Ministério Público Do Estado Do Amazonas x Andre Monteiro De Souza
Número do Processo:
0001229-16.2017.8.04.5400
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJAM
Classe:
AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Grau:
1º Grau
Órgão:
1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal
Última atualização encontrada em
30 de
abril
de 2025.
Intimações e Editais
-
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30/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIOSENTENÇA Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público que busca a responsabilização criminal de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA pelas condutas descritas no art. 15 e 16, §ú, IV, ambos da Lei nº 10.826/2003 e art. 180, caput do Código Penal, e ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR pelas condutas descritas no art. 16, §ú, IV da Lei nº 10.826/2003 e arts. 180, caput e 311, ambos do Código Penal, por fatos que se deram na data de 24/06/2017. Acusados presos em flagrante no dia 24/06/2017 (mov. 1.1); Concedida a liberdade provisória aos acusados mediante pagamento de fiança por decisão proferida na data de 28/06/2017 (mov. 12.1); Acusado ANDRÉ posto em liberdade no dia 04/07/2017 (mov. 24.1); Acusado ANTONIO posto em liberdade no dia 12/07/2018 (mov. 33.1); Denúncia oferecida no dia 12/03/2020 (mov. 62.1) e recebida no dia 14/05/2020 (mov. 69.1); Resposta à acusação apresentada pelo acusado ANDRÉ no dia 24/11/2020 (mov. 101.1); Acusado ANTONIO citado por edital no dia 09/06/2022 (mov. 123.1); Suspensão do processo e do prazo prescricional quanto ao acusado ANTONIO decretada em 23/09/2022 (mov. 126.1); Audiência de instrução e julgamento realizada na data de 14/04/2025, onde foi decretada a revelia do acusado, bem como foram apresentadas alegações finais orais tanto pelo Ministério Público quanto pela defesa do réu (mov. 170.1); Das peças policiais, extrai-se: 1. Depoimento na delegacia da testemunha Greison Ferreira Duarte, policial militar condutor da prisão em flagrante (mov. 1.4 e mov. 1.5); 2. Auto de exibição de objetos apreendidos (mov. 1.6); 3. Depoimento na delegacia da testemunha Jimmys Silveira de Castro, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.8); 4. Depoimento na delegacia da testemunha William Moreno Turman, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.9); 5. Interrogatório do acusado ANDRÉ perante a Autoridade Policial (mov. 1.13 e mov. 1.14); 6. Interrogatório do acusado ANTONIO perante a Autoridade Policial (mov. 1.16 e mov. 1.17); 7. Laudo de perícia em veículo (mov. 1.27, mov. 1.28, mov. 1.29, mov. 1.30 e mov. 1.31); 8. Restrição de roubo da motocicleta apreendida (mov. 29.34); 9. Laudo de exame em arma de fogo e munições (mov. 43.2-4); São os relatos. Fundamento e decido. I DO MÉRITO Prima facie, da prova produzida em audiência, trago: TESTEMUNHA GREISON FERREIRA DUARTE (POLICIAL MILITAR) - Relata que estava em patrulhamento com sua equipe policial, quando avistou os acusados em atitude suspeita andando de motocicleta; - Relata que sua equipe fez um retorno na via e deu ordem de parada aos acusados, contudo, estes empreenderam fuga; - Relata que, durante a perseguição aos acusados, estes colidiram com uma placa de sinalização nas proximidades da Câmara Municipal, vindo a cair ao solo; - Informa que populares tentaram agredir os acusados, o que dificultou o cumprimento da prisão em flagrante; - Relata que ao realizar a revista dos acusados, fora encontrada a arma de fogo com munições deflagradas, além de adulteração na motocicleta conduzida pelos réus; - Relata que efetuaram a prisão dos acusados e os levaram até a delegacia de polícia junto com os materiais apreendidos; - Informa que a arma de fogo apreendida estava com a numeração suprimida; - Informa que a arma de fogo se tratava de um Revólver da marca Taurus; - Informa que o acusado que estava na garupa efetuou 2 (dois) disparos em direção a sua guarnição; - Informa que o que fez com que sua equipe suspeitasse dos acusados foi que, ao avistarem a placa da motocicleta, perceberam que havia um objeto, similar a uma fita, que impedia identificar a numeração do veículo; - Informa que a equipe policial encontrava-se dividida em duas motocicletas, sendo ele um dos pilotos; - Informa que conduzia sua motocicleta sozinho e seus outros 2 (dois) colegas, as testemunhas JIMMYS e WILLIAM, estavam na outra; - Informa que o acusado que estava na garupa era de estatura mediana, de cor de pele clara e com o cabelo pintado; - Informa que o que acusado que estava na garupa, depois de colidir com a placa, tentou fugir para um rio próximo ao local, porém, foi impedido por populares; - Informa que o revólver foi encontrado na cintura do acusado. TESTEMUNHA JIMMYS SILVEIRA DE CASTRO (POLICIAL MILITAR) - Relata que sua equipe policial perseguiu os acusados após estes empreenderem fuga, contudo, estes acabaram colidindo e caindo no chão perto da Câmara Municipal; - Relata que os acusados realizaram 2 (dois) disparos de arma de fogo contra a guarnição durante a fuga; - Informa que não conhecia os acusados de outras ocorrências; - Informa que só conseguiram prender os acusados após eles colidirem com uma placa de trânsito; - Relata que um dos acusados ainda tentou correr para dentro de um rio, porém, seu colega conseguiu efetuar sua prisão; - Informa que o outro acusado permaneceu no chão; - Informa que efetuava o patrulhamento com sua equipe policial através do uso de motocicletas; - Informa que na ocasião, estava na garupa. TESTEMUNHA WILLIAM MONTEIRO TURMAN (POLICIAL MILITAR) - Relata que os acusados empreenderam fuga, contudo, acabaram colidindo com uma placa e caindo no chão; - Relata que um dos acusados tentou fugir em direção aos flutuantes, porém, conseguiu realizar sua detenção; - Informa que não foi o policial responsável pelo recolhimento da arma de fogo apreendida. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA Foi decretada a revelia do acusado, nos termos do art. 367 do Código de Processo Penal, em razão da mudança de domicílio sem a devida comunicação do novo endereço ao juízo. Com base em tais depoimentos, passo a análise da materialidade e da autoria delitiva. 1. DA MATERIALIDADE a) Do crime de receptação (art. 180 do Código Penal) A materialidade do crime de receptação encontra-se satisfatoriamente comprovada nos autos, especialmente no que tange à motocicleta utilizada pelos indivíduos no momento da prática delitiva, a qual possuía restrição de roubo e apresentava adulteração em sua placa identificadora, conforme narrado pelas testemunhas policiais e corroborado pelos laudos técnicos constantes dos autos. De acordo com o depoimento prestado pelo policial militar Greison Ferreira Duarte, a guarnição identificou comportamento suspeito por parte dos ocupantes da motocicleta, momento em que observou que a placa estava parcialmente encoberta por uma fita, dificultando sua identificação. Tal percepção motivou a tentativa de abordagem, frustrada inicialmente pela fuga dos indivíduos, culminando em perseguição até a colisão com uma placa de sinalização, ocasião em que foram detidos. Ainda conforme os relatos dos demais integrantes da equipe policial Jimmys Silveira De Castro E William Monteiro Turman, os autores do delito tentaram evadir-se do local, sendo necessário o uso de força policial para contê-los. A motocicleta foi apreendida e submetida à perícia oficial. Os Laudos de Perícia em Veículo Automotor constantes dos movs. 1.27, 1.28, 1.29, 1.30 e 1.31 demonstram, de forma objetiva, que o veículo em questão uma motocicleta Honda/Bros, de cor preta, com placa adulterada NOT 0328 possuía sinais de fraude documental e alteração no sistema de identificação veicular, tendo sido identificado que a numeração original da placa era NOT 0329, com a adulteração do dígito final (de "9" para "8") por meio de uso de fita isolante. Além disso, a consulta ao cadastro do veículo (mov. 29.34) revelou a existência de restrição de roubo, indicando que os ocupantes estavam na posse de bem produto de crime, tratando-se de motocicleta subtraída de seu legítimo proprietário Reinaldo Costa Leal Filho. A condução do veículo com a placa adulterada e com a restrição de furto/roubo caracteriza a receptação dolosa, uma vez que as circunstâncias em que se deu a abordagem e os elementos constatados na investigação revelam que os indivíduos tinham ciência da origem ilícita do bem. A materialidade, portanto, está plenamente evidenciada pela combinação entre os relatos testemunhais, os laudos periciais e o histórico de restrição do veículo, não restando dúvidas quanto ao cometimento do crime de receptação quanto à motocicleta utilizada pelos autores do delito durante a empreitada criminosa, nos moldes do art.180 do Código Penal. b) Dos crimes da Lei nº 10.826/2003 b.1) Do disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003) A materialidade do crime previsto de disparo de arma de fogo em via pública encontra-se plenamente demonstrada nos autos, com base no conjunto probatório colhido na fase inquisitorial e reforçado durante a instrução processual. As testemunhas Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, todos policiais militares que participaram da abordagem, relataram de forma coerente e convergente que, ao tentarem realizar a abordagem dos indivíduos que transitavam em uma motocicleta em atitude suspeita, estes empreenderam fuga e, durante a perseguição, foram efetuados dois disparos de arma de fogo na direção da guarnição policial. Segundo o policial Greison, após a detenção dos agentes e realização da revista pessoal, foi localizada uma arma de fogo do tipo revólver, marca Taurus, com a numeração suprimida, acondicionada na cintura de um dos ocupantes da motocicleta, que havia sido o responsável pelos disparos. No mesmo sentido, a testemunha Jimmys Silveira confirmou que os disparos ocorreram em meio à perseguição, fato que também foi parcialmente confirmado por William Turman, que participou da ação e auxiliou na contenção dos indivíduos. A eficiência da arma de fogo para a produção de disparos foi confirmada pelo laudo de perícia técnica (movs. 43.2/43.4), atestando tratar-se de revólver em perfeito estado de funcionamento. Além disso, consta nos autos o auto de exibição e apreensão (mov. 1.6), que documenta a apreensão de duas munições calibre 28 deflagradas, compatíveis com os disparos mencionados pelas testemunhas, reforçando a comprovação da conduta típica. Assim, a partir da análise dos elementos de convicção constantes nos autos, constata-se a existência de provas materiais diretas e idôneas da ocorrência do delito de disparo de arma de fogo, sendo a conduta típica, antijurídica e punível nos moldes do art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b.2) Do porte de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) - necessária reclassificação A materialidade delitiva relativa ao porte de arma de fogo encontra-se devidamente comprovada nos autos, especialmente pelo Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.6), que registrou a apreensão de um revólver da marca Taurus, calibre .38, contendo munições, localizado na cintura de um dos indivíduos no momento da abordagem, bem como pelo Laudo de Perícia Técnica (movs. 43.2/43.4), que atestou que a arma estava em perfeito estado de funcionamento, apta à produção de disparos. Contudo, ao proceder à análise do tipo penal imputado na denúncia, qual seja, o art. 16 da Lei nº 10.826/2003, que trata do porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, verifica-se que a imputação jurídica não se coaduna com os fatos à luz da legislação vigente à época dos fatos. A conduta delituosa em análise ocorreu em junho de 2017, e, conforme se extrai do próprio auto de apreensão e do laudo pericial, trata-se de arma de fogo calibre .38, a qual, naquele período, era classificada como de uso permitido. Ademais, em que pese a numeração da arma estar suprimida, a equiparação expressa entre armas com sinal identificador suprimido e armamento de uso restrito só foi introduzida no ordenamento jurídico em 2019 através da Lei nº 13.964, que alterou o §1º do art. 16 da Lei nº 10.826/2003. Dessa forma, a imputação de crime de porte ilegal de arma de uso restrito, com base na supressão da numeração, não pode retroagir para atingir fatos anteriores à referida alteração legislativa, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade e da irretroatividade da lei penal mais gravosa, previsto no art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal. Conforme disciplina o art. 383 do Código de Processo Penal, o juiz poderá, sem modificar a descrição fática contida na denúncia, dar ao fato definição jurídica diversa da que nela houver sido atribuída, promovendo a chamada emendatio libelli. Assim, diante da impossibilidade de aplicação do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 aos fatos praticados em 2017, impõe-se a reclassificação da conduta para o tipo previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, qual seja, o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, que melhor se adequa à realidade fática e normativa então vigente. Pelo exposto, com fulcro no art. 383 do CPP, RECLASSIFICO A CONDUTA IMPUTADA para o crime previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, permanecendo incólume a narrativa fática contida na denúncia. c.3) Do necessário reconhecimento da consunção entre o crime de porte de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) No presente caso, a análise do conjunto fático-probatório dos autos evidencia que os agentes foram flagrados portando arma de fogo com a numeração suprimida, a qual foi utilizada momentos depois para a prática de disparos em via pública, especificamente na direção da guarnição policial que realizava o acompanhamento tático. Conforme narrado pelas testemunhas policiais Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, os disparos de arma de fogo ocorreram durante a perseguição policial, logo após a visualização da placa adulterada da motocicleta e a tentativa de abordagem. Em tal contexto, resta demonstrado que o porte da arma de fogo foi instrumental para a execução do delito de disparo, razão pela qual o crime de porte ilegal de arma de fogo se consome na prática do disparo, devendo incidir a regra da consunção. O princípio da consunção, amplamente reconhecido pela jurisprudência pátria, estabelece que o crime-meio é absorvido pelo crime-fim, quando este último é praticado mediante a utilização do primeiro como etapa necessária ou preparatória. Trata-se de aplicação do critério da especialidade e da subsidiariedade implícita, em que o tipo penal mais abrangente ou mais grave prevalece. