Processo nº 00012035220168045400

Número do Processo: 0001203-52.2016.8.04.5400

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJAM
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Grau: 1º Grau
Órgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal
Última atualização encontrada em 30 de abril de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 30/04/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
    SENTENÇA Trata-se de ação penal que busca a responsabilização de EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal, por fatos que se deram aos quando a vítima N. P. C. de S. (nascida em 15/11/2006) estaria com 6 (seis) anos de idade. A denúncia foi oferecida ao mov. 16 e recebida ao mov. 21.1, aos 14/06/2019. Réu citado ao mov. 35.1. Resposta à acusação ao mov. 41, devidamente analisada ao mov. 44.1. AIJ realizada ao mov. 89.1, oportunidade em que foram ouvidas as testemunhas. No ato, foi desistido da condução coercitiva da vítima a qual, se realizada, poderia submeter a vítima de crime sexual à revitimização no curso do processos penal. Por fim, foi decretada a revelia do réu EDIMILSON GILDO DA SILVA. Em suas alegações finais orais, o MPE pugna pela condenação na forma do art. 217-A c/c art. 226, I, todos do CPB, bem como pela consideração de que sejam consideradas duas condutas de estupro de vulnerável. Pugna também pela fixação de valor mínimo pelos danos causados, citando o tem nº 1186, do STJ, devendo estes ser fixados ante a condição de dano in re ipsa. Já a defesa requer a absolvição por ausência de elementos ante o fato de os referidos depoimentos serem somente “de ouvir dizer”, não havendo elemento de prova, mas tão somente de elementos de informação. Ressalta o ponto de que as testemunhas não se recordam do momento exato em que ocorreram os fatos e a impossibilidade de verificar se à época o réu de fato morava com a vítima ou se tinha um relacionamento com a vítima. Aponta que as testemunhas poderiam ter interesse específico no caso por serem ascendentes da vítima. Relatório psicossocial ao mov. 1.16. Certidão de nascimento da vítima ao mov. 1.4. Depoimento da vítima ao mov. 1.3. São os relatos. Fundamento e decido. De pronto, constato a regularidade da ação instaurada posto que, à época, na forma do art. 225, p.ú., do CP, o processamento do crime se dava por ação penal pública incondicionada, por ser a vítima menor de 18 (dezoito) anos. Adiante, alega, a defesa, que em sede de AIJ a vítima se negou a relembrar os fatos e, assim, identificar o autor e em que momento teriam ocorrido os fatos narrados.  Contudo, tem-se que o depoimento trazido pela avó da vítima e pela mãe da vítima permitem concluir que os indícios formados em sede inquisitorial (inclusive fundados na palavra da vítima) se confirmaram em instrução criminal. Para isso, destaco os depoimentos orais. Inicialmente, a testemunha EDILZA PESSOA CASTILHO, avó da vítima, às perguntas do MPE afirma que se lembra que a vítima chegou da escola muito desconfiada e mudada, momento em que perguntou o que estaria havendo com a vítima. Após, afirma que a vítima chorou e a testemunha a pressionou para que falasse a verdade, tendo a vítima dito que quando a mãe da vítima estava no igarapé lavando roupa, e quando o réu estava bêbado, trancava a vítima e uma adolescente no quarto e tocava em seus seios e partes íntimas, ameaçando a vítima. Quanto ao comportamento do réu, afirma que não convivia com o réu, dizendo que sua filha convivia com ele, mas não aguentou porque o réu bebia muito, se separando por conta disso e por conta de sua neta. Afirma que o réu teria outras filhas também e repete que o réu vivia alcoolizado. Acrescenta que o réu usava palavras de cunho sexual (usava palavra de “dar isso” e “dar aquilo”), de forma que a testemunha não gostava e repreendia o réu, sobretudo por haver crianças em casa. Aponta que não gostava de palavrões na sua casa. Afirma que depois dos fatos ficou responsável pela vítima, sendo a responsável pelo registro da ocorrência. Indica que no dia anterior à audiência ligou para a vítima e esta disse que queria deixar para trás o que havia ocorrido, visto que já seria uma mulher com 18 anos. Afirma que após os fatos a vítima ficou normal, mas que queria esquecer e que já era uma mulher, e não quer mais saber do que houve. Acrescenta que a vítima disse que quando se lembra disso, tem vontade de chorar. Acrescenta que a mãe da vítima tem muitas coisas a dizer. Às perguntas da DPE informa que não se lembra do ano em que ocorreu. Após, a informante POLIANA CASTILHO DE SOUZA, mãe da vítima, ex-companheira do réu, às perguntas do MPE, afirma que a vítima nunca lhe falava nada, sempre foi fechada, porque tinha medo que a mãe lhe batesse. Informa que a vítima sempre pedia para ir morar com sua avó e que não quer mais morar com a mãe. Mas, ao ser questionada, a vítima não dizia o motivo, mas afirma que a vítima chorava e ficava muito fechada. Até que decidiu que deixaria a vítima morar com sua avó e a colocou para morar com a avó. Assim que a vítima chegou na casa da avó, a vítima se abriu com a avó e contou o que houve. Após o registro da ocorrência, afirma que continuou a morar com o réu porque nunca acreditou no que a vítima teria falado. Afirma que logo em seguida engravidou e ficou de resguardo, e foi morar com a sua mãe por conta do resguardo. Afirma que tem também uma outra filha que [na data da audiência] tem 11 anos. Acrescenta que em um dia quando estava de resguardo, estava dormindo em uma rede com o bebezinho em cima dela, e com uma cama embaixo da rede, e pediu que sua filha lhe catasse [no sentido de coçar sua cabeça]. Em um dado momento afirma que sentiu que sua filha parou de lhe catar [no sentido de coçar sua cabeça], virou e viu o réu deitado na cama, com sua filha de pernas abertas e o réu lambendo as partes de sua filha. E foi naquele momento em que acreditou e que a ficha caiu. E entendeu que foi aquilo que o réu tinha feito com sua filha [que não era filha do réu]. Acrescenta que essa filha desta ocasião era filha de sangue do réu. Indica que após os fatos a vítima não teve nenhum problema em específico, mas que a vítima não quer se lembrar dos fatos. Afirma que hoje não tem mais contato com o réu. Informa que a vítima nunca falou