Ministério Público Do Estado Do Paraná x Marcelo Corinth e outros
Número do Processo:
0002382-44.2013.8.16.0145
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPR
Classe:
AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Grau:
1º Grau
Órgão:
Vara da Fazenda Pública de Ribeirão do Pinhal
Última atualização encontrada em
20 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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20/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Vara da Fazenda Pública de Ribeirão do Pinhal | Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVAIntimação referente ao movimento (seq. 522) JULGADA IMPROCEDENTE A AÇÃO (11/06/2025). Acesse o sistema Projudi do Tribunal de Justiça do Paraná para mais detalhes.
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20/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Vara da Fazenda Pública de Ribeirão do Pinhal | Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVAIntimação referente ao movimento (seq. 522) JULGADA IMPROCEDENTE A AÇÃO (11/06/2025). Acesse o sistema Projudi do Tribunal de Justiça do Paraná para mais detalhes.
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16/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Vara da Fazenda Pública de Ribeirão do Pinhal | Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVAPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE RIBEIRÃO DO PINHAL VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE RIBEIRÃO DO PINHAL - PROJUDI Rua Marcionílio Reis Serra, Nº 803 - Centro - Ribeirão do Pinhal/PR - CEP: 86.490-000 - Fone: (43) 35511975 - E-mail: civelrp@gmail.com Autos nº. 0002382-44.2013.8.16.0145 Processo: 0002382-44.2013.8.16.0145 Classe Processual: Ação Civil de Improbidade Administrativa Assunto Principal: Dano ao Erário Valor da Causa: R$66.388,30 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Réu(s): CLAUDIO ROBERTO PEREIRA JOSMAR ELIAS DA SILVA MARCELO CORINTH MOACIR RIBEIRO LATALIZA SANDRA MOLINA POLICARPO SANTOS SENTENÇA 1. RELATÓRIO. Trata-se de ação civil pública de ressarcimento de danos ao patrimônio público e de imposição de sanções por ato de improbidade administrativa c/c. nulidade de atos administrativos e danos morais proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ em face de MOACIR RIBEIRO LATALIZA, SAULO PINTO RIBEIRO, VANESSA KAMMER ATTISANO, MARCELO CORINTH, JOSMAR ELIAS DA SILVA, SANDRA MOLINA POLYCARPO SANTOS e CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA. Alegou o Ministério Público, em síntese, que: Durante o mandato de MOACIR RIBEIRO LATALIZA como Prefeito do Município de Ribeirão do Pinhal (2005–2008), foi instaurado o Procedimento Licitatório Convite 02/2008 para contratação de serviços de publicidade institucional. No entanto, tal procedimento teria sido fraudado, com diversas irregularidades e desvio de finalidade, a fim de beneficiar indevidamente os envolvidos, em especial a empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA ME, de propriedade de SAULO PINTO RIBEIRO e VANESSA KAMMER ATTISANO. O Ministério Público descreve a atuação de diversos agentes públicos, dentre eles o então prefeito MOACIR, membros da comissão de licitação (MARCELO CORINTH, JOSMAR ELIAS DA SILVA e SANDRA MOLINA POLYCARPO SANTOS), o assessor jurídico CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA e os sócios da empresa contratada. A denúncia aponta conluio entre os requeridos, ausência do número mínimo legal de licitantes - foram convidadas apenas duas empresas -, falta de cotação prévia de preços, objeto licitado vago, ausência de definição dos serviços a serem prestados, e a posterior execução de serviços diversos e não comprovadamente realizados. A contratação foi feita por meio de contrato que previa o pagamento de 20% de comissão sobre os valores dos serviços prestados, sem definição clara de quais serviços seriam efetivamente realizados ou seus valores de referência, contrariando a 8.666/93. As notas fiscais juntadas demonstram serviços que não correspondem ao objeto contratual, como pesquisas em saúde e educação, gravação de mensagens telefônicas e realização de shows, sem documentação hábil que comprove a prestação. Aponta-se ainda que parte do pagamento destinado a um evento municipal (rodeio comemorativo) foi repassado à empresa STAFF, mesmo que o contrato para esse evento tenha sido firmado com outra empresa (JRC EVENTOS ARTÍSTICOS), caracterizando possível triangulação para desvio de recursos. A soma paga pelo Município à STAFF chegou a R$ 32.520,00, sem que tenha sido demonstrada a contraprestação correspondente. O Ministério Público requer a declaração de nulidade do procedimento licitatório e do contrato dele derivado, a condenação dos requeridos ao ressarcimento ao erário, além da imposição de sanções por ato de improbidade administrativa - suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade de bens e multa civil -, com fundamento nos arts. 10 e 11 da Lei 8.429/92, além da indenização por danos morais difusos, em virtude da ofensa aos princípios da legalidade, moralidade, publicidade e eficiência que regem a Administração Pública. A liminar de indisponibilidade de bens foi deferida, bem como a inicial foi recebida pelo juízo (mov. 6.1). Na decisão prolatada no mov. 101.1, o juízo determinou o desmembramento dos autos com relação aos requeridos SAULO PINTO RIBEIRO ATTISANO e VANESSA KAMMER ATTISANO. O requerido MOACIR RIBEIRO LATALIZA, estando devidamente citado, ofereceu contestação, alegando, em síntese, que (mov. 144.1): Impugna os pedidos formulados pelo Ministério Público em ação civil pública por improbidade administrativa. Inicialmente, sustenta preliminarmente a carência parcial da ação e a impossibilidade jurídica do pedido, sob o fundamento de que a Lei 8.429/92 não se aplica aos agentes políticos, como prefeitos, cuja responsabilidade estaria regulada exclusivamente pelo Decreto-Lei 201/67, o qual trata dos crimes de responsabilidade. Sustenta no sentido de que a responsabilização de prefeitos por atos administrativos deve observar o regime jurídico especial e mais severo previsto nesse decreto, sob pena de configurar bis in idem. Ainda na preliminar, defende que a cumulação alternativa de pedidos na petição inicial é juridicamente incabível, pois comprometeria o devido processo legal ao deixar indefinida a tipificação dos fatos. Requer, por isso, o reconhecimento da inadequação da via eleita e a extinção do feito sem julgamento do mérito. No mérito, o requerido nega ter praticado qualquer ato de improbidade. Alega que, como prefeito, confiava nos pareceres e orientações dos órgãos técnicos do município, não tendo participado de qualquer fraude no procedimento licitatório em questão. Sustenta que o processo licitatório seguiu as formalidades legais, com três empresas convidadas e propostas válidas, e que a homologação por ele realizada foi um ato administrativo regular, sem má-fé ou intenção dolosa. Enfatiza que não houve superfaturamento, prejuízo ao erário ou qualquer vantagem indevida, afastando, por consequência, os elementos indispensáveis à configuração do ato de improbidade, qual seja, a ilegalidade qualificada e o dolo. Reitera que eventual irregularidade formal não caracteriza, por si só, improbidade administrativa, sendo imprescindível a demonstração de dolo ou culpa grave, nos termos da jurisprudência. Alega a distinção entre ilegalidades e atos ímprobos, afirmando que a mera infração administrativa não basta para a imposição das severas penalidades previstas na Lei 8.429/92, sem comprovação de má-fé, desonestidade ou prejuízo efetivo. Ao final, requer o acolhimento das preliminares para extinguir o processo sem resolução de mérito, ou, alternativamente, a total improcedência dos pedidos iniciais, com fundamento na inexistência de ato ímprobo, dano ao erário ou dolo por parte do requerido. O requerido CLAUDIO ROBERTO ofereceu contestação, alegando (mov. 150.1): Era assessor jurídico do Município de Ribeirão do Pinhal e impugna integralmente os pedidos formulados na ação, a qual lhe imputa a prática de improbidade administrativa por haver emitido parecer favorável à homologação do procedimento licitatório 02/2008, supostamente eivado de irregularidades. Esclarece que jamais integrou a comissão de licitação, tampouco participou da escolha de empresas convidadas ou das fases preparatórias do certame. Sua atuação restringiu-se à emissão de parecer jurídico após a conclusão do processo licitatório, com a finalidade de analisar, de forma técnica e formal, se os documentos legais haviam sido reunidos e os trâmites seguidos conforme a legislação. Preliminarmente, sustenta a ausência de qualquer conduta dolosa por parte do requerido. Enfatiza que o parecer emitido possui natureza meramente opinativa, não vinculante, e que o ato decisório - homologação e contratação - é de competência exclusiva do gestor público, não podendo o advogado responder solidariamente por decisão que não praticou. Sustenta que para responsabilização do parecerista por ato de improbidade exige prova inequívoca de dolo, o que inexiste no caso concreto. Aponta que o advogado público não administra recursos, não ordena despesas nem tem qualquer ingerência sobre a execução contratual, estando, portanto, fora do escopo de responsabilidade direta nos termos do art. 10 da Lei 8.429/92. Defende a inviolabilidade funcional do advogado no exercício da profissão, conforme preceituam o art. 133 da Constituição Federal e os arts. 2º e 7º do Estatuto da OAB, reafirmando que a atividade de assessoramento jurídico não deve ser confundida com a gestão administrativa. Afirma que a tentativa de atribuir-lhe responsabilidade por um parecer jurídico, sem que tenha havido prova de fraude, má-fé ou conluio, configura afronta à sua autonomia profissional e à segurança jurídica da advocacia pública. A atuação opinativa do advogado, segundo o requerido, é protegida por prerrogativa constitucional e não pode ser penalizada salvo em hipóteses excepcionais, em que reste comprovado, de forma indiscutível, o dolo e a intenção de acobertar ato ilícito, o que não se verifica nos autos. O requerido reforça que não há nos autos qualquer elemento que comprove que ele tinha conhecimento das supostas irregularidades apontadas pelo Ministério Público, tampouco que tenha emitido o parecer com a finalidade de viabilizar ato ímprobo. Ao contrário, agiu dentro dos limites de sua função técnico-jurídica, analisando o procedimento à luz dos documentos apresentados e proferindo parecer nos limites da legalidade. Aponta que responsabilizá-lo por divergência interpretativa sobre normas administrativas significaria tolher a liberdade do advogado e instaurar um perigoso precedente de punição por juízo jurídico técnico divergente. Ao final, requer a total improcedência da ação, por ausência de elementos caracterizadores do ato de improbidade administrativa, especialmente dolo, enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário, bem como pela atuação do requerido dentro da legalidade, nos limites técnicos de sua função de parecerista. O requerido JOSMAR ELIAS DA SILVA, também devidamente citado, ofereceu contestação, sustentando (mov. 151): Que era membro da comissão de licitação à época dos fatos, impugna integralmente as acusações formuladas pelo Ministério Público na ação civil pública por ato de improbidade administrativa. Inicialmente, sustenta, em preliminar, a ausência das condições da ação, argumentando que a ação de improbidade administrativa, regida pela Lei 8.429/92, não se confunde nem pode ser tratada como espécie da ação civil pública