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu: PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA E DISPARO DE ARMA DE FOGO - ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ART. 15 , DA LEI 10.826/03 - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - CONDENAÇÃO MANTIDA - APLICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO - CRIME DE PORTE DE ARMA ABSORVIDO PELO CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO - REDUÇÃO DA PENA-BASE - NECESSIDADE - EQUÍVOCO NA ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - MITIGAÇÃO DO REGIME PRISIONAL - NÃO CABIMENTO - ACUSADO REINCIDENTE - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - IMPOSSIBILIDADE - APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DETRAÇÃO - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO - ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DO DEFENSOR DATIVO - CABIMENTO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. DE OFÍCIO, APLICADO O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. 01. Se o conjunto probatório dos autos se mostra irrefutável quanto à prática do delito de disparo de arma de fogo pelo acusado, impossível acolher o pleito absolutório. 02. O delito de disparo de arma de fogo (art. 15, caput, da Lei 10.826/03) absorve o crime de porte irregular de arma de fogo, ainda que com numeração de série suprimida, quando este se afigura como crime-meio daquele. 03. Se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP são favoráveis ao agente, mister a fixação da pena-base em seu patamar mínimo-legal. 04. Nos termos do que dispõe o art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, entende-se que a condição de reincidente do acusado é fundamento idôneo para justificar a imposição do regime prisional semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, mesmo nos casos em que o agente não foi submetido a uma pena corporal superior a quatro (04) anos. 05. Em se tratando de acusado reincidente, não há falar-se em substituição da pena privativa de liberdade por outras penas restritivas de direitos, sobretudo quando as particularidades do caso concreto demonstrarem que o benefício não é socialmente recomendável. 06. O Juízo da Execução detém melhores condições de conceder ao acusado os benefícios decorrentes da detração penal, porque não basta mero cálculo aritmético para se efetivar a medida, revelando-se necessário averiguar o mérito, as condições e a conduta pessoal do apenado. 07. Os honorários advocatícios do Defensor Dativo devem ser fixados em conformidade com o que dispõem os arts. 272 da Constituição do Estado de Minas Gerais; 22, § 1º, da Lei 8.906/94 ( Estatuto da Advocacia) e 1º, § 1º, da Lei Estadual 13.166/99. (STJ - AREsp: 2324371, Relator.: ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Publicação: 03/08/2023) Dessa forma, reconhecendo-se que o porte da arma de fogo teve como finalidade imediata a prática dos disparos em via pública e contra a guarnição policial, impõe-se o reconhecimento da consunção entre os delitos de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), permanecendo este último como a infração penal subsistente para fins de persecução penal. Passo à análise da autoria. 2. DA AUTORIA A autoria dos fatos imputados ao acusado ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA restou satisfatoriamente comprovada diante da robustez dos elementos probatórios constantes dos autos, especialmente os relatos colhidos em sede de audiência de instrução e julgamento, prestados pelas testemunhas policiais que atuaram diretamente na ocorrência. Segundo relato da testemunha Greison Ferreira Duarte, os policiais militares encontravam-se em patrulhamento quando avistaram os indivíduos em atitude suspeita, trafegando em uma motocicleta com a placa parcialmente encoberta por um objeto semelhante a uma fita. Ao ser dada ordem de parada, os agentes empreenderam fuga, momento em que o passageiro da garupa efetuou dois disparos de arma de fogo em direção à guarnição. Durante a perseguição, os indivíduos colidiram com uma placa de sinalização, vindo a cair. O policial destacou que o indivíduo que estava na garupa, posteriormente impedido de fugir por populares, foi flagrado portando um revólver calibre .38 da marca Taurus, com numeração suprimida, que se encontrava em sua cintura no momento da prisão. As testemunhas Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman corroboraram os relatos, confirmando que os disparos foram efetuados pelo passageiro da motocicleta durante a tentativa de fuga, e que este tentou evadir-se para a área de flutuantes, sendo capturado com auxílio de populares. Ademais, as investigações policiais identificaram o réu ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA como o indivíduo que se encontrava na garupa da motocicleta no momento da ação delitiva, portando a arma de fogo e realizando os disparos contra os policiais. Já o condutor da motocicleta foi identificado como ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR, o qual permaneceu no local após a colisão. Tais circunstâncias, aliadas à apreensão da arma com numeração raspada na posse de ANDRÉ, à coincidência física com a descrição feita no momento dos fatos, bem como à atuação coordenada com o condutor da motocicleta, demonstram de forma segura sua efetiva participação na empreitada criminosa, razão pela qual reconheço a autoria delitiva do acusado quanto aos crimes imputados. A conduta dolosa do acusado, evidenciada pelo cumprimento integral do iter criminis e pela efetiva produção do resultado lesivo, permite a perfeita subsunção do fato à norma penal incriminadora, preenchendo-se todos os elementos do tipo penal. Verificada a ausência de causas excludentes da ilicitude e da culpabilidade, bem como inexistindo quaisquer óbices à punibilidade do agente, impõe-se o reconhecimento da antijuridicidade e da culpabilidade da conduta. Dessa forma, estando comprovada a materialidade e a autoria delitiva, mostra-se imperiosa a procedência do pedido condenatório formulado na denúncia. II DO DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para: a) condenar ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA às penas do art. 180 do Código Penal e art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b) reclassificar a conduta de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA, referente ao porte de arma de fogo, para aquela descrita no art. 14 da Lei nº 10.826/2003 c) reconhecer a consunção entre os crimes de porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), absorvendo-se o primeiro em razão da progressão criminosa Com efeito, passo à dosimetria. III - DA DOSIMETRIA A) Quanto ao crime de receptação a.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 03 (três) anos (Pena: de 01 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra. No caso em tela, percebe-se a intensidade do dolo no agir do condenado é inerente ao tipo penal em questão, razão pela qual a exasperação da pena, com ênfase na culpabilidade, já foi predeterminada pelo legislador quando da fixação do mínimo e do máximo de pena que poderá ser imputada para o mencionado crime. Antecedentes: o acusado não possui condenação transitada em julgado. Conduta Social: Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias que engloboram o crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme apurado nos autos, a motocicleta objeto da receptação não foi apenas mantida em posse de forma passiva ou por simples ocultação, mas sim efetivamente utilizada na execução de nova empreitada criminosa, sendo empregada como meio de fuga durante perseguição policial e no contexto de disparos de arma de fogo contra os agentes de segurança pública. Diante disso, valoro negativamente a circunstância judicial relativa às circunstâncias do crime, acrescentando a fração de 1/8 (4 quatro meses e 15 dias) à pena-base, totalizando 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Consequências do Crime: as esperadas, ainda que nefastas. Comportamento da vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal, estabelecendo-se em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.2) da segunda fase Agravantes: ausentes circunstâncias agravantes. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, mantém-se a pena intermediária em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de receptação no patamar de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.4) da pena de multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. B) Quanto ao crime de disparo de arma de fogo b.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 02 (dois) anos (Pena: de 02 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 3 (três) meses, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: a culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra, na medida que não há elementos suficientes nos autos capazes de elevar a reprovabilidade da conduta, além daqueles que são inerentes ao tipo. Antecedentes: sem condenações transitadas em julgado. Conduta Social: não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias do crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme amplamente demonstrado nos autos, os disparos foram direcionados contra guarnição da Polícia Militar que se encontrava em serviço regular de patrulhamento urbano. Tal conduta não apenas colocou em risco a integridade física dos agentes de segurança, como também representou grave afronta à autoridade pública, evidenciando desrespeito à ordem institucional e acentuado desprezo pelas normas que regem o convívio social. Ademais, a arma utilizada para a prática delitiva possuía numeração suprimida, o que reforça o caráter ilícito e dolosamente premeditado da conduta, dificultando eventual rastreamento e apuração de origem do armamento. Embora tal elemento esteja vinculado, por vezes, ao tipo penal do art. 16 da Lei nº 10.826/2003, neste feito foi reconhecida a reclassificação para o art. 14, razão pela qual essa circunstância passa a assumir relevância como elemento agravador da forma de execução do disparo em análise. Em razão do reconhecimento da incidência de tal circunstância judicial, em regra, ter-se-ia a elevação da pena base 1/8 (um oitavo); ocorre que, diante dos fatos narrados, tem-se que estes são especialmente reprováveis, de modo que obedecer o critério fracionário, como comumente se faz, seria medida desproporcional, isto porque, a gravidade e a quantidade das circunstâncias narradas acima ensejam um maior grau de reprovabilidade. Não se pode esquecer que o pressuposto da proporcionalidade exige do julgador não somente que se guie a fim de evitar cometer excessos, mas também que se guie a fim de que o bem jurídico tutelado não seja insuficientemente protegido. Desta feita, a repressão regular ao crime, na forma fracional ordinariamente aplicada, diante dos fatos, exprime insuficiência na sanção. Este entendimento encontra guarida nos julgados do STJ, de forma que a fração aplicada não constitui direito subjetivo do réu, podendo ser alterada desde que devidamente fundamentada com fatos devidamente demonstrados e devidamente ligados ao réu. Neste sentido, destaca-se os seguintes julgados: AgRg no AREsp 2249221/SC. RELATOR: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 23/05/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 26/05/2023. EMENTA. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.OMISSÃO INEXISTENTE. REFAZIMENTO DA DOSIMETRIA DA PENA. ADMISSÃO APENAS EM CASOS DE ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. DIREITO SUBJETIVO À UTILIZAÇÃO DE FRAÇÕES ESPECÍFICAS. INEXISTÊNCIA. FRAÇÃO DE 1/6 DIANTE DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. ART. 42 DA LEI N. 11.343/06. PREPONDERÂNCIA SOBRE O ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - CP. FRAÇÃO DE 1/5. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. SÚMULA N. 83/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDA. REDUTORA. INAPLICABILIDADE. REINCIDÊNCIA GENÉRICA E MAUS ANTECEDENTES. REVISÃO DA PRISÃO PREVENTIVA E PLEITO DE LIMINAR PARA CONCESSÃO DE LIBERDADE NOS AUTOS DESTE AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INCOMPETÊNCIA. TRÁFICO DE DROGAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Corte estadual não foi omissa e bem fundamentou o indeferimento dos pleitos defensivos, adotando entendimentos já consolidados no que diz respeito à pena-base e ao privilégio do delito de tráfico, ainda que de forma contrária a pretendida. 2. O refazimento da dosimetria da pena neste Superior Tribunal de Justiça tem caráter excepcional, somente admitido sob a existência de manifesta ilegalidade, hipótese não configurada nestes autos, sob pena de incidência da Súmula n. 7/STJ. 3. Destaca-se o fato de o réu não ter direito subjetivo à utilização de frações específicas para cada circunstância judicial negativa (1/8 do intervalo ou 1/6 da pena), não sendo tais parâmetros obrigatórios, porque o que se exige das instâncias ordinárias é a fundamentação adequada e a proporcionalidade na exasperação da pena. 3.1. No caso, ao exasperar a reprimenda inaugural em razão dos antecedentes, o togado majorou a pena em 1/6, fração que não se apresenta absurda segundo os parâmetros da jurisprudência. 4. O art. 42 da Lei n. 11.343/06 preconiza que a natureza e a quantidade do entorpecente tem preponderância sobre o previsto no art. 59 do CP, razão porque o acréscimo de 1/5 na pena não se revela desproporcional. 5. A incidência das Súmulas ns. 83/STJ e 7/STJ afastam a possibilidade de conhecimento da divergência jurisprudencial. 6. Quanto à aplicação da redutora de pena do § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/06, a presença de reincidência, ainda que genérica, afasta a possibilidade. Não se olvide que o recorrente também possui antecedentes criminais, o que também inviabiliza o privilégio. 7. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça, por meio de pedido de liminar nos autos do agravo em recurso especial, efetivar a revisão da custódia preventiva, na forma do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal. 8. Agravo regimental desprovido. AgRg no HC 811085/SC. RELATOR: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 27/04/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 03/05/2023. EMENTA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DOSIMETRIA. PENA-BASE. NEGATIVAÇÃO DA CULPABILIDADE EM RAZÃO DA TENRA IDADE DA VÍTIMA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Inexiste maltrato ao princípio da colegialidade, pois, consoante disposições do Regimento Interno desta Corte, o relator deve fazer um estudo prévio da viabilidade do habeas corpus, podendo, inclusive, decidi-lo monocraticamente (art. 34, XX, do RISTJ). Por outro lado, a parte possui mecanismos processuais de submeter a controvérsia ao órgão colegiado por meio do competente agravo regimental, o que supera eventual mácula da decisão singular do Relator. 2. Como é cediço, a revisão da dosimetria da pena, na via do habeas corpus, somente é possível em situações excepcionais de manifesta ilegalidade ou abuso de poder, cujo reconhecimento ocorra de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios (HC n. 304.083/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 12/3/2015). Nesse contexto, a exasperação da pena-base deve estar fundamentada em dados concretos extraídos da conduta imputada ao acusado, os quais devem desbordar dos elementos próprios do tipo penal. 3. Na hipótese, a Corte local manteve apenas o desvalor conferido à culpabilidade do paciente, por entender que esta extrapolou os limites da normalidade para este tipo de crime, em razão da tenra idade da vítima, que contava com apenas 6 anos à época da prática delitiva, e da fragilidade do seu corpo e do órgão genital. 4. Apesar de a idade da vítima constituir elemento integrante do tipo penal descrito no art. 217-A do CP, ela pode ser considerada como fundamento para exasperação da pena-base quando se tratar de vítima de tenra idade, como no caso dos autos. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido. Assim, posto que suficientemente comprovadas as imputações que deram origem ao entendimento aqui adotado, usa-se a fração de 1/6 (um sexto) entre a diferença do máximo e o mínimo legal para majorar tal circunstância, o que totaliza o valor de 4 (quatro) meses. Assim, acrescentando-se tal valor a pena-base, estabelece-se o total de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Consequências do Crime: próprias do tipo, ainda que nefastas. Comportamento da Vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal , estabelecendo-se em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. b.2) da segunda fase Agravantes: reconhece-se a incidência da agravante prevista no art. 61, II, b do Código Penal, uma vez que os disparos de arma de fogo foram efetuados com o claro propósito de assegurar a impunidade de outros delitos praticados no mesmo contexto, notadamente o porte ilegal de arma de fogo e a receptação e adulteração do emplecamento da motocicleta utilizada na fuga. Assim, acrescenta-se a fração de 1/6 à pena intermediária, totalizando 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, estabelece-se a pena intermediária em 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de disparo de arma de fogo no patamar de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.4) da multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. C) DA UNIFICAÇÃO DE PENAS PELO CONCURSO MATERIAL, DA PENA DEFINITIVA E DO REGIME PRISIONAL O concurso material de crimes se configura quando o agente pratica dois ou mais delitos de maneira autônoma e independente, sem que haja relação de continuidade ou conexão entre eles, o que leva à aplicação das penas de forma cumulativa. No presente caso, restou demonstrado que os delitos de receptação e disparo de arma de fogo foram praticados mediante condutas autônomas, com desígnios distintos, ainda que no mesmo contexto fático. A receptação teve por objeto a posse de motocicleta com restrição de roubo, enquanto o crime de disparo de arma de fogo consistiu nos tiros efetuados contra a guarnição policial no momento da tentativa de abordagem. Verifica-se que a motocicleta já se encontrava na posse dos indivíduos antes mesmo da tentativa de fuga, configurando o crime de receptação de forma prévia e autônoma ao subsequente ato de resistência à ação policial. Por sua vez, os disparos efetuados em direção aos agentes de segurança pública tiveram como finalidade obstar a atuação estatal, caracterizando nova conduta delitiva, com motivação e objeto distintos. Trata-se, portanto, de ações independentes, praticadas em contextos diferenciados, ainda que próximos no tempo, direcionadas a lesar vítimas diversas, impondo-se o reconhecimento do concurso material de crimes, na forma do art. 69 do Código Penal, com a consequente soma das penas aplicadas aos delitos de forma cumulativa. Pelo exposto, reúno as penas anteriormente estabelecidas para cada tipo penal, perfazendo-as no patamar definitivo de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, a serem cumpridos em regime inicial SEMIABERTO, à luz do art. 33, §2º, b do Código Penal. D) DA UNIFICAÇÃO DAS PENAS DE MULTA A regra para aplicação da pena de multa, no caso de concurso de crimes, está no artigo 72 do Código Penal, segundo o qual: Art. 72, CP. No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente Pelo exposto, somando-se a multa aplicada a cada um dos crimes, estabelece-se a multa definitiva no patamar de 200 (duzentos) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa. e) Da detração da pena O acusado foi preso preventivamente na data de 24/06/2017 e posto em liberdade provisória no dia 04/07/2017, totalizando 10 dias de custódia preventiva, restando, portanto, o lapso temporal de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão. f) Substituição da pena Inaplicável ao caso, tendo em vista que a pena se encontra em patamar superior a 4 (quatro) anos e que o crime, por sua própria natureza, foi cometido mediante violência, nos termos do art. 44, I do CP. g) Das custas Por ser assistido da Defensoria Pública, presumo a vulnerabilidade financeira e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. h) Do valor mínimo de indenização O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não aferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. i) Do direito de recorrer em liberdade O réu poderá recorrer em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. V DAS DEMAIS DISPOSIÇÕES Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação pessoal do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Cientifique-se o Ministério Público e a Defensoria Pública. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado e proceda-se à execução do réu, com o encaminhamento dos autos ao juízo competente, nos termos que estabelece o regramento interno deste Tribunal de Justiça. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. À secretaria para as procedências de praxe. Cumpra-se.
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30/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIOSENTENÇA Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público que busca a responsabilização criminal de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA pelas condutas descritas no art. 15 e 16, §ú, IV, ambos da Lei nº 10.826/2003 e art. 180, caput do Código Penal, e ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR pelas condutas descritas no art. 16, §ú, IV da Lei nº 10.826/2003 e arts. 180, caput e 311, ambos do Código Penal, por fatos que se deram na data de 24/06/2017. Acusados presos em flagrante no dia 24/06/2017 (mov. 1.1); Concedida a liberdade provisória aos acusados mediante pagamento de fiança por decisão proferida na data de 28/06/2017 (mov. 12.1); Acusado ANDRÉ posto em liberdade no dia 04/07/2017 (mov. 24.1); Acusado ANTONIO posto em liberdade no dia 12/07/2018 (mov. 33.1); Denúncia oferecida no dia 12/03/2020 (mov. 62.1) e recebida no dia 14/05/2020 (mov. 69.1); Resposta à acusação apresentada pelo acusado ANDRÉ no dia 24/11/2020 (mov. 101.1); Acusado ANTONIO citado por edital no dia 09/06/2022 (mov. 123.1); Suspensão do processo e do prazo prescricional quanto ao acusado ANTONIO decretada em 23/09/2022 (mov. 126.1); Audiência de instrução e julgamento realizada na data de 14/04/2025, onde foi decretada a revelia do acusado, bem como foram apresentadas alegações finais orais tanto pelo Ministério Público quanto pela defesa do réu (mov. 170.1); Das peças policiais, extrai-se: 1. Depoimento na delegacia da testemunha Greison Ferreira Duarte, policial militar condutor da prisão em flagrante (mov. 1.4 e mov. 1.5); 2. Auto de exibição de objetos apreendidos (mov. 1.6); 3. Depoimento na delegacia da testemunha Jimmys Silveira de Castro, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.8); 4. Depoimento na delegacia da testemunha William Moreno Turman, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.9); 5. Interrogatório do acusado ANDRÉ perante a Autoridade Policial (mov. 1.13 e mov. 1.14); 6. Interrogatório do acusado ANTONIO perante a Autoridade Policial (mov. 1.16 e mov. 1.17); 7. Laudo de perícia em veículo (mov. 1.27, mov. 1.28, mov. 1.29, mov. 1.30 e mov. 1.31); 8. Restrição de roubo da motocicleta apreendida (mov. 29.34); 9. Laudo de exame em arma de fogo e munições (mov. 43.2-4); São os relatos. Fundamento e decido. I DO MÉRITO Prima facie, da prova produzida em audiência, trago: TESTEMUNHA GREISON FERREIRA DUARTE (POLICIAL MILITAR) - Relata que estava em patrulhamento com sua equipe policial, quando avistou os acusados em atitude suspeita andando de motocicleta; - Relata que sua equipe fez um retorno na via e deu ordem de parada aos acusados, contudo, estes empreenderam fuga; - Relata que, durante a perseguição aos acusados, estes colidiram com uma placa de sinalização nas proximidades da Câmara Municipal, vindo a cair ao solo; - Informa que populares tentaram agredir os acusados, o que dificultou o cumprimento da prisão em flagrante; - Relata que ao realizar a revista dos acusados, fora encontrada a arma de fogo com munições deflagradas, além de adulteração na motocicleta conduzida pelos réus; - Relata que efetuaram a prisão dos acusados e os levaram até a delegacia de polícia junto com os materiais apreendidos; - Informa que a arma de fogo apreendida estava com a numeração suprimida; - Informa que a arma de fogo se tratava de um Revólver da marca Taurus; - Informa que o acusado que estava na garupa efetuou 2 (dois) disparos em direção a sua guarnição; - Informa que o que fez com que sua equipe suspeitasse dos acusados foi que, ao avistarem a placa da motocicleta, perceberam que havia um objeto, similar a uma fita, que impedia identificar a numeração do veículo; - Informa que a equipe policial encontrava-se dividida em duas motocicletas, sendo ele um dos pilotos; - Informa que conduzia sua motocicleta sozinho e seus outros 2 (dois) colegas, as testemunhas JIMMYS e WILLIAM, estavam na outra; - Informa que o acusado que estava na garupa era de estatura mediana, de cor de pele clara e com o cabelo pintado; - Informa que o que acusado que estava na garupa, depois de colidir com a placa, tentou fugir para um rio próximo ao local, porém, foi impedido por populares; - Informa que o revólver foi encontrado na cintura do acusado. TESTEMUNHA JIMMYS SILVEIRA DE CASTRO (POLICIAL MILITAR) - Relata que sua equipe policial perseguiu os acusados após estes empreenderem fuga, contudo, estes acabaram colidindo e caindo no chão perto da Câmara Municipal; - Relata que os acusados realizaram 2 (dois) disparos de arma de fogo contra a guarnição durante a fuga; - Informa que não conhecia os acusados de outras ocorrências; - Informa que só conseguiram prender os acusados após eles colidirem com uma placa de trânsito; - Relata que um dos acusados ainda tentou correr para dentro de um rio, porém, seu colega conseguiu efetuar sua prisão; - Informa que o outro acusado permaneceu no chão; - Informa que efetuava o patrulhamento com sua equipe policial através do uso de motocicletas; - Informa que na ocasião, estava na garupa. TESTEMUNHA WILLIAM MONTEIRO TURMAN (POLICIAL MILITAR) - Relata que os acusados empreenderam fuga, contudo, acabaram colidindo com uma placa e caindo no chão; - Relata que um dos acusados tentou fugir em direção aos flutuantes, porém, conseguiu realizar sua detenção; - Informa que não foi o policial responsável pelo recolhimento da arma de fogo apreendida. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA Foi decretada a revelia do acusado, nos termos do art. 367 do Código de Processo Penal, em razão da mudança de domicílio sem a devida comunicação do novo endereço ao juízo. Com base em tais depoimentos, passo a análise da materialidade e da autoria delitiva. 