com ela sobre os fatos. Às perguntas da DPE informa que não se lembra da época em que ocorreu. Acrescenta que a situação da rede com a filha catando sua cabeça não ocorreu com a vítima dos autos, mas com sua outra filha, que é também filha do réu. Repete que não era com a vítima dos autos. Nesta senda, em que pese a alegação da defesa de que não seria possível identificar os fatos por ausência de informação precisa sobre a data, isto também não merece guarida. Isto porque em que pese a ausência da informação precisa sobre data, ano, mês, o que se individualiza é o cenário em que a conduta foi praticada (enquanto a vítima ainda morava com a mãe e antes da mãe engravidar outras vez). E, em sendo uma conduta praticada, não se faz necessária a informação específica da data em que teria ocorrido, posto que existem outras informações nos autos que permitem individualizar no tempo e no espaço o momento em que teriam ocorridos os fatos. Em adição, as palavras trazidas pelas testemunhas confirmam o Relatório Psicossocial ao mov. 1.16, momento em que a vítima teria sido ouvida. Não obstante, é compreensível, e corrobora a imputação, o fato de que a vítima tenha se negado a depor em audiência. E isto porque em crimes sexuais praticados contra vítima menor de 14 anos, a conduta criminosa recorrentemente deixa marcas e traumas que se refletem em conduta da vítima de negar-se a reviver o sofrimento que suportou em decorrência da violência. Ressalte-se, inclusive, que a desistência de sua oitiva se dá com fundamento na Lei nº 14.241/2021. Por fim, a mudança de comportamento notada pelas testemunhas, no sentido de que a vítima teria ficado calada e "mudada", também vai ao encontro das demais provas que se tem para imputar-se a autoria ao réu. Portanto, o fato de as testemunhas repetirem palavras ditas pela vítima não deve ser lido unica e exclusivamente como testemunha de ouvir dizer, dado que suas alegações encontram ressonância em outras provas produzidas nos autos. Ademais, crimes sexuais, sobretudo contra crianças e adolescentes, ocorrem de forma clandestina, de forma que estes supostos "testemunhos de ouvir dizer" constituem parte necessária da reconstrução dos fatos, isto porque geralmente são as pessoas a quem as crianças podem recorrer em tentativa de obter ajuda, e, geralmente, são as primeiras pessoas que têm acesso à versão da vítima, o que reveste seu depoimento de maior importância. Com isto, em se tratando de violência sexual, a prova subsumida nas palavras da vítima revela-se como a tônica (neste caso presente no Depoimento da vítima e no Relatório Psicossocial, corroborados pelas testemunhas na instrução criminal), já que tais infrações são, na sua quase totalidade, praticadas no interior da residência dos envolvidos ou em local ou circunstâncias que impossibilitem que outras pessoas possam presenciá-la, de tal sorte que a palavra da vítima passa a ganhar maior destaque e relevância, principalmente se a versão apresentada possui arrimo nas demais provas produzidas. A propósito, nesse pormenor, admitindo as palavras da vítima, desde que em harmonia com o contexto probatório contido nos autos e verificada a inviabilidade de se admitir a versão apresentada pela defesa, como prova assaz para a prolação de decreto condenatório, colaciona-se, a título de ilustração, as seguintes decisões extraídas do repertório de jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, a seguir, transcritas: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PALAVRA DA VÍTIMA. RELEVANTE IMPORTÂNCIA. ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. O Tribunal local, ao analisar os elementos constantes nos autos, entendeu pela ratificação da decisão de primeira instância que condenou o ora agravante pelo crime de estupro de vulnerável em continuidade delitiva. 2. A pretensão de desconstituir o julgado por suposta contrariedade à lei federal, pugnando pela absolvição ou a readequação típica da conduta, não encontra campo na via eleita, dada a necessidade de revolvimento do material probante, o que é vedado a esta Corte Superior de Justiça, a teor do disposto na Súmula n. 7/STJ. 3. Este Sodalício há muito firmou jurisprudência no sentido de que, nos crimes contra a dignidade sexual, geralmente ocorridos na clandestinidade, a palavra da vítima adquire especial importância, desde que verossímil e coerente com os demais elementos de prova. 4. Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg no REsp 1695526 / SP. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, 17.05.2018, DJe 04.06.2018). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.  ESTUPRO DE VULNERÁVEL.    PLEITO    DE    ABSOLVIÇÃO.    REEXAME   DE   PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. 1. Para a análise da tese recursal, de que o agravante não teria cometido o delito de estupro de vulnerável, mostra-se, no caso, imprescindível o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que é defeso em âmbito de recurso especial, em virtude do disposto na Súmula n. 7 desta Corte. Precedentes. 2.  Outrossim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é a de que, nos crimes de natureza sexual, os quais nem sempre deixam vestígios, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no AREsp 1268926 / PR; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL .2018/0068075-6. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, 24.04.2018. DJe 02.05.2018). No caso, são vastos os elementos de prova que apontam para a autoria do denunciado. É de se destacar que na vasta maioria dos crimes de estupro, normalmente cometidos sem a presença de outros indivíduos, à clandestinidade, há dificuldade na produção probatória, de modo que o acervo constante dos autos deve ser analisado com especial atenção. Portanto, não havendo prova de causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, estando provada a imputação ministerial, verificando-se a inexistência de quaisquer obstáculos relacionados à punibilidade do agente, o reconhecimento da procedência do pedido de condenação contido na peça de ingresso é medida de rigor. Por fim, deixo de considerar a tese do Ministério Público suscitada em sede de alegações finais orais no que diz respeito à segunda conduta de estupro de vulnerável, dado que ausente na denúncia e não amplamente fundamentada no que trouxeram as testemunhas, o que inclusive comprometeria a correlação necessária entre a vestibular e o decreto condenatório. Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para CONDENAR EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal. Com efeito, passo à dosimetria. A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma negativa. Isto porque o crime de estupro de vulnerável é crime que, mesmo diante do consentimento da vítima, ainda assim se configura. Ocorre que em contextos em que há a resistência da vítima, a conduta se reveste de especial reprovabilidade, dado que o réu inflinge ardil extra à natureza do crime: ou seja, além de se configurar já com o consentimento, o fato de não haver consentimento torna ainda mais reprovável a conduta. Antecedentes valorados na forma da súmula 444, do STJ. Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. A personalidade deve ser valorada de forma neutra. A personalidade é circunstância que deve ser apreciada à luz dos princípios relacionados à psicologia e à psiquiatria, uma vez que nela se deve analisar muito mais o conteúdo do ser humano do que a embalagem que lhe foi impressa pela sociedade. Destarte, ante a inexistência de elementos mínimos de convicção, entendo não demonstrar ele personalidade que possa ser valorada em seu desfavor. Os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. As circunstâncias serão valoradas de forma neutra, na forma que o ardil utilizado já se encontra no âmbito do próprio desvalor da conduta punida. As consequências do crime foram significativas, conforme se verificou e se valutou nos autos, sobretudo dado que a conduta do acusado resultou na desgregação da unidade familiar, fazendo com que a vítima se sentisse constrangida a ponto de não mais querer morar com a mãe e ter decidido se mudar para a casa da avó. A vítima não contribuiu para o resultado, de forma que não pode ser utilizada para aumentar a pena imposta ao réu. STJ. 6ª Turma. HC 217819-BA, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/11/2013 (Info 532). Para a fixação da pena-base, eleva-se a pena em 1/8 (um oitavo) em cima do mínimo legal, razão pela qual, diante de 2 (duas) circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 10:00:00 (dez anos) de reclusão. Não há circunstância atenuante. Quanto à agravante, deixo para analisá-la na terceira fase da dosimetria (a forma do art. 226, do CP), visto que a norma específica (neste caso a de majorante de crimes sexuais) derroga a norma genérica. Na última fase, não há causas de diminuição. Quanto ao aumento, este será de 1/2 (metade) na forma do art. 226, II, do Código Penal por ser o réu padrasto da vítima, fato este incontroverso desde a denúncia e confirmado em sede de instrução criminal, dado que a época a mãe da vítima tinha relacionamento com o réu e coabitavam todos na mesma residência. Sendo assim, fixo a pena em 15:00:00 (quinze anos) de reclusão, fixando o regime inicial de cumprimento de pena no FECHADO, tendo em vista o quantum da pena aplicada, consoante o disposto no artigo 33, §2º, alínea "a", do Código Penal. O réu poderá apelar em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. Não cabe ao acusado a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, na forma preconizada nos artigos 43 e 44, ambos do Código Penal, tendo em vista o crime em comento ter sido cometido mediante violência ou grave ameaça. O acusado não faz jus ao benefício da suspensão condicional da pena, em razão de não preencher os pressupostos dispostos no art. 77 do Código Penal. Por ser assistido pela DPE presumo a vulnerabilidade econômica e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não auferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Intime-se o Ministério Público e a Defesa da sentença. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado expeça-se mandado de prisão no regime FECHADO, para início de cumprimento de pena, expedindo-se após o cumprimento da ordem a devida guia de recolhimento. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. NESTE ATO, QUANTO AOS NOVOS FATOS TRAZIDOS PELA GENITORA, VERIFICO QUE ESTES JÁ ESTÃO SENDO APURADOS NO PROCESSO DE Nº 0000531-05.2020.8.04.5400, RAZÃO PELA QUAL DEIXO DE DETERMINAR NOVAS DILIGÊNCIAS. P.R.I.C. Manacapuru, 17 de Abril de 2025. Bárbara Marinho Nogueira Juíza de Direito
  3. 30/04/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
    SENTENÇA Trata-se de ação penal que busca a responsabilização de EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal, por fatos que se deram aos quando a vítima N. P. C. de S. (nascida em 15/11/2006) estaria com 6 (seis) anos de idade. A denúncia foi oferecida ao mov. 16 e recebida ao mov. 21.1, aos 14/06/2019. Réu citado ao mov. 35.1. Resposta à acusação ao mov. 41, devidamente analisada ao mov. 44.1. AIJ realizada ao mov. 89.1, oportunidade em que foram ouvidas as testemunhas. No ato, foi desistido da condução coercitiva da vítima a qual, se realizada, poderia submeter a vítima de crime sexual à revitimização no curso do processos penal. Por fim, foi decretada a revelia do réu EDIMILSON GILDO DA SILVA. Em suas alegações finais orais, o MPE pugna pela condenação na forma do art. 217-A c/c art. 226, I, todos do CPB, bem como pela consideração de que sejam consideradas duas condutas de estupro de vulnerável. Pugna também pela fixação de valor mínimo pelos danos causados, citando o tem nº 1186, do STJ, devendo estes ser fixados ante a condição de dano in re ipsa. Já a defesa requer a absolvição por ausência de elementos ante o fato de os referidos depoimentos serem somente “de ouvir dizer”, não havendo elemento de prova, mas tão somente de elementos de informação. Ressalta o ponto de que as testemunhas não se recordam do momento exato em que ocorreram os fatos e a impossibilidade de verificar se à época o réu de fato morava com a vítima ou se tinha um relacionamento com a vítima. Aponta que as testemunhas poderiam ter interesse específico no caso por serem ascendentes da vítima. Relatório psicossocial ao mov. 1.16. Certidão de nascimento da vítima ao mov. 1.4. Depoimento da vítima ao mov. 1.3. São os relatos. Fundamento e decido. De pronto, constato a regularidade da ação instaurada posto que, à época, na forma do art. 225, p.