/2024). A mesma compreensão tem o STF, para quem, "Segundo a pacífica jurisprudência da Corte, a existência de precedente firmado por seu Tribunal Pleno autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre a mesma matéria, independentemente do trânsito em julgado do feito paradigma" (RE 1536437 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 03-06-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 04-06-2025 PUBLIC 05-06-2025). No mesmo sentido, "Sobre as decisões proferidas em controle concentrado, o STF possui entendimento no sentido de que a existência de precedente firmado pelo Plenário da Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre o mesmo tema, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma. Vejam-se, nesse sentido: ARE 650.574-AgR/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma; AI 709.043-AgR/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma." (EDAC 1002796-10.2022.4.01.0000, JUÍZA FEDERAL OLIVIA MERLIN SILVA, TRF1 - SEGUNDA SEÇÃO, PJe 21/11/2023). Diante desse novo cenário jurisprudencial e considerando-se o referido precedente vinculante (art. 927, III, CPC) estabelecido no Tema Repetitivo 1284, é de rigor a necessidade de superação do sobredito entendimento consolidado desta Décima Turma para doravante passar a conhecer da remessa necessária nos casos de sentença de improcedência ou de extinção do processo sem resolução do mérito proferidas anteriormente à vigência da Lei 14.230, que entrou em vigor na data da sua publicação em 26/10/2021. Postas tais premissas, prossegue-se na análise do caso concreto. Na hipótese, a sentença foi proferida antes da vigência da Lei 14.230 e o juízo a quo assim justificou a necessidade de remessa dos autos para o reexame necessário por este Tribunal ID 108493601 - Pág. 135): REMESSA NECESSÁRIA 307. A sentença de improcedência do pedido formulado em ação de improbidade está sujeita a remessa necessária, por aplicação analógica do artigo 19 da Lei 4.717/65 (STJ, EREsp 1220667/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/05/2017, DJe 30/06/2017). Considerando que há sucumbência parcial dos autores, determino o envio dos autos à instância revisora para o reexame necessário. Essa sucumbência parcial afirmada na sentença decorre da seguinte parte dispositiva transcrita integralmente para fins de adequada análise da sucumbência: III. DISPOSITIVO 309. Ante o exposto, resolvo o mérito (CPC, art. 487, I) das questões submetidas da seguinte forma: 310. (I) acolho o pedido dos autores para condenar VANDA MARIA GONÇALVES PAIVA, em razão da prática dolosa das condutas previstas no artigo 10, VIII, da Lei 8.429/92, às seguintes sanções: (a) perda da função pública que o requerido estiver ocupando à época da execução (art. 12, II, LIA); (b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); (c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); 311. (II) acolho o pedido dos autores para condenar JOSÉ GASTÃO ALMADA NEDER, em razão da prática dolosa das condutas previstas no artigo 10, VIII, da Lei 8.429/92, às seguintes sanções: (a) perda da função pública que o requerido estiver ocupando à época da execução (art. 12, II, LIA); (b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); (c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); 312. (III) acolho o pedido dos autores para condenar LUIZ RENATO PEDRA SÁ, em razão da prática dolosa das condutas previstas no artigo 10, VIII, da Lei 8.429/92, às seguintes sanções: (a) perda da função pública que o requerido estiver ocupando à época da execução (art. 12, II, LIA); (b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); (c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); 313. (IV) acolho o pedido dos autores para condenar MARIA LENICE COSTA, em razão da prática dolosa das condutas previstas no artigo 10, VIII, da Lei 8.429/92, às seguintes sanções: (a) perda da função pública que o requerido estiver ocupando à época da execução (art. 12, II, LIA); (b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); (c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos (art. 12, II, LIA); 314. (V) julgar improcedentes as imputações narradas na inicial em face de JOÃO APARECIDO DA CRUZ, de WILLER COSTA SILVA MATA, de MARCO AURÉLIO VIEIRA DIAS, de MONALÍCIO ALVES ALMEIDA, de ERISLENE FLORIANO NUNES, de NEO STOCK BRASIL PRODUTOS PARA SAÚDE LTDA e de suas sócias NARAGLEICE CARNEIRO, VANESSA SCHMITZ BULCÃO e IARA SUZANA SCHIMITZ BULCÃO, tendo em vista a insuficiência de provas de relação desses requeridos com os atos ímprobos narrados e a inexistência do indispensável elemento subjetivo; 315. (VI) revogar a tutela provisória concedida em face dos requeridos absolvidos e também dos condenados, estes porque não foram condenados na pena de ressarcimento ou multa civil, à falta de quantificação do dano; PROVIDÊNCIAS DE IMPULSO PROCESSUAL (...) Como se vê, houve procedência, ainda que parcial, do pedido posto na exordial da ação civil pública por ato de improbidade, razão pela qual a remessa necessária não deve ser conhecida. Em reforço de fundamentação, o STJ, viu-se acima, firmou entendimento no sentido de que o reexame necessário é cabível nas ações de improbidade administrativa, aplicando por analogia o artigo 19 da Lei 4.717/1965, para garantir a proteção do patrimônio público e a moralidade administrativa. Na hipótese, materialmente falando, não há dúvida de que a sentença, conquanto tenha julgado parcialmente procedentes os pedidos, assegurou a pretendida proteção do patrimônio público e a moralidade administrativa visada no microssistema das ações coletivas de proteção aos direitos e interesses difusos, com as interpretações e vigência na data da sentença. Tal quadrante não se confunde com o chamado “reexame necessário” ou “duplo grau de jurisdição obrigatório” previsto no art. 496 do CPC/2015 e no art. 475 do CPC/73, em que a parcial procedência pode eventualmente gerar a remessa necessária, a depender do quantum sucumbente da Fazenda Pública, quando então aplica-se o Enunciado 325 da Súmula da jurisprudência dominante do STJ (“A remessa oficial devolve ao Tribunal o reexame de todas as parcelas da condenação suportadas pela Fazenda Pública, inclusive dos honorários de advogado.”). Com efeito, o reexame obrigatório previsto no CPC/2015 tem como pressuposto a proteção do interesse secundário, ou seja, quando houver sucumbência da Fazenda Pública, aplica-se o instituto do reexame necessário, salvo exceções legais. Com isso, e considerando-se que a sentença foi de parcial procedência dos pedidos formulados na ação civil pública por (suposto) ato de improbidade, não há que se falar em aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei 4.717/65, que sujeita apenas os casos de carência da ação ou improcedência (total) dos pedidos ao duplo grau (obrigatório) de jurisdição, razão pela qual não deve ser conhecida a remessa necessária no caso concreto. Dessa forma, não há remessa necessária (condição de eficácia da sentença) na presente demanda julgada parcialmente procedente. 