Usuário Do Sistema 2 x Darci José Vedoin e outros
Número do Processo:
0003282-93.2010.4.01.3601
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF1
Classe:
EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES
Última atualização encontrada em
23 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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10/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES | Classe: APELAçãO CíVELJUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0003282-93.2010.4.01.3601 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003282-93.2010.4.01.3601 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal e outros POLO PASSIVO:Luiz Antonio Trevisan Vedoin e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S RELATOR(A):NEVITON DE OLIVEIRA BATISTA GUEDES PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta em desfavor de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI;10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Na inicial, o MPF imputa aos recorridos a prática de atos de improbidade administrativa, alegando a má gestão dos recursos públicos oriundos do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Em suas razões recursais, alega o MPF, em síntese, que: a) “da análise das provas acostadas aos autos, restou clara a existência de conluio, com o objetivo de frustrar o caráter competitivo do certame, demonstrando afronta aos princípios norteadores do procedimento licitatório, mormente os princípios da isonomia das condições e da competitividade”; b) “no Convite 047/2002 foram ‘convidadas’ as sociedades empresárias Leal Máquinas Com. e Representações., Comercial Rodrigues e Klass - Comércio e Representações Ltda., sendo todas pertencentes ao mesmo grupo, conforme afirmado pelo primeiro em depoimento acostado à mídia digital de fl. 1452”; c) “os apelados deixaram de realizar, também, pesquisa de preço no mercado (conforme relatório DENASUS/CGU acostado às fls. 700-717), o que fez com que a aquisição da unidade móvel de saúde e dos seus equipamentos fosse realizada sem parâmetros adequados para aferimento do preço”; d) “restou comprovado o superfaturamento na execução do Convênio no 2364/2002. O Laudo de Exame Contábil de fls. 201-207 demonstrou que o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentaram sobrepreço de 21,54%, correspondente a R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais)”; e) “é importante salientar que a Lei no 8.429/1992 abriga, além de condutas praticadas com dolo, aquelas sob a modalidade culposa, afastando qualquer dúvida acerca da ocorrência de atos de improbidade”; f) “mesmo se ausente a Má - fé, evidente é a culpa que, independente de locupletamento ou enriquecimento ilícito, é suficiente para caracterizar ato de improbidade administrativa passível de sanção” ; g) “sobressalta o dever de reparar o dano moral coletivo, não só pelo prejuízo efetivo suportado pelo erário (dano material), mas também pela violação à justa expectativa que os cidadãos do município de Comodoro/MT tinham de que os gestores públicos zelassem pelos recursos que estavam sob suas responsabilidades, garantindo a prestação do serviço público de saúde de modo muito mais eficiente”. Ao final, requerer “o conhecimento e provimento do presente recurso, com a reforma da sentença de fls. 1496-1508, a fim de que os apelados Vilson Piovesan Pompermayer, Darci José Vedoin, José Benildo de Oliveira Marinho e Luiz Antônio Trevisan Vedoin sejam condenados como incursos nas sanções previstas no artigo 12 da Lei no 8.429/1992, bem como ao pagamento de indenização pelo dano moral coletivo.” (ID 25980579-págs. 154/167). Regularmente intimados, apenas os apelados Vilson Piovesan Pompermaye e José Benildo de Oliveira Marinho apresentaram contrarrazões (ID 25980579-págs. 172/181, 181/195). A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso (ID 25980579-págs. 207/225). É o relatório. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, acusando-os de praticar as condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, da Lei nº 8.429/92. A suposta irregularidade estaria relacionada à má gestão dos recursos públicos decorrentes do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Narra a inicial que os demandados, mediante prévio ajuste de vontade, associaram-se com o propósito de frustrar o caráter competitivo da Carta Convite n° 047/2002, a fim de que empresas supostamente ligadas a organização criminosa investigada no âmbito da Operação Sanguessuga fosse a vencedora do certame, o que possibilitou, ainda, a execução do objeto do Convênio 2364/2002 com superfaturamento. Inicialmente, no que se refere à incidência da Lei 14.230/2021, no caso em espécie, passo a expor as seguintes considerações. Em 26/10/2021, foi publicada a referida lei que modificou consideravelmente a Lei 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa). Como já pacificado, a referida norma legal aplica-se ao caso dos autos, eis que atinge as ações em curso, considerando que o seu art. 1º, § 4º, determina, expressamente, a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, conforme já reconheceu o STF, no julgamento do ARE 843.989/PR, fixando, a propósito, a seguinte tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - dolo; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é irretroativa, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. (ARE 843.989/PR, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Julgamento: 18/08/2022 Publicação: 12/12/2022.) Passo, então, ao exame da apelação interposta, à luz das inovações legislativas advindas da Lei 14.230/21. O MPF busca a condenação de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (presidente da Comissão Permanente de Licitação - CPL), Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin pela prática das condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Com a nova redação dada pela Lei 14.230/2021, os arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92 passaram a exigir, para fins de configuração do ato ímprobo, a prática de conduta dolosa, excluindo-se, por conseguinte, a possibilidade de condenação por conduta culposa ou dolo genérico. Confira-se: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Grifei) Portanto, a partir da nova lei, é necessária a comprovação do dolo específico para a condenação por ato de improbidade administrativa. E não é só. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se faz necessária também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). No presente caso, não há comprovação do dano ao erário ou do enriquecimento ilícito dos requeridos. Na inicial, alega o MPF que Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (ex-Presidente da Comissão de Licitação) e os empresários Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin teriam frustrado o caráter competitivo do certame (Carta Convite nº 047/2002), fracionando indevidamente o objeto do Convênio nº 2364/2002, buscando dar aparência de veracidade a licitação, que desde o incício teria sido direcionada a empresas participantes do esquema conhecido como “Máfia dos Sanguessugas”, com superfaturamento de preços dos bens licitados (unidades móveis de saúde). O valor total pactuado no convênio foi de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Por oportuno, transcreve-se trecho da petição inicial (ID 26636534-págs. 06/30): (...). Para a execução do indigitado Convênio foram destinados recursos da ordem de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), montante este que reclamava procedimento licitatório, em regra, na modalidade carta-convite. Todavia, não por acaso, o presidente da Comissão de Licitação, JOSÉ BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO, utilizou-se da modalidade carta-convite. Muito embora tenha se utilizado do procedimento correto (carta-convite), sob orientação de VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, não observou os inúmeros requisitos que a lei exige para licitar com a Administração Pública, o que tornou possível a eleição prévia de empresas, seja de fato ou de "fachada", manipuladas pela organização criminosa. Conforme documentos constantes no Relatório Denasus (fls. 223/239), "participaram" da Carta-Convite n° 047/2002 as empresas LEAL MÁQUINAS COM E REPRESENTAÇÕES, COMERCIAL RODRIGUES e KLASS — COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. Além do irrefutável direcionamento prévio da licitação, restou sobejamente comprovado o superfaturamento na execução do Convênio n°. 2364/2002. Como bem se infere do Laudo de Exame Contábil, encartado às fls. 323/330 dos autos em epígrafe, o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentam sobrepreço na ordem de 21,54%, correspondente ao montante de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais) - fls. 328. (...). A sentença recorrida foi proferida pela ilustre Juíza Federal Ana Lya Ferraz da Gama Ferreira, da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Cárceres/MT, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Confira-se, no que importa, o excerto da sentença (ID 25980579-págs. 127/151): (...). II – FUNDAMENTAÇÃO (...) Da aplicação das sanções dispostas no art. 12 da Lei n.º 8.429/92. Pois bem, como relatado, o núcleo da lide reside em estabelecer se houve superfaturamento na aquisição de um veículo para implementação de unidade móvel de saúde no Município de Comodoro/MT. Referida aquisição originou-se de convênio firmado entre o Município de Comodoro/MT e a União, por intermédio do Ministério da Saúde. Para tanto o município realizou um procedimento licitatório, na modalidade Convite. Destrinchando a tese autoral. exposta na exordial de fls. 05/29, é possível vislumbrar os seguintes fatos e condutas relevantes e tendentes a subsidiar a responsabilização dos demandados pela prática de atos de improbidade descritos na Lei n°. 8.429/92, senão vejamos: a) o objeto do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; h) não aplicação dos recursos no mercado financeiro; c) omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; d) ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite; e) a empresa vencedora do certame, KLAUS — Comércio e Representação Ltda., está comprovadamente ligada ao es q uema fraudulento da "máfia das sanguessugas", tendo participado de licitações em outras localidades em q ue foi verificada a ocorrência do mesmo modus operandi ilícito; t) prejuízo ao erário da União de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais), visto que o veículo foi vendido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), ou seja, 21,54% superior ao valor de mercado do veículo à época R$ 54.814,00 (cinquenta e quatro mil e oitocentos e quatorze reais) — na aquisição da unidade móvel de saúde referente à Carta- Convites n.° 47/02 (Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT - fls. 206). Diante de tal narrativa, a qui considerada — por ora — sem a submissão ao crivo do contraditório, é possível vislumbrar, em tese, a possibilidade de subsunção, em desfavor dos requeridos, de diversos tipos estatuídos no âmbito do artigo 9.°, 10.º e 11.° da Lei 8.429/92: I) os demandados Vilson Piovesan Pompermayer, Benildo de Oliveira Marinho, Luiz Antônio Vedoin e Darei Vedoin violaram deliberadamente os deveres de honestidade, imparcialidade, le galidade e lealdade às instituições a que serviam, eis que praticaram atos visando a fim proibido em lei e deixaram de praticar atos de ofício a fim de viabilizar o intento criminoso a que se voltava à quadrilha que inte gravam; 11) na tipologia do estatuto em referência, os atos de improbidade administrativa que foram acima relatados violaram simultaneamente os artigos 9.°, incisos I e XI; 10, inciso I e VIII; e 11, inciso I e II, todos da Lei n.° 8.429/92; Fixado tais pontos controvertidos — uma vez que veentemente negados pelos demandados nas contestações de fls. 1017/1023, fls. 1024/1030 — cabe a este juízo avaliar, na esteira do artigo 373 do Código de Processo Civil/2015, se a parte autora se desincumbira do ônus de provar a efetiva materialidade das condutas e a medida do liame fatie° que ligaria os réus a sua prática. Pois bem. De plano, registro que, afora a narrativa de que a licitação compôs a gama de certames da "'Itália dos sanguessugas", não há qualquer prova de que isto tenha efetivamente ocorrido. Não há, na sentença extraída dos autos n.° 2006.36.00.007594-5/7.° Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso (mídia digital/cd - fls. 1.451/1.452), bem como da inclusa denúncia oferecida em face de DARCI JOSÉ VEDOIN e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN VEDOIN, qualquer menção ao município de Comodoro/MT, ou ao Senhor Vilson Piovezan Pompermayer, então prefeito municipal, nem tampouco aos membros da comissão permanente de licitação que conduziram os procedimentos licitatórios que deram ensejo à execução do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164. Igualmente, na ação penal n.° 2009.36.00.009094-9, a qual visa apurar ocorrência do crime de associação criminosa (art. 288 do CP) e de "frustrar" ou "fraudar", mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente o caráter competitivo do procedimento licitatório (art. 90 da Lei n.° 8.666/93), os requeridos Vilson l'iovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho foram absolvidos por ausência de prova de sua participação nos crimes, nos termos do art. 386, II, do CPP (11s. 1489/1492). Além da inexistente menção aos processos licitatórios em questão — o que, caso presente, daria solidez à presunção de que o certame compunha o esquema fraudulento -, a autora não cuidou de trazer aos autos nenhum outro documento que comprovasse a relação entre o esquema da família Vedoin e a Carta Convite n°. 47/2002 de Comodoro/MT. Feita essa ressalva inicial sobre a ausência de prova da inserção do procedimento para a aquisição da UMS de Comodoro/MT no esquema dos "sanguessugas", passo a analisar a tipificação das condutas dos envolvidos no certame. A tipificação de atos que ocasionem prejuízo ao erário como atos de improbidade administrativa está no artigo 9.°, 10 e 11 da Lei 8.429/92: "Art. 9° Constitui ato de improbidade 'administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. I° desta lei, e notadamente:" "Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1° desta lei, e notadamente:[...]" (destaquei) "Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administracão pública qualquer acão ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituicões, e notadamente:" Segundo consta da inicial, o prejuízo experimentado pelos cofres públicos residiria no superfaturamento da ambulância adquirida pelo Município. Consoante se extrai do já mencionado relatório da auditoria realizada pela CGU em conjunto com o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Auditoria n.° 5074 – Relatório do Convênio SlAFI: 457164 FNS: 2364/2002 — fls. 700/717), o bem foi adquirido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), sendo que o valor de mercado seria de R$ 58.448,41 (cinquenta e oito mil e quatrocentos e quarenta e oito reais e quarenta e um centavos). Assim, teria havido superfaturamento equivalente a R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos), e, considerando-se a proporção com que compareceram os recursos federais, a lesão à União seria de R$ 15.155,09 (quinze mil cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Aqui algumas considerações merecem ser tecidas. Primeiramente, registre-se que a licitação tinha por objeto a aquisição de ambulância (veículo transformado). A empresa Klass Comércio e Representação Ltda. foi a única responsável em fornecer o veículo — já transformado em UMS -, que custou R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais) (fl. 488). A disparidade de valores, conforme exposto pela União, comprovaria o superfaturamento na aquisição do bem. Contudo, não penso que os dados trazidos pela autora possam embasar a conclusão de que houve cometimento de ilícito a justificar a condenação pretendida, Explico. O supedâneo da presente ação são o "Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 20 1/208)" e o "Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (fls. 700/717)". Constata-se que toda argumentação da autora gira em torno desse superfaturamento constatado pela auditoria da União. Entretanto, da detida análise da página 234 do Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (tis. 712 dos autos), apenas uma página fala, sucintamente, da efetiva composição de preços para aferição do aludido prejuízo a ser salvaguardado, conforme se infere do Relatório de Cálculo de Prejuízo Estimado de SGI/CGU/PR — Cálculo de proporcionalidade convênios — nota fiscal n.° 00235 Klass Comércio e Representações Ltda. Desse relatório, elaborado no ano de 2008, base de toda construção argumentativa da autora, não é possível constatar como os auditores chegaram ao preço do Valor Estimado de Mercado do Veículo e o Prejuízo estimado para a U.M.S. Digo isso pelo fato de a própria União (fls. 784), em 21/06/2002, ter aprovado, pela área técnica do Ministério da Saúde (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS), plano de trabalho encaminhado pelo Município de Comodoro/MT, nos seguintes termos: "Após efetuada a análise de proposta apresentada pelo(a) PREF MUN COMODORO/MT, referente a AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE TIPO SUPORTE BÁSICO, conclui-se que foram atendidas todas as solicitações contidas nos anexos VII, VIII e IX do projeto". Dessa forma, nada temos a opor quanto aprovação do presente pleito, no valor total de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Observamos que para efeito de licitação dos equipamentos solicitados, deverão ser suprimidas quaisquer referenciais a marcas e modelos ou características que direcionem a especificação dos itens para um único fabricante." Além do que, a própria União (fls. 441/444), em 27/08/2003, por meio do Parecer GESCON n.° 5039/03, aprovou a prestação de contas relativas ao cumprimento do convênio n.° SIAFI: 457164 FNS: 2364/2002, nos seguintes termos: "Diante da documentação analisada e pelo constatado no Roteiro de Análise Preliminar, opinamos pela APROVAÇÃO da prestação de contas, tendo em vista que o objeto pactuado foi atingido, devendo entretanto, ser resguardado o direito de regresso, sem prejuízo de outras sanções no caso de serem constatadas irregularidades em (...) (fl. 444)" "A documentação apresentada foi considerada suficiente para regularizar as ocorrências e/ou impropriedades constatadas anteriormente (fl. 443)" "Dispõe os autos de reanálise da prestação de contas do Convênio supracitado, decorrente das justificativas e/ou documentação encaminhada pelo Gestor, em cumprimento ao Parecer Técnico n.° 4482, de 23/07/2003, encaminhado através do Oficio n.° 557, de 23/07/2003, cujos recursos foram repassados e utilizados, conforme abaixo demonstram": Valor MS/FNS: 69.984,00 Contrapartida Utilizada: 7.776,00 Total: 77.760.00 Pagamentos: 77.760,00 Devolvido: 2.225,34 Ora, como pode a União, por sua área técnica especifica, não se opor, em 21/06/2002 (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS — fl. 784), à aquisição da unidade móvel de saúde pelo Município ao preço de R$ 77.760,00 e vir, a própria União, por uma Auditoria n.° 5074 realizada em 2008 (fls. 700/717), sem especificar de forma detalhada, dizendo que ocorreu um superfaturamento na ordem de R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos) na aquisição pelo município da U.M.S? Destarte, a incerteza quanto ao valor de mercado da U.M.S. não para por aí, vez que o Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 201/208), realizado pela Policia Federal em 2009 e, baseada no Relatório da Auditoria n.° 5074 da União, como também na tabela FIPE de 2006 e não na de 2002 (data da aquisição do veículo), identificou que o preço de mercado seria R$ 54.814,00, motivo pelo qual teria ocorrido um superfaturamento na ordem de 54%, correspondente a diferença de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais). Deste modo, um simples lançamento sintético, como o realizado pela União às fls. 712, não é suficiente para comprovação de que houve sobrepreço. Isto porque, conforme já mencionado, todos os valores foram aprovados pelo Ministério da Saúde. Além do que, o comportamento da União revela ofensa a um dos desdobramentos do princípio da boa fé objetiva, na medida em age de forma contraditória — ventre contra factum proprium - , pois, ora concorda com o valor definido para aquisição da unidade móvel de saúde — U. M. S., quando da apresentação do plano de trabalho pelo convenente; ou quando aprovou a prestação de contas do mesmo e, de outro lado, em auditoria realizada após aproximadamente 6 (seis) anos da execução do convênio, afirma que ocorreu um superfaturamento do preço pago pela U. M. S. Por sua vez, o recibo de entrega de convite licitatório indica de forma clara quais são as empresas que receberam os convites, sendo cada empresa identificada por seu carimbo e assinatura (fls. 523/525). Vale ressaltar, ademais, que os demandados Vilson Piovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho, ao praticarem os atos jurídicos que culminaram na aquisição da U. M. S., estavam aparados por Parecer da Assessoria Jurídica do Município de Comodoro/MT, ao qual informou que o Procedimento licitatório — Convite n.° 047/2002 atendeu as disposições legais do art. 40 da Lei n.° 8.666/93 (fls. 522) e foi favorável à homologação do referido procedimento, devendo ser adjudicado o seu objeto ao vencedor do certame (fls. 576). Portanto, a míngua de um detalhamento idoneamente construído para inquinar de vícios reais capazes de anular o procedimento licitatório objeto do Convênio em exame, não há como acolher a pretensão da União, mormente por ler ela própria, através de Órgãos do seu corpo funcional contraditado o conteúdo da postulação trazida para sindicância judicial. Nesse sentido: "ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE CLAREZA. NÃO FORMAÇÃO DE CONVICÇÃO. ARTIGO 50, § 1º, LEI 9.784/99. VIOLAÇÃO. SUPERFATURAMENTO. DOLO E MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ATO IMPROBO. INEXISTENTE. I. A ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do servidor. 2. Os cálculos pertinentes ao prejuízo causado ao erário não foram trazidos aos autos, de forma o que não é possível compreender como os auditores chegaram ao referido valor. A ausência de clareza e congruência na argumentação impede a formação de convicção quanto aos atos praticados pelos réus, além de malferir o disposto no artigo 50, § I° da Lei n. 9.784/99. 3. O bem objeto do Convênio ri. 1564/2001 (SIAFI 430969), firmado entre o Município de Pintadas/BA e a Fundação Nacional de Saúde, foi adquirido por valor menor que o autorizado, não havendo, portanto, que se falar em superfaturamento. O valor repassado pela União, com fins específico, já havia sido arbitrado por área técnica, demonstrando que o preço de aquisição estava em conformidade com o preço praticado no mercado. 4. Não restou demonstrado nos autos o dolo e má-fé no intuito de fraudar o certame licitatório. Ato de improbidade administrativa não configurado. 5 - Recurso irnprovido." (AC 00036274820084013304 AC - APELAÇÃO CIVEL — 00036274820084013304. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO. TRF1. Terceira Turma. E- DJF1 Data: 29/08/2014, página: 1162) Diante desse panorama, entendo que não se pode afirmar, de maneira ausente de dúvidas, que o preço da aquisição da U. M. S. pelo Município revele, por si só, a existência de superfaturamento, tendo em vista a dificuldade em se aferir a presença de sobrepreço a partir do "valor de mercado". Em arremate, parece-me que a União não logrou demonstrar que os réus tenham incorrido nas figuras previstas no artigo 9.°, 10 e 11, da Lei n°. 8.429/92. Em relação às demais irregularidades apontadas nos procedimentos licitatórios pela auditoria e narradas na petição inicial (o objeto do Convênio n.° 236-1/2002, n.° SIAF1 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; não aplicação dos recursos no mercado financeiro; omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite), em que pese estar evidenciada a ocorrência de diversas transgressões ao princípio da legalidade, estas só se configuram quando se verifica a má-fé ou falta de cuidado objetivo deliberado, pelo agente público, no trato da coisa pública, o que também não restou demonstrado nos autos. Explico. Na medida em que não restou comprovada a relação entre o procedimento licitatório e o esquema das "sanguessugas", seria necessário que outros fatores levassem à conclusão de que os requeridos agiram dolosamente ao deixarem de observar os preceitos da lei de licitações. Algo que bem poderia demonstrar a intenção viciada dos agentes públicos seria seu enriquecimento indevido. ou qualquer outro tipo de vantagem que se pudesse imaginar. Mas inexiste qualquer elemento que concorra para a conclusão de que os agentes municipais, deliberadamente. violaram seus deveres funcionais e agiram de má-fé. Nesse diapasão, vale destacar a firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, para que seja configurado o ato de improbidade de que trata a Lei 8.429/92, "é necessário a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9.° e 11 e, ao mesmo, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10" (REsp 1.261.994/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 13104/12). Sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido. Precedentes do STJ: Resp 1038777/SP, DJe I 3/03/2011 . Inexistentes tais circunstâncias, não há corno reconhecer que praticaram ato de improbidade. Assim, as irregularidades s situam-se em outro patamar que não a improbidade administrativa. Portanto, após todas as ponderações feitas acima, entendo que os elementos de prova trazidos ao processo pela União não são suficientes para demonstrar: a) a inserção dos procedimentos da Carta Convite n°. 47/2002 no esquema fraudulento da "máfia dos sanguessugas"; b) prejuízo efetivo ao erário e c) elemento subjetivo — dolo/culpa -, necessário a qualificar as irregularidades no procedimento licitatório como ato de improbidade administrativa. Deste modo, a míngua de provas dos fatos/circunstâncias descritos na inicial, a improcedência do pedido é medida que se impõe. 