ú., do CP, o processamento do crime se dava por ação penal pública incondicionada, por ser a vítima menor de 18 (dezoito) anos. Adiante, alega, a defesa, que em sede de AIJ a vítima se negou a relembrar os fatos e, assim, identificar o autor e em que momento teriam ocorrido os fatos narrados.  Contudo, tem-se que o depoimento trazido pela avó da vítima e pela mãe da vítima permitem concluir que os indícios formados em sede inquisitorial (inclusive fundados na palavra da vítima) se confirmaram em instrução criminal. Para isso, destaco os depoimentos orais. Inicialmente, a testemunha EDILZA PESSOA CASTILHO, avó da vítima, às perguntas do MPE afirma que se lembra que a vítima chegou da escola muito desconfiada e mudada, momento em que perguntou o que estaria havendo com a vítima. Após, afirma que a vítima chorou e a testemunha a pressionou para que falasse a verdade, tendo a vítima dito que quando a mãe da vítima estava no igarapé lavando roupa, e quando o réu estava bêbado, trancava a vítima e uma adolescente no quarto e tocava em seus seios e partes íntimas, ameaçando a vítima. Quanto ao comportamento do réu, afirma que não convivia com o réu, dizendo que sua filha convivia com ele, mas não aguentou porque o réu bebia muito, se separando por conta disso e por conta de sua neta. Afirma que o réu teria outras filhas também e repete que o réu vivia alcoolizado. Acrescenta que o réu usava palavras de cunho sexual (usava palavra de “dar isso” e “dar aquilo”), de forma que a testemunha não gostava e repreendia o réu, sobretudo por haver crianças em casa. Aponta que não gostava de palavrões na sua casa. Afirma que depois dos fatos ficou responsável pela vítima, sendo a responsável pelo registro da ocorrência. Indica que no dia anterior à audiência ligou para a vítima e esta disse que queria deixar para trás o que havia ocorrido, visto que já seria uma mulher com 18 anos. Afirma que após os fatos a vítima ficou normal, mas que queria esquecer e que já era uma mulher, e não quer mais saber do que houve. Acrescenta que a vítima disse que quando se lembra disso, tem vontade de chorar. Acrescenta que a mãe da vítima tem muitas coisas a dizer. Às perguntas da DPE informa que não se lembra do ano em que ocorreu. Após, a informante POLIANA CASTILHO DE SOUZA, mãe da vítima, ex-companheira do réu, às perguntas do MPE, afirma que a vítima nunca lhe falava nada, sempre foi fechada, porque tinha medo que a mãe lhe batesse. Informa que a vítima sempre pedia para ir morar com sua avó e que não quer mais morar com a mãe. Mas, ao ser questionada, a vítima não dizia o motivo, mas afirma que a vítima chorava e ficava muito fechada. Até que decidiu que deixaria a vítima morar com sua avó e a colocou para morar com a avó. Assim que a vítima chegou na casa da avó, a vítima se abriu com a avó e contou o que houve. Após o registro da ocorrência, afirma que continuou a morar com o réu porque nunca acreditou no que a vítima teria falado. Afirma que logo em seguida engravidou e ficou de resguardo, e foi morar com a sua mãe por conta do resguardo. Afirma que tem também uma outra filha que [na data da audiência] tem 11 anos. Acrescenta que em um dia quando estava de resguardo, estava dormindo em uma rede com o bebezinho em cima dela, e com uma cama embaixo da rede, e pediu que sua filha lhe catasse [no sentido de coçar sua cabeça]. Em um dado momento afirma que sentiu que sua filha parou de lhe catar [no sentido de coçar sua cabeça], virou e viu o réu deitado na cama, com sua filha de pernas abertas e o réu lambendo as partes de sua filha. E foi naquele momento em que acreditou e que a ficha caiu. E entendeu que foi aquilo que o réu tinha feito com sua filha [que não era filha do réu]. Acrescenta que essa filha desta ocasião era filha de sangue do réu. Indica que após os fatos a vítima não teve nenhum problema em específico, mas que a vítima não quer se lembrar dos fatos. Afirma que hoje não tem mais contato com o réu. Informa que a vítima nunca falou com ela sobre os fatos. Às perguntas da DPE informa que não se lembra da época em que ocorreu. Acrescenta que a situação da rede com a filha catando sua cabeça não ocorreu com a vítima dos autos, mas com sua outra filha, que é também filha do réu. Repete que não era com a vítima dos autos. Nesta senda, em que pese a alegação da defesa de que não seria possível identificar os fatos por ausência de informação precisa sobre a data, isto também não merece guarida. Isto porque em que pese a ausência da informação precisa sobre data, ano, mês, o que se individualiza é o cenário em que a conduta foi praticada (enquanto a vítima ainda morava com a mãe e antes da mãe engravidar outras vez). E, em sendo uma conduta praticada, não se faz necessária a informação específica da data em que teria ocorrido, posto que existem outras informações nos autos que permitem individualizar no tempo e no espaço o momento em que teriam ocorridos os fatos. Em adição, as palavras trazidas pelas testemunhas confirmam o Relatório Psicossocial ao mov. 1.16, momento em que a vítima teria sido ouvida. Não obstante, é compreensível, e corrobora a imputação, o fato de que a vítima tenha se negado a depor em audiência. E isto porque em crimes sexuais praticados contra vítima menor de 14 anos, a conduta criminosa recorrentemente deixa marcas e traumas que se refletem em conduta da vítima de negar-se a reviver o sofrimento que suportou em decorrência da violência. Ressalte-se, inclusive, que a desistência de sua oitiva se dá com fundamento na Lei nº 14.241/2021. Por fim, a mudança de comportamento notada pelas testemunhas, no sentido de que a vítima teria ficado calada e "mudada", também vai ao encontro das demais provas que se tem para imputar-se a autoria ao réu. Portanto, o fato de as testemunhas repetirem palavras ditas pela vítima não deve ser lido unica e exclusivamente como testemunha de ouvir dizer, dado que suas alegações encontram ressonância em outras provas produzidas nos autos. Ademais, crimes sexuais, sobretudo contra crianças e adolescentes, ocorrem de forma clandestina, de forma que estes supostos "testemunhos de ouvir dizer" constituem parte necessária da reconstrução dos fatos, isto porque geralmente são as pessoas a quem as crianças podem