2. Requisitos de admissibilidade recursal i) Gratuidade de Justiça e Preparo José Gastão Almada Neder (ID 108494526 - Pág. 3) e Maria Lenice Freire de Abreu Costa (ID 108494529 - Pág. 1 c/c Pág 24) requereram a concessão do benefício da Justiça Gratuita, afirmando não dispor de meios para arcar com as custas processuais, sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Quanto a José Gastão Almada Neder, o MPF, em contrarrazões aos apelos dos réus, impugnou o requerimento da gratuidade de justiça feito pelo apelante, afirmando que é médico e servidor público estadual, com remuneração mensal líquida de R$ 13.000,00, não sendo, assim, hipossuficiente (ID 108494565 - Pág. 5). Vanda Maria Gonçalves Paiva não requereu a concessão da gratuidade de justiça, nem realizou o preparo. Contudo, verifica-se que o Juízo de origem deferiu o benefício da justiça gratuita aos três demandados/apelantes, em decisão de ID 108493599 - Pág. 7 c/c Pág. 10. Segundo o art. 1.010, III, CPC, a apelação conterá, dentre outros, as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade. Assim, para que o recurso seja conhecido, o recorrente deve demonstrar que possui interesse recursal na reforma ou modificação da decisão. No caso concreto, cumpre afirmar, de partida, que o art. 98, § 1º, incisos I e VIII, primeira parte, do CPC, estabelecem que a gratuidade da justiça compreende as taxas judiciais e os depósitos previstos em lei para interposição de recurso. Na hipótese, o Juízo a quo já deferiu aos réus, ora apelantes, o benefício da gratuidade de justiça, em decisão de ID 108493599 - Pág. 7 c/c Pág. 10. Nesse prisma, e a partir da compreensão de que a concessão da gratuidade da justiça - in casu, no 1º Grau - compreende os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, é de rigor que não há interesse processual recursal, pelos réus, em pleitear novamente a concessão da gratuidade da justiça ou, na hipótese, em requerer, agora perante este 2º Grau, a manutenção desse benefício. Reforça essa linha intelectiva: i) O art. 9º da Lei 1.060/1950 (não revogado pelo NCPC), que estabelece que "os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias". ii) O posicionamento do STJ, para quem “O benefício da assistência judiciária gratuita, uma vez concedido, prevalece em todas as instâncias e para todos os atos do processo” (AgInt no REsp 1785426/PB, Rel. Min. Regina Helena Costa, 1ª Turma, j. 17/02/2020, DJe 20/02/2020); e “O benefício da gratuidade da justiça concedido no processo de conhecimento persistirá nos processos de liquidação e de execução, inclusive nos embargos à execução, salvo se revogado expressamente”. (AgInt nos EDcl no REsp 1759494/PB, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª Turma, j. 18/11/2019, DJe 21/11/2019). iii) E o art. 197, parágrafo único, do Regimento Interno deste Tribunal, no sentido de que "Prevalecerá, no Tribunal, a assistência judiciária já concedida em outra instância". Assim, (1) já tendo sido deferida a gratuidade da justiça pelo Juízo a quo, (2) não tendo sido revogada até a interposição do recurso e, ainda, (3) não tendo sido questionado seu deferimento em sede recursal, é de rigor a ausência do interesse processual recursal - in casu, o interesse-necessidade - quanto ao pedido de manutenção da gratuidade da justiça, razão pela qual não se conhece dos recursos de José Gastão Almada Neder e Maria Lenice Freire de Abreu Costa nesse ponto. De outro lado, ressalta-se que, mesmo que fosse indeferido o benefício da gratuidade de justiça pelo Juízo de origem, hipoteticamente falando, o recurso sob julgamento não seria considerado deserto porque a Lei 14.230/2021 alterou a Lei 8.429/1992 no que toca à necessidade do preparo, determinando que “não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas” (art. 23-B, caput) e estabelece que, caso a sentença seja de procedência, “as custas e as demais despesas processuais serão pagas ao final” (art. 23-B, § 1º). A sobredita nova previsão do art. 23-B, caput e § 1º, Lei 8.429/1992 também se aplica ao MPF, que inclusive já estava dispensado do recolhimento de preparo, nos termos do art. 4º, III e IV, da Lei 9.289/1996. Avançando, constata-se que os recursos são tempestivos, não há hipótese de deserção por ausência ou insuficiência de preparo e a sentença atacada é recorrível via apelação (art. 1.009, caput, do CPC). Portanto, presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, deles conheço. 3. Questões preliminares. 3.1 Preliminar de incompetência da Justiça Federal José Gastão Almada Neder e Vanda Maria Gonçalves Paiva alegam, em preliminar de mérito, a incompetência da Justiça Federal, pois as verbas públicas, objeto da demanda, são estaduais e não estariam sujeitas à prestação de contas perante o Departamento de Auditoria do Sistema Único de Saúde (DENASUS). Não lhes assiste razão. Ressalta-se, de início, que a questão trazida a respeito da competência da Justiça Federal já foi objeto de apreciação por esta Corte Regional no bojo do agravo de instrumento interposto pela Vanda Maria Gonçalves Paiva (ID 108493585 - Pág. 108/151 e ID 108493586 - Pág. 1/10), no qual se declarou a competência da Justiça Federal para julgar o feito (ID 108493589 - Pág. 21/29). Ademais, oportuno esclarecer que a verba pública repassada ao Estado do Tocantins é originária da União, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), de modo que a competência para julgar as causas que versem sobre a malversação de tais verbas é da Justiça Federal, ainda que o recurso tenha sido incorporado ao patrimônio do ente federativo que o recebeu. Assim, rejeito a preliminar de incompetência. 3.2 Preliminar de cerceamento de defesa José Gastão Almada Neder e Vanda Maria Gonçalves Paiva alegam que não foram deferidos seus requerimentos de produção de provas testemunhal e pericial, o que prejudicou a instrução processual, pois somente foram produzidas provas unilateralmente pelo Parquet Federal. Vanda Maria afirma, também, que, durante a migração dos autos para o PJe, não foram acostadas as mídias de “fls. 73/74” do processo, que tratam do processo administrativo de compra e oitivas, de modo que a análise das provas pelo Tribunal ad quem restará prejudicada. E Maria Lenice afirma que não foram aproveitadas as provas da Ação Penal 0004315-48.2016.4.01.4300. Verifica-se que o Juízo de origem determinou que as partes especificassem as provas que pretendiam produzir, justificando a pertinência das provas com os fatos narrados (ID 108493586 - Pág. 10). Os apelantes José Gastão Almada Neder (ID 108493598 - Pág. 36/38) e Vanda Maria Gonçalves Paiva (ID 108493598 - Pág. 18/21) requereram a oitiva de testemunhas e a produção de prova pericial para identificar as assinaturas dos documentos e perícia contábil para identificar os valores praticados. Nota-se, assim, que a apelante Maria Lenice Freire de Abreu Costa não se manifestou a respeito das provas que pretendia produzir. Ainda assim, o Juízo de origem determinou o “aproveitamento de provas produzidas junto ao juízo criminal” (ID 108493599 - Pág. 10). Logo, não houve o cerceamento de defesa por ela alegado, quanto ao aproveitamento das provas da Ação Penal 0004315-48.2016.4.01.4300. Quanto aos pedidos de produção de provas requeridos por José Gastão e Vanda Maria, o Juízo a quo os indeferiu sob os seguintes fundamentos (ID 108493599 - Pág. 7): QUESTÕES SOBRE AS QUAIS RECAIRÁ A ATIVIDADE PROBATÓRIA 138. A controvérsia dos presentes autos se resume aos seguintes pontos: 139. (a) ocorrência de improbidade na aquisição de medicamentos descrita na inicial; 140. (b) participação de cada um dos requeridos na pratica desses atos ímprobos; 141. (c) efetiva entrega, ou não, dos insumos à Sesau. DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA 142. O ônus da prova incumbe ao MPF, à UNIÃO e ao ESTADO DO TOCANTINS, no que tange à ocorrência dos fatos narrados na inicial, e aos requeridos, no tocante à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo da aplicação das penalidades da Lei 8.429/92. Assim, a distribuição do ônus da prova segue a disposição regular do artigo 373, I e II, do Código de Processo Civil. (...) PROVAS A SEREM PRODUZIDAS 144. A questão sob análise não comporta prova oral. Os esclarecimentos a serem prestados pelos agentes do Denasus não poderiam ir além dos relatórios já presentes nos autos. As testemunhas arroladas pelos requeridos também não poderiam prestar relatos mais fidedignos do que retratam os documentos juntados por cada uma das partes. Da mesma forma, nada do que os requeridos poderiam dizer em depoimentos pessoais poderia extrapolar o que consta nas defesas preliminares e contestações. 145. VANDA PAIVA requereu a produção de prova pericial em suas assinaturas e perícia contábil a fim de verificar o valor pago por cada ex-gestor. A autenticidade das assinaturas não é ponto controvertido nos autos. A responsabilidade pelas dívidas e seu valor pode ser apurada ou afastada por meio da análise das autorizações para abertura de processos, notas de empenho e autorizações de pagamento já apresentadas. 