2 . Do dano moral coletivo. Antes de tudo, registro que não é qualquer dano ao interesse difuso que configura o dano a coletividade, havendo necessidade de que os fatos assumam aspectos de gravidade o bastante para significar ofensa a um sentimento coletivo de decência e ofensa legitima aos valores da comunidade. No caso concreto, como o superfaturamento da unidade médica de saúde, adquirido por meio do Convênio n.° 2364/2002 — SIAFI: 457164, não foi provada de forma cabal, não há que se cogitar a respeito da existência de dano moral capaz de afrontar toda a coletividade. Entretanto, ainda que fosse caso, a jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, a repercussão pública negativa provocada pelas fraudes perpetradas por parlamentares e empresários, não demonstra o sofrimento popular. Vejamos: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. FRAUDE EM LICITAÇÃO REALIZADA PELA MUNICIPALIDADE. ANULAÇÃO DO CERTAME. APLICAÇÃO DA PENALIDADE CONSTANTE DO ART. 87 DA LEI 8.666/93. DANO MORAL COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO NÃO DEBATIDO NA INSTÂNCIA "A QUO". 1. (...). 2. Ad argumentandum tantum, ainda que ultrapassado o óbice erigido pelas Súmulas 282 e 356 do STF, melhor sorte não socorre ao recorrente, máxime porque a incompatibilidade entre o dano moral, qualificado pela noção de dor e sofrimento psíquico, e a transindividualidade, evidenciada pela indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da ofensa objeto de reparação, conduz à não indenizabilidade do dano moral coletivo, salvo comprovação de efetivo prejuízo dano. 3. Sob esse enfoque decidiu a 1" Turma desta Corte, no julgamento de hipótese análoga, verbis: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. DANO MORAL COLETIVO. NECESSÁRIA VINCULAÇÃO DO DANO MORAL À NOÇÃO DE DOR, DE SOFRIMENTO PSÍQUICO, DE CARÁTER INDIVIDUAL. INCOMPATIBILIDADE COM A NOÇÃO DE TRANSINDIVIDUALIDADE (INDETERMINABILIDADE DO SUJEITO PASSIVO E INDIVISIBILIDADE DA OFENSA E DA REPARAÇÃO). RECURSO ESPECIA IMPROVIDO." (REsp 508.28I/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.05.2006, DJ 01.06.2006) 4. Nada obstante, e apenas obiter dictum, há de se considerar que, no caso concreto, o autor não demonstra de forma clara e irrefutável o efetivo dano moral sofrido pela categoria social titular do interesse coletivo ou difuso, consoante assentado pelo acórdão recorrido:"... Entretanto, como já dito, por não se tratar de situação típica da existência de dano moral puro, não há como simplesmente presumi-Ia. Seria necessária prova no sentido de que a Municipalidade, de alguma forma, tenha perdido a consideração e a respeitabilidade e que a sociedade uruguaiense efetivamente tenha se sentido lesada e abalada moralmente, em decorrência do ilícito praticado, razão pela qual vai indeferido o pedido de indenização por dano moral". 5. Recurso especial não conhecido." (REsp 821891 / RS, Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, j. em 8- 4-2008, DJe 12-5-2008) (grifei) Por fim, o pedido de dano moral coletivo deve ser julgado improcedente. III — DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, nos termos do artigo 487, inciso 1, do CPC/20 I 5 c/c artigo 16 da Lei n.° 7.347/85. Proceda a liberação de eventuais restrições realizadas por meio do Sistema Bacen-Jud ou Renajud. Sem custas, nem honorários (artigo 18 da Lei n.° 7347/85). (...). (Negritos no original) Da leitura da sentença apelada, verifica-se que a magistrada de 1º grau concluiu que não há provas suficientes para confirmar o superfaturamento, especialmente porque o próprio Ministério da Saúde aprovou previamente o valor do veículo e posteriormente validou a prestação de contas do convênio. Também não há comprovação de que o procedimento licitatório estava envolvido no esquema fraudulento conhecido como "Máfia dos Sanguessugas". Concluiu, ainda, a magistrada de 1ª instância que não foram identificados indícios de enriquecimento ilícito ou dolo por parte dos agentes municipais, requisitos fundamentais para caracterização da improbidade administrativa. Assim, a ação foi julgada improcedente por ausência de provas de dano efetivo ao erário, de fraudes ou má-fé dos envolvidos. Pois bem. A presente ação fundamenta-se no Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT (ID 26636534-págs. 215/226) e no relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS e pela Controladoria-Geral da União (ID 25986532-págs. 22/37). Conforme mencionado pelo Juízo a quo na sentença, tanto o Relatório da fiscalização realizada pelo DENASUS em conjunto com a CGU quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve cobrança de sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. Isso porque, a falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, apesar de os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicarem suposta cobrança de sobrepreço na aquisição do veículo, referidas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em consideração o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. Registre-se, também, que o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, constatou um suposto prejuízo à União no valor de R$ 15.155,09 (quinze mil, cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Já, o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal em 2009, e baseado no mesmo relatório de auditoria, indicou um superfaturamento menor, no valor de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais). Ora a discrepância entre os valores apresentados gera incerteza quanto ao real prejuízo supostamente causado ao erário. Desse modo, inexistindo nos autos prova segura acerca da alegada cobrança de sobrepreço, e existindo documentos que atestam a entrega do veículo ambulância à municipalidade, não há como se falar em prejuízo ao erário. Nesse mesmo sentido, veja-se julgado proferido por este TRF da 1ª Região, em caso análogo: PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992 ALTERADA PELA LEI 14.230/2021. NORMA PROCESSUAL. SUPERVENIÊNCIA DE LEI NOVA. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. AFASTAMENTO DAS CONDUTAS CULPOSAS. APLICAÇÃO IMEDIATA. AUSÊNCIA DE DOLO. INEXISTÊNCIA DE ATO ÍMPROBO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÕES PROVIDAS. (...). Os atos de improbidade administrativa não se confundem com simples ilegalidades administrativas ou inaptidões funcionais — A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado (STJ, REsp 213.994-0, 1ª Turma; relator ministro Garcia Vieira; DJ de 27/9/1999). Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei 8.429/1992, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. Os fatos dos autos não justificam a leitura jurídica do julgador. À míngua de demonstração de que o objeto dos convênios não tenha sido cumprido, verifica-se que os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos prejudiciais, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o poder de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública (dolo) e, ainda, lesão ao erário, o que não ficou comprovado. Tal como ocorre na ação penal, em que a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII, do CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei 8.429/1992, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. É indispensável que haja um acervo mínimo e seguro de elementos informativos (judicializados), a salvo de dúvida razoável, em prol das imputações da inicial, do que não se desincumbiu o MPF, que tinha o ônus de provar os fatos constitutivos (art. 373, I, do CPC), apontando com precisão a existência de violação aos princípios da Administração Pública, especialmente em relação ao suposto dano ao erário. Remessa oficial não conhecida. Apelação a que se dá provimento, a fim de reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos do autor, nos termos do art. 17, § 11, da Lei 8.429/1992 (alterada pela Lei 14.230/2021). (Destaquei) (AC 0002308-35.2015.4.01.4101, JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (Conv.), TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 24/08/2023.) Do mesmo modo, também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido qualquer vantagem indevida. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite, a não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou dolo, o que não ficou comprovado nos autos, configurando, no máximo, meras irregularidades administrativas. Desse modo, embora possam ter ocorrido irregularidades na condução da Carta Convite n° 047/2002, decorrente do Convênio n° 2364/2002, não é possível afirmar que os membros da comissão de licitação ou o ex-prefeito de Comodoro/MT tenham recebido vantagens indevidas para sua execução. Ademais, competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu no presente caso, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa), devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Nesse sentido, cite-se precedentes desta Corte Revisora: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR (TEMA 1.199). ART. 10 DA LIA. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DANO AO ERÁRIO E DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. O STF, no julgamento do RE 843.989/PR (Tema 1.199), por unanimidade, fixou tese no sentido de que: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10, 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente (...)". 2. Pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações de improbidade administrativa ainda em curso. 3. Ademais, o STJ entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. 4. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. 5. Esta Corte já decidiu que a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não havendo mais que se falar em dano presumido. 6. A despeito das irregularidades formais narradas, consistente na não realização de licitação para contratação pública, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, não restou comprovado o intuito do agente em lesar o erário. 7. A improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 8. Não comprovada a existência de dano ao erário, tampouco o dolo específico, resta inviabilizada a condenação pela prática de ato ímprobo previsto no art. 10 da LIA. 9. Apelação provida. (sem negritos no original) (AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, TRF1 - QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. ART. 10, VIII, DA LEI 8.429/92. FRUSTRAÇÃO DA LICITUDE DE CERTAME LICITATÓRIO. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. CARÁTER SANCIONADOR. TEMA 1.199 DO STF. DOLO ESPECÍFICO DE LESAR O ERÁRIO E DE OBTER BENEFÍCIO, PARA SI OU PARA OUTREM. NÃO COMPROVADO. PERDA PATRIMONIAL EFETIVA NÃO DEMONSTRADA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. APELAÇÃO ADESIVA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. EXTENSÃO DOS EFEITOS AOS REQUERIDOS NÃO RECORRENTES. ART. 1.005 DO CPC. (...). 5. A imputação está lastreada em documentos reunidos pelo Ministério Público Federal e em parecer da Advocacia-Geral da União, nos quais foram verificadas irregularidades no procedimento licitatório a fim de redirecionar o certame em favor da empresa requerida. 6. De fato, houve irregularidades no procedimento licitatório, em razão (i) da inserção de cláusulas restritivas no Edital da Concorrência n. 01/2010; (ii) de inconsistências nas informações contidas no atesto realizado pelo ex-secretário de finanças do município, de que havia dotação orçamentária suficiente a respaldar a execução do objeto, que fora licitado antes mesmo da celebração do convênio com o Ministério da Integração; e (iii) da assinatura do primeiro termo aditivo do contrato firmado entre o Município de Miranorte/TO e a empresa requerida, a fim de dividir o objeto em etapas e reajustar o valor da suposta 1ª etapa de execução, com aumento de preços unitários de forma desproporcional. 7. Não obstante as irregularidades apontadas no procedimento licitatório, não há prova nos autos do alegado direcionamento do certame; do dolo específico de causar prejuízo ao erário ou de obter proveito ou benefício indevido, para si, ou para outra pessoa ou entidade de obter vantagem; e da comprovação da perda patrimonial efetiva com relação a todos os requeridos na ação de improbidade administrativa. 8. Embora a sentença tenha reconhecido a prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, condenou o ex-prefeito e o ex-secretário de finanças em razão da "má-gestão" e "inaptidão" de ambos para gerir o município e a respectiva pasta, elementos que, por si sós, não são aptos à caracterização do dolo específico ou má-fé dos agentes públicos de lesar o patrimônio público ou de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. 9. Além disso, o Ministério da Integração Nacional, por meio da Nota Técnica RPZ n. 037/2015, admitiu a utilização de licitação pretérita, apontada como irregular pelo autor e, conforme a Nota Técnica RPZ n. 012/2014, houve a adequação do valor objeto da avença. 10. Ausente, também, a comprovação do efetivo dano ao erário, porque houve a prestação de grande parte do objeto do contrato, consoante se extrai do Parecer nº 32/2017 da Secretaria de Infraestrutura Hídrica do Departamento de Obras do Ministério da Integração, subscrito em 14/02/2017 no sentido de que "houve um considerável avanço físico da obra e que a atual situação da obra é compatível com o total dos recursos pagos à construtora". 11. É assente o entendimento de que, "[a] partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in reipsa cf. art. 21, I, da LIA)". (AC 1000137-35.2017.4.01.3902, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, Terceira Turma, PJe de 21/03/2024). 12. À míngua de um mínimo substrato probatório de que os requeridos tenham atuado de maneira dolosa a fim de causar dano ao erário e de obter, para si ou para outrem, proveito ou benefício indevido decorrente da prática do ato imputado, somada à ausência do efetivo prejuízo supostamente causado ao erário, deve ser afastada a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, resultado que deve ser estendido aos demais requeridos não apelantes, nos termos do art. 1.005 do CPC. 13. Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento. 14. Apelação adesiva do ex-prefeito e secretário de finanças do Município de Miranorte/TO provida para reformar a sentença e afastar a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, com extensão dos efeitos da absolvição aos demais requeridos não recorrentes. (negritos não originais) (AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024.) Além disso, o MPF deixou de apresentar provas acerca do alegado acréscimo patrimonial que teria sido experimentado pelos apelados, condição esta sine qua non para enquadramento das condutas a eles atribuídas nos tipos previstos pelo art. 9º da LIA. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. A esse respeito, vale citar a seguinte ementa: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTS. 9º E 10, LEI Nº 8.429/92. ALTERAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO DEMONSTRADOS. INEXISTÊNCIA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO PROVIDO. EXTENSÃO DO JULGAMENTO. 1. Ação civil pública por improbidade administrativa que imputa aos Requeridos a prática de atos ímprobos tipificados nos arts. 9º, inciso IV e 10, inciso II, da Lei nº 8.429/92. 2. Conforme a sentença, os Requeridos praticaram condutas que ensejaram enriquecimento ilícito e dano ao Erário, nos termos dos arts. 9º, IV e 10, II, da Lei nº 8.429/92, por irregularidades na execução da obra do Convênio, firmado entre a União Federal, por intermédio do Ministério da Integração Nacional, e o Município de Porto Walter/AC. 3. A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, passou a exigir a presença do dolo específico para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92. Ainda, a Lei nº 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo prejuízo ou dano ao Erário para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10. 4. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. 5. É essencial que seja demonstrado o acréscimo patrimonial do agente para que se configure o ato de improbidade administrativa que importe em enriquecimento ilícito, o que não se verifica no caso. 6. Não restou comprovado o dolo específico na conduta dos Requeridos. Ainda, não restou demonstrado o efetivo prejuízo ao Erário, o que inviabiliza a condenação pelo art. 10 da LIA, tendo em vista as inovações da Lei nº 14.230/2021. 7. Conforme o art. 1.005, caput, do CPC, "O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses". O STJ compreende que a extensão dos efeitos deve ser feita àquelas situações que necessitem de tratamento igualitário. Precedente. 8. À vista do entrelaçamento fático entre os Réus e da inexistência de oposição manifesta dos litisconsortes, a eles deve ser estendido o efeito da improcedência da imputação, conquanto não tenha apelado, em respeito ao princípio da isonomia, por força do art. 1.005, caput, do CPC. 9. Recurso provido. Improcedência da ação de improbidade administrativa. Extensão do julgamento. (Grifei) (AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025.) Quanto ao pedido de condenação dos apelados pela prática da conduta prevista pelo art. 11, incisos I e II, da LIA, ressalte-se que a Lei 14.230/2021, ao introduzir e alterar diversos dispositivos da Lei 8.429/92, revogou expressamente a conduta genérica prevista no caput do art. 11, bem como os inciso I, II, IX e X, da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, abolidas as condutas genericamente tipificadas no caput ou nos incisos revogados do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nessa linha de compreensão, cito precedente do STJ: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.230/2021. RESPONSABILIZAÇÃO POR DOLO GENÉRICO. REVOGAÇÃO. APLICAÇÃO IMEDIATA. 1. (...). 3. A Primeira Turma desta Corte Superior, no julgamento do AREsp 2.031.414/MG, em 9/5/2023, firmou a orientação de conferir interpretação restritiva às hipóteses de aplicação retroativa da LIA (com a redação da Lei n. 14.230/2021), adstrita aos atos ímprobos culposos não transitados em julgado, de acordo com a tese 3 do Tema 1.199 do STF. 4. Acontece que o STF, posteriormente, ampliou a abrangência do Tema 1.199/STF, a exemplo do que ocorreu no ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, admitindo que a norma mais benéfica prevista na Lei n. 14.230/2021, decorrente da revogação (naquele caso, tratava-se de discussão sobre o art. 11 da LIA), poderia ser aplicada aos processos em curso. 5. Tal como aconteceu com a modalidade culposa e com os incisos I e II do art. 11 da LIA (questões diretamente examinadas pelo STF), a conduta ímproba escorada em dolo genérico (tema ainda não examinado pelo Supremo) também foi revogada pela Lei n. 14.230/2021, pelo que deve receber rigorosamente o mesmo tratamento. 6. (...). 7. Recurso especial não provido. (Grifei) (REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA TIPIFICADA NO ART. 10, VIII E IX, DA LEI 8.429/1992. DOLO VERIFICADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 7 DO STJ. EMBARGOS ACOLHIDOS APENAS PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS. 1. (...). 2. No julgamento do Tema 1.199/STF (ARE 843989 RG, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 4.3.2022), fixou-se o entendimento vinculante de que "A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente". 3. Embora, inicialmente, tal entendimento tivesse abrangido, apenas, pessoas sem condenação transitada em julgado, incursas em improbidades culposas do art. 10 da LIA, mais recentemente o STF tem ampliado a incidência da tese para extinguir as ações de improbidade cujos acusados estejam incursos nos tipos dolosos extintos da previsão genérica do caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 e, também, dos seus incisos I, II ou III, haja vista que, tanto quanto os tipos culposos, não haveria mais substrato jurídico normativo para o próprio prosseguimento da persecução em juízo. 4. (...). 6. Embargos de Declaração acolhidos apenas para prestar esclarecimentos. (Grifei) (EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024.) No caso dos autos, havendo pedido do apelante de condenação dos apelados pela prática da conduta então tipificada no inciso I e II, do art. 11, da Lei 8.429/92, é de se reconhecer a ausência superveniente de tipicidade da conduta. Em caso análogo, veja-se o seguinte precedente desta Corte Revisora: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FIRMADO COM O FUNDO NACIONAL DE SAÚDE - FNS. IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DE AÇÕES NA ÁREA DE SAÚDE. LESÃO AO ERÁRIO E VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ART. 10, I, VIII, XI, XI E 11, I, DA LEI 8.429/92. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 14.230/2021. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. RETROATIVIDADE. ENTENDIMENTO DO STF. TEMA 1.199. DOLO ESPECÍFICO E LESÃO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo ora recorrente contra o ex-prefeito do Município de Jânio Quadros, o ex-secretário saúde do Município e a cooperativa supostamente beneficiada, julgou improcedente o pedido de condenação dos requeridos nas condutas previstas nos art. 10, I, VIII, IX, XI e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades em procedimento licitatório e na execução de ações na área de saúde envolvendo verbas advindas de convênio firmado com Fundo Nacional de saúde FNS. 2. Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas nos art. 9º, 10 e 11 da Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021. Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava "obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (art. 11, § 2º). 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e ante o entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1.199. (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). 4. (...). 5. Por sua vez, o art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que "constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade", e desde que esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos, passando o rol a ser taxativo. Além da alteração de elementares de vários tipos infracionais, a Lei 14.230/2021, também revogou os incisos I ("praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamente ou diverso daquele previsto, na regra de competência") e II ("retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício"), do que resulta em atipicidade superveniente da conduta quanto a tais dispositivos. 6. (...). 9. Nesse contexto, não demonstrado o dolo específico referido na conduta dos réus, bem assim das demais elementares do tipo infracional do art. 10, I, VIII, XI, XI, da Lei n. 8.429/92, e ante a revogação do inciso I do art. 11 da mesma Lei, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação. 8. Apelação do Ministério Público a que se nega provimento. (Grifei) (AC 0005804-92.2016.4.01.3307, Rel. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, Décima Turma, PJe 17/07/2024.) Diante desse quadro, em observância ao princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, que tem aplicação imediata no âmbito do direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/21, em razão da abolição da tipicidade da conduta então imputada aos requeridos. Nesse sentido, cito precedentes desta Corte Revisora: Ação de improbidade administrativa. Inadequação da via processual eleita. Impossibilidade jurídica do pedido. Preliminares rejeitadas. Nulidade da sentença. Prejudicial rejeitada. Réu condenado pela prática das condutas ímprobas consistentes em "agir negligentemente na arrecadação de tributo ou de renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público", assim como "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício". Lei 8.429, de 2 de junho de 1992, Art. 10, X, Art. 11, II (na redação original). 1. (...). 7. A retroatividade da Lei 14.230, em favor do réu, não está restrita apenas às condutas culposas. A retroatividade também opera em caso de "abolição da tipicidade da conduta", acarretando a "improcedência dos pedidos formulados na inicial." (STJ, EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1.174.735/PE, relator Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 5/3/2024, DJe de 8/3/2024.) 8. A Lei 14.230 revogou o inciso II do art. 11 da Lei 8.429/92. Assim, não mais subsiste a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal. 9. Apelação de Ronan Rosa Batista provida. (AC 0001265-76.2013.4.01.3505, Rel. Juiz Federal Marcelo Elias Vieira (Conv.), Quarta Turma, PJe 31/07/2024.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, CAPUT E INCISO II, DA LEI Nº 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO PROVIDO. 1. Trata-se de ação de improbidade administrativa através da qual o Ministério Público Federal narra que o Apelante incidiu em irregularidades formais na condução de processo que apurou a inadimplência de cooperativa contratada pelo INCRA para a prestação de serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural. Requereu a sua condenação às penas do art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92, pela prática de atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 10 e 11 da mesma Lei. 2. A sentença condenou o Apelante pela prática de atos de improbidade administrativa tipificados no art. 11, caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92, antes das alterações realizadas pela Lei nº 14.230/2021. 3. Com o advento da Lei nº 14.230/2021, o rol de condutas do art. 11 da Lei nº 8.429/92 passou a ser taxativo, exigindo-se a subsunção da conduta em algum dos incisos deste dispositivo. Além disso, o ato tipificado no inciso II do art. 11 da Lei nº 8.429/92, após a revogação do dispositivo pela Lei nº 14.230/2021, deixou de configurar improbidade administrativa. 4. Com fundamento nos princípios do direito administrativo sancionador, entende-se que as modificações legislativas que não mais classificam como ímprobas condutas que eram consideradas desta natureza pelo regime anterior, devem abranger fatos passados não definitivamente julgados. Assim, considerando-se que a conduta atribuída ao Requerido não é mais tipificada como ato de improbidade administrativa, impõe-se a improcedência da ação. 5. Sentença reformada, para julgar improcedente a ação. 6. Recurso provido. (AC 0002294-10.2008.4.01.4000, Rel. Desembargador Federal Marcus Bastos, Décima Turma, PJe 20/11/2023.