da Lei 7.347/85, por possuírem naturezas, objetivos e legitimações distintas. Defende que a inobservância dessa distinção compromete o devido processo legal, violando o direito de defesa do réu. No mérito, sustenta que, à época, exercia cargo público de forma iniciante e sem domínio técnico específico sobre procedimentos licitatórios, atuando apenas como membro da comissão de licitação, cargo para o qual foi regularmente nomeado. Argumenta que não teve participação dolosa nem obteve qualquer benefício pessoal com o procedimento licitatório convite 12/2008, tampouco teve ingerência sobre as fases de contratação, pagamento ou fiscalização da execução do contrato. Rebate especificamente as alegações do Ministério Público de que o número de licitantes foi inferior ao exigido por lei, esclarecendo que houve tentativa anterior de realizar a licitação por meio do convite 10/2008, o qual restou deserto, mesmo com o convite a três empresas, conforme documentação juntada. Tal fato justificaria a realização do segundo procedimento com menor número de participantes, com base no art. 22, §7º, da Lei 8.666/93, que permite a repetição da licitação nesses casos. Assim, afirma que não houve vício formal ou má-fé, e que a ausência de justificativa expressa nos autos não compromete a legalidade do procedimento. No tocante à alegada ausência de definição do objeto contratual e de cotação prévia de preços, sustenta que o objeto foi suficientemente descrito, nos termos do art. 38 da Lei de Licitações, como sendo a contratação de agência de publicidade institucional para planejamento, criação, produção e veiculação de campanhas publicitárias em diferentes mídias. Argumenta que não houve qualquer obscuridade ou violação aos princípios da publicidade e isonomia, tampouco exclusão de empresas interessadas, o que, inclusive, estaria em consonância com a Súmula 177 do TCU. Em relação à execução do contrato, ao suposto pagamento indevido à empresa vencedora e à eventual prestação de serviços diversos do objeto licitado, alega que não possuía qualquer competência sobre tais atos, pois sua função limitava-se à fase licitatória. Ressalta que não teve contato com a execução contratual, nem autorizou pagamentos ou fiscalizou a prestação de serviços, sendo indevida a imputação de responsabilidade por fatos alheios às suas atribuições. Por fim, o requerido sustenta que não houve dolo, má-fé ou enriquecimento ilícito de sua parte, nem prejuízo ao erário decorrente de sua atuação, no sentido de que a responsabilização por improbidade exige a presença de elemento subjetivo dolo, bem como dano efetivo ao patrimônio público, o que não se verifica no caso em análise. O requerido MARCELO CORINTH ofereceu contestação, alegando (mov. 152.1): Na condição de então presidente da comissão de licitação do Município de Ribeirão do Pinhal, impugna integralmente os pedidos formulados na Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público. Inicialmente, alega a prescrição das pretensões formuladas, argumentando que a demanda foi ajuizada em dezembro de 2013, mais de cinco anos após a homologação do procedimento licitatório Convite 12/2008, ocorrida em junho de 2008. Assim, sustenta que as pretensões de anulação do ato administrativo, de aplicação das sanções da Lei 8.429/92 e de indenização por danos morais estariam prescritas. Alega que a imprescritibilidade prevista no art. 37, §5º, da Constituição Federal limita-se ao ressarcimento por ato doloso de improbidade administrativa, tema ainda pendente de pacificação pelo Supremo Tribunal Federal. Quanto às demais pretensões, defende a aplicação dos prazos prescricionais específicos: cinco anos para anulação de ato administrativo (por analogia ao art. 21 da Lei da Ação Popular), cinco anos para sanções da Lei 8.429/92 (art. 23 da referida lei) e três anos para danos morais (art. 206, §3º, V, do Código Civil), todos já consumados quando do ajuizamento da demanda. Sustenta, também, a inadequação da via processual adotada e a ilegitimidade ativa do Ministério Público. Alega que o Parquet acumulou pretensões de natureza distinta - ressarcitória, declaratória, indenizatória e sancionatória - em uma única ação civil pública, desrespeitando os regramentos próprios de cada espécie de ação, como a ação popular e a ação por ato de improbidade administrativa, que possuem legitimidades, fundamentos e ritos próprios. Argumenta que o Ministério Público, ao pretender tutelar patrimônio público e aplicar sanções por improbidade, extrapolou sua atribuição constitucional quando ajuizou a ação exclusivamente com base na Lei 7.347/85, devendo ser reconhecida a ausência das condições da ação e extinto o feito sem julgamento do mérito. Alega ainda cerceamento de defesa, pois os documentos colhidos no inquérito civil que instrui a inicial foram produzidos unilateralmente, sem garantia do contraditório e da ampla defesa, especialmente porque o contestante sequer foi notificado no curso da investigação. No mérito, nega a prática de qualquer ato de improbidade administrativa. Argumenta que sua participação se limitou à atuação como presidente da Comissão de Licitação e que todos os atos por ele praticados observaram a legalidade e os princípios administrativos. Defende que o Convite 12/2008 foi regularmente instaurado como repetição do Convite 10/2008, frustrado pela ausência do número mínimo de licitantes, conforme permite o art. 22, §7º, da Lei 8.666/93. A comissão decidiu pelo cancelamento do primeiro procedimento e instauração de novo certame, conduta que demonstra zelo e boa-fé dos seus membros. Alega que o objeto da licitação estava adequadamente definido - contratação de agência de publicidade institucional para planejamento, criação, produção e veiculação de campanhas -, em conformidade com o art. 38 da Lei de Licitações, sendo infundada a alegação de objeto vago. Afirma que não participou da fase de execução contratual, tampouco teve envolvimento com pagamentos, liquidação de notas fiscais ou fiscalização da prestação de serviços, não havendo individualização de conduta que justifique sua responsabilização. Aponta que não há nos autos qualquer prova de que tenha obtido vantagem indevida, contribuído para eventual dano ao erário ou agido com dolo. Reforça que a responsabilidade por ato de improbidade administrativa exige a presença de elemento subjetivo, sendo inadmissível a responsabilidade objetiva. Assim, sustenta que sua atuação, pautada pela boa-fé e nos limites da função que exercia, não configura improbidade administrativa. Ao final, requer o acolhimento das preliminares, com a consequente extinção do feito sem resolução de mérito. Subsidiariamente, requer o julgamento de improcedência total da ação, por ausência de prova de conduta dolosa, inexistência de prejuízo ao erário e falta de demonstração de qualquer ato que configure improbidade administrativa. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação, refutando as preliminares e sustentando os argumentos iniciais (mov. 165.1). Intimação para especificação de provas (mov. 172.1). O Ministério Público pugnou pela produção de prova oral, consistente na oitiva de testemunhas e depoimento pessoal dos requeridos (mov. 179.1). Os requeridos JOSMAR ELIAS DA SILVA, SANDRA MOLINA POLYCARPO SANTOS e MARCELO CORINTH pugnaram pela produção de prova oral (mov. 185.1/186.1/187.1). Foi prolatado o despacho saneador, oportunidade na qual o juízo analisou as preliminares arguidas pelas partes, bem como determinou a produção de prova oral (mov. 190.1). A primeira parte da audiência de instrução foi realizada nos autos (mov. 226). A carta precatória com a oitiva da testemunha Genesis J. Machado foi acostada nos autos (mov. 254). O Ministério Público apresentou alegações finais (mov. 267.1). Os requeridos também apresentaram alegações finais (mov. 281.1, 286.1, 287.1 e 288.1). É o que importa relatar. Passo a decidir e fundamentar. 2. FUNDAMENTAÇÃO. 2.1. Preliminarmente. PRESCRIÇÃO. Inicialmente, e, conforme consta das alegações apresentadas pelo requerido pugnando pela decretação da prescrição, entendo que, no que se refere aos dispositivos inerentes à prescrição intercorrente, uma aplicação literal do art. 23, §5°, da Lei 8.429/02, com a redação dada pela Lei 14.230/2021 estaria em desacordo com a Constituição Federal, isto é, detém vício de constitucionalidade. Com efeito, a Constituição Federal de 1988 elevou a probidade no trato da coisa pública ao status de direito fundamental. Isso porque o inciso LXXIII do seu art. 5º, inserido no Título que trata dos direitos e garantias fundamentais, conferiu ao cidadão a legitimidade para propor ação popular que vise a invalidar atos ou negócios lesivos ao princípio da moralidade pública. Da idêntica forma, o §9º do art. 14 da mesma Constituição remete à lei complementar a tarefa de instituir casos de inelegibilidade, com o objetivo de proteger a probidade administrativa exigida para o exercício do mandato eletivo. Nessa mesma ordem de ideias, arrolou-se a ofensa à “probidade na administração” como hipótese de crime de responsabilidade, cujo cometimento poderá até mesmo desaguar no impeachment do Presidente da República (CF, arts. 85, inciso V, e 86, caput). Maior demonstração de apreço à probidade não poderia externar o constituinte quando, no caput do art. 37, proclama a moralidade como um dos princípios cardeais que governam o funcionamento da Administração Pública. E o seu §4º, na mesma esteira, complementa: “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. Trata-se de um processo de fortalecimento constitucional e afirmação democrática, que se irradiou por todo o sistema jurídico brasileiro com a promulgação da Constituição Cidadã. Este panorama de fomentada cidadania, instituído pela Carta Magna de 1988, notoriamente, trouxe reflexos ao campo da administração pública, conforme leciona Marçal Justen Filho (2014, p. 207): Por força da democracia republicana, as decisões estatais devem resultar da participação de todos os possíveis interessados, que são tratados como titulares de direitos equivalentes de participação na formação da vontade estatal. Devem existir mecanismos pelos quais os governantes são constrangidos a prestar esclarecimentos e a responder por seus atos. Como decorrência, devem ser respeitados os interesses de todos os grupos sociais (inclusive das minorias), afastando-se a concepção puramente majoritária para a tomada de decisões. A democracia republicana traduz o governo fundado nas leis e no reconhecimento de direitos mínimos a todos os cidadãos, entre os quais o de participar na formação da vontade estatal. No mais, segundo a doutrina de Luís Roberto Barroso (2010, p. 364), “a Constituição funcionaria (...) não apenas como parâmetro de validade para a ordem infraconstitucional, mas também como vetor de interpretação de todas as normas do sistema”. No mesmo sentido, leciona Gustavo Binenbojm: A partir desta perspectiva, pode falar-se numa supremacia não apenas formal, mas também material da Constituição, relacionada ao fato de que os valores mais caros a uma comunidade política costumam ser exatamente aqueles acolhidos pela sua Lei Maior, e que, exatamente por isto, são postos ao abrigo da vontade das maiorias legislativas de ocasião. Estes valores, densificados através de princípios e regras constitucionais, devem, pela sua relevância não apenas jurídica, como também moral, irradiar-se por todo o ordenamento, fecundando-o com sua axiologia transformadora (BINENBOJM, 2006, p. 64). Portanto, sobressai ao cidadão o direito a uma administração pública proba, impondo, via de consequência, uma gama de deveres