146. JOSE GASTÃO NEDER e LUIZ RENATO PEDRA SÁ requereram a produção de prova pericial a fim de demonstrar o trâmite regular do processo administrativo. A prova pericial é aquela que demanda a manifestação técnica de experto em determinada área do conhecimento cientifico. O regular processamento de feito administrativo não extrapola o conhecimento próprio à ciência do direito. O estudo do processo administrativo se exaure nos cursos de Direito, requisito imposto a quem detém autorização legal para atuar em processos judiciais. Trata-se, portanto, de uma questão comum aos operadores jurídicos, que não demanda a oitiva de perito. Dessa forma, a prova requerida é inútil ao esclarecimento das questões controvertidas e deve ser indeferida (art. 370, parágrafo único, CPC). (...) 148. Os fatos relatados pelos requeridos pertinentes ao recebimento ou não dos produtos pelo estoque regulador e ao registro das notas fiscais podem ser extraídos a partir da análise de documentos, sem a necessidade de oitiva de um experto. Quanto à perícia grafotécnica, só seria necessária se a controvérsia dissesse respeito à autenticidade da anotação realizada na capa dos autos n° 2014.3055.000948. A leitura da peça inicial permite concluir que o fato não é controverso. Portanto, a anotação deve ser tida como verdadeira e lavrada por um dos auditores. Não é necessário provar de que punho ela partiu, porque o objeto deste processo não é a investigação do trabalho dos auditores. (destacou-se) Diante do contexto fático dos autos, nota-se que a produção das provas requeridas pelos apelantes não traria utilidade à resolução da lide. Ademais, cabe ao órgão julgador prevenir e reprimir a produção de provas inservíveis/desnecessárias ao processo e/ou meramente protelatórias, razão pela qual descabe falar em cerceamento de defesa, pois, diante do princípio do convencimento motivado, previsto no art. 370 do Código de Processo Civil vigente, o magistrado pode considerar desnecessária a produção de outras provas, sendo-lhe permitido, inclusive, rever seu posicionamento e determinar a realização daquelas que julgar necessárias. Não cabe compelir o magistrado a autorizar a produção desta ou daquela prova, se por outros meios estiver convencido da verdade dos fatos, tendo em vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cabe a análise da conveniência e necessidade da sua produção. Ademais, cabe ao juiz o dever de velar pela duração razoável do processo (art. 139, II, do CPC), inclusive, se o caso, indeferindo postulações meramente protelatórias (art. 139, III, segunda parte, CPC). Por fim, quanto à alegação de Vanda Maria de que, durante a migração dos autos para o PJe, não foram acostadas as mídias de “fls. 73/74” do processo, compulsando os autos é possível notar que, de fato, nenhuma das mídias constantes nos autos físicos foram juntadas aos autos eletrônicos. No entanto, tais documentos estão presentes na Ação Penal 0004315-48.2016.4.01.4300, correlata a esta demanda, de modo que podem ser analisados através dos autos da ação criminal. Além disso, sendo o caso de absolvição dos réus/apelantes – conforme restará demonstrado mais adiante -, a primazia do julgamento de mérito é um princípio jurídico que orienta o magistrado a buscar, sempre que possível, a resolução de fundo da questão apresentada, em detrimento do encerramento do processo por questões formais, ex vi do art. 4º c/c art. 282, § 2º, ambos do CPC. Rejeito, assim, a preliminar de cerceamento de defesa. Sem mais questões preliminares ou prejudiciais a serem analisadas, passo ao mérito. 4. Do mérito Em cumprimento à tarefa de regulamentar a repressão aos atos de improbidade administrativa, nos termos do artigo 37, §4º, da Constituição Federal, foi promulgada a Lei 8.429/1992, a qual definiu os contornos dos atos de improbidade, seus sujeitos ativo e passivo, a forma e a gradação das sanções imputáveis aos responsáveis por tais atos, bem como os procedimentos administrativos e judiciais a serem observados nesta seara integrante do denominado Direito Administrativo sancionador. Entretanto, em 26/10/2021, entrou em vigor a Lei 14.230, que alterou várias disposições da Lei 8.429/1992, o que provocou dissenso acerca da aplicação imediata dessas modificações às ações típicas de improbidade administrativa em curso ajuizadas com esteio na alegada prática de condutas previstas na Lei 8.429/1992. O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 1.199 da repercussão geral (ARE 843.989), portanto, de eficácia vinculante (art. 927, III, CPC), ao analisar a eventual (ir) retroatividade das disposições da Lei 14.230/2021, em especial, em relação à (i) necessidade da presença do elemento subjetivo – dolo – para a configuração do ato de improbidade administrativa, inclusive no artigo 10 da LIA (portanto, em todas as suas modalidades); e (ii) a aplicação dos novos prazos de prescrição geral e intercorrente, firmou as seguintes teses, in verbis: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa –, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. Colhe-se do voto exarado pelo e. relator desse acórdão (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18-08-2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022) que as alterações feitas pela Lei 14.230/2021 nos artigos 1º, §§ 1º e 2º, 9º, 10, 11, bem como a revogação do artigo 5º, preveem: 1) Impossibilidade de responsabilização objetiva por ato de improbidade administrativa; 2) A exigência de comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo – nos artigos 9º, 10 e 11 – a presença do elemento subjetivo – DOLO; 3) A inexistência da modalidade culposa de ato de improbidade a partir da publicação da Lei 14.230/2021; 4) A irretroatividade da norma benéfica da Lei 14.230/2021, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 5) A aplicação dos princípios da não ultra-atividade e tempus regit actum à modalidade culposa do ato de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, revelando-se indispensável o dolo para o enquadramento da conduta no ato de improbidade administrativa. A Lei 14.230/2021 ainda foi objeto de três ações de controle concentrado de constitucionalidade. Nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 7042[1] e 7043, o STF proferiu decisão que restabeleceu a legitimidade ativa concorrente (pluralidade de legitimados) entre o Ministério Público e as pessoas jurídicas interessadas para a propositura da ação, bem como de legitimidade disjuntiva porque os legitimados não dependem da autorização um dos outros para a postulação. Já nos autos da ADI 7236/DF[2], ao se considerar prejudicada a análise dos artigos 1º, §§ 1º, 2º e 3º e 10 da Lei 8.429/1992 – incluídos ou com a redação da Lei 14.230/2021 – com base no Tema 1.199 do STF, restou assentada a constitucionalidade da revogação da previsão legal de ato de improbidade administrativa na modalidade culposa, anteriormente disposto na redação originária da Lei 8.429/1992. E mais recentemente, o Plenário do STF julgou o mérito do RE 656.558/SP/Tema 309 da repercussão geral, reafirmando sua jurisprudência no sentido de que o dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da Constituição Federal), de modo que é inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade administrativa prevista nos arts. 5º e 10 da Lei 8.429/1992, em sua redação originária. Confira-se: Decisão: O Tribunal, (...) Por maioria, apreciando o tema 309 da repercussão geral, deu provimento ao RE nº 656.558/SP, a fim de se restabelecer a decisão em que se julgou improcedente a ação, e fixou a seguinte tese: "a) O dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da Constituição Federal), de modo que é inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade administrativa prevista nos arts. 5º e 10 da Lei nº 8.429/92, em sua redação originária. b) São constitucionais os arts. 13, V, e 25, II, da Lei nº 8.666/1993, desde que interpretados no sentido de que a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, além dos critérios já previstos expressamente (necessidade de procedimento administrativo formal; notória especialização profissional; natureza singular do serviço), deve observar: (i) inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e (ii) cobrança de preço compatível com a responsabilidade profissional exigida pelo