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR DO IBAMA. LIBERAÇÃO INDEVIDA DE LAUDOS DE VISTORIAS. IMPUTAÇÃO NA TIPOLOGIA DO ART. 11, CAPUT, E INC. I E II DA LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TIPO REVOGADO PELA LEI N. 14.230/21. ROL TAXATIVO. TIPICIDADE FECHADA. EXIGÊNCIA DE DOLO. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO IMEDIATA. RETROATIVIDADE. AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO TÍPICA. TEMA 1.199. STF. APELAÇÃO PROVIDA. 1. (...).. 2. A Lei n. 14.230/2021, provocou diversas alterações na Lei n. 8.429/92. Este (novo) sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa passou a alterar anteriores tipicidades e a revogar sanções, antes contempladas pela Lei n. 8.429/92, em sua redação original, dentre elas a que tem pertinência com a situação aqui analisada, ou seja, o art. 11 passou a enumerar as ações que seriam consideradas ímprobas de forma taxativa. Por outro lado, os inc. I e II do art. 11 da Lei 8.429/92 foi revogado pela Lei 14.230/2021. 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Relator: Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, Publicação 12/12/2022). 4. Registra-se que em 22.08.2023, ao apreciar o ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, o STF firmou a compreensão de que (...) As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 5. A ausência de imputação de um dos tipos do art. 11 ainda vigentes com as modificações promovidas pela Lei n. 14.230/21, leva ao reconhecimento de imputação genérica, sem vinculação a tipo específico, impondo-se a absolvição dos requeridos, por atipicidade. 4. Apelações a que se dá provimento para absolver os réus das sanções que lhes foram impostas na sentença. (AC 0005100-04.2010.4.01.3303, Rel. Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas, Décima Turma, PJe 15/12/2023.) Dessa maneira, seria o caso de se reconhecer o afastamento da imputação feita aos réus com base na referência ao caput e incisos I e II do art. 11, da Lei 8.429/92. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Nessa linha de intelecção, cite-se precedentes do Superior Tribunal de Justiça: DIREITO ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TEMA 1.199/STF. SUPERVENIÊNCIA DA LEI 14.230/2021. OMISSÃO RECONHECIDA. RECURSO ACOLHIDO, SEM EFEITOS INFRINGENTES. 1. (...). 2. Haverá abolição da figura típica quando a conduta a concretizar a anterior redação do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) se tornar irrelevante para os fins de tal lei, e não quando houver evidente correspondência na atual redação dos incisos do art. 11 da mesma lei. 3. Estando os fatos cristalizados no acórdão recorrido a tipificar a hipótese prevista no inciso XI do art. 11 da LIA, tem-se por presente verdadeira continuidade típico-normativa, não havendo que se falar em abolição da tipicidade. 4. Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos modificativos. (Grifei) (EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024.) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. INCÊNDIO EM PRÉDIO PÚBLICO. SITUAÇÃO EMERGENCIAL A PERMITIR CONTRATAÇÃO DIRETA. INCLUSÃO DE OBRAS E REFORMAS DE AMBIENTES NÃO ATINGIDOS PELO EVENTO DANOSO. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. FAVORECIMENTO DE PARTICULAR E TERCEIRO. COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM BASE NO ART. 11 DA LIA. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE TÍPICO-NORMATIVA. INEXISTÊNCIA DE ABOLIÇÃO DA IMPROBIDADE NO CASO CONCRETO. EXPRESSA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA NO INCISO V DO ART. 11 DA LIA. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. NECESSIDADE DE NOVA ADEQUAÇÃO. 1. (...). 2. A Primeira Turma do STJ, por unanimidade, em julgamento realizado no dia 6/2/2024, no AgInt no AREsp n. 2.380.545/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, acórdão pendente de publicação, seguiu a orientação da Suprema Corte no sentido de que "as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/2021 ao art. 11 da Lei n. 8.429/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado" (ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, DJe 6/9/2023). 3. Na sessão de 27/2/2024, no julgamento do AgInt no AREsp n. 1.206.630, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, DJe 1/3/2024, a Primeira Turma desta Corte, alinhando ao entendimento do STF, adotou a tese da continuidade típico-normativa do art. 11 quando, dentre os incisos inseridos pela Lei n. 14.230/2021, remanescer típica a conduta considerada no acórdão como violadora dos princípios da Administração Pública. 4. Na espécie, o Tribunal de origem, com base no conjunto fático e probatório constante dos autos, atestou a prática de ato ímprobo, em razão de dispensa indevida de licitação e do favorecimento de particular e terceiro, consignando a presença do elemento subjetivo em relação aos fatos apurados. A reversão de tal entendimento exige o reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 5. Nesse contexto, nota-se que a referida conduta (dispensa indevida de licitação e favorecimento de particular e terceiro) guarda correspondência com a hipótese prevista no inciso V do art. 11 da LIA, de maneira a atrair a referida tese da continuidade típico-normativa. 6. Considerando que a sanção de vedação de contratar com o Poder Público foi fixada em prazo superior ao limite legal (art. 12, III, da LIA, com a redação original), merece ser reduzida para 3 anos, de modo, também, a melhor atender os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, dadas as circunstâncias contidas no acórdão recorrido e as diversas outras penalidades aplicadas. 7. Agravo interno parcialmente provido, para conhecer do agravo, a fim de conhecer em parte do recurso especial, e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento, tão somente para reduzir a 3 anos a pena de proibição de contratar com a Administração Pública. (Grifei) (AgInt no AREsp 1.611.566/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 29/05/2024.) No caso dos autos, revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. Eis a redação do referido dispositivo legal: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...). V - frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; No caso concreto, contudo, em detida análise dos elementos e provas constantes dos autos, constata-se que apesar de existirem falhas na condução do procedimento da Carta Convite 47/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. A esse respeito, confira-se precedente desta Terceira Turma: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, I E II DA LEI 8.429/92. MERAS IRREGULARIDADES FORMAIS. AUSENCIA DA PRATICA ÍMPROBA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. O MPF atribuiu aos acusados a prática de atos de improbidade previstos no art. 11, I e II da Lei 8.429/92 em razão de inexigibilidade de licitação no âmbito do Senado Federal fora das hipóteses previstas em lei. 2. Não se verifica no caso em tela indícios de atos de improbidade administrativa, notadamente, porque a existência de meras irregularidades formais não configura ato ímprobo, razão pela qual não merece ser reformada a sentença guerreada, em face da inocorrência de dolo ou má-fé do agente. 3. A mera ilegalidade do ato ou inabilidade do agente público que o pratica nem sempre pode ser enquadrada como improbidade administrativa. O ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 4. Não se desconhece a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa (art. 12, da Lei 8.429/92). A decisão do TCU, contudo, embora não vincule o Poder Judiciário, pode ser utilizada como elemento de convencimento do Juízo. 5. Remessa oficial e apelação não providas. (Grifei) (AC 0047130-15.2014.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL NEY DE BARROS BELLO FILHO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 05/04/2024.) Por fim, quanto ao pedido de condenação por dano moral coletivo, este não se revela cabível, pois não há nos autos qualquer prova concreta de efetivo prejuízo moral sofrido pela coletividade em razão dos supostos atos lesivos. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. SAÚDE PÚBLICA. PRECARIEDADE DO ATENDIMENTO EM HOSPITAIS ESTADUAIS. RECEBIMENTO DE VERBAS FEDERAIS EM CONVÊNIO CELEBRADO COM A UNIÃO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA A REESTRUTURAÇÃO DE SALAS CIRÚRGICAS E AQUISIÇÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS PARA A REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS. POSSIBILIDADE. OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES. INEXISTÊNCIA. PROIBIÇÃO DE CONTRATAÇÃO DE ESTABELECIMENTOS PRIVADOS CONVENIADOS E UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESTADUAL DE SAÚDE. DESCABIMENTO. PEDIDOS DE REDUÇÃO DA MULTA DIÁRIA E DILATAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. REJEIÇÃO. DANO MORAL COLETIVO NÃO CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. (...). IX. A orientação jurisprudencial já sedimentada nos tribunais pátrios firmou-se no sentido de que "a possibilidade de indenização por dano moral está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo restrição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da legislação têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial" e de que "o dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera extrapatrimonial de uma pessoa" (REsp 1397870/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 02/12/2014, DJe 10/12/2014). Todavia, no caso concreto, entendo que não é cabível a condenação dos réus ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, pois, a despeito da precariedade no atendimento dispensado pelos hospitais estaduais de Porto Velho/RO, não restaram comprovados nos autos os danos físicos ou emocionais eventualmente suportados pelos pacientes mencionados na inicial, sendo inoportuna, também, a condenação em relação a pacientes futuros, que vierem a ser atendidos com atraso ou desídia, sob pena de se distorcer a lógica da responsabilidade civil, já que a formação do título relativo à reparação do dano antecederia a própria prática do ato ilícito. É certo que não se justifica a reparação por dano extrapatrimonial coletivo quando feita menção genérica à coletividade, sem demonstrar a dor e o sofrimento do grupo especificamente atingido (AG 0026914-77.2016.4.01.0000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 - Terceira Turma, e-DJF1 DATA: 07/10/2016). Portanto, considerando que os autores não se desincumbiram do ônus de demonstrar o efetivo dano moral sofrido, deve ser mantida a sentença também neste capítulo, ficando ressalvada a possibilidade de os pacientes perseguirem individualmente a reparação pecuniária que entenderem devida, em ações próprias, bem como de eventual reparação de danos ao erário em sede de ação de improbidade administrativa. X. Preliminar rejeitada. Remessa necessária e apelações desprovidas. (REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (CONV.), TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020.) ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. INEXECUÇÃO DO OBJETO DO CONVÊNIO FIRMADO ENTRE O INCRA E O MUNICÍPIO E AUSÊNCIA DA RESPECTIVA PRESTAÇÃO DE CONTAS. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COMPROVADO NOS AUTOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DO EFETIVO ABALO MORAL SOFRIDO PELA MUNICIPALIDADE. CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. LEI 7.347/85, ART. 18. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO REQUERIDO NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ÓBICE DO ART. 128, § 5º, II, CF/88. 1. A Lei 8.429/92, referente à Ação de Improbidade Administrativa, que regulamentou o disposto no art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art.9º); b) que causem prejuízo ao erário (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11). 2. Comprovado, de forma irrefutável, que o ex-prefeito não deu efetivo cumprimento ao objeto previsto no Convênio n. 22.006/97 e, ainda, que não houve a devida prestação de contas, resta caracterizado o ato de improbidade previsto nos artigos 10 e 11, VI, da Lei nº 8.429/92. Sentença condenatória se mantém ante o extenso acervo probatório contido nos autos. 3. Não é qualquer ato que viole o princípio da legalidade que gera um ato de improbidade administrativa, é necessário um algo mais para o agente ser tachado de ímprobo e ser tão severamente punido com o previsto na Lei 8.429/92. É preciso o dolo, a má-fé, a intenção de violar o princípio basilar da Administração Pública, circunstância não verificada na conduta da apelada CONSTRUTORA TRANSPACHECO LTDA, que não deu prosseguimento à execução da obra contemplada no Convênio n. 22.006/97, em razão da ausência de repasses financeiros por parte do Município. 4. A caracterização dos danos morais no âmbito de ação de improbidade administrativa reclama a prova inequívoca do abalo moral impingido pelo ato ímprobo, in casu, seria necessário prova no sentido de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentidos lesados e abalados moralmente. Não basta supor a mera frustração da municipalidade ou, ainda, o descrédito pela máquina administrativa em razão da inexecução do objeto avençado no Convênio, pois não se presume a existência do dano moral. Hipótese em que o autor não trouxe provas do efetivo dano moral sofrido pela categoria titular do interesse coletivo atingido pelo ato de improbidade administrativa. 5. O Ministério Público, vencido na ação por improbidade administrativa por ele ajuizada, só responderá pelos honorários de advogado se configurada a má-fé na sua atuação, como prevê o art. 18 da Lei 7.347/85, aplicada subsidiariamente. Não havendo sequer indícios de má-fé do Parquet Federal não há como fundamentar sua condenação no pagamento de honorários. 6. Não se sustenta a condenação do requerido no pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público Federal haja vista o óbice imconvite rio Público é vedado receber "a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais." 7. Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida. (AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ TOURINHO NETO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291.) Nesse contexto, embora a "Operação Sanguessuga" tenha revelado um esquema fraudulento de alcance nacional, com grande repercussão na mídia, não há justificativa para a condenação dos requeridos ao pagamento de dano moral coletivo, pois não foi comprovado que a conduta tenha atingido o círculo primordial de valores sociais. A fraude ocorreu na execução do Convênio nº 2364/2002, com a condução irregular da licitação, o que violou a legislação aplicável, mas sem evidência de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentido lesados e abalados moralmente. Ante o exposto, NEGO provimento à apelação do MPF. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 APELANTES: UNIÃO FEDERAL, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APELADOS: DARCI JOSÉ VEDOIN, LUIZ ANTONIO TREVISAN VEDOIN, VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, JOSE BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO Advogado do(a) DO APELADO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S E M E N T A PROCESSO CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MPF. LEI 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI 14.230/21. CONVÊNIO PARA AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. FRAUDE À LICITAÇÃO NÃO COMPROVADA. DANO AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADOS. ART. 11, I e II, DA LIA. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE. DANO MORAL COLETIVO. NÃO OCORRÊNCIA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. 2. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se exige também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). 3. No caso em exame, tanto o relatório de fiscalização realizado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. A falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicaram um suposto sobrepreço na aquisição do veículo, mas essas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em conta o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. 4. As discrepâncias encontradas entre o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, e o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal, impedem que referidos documentos sejam considerados como provas hábeis a comprovar o alegado sobrepreço. 5. Também não está demonstrado o alegado prejuízo ao erário, considerando que o objeto do Convênio 2364/2002 foi integralmente cumprido, com a entrega dos bens à comunidade de Comodoro/MT, além de não ter sido demonstrado o superfaturamento em sua aquisição. 6. Também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido vantagem indevida. 7. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite; não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou do dolo específico, o que não ocorreu no presente caso, evidenciando-se, no máximo, meras irregularidades administrativas. 8. Competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa) para a configuração do ato ímprobo, devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Precedente do TRF1: AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024; AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO (CONV.), DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024. 9. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. Nesse sentido: TRF1, AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL (Conv.), DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025. 10. Revogadas as condutas tipificadas nos incisos I e II do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nesse sentido: STJ, REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024 e STJ, EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024. 11. O Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Precedente do STJ: EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024. 12. Revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. 13. No caso, apesar de existirem falhas na condução da Carta Convite 047/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. 14. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (Conv.), SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020 e AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ FEDERAL TOURINHO NETO, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291. 15. Apelação do MPF a que se nega provimento. A C Ó R D Ã O Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do MPF, nos termos do voto do relator. Brasília/DF, sessão virtual de 13 a 26 de maio de 2025. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator
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10/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES | Classe: APELAçãO CíVELJUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0003282-93.2010.4.01.3601 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003282-93.2010.4.01.3601 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal e outros POLO PASSIVO:Luiz Antonio Trevisan Vedoin e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S RELATOR(A):NEVITON DE OLIVEIRA BATISTA GUEDES PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta em desfavor de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI;10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Na inicial, o MPF imputa aos recorridos a prática de atos de improbidade administrativa, alegando a má gestão dos recursos públicos oriundos do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Em suas razões recursais, alega o MPF, em síntese, que: a) “da análise das provas acostadas aos autos, restou clara a existência de conluio, com o objetivo de frustrar o caráter competitivo do certame, demonstrando afronta aos princípios norteadores do procedimento licitatório, mormente os princípios da isonomia das condições e da competitividade”; b) “no Convite 047/2002 foram ‘convidadas’ as sociedades empresárias Leal Máquinas Com. e Representações., Comercial Rodrigues e Klass - Comércio e Representações Ltda., sendo todas pertencentes ao mesmo grupo, conforme afirmado pelo primeiro em depoimento acostado à mídia digital de fl. 1452”; c) “os apelados deixaram de realizar, também, pesquisa de preço no mercado (conforme relatório DENASUS/CGU acostado às fls. 700-717), o que fez com que a aquisição da unidade móvel de saúde e dos seus equipamentos fosse realizada sem parâmetros adequados para aferimento do preço”; d) “restou comprovado o superfaturamento na execução do Convênio no 2364/2002. O Laudo de Exame Contábil de fls. 201-207 demonstrou que o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentaram sobrepreço de 21,54%, correspondente a R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais)”; e) “é importante salientar que a Lei no 8.429/1992 abriga, além de condutas praticadas com dolo, aquelas sob a modalidade culposa, afastando qualquer dúvida acerca da ocorrência de atos de improbidade”; f) “mesmo se ausente a Má - fé, evidente é a culpa que, independente de locupletamento ou enriquecimento ilícito, é suficiente para caracterizar ato de improbidade administrativa passível de sanção” ; g) “sobressalta o dever de reparar o dano moral coletivo, não só pelo prejuízo efetivo suportado pelo erário (dano material), mas também pela violação à justa expectativa que os cidadãos do município de Comodoro/MT tinham de que os gestores públicos zelassem pelos recursos que estavam sob suas responsabilidades, garantindo a prestação do serviço público de saúde de modo muito mais eficiente”. Ao final, requerer “o conhecimento e provimento do presente recurso, com a reforma da sentença de fls. 1496-1508, a fim de que os apelados Vilson Piovesan Pompermayer, Darci José Vedoin, José Benildo de Oliveira Marinho e Luiz Antônio Trevisan Vedoin sejam condenados como incursos nas sanções previstas no artigo 12 da Lei no 8.429/1992, bem como ao pagamento de indenização pelo dano moral coletivo.” (ID 25980579-págs. 154/167). Regularmente intimados, apenas os apelados Vilson Piovesan Pompermaye e José Benildo de Oliveira Marinho apresentaram contrarrazões (ID 25980579-págs. 172/181, 181/195). A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso (ID 25980579-págs. 207/225). É o relatório. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, acusando-os de praticar as condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, da Lei nº 8.429/92. A suposta irregularidade estaria relacionada à má gestão dos recursos públicos decorrentes do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Narra a inicial que os demandados, mediante prévio ajuste de vontade, associaram-se com o propósito de frustrar o caráter competitivo da Carta Convite n° 047/2002, a fim de que empresas supostamente ligadas a organização criminosa investigada no âmbito da Operação Sanguessuga fosse a vencedora do certame, o que possibilitou, ainda, a execução do objeto do Convênio 2364/2002 com superfaturamento. Inicialmente, no que se refere à incidência da Lei 14.230/2021, no caso em espécie, passo a expor as seguintes considerações. Em 26/10/2021, foi publicada a referida lei que modificou consideravelmente a Lei 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa). Como já pacificado, a referida norma legal aplica-se ao caso dos autos, eis que atinge as ações em curso, considerando que o seu art. 1º, § 4º, determina, expressamente, a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, conforme já reconheceu o STF, no julgamento do ARE 843.989/PR, fixando, a propósito, a seguinte tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - dolo; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é irretroativa, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. (ARE 843.989/PR, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Julgamento: 18/08/2022 Publicação: 12/12/2022.) Passo, então, ao exame da apelação interposta, à luz das inovações legislativas advindas da Lei 14.230/21. O MPF busca a condenação de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (presidente da Comissão Permanente de Licitação - CPL), Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin pela prática das condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Com a nova redação dada pela Lei 14.230/2021, os arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92 passaram a exigir, para fins de configuração do ato ímprobo, a prática de conduta dolosa, excluindo-se, por conseguinte, a possibilidade de condenação por conduta culposa ou dolo genérico. Confira-se: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Grifei) Portanto, a partir da nova lei, é necessária a comprovação do dolo específico para a condenação por ato de improbidade administrativa. E não é só. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se faz necessária também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). No presente caso, não há comprovação do dano ao erário ou do enriquecimento ilícito dos requeridos. Na inicial, alega o MPF que Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (ex-Presidente da Comissão de Licitação) e os empresários Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin teriam frustrado o caráter competitivo do certame (Carta Convite nº 047/2002), fracionando indevidamente o objeto do Convênio nº 2364/2002, buscando dar aparência de veracidade a licitação, que desde o incício teria sido direcionada a empresas participantes do esquema conhecido como “Máfia dos Sanguessugas”, com superfaturamento de preços dos bens licitados (unidades móveis de saúde). O valor total pactuado no convênio foi de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Por oportuno, transcreve-se trecho da petição inicial (ID 26636534-págs. 06/30): (...). Para a execução do indigitado Convênio foram destinados recursos da ordem de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), montante este que reclamava procedimento licitatório, em regra, na modalidade carta-convite. Todavia, não por acaso, o presidente da Comissão de Licitação, JOSÉ BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO, utilizou-se da modalidade carta-convite. Muito embora tenha se utilizado do procedimento correto (carta-convite), sob orientação de VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, não observou os inúmeros requisitos que a lei exige para licitar com a Administração Pública, o que tornou possível a eleição prévia de empresas, seja de fato ou de "fachada", manipuladas pela organização criminosa. Conforme documentos constantes no Relatório Denasus (fls. 223/239), "participaram" da Carta-Convite n° 047/2002 as empresas LEAL MÁQUINAS COM E REPRESENTAÇÕES, COMERCIAL RODRIGUES e KLASS — COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. Além do irrefutável direcionamento prévio da licitação, restou sobejamente comprovado o superfaturamento na execução do Convênio n°. 