1. DA MATERIALIDADE a) Do crime de receptação (art. 180 do Código Penal) A materialidade do crime de receptação encontra-se satisfatoriamente comprovada nos autos, especialmente no que tange à motocicleta utilizada pelos indivíduos no momento da prática delitiva, a qual possuía restrição de roubo e apresentava adulteração em sua placa identificadora, conforme narrado pelas testemunhas policiais e corroborado pelos laudos técnicos constantes dos autos. De acordo com o depoimento prestado pelo policial militar Greison Ferreira Duarte, a guarnição identificou comportamento suspeito por parte dos ocupantes da motocicleta, momento em que observou que a placa estava parcialmente encoberta por uma fita, dificultando sua identificação. Tal percepção motivou a tentativa de abordagem, frustrada inicialmente pela fuga dos indivíduos, culminando em perseguição até a colisão com uma placa de sinalização, ocasião em que foram detidos. Ainda conforme os relatos dos demais integrantes da equipe policial Jimmys Silveira De Castro E William Monteiro Turman, os autores do delito tentaram evadir-se do local, sendo necessário o uso de força policial para contê-los. A motocicleta foi apreendida e submetida à perícia oficial. Os Laudos de Perícia em Veículo Automotor constantes dos movs. 1.27, 1.28, 1.29, 1.30 e 1.31 demonstram, de forma objetiva, que o veículo em questão uma motocicleta Honda/Bros, de cor preta, com placa adulterada NOT 0328 possuía sinais de fraude documental e alteração no sistema de identificação veicular, tendo sido identificado que a numeração original da placa era NOT 0329, com a adulteração do dígito final (de "9" para "8") por meio de uso de fita isolante. Além disso, a consulta ao cadastro do veículo (mov. 29.34) revelou a existência de restrição de roubo, indicando que os ocupantes estavam na posse de bem produto de crime, tratando-se de motocicleta subtraída de seu legítimo proprietário Reinaldo Costa Leal Filho. A condução do veículo com a placa adulterada e com a restrição de furto/roubo caracteriza a receptação dolosa, uma vez que as circunstâncias em que se deu a abordagem e os elementos constatados na investigação revelam que os indivíduos tinham ciência da origem ilícita do bem. A materialidade, portanto, está plenamente evidenciada pela combinação entre os relatos testemunhais, os laudos periciais e o histórico de restrição do veículo, não restando dúvidas quanto ao cometimento do crime de receptação quanto à motocicleta utilizada pelos autores do delito durante a empreitada criminosa, nos moldes do art.180 do Código Penal. b) Dos crimes da Lei nº 10.826/2003 b.1) Do disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003) A materialidade do crime previsto de disparo de arma de fogo em via pública encontra-se plenamente demonstrada nos autos, com base no conjunto probatório colhido na fase inquisitorial e reforçado durante a instrução processual. As testemunhas Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, todos policiais militares que participaram da abordagem, relataram de forma coerente e convergente que, ao tentarem realizar a abordagem dos indivíduos que transitavam em uma motocicleta em atitude suspeita, estes empreenderam fuga e, durante a perseguição, foram efetuados dois disparos de arma de fogo na direção da guarnição policial. Segundo o policial Greison, após a detenção dos agentes e realização da revista pessoal, foi localizada uma arma de fogo do tipo revólver, marca Taurus, com a numeração suprimida, acondicionada na cintura de um dos ocupantes da motocicleta, que havia sido o responsável pelos disparos. No mesmo sentido, a testemunha Jimmys Silveira confirmou que os disparos ocorreram em meio à perseguição, fato que também foi parcialmente confirmado por William Turman, que participou da ação e auxiliou na contenção dos indivíduos. A eficiência da arma de fogo para a produção de disparos foi confirmada pelo laudo de perícia técnica (movs. 43.2/43.4), atestando tratar-se de revólver em perfeito estado de funcionamento. Além disso, consta nos autos o auto de exibição e apreensão (mov. 1.6), que documenta a apreensão de duas munições calibre 28 deflagradas, compatíveis com os disparos mencionados pelas testemunhas, reforçando a comprovação da conduta típica. Assim, a partir da análise dos elementos de convicção constantes nos autos, constata-se a existência de provas materiais diretas e idôneas da ocorrência do delito de disparo de arma de fogo, sendo a conduta típica, antijurídica e punível nos moldes do art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b.2) Do porte de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) - necessária reclassificação A materialidade delitiva relativa ao porte de arma de fogo encontra-se devidamente comprovada nos autos, especialmente pelo Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.6), que registrou a apreensão de um revólver da marca Taurus, calibre .38, contendo munições, localizado na cintura de um dos indivíduos no momento da abordagem, bem como pelo Laudo de Perícia Técnica (movs. 43.2/43.4), que atestou que a arma estava em perfeito estado de funcionamento, apta à produção de disparos. Contudo, ao proceder à análise do tipo penal imputado na denúncia, qual seja, o art. 16 da Lei nº 10.826/2003, que trata do porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, verifica-se que a imputação jurídica não se coaduna com os fatos à luz da legislação vigente à época dos fatos. A conduta delituosa em análise ocorreu em junho de 2017, e, conforme se extrai do próprio auto de apreensão e do laudo pericial, trata-se de arma de fogo calibre .38, a qual, naquele período, era classificada como de uso permitido. Ademais, em que pese a numeração da arma estar suprimida, a equiparação expressa entre armas com sinal identificador suprimido e armamento de uso restrito só foi introduzida no ordenamento jurídico em 2019 através da Lei nº 13.964, que alterou o §1º do art. 16 da Lei nº 10.826/2003. Dessa forma, a imputação de crime de porte ilegal de arma de uso restrito, com base na supressão da numeração, não pode retroagir para atingir fatos anteriores à referida alteração legislativa, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade e da irretroatividade da lei penal mais gravosa, previsto no art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal. Conforme disciplina o art. 383 do Código de Processo Penal, o juiz poderá, sem modificar a descrição fática contida na denúncia, dar ao fato definição jurídica diversa da que nela houver sido atribuída, promovendo a chamada emendatio libelli. Assim, diante da impossibilidade de aplicação do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 aos fatos praticados em 2017, impõe-se a reclassificação da conduta para o tipo previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, qual seja, o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, que melhor se adequa à realidade fática e normativa então vigente. Pelo exposto, com fulcro no art. 383 do CPP, RECLASSIFICO A CONDUTA IMPUTADA para o crime previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, permanecendo incólume a narrativa fática contida na denúncia. c.3) Do necessário reconhecimento da consunção entre o crime de porte de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) No presente caso, a análise do conjunto fático-probatório dos autos evidencia que os agentes foram flagrados portando arma de fogo com a numeração suprimida, a qual foi utilizada momentos depois para a prática de disparos em via pública, especificamente na direção da guarnição policial que realizava o acompanhamento tático. Conforme narrado pelas testemunhas policiais Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, os disparos de arma de fogo ocorreram durante a perseguição policial, logo após a visualização da placa adulterada da motocicleta e a tentativa de abordagem. Em tal contexto, resta demonstrado que o porte da arma de fogo foi instrumental para a execução do delito de disparo, razão pela qual o crime de porte ilegal de arma de fogo se consome na prática do disparo, devendo incidir a regra da consunção. O princípio da consunção, amplamente reconhecido pela jurisprudência pátria, estabelece que o crime-meio é absorvido pelo crime-fim, quando este último é praticado mediante a utilização do primeiro como etapa necessária ou preparatória. Trata-se de aplicação do critério da especialidade e da subsidiariedade implícita, em que o tipo penal mais abrangente ou mais grave prevalece. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu: PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA E DISPARO DE ARMA DE FOGO - ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ART. 15 , DA LEI 10.826/03 - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - CONDENAÇÃO MANTIDA - APLICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO - CRIME DE PORTE DE ARMA ABSORVIDO PELO CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO - REDUÇÃO DA PENA-BASE - NECESSIDADE - EQUÍVOCO NA ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - MITIGAÇÃO DO REGIME PRISIONAL - NÃO CABIMENTO - ACUSADO REINCIDENTE - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - IMPOSSIBILIDADE - APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DETRAÇÃO - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO - ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DO DEFENSOR DATIVO - CABIMENTO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. DE OFÍCIO, APLICADO O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. 01. Se o conjunto probatório dos autos se mostra irrefutável quanto à prática do delito de disparo de arma de fogo pelo acusado, impossível acolher o pleito absolutório. 02. O delito de disparo de arma de fogo (art. 15, caput, da Lei 10.826/03) absorve o crime de porte irregular de arma de fogo, ainda que com numeração de série suprimida, quando este se afigura como crime-meio daquele. 03. Se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP são favoráveis ao agente, mister a fixação da pena-base em seu patamar mínimo-legal. 04. Nos termos do que dispõe o art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, entende-se que a condição de reincidente do acusado é fundamento idôneo para justificar a imposição do regime prisional semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, mesmo nos casos em que o agente não foi submetido a uma pena corporal superior a quatro (04) anos. 05. Em se tratando de acusado reincidente, não há falar-se em substituição da pena privativa de liberdade por outras penas restritivas de direitos, sobretudo quando as particularidades do caso concreto demonstrarem que o benefício não é socialmente recomendável. 06. O Juízo da Execução detém melhores condições de conceder ao acusado os benefícios decorrentes da detração penal, porque não basta mero cálculo aritmético para se efetivar a medida, revelando-se necessário averiguar o mérito, as condições e a conduta pessoal do apenado. 07. Os honorários advocatícios do Defensor Dativo devem ser fixados em conformidade com o que dispõem os arts. 272 da Constituição do Estado de Minas Gerais; 22, § 1º, da Lei 8.906/94 ( Estatuto da Advocacia) e 1º, § 1º, da Lei Estadual 13.166/99. (STJ - AREsp: 2324371, Relator.: ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Publicação: 03/08/2023) Dessa forma, reconhecendo-se que o porte da arma de fogo teve como finalidade imediata a prática dos disparos em via pública e contra a guarnição policial, impõe-se o reconhecimento da consunção entre os delitos de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), permanecendo este último como a infração penal subsistente para fins de persecução penal. Passo à análise da autoria. 2. DA AUTORIA A autoria dos fatos imputados ao acusado ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA restou satisfatoriamente comprovada diante da robustez dos elementos probatórios constantes dos autos, especialmente os relatos colhidos em sede de audiência de instrução e julgamento, prestados pelas testemunhas policiais que atuaram diretamente na ocorrência. Segundo relato da testemunha Greison Ferreira Duarte, os policiais militares encontravam-se em patrulhamento quando avistaram os indivíduos em atitude suspeita, trafegando em uma motocicleta com a placa parcialmente encoberta por um objeto semelhante a uma fita. Ao ser dada ordem de parada, os agentes empreenderam fuga, momento em que o passageiro da garupa efetuou dois disparos de arma de fogo em direção à guarnição. Durante a perseguição, os indivíduos colidiram com uma placa de sinalização, vindo a cair. O policial destacou que o indivíduo que estava na garupa, posteriormente impedido de fugir por populares, foi flagrado portando um revólver calibre .38 da marca Taurus, com numeração suprimida, que se encontrava em sua cintura no momento da prisão. As testemunhas Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman corroboraram os relatos, confirmando que os disparos foram efetuados pelo passageiro da motocicleta durante a tentativa de fuga, e que este tentou evadir-se para a área de flutuantes, sendo capturado com auxílio de populares. Ademais, as investigações policiais identificaram o réu ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA como o indivíduo que se encontrava na garupa da motocicleta no momento da ação delitiva, portando a arma de fogo e realizando os disparos contra os policiais. Já o condutor da motocicleta foi identificado como ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR, o qual permaneceu no local após a colisão. Tais circunstâncias, aliadas à apreensão da arma com numeração raspada na posse de ANDRÉ, à coincidência física com a descrição feita no momento dos fatos, bem como à atuação coordenada com o condutor da motocicleta, demonstram de forma segura sua efetiva participação na empreitada criminosa, razão pela qual reconheço a autoria delitiva do acusado quanto aos crimes imputados. A conduta dolosa do acusado, evidenciada pelo cumprimento integral do iter criminis e pela efetiva produção do resultado lesivo, permite a perfeita subsunção do fato à norma penal incriminadora, preenchendo-se todos os elementos do tipo penal. Verificada a ausência de causas excludentes da ilicitude e da culpabilidade, bem como inexistindo quaisquer óbices à punibilidade do agente, impõe-se o reconhecimento da antijuridicidade e da culpabilidade da conduta. Dessa forma, estando comprovada a materialidade e a autoria delitiva, mostra-se imperiosa a procedência do pedido condenatório formulado na denúncia. II DO DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para: a) condenar ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA às penas do art. 180 do Código Penal e art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b) reclassificar a conduta de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA, referente ao porte de arma de fogo, para aquela descrita no art. 14 da Lei nº 10.826/2003 c) reconhecer a consunção entre os crimes de porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), absorvendo-se o primeiro em razão da progressão criminosa Com efeito, passo à dosimetria. III - DA DOSIMETRIA A) Quanto ao crime de receptação a.