caso, observado, também, o valor médio cobrado pelo escritório de advocacia contratado em situações similares anteriores." Tudo nos termos do voto ora aditado do Relator, vencidos parcialmente os Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, André Mendonça e Cármen Lúcia. Plenário, Sessão Virtual de 18.10.2024 a 25.10.2024. Assim é que pelas mesmas razões que justificaram a imediata revogação do tipo culposo do artigo 10 da Lei 8.429/1992 estabelecido no julgamento do ARE 843.989 (Tema 1.199 da repercussão geral), corroborada pelo indeferimento da medida cautelar acima referida em relação ao artigo 11, caput, incisos I e II, infere-se que as modificações do artigo 11, caput, incisos I e II da Lei 8.429/1992 trazidas pela Lei 14.230/2021 devem incidir nos processos em curso (ainda não transitados em julgado). É nesse prisma que serão analisadas as condutas da parte ré/apelante que aqui estão delimitadas pelo princípio dispositivo, o qual, nesta esfera recursal, manifesta-se por meio do efeito devolutivo (tantum devolutum quantum appelatum) estabelecido pelo art. 515, caput, do CPC/1973, correspondente ao art. 1.013 do CPC/2015, segundo o qual “A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada”. Do caso concreto. A ação foi ajuizada pelo Ministério Público Federal, em litisconsórcio com a União Federal e com o Estado do Tocantins, em desfavor de Maria Lenice Freire de Abreu Costa, Vanda Maria Gonçalves Paiva, José Gastão Almada Neder, Erislene Floriano Nunes, Iara Suzana Schimitz Bulcão, João Aparecido Da Cruz, Luiz Renato Pedra Sá, Marco Aurélio Vieira Dias, Monalício Alves Almeida, Naragleice Carneiro, Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, Vanessa Schmitz Bulcão e Willer Costa Silva Mata, em razão de irregularidades em procedimento licitatório envolvendo verbas do Ministério da Saúde, repassadas ao Estado do Tocantins, consubstanciado no direcionamento da contratação da empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, o que configurariam atos de improbidade previstos no art. 10, caput e incisos I, VIII e XII, e art. 11, caput, ambos da Lei 8.429/1992. O Juízo de origem julgou parcialmente procedente o pedido para condenar Vanda Maria Gonçalves Paiva, João Gastão Almada Neder, Maria Lenice Freire de Abreu Costa e Luiz Renato Pedra Sá por ato de improbidade previsto no art. 10, inciso VIII, da Lei 8.429/1992, absolvendo os demais réus. No caso concreto, após a prolação da sentença, entrou em vigor a Lei 14.230/2021, que promoveu profundas alterações na Lei 8.429/1992 e que devem ser aplicadas retroativamente no caso concreto, já que se trata de ação em curso e considerando que o artigo 1º, §4º, dessa lei determina expressamente a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do Direito Administrativo sancionador, o qual comporta aplicação retroativa quando beneficiar o réu, segundo abordado acima por ocasião da análise da tese jurídica firmada pelo STF no julgamento do ARE 843.989 / Tema 1.199, em 18/08/2022. Nessa perspectiva, é de rigor a compreensão de que a nova legislação incide no caso concreto, seja em razão da índole processual de algumas de suas regras, seja por estabelecer um novo regime jurídico persecutório (norma de ordem pública), no qual é possível aplicar os princípios do Direito Administrativo sancionador, que expressa uma das facetas do poder punitivo estatal. Portanto, na esteira do entendimento que vem se consolidando no âmbito das Instâncias Revisoras, inclusive neste Eg. TRF/1ª Região, as inovações introduzidas na LIA têm aplicação imediata aos processos em curso, hipótese dos autos. Essa linha intelectiva está de acordo com o posicionamento do STF que, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. (...). (ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023) (destaques acrescidos) Diante dessa orientação, cumpre enfatizar que a Lei 8.429/1992, após a reforma promovida pela Lei 14.230/2021, que acrescentou o § 1º ao art. 1º, exige a presença do elemento subjetivo dolo para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei. Já o § 2º desse art. 1º da Lei 8.429/1992, também acrescentado pela Lei 14.230/2021, define “dolo”, para fins de improbidade administrativa, como “a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente”. Já o § 4º desse art. 1º da Lei 8.429/1992, também acrescentado pela Lei 14.230/2021, dispõe que “aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”. Como resultado da incidência dos princípios do Direito Administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei 8.429/1992, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. Conforme recentemente decidiu esta Colenda Turma em caso semelhante[3] (Apelação Cível 0008882-94.2016.4.01.3307), combinando-se os §§ 1º e 2º do art. 11 da Lei 8.429/1992[4], infere-se que a novel legislação passou a exigir comprovação do dolo específico (“fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade”) para a configuração de “quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei”. Na hipótese, os demandados/apelantes alegam, em síntese, ausência de demonstração de dolo em suas condutas, bem como não comprovação de efetivo dano ao erário, pois os produtos foram entregues. Sustentam, assim, que não há configuração de atos de improbidade. O MPF alega que foi feita contratação direta da empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, havendo fraude ao processo licitatório. Afirma que houve desvio de recursos públicos decorrentes da contratação da referida empresa, para que a sócia Vanessa Schmitz Bulcão, ré absolvida, fosse favorecida, e que os servidores lotados no estoque regulador da Secretaria de Saúde, Erislene Floriano Nunes, Marco Aurélio Vieira Dias e Monalício Alves Almeida, também absolvidos, teriam inserido informação falsa em nota fiscal (de número 7364) para facilitarem o desvio de dinheiro público. Narra o MPF, em sua inicial, que em 2014, Vanda Maria Gonçalves Paiva, então Secretária Estadual de Saúde do Tocantins, José Gastão Almada Neder, Secretário Executivo da SESAU/TO, Luiz Renato Pedra Sá, Diretor de apoio à gestão hospitalar, e Maria Lenice Freire de Abreu Costa, chefe da assessoria jurídica do Estado, em unidade de desígnios, dispensaram procedimento licitatório indevidamente, contratando diretamente a empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, beneficiando Iara Suzana Schmitz Bulcão e Vanessa Schmitz Bulcão, sócias da empresa. Afirma o Parquet Federal que a cúpula da SESAU/TO e do Governo do Estado do Tocantins, no período de 2012 a 2014, institucionalizaram a prática de “reconhecimento de despesas” para a aquisição de medicamentos, materiais e produtos hospitalares sem licitação e sem formalização de contrato. Alega o órgão ministerial que o procedimento adotado visava viabilizar o pagamento fundado na prévia entrega dos referidos bens por determinadas empresas, escolhidas previamente pela própria Administração, que apresentavam propostas superfaturadas e/ou que não refletiam a quantidade e a qualidade dos bens efetivamente entregues. No caso dos autos, visando ao pagamento por materiais hospitalares (seringas e luvas descartáveis de vários tipos) adquiridos da empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, foi autuado o Processo de “reconhecimento de despesa” número 2014.3055.000948. Por fim, afirma o Parquet Federal que três empresas ofereceram propostas, o que não passou de dissimulação de cotação, pois a Neo Stock já havia supostamente entregue todos os bens, antes da cotação. Além disso, alega o MPF que a Secretária Estadual de Saúde do Tocantins alegou situação de emergência para as contratações com dispensa de licitação, referindo-se às situações anteriores, sendo evidente que a urgência jamais poderia se dar em caráter retroativo. O Juízo sentenciante, analisando os documentos juntados aos autos pelas partes, e levando em consideração todos os elementos de provas presentes, firmou posicionamento no sentido de julgar parcialmente procedente o pedido para condenar Vanda Maria Gonçalves Paiva, João Gastão Almada Neder, Maria Lenice Freire de Abreu Costa e Luiz Renato Pedra Sá por ato de improbidade previsto no art. 10, inciso VIII, da Lei 8.429/1992, absolvendo os demais réus. Ocorre que não restou comprovado o efetivo dano causado ao erário, pois a defesa logrou êxito em juntar aos autos documentos que demonstraram que os produtos adquiridos da empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda foram efetivamente entregues ao Estado do Tocantins, além de não figurarem com sobrepreço ou superfaturamento. Vejam-se trechos da sentença em que o Juízo de origem analisou o conjunto probatório presente nos autos, entendendo que não havia que se falar em atos de improbidade nas condutas dos servidores da SESAU/TO (Willer Costa Silva Mata, Erislene Floriano Nunes, Marco Aurélio Vieira Dias e Monalício Alves Almeida), bem como nas condutas dos particulares sócios da empresa Neo Stock Brasil, Iara Suzana Schmitz Bulcão, Naragleice Carneiro e Vanessa Schmitz Bulcão, diante da comprovação de efetiva contraprestação na entrega dos materiais hospitalares (ID 108493601 - Pág. 115/128): (...) 