2364/2002. Como bem se infere do Laudo de Exame Contábil, encartado às fls. 323/330 dos autos em epígrafe, o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentam sobrepreço na ordem de 21,54%, correspondente ao montante de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais) - fls. 328. (...). A sentença recorrida foi proferida pela ilustre Juíza Federal Ana Lya Ferraz da Gama Ferreira, da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Cárceres/MT, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Confira-se, no que importa, o excerto da sentença (ID 25980579-págs. 127/151): (...). II – FUNDAMENTAÇÃO (...) Da aplicação das sanções dispostas no art. 12 da Lei n.º 8.429/92. Pois bem, como relatado, o núcleo da lide reside em estabelecer se houve superfaturamento na aquisição de um veículo para implementação de unidade móvel de saúde no Município de Comodoro/MT. Referida aquisição originou-se de convênio firmado entre o Município de Comodoro/MT e a União, por intermédio do Ministério da Saúde. Para tanto o município realizou um procedimento licitatório, na modalidade Convite. Destrinchando a tese autoral. exposta na exordial de fls. 05/29, é possível vislumbrar os seguintes fatos e condutas relevantes e tendentes a subsidiar a responsabilização dos demandados pela prática de atos de improbidade descritos na Lei n°. 8.429/92, senão vejamos: a) o objeto do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; h) não aplicação dos recursos no mercado financeiro; c) omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; d) ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite; e) a empresa vencedora do certame, KLAUS — Comércio e Representação Ltda., está comprovadamente ligada ao es q uema fraudulento da "máfia das sanguessugas", tendo participado de licitações em outras localidades em q ue foi verificada a ocorrência do mesmo modus operandi ilícito; t) prejuízo ao erário da União de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais), visto que o veículo foi vendido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), ou seja, 21,54% superior ao valor de mercado do veículo à época R$ 54.814,00 (cinquenta e quatro mil e oitocentos e quatorze reais) — na aquisição da unidade móvel de saúde referente à Carta- Convites n.° 47/02 (Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT - fls. 206). Diante de tal narrativa, a qui considerada — por ora — sem a submissão ao crivo do contraditório, é possível vislumbrar, em tese, a possibilidade de subsunção, em desfavor dos requeridos, de diversos tipos estatuídos no âmbito do artigo 9.°, 10.º e 11.° da Lei 8.429/92: I) os demandados Vilson Piovesan Pompermayer, Benildo de Oliveira Marinho, Luiz Antônio Vedoin e Darei Vedoin violaram deliberadamente os deveres de honestidade, imparcialidade, le galidade e lealdade às instituições a que serviam, eis que praticaram atos visando a fim proibido em lei e deixaram de praticar atos de ofício a fim de viabilizar o intento criminoso a que se voltava à quadrilha que inte gravam; 11) na tipologia do estatuto em referência, os atos de improbidade administrativa que foram acima relatados violaram simultaneamente os artigos 9.°, incisos I e XI; 10, inciso I e VIII; e 11, inciso I e II, todos da Lei n.° 8.429/92; Fixado tais pontos controvertidos — uma vez que veentemente negados pelos demandados nas contestações de fls. 1017/1023, fls. 1024/1030 — cabe a este juízo avaliar, na esteira do artigo 373 do Código de Processo Civil/2015, se a parte autora se desincumbira do ônus de provar a efetiva materialidade das condutas e a medida do liame fatie° que ligaria os réus a sua prática. Pois bem. De plano, registro que, afora a narrativa de que a licitação compôs a gama de certames da "'Itália dos sanguessugas", não há qualquer prova de que isto tenha efetivamente ocorrido. Não há, na sentença extraída dos autos n.° 2006.36.00.007594-5/7.° Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso (mídia digital/cd - fls. 1.451/1.452), bem como da inclusa denúncia oferecida em face de DARCI JOSÉ VEDOIN e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN VEDOIN, qualquer menção ao município de Comodoro/MT, ou ao Senhor Vilson Piovezan Pompermayer, então prefeito municipal, nem tampouco aos membros da comissão permanente de licitação que conduziram os procedimentos licitatórios que deram ensejo à execução do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164. Igualmente, na ação penal n.° 2009.36.00.009094-9, a qual visa apurar ocorrência do crime de associação criminosa (art. 288 do CP) e de "frustrar" ou "fraudar", mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente o caráter competitivo do procedimento licitatório (art. 90 da Lei n.° 8.666/93), os requeridos Vilson l'iovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho foram absolvidos por ausência de prova de sua participação nos crimes, nos termos do art. 386, II, do CPP (11s. 1489/1492). Além da inexistente menção aos processos licitatórios em questão — o que, caso presente, daria solidez à presunção de que o certame compunha o esquema fraudulento -, a autora não cuidou de trazer aos autos nenhum outro documento que comprovasse a relação entre o esquema da família Vedoin e a Carta Convite n°. 47/2002 de Comodoro/MT. Feita essa ressalva inicial sobre a ausência de prova da inserção do procedimento para a aquisição da UMS de Comodoro/MT no esquema dos "sanguessugas", passo a analisar a tipificação das condutas dos envolvidos no certame. A tipificação de atos que ocasionem prejuízo ao erário como atos de improbidade administrativa está no artigo 9.°, 10 e 11 da Lei 8.429/92: "Art. 9° Constitui ato de improbidade 'administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. I° desta lei, e notadamente:" "Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1° desta lei, e notadamente:[...]" (destaquei) "Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administracão pública qualquer acão ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituicões, e notadamente:" Segundo consta da inicial, o prejuízo experimentado pelos cofres públicos residiria no superfaturamento da ambulância adquirida pelo Município. Consoante se extrai do já mencionado relatório da auditoria realizada pela CGU em conjunto com o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Auditoria n.° 5074 – Relatório do Convênio SlAFI: 457164 FNS: 2364/2002 — fls. 700/717), o bem foi adquirido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), sendo que o valor de mercado seria de R$ 58.448,41 (cinquenta e oito mil e quatrocentos e quarenta e oito reais e quarenta e um centavos). Assim, teria havido superfaturamento equivalente a R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos), e, considerando-se a proporção com que compareceram os recursos federais, a lesão à União seria de R$ 15.155,09 (quinze mil cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Aqui algumas considerações merecem ser tecidas. Primeiramente, registre-se que a licitação tinha por objeto a aquisição de ambulância (veículo transformado). A empresa Klass Comércio e Representação Ltda. foi a única responsável em fornecer o veículo — já transformado em UMS -, que custou R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais) (fl. 488). A disparidade de valores, conforme exposto pela União, comprovaria o superfaturamento na aquisição do bem. Contudo, não penso que os dados trazidos pela autora possam embasar a conclusão de que houve cometimento de ilícito a justificar a condenação pretendida, Explico. O supedâneo da presente ação são o "Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 20 1/208)" e o "Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (fls. 700/717)". Constata-se que toda argumentação da autora gira em torno desse superfaturamento constatado pela auditoria da União. Entretanto, da detida análise da página 234 do Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (tis. 712 dos autos), apenas uma página fala, sucintamente, da efetiva composição de preços para aferição do aludido prejuízo a ser salvaguardado, conforme se infere do Relatório de Cálculo de Prejuízo Estimado de SGI/CGU/PR — Cálculo de proporcionalidade convênios — nota fiscal n.° 00235 Klass Comércio e Representações Ltda. Desse relatório, elaborado no ano de 2008, base de toda construção argumentativa da autora, não é possível constatar como os auditores chegaram ao preço do Valor Estimado de Mercado do Veículo e o Prejuízo estimado para a U.M.S. Digo isso pelo fato de a própria União (fls. 784), em 21/06/2002, ter aprovado, pela área técnica do Ministério da Saúde (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS), plano de trabalho encaminhado pelo Município de Comodoro/MT, nos seguintes termos: "Após efetuada a análise de proposta apresentada pelo(a) PREF MUN COMODORO/MT, referente a AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE TIPO SUPORTE BÁSICO, conclui-se que foram atendidas todas as solicitações contidas nos anexos VII, VIII e IX do projeto". Dessa forma, nada temos a opor quanto aprovação do presente pleito, no valor total de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Observamos que para efeito de licitação dos equipamentos solicitados, deverão ser suprimidas quaisquer referenciais a marcas e modelos ou características que direcionem a especificação dos itens para um único fabricante." Além do que, a própria União (fls. 441/444), em 27/08/2003, por meio do Parecer GESCON n.° 5039/03, aprovou a prestação de contas relativas ao cumprimento do convênio n.° SIAFI: 457164 FNS: 2364/2002, nos seguintes termos: "Diante da documentação analisada e pelo constatado no Roteiro de Análise Preliminar, opinamos pela APROVAÇÃO da prestação de contas, tendo em vista que o objeto pactuado foi atingido, devendo entretanto, ser resguardado o direito de regresso, sem prejuízo de outras sanções no caso de serem constatadas irregularidades em (...) (fl. 444)" "A documentação apresentada foi considerada suficiente para regularizar as ocorrências e/ou impropriedades constatadas anteriormente (fl. 443)" "Dispõe os autos de reanálise da prestação de contas do Convênio supracitado, decorrente das justificativas e/ou documentação encaminhada pelo Gestor, em cumprimento ao Parecer Técnico n.° 4482, de 23/07/2003, encaminhado através do Oficio n.° 557, de 23/07/2003, cujos recursos foram repassados e utilizados, conforme abaixo demonstram": Valor MS/FNS: 69.984,00 Contrapartida Utilizada: 7.776,00 Total: 77.760.00 Pagamentos: 77.760,00 Devolvido: 2.225,34 Ora, como pode a União, por sua área técnica especifica, não se opor, em 21/06/2002 (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS — fl. 784), à aquisição da unidade móvel de saúde pelo Município ao preço de R$ 77.760,00 e vir, a própria União, por uma Auditoria n.° 5074 realizada em 2008 (fls. 700/717), sem especificar de forma detalhada, dizendo que ocorreu um superfaturamento na ordem de R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos) na aquisição pelo município da U.M.S? Destarte, a incerteza quanto ao valor de mercado da U.M.S. não para por aí, vez que o Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 201/208), realizado pela Policia Federal em 2009 e, baseada no Relatório da Auditoria n.° 5074 da União, como também na tabela FIPE de 2006 e não na de 2002 (data da aquisição do veículo), identificou que o preço de mercado seria R$ 54.814,00, motivo pelo qual teria ocorrido um superfaturamento na ordem de 54%, correspondente a diferença de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais). Deste modo, um simples lançamento sintético, como o realizado pela União às fls. 712, não é suficiente para comprovação de que houve sobrepreço. Isto porque, conforme já mencionado, todos os valores foram aprovados pelo Ministério da Saúde. Além do que, o comportamento da União revela ofensa a um dos desdobramentos do princípio da boa fé objetiva, na medida em age de forma contraditória — ventre contra factum proprium - , pois, ora concorda com o valor definido para aquisição da unidade móvel de saúde — U. M. S., quando da apresentação do plano de trabalho pelo convenente; ou quando aprovou a prestação de contas do mesmo e, de outro lado, em auditoria realizada após aproximadamente 6 (seis) anos da execução do convênio, afirma que ocorreu um superfaturamento do preço pago pela U. M. S. Por sua vez, o recibo de entrega de convite licitatório indica de forma clara quais são as empresas que receberam os convites, sendo cada empresa identificada por seu carimbo e assinatura (fls. 523/525). Vale ressaltar, ademais, que os demandados Vilson Piovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho, ao praticarem os atos jurídicos que culminaram na aquisição da U. M. S., estavam aparados por Parecer da Assessoria Jurídica do Município de Comodoro/MT, ao qual informou que o Procedimento licitatório — Convite n.° 047/2002 atendeu as disposições legais do art. 40 da Lei n.° 8.666/93 (fls. 522) e foi favorável à homologação do referido procedimento, devendo ser adjudicado o seu objeto ao vencedor do certame (fls. 576). Portanto, a míngua de um detalhamento idoneamente construído para inquinar de vícios reais capazes de anular o procedimento licitatório objeto do Convênio em exame, não há como acolher a pretensão da União, mormente por ler ela própria, através de Órgãos do seu corpo funcional contraditado o conteúdo da postulação trazida para sindicância judicial. Nesse sentido: "ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE CLAREZA. NÃO FORMAÇÃO DE CONVICÇÃO. ARTIGO 50, § 1º, LEI 9.784/99. VIOLAÇÃO. SUPERFATURAMENTO. DOLO E MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ATO IMPROBO. INEXISTENTE. I. A ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do servidor. 2. Os cálculos pertinentes ao prejuízo causado ao erário não foram trazidos aos autos, de forma o que não é possível compreender como os auditores chegaram ao referido valor. A ausência de clareza e congruência na argumentação impede a formação de convicção quanto aos atos praticados pelos réus, além de malferir o disposto no artigo 50, § I° da Lei n. 9.784/99. 3. O bem objeto do Convênio ri. 1564/2001 (SIAFI 430969), firmado entre o Município de Pintadas/BA e a Fundação Nacional de Saúde, foi adquirido por valor menor que o autorizado, não havendo, portanto, que se falar em superfaturamento. O valor repassado pela União, com fins específico, já havia sido arbitrado por área técnica, demonstrando que o preço de aquisição estava em conformidade com o preço praticado no mercado. 4. Não restou demonstrado nos autos o dolo e má-fé no intuito de fraudar o certame licitatório. Ato de improbidade administrativa não configurado. 5 - Recurso irnprovido." (AC 00036274820084013304 AC - APELAÇÃO CIVEL — 00036274820084013304. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO. TRF1. Terceira Turma. E- DJF1 Data: 29/08/2014, página: 1162) Diante desse panorama, entendo que não se pode afirmar, de maneira ausente de dúvidas, que o preço da aquisição da U. M. S. pelo Município revele, por si só, a existência de superfaturamento, tendo em vista a dificuldade em se aferir a presença de sobrepreço a partir do "valor de mercado". Em arremate, parece-me que a União não logrou demonstrar que os réus tenham incorrido nas figuras previstas no artigo 9.°, 10 e 11, da Lei n°. 8.429/92. Em relação às demais irregularidades apontadas nos procedimentos licitatórios pela auditoria e narradas na petição inicial (o objeto do Convênio n.° 236-1/2002, n.° SIAF1 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; não aplicação dos recursos no mercado financeiro; omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite), em que pese estar evidenciada a ocorrência de diversas transgressões ao princípio da legalidade, estas só se configuram quando se verifica a má-fé ou falta de cuidado objetivo deliberado, pelo agente público, no trato da coisa pública, o que também não restou demonstrado nos autos. Explico. Na medida em que não restou comprovada a relação entre o procedimento licitatório e o esquema das "sanguessugas", seria necessário que outros fatores levassem à conclusão de que os requeridos agiram dolosamente ao deixarem de observar os preceitos da lei de licitações. Algo que bem poderia demonstrar a intenção viciada dos agentes públicos seria seu enriquecimento indevido. ou qualquer outro tipo de vantagem que se pudesse imaginar. Mas inexiste qualquer elemento que concorra para a conclusão de que os agentes municipais, deliberadamente. violaram seus deveres funcionais e agiram de má-fé. Nesse diapasão, vale destacar a firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, para que seja configurado o ato de improbidade de que trata a Lei 8.429/92, "é necessário a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9.° e 11 e, ao mesmo, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10" (REsp 1.261.994/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 13104/12). Sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido. Precedentes do STJ: Resp 1038777/SP, DJe I 3/03/2011 . Inexistentes tais circunstâncias, não há corno reconhecer que praticaram ato de improbidade. Assim, as irregularidades s situam-se em outro patamar que não a improbidade administrativa. Portanto, após todas as ponderações feitas acima, entendo que os elementos de prova trazidos ao processo pela União não são suficientes para demonstrar: a) a inserção dos procedimentos da Carta Convite n°. 47/2002 no esquema fraudulento da "máfia dos sanguessugas"; b) prejuízo efetivo ao erário e c) elemento subjetivo — dolo/culpa -, necessário a qualificar as irregularidades no procedimento licitatório como ato de improbidade administrativa. Deste modo, a míngua de provas dos fatos/circunstâncias descritos na inicial, a improcedência do pedido é medida que se impõe. 2 . Do dano moral coletivo. Antes de tudo, registro que não é qualquer dano ao interesse difuso que configura o dano a coletividade, havendo necessidade de que os fatos assumam aspectos de gravidade o bastante para significar ofensa a um sentimento coletivo de decência e ofensa legitima aos valores da comunidade. No caso concreto, como o superfaturamento da unidade médica de saúde, adquirido por meio do Convênio n.° 2364/2002 — SIAFI: 457164, não foi provada de forma cabal, não há que se cogitar a respeito da existência de dano moral capaz de afrontar toda a coletividade. Entretanto, ainda que fosse caso, a jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, a repercussão pública negativa provocada pelas fraudes perpetradas por parlamentares e empresários, não demonstra o sofrimento popular. Vejamos: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. FRAUDE EM LICITAÇÃO REALIZADA PELA MUNICIPALIDADE. ANULAÇÃO DO CERTAME. APLICAÇÃO DA PENALIDADE CONSTANTE DO ART. 87 DA LEI 8.666/93. DANO MORAL COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO NÃO DEBATIDO NA INSTÂNCIA "A QUO". 1. (...). 2. Ad argumentandum tantum, ainda que ultrapassado o óbice erigido pelas Súmulas 282 e 356 do STF, melhor sorte não socorre ao recorrente, máxime porque a incompatibilidade entre o dano moral, qualificado pela noção de dor e sofrimento psíquico, e a transindividualidade, evidenciada pela indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da ofensa objeto de reparação, conduz à não indenizabilidade do dano moral coletivo, salvo comprovação de efetivo prejuízo dano. 3. Sob esse enfoque decidiu a 1" Turma desta Corte, no julgamento de hipótese análoga, verbis: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. DANO MORAL COLETIVO. NECESSÁRIA VINCULAÇÃO DO DANO MORAL À NOÇÃO DE DOR, DE SOFRIMENTO PSÍQUICO, DE CARÁTER INDIVIDUAL. INCOMPATIBILIDADE COM A NOÇÃO DE TRANSINDIVIDUALIDADE (INDETERMINABILIDADE DO SUJEITO PASSIVO E INDIVISIBILIDADE DA OFENSA E DA REPARAÇÃO). RECURSO ESPECIA IMPROVIDO." (REsp 508.28I/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.05.2006, DJ 01.06.2006) 4. Nada obstante, e apenas obiter dictum, há de se considerar que, no caso concreto, o autor não demonstra de forma clara e irrefutável o efetivo dano moral sofrido pela categoria social titular do interesse coletivo ou difuso, consoante assentado pelo acórdão recorrido:"... Entretanto, como já dito, por não se tratar de situação típica da existência de dano moral puro, não há como simplesmente presumi-Ia. Seria necessária prova no sentido de que a Municipalidade, de alguma forma, tenha perdido a consideração e a respeitabilidade e que a sociedade uruguaiense efetivamente tenha se sentido lesada e abalada moralmente, em decorrência do ilícito praticado, razão pela qual vai indeferido o pedido de indenização por dano moral". 5. Recurso especial não conhecido." (REsp 821891 / RS, Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, j. em 8- 4-2008, DJe 12-5-2008) (grifei) Por fim, o pedido de dano moral coletivo deve ser julgado improcedente. III — DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, nos termos do artigo 487, inciso 1, do CPC/20 I 5 c/c artigo 16 da Lei n.° 7.347/85. Proceda a liberação de eventuais restrições realizadas por meio do Sistema Bacen-Jud ou Renajud. Sem custas, nem honorários (artigo 18 da Lei n.° 7347/85). (...). (Negritos no original) Da leitura da sentença apelada, verifica-se que a magistrada de 1º grau concluiu que não há provas suficientes para confirmar o superfaturamento, especialmente porque o próprio Ministério da Saúde aprovou previamente o valor do veículo e posteriormente validou a prestação de contas do convênio. Também não há comprovação de que o procedimento licitatório estava envolvido no esquema fraudulento conhecido como "Máfia dos Sanguessugas". Concluiu, ainda, a magistrada de 1ª instância que não foram identificados indícios de enriquecimento ilícito ou dolo por parte dos agentes municipais, requisitos fundamentais para caracterização da improbidade administrativa. Assim, a ação foi julgada improcedente por ausência de provas de dano efetivo ao erário, de fraudes ou má-fé dos envolvidos. Pois bem. A presente ação fundamenta-se no Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT (ID 26636534-págs. 215/226) e no relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS e pela Controladoria-Geral da União (ID 25986532-págs. 22/37). Conforme mencionado pelo Juízo a quo na sentença, tanto o Relatório da fiscalização realizada pelo DENASUS em conjunto com a CGU quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve cobrança de sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. Isso porque, a falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, apesar de os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicarem suposta cobrança de sobrepreço na aquisição do veículo, referidas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em consideração o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. Registre-se, também, que o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, constatou um suposto prejuízo à União no valor de R$ 15.155,09 (quinze mil, cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Já, o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal em 2009, e baseado no mesmo relatório de auditoria, indicou um superfaturamento menor, no valor de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais). Ora a discrepância entre os valores apresentados gera incerteza quanto ao real prejuízo supostamente causado ao erário. Desse modo, inexistindo nos autos prova segura acerca da alegada cobrança de sobrepreço, e existindo documentos que atestam a entrega do veículo ambulância à municipalidade, não há como se falar em prejuízo ao erário. Nesse mesmo sentido, veja-se julgado proferido por este TRF da 1ª Região, em caso análogo: PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992 ALTERADA PELA LEI 14.230/2021. NORMA PROCESSUAL. SUPERVENIÊNCIA DE LEI NOVA. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. AFASTAMENTO DAS CONDUTAS CULPOSAS. APLICAÇÃO IMEDIATA. AUSÊNCIA DE DOLO. INEXISTÊNCIA DE ATO ÍMPROBO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÕES PROVIDAS. (...). Os atos de improbidade administrativa não se confundem com simples ilegalidades administrativas ou inaptidões funcionais — A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado (STJ, REsp 213.994-0, 1ª Turma; relator ministro Garcia Vieira; DJ de 27/9/1999). Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei 8.429/1992, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. Os fatos dos autos não justificam a leitura jurídica do julgador. À míngua de demonstração de que o objeto dos convênios não tenha sido cumprido, verifica-se que os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos prejudiciais, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o poder de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública (dolo) e, ainda, lesão ao erário, o que não ficou comprovado. Tal como ocorre na ação penal, em que a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII, do CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei 8.429/1992, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. É indispensável que haja um acervo mínimo e seguro de elementos informativos (judicializados), a salvo de dúvida razoável, em prol das imputações da inicial, do que não se desincumbiu o MPF, que tinha o ônus de provar os fatos constitutivos (art. 373, I, do CPC), apontando com precisão a existência de violação aos princípios da Administração Pública, especialmente em relação ao suposto dano ao erário. Remessa oficial não conhecida. Apelação a que se dá provimento, a fim de reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos do autor, nos termos do art. 17, § 11, da Lei 8.429/1992 (alterada pela Lei 14.230/2021). (Destaquei) (AC 0002308-35.2015.4.01.4101, JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (Conv.), TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 24/08/2023.) Do mesmo modo, também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido qualquer vantagem indevida. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite, a não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou dolo, o que não ficou comprovado nos autos, configurando, no máximo, meras irregularidades administrativas. Desse modo, embora possam ter ocorrido irregularidades na condução da Carta Convite n° 047/2002, decorrente do Convênio n° 2364/2002, não é possível afirmar que os membros da comissão de licitação ou o ex-prefeito de Comodoro/MT tenham recebido vantagens indevidas para sua execução. Ademais, competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu no presente caso, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa), devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Nesse sentido, cite-se precedentes desta Corte Revisora: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR (TEMA 1.199). ART. 10 DA LIA. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DANO AO ERÁRIO E DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. O STF, no julgamento do RE 843.989/PR (Tema 1.199), por unanimidade, fixou tese no sentido de que: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10, 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente (...)". 2. Pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações de improbidade administrativa ainda em curso. 3. Ademais, o STJ entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. 4. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. 5. Esta Corte já decidiu que a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não havendo mais que se falar em dano presumido. 6. A despeito das irregularidades formais narradas, consistente na não realização de licitação para contratação pública, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, não restou comprovado o intuito do agente em lesar o erário. 7. A improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 8. Não comprovada a existência de dano ao erário, tampouco o dolo específico, resta inviabilizada a condenação pela prática de ato ímprobo previsto no art. 10 da LIA. 9. Apelação provida. (sem negritos no original) (AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, TRF1 - QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. ART. 10, VIII, DA LEI 8.429/92. FRUSTRAÇÃO DA LICITUDE DE CERTAME LICITATÓRIO. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. CARÁTER SANCIONADOR. TEMA 1.199 DO STF. DOLO ESPECÍFICO DE LESAR O ERÁRIO E DE OBTER BENEFÍCIO, PARA SI OU PARA OUTREM. NÃO COMPROVADO. PERDA PATRIMONIAL EFETIVA NÃO DEMONSTRADA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. APELAÇÃO ADESIVA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. EXTENSÃO DOS EFEITOS AOS REQUERIDOS NÃO RECORRENTES. ART. 1.005 DO CPC. (...). 5. A imputação está lastreada em documentos reunidos pelo Ministério Público Federal e em parecer da Advocacia-Geral da União, nos quais foram verificadas irregularidades no procedimento licitatório a fim de redirecionar o certame em favor da empresa requerida. 6. De fato, houve irregularidades no procedimento licitatório, em razão (i) da inserção de cláusulas restritivas no Edital da Concorrência n. 01/2010; (ii) de inconsistências nas informações contidas no atesto realizado pelo ex-secretário de finanças do município, de que havia dotação orçamentária suficiente a respaldar a execução do objeto, que fora licitado antes mesmo da celebração do convênio com o Ministério da Integração; e (iii) da assinatura do primeiro termo aditivo do contrato firmado entre o Município de Miranorte/TO e a empresa requerida, a fim de dividir o objeto em etapas e reajustar o valor da suposta 1ª etapa de execução, com aumento de preços unitários de forma desproporcional. 7. Não obstante as irregularidades apontadas no procedimento licitatório, não há prova nos autos do alegado direcionamento do certame; do dolo específico de causar prejuízo ao erário ou de obter proveito ou benefício indevido, para si, ou para outra pessoa ou entidade de obter vantagem; e da comprovação da perda patrimonial efetiva com relação a todos os requeridos na ação de improbidade administrativa. 8. Embora a sentença tenha reconhecido a prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, condenou o ex-prefeito e o ex-secretário de finanças em razão da "má-gestão" e "inaptidão" de ambos para gerir o município e a respectiva pasta, elementos que, por si sós, não são aptos à caracterização do dolo específico ou má-fé dos agentes públicos de lesar o patrimônio público ou de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. 9. Além disso, o Ministério da Integração Nacional, por meio da Nota Técnica RPZ n. 037/2015, admitiu a utilização de licitação pretérita, apontada como irregular pelo autor e, conforme a Nota Técnica RPZ n. 012/2014, houve a adequação do valor objeto da avença. 10. Ausente, também, a comprovação do efetivo dano ao erário, porque houve a prestação de grande parte do objeto do contrato, consoante se extrai do Parecer nº 32/2017 da Secretaria de Infraestrutura Hídrica do Departamento de Obras do Ministério da Integração, subscrito em 14/02/2017 no sentido de que "houve um considerável avanço físico da obra e que a atual situação da obra é compatível com o total dos recursos pagos à construtora". 11. É assente o entendimento de que, "[a] partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in reipsa cf. art. 21, I, da LIA)". (AC 1000137-35.2017.4.01.3902, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, Terceira Turma, PJe de 21/03/2024). 12. À míngua de um mínimo substrato probatório de que os requeridos tenham atuado de maneira dolosa a fim de causar dano ao erário e de obter, para si ou para outrem, proveito ou benefício indevido decorrente da prática do ato imputado, somada à ausência do efetivo prejuízo supostamente causado ao erário, deve ser afastada a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, resultado que deve ser estendido aos demais requeridos não apelantes, nos termos do art. 1.005 do CPC. 13. Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento. 14. Apelação adesiva do ex-prefeito e secretário de finanças do Município de Miranorte/TO provida para reformar a sentença e afastar a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, com extensão dos efeitos da absolvição aos demais requeridos não recorrentes. (negritos não originais) (AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024.) Além disso, o MPF deixou de apresentar provas acerca do alegado acréscimo patrimonial que teria sido experimentado pelos apelados, condição esta sine qua non para enquadramento das condutas a eles atribuídas nos tipos previstos pelo art. 9º da LIA. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. A esse respeito, vale citar a seguinte ementa: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTS. 9º E 10, LEI Nº 8.429/92. ALTERAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO DEMONSTRADOS. INEXISTÊNCIA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO PROVIDO. EXTENSÃO DO JULGAMENTO. 1. Ação civil pública por improbidade administrativa que imputa aos Requeridos a prática de atos ímprobos tipificados nos arts. 9º, inciso IV e 10, inciso II, da Lei nº 8.429/92. 2. Conforme a sentença, os Requeridos praticaram condutas que ensejaram enriquecimento ilícito e dano ao Erário, nos termos dos arts. 9º, IV e 10, II, da Lei nº 8.429/92, por irregularidades na execução da obra do Convênio, firmado entre a União Federal, por intermédio do Ministério da Integração Nacional, e o Município de Porto Walter/AC. 3. A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, passou a exigir a presença do dolo específico para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92. Ainda, a Lei nº 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo prejuízo ou dano ao Erário para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10. 4. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. 5. É essencial que seja demonstrado o acréscimo patrimonial do agente para que se configure o ato de improbidade administrativa que importe em enriquecimento ilícito, o que não se verifica no caso. 6. Não restou comprovado o dolo específico na conduta dos Requeridos. Ainda, não restou demonstrado o efetivo prejuízo ao Erário, o que inviabiliza a condenação pelo art. 10 da LIA, tendo em vista as inovações da Lei nº 14.230/2021. 7. Conforme o art. 1.005, caput, do CPC, "O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses". O STJ compreende que a extensão dos efeitos deve ser feita àquelas situações que necessitem de tratamento igualitário. Precedente. 8. À vista do entrelaçamento fático entre os Réus e da inexistência de oposição manifesta dos litisconsortes, a eles deve ser estendido o efeito da improcedência da imputação, conquanto não tenha apelado, em respeito ao princípio da isonomia, por força do art. 1.005, caput, do CPC. 9. Recurso provido. Improcedência da ação de improbidade administrativa. Extensão do julgamento. (Grifei) (AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025.) Quanto ao pedido de condenação dos apelados pela prática da conduta prevista pelo art. 11, incisos I e II, da LIA, ressalte-se que a Lei 14.230/2021, ao introduzir e alterar diversos dispositivos da Lei 8.429/92, revogou expressamente a conduta genérica prevista no caput do art. 11, bem como os inciso I, II, IX e X, da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, abolidas as condutas genericamente tipificadas no caput ou nos incisos revogados do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nessa linha de compreensão, cito precedente do STJ: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.230/2021. RESPONSABILIZAÇÃO POR DOLO GENÉRICO. REVOGAÇÃO. APLICAÇÃO IMEDIATA. 1. (...). 3. A Primeira Turma desta Corte Superior, no julgamento do AREsp 2.031.414/MG, em 9/5/2023, firmou a orientação de conferir interpretação restritiva às hipóteses de aplicação retroativa da LIA (com a redação da Lei n. 14.230/2021), adstrita aos atos ímprobos culposos não transitados em julgado, de acordo com a tese 3 do Tema 1.199 do STF. 4. Acontece que o STF, posteriormente, ampliou a abrangência do Tema 1.199/STF, a exemplo do que ocorreu no ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, admitindo que a norma mais benéfica prevista na Lei n. 14.230/2021, decorrente da revogação (naquele caso, tratava-se de discussão sobre o art. 11 da LIA), poderia ser aplicada aos processos em curso. 5. Tal como aconteceu com a modalidade culposa e com os incisos I e II do art. 11 da LIA (questões diretamente examinadas pelo STF), a conduta ímproba escorada em dolo genérico (tema ainda não examinado pelo Supremo) também foi revogada pela Lei n. 14.230/2021, pelo que deve receber rigorosamente o mesmo tratamento. 6. (...). 7. Recurso especial não provido. (Grifei) (REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA TIPIFICADA NO ART. 10, VIII E IX, DA LEI 8.429/1992. DOLO VERIFICADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 7 DO STJ. EMBARGOS ACOLHIDOS APENAS PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS. 1. (...). 2. No julgamento do Tema 1.199/STF (ARE 843989 RG, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 4.3.2022), fixou-se o entendimento vinculante de que "A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente". 3. Embora, inicialmente, tal entendimento tivesse abrangido, apenas, pessoas sem condenação transitada em julgado, incursas em improbidades culposas do art. 10 da LIA, mais recentemente o STF tem ampliado a incidência da tese para extinguir as ações de improbidade cujos acusados estejam incursos nos tipos dolosos extintos da previsão genérica do caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 e, também, dos seus incisos I, II ou III, haja vista que, tanto quanto os tipos culposos, não haveria mais substrato jurídico normativo para o próprio prosseguimento da persecução em juízo. 4. (...). 6. Embargos de Declaração acolhidos apenas para prestar esclarecimentos. (Grifei) (EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024.) No caso dos autos, havendo pedido do apelante de condenação dos apelados pela prática da conduta então tipificada no inciso I e II, do art. 11, da Lei 8.429/92, é de se reconhecer a ausência superveniente de tipicidade da conduta. Em caso análogo, veja-se o seguinte precedente desta Corte Revisora: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FIRMADO COM O FUNDO NACIONAL DE SAÚDE - FNS. IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DE AÇÕES NA ÁREA DE SAÚDE. LESÃO AO ERÁRIO E VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ART. 10, I, VIII, XI, XI E 11, I, DA LEI 8.429/92. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 14.230/2021. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. RETROATIVIDADE. ENTENDIMENTO DO STF. TEMA 1.199. DOLO ESPECÍFICO E LESÃO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo ora recorrente contra o ex-prefeito do Município de Jânio Quadros, o ex-secretário saúde do Município e a cooperativa supostamente beneficiada, julgou improcedente o pedido de condenação dos requeridos nas condutas previstas nos art. 10, I, VIII, IX, XI e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades em procedimento licitatório e na execução de ações na área de saúde envolvendo verbas advindas de convênio firmado com Fundo Nacional de saúde FNS. 2. Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas nos art. 9º, 10 e 11 da Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021. Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava "obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (art. 11, § 2º). 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e ante o entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1.199. (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). 4. (...). 5. Por sua vez, o art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que "constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade", e desde que esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos, passando o rol a ser taxativo. Além da alteração de elementares de vários tipos infracionais, a Lei 14.230/2021, também revogou os incisos I ("praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamente ou diverso daquele previsto, na regra de competência") e II ("retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício"), do que resulta em atipicidade superveniente da conduta quanto a tais dispositivos. 6. (...). 9. Nesse contexto, não demonstrado o dolo específico referido na conduta dos réus, bem assim das demais elementares do tipo infracional do art. 10, I, VIII, XI, XI, da Lei n. 8.429/92, e ante a revogação do inciso I do art. 11 da mesma Lei, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação. 8. Apelação do Ministério Público a que se nega provimento. (Grifei) (AC 0005804-92.2016.4.01.3307, Rel. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, Décima Turma, PJe 17/07/2024.) Diante desse quadro, em observância ao princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, que tem aplicação imediata no âmbito do direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/21, em razão da abolição da tipicidade da conduta então imputada aos requeridos. Nesse sentido, cito precedentes desta Corte Revisora: Ação de improbidade administrativa. Inadequação da via processual eleita. Impossibilidade jurídica do pedido. Preliminares rejeitadas. Nulidade da sentença. Prejudicial rejeitada. Réu condenado pela prática das condutas ímprobas consistentes em "agir negligentemente na arrecadação de tributo ou de renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público", assim como "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício". Lei 8.429, de 2 de junho de 1992, Art. 10, X, Art. 11, II (na redação original). 1. (...). 7. A retroatividade da Lei 14.230, em favor do réu, não está restrita apenas às condutas culposas. A retroatividade também opera em caso de "abolição da tipicidade da conduta", acarretando a "improcedência dos pedidos formulados na inicial." (STJ, EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1.174.735/PE, relator Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 5/3/2024, DJe de 8/3/2024.) 8. A Lei 14.230 revogou o inciso II do art. 11 da Lei 8.429/92. Assim, não mais subsiste a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal. 9. Apelação de Ronan Rosa Batista provida. (AC 0001265-76.2013.4.01.3505, Rel. Juiz Federal Marcelo Elias Vieira (Conv.), Quarta Turma, PJe 31/07/2024.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, CAPUT E INCISO II, DA LEI Nº 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO PROVIDO. 1. Trata-se de ação de improbidade administrativa através da qual o Ministério Público Federal narra que o Apelante incidiu em irregularidades formais na condução de processo que apurou a inadimplência de cooperativa contratada pelo INCRA para a prestação de serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural. Requereu a sua condenação às penas do art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92, pela prática de atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 10 e 11 da mesma Lei. 2. A sentença condenou o Apelante pela prática de atos de improbidade administrativa tipificados no art. 11, caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92, antes das alterações realizadas pela Lei nº 14.230/2021. 3. Com o advento da Lei nº 14.230/2021, o rol de condutas do art. 11 da Lei nº 8.429/92 passou a ser taxativo, exigindo-se a subsunção da conduta em algum dos incisos deste dispositivo. Além disso, o ato tipificado no inciso II do art. 11 da Lei nº 8.429/92, após a revogação do dispositivo pela Lei nº 14.230/2021, deixou de configurar improbidade administrativa. 4. Com fundamento nos princípios do direito administrativo sancionador, entende-se que as modificações legislativas que não mais classificam como ímprobas condutas que eram consideradas desta natureza pelo regime anterior, devem abranger fatos passados não definitivamente julgados. Assim, considerando-se que a conduta atribuída ao Requerido não é mais tipificada como ato de improbidade administrativa, impõe-se a improcedência da ação. 5. Sentença reformada, para julgar improcedente a ação. 6. Recurso provido. (AC 0002294-10.2008.4.01.4000, Rel. Desembargador Federal Marcus Bastos, Décima Turma, PJe 20/11/2023.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR DO IBAMA. LIBERAÇÃO INDEVIDA DE LAUDOS DE VISTORIAS. IMPUTAÇÃO NA TIPOLOGIA DO ART. 11, CAPUT, E INC. I E II DA LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TIPO REVOGADO PELA LEI N. 14.230/21. ROL TAXATIVO. TIPICIDADE FECHADA. EXIGÊNCIA DE DOLO. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO IMEDIATA. RETROATIVIDADE. AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO TÍPICA. TEMA 1.199. STF. APELAÇÃO PROVIDA. 1. (...).. 2. A Lei n. 14.230/2021, provocou diversas alterações na Lei n. 8.429/92. Este (novo) sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa passou a alterar anteriores tipicidades e a revogar sanções, antes contempladas pela Lei n. 8.429/92, em sua redação original, dentre elas a que tem pertinência com a situação aqui analisada, ou seja, o art. 11 passou a enumerar as ações que seriam consideradas ímprobas de forma taxativa. Por outro lado, os inc. I e II do art. 11 da Lei 8.429/92 foi revogado pela Lei 14.230/2021. 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Relator: Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, Publicação 12/12/2022). 4. Registra-se que em 22.08.2023, ao apreciar o ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, o STF firmou a compreensão de que (...) As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 5. A ausência de imputação de um dos tipos do art. 11 ainda vigentes com as modificações promovidas pela Lei n. 14.230/21, leva ao reconhecimento de imputação genérica, sem vinculação a tipo específico, impondo-se a absolvição dos requeridos, por atipicidade. 4. Apelações a que se dá provimento para absolver os réus das sanções que lhes foram impostas na sentença. (AC 0005100-04.2010.4.01.3303, Rel. Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas, Décima Turma, PJe 15/12/2023.) Dessa maneira, seria o caso de se reconhecer o afastamento da imputação feita aos réus com base na referência ao caput e incisos I e II do art. 11, da Lei 8.429/92. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Nessa linha de intelecção, cite-se precedentes do Superior Tribunal de Justiça: DIREITO ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TEMA 1.199/STF. SUPERVENIÊNCIA DA LEI 14.230/2021. OMISSÃO RECONHECIDA. RECURSO ACOLHIDO, SEM EFEITOS INFRINGENTES. 1. (...). 2. Haverá abolição da figura típica quando a conduta a concretizar a anterior redação do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) se tornar irrelevante para os fins de tal lei, e não quando houver evidente correspondência na atual redação dos incisos do art. 11 da mesma lei. 3. Estando os fatos cristalizados no acórdão recorrido a tipificar a hipótese prevista no inciso XI do art. 11 da LIA, tem-se por presente verdadeira continuidade típico-normativa, não havendo que se falar em abolição da tipicidade. 4. Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos modificativos. (Grifei) (EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024.) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. INCÊNDIO EM PRÉDIO PÚBLICO. SITUAÇÃO EMERGENCIAL A PERMITIR CONTRATAÇÃO DIRETA. INCLUSÃO DE OBRAS E REFORMAS DE AMBIENTES NÃO ATINGIDOS PELO EVENTO DANOSO. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. FAVORECIMENTO DE PARTICULAR E TERCEIRO. COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM BASE NO ART. 11 DA LIA. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE TÍPICO-NORMATIVA. INEXISTÊNCIA DE ABOLIÇÃO DA IMPROBIDADE NO CASO CONCRETO. EXPRESSA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA NO INCISO V DO ART. 11 DA LIA. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. NECESSIDADE DE NOVA ADEQUAÇÃO. 1. (...). 2. A Primeira Turma do STJ, por unanimidade, em julgamento realizado no dia 6/2/2024, no AgInt no AREsp n. 2.380.545/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, acórdão pendente de publicação, seguiu a orientação da Suprema Corte no sentido de que "as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/2021 ao art. 11 da Lei n. 8.429/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado" (ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, DJe 6/9/2023). 3. Na sessão de 27/2/2024, no julgamento do AgInt no AREsp n. 1.206.630, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, DJe 1/3/2024, a Primeira Turma desta Corte, alinhando ao entendimento do STF, adotou a tese da continuidade típico-normativa do art. 11 quando, dentre os incisos inseridos pela Lei n. 14.230/2021, remanescer típica a conduta considerada no acórdão como violadora dos princípios da Administração Pública. 4. Na espécie, o Tribunal de origem, com base no conjunto fático e probatório constante dos autos, atestou a prática de ato ímprobo, em razão de dispensa indevida de licitação e do favorecimento de particular e terceiro, consignando a presença do elemento subjetivo em relação aos fatos apurados. A reversão de tal entendimento exige o reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 5. Nesse contexto, nota-se que a referida conduta (dispensa indevida de licitação e favorecimento de particular e terceiro) guarda correspondência com a hipótese prevista no inciso V do art. 11 da LIA, de maneira a atrair a referida tese da continuidade típico-normativa. 6. Considerando que a sanção de vedação de contratar com o Poder Público foi fixada em prazo superior ao limite legal (art. 12, III, da LIA, com a redação original), merece ser reduzida para 3 anos, de modo, também, a melhor atender os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, dadas as circunstâncias contidas no acórdão recorrido e as diversas outras penalidades aplicadas. 7. Agravo interno parcialmente provido, para conhecer do agravo, a fim de conhecer em parte do recurso especial, e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento, tão somente para reduzir a 3 anos a pena de proibição de contratar com a Administração Pública. (Grifei) (AgInt no AREsp 1.611.566/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 29/05/2024.) No caso dos autos, revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. Eis a redação do referido dispositivo legal: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...). V - frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; No caso concreto, contudo, em detida análise dos elementos e provas constantes dos autos, constata-se que apesar de existirem falhas na condução do procedimento da Carta Convite 47/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. A esse respeito, confira-se precedente desta Terceira Turma: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, I E II DA LEI 8.429/92. MERAS IRREGULARIDADES FORMAIS. AUSENCIA DA PRATICA ÍMPROBA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. O MPF atribuiu aos acusados a prática de atos de improbidade previstos no art. 11, I e II da Lei 8.429/92 em razão de inexigibilidade de licitação no âmbito do Senado Federal fora das hipóteses previstas em lei. 2. Não se verifica no caso em tela indícios de atos de improbidade administrativa, notadamente, porque a existência de meras irregularidades formais não configura ato ímprobo, razão pela qual não merece ser reformada a sentença guerreada, em face da inocorrência de dolo ou má-fé do agente. 3. A mera ilegalidade do ato ou inabilidade do agente público que o pratica nem sempre pode ser enquadrada como improbidade administrativa. O ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 4. Não se desconhece a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa (art. 12, da Lei 8.429/92). A decisão do TCU, contudo, embora não vincule o Poder Judiciário, pode ser utilizada como elemento de convencimento do Juízo. 5. Remessa oficial e apelação não providas. (Grifei) (AC 0047130-15.2014.