recorrer em tentativa de obter ajuda, e, geralmente, são as primeiras pessoas que têm acesso à versão da vítima, o que reveste seu depoimento de maior importância. Com isto, em se tratando de violência sexual, a prova subsumida nas palavras da vítima revela-se como a tônica (neste caso presente no Depoimento da vítima e no Relatório Psicossocial, corroborados pelas testemunhas na instrução criminal), já que tais infrações são, na sua quase totalidade, praticadas no interior da residência dos envolvidos ou em local ou circunstâncias que impossibilitem que outras pessoas possam presenciá-la, de tal sorte que a palavra da vítima passa a ganhar maior destaque e relevância, principalmente se a versão apresentada possui arrimo nas demais provas produzidas. A propósito, nesse pormenor, admitindo as palavras da vítima, desde que em harmonia com o contexto probatório contido nos autos e verificada a inviabilidade de se admitir a versão apresentada pela defesa, como prova assaz para a prolação de decreto condenatório, colaciona-se, a título de ilustração, as seguintes decisões extraídas do repertório de jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, a seguir, transcritas: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PALAVRA DA VÍTIMA. RELEVANTE IMPORTÂNCIA. ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. O Tribunal local, ao analisar os elementos constantes nos autos, entendeu pela ratificação da decisão de primeira instância que condenou o ora agravante pelo crime de estupro de vulnerável em continuidade delitiva. 2. A pretensão de desconstituir o julgado por suposta contrariedade à lei federal, pugnando pela absolvição ou a readequação típica da conduta, não encontra campo na via eleita, dada a necessidade de revolvimento do material probante, o que é vedado a esta Corte Superior de Justiça, a teor do disposto na Súmula n. 7/STJ. 3. Este Sodalício há muito firmou jurisprudência no sentido de que, nos crimes contra a dignidade sexual, geralmente ocorridos na clandestinidade, a palavra da vítima adquire especial importância, desde que verossímil e coerente com os demais elementos de prova. 4. Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg no REsp 1695526 / SP. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, 17.05.2018, DJe 04.06.2018). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.  ESTUPRO DE VULNERÁVEL.    PLEITO    DE    ABSOLVIÇÃO.    REEXAME   DE   PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. 1. Para a análise da tese recursal, de que o agravante não teria cometido o delito de estupro de vulnerável, mostra-se, no caso, imprescindível o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que é defeso em âmbito de recurso especial, em virtude do disposto na Súmula n. 7 desta Corte. Precedentes. 2.  Outrossim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é a de que, nos crimes de natureza sexual, os quais nem sempre deixam vestígios, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no AREsp 1268926 / PR; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL .2018/0068075-6. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, 24.04.2018. DJe 02.05.2018). No caso, são vastos os elementos de prova que apontam para a autoria do denunciado. É de se destacar que na vasta maioria dos crimes de estupro, normalmente cometidos sem a presença de outros indivíduos, à clandestinidade, há dificuldade na produção probatória, de modo que o acervo constante dos autos deve ser analisado com especial atenção. Portanto, não havendo prova de causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, estando provada a imputação ministerial, verificando-se a inexistência de quaisquer obstáculos relacionados à punibilidade do agente, o reconhecimento da procedência do pedido de condenação contido na peça de ingresso é medida de rigor. Por fim, deixo de considerar a tese do Ministério Público suscitada em sede de alegações finais orais no que diz respeito à segunda conduta de estupro de vulnerável, dado que ausente na denúncia e não amplamente fundamentada no que trouxeram as testemunhas, o que inclusive comprometeria a correlação necessária entre a vestibular e o decreto condenatório. Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para CONDENAR EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal. Com efeito, passo à dosimetria. A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma negativa. Isto porque o crime de estupro de vulnerável é crime que, mesmo diante do consentimento da vítima, ainda assim se configura. Ocorre que em contextos em que há a resistência da vítima, a conduta se reveste de especial reprovabilidade, dado que o réu inflinge ardil extra à natureza do crime: ou seja, além de se configurar já com o consentimento, o fato de não haver consentimento torna ainda mais reprovável a conduta. Antecedentes valorados na forma da súmula 444, do STJ. Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. A personalidade deve ser valorada de forma neutra. A personalidade é circunstância que deve ser apreciada à luz dos princípios relacionados à psicologia e à psiquiatria, uma vez que nela se deve analisar muito mais o conteúdo do ser humano do que a embalagem que lhe foi impressa pela sociedade. Destarte, ante a inexistência de elementos mínimos de convicção, entendo não demonstrar ele personalidade que possa ser valorada em seu desfavor. Os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. As circunstâncias serão valoradas de forma neutra, na forma que o ardil utilizado já se encontra no âmbito do próprio desvalor da conduta punida. As consequências do crime foram significativas, conforme se verificou e se valutou nos autos, sobretudo dado que a conduta do acusado resultou na desgregação da unidade familiar, fazendo com que a vítima se sentisse constrangida a ponto de não mais querer morar com a mãe e ter decidido se mudar para a casa da avó. A vítima não contribuiu para o resultado, de forma que não pode ser utilizada para aumentar a pena imposta ao réu. STJ. 6ª Turma. HC 217819-BA, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/11/2013 (Info 532). Para a fixação da pena-base, eleva-se a pena em 1/8 (um oitavo) em cima do mínimo legal, razão pela qual, diante de 2 (duas) circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 