ao administrador, pois “administrar a coisa pública, conquanto configure um projeto gerencial, também é um compromisso com a densificação pontual de comandos constitucionais” (FAZZIO JÚNIOR, 2015, p. 75). Ainda, afirma Mateus Bertoncini: Não se deve, portanto, ter dúvida quanto à força vinculante da ideologia constitucional de probidade na Administração Pública, uma das metas da República Federativa do Brasil, e que nada mais é senão a vontade popular convertida em norma principiológica da mais elevada hierarquia, e que se opõe vigorosamente à chamada cultura de improbidade administrativa, historicamente presente nos círculos do poder dominante no Brasil (BERTONCINI, 2012, p. 37). Observadas as premissas supra, de nada valeria a Constituição Federal proclamar o princípio da probidade sem que a ordem jurídica infraconstitucional assegure os instrumentos adequados para efetivação do direito, consolidando, de modo concreto, a exigência de moralidade e boa-fé por parte do administrador público em suas condutas. Analisando brevemente o contexto de edição da Lei de Improbidade Administrativa, Fernando Capez (2010, p. 273) faz a seguinte ressalva: “A Lei de Improbidade Administrativa passa a ter como fundamento nuclear a dignidade da pessoa humana, considerada o valor máximo de nosso Estado de Direito, de forma que caberá a ela selecionar as condutas mais importantes para a proteção do bem jurídico em consonância com esse valor que se irradia por todo o sistema punitivo”. Ante todo exposto, é necessário reconhecer que, ao estabelecer um prazo de prescrição intercorrente de apenas quatro anos, a Lei n. 14.230/2021 debilitou, de modo desarrazoado e desproporcional, um dos mais relevantes instrumentos processuais que garantiam a concretização do princípio da moralidade administrativa: a ação de improbidade administrativa. Com efeito, sabe-se ser comum em ações dessa espécie o surgimento de questões fáticas de grande complexidade, a reclamar intensa atividade probatória (audiências para oitiva de dezenas de testemunhas, inclusive por precatória/rogatória; e perícias, às vezes em mais de uma área das ciências). Também é de todos sabidos que, em boa parte dessas demandas, forma-se litisconsórcio entre diversos réus, o que quase sempre implica o prolongamento das fases de citação, defesa, instrução e julgamento dos processos. Assim, percebe-se que o prazo de prescricional não será suficiente, na maioria dos casos, para que o órgão judicial possa sentenciar a causa antes de consumar-se a prescrição intercorrente, esvaziando um dos principais instrumentos na defesa do direito fundamental à probidade administrativa. O Conselho Nacional de Justiça, em levantamento publicado no ano de 2015, constatou que o tempo médio para o julgamento em primeiro grau das ações de improbidade objeto do estudo foi de cerca de quatro anos e três meses. Confira-se: “Com relação ao tempo decorrido (em dias) entre a data de ajuizamento da ação e o julgamento, foi observado a média de 1.548,63 dias (4,24 anos) com um desvio padrão de 8,93 dias. Foi realizada ainda análise comparativa entre o tempo decorrido entre a data de ajuizamento da ação e o julgamento, comparando-se entre as Varas Estaduais e Federais. O tempo médio observado entre a ação e a data do julgamento foi de 1586 dias para na Vara Estadual e de 1361 dias na Vara Federal (Tabela 4). Para verificar se a diferença entre os tempos decorridos a partir da data da ação e o julgamento para este tipo de dado, pode utilizar o teste conhecido como teste de log rank. Foi obtida a estatística de log rank observado foi de 101,13 e valor p < 0,0001, indicando que em geral o tempo decorrido entre a data da ação e o julgamento na esfera Federal é menor do que na esfera Estadual”. Portanto, conclui-se que a Lei 14.230/21 instituiu prescrição intercorrente cujo prazo se revela notoriamente inconciliável com a complexa tramitação das ações de improbidade. Ao fazê-lo, o legislador reduziu de modo drástico o grau de tutela ao princípio da probidade administrativa, que até então era a ele dispensado pela Lei n. 8.429/92. Passou, em suma, a protegê-lo deficientemente. Acresça-se que a nova legislação tampouco previu medidas compensatórias ou alternativas que pudessem otimizar a persecução dos atos de improbidade, tornando-a mais célere. Bem ao contrário, é possível intuir que a demora para o julgamento dessas ações é fenômeno que tenderá a agravar-se. Basta ver que a Lei 14.230/21 impôs, como condição de validade da sentença condenatória, o deferimento das provas tempestivamente especificadas pelos réus (LIA, art. 17, § 10-F, inciso II): ao se interpretar ao pé da letra o dispositivo, sequer será possível rejeitar a produção daquelas que se mostrarem inúteis para o esclarecimento dos fatos. Para além disso, a reforma legislativa instituiu a plena recorribilidade das decisões interlocutórias via agravo de instrumento (LIA, § 21° do art. 17), podendo obstaculizar o julgamento da causa, o que importará em maior delonga no trâmite processual, não podendo, de regra, tal responsabilidade ser atribuída ao autor da ação. Nesse ponto, saliento que o instituto da prescrição intercorrente está intimamente ligado a inércia do autor no prosseguimento processual, atribuindo-lhe o ônus de impulsionar de maneira ativa o desenrolar do feito, respeitando-se o direito fundamental de duração razoável do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal. A jurisprudência é consolidada no mesmo sentido: RECURSO ESPECIAL. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. CABIMENTO. TERMO INICIAL. NECESSIDADE DE PRÉVIA INTIMAÇÃO DO CREDOR-EXEQUENTE. OITIVA DO CREDOR. INEXISTÊNCIA. CONTRADITÓRIO DESRESPEITADO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. As teses a serem firmadas, para efeito do art. 947 do CPC/2015 são as seguintes: 1.1 Incide a prescrição intercorrente, nas causas regidas pelo CPC/73, quando o exequente permanece inerte por prazo superior ao de prescrição do direito material vindicado, conforme interpretação extraída do art. 202, parágrafo único, do Código Civil de 2002. 1.2 O termo inicial do prazo prescricional, na vigência do CPC/1973, conta-se do fim do prazo judicial de suspensão do processo ou, inexistindo prazo fixado, do transcurso de um ano (aplicação analógica do art. 40, § 2º, da Lei 6.830/1980). 1.3 O termo inicial do art. 1.056 do CPC/2015 tem incidência apenas nas hipóteses em que o processo se encontrava suspenso na data da entrada em vigor da novel lei processual, uma vez que não se pode extrair interpretação que viabilize o reinício ou a reabertura de prazo prescricional ocorridos na vigência do revogado CPC/1973 (aplicação irretroativa da norma processual). 1.4. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, inclusive nas hipóteses de declaração de ofício da prescrição intercorrente, devendo o credor ser previamente intimado para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição. 2. No caso concreto, a despeito de transcorrido mais de uma década após o arquivamento administrativo do processo, não houve a intimação da recorrente a assegurar o exercício oportuno do contraditório. 3. Recurso especial provido. RECURSO ESPECIAL Nº 1.604.412 - SC (2016/0125154-1). RELATOR: MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE. Brasília, 27 de junho de 2018 (data do julgamento). APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ação de busca e apreensão. conversão em execução. possibilidade. art. 4º do decreto-lei 911/69. regra específica. inaplicabilidade da regra geral do art. 329, i, do CPC/15. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INÉRCIA DO AUTOR NÃO CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO. cédula de crédito bancário válida como título executivo extrajudicial. inteligência do artigo 28 da lei nº. 10.931/2004. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. Por expressa disposição legal (art. 4º do DL 911/69), há a concessão ao credor da faculdade de converter a ação de busca e apreensão em execução, sendo que inexiste qualquer ressalva, no dispositivo legal, quanto à realização ou não de citação prévia. É cediço que apenas ocorre a prescrição intercorrente se o processo permanecer sem andamento em razão de fato que possa ser atribuído ao autor, que deixa de diligenciar no sentido de fazer o processo prosseguir normalmente, permitindo o escoamento de prazo previsto em lei. A última parcela do contrato está aprazada para o dia 15/10/1999, contudo o credor ajuizou ação de busca e apreensão, interrompendo o prazo prescricional. Assim, convertendo-se a ação de busca e apreensão em ação de execução, não há que falar em ocorrência da prescrição. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo. (TJPR - 18ª C.Cível - 0008400-81.2018.8.16.0056 - Cambé - Rel.: DESEMBARGADOR MARCELO GOBBO DALLA DEA - J. 28.10.2019). Como se vê, admitir a incidência da prescrição intercorrente, nestes casos, está de encontro aos fundamentos do próprio instituto, pois a complexidade da causa é quase inerente às ações de improbidade administrativa e ao rito processual previsto pela Lei n° 8.429/92, garantindo-se impunidade ao agente ofensor, ainda que ausente inércia ou desídia pelo autor da ação. Entendimento em sentido contrário, ressalto, implicaria em proteção deficiente ao direito fundamental de probidade, fato este em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Ainda que assim não fosse, em decisão prolatada no dia 18/08/2022, o Supremo Tribunal Federal decidiu sobre as mudanças na lei de improbidade, fixando, no que se refere a tese de prescrição, o seguinte: “O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei”. Dessa forma, restam afastadas as questões referentes à ocorrência da prescrição, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal de que o novo regime prescricional não retroage, restando afastadas as questões elencadas pelos requeridos. 