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL NEY DE BARROS BELLO FILHO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 05/04/2024.) Por fim, quanto ao pedido de condenação por dano moral coletivo, este não se revela cabível, pois não há nos autos qualquer prova concreta de efetivo prejuízo moral sofrido pela coletividade em razão dos supostos atos lesivos. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. SAÚDE PÚBLICA. PRECARIEDADE DO ATENDIMENTO EM HOSPITAIS ESTADUAIS. RECEBIMENTO DE VERBAS FEDERAIS EM CONVÊNIO CELEBRADO COM A UNIÃO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA A REESTRUTURAÇÃO DE SALAS CIRÚRGICAS E AQUISIÇÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS PARA A REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS. POSSIBILIDADE. OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES. INEXISTÊNCIA. PROIBIÇÃO DE CONTRATAÇÃO DE ESTABELECIMENTOS PRIVADOS CONVENIADOS E UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESTADUAL DE SAÚDE. DESCABIMENTO. PEDIDOS DE REDUÇÃO DA MULTA DIÁRIA E DILATAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. REJEIÇÃO. DANO MORAL COLETIVO NÃO CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. (...). IX. A orientação jurisprudencial já sedimentada nos tribunais pátrios firmou-se no sentido de que "a possibilidade de indenização por dano moral está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo restrição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da legislação têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial" e de que "o dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera extrapatrimonial de uma pessoa" (REsp 1397870/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 02/12/2014, DJe 10/12/2014). Todavia, no caso concreto, entendo que não é cabível a condenação dos réus ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, pois, a despeito da precariedade no atendimento dispensado pelos hospitais estaduais de Porto Velho/RO, não restaram comprovados nos autos os danos físicos ou emocionais eventualmente suportados pelos pacientes mencionados na inicial, sendo inoportuna, também, a condenação em relação a pacientes futuros, que vierem a ser atendidos com atraso ou desídia, sob pena de se distorcer a lógica da responsabilidade civil, já que a formação do título relativo à reparação do dano antecederia a própria prática do ato ilícito. É certo que não se justifica a reparação por dano extrapatrimonial coletivo quando feita menção genérica à coletividade, sem demonstrar a dor e o sofrimento do grupo especificamente atingido (AG 0026914-77.2016.4.01.0000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 - Terceira Turma, e-DJF1 DATA: 07/10/2016). Portanto, considerando que os autores não se desincumbiram do ônus de demonstrar o efetivo dano moral sofrido, deve ser mantida a sentença também neste capítulo, ficando ressalvada a possibilidade de os pacientes perseguirem individualmente a reparação pecuniária que entenderem devida, em ações próprias, bem como de eventual reparação de danos ao erário em sede de ação de improbidade administrativa. X. Preliminar rejeitada. Remessa necessária e apelações desprovidas. (REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (CONV.), TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020.) ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. INEXECUÇÃO DO OBJETO DO CONVÊNIO FIRMADO ENTRE O INCRA E O MUNICÍPIO E AUSÊNCIA DA RESPECTIVA PRESTAÇÃO DE CONTAS. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COMPROVADO NOS AUTOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DO EFETIVO ABALO MORAL SOFRIDO PELA MUNICIPALIDADE. CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. LEI 7.347/85, ART. 18. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO REQUERIDO NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ÓBICE DO ART. 128, § 5º, II, CF/88. 1. A Lei 8.429/92, referente à Ação de Improbidade Administrativa, que regulamentou o disposto no art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art.9º); b) que causem prejuízo ao erário (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11). 2. Comprovado, de forma irrefutável, que o ex-prefeito não deu efetivo cumprimento ao objeto previsto no Convênio n. 22.006/97 e, ainda, que não houve a devida prestação de contas, resta caracterizado o ato de improbidade previsto nos artigos 10 e 11, VI, da Lei nº 8.429/92. Sentença condenatória se mantém ante o extenso acervo probatório contido nos autos. 3. Não é qualquer ato que viole o princípio da legalidade que gera um ato de improbidade administrativa, é necessário um algo mais para o agente ser tachado de ímprobo e ser tão severamente punido com o previsto na Lei 8.429/92. É preciso o dolo, a má-fé, a intenção de violar o princípio basilar da Administração Pública, circunstância não verificada na conduta da apelada CONSTRUTORA TRANSPACHECO LTDA, que não deu prosseguimento à execução da obra contemplada no Convênio n. 22.006/97, em razão da ausência de repasses financeiros por parte do Município. 4. A caracterização dos danos morais no âmbito de ação de improbidade administrativa reclama a prova inequívoca do abalo moral impingido pelo ato ímprobo, in casu, seria necessário prova no sentido de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentidos lesados e abalados moralmente. Não basta supor a mera frustração da municipalidade ou, ainda, o descrédito pela máquina administrativa em razão da inexecução do objeto avençado no Convênio, pois não se presume a existência do dano moral. Hipótese em que o autor não trouxe provas do efetivo dano moral sofrido pela categoria titular do interesse coletivo atingido pelo ato de improbidade administrativa. 5. O Ministério Público, vencido na ação por improbidade administrativa por ele ajuizada, só responderá pelos honorários de advogado se configurada a má-fé na sua atuação, como prevê o art. 18 da Lei 7.347/85, aplicada subsidiariamente. Não havendo sequer indícios de má-fé do Parquet Federal não há como fundamentar sua condenação no pagamento de honorários. 6. Não se sustenta a condenação do requerido no pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público Federal haja vista o óbice imconvite rio Público é vedado receber "a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais." 7. Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida. (AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ TOURINHO NETO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291.) Nesse contexto, embora a "Operação Sanguessuga" tenha revelado um esquema fraudulento de alcance nacional, com grande repercussão na mídia, não há justificativa para a condenação dos requeridos ao pagamento de dano moral coletivo, pois não foi comprovado que a conduta tenha atingido o círculo primordial de valores sociais. A fraude ocorreu na execução do Convênio nº 2364/2002, com a condução irregular da licitação, o que violou a legislação aplicável, mas sem evidência de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentido lesados e abalados moralmente. Ante o exposto, NEGO provimento à apelação do MPF. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 APELANTES: UNIÃO FEDERAL, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APELADOS: DARCI JOSÉ VEDOIN, LUIZ ANTONIO TREVISAN VEDOIN, VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, JOSE BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO Advogado do(a) DO APELADO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S E M E N T A PROCESSO CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MPF. LEI 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI 14.230/21. CONVÊNIO PARA AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. FRAUDE À LICITAÇÃO NÃO COMPROVADA. DANO AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADOS. ART. 11, I e II, DA LIA. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE. DANO MORAL COLETIVO. NÃO OCORRÊNCIA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. 2. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se exige também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). 3. No caso em exame, tanto o relatório de fiscalização realizado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. A falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicaram um suposto sobrepreço na aquisição do veículo, mas essas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em conta o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. 4. As discrepâncias encontradas entre o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, e o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal, impedem que referidos documentos sejam considerados como provas hábeis a comprovar o alegado sobrepreço. 5. Também não está demonstrado o alegado prejuízo ao erário, considerando que o objeto do Convênio 2364/2002 foi integralmente cumprido, com a entrega dos bens à comunidade de Comodoro/MT, além de não ter sido demonstrado o superfaturamento em sua aquisição. 6. Também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido vantagem indevida. 7. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite; não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou do dolo específico, o que não ocorreu no presente caso, evidenciando-se, no máximo, meras irregularidades administrativas. 8. Competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa) para a configuração do ato ímprobo, devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Precedente do TRF1: AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024; AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO (CONV.), DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024. 9. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. Nesse sentido: TRF1, AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL (Conv.), DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025. 10. Revogadas as condutas tipificadas nos incisos I e II do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nesse sentido: STJ, REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024 e STJ, EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024. 11. O Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Precedente do STJ: EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024. 12. Revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. 13. No caso, apesar de existirem falhas na condução da Carta Convite 047/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. 14. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (Conv.), SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020 e AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ FEDERAL TOURINHO NETO, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291. 15. Apelação do MPF a que se nega provimento. A C Ó R D Ã O Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do MPF, nos termos do voto do relator. Brasília/DF, sessão virtual de 13 a 26 de maio de 2025. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator
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10/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES | Classe: APELAçãO CíVELJUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0003282-93.2010.4.01.3601 PROCESSO REFERÊNCIA: 0003282-93.2010.4.01.3601 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal e outros POLO PASSIVO:Luiz Antonio Trevisan Vedoin e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S RELATOR(A):NEVITON DE OLIVEIRA BATISTA GUEDES PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta em desfavor de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI;10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Na inicial, o MPF imputa aos recorridos a prática de atos de improbidade administrativa, alegando a má gestão dos recursos públicos oriundos do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Em suas razões recursais, alega o MPF, em síntese, que: a) “da análise das provas acostadas aos autos, restou clara a existência de conluio, com o objetivo de frustrar o caráter competitivo do certame, demonstrando afronta aos princípios norteadores do procedimento licitatório, mormente os princípios da isonomia das condições e da competitividade”; b) “no Convite 047/2002 foram ‘convidadas’ as sociedades empresárias Leal Máquinas Com. e Representações., Comercial Rodrigues e Klass - Comércio e Representações Ltda., sendo todas pertencentes ao mesmo grupo, conforme afirmado pelo primeiro em depoimento acostado à mídia digital de fl. 1452”; c) “os apelados deixaram de realizar, também, pesquisa de preço no mercado (conforme relatório DENASUS/CGU acostado às fls. 700-717), o que fez com que a aquisição da unidade móvel de saúde e dos seus equipamentos fosse realizada sem parâmetros adequados para aferimento do preço”; d) “restou comprovado o superfaturamento na execução do Convênio no 2364/2002. O Laudo de Exame Contábil de fls. 201-207 demonstrou que o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentaram sobrepreço de 21,54%, correspondente a R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais)”; e) “é importante salientar que a Lei no 8.429/1992 abriga, além de condutas praticadas com dolo, aquelas sob a modalidade culposa, afastando qualquer dúvida acerca da ocorrência de atos de improbidade”; f) “mesmo se ausente a Má - fé, evidente é a culpa que, independente de locupletamento ou enriquecimento ilícito, é suficiente para caracterizar ato de improbidade administrativa passível de sanção” ; g) “sobressalta o dever de reparar o dano moral coletivo, não só pelo prejuízo efetivo suportado pelo erário (dano material), mas também pela violação à justa expectativa que os cidadãos do município de Comodoro/MT tinham de que os gestores públicos zelassem pelos recursos que estavam sob suas responsabilidades, garantindo a prestação do serviço público de saúde de modo muito mais eficiente”. Ao final, requerer “o conhecimento e provimento do presente recurso, com a reforma da sentença de fls. 1496-1508, a fim de que os apelados Vilson Piovesan Pompermayer, Darci José Vedoin, José Benildo de Oliveira Marinho e Luiz Antônio Trevisan Vedoin sejam condenados como incursos nas sanções previstas no artigo 12 da Lei no 8.429/1992, bem como ao pagamento de indenização pelo dano moral coletivo.” (ID 25980579-págs. 154/167). Regularmente intimados, apenas os apelados Vilson Piovesan Pompermaye e José Benildo de Oliveira Marinho apresentaram contrarrazões (ID 25980579-págs. 172/181, 181/195). A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso (ID 25980579-págs. 207/225). É o relatório. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 Processo Referência: 0003282-93.2010.4.01.3601 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES (RELATOR): O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho, Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin, acusando-os de praticar as condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, da Lei nº 8.429/92. A suposta irregularidade estaria relacionada à má gestão dos recursos públicos decorrentes do Convênio nº 2364/2002, firmado com a União Federal para a aquisição de unidade móvel de saúde para o Município de Comodoro/MT. Narra a inicial que os demandados, mediante prévio ajuste de vontade, associaram-se com o propósito de frustrar o caráter competitivo da Carta Convite n° 047/2002, a fim de que empresas supostamente ligadas a organização criminosa investigada no âmbito da Operação Sanguessuga fosse a vencedora do certame, o que possibilitou, ainda, a execução do objeto do Convênio 2364/2002 com superfaturamento. Inicialmente, no que se refere à incidência da Lei 14.230/2021, no caso em espécie, passo a expor as seguintes considerações. Em 26/10/2021, foi publicada a referida lei que modificou consideravelmente a Lei 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa). Como já pacificado, a referida norma legal aplica-se ao caso dos autos, eis que atinge as ações em curso, considerando que o seu art. 1º, § 4º, determina, expressamente, a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, conforme já reconheceu o STF, no julgamento do ARE 843.989/PR, fixando, a propósito, a seguinte tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - dolo; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é irretroativa, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. (ARE 843.989/PR, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Julgamento: 18/08/2022 Publicação: 12/12/2022.) Passo, então, ao exame da apelação interposta, à luz das inovações legislativas advindas da Lei 14.230/21. O MPF busca a condenação de Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (presidente da Comissão Permanente de Licitação - CPL), Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin pela prática das condutas previstas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11, incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. Com a nova redação dada pela Lei 14.230/2021, os arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92 passaram a exigir, para fins de configuração do ato ímprobo, a prática de conduta dolosa, excluindo-se, por conseguinte, a possibilidade de condenação por conduta culposa ou dolo genérico. Confira-se: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Grifei) Portanto, a partir da nova lei, é necessária a comprovação do dolo específico para a condenação por ato de improbidade administrativa. E não é só. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se faz necessária também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). No presente caso, não há comprovação do dano ao erário ou do enriquecimento ilícito dos requeridos. Na inicial, alega o MPF que Vilson Piovesan Pompermayer (ex-prefeito), José Benildo de Oliveira Marinho (ex-Presidente da Comissão de Licitação) e os empresários Luis Antonio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin teriam frustrado o caráter competitivo do certame (Carta Convite nº 047/2002), fracionando indevidamente o objeto do Convênio nº 2364/2002, buscando dar aparência de veracidade a licitação, que desde o incício teria sido direcionada a empresas participantes do esquema conhecido como “Máfia dos Sanguessugas”, com superfaturamento de preços dos bens licitados (unidades móveis de saúde). O valor total pactuado no convênio foi de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Por oportuno, transcreve-se trecho da petição inicial (ID 26636534-págs. 06/30): (...). Para a execução do indigitado Convênio foram destinados recursos da ordem de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), montante este que reclamava procedimento licitatório, em regra, na modalidade carta-convite. Todavia, não por acaso, o presidente da Comissão de Licitação, JOSÉ BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO, utilizou-se da modalidade carta-convite. Muito embora tenha se utilizado do procedimento correto (carta-convite), sob orientação de VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, não observou os inúmeros requisitos que a lei exige para licitar com a Administração Pública, o que tornou possível a eleição prévia de empresas, seja de fato ou de "fachada", manipuladas pela organização criminosa. Conforme documentos constantes no Relatório Denasus (fls. 223/239), "participaram" da Carta-Convite n° 047/2002 as empresas LEAL MÁQUINAS COM E REPRESENTAÇÕES, COMERCIAL RODRIGUES e KLASS — COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. Além do irrefutável direcionamento prévio da licitação, restou sobejamente comprovado o superfaturamento na execução do Convênio n°. 2364/2002. Como bem se infere do Laudo de Exame Contábil, encartado às fls. 323/330 dos autos em epígrafe, o veículo e os equipamentos fornecidos à Prefeitura de Comodoro/MT apresentam sobrepreço na ordem de 21,54%, correspondente ao montante de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais) - fls. 328. (...). A sentença recorrida foi proferida pela ilustre Juíza Federal Ana Lya Ferraz da Gama Ferreira, da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Cárceres/MT, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Confira-se, no que importa, o excerto da sentença (ID 25980579-págs. 127/151): (...). II – FUNDAMENTAÇÃO (...) Da aplicação das sanções dispostas no art. 12 da Lei n.º 8.429/92. Pois bem, como relatado, o núcleo da lide reside em estabelecer se houve superfaturamento na aquisição de um veículo para implementação de unidade móvel de saúde no Município de Comodoro/MT. Referida aquisição originou-se de convênio firmado entre o Município de Comodoro/MT e a União, por intermédio do Ministério da Saúde. Para tanto o município realizou um procedimento licitatório, na modalidade Convite. Destrinchando a tese autoral. exposta na exordial de fls. 05/29, é possível vislumbrar os seguintes fatos e condutas relevantes e tendentes a subsidiar a responsabilização dos demandados pela prática de atos de improbidade descritos na Lei n°. 8.429/92, senão vejamos: a) o objeto do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; h) não aplicação dos recursos no mercado financeiro; c) omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; d) ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite; e) a empresa vencedora do certame, KLAUS — Comércio e Representação Ltda., está comprovadamente ligada ao es q uema fraudulento da "máfia das sanguessugas", tendo participado de licitações em outras localidades em q ue foi verificada a ocorrência do mesmo modus operandi ilícito; t) prejuízo ao erário da União de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais), visto que o veículo foi vendido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), ou seja, 21,54% superior ao valor de mercado do veículo à época R$ 54.814,00 (cinquenta e quatro mil e oitocentos e quatorze reais) — na aquisição da unidade móvel de saúde referente à Carta- Convites n.° 47/02 (Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT - fls. 206). Diante de tal narrativa, a qui considerada — por ora — sem a submissão ao crivo do contraditório, é possível vislumbrar, em tese, a possibilidade de subsunção, em desfavor dos requeridos, de diversos tipos estatuídos no âmbito do artigo 9.°, 10.º e 11.° da Lei 8.429/92: I) os demandados Vilson Piovesan Pompermayer, Benildo de Oliveira Marinho, Luiz Antônio Vedoin e Darei Vedoin violaram deliberadamente os deveres de honestidade, imparcialidade, le galidade e lealdade às instituições a que serviam, eis que praticaram atos visando a fim proibido em lei e deixaram de praticar atos de ofício a fim de viabilizar o intento criminoso a que se voltava à quadrilha que inte gravam; 11) na tipologia do estatuto em referência, os atos de improbidade administrativa que foram acima relatados violaram simultaneamente os artigos 9.°, incisos I e XI; 10, inciso I e VIII; e 11, inciso I e II, todos da Lei n.° 8.429/92; Fixado tais pontos controvertidos — uma vez que veentemente negados pelos demandados nas contestações de fls. 1017/1023, fls. 1024/1030 — cabe a este juízo avaliar, na esteira do artigo 373 do Código de Processo Civil/2015, se a parte autora se desincumbira do ônus de provar a efetiva materialidade das condutas e a medida do liame fatie° que ligaria os réus a sua prática. Pois bem. De plano, registro que, afora a narrativa de que a licitação compôs a gama de certames da "'Itália dos sanguessugas", não há qualquer prova de que isto tenha efetivamente ocorrido. Não há, na sentença extraída dos autos n.° 2006.36.00.007594-5/7.° Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso (mídia digital/cd - fls. 1.451/1.452), bem como da inclusa denúncia oferecida em face de DARCI JOSÉ VEDOIN e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN VEDOIN, qualquer menção ao município de Comodoro/MT, ou ao Senhor Vilson Piovezan Pompermayer, então prefeito municipal, nem tampouco aos membros da comissão permanente de licitação que conduziram os procedimentos licitatórios que deram ensejo à execução do Convênio n.° 2364/2002, n.° SIAFI 457164. Igualmente, na ação penal n.° 2009.36.00.009094-9, a qual visa apurar ocorrência do crime de associação criminosa (art. 288 do CP) e de "frustrar" ou "fraudar", mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente o caráter competitivo do procedimento licitatório (art. 90 da Lei n.° 8.666/93), os requeridos Vilson l'iovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho foram absolvidos por ausência de prova de sua participação nos crimes, nos termos do art. 386, II, do CPP (11s. 1489/1492). Além da inexistente menção aos processos licitatórios em questão — o que, caso presente, daria solidez à presunção de que o certame compunha o esquema fraudulento -, a autora não cuidou de trazer aos autos nenhum outro documento que comprovasse a relação entre o esquema da família Vedoin e a Carta Convite n°. 47/2002 de Comodoro/MT. Feita essa ressalva inicial sobre a ausência de prova da inserção do procedimento para a aquisição da UMS de Comodoro/MT no esquema dos "sanguessugas", passo a analisar a tipificação das condutas dos envolvidos no certame. A tipificação de atos que ocasionem prejuízo ao erário como atos de improbidade administrativa está no artigo 9.°, 10 e 11 da Lei 8.429/92: "Art. 9° Constitui ato de improbidade 'administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. I° desta lei, e notadamente:" "Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1° desta lei, e notadamente:[...]" (destaquei) "Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administracão pública qualquer acão ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituicões, e notadamente:" Segundo consta da inicial, o prejuízo experimentado pelos cofres públicos residiria no superfaturamento da ambulância adquirida pelo Município. Consoante se extrai do já mencionado relatório da auditoria realizada pela CGU em conjunto com o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Auditoria n.