10:00:00 (dez anos) de reclusão. Não há circunstância atenuante. Quanto à agravante, deixo para analisá-la na terceira fase da dosimetria (a forma do art. 226, do CP), visto que a norma específica (neste caso a de majorante de crimes sexuais) derroga a norma genérica. Na última fase, não há causas de diminuição. Quanto ao aumento, este será de 1/2 (metade) na forma do art. 226, II, do Código Penal por ser o réu padrasto da vítima, fato este incontroverso desde a denúncia e confirmado em sede de instrução criminal, dado que a época a mãe da vítima tinha relacionamento com o réu e coabitavam todos na mesma residência. Sendo assim, fixo a pena em 15:00:00 (quinze anos) de reclusão, fixando o regime inicial de cumprimento de pena no FECHADO, tendo em vista o quantum da pena aplicada, consoante o disposto no artigo 33, §2º, alínea "a", do Código Penal. O réu poderá apelar em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. Não cabe ao acusado a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, na forma preconizada nos artigos 43 e 44, ambos do Código Penal, tendo em vista o crime em comento ter sido cometido mediante violência ou grave ameaça. O acusado não faz jus ao benefício da suspensão condicional da pena, em razão de não preencher os pressupostos dispostos no art. 77 do Código Penal. Por ser assistido pela DPE presumo a vulnerabilidade econômica e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não auferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Intime-se o Ministério Público e a Defesa da sentença. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado expeça-se mandado de prisão no regime FECHADO, para início de cumprimento de pena, expedindo-se após o cumprimento da ordem a devida guia de recolhimento. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. NESTE ATO, QUANTO AOS NOVOS FATOS TRAZIDOS PELA GENITORA, VERIFICO QUE ESTES JÁ ESTÃO SENDO APURADOS NO PROCESSO DE Nº 0000531-05.2020.8.04.5400, RAZÃO PELA QUAL DEIXO DE DETERMINAR NOVAS DILIGÊNCIAS. P.R.I.C. Manacapuru, 17 de Abril de 2025. Bárbara Marinho Nogueira Juíza de Direito
  4. 30/04/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
    SENTENÇA Trata-se de ação penal que busca a responsabilização de EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal, por fatos que se deram aos quando a vítima N. P. C. de S. (nascida em 15/11/2006) estaria com 6 (seis) anos de idade. A denúncia foi oferecida ao mov. 16 e recebida ao mov. 21.1, aos 14/06/2019. Réu citado ao mov. 35.1. Resposta à acusação ao mov. 41, devidamente analisada ao mov. 44.1. AIJ realizada ao mov. 89.1, oportunidade em que foram ouvidas as testemunhas. No ato, foi desistido da condução coercitiva da vítima a qual, se realizada, poderia submeter a vítima de crime sexual à revitimização no curso do processos penal. Por fim, foi decretada a revelia do réu EDIMILSON GILDO DA SILVA. Em suas alegações finais orais, o MPE pugna pela condenação na forma do art. 217-A c/c art. 226, I, todos do CPB, bem como pela consideração de que sejam consideradas duas condutas de estupro de vulnerável. Pugna também pela fixação de valor mínimo pelos danos causados, citando o tem nº 1186, do STJ, devendo estes ser fixados ante a condição de dano in re ipsa. Já a defesa requer a absolvição por ausência de elementos ante o fato de os referidos depoimentos serem somente “de ouvir dizer”, não havendo elemento de prova, mas tão somente de elementos de informação. Ressalta o ponto de que as testemunhas não se recordam do momento exato em que ocorreram os fatos e a impossibilidade de verificar se à época o réu de fato morava com a vítima ou se tinha um relacionamento com a vítima. Aponta que as testemunhas poderiam ter interesse específico no caso por serem ascendentes da vítima. Relatório psicossocial ao mov. 1.16. Certidão de nascimento da vítima ao mov. 1.4. Depoimento da vítima ao mov. 1.3. São os relatos. Fundamento e decido. De pronto, constato a regularidade da ação instaurada posto que, à época, na forma do art. 225, p.ú., do CP, o processamento do crime se dava por ação penal pública incondicionada, por ser a vítima menor de 18 (dezoito) anos. Adiante, alega, a defesa, que em sede de AIJ a vítima se negou a relembrar os fatos e, assim, identificar o autor e em que momento teriam ocorrido os fatos narrados.  Contudo, tem-se que o depoimento trazido pela avó da vítima e pela mãe da vítima permitem concluir que os indícios formados em sede inquisitorial (inclusive fundados na palavra da vítima) se confirmaram em instrução criminal. Para isso, destaco os depoimentos orais. Inicialmente, a testemunha EDILZA PESSOA CASTILHO, avó da vítima, às perguntas do MPE afirma que se lembra que a vítima chegou da escola muito desconfiada e mudada, momento em que perguntou o que estaria havendo com a vítima. Após, afirma que a vítima chorou e a testemunha a pressionou para que falasse a verdade, tendo a vítima dito que quando a mãe da vítima estava no igarapé lavando roupa, e quando o réu estava bêbado, trancava a vítima e uma adolescente no quarto e tocava em seus seios e partes íntimas, ameaçando a vítima. Quanto ao comportamento do réu, afirma que não convivia com o réu, dizendo que sua filha convivia com ele, mas não aguentou porque o réu bebia muito, se separando por conta disso e por conta de sua neta. Afirma que o réu teria outras filhas também e repete que o réu vivia alcoolizado. Acrescenta que o réu usava palavras de cunho sexual (usava palavra de “dar isso” e “dar aquilo”), de forma que a testemunha não gostava e repreendia o réu, sobretudo por haver crianças em casa. Aponta que não gostava de palavrões na sua casa. Afirma que depois dos fatos ficou responsável pela vítima, sendo a responsável pelo registro da ocorrência. Indica que no dia anterior à audiência ligou para a vítima e esta disse que queria deixar para trás o que havia ocorrido, visto que já seria uma mulher com 18 anos. Afirma que após os fatos a vítima ficou normal, mas que queria esquecer e que já era uma mulher, e não quer mais saber do que houve. Acrescenta que a vítima disse que quando se lembra disso, tem vontade de chorar. Acrescenta que a mãe da vítima tem muitas coisas a dizer. Às perguntas da DPE informa que não se lembra do ano em