192. Houve o efetivo pagamento do valor de R$ 254.640,00 A NEOSTOCK em 17/07/2014 (fl. 98). (...) 194. A auditoria do DENASUS identificou que houve efetiva entrega, com registro de entrada dos pedidos no sistema interno de controle de estoque do Almoxarifado da SESAU/TO, dos materiais constantes nas notas fiscais de numerações 7235, 7445, 7456, 7550 e 7551. Em relação à NF de n° 7364, constatou-se que não há registro ou documentos que permitam afirmar que os produtos adquiridos e pagos dela constantes foram efetivamente entregues. Destaca ainda que a relação de produtos e o valor total são iguais aos existentes na descriminação da NF de n° 7211. 195. Como anteriormente já mencionado, no final do processo administrativo em análise, a SESAU/TO somente efetuou o pagamento da NF n° 7364 no valor de R$ 254.640,00. Destarte, nestes autos somente se discute a efetiva entrega dos insumos presentes nesta nota fiscal, cujo valor foi efetivamente pago pela SESAU/TO em 23/07/2014 por meio da OB18975. (...) 223. É incontroverso que os requeridos, de fato, assinaram a nota fiscal de n° 7364 juntada aos autos do processo administrativo de n° 2014.3055.000948 (fls. 05/06). Desta forma, a ocorrência do ato ímprobo deve ser precedida pela averiguação da efetiva entrega dos bens, pois, uma vez entregues, ocorrerá o afastamento de qualquer conduta típica por parte dos demandados. 224. O MPF alega que os medicamentos nunca foram entregues. Tal alegação se fundamenta nos relatórios do DENASUS que, ainda segundo o órgão ministerial, apontam nesse sentido. De fato, a constatação n° 392393 elaborada pela aludida auditoria descreve que "não há registros, nem documentos que comprovem a entrega à Secretaria Estadual de Saúde de 356 mil seringas descartáveis e 115 mil pares de luvas citadas na Nota Fiscal 7364, de 13 de janeiro de 2014". 225. A defesa do Núcleo dos Particulares (NEOSTOCK e suas sócias) requer a absolvição dos envolvidos sustentando que tanto o MPF quanto o DENASUS incorreram em erro nas acusações e conclusões em razão de equívocos processados no bojo do processo administrativo de n° 2014.3055.000948. 226. Alegam que, por erro da própria empresa (NEOSTOCK), houve a emissão da NF de n° 7211 constando como valor da seringa de 20ml o de R$ 0,66 (fls. 186/187 destes autos) ao invés de R$ 0,73, valor este que fez parte da proposta apresentada pela empresa (fl. 23, do processo administrativo), bem como consta do Of n° 20/2013 que autorizou a entrega dos insumos no Estoque Regulador de Palmas (fl. 186, dos presentes autos). 227. Na NF de n° 7211, juntada aos presentes autos pela defesa dos particulares à fl. 187, constam as assinaturas de MARCO AURELIO VIEIRA DIAS, MONALICIO ALVES ALMEIDA e EDINALDO ALVES DE LIMA, certificando o recebimento de todo o material em 23/12/2013. 228. Percebendo o equívoco no valor unitário das seringas de 20ml, a NEOSTOCK procedeu à emissão de nova Nota Fiscal, a de n° 7364, em 13/01/2014, intentando a retificação daquele valor para R$ 0,73. Conforme sustentação da defesa, o servidor encarregado de juntar aos autos do processo administrativo essa nova nota fiscal deveria ter certificado o ocorrido naqueles autos, entretanto, tão somente removeu a NF n° 7211, entregando-a para o responsável pela empresa NEOSTOCK e juntou a NF de n° 7364 em seu lugar. 229. Ao se realizar o comparativo entre as Notas Fiscais de n° 7211 e 7364 (fls. 186/187 destes autos e fl. 05/06 do processo administrativo) observa-se que expressam exatamente os mesmos itens nas mesmas quantidades. As únicas diferenças encontram-se no valor unitário da seringa de 20ml (NF n° 7211 - R$ 0,66; NE n° 7364— R$ 0,73) e, por consequência óbvia, no seu valor total (NF n° 7211- R$ 251.140,00; NF n° 7364 — R$ 254.640,00). 230. Foram também colecionados aos autos cópia de e-mail de comunicação entre os funcionários da matriz da NEOSTOCK e da sua filial em Palmas corroborando com a tese do erro na NF 7211 (fl. 191) e de declaração firmada por WAGNILTON CHARLES, funcionário da NEOSTOCK filial Palmas, de que dirigiu-se à SESAU/TO para proceder substituição da NF 7211 pela NF 7364 (fl. 192). 231. Na mídia juntada A fl. 73 destes autos há as planilhas de entradas e saídas do Estoque Regular da SESAU/TO. Analisando seu conteúdo, certifica-se a entrada de todos os materiais constantes da NF 7211, posteriormente substituída pela NF 7364. 232. Considero que os documentos que serviram de amparo à tese de defesa do Núcleo dos Particulares merecem serem considerados idôneos para atestarem a veracidade das alegações trazidas aos autos no que concerne a necessidade da substituição das notas fiscais em razão do erro no valor unitário da seringa de 20ml. 233. Embora contrariando as conclusões firmadas pela auditoria do DENASUS e pelo MPF, diante dos documentos acima mencionados, juntamente com a certificação de efetiva entrada dos materiais constantes da NF 7211 no Estoque Regulador, conclui-se que houve efetiva entrega dos insumos e, via de consequência, não há o que se falar em prática de conduta típica por parte dos demandados. A absolvição dos demandados ERISLENE FLORIANO NUNES, MARCO AURELIO VIEIRA DIAS e MONALÍCIO ALVES ALMEIDA é a medida a ser adotada. (...) 237. Conforme anteriormente já explicitado, a defesa do Núcleo dos Particulares aduz, como principal tese defensiva, o equívoco constante na NF de n° 7211 que levou à empresa NEOSTOCK a emitir uma segunda Nota Fiscal com o correto valor da seringa de 20ml, a NF de n° 7364, sendo esta última objeto da ordem de pagamento 2014OB18975 no importe de R$ 254.640,00, questionada nos presentes autos. 236. Essa tese de defesa já foi enfrentada quando da análise das condutas dos servidores da SESAU/TO. Restou comprovado pelas provas dos autos que houve efetiva necessidade da substituição da NF n° 7211 pela NF de n° 7364 pela NF n° 7364 em razão do erro quanto ao valor unitário da seringa de 20 ml (R$ 0,66, na NF 7211 ao invés de R$ 0,73, na NF 7364, sendo que naquela constam as assinaturas de MARCO AURELIO VIEIRA DIAS, MONALICIO ALVES ALMEIDA e EDINALDO ALVES DE LIMA, certificando o recebimento de todo o material em 23/12/2013 (fl. 187). 237. A partir da análise comparativa entre as Notas Fiscais de numerações 7211 e 7364 (fls. 186/187 destes autos e fls. 05/06 do processo administrativo) pode-se concluir que expressam exatamente os mesmos itens e nas mesmas quantidades, com a única diferença presentes tão somente no valor unitário da seringa de 20ml (NF n° 7211 - R$ 0,66; NF n° 7364 - R$ 0,73) e no valor total (NF n° 7211 - R$ 251.140,00; NF n° 7364 - R$ 254.640,00). 238. Analisando o conteúdo das planilhas de entradas e saídas do Estoque Regulador da SESAU/TO (mídia de fl. 73), certifica-se a entrada de todos os materiais constantes da NF 7211, posteriormente substituída pela NF 7364. Assim, não há o que se falar em recebimento indevido por materiais que não foram entregues. (...) 