2.2. Mérito. O ato de improbidade administrativa constitui-se como a conduta ilegal do agente público, ativa ou omissa, no exercício de sua função pública. A Lei 8.429/92 que trata do instituto, procurou de toda forma delimitar situações em que o administrador, assim agindo, estaria em descompasso com os interesses de seus administrados, bem como, com o patrimônio público propriamente dito. Como era de se esperar, tal legislação não teve a pretensão de esgotar as situações em que o administrador agindo, estaria afrontando os interesses ligados aos seus administrados, mas, isso sim, procurou se pautar principalmente nos princípios elencados pelo art. 37, da Constituição Federal, os quais deve o agente público seguir estritamente quando do desempenho de sua função pública. Sobre o conceito de probidade administrativa, embora muito próximo ao de moralidade administrativa, com ele não se confunde. De fato, para o ordenamento jurídico pátrio, para que um ato administrativo seja considerado probo, ele deve estar em consonância com todos os princípios que regem a Administração Pública, sendo a moralidade, portanto, somente um desses princípios a serem considerados. O professor Emerson Garcia, em sua obra intitulada “Improbidade Administrativa”, 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 79, ensina que: “A licitude dos atos dos agentes públicos há de ser extraída da conjunção das regras e dos princípios, quer explícitos, quer implícito, o que conferirá a estes um grau de obrigatoriedade que há muito é difundido, mas que pouco tem se concretizado. A unidade da Constituição indica que todas as normas por ela formalmente encampadas têm igual força e hierarquia, sendo cogente sua observância pelos agentes públicos. (...) Face a própria técnica legislativa que considerou ato de improbidade a mera violação aos princípios regentes da atividade estatal, devem ser buscadas novas perspectivas para a compreensão da probidade, considerada por muitos mera especificação do princípio da moralidade administrativa”. A Lei 8.429/92, normatizou a improbidade administrativa, prevendo o que é ato de improbidade administrativa, quem pode praticá-lo e quais as sanções aplicáveis. Hodiernamente, são previstos e punidos três tipos de atos de improbidade: o enriquecimento ilícito (art. 9º), o dano ao erário (art. 10) e a violação dos princípios da administração pública (art. 11). Da análise dos autos, verifica-se que o objeto central desta ação civil pública proposta pelo Ministério Público é a apuração dos supostos atos de improbidade administrativa praticados pelos requeridos, relacionados ao procedimento licitatório modalidade convite 12/08, realizado pelo Município de Ribeirão do Pinhal. Alega o Ministério Público, em síntese, que os réus atuaram de maneira coordenada e dolosa com o objetivo de fraudar referido procedimento licitatório, favorecendo indevidamente empresa previamente selecionada. Aponta ainda irregularidades específicas no certame, tais como insuficiência do número mínimo de licitantes, ausência de prévia cotação de preços, descrição vaga do objeto licitado, execução de serviços estranhos ao objeto contratual e falta de comprovação adequada dos serviços prestados, culminando em suposto prejuízo ao erário e violação dos princípios constitucionais da Administração Pública. Em suas contestações, os requeridos negaram veementemente as imputações do Ministério Público, ressaltando especialmente a inexistência de dolo, má-fé ou conluio. Argumentaram que o procedimento licitatório foi realizado dentro dos padrões técnicos e legais aplicáveis à época, destacando o caráter meramente opinativo de alguns atos, especialmente dos pareceres jurídicos, e a limitação funcional dos membros da comissão de licitação, sem poder decisório sobre a contratação ou sobre pagamentos efetuados. Sendo assim, a controvérsia dos autos diz respeito à ocorrência ou não dos atos de improbidade administrativa relacionados ao procedimento licitatório - convite 12/2008 -, especificamente quanto à existência de fraude, dolo e conluio entre os requeridos, bem como sobre a eventual comprovação de prejuízo ao erário e violação dos princípios da Administração Pública. Ou seja, a controvérsia envolve averiguar se os requeridos efetivamente agiram de forma dolosa e ilícita no certame licitatório ou se suas condutas se encontram regulares, desprovidas de dolo ou má-fé, não configurando, portanto, improbidade administrativa. Na inicial apresentada pelo Ministério Público, este pugnou pela declaração de nulidade dos atos administrativos, o ressarcimento dos danos materiais e morais, além da aplicação das sanções previstas na Lei 8.429/92. Com relação aos requeridos SAULO PINTO RIBEIRO e VANESSA KAMMER ATTISANO, pugnou pela condenação destes nas sanções previstas no art. 9º, caput e inciso I, da Lei 8.429/92, e com relação aos demais réus, a condenação nas sanções previstas no art. 10, caput, incisos I, VIII, XI e XII, também da Lei 8.429/92. Contudo, verifica-se que o juízo desmembrou a ação com relação aos requeridos SAULO e VANESSA, vez que estavam residindo no Canadá, o que teria impossibilitado a notificação pessoal destes à época, fundamentando, inclusive, na ausência de litisconsórcio necessário nas Ações de Improbidade Administrativa. Sendo assim, passo à análise individualizada da conduta de cada um dos requeridos, conforme consta da petição inicial e em cotejo com as provas constantes dos autos, vez que, embora os fatos narrados pelo Ministério Público estejam centrados em um mesmo procedimento licitatório, torna-se imprescindível que a responsabilização por ato de improbidade administrativa observe a atuação concreta e específica de cada agente envolvido. No que se refere ao requerido MOACIR RIBEIRO LATALIZA, o Ministério Público alega que este, na época que era prefeito do Município de Ribeirão do Pinhal, contratou uma empresa para a prestação de serviços de publicidade institucional, por meio do Procedimento Licitatório Convite 02/2008. O Ministério Público sustenta que o procedimento licitatório apresentou falhas formais, especialmente no que se refere ao número de empresas convidadas - inferior ao mínimo legal previsto no art. 22, §3º, da Lei 8.666/93 -, à imprecisão do objeto contratual e à ausência de comprovação documental detalhada da prestação dos serviços. No entanto, é importante enaltecer que a mera existência de irregularidades formais não é suficiente para a caracterização de ato de improbidade administrativa. A responsabilização do agente público exige, nos termos do §1º do art. 1º, da Lei 8.429/92, com a redação dada pela Lei 14.230/21, a demonstração do elemento subjetivo dolo, entendido como a intenção deliberada de praticar ato ímprobo, seja para violar princípios, causar lesão ao erário ou obter vantagem indevida. Art. 1º. (...). Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. Da análise do conjunto probatório contido nos autos, não revela qualquer conduta dolosa por parte do requerido MOACIR RIBEIRO LATALIZA, pelo contrário, verifica-se que o procedimento foi encaminhado aos setores competentes, tendo tramitado com parecer jurídico favorável e atuação da comissão de licitação, sem qualquer demonstração de que o então prefeito tenha agido com desvio de finalidade ou em conluio com os demais agentes para fraudar a contratação. Verifica-se do parecer jurídico de abertura de edital de licitação acostado nos autos (mov. 1.2, p. 17) o posicionamento favorável, no sentido de que: “(...). O presente parecer é favorável a instauração do procedimento licitatório na modalidade que se pretende, quanto à elaboração e formalidade do procedimento, registrando-se que deve ser levado em consideração que: (...)”. Importa ainda salientar que não se vislumbra qualquer indício concreto de direcionamento da contratação à empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA. ME, como alegado pelo Ministério Público, vez que, da análise dos autos, consta que além da empresa contratada, outra empresa foi formalmente convidada a participar do certame, tendo esta, contudo, renunciado expressamente ao convite, conforme termo de renúncia acostado nos autos (mov. 1.2, p. 22). Sendo assim, a referida circunstância desconstitui a imputação feita pelo Ministério Público no sentido de prévio ajustamento ou simulação do procedimento, pois indica que houve tentativa, ainda que não exitosa, de cumprir o mínimo legal de competitividade previsto para a modalidade convite. Da análise do depoimento pessoal prestado pelo requerido MOACIR RIBEIRO LATALIZZA, este consignou que (mov. 226.4): “Havia a necessidade de contratação de uma empresa de publicidade para o Município. Existem muitas promoções, muitas campanhas, que se for licitar todas as coisas pequenas que o Município necessita, é humanamente impossível. Então se contrata a empresa de publicidade para que seja tudo abrangido, como rádio, TV, etc. O objeto era a divulgação das campanhas institucionais. Não se recorda sobre a estimativa de valor que foi feita à época. Se recorda apenas da agência de publicidade, porque foi a contratada na época. Sobre os serviços, era mais utilizado na saúde, como em campanhas de vacinação, de combate à dengue e outras epidemias, etc. Sobre a campanha de rodeios, também foi realizada na época. O rodeio foi realizado normalmente, como comemoração ao aniversário do Município, e se no contrato da agência de publicidade abrangia isso, certamente foi utilizado. A empresa não fez a realização do rodeio, apenas a publicidade. Não conhecia a VANESSA e o SAULO, e nem estes os conheciam também. Todos os pagamentos e empenhos eram feitos pela contabilidade, de acordo com a documentação, porém, não se recorda como ficou definido o valor, pois era parte do setor da contabilidade. MARCELO CORINTH era contador, e era comum que as pessoas integrassem nas comissões à época. JOSMAR era cargo de confiança, também, é meu primo. Ele não era Secretário, era cargo comissionado para o departamento econômico. Não se recorda exatamente o que ele fazia, mas que ele fazia aquilo que o departamento exigia. A SANDRA sempre foi efetiva do Município, inclusive até hoje, trabalhando como professora da rede pública municipal. Como ela era funcionária pública, ela poderia ser chamada para fazer parte do Secretariado. Ela fez parte do Secretariado do quadro de funcionários efetivos. Era do Departamento de Cultura e é minha cunhada. CLÁUDIO era assessor jurídico, em cargo comissionado. As comissões de licitação eram feitas de forma permanente, sendo que MARCELO, JOSMAR e SANDRA foram designados para comissão permanente de licitação. Qualquer pessoa da comissão tem experiência para fazer a licitação, basta ver os critérios da lei, de modo que todos tinham experiência. O CLAUDIO não aparece na comissão, porque era do jurídico, e tudo precisa passar pela comissão de licitação. Como Prefeito municipal na época, a atribuição era homologar a licitação, e não fiscalizar. Quando havia necessidade de contratação de qualquer serviço, era determinado que fizesse. A decisão do Prefeito era apenas homologar, e tinha parecer jurídico em todas. A decisão era de acordo com o parecer jurídico. O advogado do Município na época era contratado para esse fim”. Com isso, verifica-se que o depoimento prestado pelo requerido, contribuiu de forma significativa para reforçar a tese da ausência de dolo e, por conseguinte, de improbidade administrativa, vez que, durante a atuação do órgão ministerial, este concentrou-se predominantemente em indagar sobre irregularidades formais no processo licitatório, nos termos do que foi apresentado na inicial, ou seja, sobre a composição da comissão de licitação e a qualificação técnica dos servidores designados, deixando, conduto, de aprofundar ou demonstrar a existência de uma conduta dolosa e intencional dirigida à prática de fraude ou direcionamento do certame, que teriam acarretado em prejuízo ao erário, nos termos da inicial apresentada. A propósito, o Ministério Público questionou o requerido no sentido de que: MP: O senhor disse aqui que qualquer pessoa que leia ali por 10 minutos e seja inteligente tem condições de compor a comissão de licitação. Então a quem a gente deve atribuir a culpa pelas irregularidades nessa licitação? R: Eu não posso dizer a quem é porque eu nem sei se houve essa irregularidade. Se houver irregularidade, não posso falar quem é o culpado, isso vai depender do entendimento da justiça. Verifica-se que a resposta evidencia, em primeiro lugar, que o requerido sequer reconhece a ocorrência de irregularidades graves no certame, mas tampouco se exime de eventual responsabilidade institucional. Em segundo lugar, demonstra que não houve qualquer reconhecimento de conduta consciente e direcionada à fraudar as regras da licitação ou à obtenção de vantagem indevida por parte de terceiros, o que seria imprescindível à configuração do ato ímprobo nos termos do art. 10, incisos I, VIII e XII, da Lei 8.429/92, conforme imputação feita na exordial. Segundo a narrativa apresentada pelo Ministério Público, este atribui aos requeridos condutas que, em tese, se amoldariam nas referidas hipóteses previstas na Lei de Improbidade Administrativa: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Para a configuração de tais condutas típicas, é exigido a presença de dolo