° 5074 – Relatório do Convênio SlAFI: 457164 FNS: 2364/2002 — fls. 700/717), o bem foi adquirido por R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais), sendo que o valor de mercado seria de R$ 58.448,41 (cinquenta e oito mil e quatrocentos e quarenta e oito reais e quarenta e um centavos). Assim, teria havido superfaturamento equivalente a R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos), e, considerando-se a proporção com que compareceram os recursos federais, a lesão à União seria de R$ 15.155,09 (quinze mil cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Aqui algumas considerações merecem ser tecidas. Primeiramente, registre-se que a licitação tinha por objeto a aquisição de ambulância (veículo transformado). A empresa Klass Comércio e Representação Ltda. foi a única responsável em fornecer o veículo — já transformado em UMS -, que custou R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais) (fl. 488). A disparidade de valores, conforme exposto pela União, comprovaria o superfaturamento na aquisição do bem. Contudo, não penso que os dados trazidos pela autora possam embasar a conclusão de que houve cometimento de ilícito a justificar a condenação pretendida, Explico. O supedâneo da presente ação são o "Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 20 1/208)" e o "Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (fls. 700/717)". Constata-se que toda argumentação da autora gira em torno desse superfaturamento constatado pela auditoria da União. Entretanto, da detida análise da página 234 do Relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS e pela Controladoria Geral da União (tis. 712 dos autos), apenas uma página fala, sucintamente, da efetiva composição de preços para aferição do aludido prejuízo a ser salvaguardado, conforme se infere do Relatório de Cálculo de Prejuízo Estimado de SGI/CGU/PR — Cálculo de proporcionalidade convênios — nota fiscal n.° 00235 Klass Comércio e Representações Ltda. Desse relatório, elaborado no ano de 2008, base de toda construção argumentativa da autora, não é possível constatar como os auditores chegaram ao preço do Valor Estimado de Mercado do Veículo e o Prejuízo estimado para a U.M.S. Digo isso pelo fato de a própria União (fls. 784), em 21/06/2002, ter aprovado, pela área técnica do Ministério da Saúde (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS), plano de trabalho encaminhado pelo Município de Comodoro/MT, nos seguintes termos: "Após efetuada a análise de proposta apresentada pelo(a) PREF MUN COMODORO/MT, referente a AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE TIPO SUPORTE BÁSICO, conclui-se que foram atendidas todas as solicitações contidas nos anexos VII, VIII e IX do projeto". Dessa forma, nada temos a opor quanto aprovação do presente pleito, no valor total de R$ 77.760,00 (setenta e sete mil e setecentos e sessenta reais). Observamos que para efeito de licitação dos equipamentos solicitados, deverão ser suprimidas quaisquer referenciais a marcas e modelos ou características que direcionem a especificação dos itens para um único fabricante." Além do que, a própria União (fls. 441/444), em 27/08/2003, por meio do Parecer GESCON n.° 5039/03, aprovou a prestação de contas relativas ao cumprimento do convênio n.° SIAFI: 457164 FNS: 2364/2002, nos seguintes termos: "Diante da documentação analisada e pelo constatado no Roteiro de Análise Preliminar, opinamos pela APROVAÇÃO da prestação de contas, tendo em vista que o objeto pactuado foi atingido, devendo entretanto, ser resguardado o direito de regresso, sem prejuízo de outras sanções no caso de serem constatadas irregularidades em (...) (fl. 444)" "A documentação apresentada foi considerada suficiente para regularizar as ocorrências e/ou impropriedades constatadas anteriormente (fl. 443)" "Dispõe os autos de reanálise da prestação de contas do Convênio supracitado, decorrente das justificativas e/ou documentação encaminhada pelo Gestor, em cumprimento ao Parecer Técnico n.° 4482, de 23/07/2003, encaminhado através do Oficio n.° 557, de 23/07/2003, cujos recursos foram repassados e utilizados, conforme abaixo demonstram": Valor MS/FNS: 69.984,00 Contrapartida Utilizada: 7.776,00 Total: 77.760.00 Pagamentos: 77.760,00 Devolvido: 2.225,34 Ora, como pode a União, por sua área técnica especifica, não se opor, em 21/06/2002 (Parecer n.° 2650/2002-Unidade de Análise Técnica/SIS/MS — fl. 784), à aquisição da unidade móvel de saúde pelo Município ao preço de R$ 77.760,00 e vir, a própria União, por uma Auditoria n.° 5074 realizada em 2008 (fls. 700/717), sem especificar de forma detalhada, dizendo que ocorreu um superfaturamento na ordem de R$ 19.311,59 (dezenove mil e trezentos e onze reais e cinquenta e nove centavos) na aquisição pelo município da U.M.S? Destarte, a incerteza quanto ao valor de mercado da U.M.S. não para por aí, vez que o Laudo de Exame Contábil n.° 0062/2009 — SETEC/SR/DPF/MT (fls. 201/208), realizado pela Policia Federal em 2009 e, baseada no Relatório da Auditoria n.° 5074 da União, como também na tabela FIPE de 2006 e não na de 2002 (data da aquisição do veículo), identificou que o preço de mercado seria R$ 54.814,00, motivo pelo qual teria ocorrido um superfaturamento na ordem de 54%, correspondente a diferença de R$ 13.783,00 (treze mil e setecentos e oitenta e três reais). Deste modo, um simples lançamento sintético, como o realizado pela União às fls. 712, não é suficiente para comprovação de que houve sobrepreço. Isto porque, conforme já mencionado, todos os valores foram aprovados pelo Ministério da Saúde. Além do que, o comportamento da União revela ofensa a um dos desdobramentos do princípio da boa fé objetiva, na medida em age de forma contraditória — ventre contra factum proprium - , pois, ora concorda com o valor definido para aquisição da unidade móvel de saúde — U. M. S., quando da apresentação do plano de trabalho pelo convenente; ou quando aprovou a prestação de contas do mesmo e, de outro lado, em auditoria realizada após aproximadamente 6 (seis) anos da execução do convênio, afirma que ocorreu um superfaturamento do preço pago pela U. M. S. Por sua vez, o recibo de entrega de convite licitatório indica de forma clara quais são as empresas que receberam os convites, sendo cada empresa identificada por seu carimbo e assinatura (fls. 523/525). Vale ressaltar, ademais, que os demandados Vilson Piovesan Pompermayer e José Benildo de Oliveira Marinho, ao praticarem os atos jurídicos que culminaram na aquisição da U. M. S., estavam aparados por Parecer da Assessoria Jurídica do Município de Comodoro/MT, ao qual informou que o Procedimento licitatório — Convite n.° 047/2002 atendeu as disposições legais do art. 40 da Lei n.° 8.666/93 (fls. 522) e foi favorável à homologação do referido procedimento, devendo ser adjudicado o seu objeto ao vencedor do certame (fls. 576). Portanto, a míngua de um detalhamento idoneamente construído para inquinar de vícios reais capazes de anular o procedimento licitatório objeto do Convênio em exame, não há como acolher a pretensão da União, mormente por ler ela própria, através de Órgãos do seu corpo funcional contraditado o conteúdo da postulação trazida para sindicância judicial. Nesse sentido: "ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE CLAREZA. NÃO FORMAÇÃO DE CONVICÇÃO. ARTIGO 50, § 1º, LEI 9.784/99. VIOLAÇÃO. SUPERFATURAMENTO. DOLO E MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ATO IMPROBO. INEXISTENTE. I. A ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do servidor. 2. Os cálculos pertinentes ao prejuízo causado ao erário não foram trazidos aos autos, de forma o que não é possível compreender como os auditores chegaram ao referido valor. A ausência de clareza e congruência na argumentação impede a formação de convicção quanto aos atos praticados pelos réus, além de malferir o disposto no artigo 50, § I° da Lei n. 9.784/99. 3. O bem objeto do Convênio ri. 1564/2001 (SIAFI 430969), firmado entre o Município de Pintadas/BA e a Fundação Nacional de Saúde, foi adquirido por valor menor que o autorizado, não havendo, portanto, que se falar em superfaturamento. O valor repassado pela União, com fins específico, já havia sido arbitrado por área técnica, demonstrando que o preço de aquisição estava em conformidade com o preço praticado no mercado. 4. Não restou demonstrado nos autos o dolo e má-fé no intuito de fraudar o certame licitatório. Ato de improbidade administrativa não configurado. 5 - Recurso irnprovido." (AC 00036274820084013304 AC - APELAÇÃO CIVEL — 00036274820084013304. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO. TRF1. Terceira Turma. E- DJF1 Data: 29/08/2014, página: 1162) Diante desse panorama, entendo que não se pode afirmar, de maneira ausente de dúvidas, que o preço da aquisição da U. M. S. pelo Município revele, por si só, a existência de superfaturamento, tendo em vista a dificuldade em se aferir a presença de sobrepreço a partir do "valor de mercado". Em arremate, parece-me que a União não logrou demonstrar que os réus tenham incorrido nas figuras previstas no artigo 9.°, 10 e 11, da Lei n°. 8.429/92. Em relação às demais irregularidades apontadas nos procedimentos licitatórios pela auditoria e narradas na petição inicial (o objeto do Convênio n.° 236-1/2002, n.° SIAF1 457164 foi licitado na modalidade Carta Convite, mais fácil de ser simulada; não aplicação dos recursos no mercado financeiro; omissão da Comissão Municipal de Licitação em realizar consulta prévia de preços; ausência de identificação dos responsáveis pelo recebimento do convite), em que pese estar evidenciada a ocorrência de diversas transgressões ao princípio da legalidade, estas só se configuram quando se verifica a má-fé ou falta de cuidado objetivo deliberado, pelo agente público, no trato da coisa pública, o que também não restou demonstrado nos autos. Explico. Na medida em que não restou comprovada a relação entre o procedimento licitatório e o esquema das "sanguessugas", seria necessário que outros fatores levassem à conclusão de que os requeridos agiram dolosamente ao deixarem de observar os preceitos da lei de licitações. Algo que bem poderia demonstrar a intenção viciada dos agentes públicos seria seu enriquecimento indevido. ou qualquer outro tipo de vantagem que se pudesse imaginar. Mas inexiste qualquer elemento que concorra para a conclusão de que os agentes municipais, deliberadamente. violaram seus deveres funcionais e agiram de má-fé. Nesse diapasão, vale destacar a firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, para que seja configurado o ato de improbidade de que trata a Lei 8.429/92, "é necessário a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9.° e 11 e, ao mesmo, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10" (REsp 1.261.994/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 13104/12). Sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido. Precedentes do STJ: Resp 1038777/SP, DJe I 3/03/2011 . Inexistentes tais circunstâncias, não há corno reconhecer que praticaram ato de improbidade. Assim, as irregularidades s situam-se em outro patamar que não a improbidade administrativa. Portanto, após todas as ponderações feitas acima, entendo que os elementos de prova trazidos ao processo pela União não são suficientes para demonstrar: a) a inserção dos procedimentos da Carta Convite n°. 47/2002 no esquema fraudulento da "máfia dos sanguessugas"; b) prejuízo efetivo ao erário e c) elemento subjetivo — dolo/culpa -, necessário a qualificar as irregularidades no procedimento licitatório como ato de improbidade administrativa. Deste modo, a míngua de provas dos fatos/circunstâncias descritos na inicial, a improcedência do pedido é medida que se impõe. 2 . Do dano moral coletivo. Antes de tudo, registro que não é qualquer dano ao interesse difuso que configura o dano a coletividade, havendo necessidade de que os fatos assumam aspectos de gravidade o bastante para significar ofensa a um sentimento coletivo de decência e ofensa legitima aos valores da comunidade. No caso concreto, como o superfaturamento da unidade médica de saúde, adquirido por meio do Convênio n.° 2364/2002 — SIAFI: 457164, não foi provada de forma cabal, não há que se cogitar a respeito da existência de dano moral capaz de afrontar toda a coletividade. Entretanto, ainda que fosse caso, a jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, a repercussão pública negativa provocada pelas fraudes perpetradas por parlamentares e empresários, não demonstra o sofrimento popular. Vejamos: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. FRAUDE EM LICITAÇÃO REALIZADA PELA MUNICIPALIDADE. ANULAÇÃO DO CERTAME. APLICAÇÃO DA PENALIDADE CONSTANTE DO ART. 87 DA LEI 8.666/93. DANO MORAL COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO NÃO DEBATIDO NA INSTÂNCIA "A QUO". 1. (...). 2. Ad argumentandum tantum, ainda que ultrapassado o óbice erigido pelas Súmulas 282 e 356 do STF, melhor sorte não socorre ao recorrente, máxime porque a incompatibilidade entre o dano moral, qualificado pela noção de dor e sofrimento psíquico, e a transindividualidade, evidenciada pela indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da ofensa objeto de reparação, conduz à não indenizabilidade do dano moral coletivo, salvo comprovação de efetivo prejuízo dano. 3. Sob esse enfoque decidiu a 1" Turma desta Corte, no julgamento de hipótese análoga, verbis: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. DANO MORAL COLETIVO. NECESSÁRIA VINCULAÇÃO DO DANO MORAL À NOÇÃO DE DOR, DE SOFRIMENTO PSÍQUICO, DE CARÁTER INDIVIDUAL. INCOMPATIBILIDADE COM A NOÇÃO DE TRANSINDIVIDUALIDADE (INDETERMINABILIDADE DO SUJEITO PASSIVO E INDIVISIBILIDADE DA OFENSA E DA REPARAÇÃO). RECURSO ESPECIA IMPROVIDO." (REsp 508.28I/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.05.2006, DJ 01.06.2006) 4. Nada obstante, e apenas obiter dictum, há de se considerar que, no caso concreto, o autor não demonstra de forma clara e irrefutável o efetivo dano moral sofrido pela categoria social titular do interesse coletivo ou difuso, consoante assentado pelo acórdão recorrido:"... Entretanto, como já dito, por não se tratar de situação típica da existência de dano moral puro, não há como simplesmente presumi-Ia. Seria necessária prova no sentido de que a Municipalidade, de alguma forma, tenha perdido a consideração e a respeitabilidade e que a sociedade uruguaiense efetivamente tenha se sentido lesada e abalada moralmente, em decorrência do ilícito praticado, razão pela qual vai indeferido o pedido de indenização por dano moral". 5. Recurso especial não conhecido." (REsp 821891 / RS, Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, j. em 8- 4-2008, DJe 12-5-2008) (grifei) Por fim, o pedido de dano moral coletivo deve ser julgado improcedente. III — DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, nos termos do artigo 487, inciso 1, do CPC/20 I 5 c/c artigo 16 da Lei n.° 7.347/85. Proceda a liberação de eventuais restrições realizadas por meio do Sistema Bacen-Jud ou Renajud. Sem custas, nem honorários (artigo 18 da Lei n.° 7347/85). (...). (Negritos no original) Da leitura da sentença apelada, verifica-se que a magistrada de 1º grau concluiu que não há provas suficientes para confirmar o superfaturamento, especialmente porque o próprio Ministério da Saúde aprovou previamente o valor do veículo e posteriormente validou a prestação de contas do convênio. Também não há comprovação de que o procedimento licitatório estava envolvido no esquema fraudulento conhecido como "Máfia dos Sanguessugas". Concluiu, ainda, a magistrada de 1ª instância que não foram identificados indícios de enriquecimento ilícito ou dolo por parte dos agentes municipais, requisitos fundamentais para caracterização da improbidade administrativa. Assim, a ação foi julgada improcedente por ausência de provas de dano efetivo ao erário, de fraudes ou má-fé dos envolvidos. Pois bem. A presente ação fundamenta-se no Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT (ID 26636534-págs. 215/226) e no relatório da fiscalização realizada de forma conjunta pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS e pela Controladoria-Geral da União (ID 25986532-págs. 22/37). Conforme mencionado pelo Juízo a quo na sentença, tanto o Relatório da fiscalização realizada pelo DENASUS em conjunto com a CGU quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve cobrança de sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. Isso porque, a falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, apesar de os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicarem suposta cobrança de sobrepreço na aquisição do veículo, referidas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em consideração o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. Registre-se, também, que o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, constatou um suposto prejuízo à União no valor de R$ 15.155,09 (quinze mil, cento e cinquenta e cinco reais e nove centavos). Já, o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal em 2009, e baseado no mesmo relatório de auditoria, indicou um superfaturamento menor, no valor de R$ 13.783,00 (treze mil, setecentos e oitenta e três reais). Ora a discrepância entre os valores apresentados gera incerteza quanto ao real prejuízo supostamente causado ao erário. Desse modo, inexistindo nos autos prova segura acerca da alegada cobrança de sobrepreço, e existindo documentos que atestam a entrega do veículo ambulância à municipalidade, não há como se falar em prejuízo ao erário. Nesse mesmo sentido, veja-se julgado proferido por este TRF da 1ª Região, em caso análogo: PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992 ALTERADA PELA LEI 14.230/2021. NORMA PROCESSUAL. SUPERVENIÊNCIA DE LEI NOVA. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. AFASTAMENTO DAS CONDUTAS CULPOSAS. APLICAÇÃO IMEDIATA. AUSÊNCIA DE DOLO. INEXISTÊNCIA DE ATO ÍMPROBO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÕES PROVIDAS. (...). Os atos de improbidade administrativa não se confundem com simples ilegalidades administrativas ou inaptidões funcionais — A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado (STJ, REsp 213.994-0, 1ª Turma; relator ministro Garcia Vieira; DJ de 27/9/1999). Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei 8.429/1992, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. Os fatos dos autos não justificam a leitura jurídica do julgador. À míngua de demonstração de que o objeto dos convênios não tenha sido cumprido, verifica-se que os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos prejudiciais, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o poder de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública (dolo) e, ainda, lesão ao erário, o que não ficou comprovado. Tal como ocorre na ação penal, em que a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII, do CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei 8.429/1992, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. É indispensável que haja um acervo mínimo e seguro de elementos informativos (judicializados), a salvo de dúvida razoável, em prol das imputações da inicial, do que não se desincumbiu o MPF, que tinha o ônus de provar os fatos constitutivos (art. 373, I, do CPC), apontando com precisão a existência de violação aos princípios da Administração Pública, especialmente em relação ao suposto dano ao erário. Remessa oficial não conhecida. Apelação a que se dá provimento, a fim de reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos do autor, nos termos do art. 17, § 11, da Lei 8.429/1992 (alterada pela Lei 14.230/2021). (Destaquei) (AC 0002308-35.2015.4.01.4101, JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (Conv.), TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 24/08/2023.) Do mesmo modo, também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido qualquer vantagem indevida. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite, a não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou dolo, o que não ficou comprovado nos autos, configurando, no máximo, meras irregularidades administrativas. Desse modo, embora possam ter ocorrido irregularidades na condução da Carta Convite n° 047/2002, decorrente do Convênio n° 2364/2002, não é possível afirmar que os membros da comissão de licitação ou o ex-prefeito de Comodoro/MT tenham recebido vantagens indevidas para sua execução. Ademais, competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu no presente caso, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa), devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Nesse sentido, cite-se precedentes desta Corte Revisora: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR (TEMA 1.199). ART. 10 DA LIA. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. DANO AO ERÁRIO E DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. O STF, no julgamento do RE 843.989/PR (Tema 1.199), por unanimidade, fixou tese no sentido de que: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10, 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente (...)". 2. Pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações de improbidade administrativa ainda em curso. 3. Ademais, o STJ entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. 4. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. 5. Esta Corte já decidiu que a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não havendo mais que se falar em dano presumido. 6. A despeito das irregularidades formais narradas, consistente na não realização de licitação para contratação pública, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, não restou comprovado o intuito do agente em lesar o erário. 7. A improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 8. Não comprovada a existência de dano ao erário, tampouco o dolo específico, resta inviabilizada a condenação pela prática de ato ímprobo previsto no art. 10 da LIA. 9. Apelação provida. (sem negritos no original) (AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, TRF1 - QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. ART. 10, VIII, DA LEI 8.429/92. FRUSTRAÇÃO DA LICITUDE DE CERTAME LICITATÓRIO. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. CARÁTER SANCIONADOR. TEMA 1.199 DO STF. DOLO ESPECÍFICO DE LESAR O ERÁRIO E DE OBTER BENEFÍCIO, PARA SI OU PARA OUTREM. NÃO COMPROVADO. PERDA PATRIMONIAL EFETIVA NÃO DEMONSTRADA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. APELAÇÃO ADESIVA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. EXTENSÃO DOS EFEITOS AOS REQUERIDOS NÃO RECORRENTES. ART. 1.005 DO CPC. (...). 5. A imputação está lastreada em documentos reunidos pelo Ministério Público Federal e em parecer da Advocacia-Geral da União, nos quais foram verificadas irregularidades no procedimento licitatório a fim de redirecionar o certame em favor da empresa requerida. 6. De fato, houve irregularidades no procedimento licitatório, em razão (i) da inserção de cláusulas restritivas no Edital da Concorrência n. 01/2010; (ii) de inconsistências nas informações contidas no atesto realizado pelo ex-secretário de finanças do município, de que havia dotação orçamentária suficiente a respaldar a execução do objeto, que fora licitado antes mesmo da celebração do convênio com o Ministério da Integração; e (iii) da assinatura do primeiro termo aditivo do contrato firmado entre o Município de Miranorte/TO e a empresa requerida, a fim de dividir o objeto em etapas e reajustar o valor da suposta 1ª etapa de execução, com aumento de preços unitários de forma desproporcional. 7. Não obstante as irregularidades apontadas no procedimento licitatório, não há prova nos autos do alegado direcionamento do certame; do dolo específico de causar prejuízo ao erário ou de obter proveito ou benefício indevido, para si, ou para outra pessoa ou entidade de obter vantagem; e da comprovação da perda patrimonial efetiva com relação a todos os requeridos na ação de improbidade administrativa. 8. Embora a sentença tenha reconhecido a prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, condenou o ex-prefeito e o ex-secretário de finanças em razão da "má-gestão" e "inaptidão" de ambos para gerir o município e a respectiva pasta, elementos que, por si sós, não são aptos à caracterização do dolo específico ou má-fé dos agentes públicos de lesar o patrimônio público ou de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. 9. Além disso, o Ministério da Integração Nacional, por meio da Nota Técnica RPZ n. 037/2015, admitiu a utilização de licitação pretérita, apontada como irregular pelo autor e, conforme a Nota Técnica RPZ n. 012/2014, houve a adequação do valor objeto da avença. 10. Ausente, também, a comprovação do efetivo dano ao erário, porque houve a prestação de grande parte do objeto do contrato, consoante se extrai do Parecer nº 32/2017 da Secretaria de Infraestrutura Hídrica do Departamento de Obras do Ministério da Integração, subscrito em 14/02/2017 no sentido de que "houve um considerável avanço físico da obra e que a atual situação da obra é compatível com o total dos recursos pagos à construtora". 11. É assente o entendimento de que, "[a] partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in reipsa cf. art. 21, I, da LIA)". (AC 1000137-35.2017.4.01.3902, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, Terceira Turma, PJe de 21/03/2024). 12. À míngua de um mínimo substrato probatório de que os requeridos tenham atuado de maneira dolosa a fim de causar dano ao erário e de obter, para si ou para outrem, proveito ou benefício indevido decorrente da prática do ato imputado, somada à ausência do efetivo prejuízo supostamente causado ao erário, deve ser afastada a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, resultado que deve ser estendido aos demais requeridos não apelantes, nos termos do art. 1.005 do CPC. 13. Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento. 14. Apelação adesiva do ex-prefeito e secretário de finanças do Município de Miranorte/TO provida para reformar a sentença e afastar a condenação pela prática da conduta descrita no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, com extensão dos efeitos da absolvição aos demais requeridos não recorrentes. (negritos não originais) (AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024.) Além disso, o MPF deixou de apresentar provas acerca do alegado acréscimo patrimonial que teria sido experimentado pelos apelados, condição esta sine qua non para enquadramento das condutas a eles atribuídas nos tipos previstos pelo art. 9º da LIA. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. A esse respeito, vale citar a seguinte ementa: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTS. 9º E 10, LEI Nº 8.429/92. ALTERAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO NÃO DEMONSTRADOS. INEXISTÊNCIA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO PROVIDO. EXTENSÃO DO JULGAMENTO. 