que ocorreu. Após, a informante POLIANA CASTILHO DE SOUZA, mãe da vítima, ex-companheira do réu, às perguntas do MPE, afirma que a vítima nunca lhe falava nada, sempre foi fechada, porque tinha medo que a mãe lhe batesse. Informa que a vítima sempre pedia para ir morar com sua avó e que não quer mais morar com a mãe. Mas, ao ser questionada, a vítima não dizia o motivo, mas afirma que a vítima chorava e ficava muito fechada. Até que decidiu que deixaria a vítima morar com sua avó e a colocou para morar com a avó. Assim que a vítima chegou na casa da avó, a vítima se abriu com a avó e contou o que houve. Após o registro da ocorrência, afirma que continuou a morar com o réu porque nunca acreditou no que a vítima teria falado. Afirma que logo em seguida engravidou e ficou de resguardo, e foi morar com a sua mãe por conta do resguardo. Afirma que tem também uma outra filha que [na data da audiência] tem 11 anos. Acrescenta que em um dia quando estava de resguardo, estava dormindo em uma rede com o bebezinho em cima dela, e com uma cama embaixo da rede, e pediu que sua filha lhe catasse [no sentido de coçar sua cabeça]. Em um dado momento afirma que sentiu que sua filha parou de lhe catar [no sentido de coçar sua cabeça], virou e viu o réu deitado na cama, com sua filha de pernas abertas e o réu lambendo as partes de sua filha. E foi naquele momento em que acreditou e que a ficha caiu. E entendeu que foi aquilo que o réu tinha feito com sua filha [que não era filha do réu]. Acrescenta que essa filha desta ocasião era filha de sangue do réu. Indica que após os fatos a vítima não teve nenhum problema em específico, mas que a vítima não quer se lembrar dos fatos. Afirma que hoje não tem mais contato com o réu. Informa que a vítima nunca falou com ela sobre os fatos. Às perguntas da DPE informa que não se lembra da época em que ocorreu. Acrescenta que a situação da rede com a filha catando sua cabeça não ocorreu com a vítima dos autos, mas com sua outra filha, que é também filha do réu. Repete que não era com a vítima dos autos. Nesta senda, em que pese a alegação da defesa de que não seria possível identificar os fatos por ausência de informação precisa sobre a data, isto também não merece guarida. Isto porque em que pese a ausência da informação precisa sobre data, ano, mês, o que se individualiza é o cenário em que a conduta foi praticada (enquanto a vítima ainda morava com a mãe e antes da mãe engravidar outras vez). E, em sendo uma conduta praticada, não se faz necessária a informação específica da data em que teria ocorrido, posto que existem outras informações nos autos que permitem individualizar no tempo e no espaço o momento em que teriam ocorridos os fatos. Em adição, as palavras trazidas pelas testemunhas confirmam o Relatório Psicossocial ao mov. 1.16, momento em que a vítima teria sido ouvida. Não obstante, é compreensível, e corrobora a imputação, o fato de que a vítima tenha se negado a depor em audiência. E isto porque em crimes sexuais praticados contra vítima menor de 14 anos, a conduta criminosa recorrentemente deixa marcas e traumas que se refletem em conduta da vítima de negar-se a reviver o sofrimento que suportou em decorrência da violência. Ressalte-se, inclusive, que a desistência de sua oitiva se dá com fundamento na Lei nº 14.241/2021. Por fim, a mudança de comportamento notada pelas testemunhas, no sentido de que a vítima teria ficado calada e "mudada", também vai ao encontro das demais provas que se tem para imputar-se a autoria ao réu. Portanto, o fato de as testemunhas repetirem palavras ditas pela vítima não deve ser lido unica e exclusivamente como testemunha de ouvir dizer, dado que suas alegações encontram ressonância em outras provas produzidas nos autos. Ademais, crimes sexuais, sobretudo contra crianças e adolescentes, ocorrem de forma clandestina, de forma que estes supostos "testemunhos de ouvir dizer" constituem parte necessária da reconstrução dos fatos, isto porque geralmente são as pessoas a quem as crianças podem recorrer em tentativa de obter ajuda, e, geralmente, são as primeiras pessoas que têm acesso à versão da vítima, o que reveste seu depoimento de maior importância. Com isto, em se tratando de violência sexual, a prova subsumida nas palavras da vítima revela-se como a tônica (neste caso presente no Depoimento da vítima e no Relatório Psicossocial, corroborados pelas testemunhas na instrução criminal), já que tais infrações são, na sua quase totalidade, praticadas no interior da residência dos envolvidos ou em local ou circunstâncias que impossibilitem que outras pessoas possam presenciá-la, de tal sorte que a palavra da vítima passa a ganhar maior destaque e relevância, principalmente se a versão apresentada possui arrimo nas demais provas produzidas. A propósito, nesse pormenor, admitindo as palavras da vítima, desde que em harmonia com o contexto probatório contido nos autos e verificada a inviabilidade de se admitir a versão apresentada pela defesa, como prova assaz para a prolação de decreto condenatório, colaciona-se, a título de ilustração, as seguintes decisões extraídas do repertório de jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, a seguir, transcritas: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PALAVRA DA VÍTIMA. RELEVANTE IMPORTÂNCIA. ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. O Tribunal local, ao analisar os elementos constantes nos autos, entendeu pela ratificação da decisão de primeira instância que condenou o ora agravante pelo crime de estupro de vulnerável em continuidade delitiva. 2. A pretensão de desconstituir o julgado por suposta contrariedade à lei federal, pugnando pela absolvição ou a readequação típica da conduta, não encontra campo na via eleita, dada a necessidade de revolvimento do material probante, o que é vedado a esta Corte Superior de Justiça, a teor do disposto na Súmula n. 7/STJ. 3. Este Sodalício há muito firmou jurisprudência no sentido de que, nos crimes contra a dignidade sexual, geralmente ocorridos na clandestinidade, a palavra da vítima adquire especial importância, desde que verossímil e coerente com os demais elementos de prova. 4. Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg no REsp 1695526 / SP. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, 17.05.2018, DJe 04.06.2018). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.  ESTUPRO DE VULNERÁVEL.    PLEITO    DE    ABSOLVIÇÃO.    REEXAME   DE   PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. 1. Para a análise da tese recursal, de que o agravante não teria cometido o delito de estupro de vulnerável, mostra-se, no caso, imprescindível o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que é defeso em âmbito de recurso especial, em virtude do disposto na Súmula n. 7 desta Corte. Precedentes. 2.  Outrossim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é a de que, nos crimes de natureza sexual, os quais nem sempre deixam vestígios, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no AREsp 1268926 / PR; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL .2018/0068075-6. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, 24.04.2018. DJe 02.05.2018). No caso, são vastos os elementos de prova que apontam para a autoria do denunciado. É de se destacar que na vasta maioria dos crimes de estupro, normalmente cometidos sem a presença de outros indivíduos, à clandestinidade, há dificuldade na produção probatória, de modo que o acervo constante dos autos deve ser analisado com especial atenção. Portanto, não havendo prova de causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, estando provada a imputação ministerial, verificando-se a inexistência de quaisquer obstáculos relacionados à punibilidade do agente, o reconhecimento da procedência do pedido de condenação contido na peça de ingresso é medida de rigor. Por fim, deixo de considerar a tese do Ministério Público suscitada em sede de alegações finais orais no que diz respeito à segunda conduta de estupro de vulnerável, dado que ausente na denúncia e não amplamente fundamentada no que trouxeram as testemunhas, o que inclusive comprometeria a correlação necessária entre a vestibular e o decreto condenatório. Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para CONDENAR EDIMILSON GILDO DA SILVA pela prática do tipo penal previsto no art. 217-A, do Código Penal. Com efeito, passo à dosimetria. A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma negativa. Isto porque o crime de estupro de vulnerável é crime que, mesmo diante do consentimento da vítima, ainda assim se configura. Ocorre que em contextos em que há a resistência da vítima, a conduta se reveste de especial reprovabilidade, dado que o réu inflinge ardil extra à natureza do crime: ou seja, além de se configurar já com o consentimento, o fato de não haver consentimento torna ainda mais reprovável a conduta. Antecedentes valorados na forma da súmula 444, do STJ. Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. A personalidade deve ser valorada de forma neutra. A personalidade é circunstância que deve ser apreciada à luz dos princípios relacionados à psicologia e à psiquiatria, uma vez que nela se deve analisar muito mais o conteúdo do ser humano do que a embalagem que lhe foi impressa pela sociedade. Destarte, ante a inexistência de elementos mínimos de convicção, entendo não demonstrar ele personalidade que possa ser valorada em seu desfavor. Os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. As circunstâncias serão valoradas de forma neutra, na forma que o ardil utilizado já se encontra no âmbito do próprio desvalor da conduta punida. As consequências do crime foram significativas, conforme se verificou e se valutou nos autos, sobretudo dado que a conduta do acusado resultou na desgregação da unidade familiar, fazendo com que a vítima se sentisse constrangida a ponto de não mais querer morar com a mãe e ter decidido se mudar para a casa da avó. A vítima não contribuiu para o resultado, de forma que não pode ser utilizada para aumentar a pena imposta ao réu. STJ. 6ª Turma. HC 217819-BA, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/11/2013 (Info 532). Para a fixação da pena-base, eleva-se a pena em 1/8 (um oitavo) em cima do mínimo legal, razão pela qual, diante de 2 (duas) circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 10:00:00 (dez anos) de reclusão. Não há circunstância atenuante. Quanto à agravante, deixo para analisá-la na terceira fase da dosimetria (a forma do art. 226, do CP), visto que a norma específica (neste caso a de majorante de crimes sexuais) derroga a norma genérica. Na última fase, não há causas de diminuição. Quanto ao aumento, este será de 1/2 (metade) na forma do art. 226, II, do Código Penal por ser o réu padrasto da vítima, fato este incontroverso desde a denúncia e confirmado em sede de instrução criminal, dado que a época a mãe da vítima tinha relacionamento com o réu e coabitavam todos na mesma residência. Sendo assim, fixo a pena em 15:00:00 (quinze anos) de reclusão, fixando o regime inicial de cumprimento de pena no FECHADO, tendo em vista o quantum da pena aplicada, consoante o disposto no artigo 33, §2º, alínea "a", do Código Penal. O réu poderá apelar em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. Não cabe ao acusado a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, na forma preconizada nos artigos 43 e 44, ambos do Código Penal, tendo em vista o crime em comento ter sido cometido mediante violência ou grave ameaça. O acusado não faz jus ao benefício da suspensão condicional da pena, em razão de não preencher os pressupostos dispostos no art. 77 do Código Penal. Por ser assistido pela DPE presumo a vulnerabilidade econômica e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não auferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Intime-se o Ministério Público e a Defesa da sentença. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado expeça-se mandado de prisão no regime FECHADO, para início de cumprimento de pena, expedindo-se após o cumprimento da ordem a devida guia de recolhimento. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. NESTE ATO, QUANTO AOS NOVOS FATOS TRAZIDOS PELA GENITORA, VERIFICO QUE ESTES JÁ ESTÃO SENDO APURADOS NO PROCESSO DE Nº 0000531-05.2020.8.04.5400, RAZÃO PELA QUAL DEIXO DE DETERMINAR NOVAS DILIGÊNCIAS. P.R.I.C. Manacapuru, 17 de Abril de 2025. Bárbara Marinho Nogueira Juíza de Direito
  5. 30/04/2025 - Documento obtido via DJEN
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