específico, isto é, a vontade consciente e dirigida a lesar o patrimônio público ou frustrar os princípios da licitação, o que não se depreende do depoimento do requerido, tampouco do restante do conjunto probatório. Nesse sentido, cito: É inconstitucional — em razão da necessidade da existência do dolo do agente — a previsão da modalidade culposa de ato de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/1992, arts. 5º e 10, em sua redação originária). É constitucional a contratação direta de advogados pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, se preenchidos os requisitos da lei e desde que não haja impedimento específico para a contratação desses serviços. Teses fixadas: a) O dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da Constituição Federal), de modo que é inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade administrativa prevista nos arts. 5º e 10 da Lei nº 8.429/92, em sua redação originária. b) São constitucionais os arts. 13, V, e 25, II, da Lei nº 8.666/1993, desde que interpretados no sentido de que a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, além dos critérios já previstos expressamente (necessidade de procedimento administrativo formal; notória especialização profissional; natureza singular do serviço), deve observar: (i) inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e (ii) cobrança de preço compatível com a responsabilidade profissional exigida pelo caso, observado, também, o valor médio cobrado pelo escritório de advocacia contratado em situações similares anteriores. STF. Plenário. RE 610.523/SP e RE 656.558/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 28/10/2024 (Repercussão Geral – Tema 309) (Info 1156). Ademais, ao julgar o Tema 1.119, o Supremo Tribunal Federal decidiu que as alterações benéficas ao réu previstas na Lei 14.230/21 não poderiam incidir caso já houvesse condenação transitada em julgado. Contudo, as alterações poderiam ser aplicadas aos processos em curso, desde que ainda não tivesse coisa julgada, razão pela qual torna-se imprescindível a exigência do elemento subjetivo dolo específico para configuração dos atos de improbidade administrativa. Nesse sentido, cito: (...) 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. STF. Plenário. ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Rel. Min. LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 22/08/2023. Com isso, vale destacar que de todas as provas contidas nos autos, não se extrai qualquer elemento concreto que aponte o requerido como autor de condutas ilícitas, acordos prévios com os licitantes, ordens verbais de favorecimento ou anuência dolosa com irregularidades estruturais do certame. O Ministério Público, ao dirigir seus questionamentos exclusivamente à apuração de supostas falhas formais na condução do procedimento licitatório, afastou-se da questão central dos autos, que imputava ao requerido a prática de atos dolosos que teriam causado dano efetivo ao erário. A atuação do requerido limitou-se a autorizar a abertura do procedimento e a homologar sua conclusão, confiando nos pareceres técnicos e jurídicos que respaldaram a contratação. Não há prova nos autos de que tenha ele tido participação direta na escolha das empresas convidadas ou que tenha exercido influência para direcionar o resultado do certame. Tampouco há demonstração de benefício pessoal, de terceiros a ele relacionados ou de intenção deliberada de causar prejuízo ao erário. Assim, a imputação de responsabilidade apenas em razão da sua posição hierárquica de chefe do executivo municipal, sem a individualização da conduta dolosa, não se sustenta à luz do atual regime legal da improbidade decidida pelo Supremo Tribunal Federal. Não obstante, o Ministério Público não comprovou a inexistência da prestação dos serviços contratados, nem tampouco a ocorrência de dano efetivo ao patrimônio público, circunstâncias que reforçam o caráter meramente formal das irregularidades apontadas, não podendo o enquadramento ser feito como conduta ímproba. Sobre o tema: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS SEM LICITAÇÃO – DANO AO ERÁRIO E OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS – DOLO – SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.230/21 – APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR AO SISTEMA DE IMPROBIDADE – RETROATIVIDADE DA NORMA MAIS BENÉFICA. 1. O propósito da Lei de Improbidade Administrativa é coibir atos praticados com manifesta intenção lesiva à Administração Pública e não apenas atos que, embora ilegais ou irregulares, tenham sido praticados por administradores inábeis sem a comprovação de má-fé. Ausência de dolo. 2. Da ilegalidade ou irregularidade em si não decorre a improbidade. Para caracterização do ato de improbidade administrativa exige-se a presença do elemento subjetivo na conduta do agente público. 3. Ação civil pública por improbidade administrativa. A Lei 14.230/2021 promoveu profundas alterações na Lei de Improbidade Administrativa, dentre as quais a supressão das modalidades culposas nos atos de improbidade. Novatio legis in mellius. Retroatividade. Aplicação dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador (art. 1º, §4º, da Lei 8.429/92). 4. Para caracterização do ato de improbidade administrativa faz-se necessário dolo do agente, assim entendido como a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 da LIA, não bastando a voluntariedade do agente ou o mero exercício da função ou desempenho de competências públicas. Ausência de prova de dolo dos réus. Ação civil pública improcedente. Sentença reformada. Recursos providos. (TJ-SP - AC: 10012716120188260498 SP 1001271-61.2018.8 .26.0498, Relator.: Décio Notarangeli, Data de Julgamento: 18/04/2022, 9ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 18/04/2022). DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DA NOVA LEI N. º 14.230/21 AOS PROCESSOS EM CURSO EM VIRTUDE DA REVOGAÇÃO EXPRESSA DO TEXTO ANTERIOR. EXEGESE DA TESE FIXADA PELO E. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO TEMA N. º 1.199 (ARE 843.989/PR). MÉRITO. TESE ACUSATÓRIA SOBRE IRREGULARIDADES EM INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. ABSOLVIÇÃO DOS AGENTES NA ESFERA CRIMINAL PELOS MESMOS FATOS APURADOS NESSA LIDE. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO PODE SER IGNORADA, A DESPEITO DO PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. PRECENDENTES. MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA. SERVIÇOS QUE FORAM PRESTADOS, INEXISTINDO EFETIVA PERDA PATRIMONIAL, DESVIO, APROPRIAÇÃO, MALBARATAMENTO OU DILAPIDAÇÃO DE BENS OU HAVERES DA ENTIDADE PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE SE PRESUMIR DANO. EVENTUAL MÁ-GESTÃO DO ADMINISTRADOR QUE, POR SI SÓ, NÃO CONFIGURA ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APELOS DOS REQUERIDOS PROVIDOS.RECURSO DA ACUSAÇÃO PREJUDICADO. I. Consoante decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal por ocasião do Tema n.º 1.199, a nova Lei n.º 14 .230/2021 aplica-se imediatamente aos processos pendentes, eis que não é possível uma futura decisão condenatória com base em norma legal revogada. II. Não se desconhece que o e. Pretório Excelso, no âmbito da Medida Cautelar na ADI n .º 7.236, suspendeu a eficácia do novel artigo 21, § 4.º, da Lei n.º 8 .429/92 (com redação dada pela Lei n.º 14.230/21), o qual dispõe sobre a comunicação da absolvição criminal com a ação por improbidade administrativa. Tal decisão volta a fazer prevalecer o princípio geral da independência entre as instâncias. III. Todavia, ‘in casu’, no âmbito da Ação Penal envolvendo os mesmos fatos, esse e. Tribunal de Justiça já decidiu que ‘foram observadas as formalidades pertinentes à inexigibilidade de licitação, não tendo sido configurado o dolo específico de causar dano ao erário e efetivo prejuízo à Administração Pública, tampouco ajuste e combinação entre os acusados para lesar o patrimônio público’. IV. Desse modo, ainda que não haja vinculação obrigatória entre as instâncias, é pertinente considerar os argumentos contidos na decisão penal absolutória como elementos de persuasão nessa ação por improbidade administrativa, sob pena de ofensa à coerência jurídica, consoante recentes julgados das Cortes Superiores. V. Outrossim, esse e. Tribunal de Justiça tem decidido que eventual equívoco por parte do gestor público na escolha ou condução de procedimento de contratação, por si só, não é capaz de fazer presumir má-fé na conduta dos requeridos. VI. Ademais, o artigo 1.º, § 3.º, da Lei n. º 8.429/92, dispõe que o mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (TJ-PR 0001359-65.2016 .8.16.0175 Uraí, Relator.: Abraham Lincoln Merheb Calixto, Data de Julgamento: 02/04/2024, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/04/2024). Direito administrativo. Ação civil pública por ato de improbidade administrativa. Condenação por dolo genérico. Impossibilidade. Dolo específico não demonstrado. Danos ao erário não evidenciado. Necessidade de comprovação da efetiva perda e dano patrimonial do ente público. Recurso do Ministério Público Prejudicado, recurso de Luciane Maira Teixeira provido e recurso de Antônio Gonçalves da Luz (apelação adesiva) provido, com reforma da sentença para absolver os réus da condenação por improbidade administrativa. I. Caso em exame1.1. Apelações cíveis interpostas por Luciane Maira Teixeira, Antônio Gonçalves da Luz e pelo Ministério Público do Estado do Paraná contra sentença que reconheceu a prática de ato de improbidade administrativa, condenando os réus ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano .1.2. A apelante Luciane Maira Teixeira sustenta que a locação de imóvel para a manutenção de um cavalo, realizada durante sua gestão foi necessária e legal, enquanto Antônio Gonçalves da Luz argumenta que sua conduta não restou eivada de dolo e não causou danos ao erário.1 .3. O Ministério Público, por sua vez, pretende a reforma da r. sentença a fim de que os réus sejam condenados ao ressarcimento integral do dano causado ao erário. II. Questão em discussão2.1. A questão em discussão consiste em saber se os apelados praticaram ato de improbidade administrativa e se devem ser condenados ao ressarcimento integral de danos ao erário. III. Razões de decidir3.1 A nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/2021) é aplicável ao caso, exigindo a comprovação do dolo específico para a configuração de ato de improbidade.3 .2. Não foi demonstrado o dolo específico dos réus da intenção de lesar a Administração Pública, em que pese as irregularidades nas dispensas de licitação.3.3. A irregularidade na locação do imóvel não implica automaticamente em dano ao erário, sendo necessária a comprovação efetiva de perda patrimonial, o que não restou demonstrado nos autos. IV. Dispositivo e tese4.1. Apelações de Luciane Maira Teixeira e Antônio Gonçalves da Luz conhecidas e providas para reformar a sentença, absolvendo-se os réus da condenação por improbidade administrativa. Recurso do Ministério Público prejudicado. Tese de julgamento: A configuração de ato de improbidade administrativa exige a demonstração do dolo específico do agente, não sendo suficiente a mera irregularidade na conduta administrativa para caracterizar a improbidade. Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8 .429/1992, art. 10; Lei 8.666/93, art. 24, inciso X .Jurisprudência relevante citada: TJPR, 4ª Câmara Cível, 0002209-24.2023.8.16 .0192, Rel. Desembargadora Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, j. 08.07 .2024; TJPR, 4ª Câmara Cível, 0003065-03.2016.8.16 .0137, Rel. Desembargador Abraham Lincoln Merheb Calixto, j. 12.03 .2024; TJPR, 4ª Câmara Cível, 0066800-25.2015.8.16 .0014, Rel. Desembargadora Maria Aparecida Blanco de Lima, j. 22.10 .2023; TJPR, 4ª Câmara Cível, 0001284-25.2017.8.16 .0067, Rel. Desembargador Luiz Taro Oyama, j. 15.04 .2024. (TJ-PR 00053449420188160038 Fazenda Rio Grande, Relator.: substituto Marcio Jose Tokars, Data de Julgamento: 01/02/2025, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 06/02/2025). Ato contínuo, verifica-se que o requerido JOSMAR ELIAS DA SILVA, que à época dos fatos exercia função comissionada no Município de Ribeirão do Pinhal e integrava a comissão responsável pelo Convite 02/2008, também não se extrai dos autos qualquer elemento que permita concluir pela prática de ato de improbidade administrativa nos termos da Lei 8.429/1992. A inicial apresentada pelo Ministério Público atribui ai requerido a suposta participação dolosa na montagem do procedimento licitatório que culminou na contratação da empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA. ME, com fundamento nos incisos I, VIII, XI e XII do art. 10, da Lei de Improbidade Administrativa. No entanto, não se verifica a existência de dolo, nem de efetivo prejuízo ao erário, elementos essenciais à caracterização do ato ímprobo. Constata-se dos autos que o requerido foi designado para integrar a comissão de licitação por ato formal do Chefe do Executivo, tendo exercido sua função de maneira limitada à sua capacidade técnica, sem comprovação de que tenha determinado, influenciado ou direcionado qualquer aspecto relevante do procedimento. A atuação do requerido restringiu-se à assinatura dos documentos relacionados ao certame, em conjunto com os demais membros da comissão, sem qualquer prova de que tenha exercido papel decisivo na seleção da empresa vencedora ou na condução do processo de forma dolosa. Não há qualquer indício de que o requerido tivesse relação pessoal ou funcional com os representantes da empresa contratada, tampouco que tenha auferido qualquer vantagem ou concorrido para lesão ao patrimônio público. Ainda que se alegue que o certame não tenha observado todas as formalidades legais, como o número mínimo de participantes exigido para a modalidade convite, eventuais vícios formais não bastam para configurar improbidade administrativa, exigindo-se, nos termos do art. 10, da Lei de Improbidade Administrativa, a demonstração de prejuízo efetivo ao erário. Tal conclusão é reforçada pelo próprio depoimento pessoal prestado pelo requerido JOSMAR ELIAS DA SILVA durante a audiência de instrução (mov. 226.2): “(...) Não tinha experiência com licitação. Participava como membro da licitação. Que tinha o Presidente, e os dois membros. Então tudo era discutido ali. Se considerava competente para compor a comissão. A empresa foi contratada para divulgação, como divulgação de rodeios, através de telefone, das ruas, para REFIS de IPTU, entre outras. Não se recorda quem solicitou a abertura do processo licitatório. No primeiro processo foi feita a abertura e não compareceu nenhuma empresa. O Prefeito solicitou que fosse feito novamente o processo, e nessa segunda solicitação, compareceram duas empresas. O processo foi levado adianta e foi passado pelo jurídico, e o jurídico deferiu. O processo não foi devolvido para a comissão. Foi feita pesquisa de mercado na época. O presidente da comissão fez a pesquisa de mercado. A contabilidade que define a forma de pagamento. Não se recorda quem definiu o valor para licitação. As dúvidas na época do jurídico era com o Dr. Cláudio”. Observa-se que o requerido atuava de forma secundária e assistemática, seguindo o fluxo regular da tramitação do processo, sem exercer qualquer influência sobre os aspectos jurídicos, financeiros ou decisórios do procedimento, tampouco praticar qualquer ato que pudesse revelar dolo ou desvio de finalidade. Ao destacar que o processo passou pelo crivo do jurídico e não retornou à comissão, o depoente demonstra que atuou com confiança legítima na legalidade dos atos administrativos subsequentes, não havendo prova de que tenha percebido ou ignorado vícios insanáveis. Assim, não resta demonstrado que os serviços contratados não foram prestados, ou que houve superfaturamento, desvio de verba ou qualquer outro ato que resultasse em dano concreto à administração pública. Pelo contrário, constam nos autos elementos que indicam que os serviços de publicidade foram efetivamente executados pela empresa contratada. Com relação a requerida SANDRA MOLINA POLYCARPO SANTOS, que à época também integrava a comissão de licitação responsável pela condução do Convite 02/2008, sua designação deu-se por ato formal do Chefe do Executivo Municipal, no exercício regular da função pública. Em que pese a alegação de que seu vínculo de parentesco com o então prefeito configuraria suspeição ou quebra dos princípios da moralidade e impessoalidade, tal circunstância, por si só, não tem o condão de tornar ilícita sua nomeação, ausente qualquer prova de que tal vínculo tenha influenciado ou comprometido sua atuação funcional. Além disso, a inicial atribui à requerida a prática de atos de improbidade administrativa com base nos incisos I, VIII, XI e XII do art. 10 da Lei 8.429/1992, sustentando que sua atuação contribuiu para o direcionamento indevido da contratação da empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA. ME, gerando dano ao erário. No entanto, os elementos dos autos não são suficientes para sustentar tal imputação, pois não houve qualquer evidência de que a requerida teria praticado atos dolosos, tampouco que tenha concorrido de forma consciente para eventual irregularidade no certame. Sua participação limitou-se à assinatura dos documentos inerentes à função de membro da comissão, não havendo, assim como o requerido JOSMAR, protagonismo na definição de critérios, escolha de empresas convidadas, análise de propostas ou aferição da prestação dos serviços contratados. Ou seja, a própria composição da comissão era colegiada, tendo todas as decisões sido tomadas conjuntamente, inclusive sob a orientação da assessoria jurídica do Município. Ainda que se reconheça a existência de falhas formais no procedimento - como a participação de apenas duas empresas ou a ausência de detalhamento técnico do objeto -, tais vícios não implicam, por si sós, a prática de ato ímprobo, exigindo-se a demonstração de dolo e de dano efetivo ao erário. Sendo assim, não há nos autos comprovação de que os serviços contratados não tenham sido efetivamente prestados, tampouco de que tenham sido pagos valores superiores ao praticado no mercado. Ao contrário, há indicativos de que as ações publicitárias ocorreram - como divulgação de eventos institucionais e ações de incentivo à regularização fiscal -, não havendo prova documental ou testemunhal de superfaturamento, desvio de finalidade ou inexecução contratual. Ademais, o simples parentesco da requerida com o então prefeito e requerido MOACIR, ausente a demonstração de conluio ou benefício pessoal, não supre a exigência legal de dolo específico, tampouco se presta, isoladamente, à configuração de improbidade, pois a nomeação da servidora comissionado para integrar comissão de licitação, não é, por si, prova de desonestidade funcional. Ainda sobre os membros da comissão da licitação, o requerido MARCELO CORINTH exerceu, à época dos fatos, a função de presidente da comissão permanente de licitação do Município de Ribeirão do Pinhal, sendo, portanto, responsável pela condução formal do Convite 02/2008, que resultou na contratação da empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA. ME para prestação de serviços de publicidade institucional. A inicial atribui a MARCELO a prática de atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, I, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, sob a alegação de que teria conduzido de maneira fraudulenta o processo licitatório, frustrando sua licitude, permitindo a contratação direcionada da empresa vencedora e contribuindo para lesão ao erário. Contudo, a instrução processual não forneceu elementos suficientes para confirmar a configuração típica desses dispositivos, especialmente diante da atual redação da lei e dos critérios objetivos exigidos para responsabilização. Conforme sustentado em sua contestação, MARCELO CORINTH atuou na qualidade de servidor público designado para a presidência da comissão, sem qualquer prova de que tenha agido com dolo ou desonestidade, tampouco de que tenha influenciado na escolha das empresas convidadas ou buscado beneficiar previamente a empresa contratada. Ainda que tenha sido o responsável pela condução formal do certame, não há elementos que demonstrem má-fé, intenção de fraudar o caráter competitivo da licitação ou favorecimento indevido. Ao contrário, o requerido esclareceu que houve tentativa prévia de licitação, que restou frustrada por ausência de interessados, tendo-se reiniciado o processo com novo convite, do qual participaram duas empresas, sendo que uma delas declinou expressamente da participação. A referida circunstância, somada ao fato de que o processo foi submetido à análise e parecer favorável da assessoria jurídica do Município, sem qualquer devolução para correções, reforça a presunção de boa-fé na atuação do servidor. No seu depoimento pessoal, o requerido consignou que (mov. 226.3): “(...). Já trabalhou como membro de comissão em procedimentos anteriores. Trabalhou como membro também na gestão anterior. Recebia dos ofícios para instauração dos processos, montavam os editais (geralmente padrões), fazia toda a parte de publicidade, e no dia marcado o pessoal vinha e fazia as reuniões públicas. Boa parte era feita por mim, mas o Osmar e Sandra também ajudavam, como por exemplo nas reuniões, análise dos documentos, etc. Sobre o procedimento da licitação, era o responsável. Sobre o objeto da contratação, foi solicitada pelo Prefeito. O objeto era a contratação de empresa para intermediar as questões de imprensa, pesquisas, era amplo o objeto, era bastante coisa. O serviço seriam os solicitados pelo Prefeito, com relação a publicidade, propaganda, pesquisas. O valor era limitado ao teto da modalidade, mas não se recorda sobre o valor definido. Sobre o número mínimo de participantes, eram três, e nesse caso foram dois. Esse caso na época foi consultado pela assessoria jurídica, pois foi instaurado nos meses anteriores a mesma modalidade de licitação de carta convite, e conseguiram contatar com três empresas, porém, no dia não compareceu ninguém. Passado um período, o Prefeito solicitou que fosse feito novamente o processo. O processo foi retomado, e não conseguiam empresas que ser propunham a vir participar. Sobre os valores, o Prefeito determinou que os honorários da empresa fossem de 20%. Não foi utilizado parâmetro para definir os valores dos serviços. Alguns dos serviços prestados foram pesquisas, intermediação de espera telefônica, intermediação de shows com rodeios, que contratou bandas por intermédio dessa empresa, mas não sabe informar se ela que fez o rodeio. Não teve nenhum outro participante (...)”