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 03 (três) anos (Pena: de 01 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra. No caso em tela, percebe-se a intensidade do dolo no agir do condenado é inerente ao tipo penal em questão, razão pela qual a exasperação da pena, com ênfase na culpabilidade, já foi predeterminada pelo legislador quando da fixação do mínimo e do máximo de pena que poderá ser imputada para o mencionado crime. Antecedentes: o acusado não possui condenação transitada em julgado. Conduta Social: Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias que engloboram o crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme apurado nos autos, a motocicleta objeto da receptação não foi apenas mantida em posse de forma passiva ou por simples ocultação, mas sim efetivamente utilizada na execução de nova empreitada criminosa, sendo empregada como meio de fuga durante perseguição policial e no contexto de disparos de arma de fogo contra os agentes de segurança pública. Diante disso, valoro negativamente a circunstância judicial relativa às circunstâncias do crime, acrescentando a fração de 1/8 (4 quatro meses e 15 dias) à pena-base, totalizando 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Consequências do Crime: as esperadas, ainda que nefastas. Comportamento da vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal, estabelecendo-se em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.2) da segunda fase Agravantes: ausentes circunstâncias agravantes. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, mantém-se a pena intermediária em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de receptação no patamar de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.4) da pena de multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. B) Quanto ao crime de disparo de arma de fogo b.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 02 (dois) anos (Pena: de 02 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 3 (três) meses, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: a culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra, na medida que não há elementos suficientes nos autos capazes de elevar a reprovabilidade da conduta, além daqueles que são inerentes ao tipo. Antecedentes: sem condenações transitadas em julgado. Conduta Social: não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias do crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme amplamente demonstrado nos autos, os disparos foram direcionados contra guarnição da Polícia Militar que se encontrava em serviço regular de patrulhamento urbano. Tal conduta não apenas colocou em risco a integridade física dos agentes de segurança, como também representou grave afronta à autoridade pública, evidenciando desrespeito à ordem institucional e acentuado desprezo pelas normas que regem o convívio social. Ademais, a arma utilizada para a prática delitiva possuía numeração suprimida, o que reforça o caráter ilícito e dolosamente premeditado da conduta, dificultando eventual rastreamento e apuração de origem do armamento. Embora tal elemento esteja vinculado, por vezes, ao tipo penal do art. 16 da Lei nº 10.826/2003, neste feito foi reconhecida a reclassificação para o art. 14, razão pela qual essa circunstância passa a assumir relevância como elemento agravador da forma de execução do disparo em análise. Em razão do reconhecimento da incidência de tal circunstância judicial, em regra, ter-se-ia a elevação da pena base 1/8 (um oitavo); ocorre que, diante dos fatos narrados, tem-se que estes são especialmente reprováveis, de modo que obedecer o critério fracionário, como comumente se faz, seria medida desproporcional, isto porque, a gravidade e a quantidade das circunstâncias narradas acima ensejam um maior grau de reprovabilidade. Não se pode esquecer que o pressuposto da proporcionalidade exige do julgador não somente que se guie a fim de evitar cometer excessos, mas também que se guie a fim de que o bem jurídico tutelado não seja insuficientemente protegido. Desta feita, a repressão regular ao crime, na forma fracional ordinariamente aplicada, diante dos fatos, exprime insuficiência na sanção. Este entendimento encontra guarida nos julgados do STJ, de forma que a fração aplicada não constitui direito subjetivo do réu, podendo ser alterada desde que devidamente fundamentada com fatos devidamente demonstrados e devidamente ligados ao réu. Neste sentido, destaca-se os seguintes julgados: AgRg no AREsp 2249221/SC. RELATOR: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 23/05/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 26/05/2023. EMENTA. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.OMISSÃO INEXISTENTE. REFAZIMENTO DA DOSIMETRIA DA PENA. ADMISSÃO APENAS EM CASOS DE ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. DIREITO SUBJETIVO À UTILIZAÇÃO DE FRAÇÕES ESPECÍFICAS. INEXISTÊNCIA. FRAÇÃO DE 1/6 DIANTE DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. ART. 42 DA LEI N. 11.343/06. PREPONDERÂNCIA SOBRE O ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - CP. FRAÇÃO DE 1/5. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. SÚMULA N. 83/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDA. REDUTORA. INAPLICABILIDADE. REINCIDÊNCIA GENÉRICA E MAUS ANTECEDENTES. REVISÃO DA PRISÃO PREVENTIVA E PLEITO DE LIMINAR PARA CONCESSÃO DE LIBERDADE NOS AUTOS DESTE AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INCOMPETÊNCIA. TRÁFICO DE DROGAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Corte estadual não foi omissa e bem fundamentou o indeferimento dos pleitos defensivos, adotando entendimentos já consolidados no que diz respeito à pena-base e ao privilégio do delito de tráfico, ainda que de forma contrária a pretendida. 2. O refazimento da dosimetria da pena neste Superior Tribunal de Justiça tem caráter excepcional, somente admitido sob a existência de manifesta ilegalidade, hipótese não configurada nestes autos, sob pena de incidência da Súmula n. 7/STJ. 3. Destaca-se o fato de o réu não ter direito subjetivo à utilização de frações específicas para cada circunstância judicial negativa (1/8 do intervalo ou 1/6 da pena), não sendo tais parâmetros obrigatórios, porque o que se exige das instâncias ordinárias é a fundamentação adequada e a proporcionalidade na exasperação da pena. 3.1. No caso, ao exasperar a reprimenda inaugural em razão dos antecedentes, o togado majorou a pena em 1/6, fração que não se apresenta absurda segundo os parâmetros da jurisprudência. 4. O art. 42 da Lei n. 11.343/06 preconiza que a natureza e a quantidade do entorpecente tem preponderância sobre o previsto no art. 59 do CP, razão porque o acréscimo de 1/5 na pena não se revela desproporcional. 5. A incidência das Súmulas ns. 83/STJ e 7/STJ afastam a possibilidade de conhecimento da divergência jurisprudencial. 6. Quanto à aplicação da redutora de pena do § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/06, a presença de reincidência, ainda que genérica, afasta a possibilidade. Não se olvide que o recorrente também possui antecedentes criminais, o que também inviabiliza o privilégio. 7. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça, por meio de pedido de liminar nos autos do agravo em recurso especial, efetivar a revisão da custódia preventiva, na forma do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal. 8. Agravo regimental desprovido. AgRg no HC 811085/SC. RELATOR: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 27/04/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 03/05/2023. EMENTA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DOSIMETRIA. PENA-BASE. NEGATIVAÇÃO DA CULPABILIDADE EM RAZÃO DA TENRA IDADE DA VÍTIMA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Inexiste maltrato ao princípio da colegialidade, pois, consoante disposições do Regimento Interno desta Corte, o relator deve fazer um estudo prévio da viabilidade do habeas corpus, podendo, inclusive, decidi-lo monocraticamente (art. 34, XX, do RISTJ). Por outro lado, a parte possui mecanismos processuais de submeter a controvérsia ao órgão colegiado por meio do competente agravo regimental, o que supera eventual mácula da decisão singular do Relator. 2. Como é cediço, a revisão da dosimetria da pena, na via do habeas corpus, somente é possível em situações excepcionais de manifesta ilegalidade ou abuso de poder, cujo reconhecimento ocorra de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios (HC n. 304.083/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 12/3/2015). Nesse contexto, a exasperação da pena-base deve estar fundamentada em dados concretos extraídos da conduta imputada ao acusado, os quais devem desbordar dos elementos próprios do tipo penal. 3. Na hipótese, a Corte local manteve apenas o desvalor conferido à culpabilidade do paciente, por entender que esta extrapolou os limites da normalidade para este tipo de crime, em razão da tenra idade da vítima, que contava com apenas 6 anos à época da prática delitiva, e da fragilidade do seu corpo e do órgão genital. 4. Apesar de a idade da vítima constituir elemento integrante do tipo penal descrito no art. 217-A do CP, ela pode ser considerada como fundamento para exasperação da pena-base quando se tratar de vítima de tenra idade, como no caso dos autos. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido. Assim, posto que suficientemente comprovadas as imputações que deram origem ao entendimento aqui adotado, usa-se a fração de 1/6 (um sexto) entre a diferença do máximo e o mínimo legal para majorar tal circunstância, o que totaliza o valor de 4 (quatro) meses. Assim, acrescentando-se tal valor a pena-base, estabelece-se o total de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Consequências do Crime: próprias do tipo, ainda que nefastas. Comportamento da Vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal , estabelecendo-se em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. b.2) da segunda fase Agravantes: reconhece-se a incidência da agravante prevista no art. 61, II, b do Código Penal, uma vez que os disparos de arma de fogo foram efetuados com o claro propósito de assegurar a impunidade de outros delitos praticados no mesmo contexto, notadamente o porte ilegal de arma de fogo e a receptação e adulteração do emplecamento da motocicleta utilizada na fuga. Assim, acrescenta-se a fração de 1/6 à pena intermediária, totalizando 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, estabelece-se a pena intermediária em 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de disparo de arma de fogo no patamar de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.4) da multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. C) DA UNIFICAÇÃO DE PENAS PELO CONCURSO MATERIAL, DA PENA DEFINITIVA E DO REGIME PRISIONAL O concurso material de crimes se configura quando o agente pratica dois ou mais delitos de maneira autônoma e independente, sem que haja relação de continuidade ou conexão entre eles, o que leva à aplicação das penas de forma cumulativa. No presente caso, restou demonstrado que os delitos de receptação e disparo de arma de fogo foram praticados mediante condutas autônomas, com desígnios distintos, ainda que no mesmo contexto fático. A receptação teve por objeto a posse de motocicleta com restrição de roubo, enquanto o crime de disparo de arma de fogo consistiu nos tiros efetuados contra a guarnição policial no momento da tentativa de abordagem. Verifica-se que a motocicleta já se encontrava na posse dos indivíduos antes mesmo da tentativa de fuga, configurando o crime de receptação de forma prévia e autônoma ao subsequente ato de resistência à ação policial. Por sua vez, os disparos efetuados em direção aos agentes de segurança pública tiveram como finalidade obstar a atuação estatal, caracterizando nova conduta delitiva, com motivação e objeto distintos. Trata-se, portanto, de ações independentes, praticadas em contextos diferenciados, ainda que próximos no tempo, direcionadas a lesar vítimas diversas, impondo-se o reconhecimento do concurso material de crimes, na forma do art. 69 do Código Penal, com a consequente soma das penas aplicadas aos delitos de forma cumulativa. Pelo exposto, reúno as penas anteriormente estabelecidas para cada tipo penal, perfazendo-as no patamar definitivo de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, a serem cumpridos em regime inicial SEMIABERTO, à luz do art. 33, §2º, b do Código Penal. D) DA UNIFICAÇÃO DAS PENAS DE MULTA A regra para aplicação da pena de multa, no caso de concurso de crimes, está no artigo 72 do Código Penal, segundo o qual: Art. 72, CP. No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente Pelo exposto, somando-se a multa aplicada a cada um dos crimes, estabelece-se a multa definitiva no patamar de 200 (duzentos) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa. e) Da detração da pena O acusado foi preso preventivamente na data de 24/06/2017 e posto em liberdade provisória no dia 04/07/2017, totalizando 10 dias de custódia preventiva, restando, portanto, o lapso temporal de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão. f) Substituição da pena Inaplicável ao caso, tendo em vista que a pena se encontra em patamar superior a 4 (quatro) anos e que o crime, por sua própria natureza, foi cometido mediante violência, nos termos do art. 44, I do CP. g) Das custas Por ser assistido da Defensoria Pública, presumo a vulnerabilidade financeira e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. h) Do valor mínimo de indenização O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não aferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. i) Do direito de recorrer em liberdade O réu poderá recorrer em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. V DAS DEMAIS DISPOSIÇÕES Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação pessoal do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Cientifique-se o Ministério Público e a Defensoria Pública. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado e proceda-se à execução do réu, com o encaminhamento dos autos ao juízo competente, nos termos que estabelece o regramento interno deste Tribunal de Justiça. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. À secretaria para as procedências de praxe. Cumpra-se.