240. A alegação de prejuízo ao erário consubstanciada no descumprimento da obrigação de entregar os insumos foi muito bem enfrentada pelas provas documentais trazidas pela defesa e, conforme o que foi narrado, todos os materiais constantes da Nota Fiscal de n° 7364 que, conforme já exaustivamente explicado e devidamente justificado e comprovado, são exatamente os mesmos (em qualidade e quantidade) que constam na NF n° 7211 foram, sim, efetivamente entregues pela empresa NEO STOCK BRASIL PRODUTOS PARA SAÚDE LTDA. 241. Convém também destacar que as provas emprestadas produzidas na 4ª Vara Federal desta Seção Judiciária e juntadas aos autos (fls. 1.143/1.144 e 1.149 e 1.174) não contribuem para fundamentar as acusações narradas na inicial. As investigações no âmbito criminal não demonstraram superfaturamento, conluio entre as empresas e os agentes públicos, pagamento de vantagem indevida ou qualquer outra conduta que demonstre cabalmente ato de improbidade por parte dos particulares. (destacou-se) O Juízo de origem verificou que a empresa Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda possui idoneidade e entregava os produtos sem saber quando receberia por eles, pois o pagamento era sempre posterior, através de procedimento de “reconhecimento de dívida”, como já relatado acima, o que revela ausência de dolo da empresa em malversar as verbas públicas, como se vê nestas partes da sentença (ID 108493601 - Pág. 128): (...) 243. Ainda a partir do ponto de vista dos empresários, não é vantajoso promover o fornecimento de insumos sem data para o pagamento. A análise das evidências produzidas na Operação Pronto Socorro indica que os empresários eram compelidos a fornecer os artigos médicos, sem a indicação de uma data em que o pagamento por tais artigos seria feito. Inclusive é o que a defesa aponta nos presentes autos e nas justificativas apresentadas à auditoria do DENASUS. 244. No caso dos autos, o fornecimento dos insumos ocorreu em dezembro/2013, mas o pagamento somente ocorreu em 24/07/2014 (fl. 99 do processo administrativo n° 2014.3055.000948; mídia de fl. 73, destes autos). 245. A empresa tem elevada notoriedade em âmbito nacional e, indubitavelmente, possui grande carta de clientes formada pelos grandes estabelecimentos particulares na área da saúde e poderia ter vendido esses insumos a este público ou a outros entes políticos, recebendo à vista ou em prazos menores. 246. Além disso, o MPF não logrou êxito em comprovar efetivamente a existência de superfaturamento dos produtos; há nos autos do processo administrativo cotações de preços sinalizando que foram praticados valores compatíveis com os de mercado. A empresa demorou certo tempo para receber, sem pode lançar mão de nenhum tipo de forma de cobrança, tendo em vista o caráter de requisição administrada com as quais se revestiram todas as determinações de entrega de produtos. 247. Todas essas circunstâncias fáticas deixam claro que o procedimento adotado pela SESAU/TO não foi capaz de trazer nenhuma vantagem, quer seja licita ou ilícita, para a empresa NEO STOCK BRASIL PRODUTOS PARA SAUDE LTDA. A empresa forneceu imediatamente insumos ao ESTADO DO TOCANTINS sob preços praticados pelo mercado e demorou para receber a contrapartida financeira respectiva. 248. Por essas razões e diante da insuficiência das provas revelando o envolvimento dos empresários na prática dos atos ímprobos, é seguro entender que NEO STOCK BRASIL PRODUTOS PARA SAUDE LTDA e suas sócias IARA SUZANA SCHMITZ BULCÃO, NARAGLEICE CARNEIRO e VANESSA SCHMITZ BULCÃO não provocaram a Administração Pública com vistas a fornecer insumos médicos ao ESTADO DO TOCANTINS à revelia do processo licitatório regular. As evidências sinalizam que as empresárias não estavam em conluio com a alta cúpula da SESAU/TO manifestando concordância com todo o procedimento que ocorria às margens da lei, mas realizaram o fornecimento, seja porque entenderam não ser possível se impor à determinação administrativa, seja porque confiavam na legitimidade do procedimento e no cumprimento da avença em tempo razoável. 249. O elemento subjetivo indispensável à condenação da empresa NEO STOCK BRASIL PRODUTOS PARA SAUDE LTDA e de suas sócias IARA SUZANA SCHIMITZ BULCÃO, NARAGLEICE CARNEIRO e VANESSA SCHMITZ BULCÃO (dolo, culpa e/ou má-fé) não está demonstrado. A absolvição desses é a medida acertada que deve se impor. (destacou-se) Em relação à ausência de procedimento licitatório para a contratação da empresa por situação emergencial, o Juízo a quo firmou posicionamento pela condenação dos apelantes em razão da violação a dispositivos legais, como se nota nestes trechos da sentença (ID 108493601 - Pág. 120/121): (...) 193. Como se sabe, os atos administrativos são, por natureza, formais. As compras da administração pública devem ser documentadas em processo administrativo (Lei n. 8.666/93, art. 38). O contrato verbal com a Administração Pública é nulo e de nenhum efeito (Lei n. 8.666/93, art. 60, parágrafo único). A licitação é a regra; as compras diretas são exceções, somente nas hipóteses previstas nos arts. 24 e 25 da Lei n. 8.666/93. O regime de reconhecimento de despesa, previsto no art. 37 da Lei n. 4.320/64, não se presta para reconhecer dívida do próprio exercício. No caso, o processo de pagamento foi instaurado dentro do próprio exercício. A violação desses dispositivos legais configura, sem dúvida, improbidade administrativa. (...) 201. VANDA MARIA GONÇALVES PAIVA, LUIZ RENATO PEDRA SA e JOSÉ GASTAO ALMADA NEDER tinham o poder de adotar o procedimento administrativo previsto em lei para a situação, ou de impedir a adoção do procedimento irregular, mas escolheram não fazê-lo. Logo, incorreram no tipo descrito no artigo 10, VIII e IX, da Lei n. 8.429/92. 202. Convém enfatizar, que esta ação é apenas uma de dezenas de outras que tramitam nesta Vara Federal, evidenciando que o procedimento de Reconhecimento de Despesas, clara exceção legal, transformou-se na regra geral no âmbito da Secretaria de Saúde do Tocantins. (destacou-se) Assim, embora tenha ocorrido indevida dispensa de licitação, calcada em situação emergencial pretérita, verifica-se que o próprio Juízo sentenciante reconheceu a precariedade da situação da saúde no Estado do Tocantins, além de ter firmado posicionamento pela demonstração de efetiva entrega dos produtos adquiridos da empresa Neo Stock, o que revela ausência do dolo específico dos demandados em “obter proveito benefício indevido para si ou para outrem” (ID 108493601 - Pág. 123 e 128): (....) 209. O que se pode vislumbrar dos presentes autos é um caso de aquisição de bens sem qualquer espécie de procedimento seletivo, justificado por uma alegação completamente aberta de "situação emergencial" pela qual passava (e ainda passa) a saúde pública tocantinense. Esta é a justificativa apresentada por LUIZ RENATO PEDRA SA no termo de abertura do Processo 2014.3055.000948, por VANDA PAIVA (fls. 37/38) e novamente por ela em conjunto com JOSÉ GASTÃO ALMADA NEDER (fls. 76/77 do processo). (...) 242. É fato incontroverso que os serviços públicos de saúde do Estado enfrentavam, há época dos fatos e, infelizmente ainda enfrentam, uma situação bastante delicada, ainda desde antes dos fatos narrados na inicial. Nesse panorama, é razoável entender, a partir do ponto de vista dos empresários, que o Estado possuía poderes para determinar o fornecimento dos insumos com pagamento diferido. Trata-se, no caso, da aplicação do princípio da confiança que, segundo o Superior Tribunal de Justiça, vincula também a Administração Pública, ainda que se trate de atos ilícitos: (destacou-se) Assim, não restou comprovado nos autos o conluio entre os demandados para a contratação direta da empresa Neo Stock Brasil, muito menos o dolo específico em se beneficiar com isso. Verifica-se que na Ação Penal correlata a esta demanda (AP 0004315-48.2016.4.01.4300), foi proferida sentença condenando Luiz Renato Pedra Sá, José Gastão Almada Neder e Vanda Maria Gonçalves Paiva pela prática do crime previsto no art. 89, cumulado com o art. 84, §2º, ambos da Lei 8.666/93, absolvendo os demais réus (ID 113955610, Pág. 80, da Ação Penal). No entanto, os réus condenados interpuseram recurso de apelação, os quais foram providos para absolver os apelantes, sob o seguinte fundamento (ID 429758676, Pág. 15, da Ação Penal ): (...) Em suma, no decreto