. Conforme consignado anteriormente, e ainda que se reconheça eventualmente a existência de irregularidades formais, como a ausência de convite ao número mínimo de três empresas ou falhas na delimitação do objeto, é certo que tais vícios, por si sós, não caracterizam improbidade administrativa. Assim, não tendo prova de que os serviços contratados não tenham sido prestados, tampouco de que tenham sido pagos valores superiores aos praticados no mercado. Por fim, vale destacar que não demonstrou que o requerido MARCELO tenha obtido qualquer vantagem pessoal, tampouco que tenha atuado em conluio com os demais agentes ou com representantes da empresa contratada, vez que sua atuação não extrapolou os limites do exercício funcional regular e não evidencia a prática de ato doloso apto a configurar improbidade. Por fim, o requerido CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA atuava, à época dos fatos, como assessor jurídico do Município de Ribeirão do Pinhal, sendo responsável por emitir parecer no processo licitatório Convite 02/2008, que resultou na contratação da empresa STAFF ART MARKETING & EVENTOS LTDA. ME para prestação de serviços de publicidade. A petição inicial lhe atribui a prática de atos de improbidade administrativa sob a alegação de que, mesmo diante de irregularidades formais no procedimento, teria emitido parecer jurídico favorável à contratação, contribuindo para a prática de ato lesivo ao erário. No entanto, da análise dos autos, não vejo também suporte jurídico ou fático suficiente para responsabilizá-lo por ato de improbidade, seja pela ausência de dolo, seja pela inexistência de dano efetivo ao erário ou de conduta funcional desviada de seus limites legais. Primeiro, cabe destacar que a contratação objeto da presente ação foi precedida de tentativa anterior de realização do certame, a qual restou infrutífera por ausência de interessados. Diante disso, a Administração Pública promoveu uma segunda tentativa, da qual participaram duas empresas - sendo que uma delas declinou formalmente de sua participação, restando apenas a empresa contratada. Assim, é relevante demonstrar que a emissão do parecer jurídico se deu em meio a uma realidade administrativa concreta, na qual havia necessidade de contratação de serviços de publicidade institucional, e restrita disponibilidade de prestadores de serviço no mercado local - realidade típica de cidades de pequeno porte, como é o caso de Ribeirão do Pinhal -, conforme relatado no depoimento pessoal prestado pelo presidente da comissão de licitação à época. Assim, exigir que o assessor jurídico obstasse o procedimento por vícios formais, diante da necessidade prática do Município em contratar o serviço e da escassez de interessados, seria desconsiderar a razoabilidade e o contexto fático, e impor à função técnica um ônus incompatível com suas atribuições. A atuação do assessor jurídico limitou-se à emissão de parecer técnico, não cabendo a ele substituir a autoridade competente na decisão de contratar. Além disso, sua manifestação, embora vinculante do ponto de vista interno, não detém força executiva nem confere comando de gestão, vez que o ato praticado pelo requerido se deu na fase final da licitação, não tendo influência alguma sobre as empresas que se candidataram a participar do certame. Ademais, não se demonstrou que o requerido tenha se beneficiado pessoalmente da contratação, nem que tenha mantido qualquer vínculo com os representantes da empresa contratada, tampouco que tenha atuado com o intuito de fraudar a licitação ou de beneficiar terceiros. O simples fato de ter opinado pela regularidade do procedimento, com base nos elementos que lhe foram submetidos à época, não configura dolo nem má-fé, especialmente em se tratando de vícios meramente formais, e em um contexto de necessidade de continuidade da prestação de serviços públicos essenciais. Nesse sentido, cito: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SUPOSTA FRAUDE A PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. DECISÃO SANEADORA QUE AFASTOU A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DAS SANÇÕES DA LEI N. º 8.429/92 E RECEBEU A PETIÇÃO INICIAL. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. TÉRMINO DO EXERCÍCIO DE MANDATO, DE CARGO EM COMISSÃO OU DE FUNÇÃO DE CONFIANÇA. LUSTRO PRESCRICIONAL VERIFICADO EM RELAÇÃO À RECORRENTE. INDÍCIOS DE CONDUTA ÍMPROBA MANIFESTAMENTE INEXISTENTES. EMISSÃO DE PARECER JURÍDICO ATESTANDO A VIABILIDADE DA CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS QUANTO À EVENTUAL CONLUIO E INTENÇÃO DOLOSA DE PROPORCIONAR ENRIQUECIMENTO ILÍCITO À EMPRESA CONTRATADA, E CONSEQUENTE PREJUÍZO AO ERÁRIO. REJEIÇÃO QUE SE IMPÕE. EXEGESE DO ARTIGO 17, § 6º-B, DA LEI N.º 8 .429/92. RECURSO PROVIDO. 1. A matéria concernente à prescrição nas ações decorrentes de ato de improbidade administrativa é regulada expressamente pelo artigo 23 da Lei n. º 8.429/92, cujo teor, à época do ajuizamento da ação, prescrevia que em relação ao detentor de cargo comissionado ou de função de confiança o prazo prescrevia em 5 (cinco) anos a contar, individualmente, do encerramento do vínculo com a Administração Pública. 2. No caso concreto, entre a data da exoneração da servidora e o ajuizamento da demanda transcorreu o lapso prescricional para a condenação nas penalidades previstas na Lei n. º 8.429/92, impondo-se reconhecer a prescrição da pretensão punitiva formulada em face da ora recorrente. 3. Contudo, ainda que se reconheça a prescrição da pretensão punitiva, o nobre Magistrado singular recebeu a inicial com base no artigo 10, inciso VIII, da Lei de Improbidade Administrativa, de modo que o feito subsiste em relação ao ressarcimento ao erário. 4. Nesse contexto, em decorrência das teses fixadas pelo Supremo Tribunal Federal nos julgamentos do RE 852475 e do ARE 843989, aplicáveis ao caso, faz-se necessária a presença da conduta dolosa. 5. Além disso, a ocorrência de lesão ao erário é conditio sine qua non para a condenação com base no tipo supracitado, não sendo admitido o dano presumido. 6. Pela narrativa do órgão ministerial, denota-se que o ato ímprobo atribuído à recorrente decorre, tão somente, da emissão de seu parecer jurídico favorável à contratação por dispensa de licitação. Nada mais foi dito quanto a ela. 7. Entretanto, não se pode dizer que tal ato se afigura como ímprobo, porque absolutamente ausentes elementos mínimos quanto à eventual conluio da recorrente no suposto esquema para contratação da empresa corré e intenção dolosa de proporcionar enriquecimento ilícito à contratada e consequente prejuízo ao erário. 8. Nesse passo, é preciso enfatizar que a simples elaboração de parecer, por si só, não é suficiente para caracterizar a improbidade da conduta do agente público, devendo ser provado o erro grosseiro, o dolo ou a má-fé, cujas circunstâncias sequer foram consideradas na petição inicial no que diz respeito à recorrente. 9. Outrossim, sequer há prova de prejuízo ao erário, vez que os serviços foram devidamente prestados e não houve alegação de superfaturamento, não sendo possível a condenação de ressarcimento, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública. 10. O próprio Parquet em sua petição inicial não aponta prejuízo efetivo, mas, tão somente, dano presumido, o que é vedado na atual redação da Lei n.º 8 .429/92. 11. Diante dessas premissas, forçoso concluir que a demanda originária, à luz das provas constantes nos autos e da jurisprudência uníssona desta Corte em casos semelhantes ao presente, é incapaz de gerar a suspeita da prática de ato de improbidade por parte da recorrente, impondo-se dar provimento ao recurso, para o fim de rejeitar a petição inicial da ação de origem em relação a ela, com fulcro no artigo 17, § 6º-B, da Lei n.º 8 .429/92. (TJ-PR 00440326920238160000 Pitanga, Relator.: Abraham Lincoln Merheb Calixto, Data de Julgamento: 12/03/2024, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 18/03/2024). Desse modo, verifica-se que a jurisprudência é clara ao afirmar que a responsabilização do assessor jurídico por ato de improbidade somente é cabível quando evidenciada a emissão dolosa de parecer com o intuito de acobertar ilegalidades sabidas ou previamente combinadas, o que não se verifica no presente caso. Ao contrário, o requerido atuou dentro dos limites de sua função técnica, sem participação na condução direta do certame, sem ingerência sobre a escolha das empresas e sem qualquer comprovação de vontade livre e consciente de causar lesão ao erário. Sobre a exigência do dolo específico, confiram-se precedentes: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – VÍCIOS NA LICITAÇÃO E NA EXECUÇÃO CONTRATUAL – DANO AO ERÁRIO – INEXISTÊNCIA – OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ADMINISTRAÇÃO – IRREGULARIDADE QUE NÃO CONFIGURA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AUSÊNCIA DE DOLO. 1. Para a caracterização do ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário impõe-se a efetiva demonstração de real prejuízo aos cofres públicos. Equipamento contratado que foi instalado. Autor que afirma não ser possível mensurar a parcela do contrato que não foi executada a contento. Ausência de prova de dano ao erário. Ofensa ao art. 10 da Lei nº 8 .429/92 não caracterizada. 2. O propósito da Lei de Improbidade Administrativa é coibir atos praticados com manifesta intenção lesiva à Administração Pública e não apenas atos que, embora ilegais ou irregulares, tenham sido praticados por administradores inábeis sem a comprovação de má-fé. 3. Da ilegalidade ou irregularidade em si não decorre a improbidade. Para caracterização do ato de improbidade administrativa exige-se a presença do elemento subjetivo na conduta do agente público. Entendimento que precede a edição da Lei nº 14.230/21. 4. Alteração de equipamentos – formato de lixeiras e encosto de bancos públicos – sem formalização em aditivos contratuais. Má-fé não demonstrada. Irregularidade que não caracteriza improbidade administrativa. Sentença reformada. Pedido improcedente. Recursos providos. (TJ-SP - Apelação Cível: 1000969-47 .2017.8.26.0472 Porto Ferreira, Relator.: Décio Notarangeli, Data de Julgamento: 24/04/2024, 9ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 24/04/2024). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ACIDENTE AUTOMOBILISTICO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO PÚBLICO. REPARAÇÃO DANOS. DECISÃO QUE REJEITOU A INICIAL. PRETENSÃO RECURSAL PELO RECEBIMENTO DE EMENDA À INICIAL. TESE DE CARACTERIZAÇÃO DE DOLO NA CONDUTA DESCRITA. IMPOSSIBILIDADE. CONDUTA QUE DEMONSTRA MERA INOBSERVÂNCIA DA VIA ADEQUADA PARA A RESTITUIÇÃO DE DANOS MATERIAIS CAUSADOS À TERCEIRO PARTICULAR PRATICADOS POR AGENTE PÚBLICO. EVIDENCIADA SUPOSTA CULPA (NEGLIGÊNCIA) DO AGENTE PÚBLICO. NÃO CONFIGURAÇÃO DO ARTIGO 10, INCISO XI, DA LEI FEDERAL Nº 8.429/1992. SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.203/2021. TEMA 1.199 DO STF. EXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO NA CONDUTA PARA A CONFIGURAÇÃO DE ATO IMPROBO. AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DOLO (ESPECÍFICO). ATOS DE IMPROBIDADE NÃO CONFIGURADOS. QUESTÃO A SER DIRIMIDA EM DEMANDA AUTÔNOMA NO ÂMBITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-PR 0001073-76.2022.8 .16.0143 Reserva, Relator.: Substituta Luciani de Lourdes Tesseroli Maronezi, Data de Julgamento: 08/04/2024, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 08/04/2024). APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE OSCIP COM ATENDIMENTO À EDUCAÇÃO BÁSICA NO MUNICÍPIO DE GUARATUBA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. REFORMA. AUSÊNCIA DE PROVAS CONSTITUTIVAS DE DOLO ESPECÍFICO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO COM BASE EM DOLO GENÉRICO. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 14.230/2021. MERA CONTRATAÇÃO IRREGULAR QUE NÃO CARACTERIZA IMPROBIDADE. SERVIÇOS EFETIVAMENTE PRESTADOS. TAC FIRMADO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO QUE JUSTIFICA A EMERGENCIALIDADE DA CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE EFETIVO DANO AO ERÁRIO. APELOS CONHECIDOS E PROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA. (TJ-PR 00032340620178160088 Guaratuba, Relator.: Substituto Marcelo Wallbach Silva, Data de Julgamento: 01/10/2024, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 03/10/2024). AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - SUPOSTA AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO DE DISPENSA DE LICITAÇÃO E DE INSTRUMENTO CONTRATUAL - DECISÃO AGRAVADA QUE RECEBEU A INICIAL DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM RELAÇÃO AOS AGRAVANTES E OUTROS ACUSADOS PROFERIDA APÓS A EDIÇÃO DA LEI N° 14.230/21 - INSURGÊNCIA DOS ACUSADOS - SUPERVENIÊNCIA DA LEI 14.230/21, QUE PROMOVEU MUDANÇAS NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA -POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DAS NORMAS MAIS BENÉFICAS AO ACUSADO, COM ALICERCE NO ART. 5º, INCISO XL, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR QUE, ASSIM COMO O DIREITO PENAL, SÃO ESPÉCIES DO GÊNERO “DIREITO SANCIONADOR - TESE DE INEXISTÊNCIA DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - ACOLHIMENTO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA O RECEBIMENTO DA INICIAL E INDÍCIOS DE COMETIMENTO DE ATOS ÍMPROBOS E LESÃO AO ERÁRIO - EXIGÊNCIA DA DEMONSTRAÇÃO DE INTENÇÃO DOLOSA DOS ACUSADOS - DOLO ESPECÍFICO NÃO EXISTENTE - DECISÃO AGRAVADA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 5ª Câmara Cível - 0016089-14.2022.8.16.0000 - Mandaguari - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO BRAGA BETTEGA - J. 12.12.2022). APELAÇÃO CÍVEL – IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO DOS RÉUS POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SUBSUNÇÃO DA CONDUTA AO ARTIGO 11, VIII, E, SUBSIDIARIAMENTE, AO ARTIGO 10, I, DA LEI Nº 8.429/1992 – CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO DE IMÓVEL PÚBLICO MEDIANTE PROJETO DE LEI EM DETRIMENTO DE LICITAÇÃO – IMÓVEIS QUE NÃO ESTAVAM SENDO UTILIZADOS E SERVIRAM COMO INCENTIVO PARA A INSTALAÇÃO EM REGIÃO COM POPULAÇÃO EMINENTEMENTE RURÍCOLA – RECOMENDAÇÃO EMITIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DESATENDIDA PELO PREFEITO – PROVA ORAL COLHIDA NOS AUTOS QUE CORROBORA CRENÇA DE LEGALIDADE POR SUPOSTA AUTORIZAÇÃO NA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL – DANO AO ERÁRIO NÃO EVIDENCIADO – OBRAS DE INVESTIMENTO NOS IMÓVEIS QUE SE REVERTERIAM EM FAVOR DO MUNICÍPIO – IMÓVEIS QUE UMA VEZ OCUPADOS DISPENSARIAM CUSTOS COM MANUTENÇÃO PELA PREFEITURA – INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE OS IMÓVEIS NÃO SERIAM REGULARMENTE UTILIZADOS – PRESUNÇÃO DE QUE A UTILIZAÇÃO DOS BENS GERARIA EMPREGOS E RENDA – DOLO ESPECÍFICO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO – INVIABILIDADE DE APLICAÇÃO DE TIPO SUBSIDIÁRIO JÁ REVOGADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 5ª Câmara Cível - 0003611-74.2019.8.16.0130 - Paranavaí - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ANTONIO FRANCO FERREIRA DA COSTA NETO - J. 30.01.2023). As severas sanções cominadas pela Lei de Improbidade Administrativa têm como fundamento a existência de grave violação aos deveres impostos aos agentes públicos cuja configuração não prescinde da demonstração cabal sobre de sua prática efetiva, afastada a possibilidade de imposição de sanções com base apenas em presunções. Significa dizer que a ação de improbidade administrativa exige prova certa, determinada e concreta dos atos ilícitos, para ensejar condenação e não se contenta com simples indícios. Impende ressaltar que sem a demonstração de má-fé, de desonestidade, de provas robustas, não há que se cogitar a aplicação de penalidades como as decorrentes de atos de improbidade administrativa, como por exemplo a aplicação das sanções contidas no art. 12 da Lei n. 8.429/92. A jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro ensina que: “Por isso mesmo, a aplicação da Lei de Improbidade exige bom senso, pesquisa da intenção do agente, sob pena de encarregar-se inutilmente o Judiciário com questões irrelevantes, que podem ser adequadamente resolvidas na própria esfera administrativa. A própria severidade das sanções previstas na Constituição está a demonstrar que o objetivo foi o de punir infrações que tenham um mínimo de gravidade, por apresentarem consequências danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para terceiros” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005, p. 727/728). Ao bem da verdade, observadas todas as circunstâncias do caso concreto, é aplicável ao presente caso os mencionados princípios da razoabilidade e proporcionalidade, que na lição de José dos Santos Carvalho Filho, podem ser assim conceituadas: “Razoabilidade é a qualidade do que é razoável, ou seja, aquilo que se situa dentro de limites aceitáveis, ainda que os juízos de valor que provocaram a conduta possam dispor-se de forma um pouco diversa. (...) O grande fundamento do princípio da proporcionalidade é o excesso de poder, e o fim a que se destina é exatamente o de conter atos, decisões e condutas de agentes públicos que ultrapassem os limites adequados, com vistas ao objetivo colimado pela Administração, ou até mesmo pelos Poderes representativos do Estado”. (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 28ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Editora Atlas, 2015, p. 41/42). Dessa forma, ausente o elemento subjetivo dolo e a demonstração de que os requeridos tenham agido com má-fé ou intuito de beneficiar terceiros ou a si próprio, não há como se reconhecer a prática de ato de improbidade administrativa, impedindo o reconhecimento de que sua conduta de amolde a qualquer das hipóteses previstas no art. 10, da Lei 8.429/92. Por derradeiro, cumpre destacar também a ausência de comprovação de prejuízo efetivo ao erário decorrente da contratação objeto da presente ação. Nos termos do art. 10, caput, da Lei 8.429/92, com a redação dada pela Lei 14.230/21, constitui ato de improbidade administrativa aquele que cause lesão ao erário, exigindo-se, portanto, como elemento objetivo do tipo, a efetiva ocorrência de dano patrimonial. A simples alegação de irregularidade formal ou de ausência de competitividade no procedimento licitatório não basta para configurar a hipótese legal, sendo indispensável que reste comprovado nos autos que recursos públicos foram desviados, mal aplicados ou empregados de forma antieconômica. O referido entendimento foi expressamente reafirmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.929.685/TO, de relatoria do Min. Gurgel de Faria, julgado em 27/08/2024, ocasião em que a 1ª Turma da Corte firmou o entendimento de que a exigência do efetivo prejuízo ao erário aplica-se aos processos em curso, mesmo que os fatos tenham ocorrido sob a vigência da redação anterior da lei, vejamos: A exigência do efetivo prejuízo, em relação ao ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário, prevista no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92 (com redação dada pela Lei nº 14.230/2021), se aplica aos processos ainda em curso. (STJ. 1ª Turma. REsp 1.929.685/TO, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 27/8/2024 – Info 823) No presente caso, não há nos autos qualquer elemento que comprove a ausência de prestação dos serviços contratados. Ao contrário, há indícios documentais e testemunhais no sentido de que a empresa efetivamente executou os serviços de publicidade institucional pactuados com a administração, conforme contratado. Não foi demonstrado, ainda, que os valores pagos extrapolavam o preço de mercado, ou que houve superfaturamento, duplicidade de pagamento ou desvio de finalidade. Dessa forma, ausente qualquer prova de que o Município tenha sofrido dano efetivo, seja por pagamento indevido, seja por descumprimento contratual, não se configura a hipótese prevista no art. 10 da Lei 8.429/92, sendo incabível o reconhecimento de ato de improbidade por lesão ao erário. Consequentemente, ainda que o Ministério Público sustente a ocorrência de vícios formais na fase de contratação, tais circunstâncias, desacompanhadas de demonstração de dano concreto e de elemento subjetivo dolo, não são suficientes para sustentar a pretensão condenatória. Nesse sentido, vejamos: DIREITO SANCIONADOR. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALEGADA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO DOLOSO (ART. 10 DA LIA). CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONSULTORIA EM LICITAÇÃO. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI FEDERAL Nº 14.230/2021. NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO EFETIVO AO ERÁRIO NEM DOLO ESPECÍFICO DO RÉU-APELANTE. IMPOSSIBILIDADE DE TIPIFICAÇÃO NO ART. 10 DA LIA. a) Cuida-se de apelo interposto contra sentença que condenou o Réu (ex-Prefeito de Tapejara), em ação de improbidade, em razão de dano ao erário decorrente da contratação, via licitação, de profissional para atividades de auditoria e consultoria em licitações. b) Considerando a aplicação imediata da Lei Federal nº 14 .230/2021 (Tema 1.199 do STF), a atual redação do art. 10 da LIA exige a perda patrimonial efetiva e o dolo específico para configuração de ato ímprobo por prejuízo ao erário. c) A perda patrimonial efetiva, em alegadas fraudes à contratação pública, restringe-se ao valor do eventual superfaturamento ou da inexecução dos objetos contratuais, situações não verificadas nos autos. Precedentes. d) A LIA não se presta a punir “administradores ou agentes públicos inexperientes, inábeis ou que fizeram uma má opção política na gerência da coisa pública” (STJ, Tema Repetitivo 1.108). e) O dolo específico não foi comprovado no caso. Não há elementos indicativos de conluio e beneficiamento indevido de particulares mediante irregularidades no procedimento licitatório. f) Ainda, a única atuação comprovada do Prefeito no Certame foi a assinatura da homologação da Licitação, bem como do Contrato. g) Como não demonstrada a ocorrência de dolo específico na conduta do Réu, não é possível a configuração do ato de improbidade do art. 10 da LIA. 2) APELO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. (TJ-PR 0007599-39.2017.8 .16.0077 Cruzeiro do Oeste, Relator.: Leonel Cunha, Data de Julgamento: 08/04/2024, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 13/04/2024) Diante de todo o exposto, não restou demonstrado, em relação a nenhum dos requeridos, o elemento subjetivo dolo exigido pela atual redação da Lei 8.429/92 para a caracterização de ato de improbidade administrativa. Tampouco se comprovou a existência de dano efetivo ao erário, conforme exigência expressa do art. 10 da referida norma legal, reforçada pelo entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.929.685/TO). Assim, ausentes os pressupostos legais indispensáveis à configuração do ato de improbidade administrativa, impõe-se a improcedência dos pedidos formulados na petição inicial. 3. DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, julgando extinto o processo com julgamento do mérito, o que faço com resolução do mérito na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil. O autor (parquet) é sucumbente. Todavia, deixo de condená-lo ao pagamento de custas e honorários advocatícios, posto que, em sede de ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé, o que não vislumbro do referido órgão ministerial, conforme art. 18, da Lei n. 7.347/1985. Cumpram-se as disposições do Código de Normas. Oportunamente, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Ribeirão do Pinhal, assinado e datado eletronicamente. Camila Felix Silva Juíza Substituta