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30/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara da Comarca de Manacapuru - Criminal | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIOSENTENÇA Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público que busca a responsabilização criminal de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA pelas condutas descritas no art. 15 e 16, §ú, IV, ambos da Lei nº 10.826/2003 e art. 180, caput do Código Penal, e ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR pelas condutas descritas no art. 16, §ú, IV da Lei nº 10.826/2003 e arts. 180, caput e 311, ambos do Código Penal, por fatos que se deram na data de 24/06/2017. Acusados presos em flagrante no dia 24/06/2017 (mov. 1.1); Concedida a liberdade provisória aos acusados mediante pagamento de fiança por decisão proferida na data de 28/06/2017 (mov. 12.1); Acusado ANDRÉ posto em liberdade no dia 04/07/2017 (mov. 24.1); Acusado ANTONIO posto em liberdade no dia 12/07/2018 (mov. 33.1); Denúncia oferecida no dia 12/03/2020 (mov. 62.1) e recebida no dia 14/05/2020 (mov. 69.1); Resposta à acusação apresentada pelo acusado ANDRÉ no dia 24/11/2020 (mov. 101.1); Acusado ANTONIO citado por edital no dia 09/06/2022 (mov. 123.1); Suspensão do processo e do prazo prescricional quanto ao acusado ANTONIO decretada em 23/09/2022 (mov. 126.1); Audiência de instrução e julgamento realizada na data de 14/04/2025, onde foi decretada a revelia do acusado, bem como foram apresentadas alegações finais orais tanto pelo Ministério Público quanto pela defesa do réu (mov. 170.1); Das peças policiais, extrai-se: 1. Depoimento na delegacia da testemunha Greison Ferreira Duarte, policial militar condutor da prisão em flagrante (mov. 1.4 e mov. 1.5); 2. Auto de exibição de objetos apreendidos (mov. 1.6); 3. Depoimento na delegacia da testemunha Jimmys Silveira de Castro, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.8); 4. Depoimento na delegacia da testemunha William Moreno Turman, policial militar que participou da prisão em flagrante (mov. 1.9); 5. Interrogatório do acusado ANDRÉ perante a Autoridade Policial (mov. 1.13 e mov. 1.14); 6. Interrogatório do acusado ANTONIO perante a Autoridade Policial (mov. 1.16 e mov. 1.17); 7. Laudo de perícia em veículo (mov. 1.27, mov. 1.28, mov. 1.29, mov. 1.30 e mov. 1.31); 8. Restrição de roubo da motocicleta apreendida (mov. 29.34); 9. Laudo de exame em arma de fogo e munições (mov. 43.2-4); São os relatos. Fundamento e decido. I DO MÉRITO Prima facie, da prova produzida em audiência, trago: TESTEMUNHA GREISON FERREIRA DUARTE (POLICIAL MILITAR) - Relata que estava em patrulhamento com sua equipe policial, quando avistou os acusados em atitude suspeita andando de motocicleta; - Relata que sua equipe fez um retorno na via e deu ordem de parada aos acusados, contudo, estes empreenderam fuga; - Relata que, durante a perseguição aos acusados, estes colidiram com uma placa de sinalização nas proximidades da Câmara Municipal, vindo a cair ao solo; - Informa que populares tentaram agredir os acusados, o que dificultou o cumprimento da prisão em flagrante; - Relata que ao realizar a revista dos acusados, fora encontrada a arma de fogo com munições deflagradas, além de adulteração na motocicleta conduzida pelos réus; - Relata que efetuaram a prisão dos acusados e os levaram até a delegacia de polícia junto com os materiais apreendidos; - Informa que a arma de fogo apreendida estava com a numeração suprimida; - Informa que a arma de fogo se tratava de um Revólver da marca Taurus; - Informa que o acusado que estava na garupa efetuou 2 (dois) disparos em direção a sua guarnição; - Informa que o que fez com que sua equipe suspeitasse dos acusados foi que, ao avistarem a placa da motocicleta, perceberam que havia um objeto, similar a uma fita, que impedia identificar a numeração do veículo; - Informa que a equipe policial encontrava-se dividida em duas motocicletas, sendo ele um dos pilotos; - Informa que conduzia sua motocicleta sozinho e seus outros 2 (dois) colegas, as testemunhas JIMMYS e WILLIAM, estavam na outra; - Informa que o acusado que estava na garupa era de estatura mediana, de cor de pele clara e com o cabelo pintado; - Informa que o que acusado que estava na garupa, depois de colidir com a placa, tentou fugir para um rio próximo ao local, porém, foi impedido por populares; - Informa que o revólver foi encontrado na cintura do acusado. TESTEMUNHA JIMMYS SILVEIRA DE CASTRO (POLICIAL MILITAR) - Relata que sua equipe policial perseguiu os acusados após estes empreenderem fuga, contudo, estes acabaram colidindo e caindo no chão perto da Câmara Municipal; - Relata que os acusados realizaram 2 (dois) disparos de arma de fogo contra a guarnição durante a fuga; - Informa que não conhecia os acusados de outras ocorrências; - Informa que só conseguiram prender os acusados após eles colidirem com uma placa de trânsito; - Relata que um dos acusados ainda tentou correr para dentro de um rio, porém, seu colega conseguiu efetuar sua prisão; - Informa que o outro acusado permaneceu no chão; - Informa que efetuava o patrulhamento com sua equipe policial através do uso de motocicletas; - Informa que na ocasião, estava na garupa. TESTEMUNHA WILLIAM MONTEIRO TURMAN (POLICIAL MILITAR) - Relata que os acusados empreenderam fuga, contudo, acabaram colidindo com uma placa e caindo no chão; - Relata que um dos acusados tentou fugir em direção aos flutuantes, porém, conseguiu realizar sua detenção; - Informa que não foi o policial responsável pelo recolhimento da arma de fogo apreendida. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA Foi decretada a revelia do acusado, nos termos do art. 367 do Código de Processo Penal, em razão da mudança de domicílio sem a devida comunicação do novo endereço ao juízo. Com base em tais depoimentos, passo a análise da materialidade e da autoria delitiva. 1. DA MATERIALIDADE a) Do crime de receptação (art. 180 do Código Penal) A materialidade do crime de receptação encontra-se satisfatoriamente comprovada nos autos, especialmente no que tange à motocicleta utilizada pelos indivíduos no momento da prática delitiva, a qual possuía restrição de roubo e apresentava adulteração em sua placa identificadora, conforme narrado pelas testemunhas policiais e corroborado pelos laudos técnicos constantes dos autos. De acordo com o depoimento prestado pelo policial militar Greison Ferreira Duarte, a guarnição identificou comportamento suspeito por parte dos ocupantes da motocicleta, momento em que observou que a placa estava parcialmente encoberta por uma fita, dificultando sua identificação. Tal percepção motivou a tentativa de abordagem, frustrada inicialmente pela fuga dos indivíduos, culminando em perseguição até a colisão com uma placa de sinalização, ocasião em que foram detidos. Ainda conforme os relatos dos demais integrantes da equipe policial Jimmys Silveira De Castro E William Monteiro Turman, os autores do delito tentaram evadir-se do local, sendo necessário o uso de força policial para contê-los. A motocicleta foi apreendida e submetida à perícia oficial. Os Laudos de Perícia em Veículo Automotor constantes dos movs. 1.27, 1.28, 1.29, 1.30 e 1.31 demonstram, de forma objetiva, que o veículo em questão uma motocicleta Honda/Bros, de cor preta, com placa adulterada NOT 0328 possuía sinais de fraude documental e alteração no sistema de identificação veicular, tendo sido identificado que a numeração original da placa era NOT 0329, com a adulteração do dígito final (de "9" para "8") por meio de uso de fita isolante. Além disso, a consulta ao cadastro do veículo (mov. 29.34) revelou a existência de restrição de roubo, indicando que os ocupantes estavam na posse de bem produto de crime, tratando-se de motocicleta subtraída de seu legítimo proprietário Reinaldo Costa Leal Filho. A condução do veículo com a placa adulterada e com a restrição de furto/roubo caracteriza a receptação dolosa, uma vez que as circunstâncias em que se deu a abordagem e os elementos constatados na investigação revelam que os indivíduos tinham ciência da origem ilícita do bem. A materialidade, portanto, está plenamente evidenciada pela combinação entre os relatos testemunhais, os laudos periciais e o histórico de restrição do veículo, não restando dúvidas quanto ao cometimento do crime de receptação quanto à motocicleta utilizada pelos autores do delito durante a empreitada criminosa, nos moldes do art.180 do Código Penal. b) Dos crimes da Lei nº 10.826/2003 b.1) Do disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003) A materialidade do crime previsto de disparo de arma de fogo em via pública encontra-se plenamente demonstrada nos autos, com base no conjunto probatório colhido na fase inquisitorial e reforçado durante a instrução processual. As testemunhas Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, todos policiais militares que participaram da abordagem, relataram de forma coerente e convergente que, ao tentarem realizar a abordagem dos indivíduos que transitavam em uma motocicleta em atitude suspeita, estes empreenderam fuga e, durante a perseguição, foram efetuados dois disparos de arma de fogo na direção da guarnição policial. Segundo o policial Greison, após a detenção dos agentes e realização da revista pessoal, foi localizada uma arma de fogo do tipo revólver, marca Taurus, com a numeração suprimida, acondicionada na cintura de um dos ocupantes da motocicleta, que havia sido o responsável pelos disparos. No mesmo sentido, a testemunha Jimmys Silveira confirmou que os disparos ocorreram em meio à perseguição, fato que também foi parcialmente confirmado por William Turman, que participou da ação e auxiliou na contenção dos indivíduos. A eficiência da arma de fogo para a produção de disparos foi confirmada pelo laudo de perícia técnica (movs. 43.2/43.4), atestando tratar-se de revólver em perfeito estado de funcionamento. Além disso, consta nos autos o auto de exibição e apreensão (mov. 1.6), que documenta a apreensão de duas munições calibre 28 deflagradas, compatíveis com os disparos mencionados pelas testemunhas, reforçando a comprovação da conduta típica. Assim, a partir da análise dos elementos de convicção constantes nos autos, constata-se a existência de provas materiais diretas e idôneas da ocorrência do delito de disparo de arma de fogo, sendo a conduta típica, antijurídica e punível nos moldes do art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b.2) Do porte de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) - necessária reclassificação A materialidade delitiva relativa ao porte de arma de fogo encontra-se devidamente comprovada nos autos, especialmente pelo Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.6), que registrou a apreensão de um revólver da marca Taurus, calibre .38, contendo munições, localizado na cintura de um dos indivíduos no momento da abordagem, bem como pelo Laudo de Perícia Técnica (movs. 43.2/43.4), que atestou que a arma estava em perfeito estado de funcionamento, apta à produção de disparos. Contudo, ao proceder à análise do tipo penal imputado na denúncia, qual seja, o art. 16 da Lei nº 10.826/2003, que trata do porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, verifica-se que a imputação jurídica não se coaduna com os fatos à luz da legislação vigente à época dos fatos. A conduta delituosa em análise ocorreu em junho de 2017, e, conforme se extrai do próprio auto de apreensão e do laudo pericial, trata-se de arma de fogo calibre .38, a qual, naquele período, era classificada como de uso permitido. Ademais, em que pese a numeração da arma estar suprimida, a equiparação expressa entre armas com sinal identificador suprimido e armamento de uso restrito só foi introduzida no ordenamento jurídico em 2019 através da Lei nº 13.964, que alterou o §1º do art. 16 da Lei nº 10.826/2003. Dessa forma, a imputação de crime de porte ilegal de arma de uso restrito, com base na supressão da numeração, não pode retroagir para atingir fatos anteriores à referida alteração legislativa, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade e da irretroatividade da lei penal mais gravosa, previsto no art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal. Conforme disciplina o art. 383 do Código de Processo Penal, o juiz poderá, sem modificar a descrição fática contida na denúncia, dar ao fato definição jurídica diversa da que nela houver sido atribuída, promovendo a chamada emendatio libelli. Assim, diante da impossibilidade de aplicação do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 aos fatos praticados em 2017, impõe-se a reclassificação da conduta para o tipo previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, qual seja, o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, que melhor se adequa à realidade fática e normativa então vigente. Pelo exposto, com fulcro no art. 383 do CPP, RECLASSIFICO A CONDUTA IMPUTADA para o crime previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, permanecendo incólume a narrativa fática contida na denúncia. c.3) Do necessário reconhecimento da consunção entre o crime de porte de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 16 da Lei nº 10.826/2003) No presente caso, a análise do conjunto fático-probatório dos autos evidencia que os agentes foram flagrados portando arma de fogo com a numeração suprimida, a qual foi utilizada momentos depois para a prática de disparos em via pública, especificamente na direção da guarnição policial que realizava o acompanhamento tático. Conforme narrado pelas testemunhas policiais Greison Ferreira Duarte, Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman, os disparos de arma de fogo ocorreram durante a perseguição policial, logo após a visualização da placa adulterada da motocicleta e a tentativa de abordagem. Em tal contexto, resta demonstrado que o porte da arma de fogo foi instrumental para a execução do delito de disparo, razão pela qual o crime de porte ilegal de arma de fogo se consome na prática do disparo, devendo incidir a regra da consunção. O princípio da consunção, amplamente reconhecido pela jurisprudência pátria, estabelece que o crime-meio é absorvido pelo crime-fim, quando este último é praticado mediante a utilização do primeiro como etapa necessária ou preparatória. Trata-se de aplicação do critério da especialidade e da subsidiariedade implícita, em que o tipo penal mais abrangente ou mais grave prevalece. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu: PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA E DISPARO DE ARMA DE FOGO - ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ART. 15 , DA LEI 10.826/03 - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - CONDENAÇÃO MANTIDA - APLICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO - CRIME DE PORTE DE ARMA ABSORVIDO PELO CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO - REDUÇÃO DA PENA-BASE - NECESSIDADE - EQUÍVOCO NA ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - MITIGAÇÃO DO REGIME PRISIONAL - NÃO CABIMENTO - ACUSADO REINCIDENTE - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - IMPOSSIBILIDADE - APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DETRAÇÃO - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO - ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DO DEFENSOR DATIVO - CABIMENTO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. DE OFÍCIO, APLICADO O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. 01. Se o conjunto probatório dos autos se mostra irrefutável quanto à prática do delito de disparo de arma de fogo pelo acusado, impossível acolher o pleito absolutório. 02. O delito de disparo de arma de fogo (art. 15, caput, da Lei 10.826/03) absorve o crime de porte irregular de arma de fogo, ainda que com numeração de série suprimida, quando este se afigura como crime-meio daquele. 03. Se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP são favoráveis ao agente, mister a fixação da pena-base em seu patamar mínimo-legal. 04. Nos termos do que dispõe o art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, entende-se que a condição de reincidente do acusado é fundamento idôneo para justificar a imposição do regime prisional semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, mesmo nos casos em que o agente não foi submetido a uma pena corporal superior a quatro (04) anos. 05. Em se tratando de acusado reincidente, não há falar-se em substituição da pena privativa de liberdade por outras penas restritivas de direitos, sobretudo quando as particularidades do caso concreto demonstrarem que o benefício não é socialmente recomendável. 06. O Juízo da Execução detém melhores condições de conceder ao acusado os benefícios decorrentes da detração penal, porque não basta mero cálculo aritmético para se efetivar a medida, revelando-se necessário averiguar o mérito, as condições e a conduta pessoal do apenado. 07. Os honorários advocatícios do Defensor Dativo devem ser fixados em conformidade com o que dispõem os arts. 272 da Constituição do Estado de Minas Gerais; 22, § 1º, da Lei 8.906/94 ( Estatuto da Advocacia) e 1º, § 1º, da Lei Estadual 13.166/99. (STJ - AREsp: 2324371, Relator.: ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Publicação: 03/08/2023) Dessa forma, reconhecendo-se que o porte da arma de fogo teve como finalidade imediata a prática dos disparos em via pública e contra a guarnição policial, impõe-se o reconhecimento da consunção entre os delitos de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), permanecendo este último como a infração penal subsistente para fins de persecução penal. Passo à análise da autoria. 2. DA AUTORIA A autoria dos fatos imputados ao acusado ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA restou satisfatoriamente comprovada diante da robustez dos elementos probatórios constantes dos autos, especialmente os relatos colhidos em sede de audiência de instrução e julgamento, prestados pelas testemunhas policiais que atuaram diretamente na ocorrência. Segundo relato da testemunha Greison Ferreira Duarte, os policiais militares encontravam-se em patrulhamento quando avistaram os indivíduos em atitude suspeita, trafegando em uma motocicleta com a placa parcialmente encoberta por um objeto semelhante a uma fita. Ao ser dada ordem de parada, os agentes empreenderam fuga, momento em que o passageiro da garupa efetuou dois disparos de arma de fogo em direção à guarnição. Durante a perseguição, os indivíduos colidiram com uma placa de sinalização, vindo a cair. O policial destacou que o indivíduo que estava na garupa, posteriormente impedido de fugir por populares, foi flagrado portando um revólver calibre .38 da marca Taurus, com numeração suprimida, que se encontrava em sua cintura no momento da prisão. As testemunhas Jimmys Silveira de Castro e William Monteiro Turman corroboraram os relatos, confirmando que os disparos foram efetuados pelo passageiro da motocicleta durante a tentativa de fuga, e que este tentou evadir-se para a área de flutuantes, sendo capturado com auxílio de populares. Ademais, as investigações policiais identificaram o réu ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA como o indivíduo que se encontrava na garupa da motocicleta no momento da ação delitiva, portando a arma de fogo e realizando os disparos contra os policiais. Já o condutor da motocicleta foi identificado como ANTONIO DO NASCIMENTO JUNIOR, o qual permaneceu no local após a colisão. Tais circunstâncias, aliadas à apreensão da arma com numeração raspada na posse de ANDRÉ, à coincidência física com a descrição feita no momento dos fatos, bem como à atuação coordenada com o condutor da motocicleta, demonstram de forma segura sua efetiva participação na empreitada criminosa, razão pela qual reconheço a autoria delitiva do acusado quanto aos crimes imputados. A conduta dolosa do acusado, evidenciada pelo cumprimento integral do iter criminis e pela efetiva produção do resultado lesivo, permite a perfeita subsunção do fato à norma penal incriminadora, preenchendo-se todos os elementos do tipo penal. Verificada a ausência de causas excludentes da ilicitude e da culpabilidade, bem como inexistindo quaisquer óbices à punibilidade do agente, impõe-se o reconhecimento da antijuridicidade e da culpabilidade da conduta. Dessa forma, estando comprovada a materialidade e a autoria delitiva, mostra-se imperiosa a procedência do pedido condenatório formulado na denúncia. II DO DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva formulada na exordial acusatória para: a) condenar ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA às penas do art. 180 do Código Penal e art. 15 da Lei nº 10.826/2003. b) reclassificar a conduta de ANDRÉ MONTEIRO DE SOUZA, referente ao porte de arma de fogo, para aquela descrita no art. 14 da Lei nº 10.826/2003 c) reconhecer a consunção entre os crimes de porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) e disparo de arma de fogo (art. 15 da Lei nº 10.826/2003), absorvendo-se o primeiro em razão da progressão criminosa Com efeito, passo à dosimetria. III - DA DOSIMETRIA A) Quanto ao crime de receptação a.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 03 (três) anos (Pena: de 01 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: A culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra. No caso em tela, percebe-se a intensidade do dolo no agir do condenado é inerente ao tipo penal em questão, razão pela qual a exasperação da pena, com ênfase na culpabilidade, já foi predeterminada pelo legislador quando da fixação do mínimo e do máximo de pena que poderá ser imputada para o mencionado crime. Antecedentes: o acusado não possui condenação transitada em julgado. Conduta Social: Não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias que engloboram o crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme apurado nos autos, a motocicleta objeto da receptação não foi apenas mantida em posse de forma passiva ou por simples ocultação, mas sim efetivamente utilizada na execução de nova empreitada criminosa, sendo empregada como meio de fuga durante perseguição policial e no contexto de disparos de arma de fogo contra os agentes de segurança pública. Diante disso, valoro negativamente a circunstância judicial relativa às circunstâncias do crime, acrescentando a fração de 1/8 (4 quatro meses e 15 dias) à pena-base, totalizando 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Consequências do Crime: as esperadas, ainda que nefastas. Comportamento da vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal, estabelecendo-se em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.2) da segunda fase Agravantes: ausentes circunstâncias agravantes. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, mantém-se a pena intermediária em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de receptação no patamar de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. a.4) da pena de multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. B) Quanto ao crime de disparo de arma de fogo b.1) da primeira fase Para a fixação da pena-base, entende este Juízo que cada circunstância judicial deverá incidir na pena-base, considerando 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, uma vez que são 08 (oito) circunstâncias judiciais a serem apreciadas. No presente caso o delito ora em análise prevê na pena-base um intervalo de 02 (dois) anos (Pena: de 02 a 04 anos). Nesse diapasão para cada circunstância judicial reconhecida, deverá aumentar ou diminuir quando for o caso, a pena-base em 3 (três) meses, de modo que, se todas as circunstâncias fossem reconhecidas desfavoravelmente, totalizariam a pena máxima cominada ao delito. Esclarecido tais parâmetros, passo a análise das circunstâncias judiciais. Culpabilidade: a culpabilidade, como juízo de reprovação social que recai sobre a conduta típica e ilícita e também sobre o agente, será valorada de forma neutra, na medida que não há elementos suficientes nos autos capazes de elevar a reprovabilidade da conduta, além daqueles que são inerentes ao tipo. Antecedentes: sem condenações transitadas em julgado. Conduta Social: não constam parâmetros nos autos para a análise da conduta social do acusado. Personalidade do Agente: A personalidade deve ser valorada de forma neutra, pois não há dados técnicos nos autos que desabonem a personalidade do acusado. Em outras palavras, a simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/2015. Motivos: os motivos devem ser valorados de forma neutra, posto que não extrapolam os próprios do tipo penal. Circunstâncias: as circunstâncias do crime são relevantes e merecem serem levadas à tona. Conforme amplamente demonstrado nos autos, os disparos foram direcionados contra guarnição da Polícia Militar que se encontrava em serviço regular de patrulhamento urbano. Tal conduta não apenas colocou em risco a integridade física dos agentes de segurança, como também representou grave afronta à autoridade pública, evidenciando desrespeito à ordem institucional e acentuado desprezo pelas normas que regem o convívio social. Ademais, a arma utilizada para a prática delitiva possuía numeração suprimida, o que reforça o caráter ilícito e dolosamente premeditado da conduta, dificultando eventual rastreamento e apuração de origem do armamento. Embora tal elemento esteja vinculado, por vezes, ao tipo penal do art. 16 da Lei nº 10.826/2003, neste feito foi reconhecida a reclassificação para o art. 14, razão pela qual essa circunstância passa a assumir relevância como elemento agravador da forma de execução do disparo em análise. Em razão do reconhecimento da incidência de tal circunstância judicial, em regra, ter-se-ia a elevação da pena base 1/8 (um oitavo); ocorre que, diante dos fatos narrados, tem-se que estes são especialmente reprováveis, de modo que obedecer o critério fracionário, como comumente se faz, seria medida desproporcional, isto porque, a gravidade e a quantidade das circunstâncias narradas acima ensejam um maior grau de reprovabilidade. Não se pode esquecer que o pressuposto da proporcionalidade exige do julgador não somente que se guie a fim de evitar cometer excessos, mas também que se guie a fim de que o bem jurídico tutelado não seja insuficientemente protegido. Desta feita, a repressão regular ao crime, na forma fracional ordinariamente aplicada, diante dos fatos, exprime insuficiência na sanção. Este entendimento encontra guarida nos julgados do STJ, de forma que a fração aplicada não constitui direito subjetivo do réu, podendo ser alterada desde que devidamente fundamentada com fatos devidamente demonstrados e devidamente ligados ao réu. Neste sentido, destaca-se os seguintes julgados: AgRg no AREsp 2249221/SC. RELATOR: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 23/05/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 26/05/2023. EMENTA. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.OMISSÃO INEXISTENTE. REFAZIMENTO DA DOSIMETRIA DA PENA. ADMISSÃO APENAS EM CASOS DE ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. DIREITO SUBJETIVO À UTILIZAÇÃO DE FRAÇÕES ESPECÍFICAS. INEXISTÊNCIA. FRAÇÃO DE 1/6 DIANTE DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. ART. 42 DA LEI N. 11.343/06. PREPONDERÂNCIA SOBRE O ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - CP. FRAÇÃO DE 1/5. DESPROPORCIONALIDADE INEXISTENTE. SÚMULA N. 83/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDA. REDUTORA. INAPLICABILIDADE. REINCIDÊNCIA GENÉRICA E MAUS ANTECEDENTES. REVISÃO DA PRISÃO PREVENTIVA E PLEITO DE LIMINAR PARA CONCESSÃO DE LIBERDADE NOS AUTOS DESTE AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INCOMPETÊNCIA. TRÁFICO DE DROGAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Corte estadual não foi omissa e bem fundamentou o indeferimento dos pleitos defensivos, adotando entendimentos já consolidados no que diz respeito à pena-base e ao privilégio do delito de tráfico, ainda que de forma contrária a pretendida. 2. O refazimento da dosimetria da pena neste Superior Tribunal de Justiça tem caráter excepcional, somente admitido sob a existência de manifesta ilegalidade, hipótese não configurada nestes autos, sob pena de incidência da Súmula n. 7/STJ. 3. Destaca-se o fato de o réu não ter direito subjetivo à utilização de frações específicas para cada circunstância judicial negativa (1/8 do intervalo ou 1/6 da pena), não sendo tais parâmetros obrigatórios, porque o que se exige das instâncias ordinárias é a fundamentação adequada e a proporcionalidade na exasperação da pena. 3.1. No caso, ao exasperar a reprimenda inaugural em razão dos antecedentes, o togado majorou a pena em 1/6, fração que não se apresenta absurda segundo os parâmetros da jurisprudência. 4. O art. 42 da Lei n. 11.343/06 preconiza que a natureza e a quantidade do entorpecente tem preponderância sobre o previsto no art. 59 do CP, razão porque o acréscimo de 1/5 na pena não se revela desproporcional. 5. A incidência das Súmulas ns. 83/STJ e 7/STJ afastam a possibilidade de conhecimento da divergência jurisprudencial. 6. Quanto à aplicação da redutora de pena do § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/06, a presença de reincidência, ainda que genérica, afasta a possibilidade. Não se olvide que o recorrente também possui antecedentes criminais, o que também inviabiliza o privilégio. 7. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça, por meio de pedido de liminar nos autos do agravo em recurso especial, efetivar a revisão da custódia preventiva, na forma do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal. 8. Agravo regimental desprovido. AgRg no HC 811085/SC. RELATOR: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA. QUINTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 27/04/2023. DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE: DJe 03/05/2023. EMENTA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DOSIMETRIA. PENA-BASE. NEGATIVAÇÃO DA CULPABILIDADE EM RAZÃO DA TENRA IDADE DA VÍTIMA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Inexiste maltrato ao princípio da colegialidade, pois, consoante disposições do Regimento Interno desta Corte, o relator deve fazer um estudo prévio da viabilidade do habeas corpus, podendo, inclusive, decidi-lo monocraticamente (art. 34, XX, do RISTJ). Por outro lado, a parte possui mecanismos processuais de submeter a controvérsia ao órgão colegiado por meio do competente agravo regimental, o que supera eventual mácula da decisão singular do Relator. 2. Como é cediço, a revisão da dosimetria da pena, na via do habeas corpus, somente é possível em situações excepcionais de manifesta ilegalidade ou abuso de poder, cujo reconhecimento ocorra de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios (HC n. 304.083/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 12/3/2015). Nesse contexto, a exasperação da pena-base deve estar fundamentada em dados concretos extraídos da conduta imputada ao acusado, os quais devem desbordar dos elementos próprios do tipo penal. 3. Na hipótese, a Corte local manteve apenas o desvalor conferido à culpabilidade do paciente, por entender que esta extrapolou os limites da normalidade para este tipo de crime, em razão da tenra idade da vítima, que contava com apenas 6 anos à época da prática delitiva, e da fragilidade do seu corpo e do órgão genital. 4. Apesar de a idade da vítima constituir elemento integrante do tipo penal descrito no art. 217-A do CP, ela pode ser considerada como fundamento para exasperação da pena-base quando se tratar de vítima de tenra idade, como no caso dos autos. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido. Assim, posto que suficientemente comprovadas as imputações que deram origem ao entendimento aqui adotado, usa-se a fração de 1/6 (um sexto) entre a diferença do máximo e o mínimo legal para majorar tal circunstância, o que totaliza o valor de 4 (quatro) meses. Assim, acrescentando-se tal valor a pena-base, estabelece-se o total de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Consequências do Crime: próprias do tipo, ainda que nefastas. Comportamento da Vítima: comum ao fato. Com isso, cabível é, portanto, a fixação da pena-base acima do mínimo legal , estabelecendo-se em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. b.2) da segunda fase Agravantes: reconhece-se a incidência da agravante prevista no art. 61, II, b do Código Penal, uma vez que os disparos de arma de fogo foram efetuados com o claro propósito de assegurar a impunidade de outros delitos praticados no mesmo contexto, notadamente o porte ilegal de arma de fogo e a receptação e adulteração do emplecamento da motocicleta utilizada na fuga. Assim, acrescenta-se a fração de 1/6 à pena intermediária, totalizando 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. Atenuantes: ausentes circunstâncias atenuantes. Assim sendo, estabelece-se a pena intermediária em 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.3) da terceira fase Causas de aumento: ausentes causas de aumento. Causas de diminuição: ausentes causas de diminuição. Portanto, estabelece-se a pena definitiva quanto ao crime de disparo de arma de fogo no patamar de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. b.4) da multa O art. 49 do CP dispõe como valor mínimo o valor de 10 (dez) dias-multa e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Quanto ao valor do dia-multa, este deve ser calculado conforme ensina a doutrina, pelo sistema bifásico, considerando-se principalmente a situação econômica do condenado (art. 60, do CP), podendo ser aumentada até o triplo ou até o quíntuplo quando se tratar dos crimes da Lei de Drogas, não podendo ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes esse mesmo salário (art. 49, § 1º, do CP). Sendo assim, fixo a pena de multa em 100 (cem) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa, devendo ser creditados à conta do Fundo Penitenciário. C) DA UNIFICAÇÃO DE PENAS PELO CONCURSO MATERIAL, DA PENA DEFINITIVA E DO REGIME PRISIONAL O concurso material de crimes se configura quando o agente pratica dois ou mais delitos de maneira autônoma e independente, sem que haja relação de continuidade ou conexão entre eles, o que leva à aplicação das penas de forma cumulativa. No presente caso, restou demonstrado que os delitos de receptação e disparo de arma de fogo foram praticados mediante condutas autônomas, com desígnios distintos, ainda que no mesmo contexto fático. A receptação teve por objeto a posse de motocicleta com restrição de roubo, enquanto o crime de disparo de arma de fogo consistiu nos tiros efetuados contra a guarnição policial no momento da tentativa de abordagem. Verifica-se que a motocicleta já se encontrava na posse dos indivíduos antes mesmo da tentativa de fuga, configurando o crime de receptação de forma prévia e autônoma ao subsequente ato de resistência à ação policial. Por sua vez, os disparos efetuados em direção aos agentes de segurança pública tiveram como finalidade obstar a atuação estatal, caracterizando nova conduta delitiva, com motivação e objeto distintos. Trata-se, portanto, de ações independentes, praticadas em contextos diferenciados, ainda que próximos no tempo, direcionadas a lesar vítimas diversas, impondo-se o reconhecimento do concurso material de crimes, na forma do art. 69 do Código Penal, com a consequente soma das penas aplicadas aos delitos de forma cumulativa. Pelo exposto, reúno as penas anteriormente estabelecidas para cada tipo penal, perfazendo-as no patamar definitivo de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, a serem cumpridos em regime inicial SEMIABERTO, à luz do art. 33, §2º, b do Código Penal. D) DA UNIFICAÇÃO DAS PENAS DE MULTA A regra para aplicação da pena de multa, no caso de concurso de crimes, está no artigo 72 do Código Penal, segundo o qual: Art. 72, CP. No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente Pelo exposto, somando-se a multa aplicada a cada um dos crimes, estabelece-se a multa definitiva no patamar de 200 (duzentos) dias-multa a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo o dia-multa. e) Da detração da pena O acusado foi preso preventivamente na data de 24/06/2017 e posto em liberdade provisória no dia 04/07/2017, totalizando 10 dias de custódia preventiva, restando, portanto, o lapso temporal de 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão. f) Substituição da pena Inaplicável ao caso, tendo em vista que a pena se encontra em patamar superior a 4 (quatro) anos e que o crime, por sua própria natureza, foi cometido mediante violência, nos termos do art. 44, I do CP. g) Das custas Por ser assistido da Defensoria Pública, presumo a vulnerabilidade financeira e deixo de condenar o réu ao pagamento das custas. h) Do valor mínimo de indenização O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, determina que o juiz, ao proferir a Sentença Condenatória, deverá fixar valor mínimo para a reparação do dano e dos prejuízos causados à vítima. Ocorre que a instrução criminal não aferiu parâmetros para a fixação do valor mínimo do dano, razão pela qual deixo de fixar valor mínimo pelos danos causados pela presente infração. i) Do direito de recorrer em liberdade O réu poderá recorrer em liberdade, como já se encontra, pois não restaram caracterizados os motivos que indiquem a necessidade de custódia cautelar, conforme artigo 312, do Código de Processo Penal. V DAS DEMAIS DISPOSIÇÕES Passadas as determinações da condenação, dê-se publicidade ao ato na forma que requer a lei. Proceda-se à intimação pessoal do réu, na forma do art. 392, e incisos, do CPP. Cientifique-se o Ministério Público e a Defensoria Pública. Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para proceder-se ao juízo de admissibilidade e demais determinações procedimentais. Decorrido o prazo, sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado e proceda-se à execução do réu, com o encaminhamento dos autos ao juízo competente, nos termos que estabelece o regramento interno deste Tribunal de Justiça. Com o trânsito, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, informando o Tribunal Regional Eleitoral acerca da condenação. À secretaria para as procedências de praxe. Cumpra-se.
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30/04/2025 - Documento obtido via DJENCom Julgamento De Mérito Baixar (PDF)