condenatório o juízo não delimitou o dolo específico dos acusados em causar dano à administração, pelo contrário, o juízo, nas disposições finais da sentença, afirmou expressamente que não houve prejuízo ao erário, afirmando que não houve comprovação de danos ao patrimônio público. Id 113955610 (fls. 1108-1152) Além do mais, na dosimetria da pena de todos os condenados, o juízo afirmou que “[a]s consequências do delito, interpretadas como o mal causado pelo crime, transcendentes ao resultado típico, não devem ser valoradas negativamente, porquanto, os bens indevidamente contratados foram entregues e não constam dos autos informações que apontem para a presença de sobrepreço” Id 113955610 (fl. 1147) (...) No caso, o juízo não trouxe na sentença elementos que comprovem o dolo dos acusados, tampouco que houve dano ao erário, pelo contrário, há elementos idôneos a atestar que os valores praticados nas licitações eram compatíveis com os serviços efetivamente contratados. A simples não realização do processo licitatório não é suficiente para atrair a incidência do tipo previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, competindo à acusação trazer provas de que a não realização da licitação resultou em dano ao erário. As provas contidas nos autos, vistas de forma conjunta, são suficientes para chegar à conclusão de que não houve dolo nas condutas dos recorrentes. Por sua vez, o MPF deixou de apresentar a esta Corte elementos probatórios idôneos, inequívocos e convincentes a fim de que se possa concluir, de forma razoável, pela demonstração da ocorrência de prejuízo ao erário. Em suma, inexiste prova, nas condutas dos acusados, “além do necessário dolo simples (vontade consciente e livre de contratar independentemente da realização de prévio procedimento licitatório), [da] intenção de produzir um prejuízo aos cofres públicos por meio do afastamento indevido da licitação.” (STF, AP 527, supra.) Consequentemente, não ficou comprovado que a dispensa de licitação ou que a não observância do procedimento de dispensa, foram praticadas com objetivo de causar dano à Administração Pública. Nesse contexto, “[o] dolo na conduta do réu, não restou evidenciado, não sendo admissível a sua presunção.” (TRF 1ª Região, ACR 0004514-94.2006.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal MÁRIO CÉSAR RIBEIRO, Quarta Turma, e-DJF1 p. 50 de 22/03/2012.) Assim sendo, é inevitável a conclusão no sentido de que a sentença merece ser reformada, a fim de que os acusados sejam absolvidos, por não constituir crime os fatos imputados aos acusados. Assim, conquanto o Juízo de origem tenha firmado posicionamento pela constatação de dispensa indevida de licitação pelos gestores estaduais, o conjunto fático-probatório dos autos é de que não houve demonstração do elemento subjetivo doloso específico nas condutas dos demandados, tendo em vista que a contratação direta da empresa demandada/apelada, Neo Stock Brasil, deu-se para a aquisição de materiais hospitalares que foram efetivamente entregues. Não havendo a presença do dolo específico na conduta dos demandados, não há que se falar em ato de improbidade. Para a configuração do ato de improbidade não basta apenas a presença de uma das hipóteses elencadas nos arts. 9º, 10 e 11, da Lei 8.429/1992, sendo imperiosa a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo, de sorte que a improbidade administrativa não se caracteriza por meio de responsabilização objetiva dos agentes públicos, e a conduta culposa, depois das alterações trazidas pela Lei 14.230/2021, não é mais hábil a configurar ato de improbidade, sob pena de inadequação típica. Quanto aos atos de improbidade especificamente previstos no art. 10 da LIA, não se admite mais imputação de improbidade sem elementos concretos que demonstrem qual o dano ocasionado ao erário, não podendo ser presumida a malversação dolosa de recursos públicos. Assim, descartado o elemento subjetivo na conduta dos demandados, uma vez que não demonstrado que a dispensa de licitação se deu com o fim de beneficiar os réus. O conjunto fático-probatório dos autos também não permite afirmar que os apelantes e demais demandados tenham agido com dolo de obter proveito ou benefício indevido para si ou para terceiro, conforme prevê o § 1º c/c § 2º do art. 11 da LIA, não bastando a voluntariedade do agente para a configuração do ato ímprobo, com o fim de imputar a eles as condutas previstas na Lei 8.429/1992, após as alterações trazidas pela Lei 14.230/2021. Além disso, como se viu, os materiais hospitalares foram efetivamente entregues, de modo que não há que se falar em prejuízo ao erário. Nem há nos autos provas de que os demandados tenham agido em conluio com a empresa contratada para desviar verbas federais. A improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. Logo, a dispensa indevida de licitação demonstra irregularidade na aplicação de recurso público federal, mas não revela, por si só, dolo dos demandados em causar dano efetivo e comprovado aos cofres públicos, nem de se beneficiar indevidamente. Anoto, ademais, que, embora a conduta dos apelantes e demais demandados pudesse ser enquadrada no art. 11, inciso V, da Lei 8.429/1992, com a nova redação dada pela Lei 14.230/2021 (“frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros”), ainda assim não haveria configuração de ato de improbidade, já que ausente o dolo específico na conduta deles, razão pela qual não se revela possível a aplicação do princípio da continuidade normativo-típica ao caso em testilha. Assim, não sendo o caso de condenação dos apelantes e demais demandados pela prática de atos de improbidade administrativa descritos na Lei 8.429/1992, a sentença de parcial procedência deve ser reformada para julgar improcedentes os pedidos de condenação por atos de improbidade. Ante o exposto, 1) Não conheço da Remessa Necessária; 2) Conheço parcialmente das apelações dos réus José Gastão Almada Neder e Vanda Maria Gonçalves Paiva e, nessa extensão, dou-lhes provimento para julgar improcedentes os pedidos e, por via de consequência, absolvê-los das imputações; 3) Conheço da apelação de Maria Lenice Freire de Abreu Costa e dou provimento para julgar improcedentes os pedidos e, por via de consequência, absolvê-la; e 4) Conheço da apelação do Ministério Público Federal e nego-lhe provimento, mantendo-se, por via de consequência, a improcedência dos pedidos quanto aos demandados Erislene Floriano Nunes, Marco Aurélio Vieira Dias, Monalício Alves Almeida, Neo Stock Brasil Produtos para Saúde Ltda, Vanessa Schmitz Bulcão e Willer Costa Silva Malta. Descabe a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, posto que não verificada má-fé da parte autora (inteligência do §2º do artigo 23-B da Lei 8.429/1992, com a redação incluída pela Lei 14.230/2021)[5]. Providências: Com amparo no art. 29, XII, RI-TRF1, determino a correção da autuação para: 1) Cadastrar como APELANTES José Gastão Almada Neder, Maria Lenice Freire de Abreu Costa e Vanda Maria Gonçalves Paiva, tendo em vista a interposição de recursos de apelações por eles. 2) Tendo em vista a concessão da gratuidade da justiça no 1º grau, anote-se a justiça gratuita para os réus José Gastão Almada Neder, Maria Lenice Freire de Abreu Costa e Vanda Maria Gonçalves Paiva, ora apelantes, como determina o art. 164, VI, do Regimento Interno deste Tribunal. 3) Descadastrar o advogado de Willer Costa Silva, Dr. RODOLFO ALVES DOS SANTOS, diante da renúncia ao mandato feita no ID 108494559 c/c ID 108494560. Consigna-se que o apelado não constituiu novo procurador (ID 277689643). 4) Constar a classe judicial "APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)", ao invés de "APELAÇÃO CÍVEL (198)". É o voto. Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora [1]https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur475131/false [2]https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6475588 [3]No qual o FNDE imputava ao réu a prática de condutas tipificadas nos arts. 10, IX e XI, e 11, I, II e VI, da Lei nº 8.429/92. [4]Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) § 1º Nos termos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, somente haverá improbidade administrativa, na aplicação deste artigo, quando for comprovado na conduta funcional do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo a quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) [5]Art. 23-B. (...) (...) § 2º Haverá condenação em honorários sucumbenciais em caso de improcedência da ação de improbidade se comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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Tribunal: TRF1 | Data: 23/07/2025Tipo: IntimaçãoPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 0001933-82.2016.4.01.4300 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001933-82.2016.4.01.4300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: MPF e outros APELADOS: JOAO APARECIDO DA CRUZ e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: EDINA GOMES AMORIM - GO13780-A, DIOGO VINICIUS FERREIRA DE ARAUJO LIMA - TO4892-A, FERNANDA CRISTINA NOGUEIRA DE LIMA - AL9961-A, MARCEL CHAVES ALVIM - TO8381-A, JOAO SANZIO ALVES GUIMARAES - TO1487-A, JANDER SILVA TELES DE OLIVEIRA - TO4769-A, PAMELLA CRISTINA BARBOSA DUTRA BARROS - TO6840-A, EDMILSON DOMINGOS DE SOUSA JUNIOR - TO2304-A, MARIA LENICE FREIRE DE ABREU COSTA - TO2307-A, GUSTAVO BOTTOS DE PAULA - TO4121-A, RODOLFO ALVES DOS SANTOS - TO5706-A e JUVENAL KLAYBER COELHO - TO182-S E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO CONFIGURADOS. APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA MAIS BENÉFICA (TEMA 1.199/STF). REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECURSOS DOS RÉUS PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelos réus condenados em face de sentença que, em Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido. A sentença condenou quatro réus pela prática de ato de improbidade previsto no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, e absolveu os demais demandados. 2. A imputação consiste na dispensa indevida de licitação para aquisição de materiais hospitalares, mediante procedimento de "reconhecimento de despesa", com suposto direcionamento à empresa contratada, em violação aos arts. 10, I, VIII, XII, e 11, caput, da Lei 8.429/1992 (redação original). 3. O MPF recorre pugnando pela condenação dos réus absolvidos em primeira instância. Os réus condenados apelam, suscitando preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa e, no mérito, alegando a ausência de dolo e de dano ao erário, dada a efetiva entrega dos produtos adquiridos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há três questões em discussão: (i) o cabimento da remessa necessária em sentenças de parcial procedência proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021; (ii) a aplicação retroativa das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, notadamente a exigência de dolo específico para a configuração de todos os atos de improbidade (Tema 1.199/STF); e (iii) a existência de prova do dolo específico dos agentes e de dano efetivo ao erário na dispensa de licitação para a aquisição de insumos hospitalares efetivamente entregues. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A remessa necessária em ações de improbidade, para sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, observa a tese recentemente firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1284. Segundo o precedente vinculante, para as sentenças proferidas antes da vigência da Lei 14.230/2021, aplica-se o regime jurídico anterior, que previa o reexame por analogia ao art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 6. A referida aplicação analógica restringe-se, contudo, às hipóteses de sentença de improcedência total do pedido ou de carência de ação. No caso concreto, a sentença foi de parcial procedência, motivo pelo qual não se enquadra na hipótese legal que autoriza o reexame obrigatório, não devendo a remessa ser conhecida. 7. As preliminares de incompetência da Justiça Federal e de cerceamento de defesa são rejeitadas. A competência federal decorre da origem das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e já foi objeto de decisão anterior desta Corte em sede de recurso de agravo de instrumento. O indeferimento de provas se ampara no princípio do livre convencimento motivado do magistrado (art. 370, CPC), que as considerou desnecessárias à resolução da lide. 8. No mérito, aplica-se ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal fixado no Tema 1.199 de Repercussão Geral (ARE 843.989). A Corte estabeleceu a retroatividade das normas de direito material mais benéficas da Lei 14.230/2021 aos processos de improbidade em curso, sem condenação transitada em julgado. 9. A principal alteração retroativa consiste na revogação da modalidade culposa e na exigência de dolo para todos os atos de improbidade. A Lei 8.429/1992, em seu art. 1º, § 2º, passou a definir o dolo como "a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", exigindo-se, ainda, "o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (conforme § 1º do art. 11). 10. A dispensa indevida de licitação, embora constitua uma irregularidade formal, não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. Para a tipificação da conduta, é indispensável a comprovação do elemento subjetivo qualificado, ou seja, o dolo específico de lesar o erário ou de obter vantagem ilícita. 11. O conjunto fático-probatório demonstra a ausência do dolo específico. Os documentos dos autos, corroborados pela absolvição dos réus em sede de apelação na ação penal correlata pelos mesmos fatos, atestam que os materiais hospitalares foram efetivamente entregues à administração pública. 12. Ademais, não há provas de superfaturamento nos preços dos produtos adquiridos, o que afasta a ocorrência de dano patrimonial efetivo ao erário. A absolvição na esfera criminal, fundamentada na ausência de dolo de causar dano, reforça a conclusão de que não houve intenção deliberada de causar prejuízo aos cofres públicos. 13. A conduta dos agentes, portanto, carece do elemento subjetivo essencial exigido pela nova tipologia dos atos de improbidade administrativa. Uma vez que a mera ilegalidade ou a inabilidade do gestor não se confundem com o ato ímprobo, que pressupõe desonestidade e má-fé. A absolvição dos réus é a medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO E TESE 14. Remessa necessária não conhecida. Apelações dos réus providas para julgar improcedentes os pedidos e absolvê-los das imputações. Apelação do Ministério Público Federal não provida. Sem condenação em honorários advocatícios, por ausência de má-fé da parte autora. Tese de julgamento: "1. A remessa necessária em ação de improbidade administrativa, em sentenças proferidas antes da Lei 14.230/2021, rege-se pela aplicação analógica do art. 19 da Lei 4.717/1965, consoante Tema Repetitivo 1284/STJ, não sendo cabível nos casos de parcial procedência do pedido. 2. As alterações da Lei 14.230/2021, que exigem a comprovação de dolo específico para a tipificação de todos os atos de improbidade administrativa, aplicam-se retroativamente às ações em curso sem trânsito em julgado, por força do decidido pelo STF no Tema 1.199/RG. 3. A dispensa indevida de licitação, por si só, não configura ato de improbidade administrativa se não demonstrado o dolo específico do agente em causar prejuízo ao erário ou obter vantagem ilícita, bem como o efetivo dano patrimonial." Legislação relevante citada: Constituição Federal, art. 37, § 4º; Lei 14.230/2021; Lei 8.429/1992, arts. 1º, §§ 1º, 2º e 4º, 9º, 10, VIII, 11, §§ 1º e 2º, 17, § 19, IV, 17-C, § 3º, e 23-B; Lei 4.717/1965, art. 19; Lei 4.320/64, art. 37; Código de Processo Civil, arts. 4º, 282, § 2º, 370, 487, I, 927, III, e 1.013. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989/RG (Tema 1.199); STF, RE 656.558/SP (Tema 309); STF, ADI 7042; STF, ADI 7043; STF, ADI 7236; STJ, REsp 2.117.355/MG (Tema 1284); STJ, EREsp 1.220.667/MG; STF, ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da remessa necessária, DAR PROVIMENTO às apelações dos réus e NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora
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