1. Ação civil pública por improbidade administrativa que imputa aos Requeridos a prática de atos ímprobos tipificados nos arts. 9º, inciso IV e 10, inciso II, da Lei nº 8.429/92. 2. Conforme a sentença, os Requeridos praticaram condutas que ensejaram enriquecimento ilícito e dano ao Erário, nos termos dos arts. 9º, IV e 10, II, da Lei nº 8.429/92, por irregularidades na execução da obra do Convênio, firmado entre a União Federal, por intermédio do Ministério da Integração Nacional, e o Município de Porto Walter/AC. 3. A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, passou a exigir a presença do dolo específico para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92. Ainda, a Lei nº 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo prejuízo ou dano ao Erário para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10. 4. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. 5. É essencial que seja demonstrado o acréscimo patrimonial do agente para que se configure o ato de improbidade administrativa que importe em enriquecimento ilícito, o que não se verifica no caso. 6. Não restou comprovado o dolo específico na conduta dos Requeridos. Ainda, não restou demonstrado o efetivo prejuízo ao Erário, o que inviabiliza a condenação pelo art. 10 da LIA, tendo em vista as inovações da Lei nº 14.230/2021. 7. Conforme o art. 1.005, caput, do CPC, "O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses". O STJ compreende que a extensão dos efeitos deve ser feita àquelas situações que necessitem de tratamento igualitário. Precedente. 8. À vista do entrelaçamento fático entre os Réus e da inexistência de oposição manifesta dos litisconsortes, a eles deve ser estendido o efeito da improcedência da imputação, conquanto não tenha apelado, em respeito ao princípio da isonomia, por força do art. 1.005, caput, do CPC. 9. Recurso provido. Improcedência da ação de improbidade administrativa. Extensão do julgamento. (Grifei) (AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025.) Quanto ao pedido de condenação dos apelados pela prática da conduta prevista pelo art. 11, incisos I e II, da LIA, ressalte-se que a Lei 14.230/2021, ao introduzir e alterar diversos dispositivos da Lei 8.429/92, revogou expressamente a conduta genérica prevista no caput do art. 11, bem como os inciso I, II, IX e X, da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, abolidas as condutas genericamente tipificadas no caput ou nos incisos revogados do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nessa linha de compreensão, cito precedente do STJ: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.230/2021. RESPONSABILIZAÇÃO POR DOLO GENÉRICO. REVOGAÇÃO. APLICAÇÃO IMEDIATA. 1. (...). 3. A Primeira Turma desta Corte Superior, no julgamento do AREsp 2.031.414/MG, em 9/5/2023, firmou a orientação de conferir interpretação restritiva às hipóteses de aplicação retroativa da LIA (com a redação da Lei n. 14.230/2021), adstrita aos atos ímprobos culposos não transitados em julgado, de acordo com a tese 3 do Tema 1.199 do STF. 4. Acontece que o STF, posteriormente, ampliou a abrangência do Tema 1.199/STF, a exemplo do que ocorreu no ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, admitindo que a norma mais benéfica prevista na Lei n. 14.230/2021, decorrente da revogação (naquele caso, tratava-se de discussão sobre o art. 11 da LIA), poderia ser aplicada aos processos em curso. 5. Tal como aconteceu com a modalidade culposa e com os incisos I e II do art. 11 da LIA (questões diretamente examinadas pelo STF), a conduta ímproba escorada em dolo genérico (tema ainda não examinado pelo Supremo) também foi revogada pela Lei n. 14.230/2021, pelo que deve receber rigorosamente o mesmo tratamento. 6. (...). 7. Recurso especial não provido. (Grifei) (REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA TIPIFICADA NO ART. 10, VIII E IX, DA LEI 8.429/1992. DOLO VERIFICADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 7 DO STJ. EMBARGOS ACOLHIDOS APENAS PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS. 1. (...). 2. No julgamento do Tema 1.199/STF (ARE 843989 RG, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 4.3.2022), fixou-se o entendimento vinculante de que "A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente". 3. Embora, inicialmente, tal entendimento tivesse abrangido, apenas, pessoas sem condenação transitada em julgado, incursas em improbidades culposas do art. 10 da LIA, mais recentemente o STF tem ampliado a incidência da tese para extinguir as ações de improbidade cujos acusados estejam incursos nos tipos dolosos extintos da previsão genérica do caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 e, também, dos seus incisos I, II ou III, haja vista que, tanto quanto os tipos culposos, não haveria mais substrato jurídico normativo para o próprio prosseguimento da persecução em juízo. 4. (...). 6. Embargos de Declaração acolhidos apenas para prestar esclarecimentos. (Grifei) (EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024.) No caso dos autos, havendo pedido do apelante de condenação dos apelados pela prática da conduta então tipificada no inciso I e II, do art. 11, da Lei 8.429/92, é de se reconhecer a ausência superveniente de tipicidade da conduta. Em caso análogo, veja-se o seguinte precedente desta Corte Revisora: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FIRMADO COM O FUNDO NACIONAL DE SAÚDE - FNS. IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DE AÇÕES NA ÁREA DE SAÚDE. LESÃO AO ERÁRIO E VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ART. 10, I, VIII, XI, XI E 11, I, DA LEI 8.429/92. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 14.230/2021. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. RETROATIVIDADE. ENTENDIMENTO DO STF. TEMA 1.199. DOLO ESPECÍFICO E LESÃO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo ora recorrente contra o ex-prefeito do Município de Jânio Quadros, o ex-secretário saúde do Município e a cooperativa supostamente beneficiada, julgou improcedente o pedido de condenação dos requeridos nas condutas previstas nos art. 10, I, VIII, IX, XI e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades em procedimento licitatório e na execução de ações na área de saúde envolvendo verbas advindas de convênio firmado com Fundo Nacional de saúde FNS. 2. Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas nos art. 9º, 10 e 11 da Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021. Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava "obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade" (art. 11, § 2º). 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e ante o entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1.199. (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). 4. (...). 5. Por sua vez, o art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que "constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade", e desde que esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos, passando o rol a ser taxativo. Além da alteração de elementares de vários tipos infracionais, a Lei 14.230/2021, também revogou os incisos I ("praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamente ou diverso daquele previsto, na regra de competência") e II ("retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício"), do que resulta em atipicidade superveniente da conduta quanto a tais dispositivos. 6. (...). 9. Nesse contexto, não demonstrado o dolo específico referido na conduta dos réus, bem assim das demais elementares do tipo infracional do art. 10, I, VIII, XI, XI, da Lei n. 8.429/92, e ante a revogação do inciso I do art. 11 da mesma Lei, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação. 8. Apelação do Ministério Público a que se nega provimento. (Grifei) (AC 0005804-92.2016.4.01.3307, Rel. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, Décima Turma, PJe 17/07/2024.) Diante desse quadro, em observância ao princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, que tem aplicação imediata no âmbito do direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/21, em razão da abolição da tipicidade da conduta então imputada aos requeridos. Nesse sentido, cito precedentes desta Corte Revisora: Ação de improbidade administrativa. Inadequação da via processual eleita. Impossibilidade jurídica do pedido. Preliminares rejeitadas. Nulidade da sentença. Prejudicial rejeitada. Réu condenado pela prática das condutas ímprobas consistentes em "agir negligentemente na arrecadação de tributo ou de renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público", assim como "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício". Lei 8.429, de 2 de junho de 1992, Art. 10, X, Art. 11, II (na redação original). 1. (...). 7. A retroatividade da Lei 14.230, em favor do réu, não está restrita apenas às condutas culposas. A retroatividade também opera em caso de "abolição da tipicidade da conduta", acarretando a "improcedência dos pedidos formulados na inicial." (STJ, EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1.174.735/PE, relator Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 5/3/2024, DJe de 8/3/2024.) 8. A Lei 14.230 revogou o inciso II do art. 11 da Lei 8.429/92. Assim, não mais subsiste a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal. 9. Apelação de Ronan Rosa Batista provida. (AC 0001265-76.2013.4.01.3505, Rel. Juiz Federal Marcelo Elias Vieira (Conv.), Quarta Turma, PJe 31/07/2024.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, CAPUT E INCISO II, DA LEI Nº 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO PROVIDO. 1. Trata-se de ação de improbidade administrativa através da qual o Ministério Público Federal narra que o Apelante incidiu em irregularidades formais na condução de processo que apurou a inadimplência de cooperativa contratada pelo INCRA para a prestação de serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural. Requereu a sua condenação às penas do art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92, pela prática de atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 10 e 11 da mesma Lei. 2. A sentença condenou o Apelante pela prática de atos de improbidade administrativa tipificados no art. 11, caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92, antes das alterações realizadas pela Lei nº 14.230/2021. 3. Com o advento da Lei nº 14.230/2021, o rol de condutas do art. 11 da Lei nº 8.429/92 passou a ser taxativo, exigindo-se a subsunção da conduta em algum dos incisos deste dispositivo. Além disso, o ato tipificado no inciso II do art. 11 da Lei nº 8.429/92, após a revogação do dispositivo pela Lei nº 14.230/2021, deixou de configurar improbidade administrativa. 4. Com fundamento nos princípios do direito administrativo sancionador, entende-se que as modificações legislativas que não mais classificam como ímprobas condutas que eram consideradas desta natureza pelo regime anterior, devem abranger fatos passados não definitivamente julgados. Assim, considerando-se que a conduta atribuída ao Requerido não é mais tipificada como ato de improbidade administrativa, impõe-se a improcedência da ação. 5. Sentença reformada, para julgar improcedente a ação. 6. Recurso provido. (AC 0002294-10.2008.4.01.4000, Rel. Desembargador Federal Marcus Bastos, Décima Turma, PJe 20/11/2023.) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR DO IBAMA. LIBERAÇÃO INDEVIDA DE LAUDOS DE VISTORIAS. IMPUTAÇÃO NA TIPOLOGIA DO ART. 11, CAPUT, E INC. I E II DA LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TIPO REVOGADO PELA LEI N. 14.230/21. ROL TAXATIVO. TIPICIDADE FECHADA. EXIGÊNCIA DE DOLO. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO IMEDIATA. RETROATIVIDADE. AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO TÍPICA. TEMA 1.199. STF. APELAÇÃO PROVIDA. 1. (...).. 2. A Lei n. 14.230/2021, provocou diversas alterações na Lei n. 8.429/92. Este (novo) sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa passou a alterar anteriores tipicidades e a revogar sanções, antes contempladas pela Lei n. 8.429/92, em sua redação original, dentre elas a que tem pertinência com a situação aqui analisada, ou seja, o art. 11 passou a enumerar as ações que seriam consideradas ímprobas de forma taxativa. Por outro lado, os inc. I e II do art. 11 da Lei 8.429/92 foi revogado pela Lei 14.230/2021. 3. Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Relator: Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, Publicação 12/12/2022). 4. Registra-se que em 22.08.2023, ao apreciar o ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, o STF firmou a compreensão de que (...) As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 5. A ausência de imputação de um dos tipos do art. 11 ainda vigentes com as modificações promovidas pela Lei n. 14.230/21, leva ao reconhecimento de imputação genérica, sem vinculação a tipo específico, impondo-se a absolvição dos requeridos, por atipicidade. 4. Apelações a que se dá provimento para absolver os réus das sanções que lhes foram impostas na sentença. (AC 0005100-04.2010.4.01.3303, Rel. Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas, Décima Turma, PJe 15/12/2023.) Dessa maneira, seria o caso de se reconhecer o afastamento da imputação feita aos réus com base na referência ao caput e incisos I e II do art. 11, da Lei 8.429/92. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Nessa linha de intelecção, cite-se precedentes do Superior Tribunal de Justiça: DIREITO ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TEMA 1.199/STF. SUPERVENIÊNCIA DA LEI 14.230/2021. OMISSÃO RECONHECIDA. RECURSO ACOLHIDO, SEM EFEITOS INFRINGENTES. 1. (...). 2. Haverá abolição da figura típica quando a conduta a concretizar a anterior redação do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) se tornar irrelevante para os fins de tal lei, e não quando houver evidente correspondência na atual redação dos incisos do art. 11 da mesma lei. 3. Estando os fatos cristalizados no acórdão recorrido a tipificar a hipótese prevista no inciso XI do art. 11 da LIA, tem-se por presente verdadeira continuidade típico-normativa, não havendo que se falar em abolição da tipicidade. 4. Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos modificativos. (Grifei) (EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024.) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. INCÊNDIO EM PRÉDIO PÚBLICO. SITUAÇÃO EMERGENCIAL A PERMITIR CONTRATAÇÃO DIRETA. INCLUSÃO DE OBRAS E REFORMAS DE AMBIENTES NÃO ATINGIDOS PELO EVENTO DANOSO. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. FAVORECIMENTO DE PARTICULAR E TERCEIRO. COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM BASE NO ART. 11 DA LIA. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE TÍPICO-NORMATIVA. INEXISTÊNCIA DE ABOLIÇÃO DA IMPROBIDADE NO CASO CONCRETO. EXPRESSA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA NO INCISO V DO ART. 11 DA LIA. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. NECESSIDADE DE NOVA ADEQUAÇÃO. 1. (...). 2. A Primeira Turma do STJ, por unanimidade, em julgamento realizado no dia 6/2/2024, no AgInt no AREsp n. 2.380.545/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, acórdão pendente de publicação, seguiu a orientação da Suprema Corte no sentido de que "as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/2021 ao art. 11 da Lei n. 8.429/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado" (ARE 803.568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, DJe 6/9/2023). 3. Na sessão de 27/2/2024, no julgamento do AgInt no AREsp n. 1.206.630, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, DJe 1/3/2024, a Primeira Turma desta Corte, alinhando ao entendimento do STF, adotou a tese da continuidade típico-normativa do art. 11 quando, dentre os incisos inseridos pela Lei n. 14.230/2021, remanescer típica a conduta considerada no acórdão como violadora dos princípios da Administração Pública. 4. Na espécie, o Tribunal de origem, com base no conjunto fático e probatório constante dos autos, atestou a prática de ato ímprobo, em razão de dispensa indevida de licitação e do favorecimento de particular e terceiro, consignando a presença do elemento subjetivo em relação aos fatos apurados. A reversão de tal entendimento exige o reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 5. Nesse contexto, nota-se que a referida conduta (dispensa indevida de licitação e favorecimento de particular e terceiro) guarda correspondência com a hipótese prevista no inciso V do art. 11 da LIA, de maneira a atrair a referida tese da continuidade típico-normativa. 6. Considerando que a sanção de vedação de contratar com o Poder Público foi fixada em prazo superior ao limite legal (art. 12, III, da LIA, com a redação original), merece ser reduzida para 3 anos, de modo, também, a melhor atender os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, dadas as circunstâncias contidas no acórdão recorrido e as diversas outras penalidades aplicadas. 7. Agravo interno parcialmente provido, para conhecer do agravo, a fim de conhecer em parte do recurso especial, e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento, tão somente para reduzir a 3 anos a pena de proibição de contratar com a Administração Pública. (Grifei) (AgInt no AREsp 1.611.566/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 29/05/2024.) No caso dos autos, revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. Eis a redação do referido dispositivo legal: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...). V - frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; No caso concreto, contudo, em detida análise dos elementos e provas constantes dos autos, constata-se que apesar de existirem falhas na condução do procedimento da Carta Convite 47/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. A esse respeito, confira-se precedente desta Terceira Turma: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, I E II DA LEI 8.429/92. MERAS IRREGULARIDADES FORMAIS. AUSENCIA DA PRATICA ÍMPROBA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. O MPF atribuiu aos acusados a prática de atos de improbidade previstos no art. 11, I e II da Lei 8.429/92 em razão de inexigibilidade de licitação no âmbito do Senado Federal fora das hipóteses previstas em lei. 2. Não se verifica no caso em tela indícios de atos de improbidade administrativa, notadamente, porque a existência de meras irregularidades formais não configura ato ímprobo, razão pela qual não merece ser reformada a sentença guerreada, em face da inocorrência de dolo ou má-fé do agente. 3. A mera ilegalidade do ato ou inabilidade do agente público que o pratica nem sempre pode ser enquadrada como improbidade administrativa. O ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. 4. Não se desconhece a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa (art. 12, da Lei 8.429/92). A decisão do TCU, contudo, embora não vincule o Poder Judiciário, pode ser utilizada como elemento de convencimento do Juízo. 5. Remessa oficial e apelação não providas. (Grifei) (AC 0047130-15.2014.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL NEY DE BARROS BELLO FILHO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 05/04/2024.) Por fim, quanto ao pedido de condenação por dano moral coletivo, este não se revela cabível, pois não há nos autos qualquer prova concreta de efetivo prejuízo moral sofrido pela coletividade em razão dos supostos atos lesivos. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. SAÚDE PÚBLICA. PRECARIEDADE DO ATENDIMENTO EM HOSPITAIS ESTADUAIS. RECEBIMENTO DE VERBAS FEDERAIS EM CONVÊNIO CELEBRADO COM A UNIÃO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA A REESTRUTURAÇÃO DE SALAS CIRÚRGICAS E AQUISIÇÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS PARA A REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS. POSSIBILIDADE. OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES. INEXISTÊNCIA. PROIBIÇÃO DE CONTRATAÇÃO DE ESTABELECIMENTOS PRIVADOS CONVENIADOS E UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESTADUAL DE SAÚDE. DESCABIMENTO. PEDIDOS DE REDUÇÃO DA MULTA DIÁRIA E DILATAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. REJEIÇÃO. DANO MORAL COLETIVO NÃO CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. (...). IX. A orientação jurisprudencial já sedimentada nos tribunais pátrios firmou-se no sentido de que "a possibilidade de indenização por dano moral está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo restrição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da legislação têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial" e de que "o dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera extrapatrimonial de uma pessoa" (REsp 1397870/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 02/12/2014, DJe 10/12/2014). Todavia, no caso concreto, entendo que não é cabível a condenação dos réus ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, pois, a despeito da precariedade no atendimento dispensado pelos hospitais estaduais de Porto Velho/RO, não restaram comprovados nos autos os danos físicos ou emocionais eventualmente suportados pelos pacientes mencionados na inicial, sendo inoportuna, também, a condenação em relação a pacientes futuros, que vierem a ser atendidos com atraso ou desídia, sob pena de se distorcer a lógica da responsabilidade civil, já que a formação do título relativo à reparação do dano antecederia a própria prática do ato ilícito. É certo que não se justifica a reparação por dano extrapatrimonial coletivo quando feita menção genérica à coletividade, sem demonstrar a dor e o sofrimento do grupo especificamente atingido (AG 0026914-77.2016.4.01.0000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 - Terceira Turma, e-DJF1 DATA: 07/10/2016). Portanto, considerando que os autores não se desincumbiram do ônus de demonstrar o efetivo dano moral sofrido, deve ser mantida a sentença também neste capítulo, ficando ressalvada a possibilidade de os pacientes perseguirem individualmente a reparação pecuniária que entenderem devida, em ações próprias, bem como de eventual reparação de danos ao erário em sede de ação de improbidade administrativa. X. Preliminar rejeitada. Remessa necessária e apelações desprovidas. (REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (CONV.), TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020.) ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. INEXECUÇÃO DO OBJETO DO CONVÊNIO FIRMADO ENTRE O INCRA E O MUNICÍPIO E AUSÊNCIA DA RESPECTIVA PRESTAÇÃO DE CONTAS. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COMPROVADO NOS AUTOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DO EFETIVO ABALO MORAL SOFRIDO PELA MUNICIPALIDADE. CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. LEI 7.347/85, ART. 18. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO REQUERIDO NO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ÓBICE DO ART. 128, § 5º, II, CF/88. 1. A Lei 8.429/92, referente à Ação de Improbidade Administrativa, que regulamentou o disposto no art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art.9º); b) que causem prejuízo ao erário (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11). 2. Comprovado, de forma irrefutável, que o ex-prefeito não deu efetivo cumprimento ao objeto previsto no Convênio n. 22.006/97 e, ainda, que não houve a devida prestação de contas, resta caracterizado o ato de improbidade previsto nos artigos 10 e 11, VI, da Lei nº 8.429/92. Sentença condenatória se mantém ante o extenso acervo probatório contido nos autos. 3. Não é qualquer ato que viole o princípio da legalidade que gera um ato de improbidade administrativa, é necessário um algo mais para o agente ser tachado de ímprobo e ser tão severamente punido com o previsto na Lei 8.429/92. É preciso o dolo, a má-fé, a intenção de violar o princípio basilar da Administração Pública, circunstância não verificada na conduta da apelada CONSTRUTORA TRANSPACHECO LTDA, que não deu prosseguimento à execução da obra contemplada no Convênio n. 22.006/97, em razão da ausência de repasses financeiros por parte do Município. 4. A caracterização dos danos morais no âmbito de ação de improbidade administrativa reclama a prova inequívoca do abalo moral impingido pelo ato ímprobo, in casu, seria necessário prova no sentido de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentidos lesados e abalados moralmente. Não basta supor a mera frustração da municipalidade ou, ainda, o descrédito pela máquina administrativa em razão da inexecução do objeto avençado no Convênio, pois não se presume a existência do dano moral. Hipótese em que o autor não trouxe provas do efetivo dano moral sofrido pela categoria titular do interesse coletivo atingido pelo ato de improbidade administrativa. 5. O Ministério Público, vencido na ação por improbidade administrativa por ele ajuizada, só responderá pelos honorários de advogado se configurada a má-fé na sua atuação, como prevê o art. 18 da Lei 7.347/85, aplicada subsidiariamente. Não havendo sequer indícios de má-fé do Parquet Federal não há como fundamentar sua condenação no pagamento de honorários. 6. Não se sustenta a condenação do requerido no pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público Federal haja vista o óbice imconvite rio Público é vedado receber "a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais." 7. Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida. (AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ TOURINHO NETO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291.) Nesse contexto, embora a "Operação Sanguessuga" tenha revelado um esquema fraudulento de alcance nacional, com grande repercussão na mídia, não há justificativa para a condenação dos requeridos ao pagamento de dano moral coletivo, pois não foi comprovado que a conduta tenha atingido o círculo primordial de valores sociais. A fraude ocorreu na execução do Convênio nº 2364/2002, com a condução irregular da licitação, o que violou a legislação aplicável, mas sem evidência de que os munícipes, de alguma forma, tenham se sentido lesados e abalados moralmente. Ante o exposto, NEGO provimento à apelação do MPF. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0003282-93.2010.4.01.3601 APELANTES: UNIÃO FEDERAL, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APELADOS: DARCI JOSÉ VEDOIN, LUIZ ANTONIO TREVISAN VEDOIN, VILSON PIOVESAN POMPERMAYER, JOSE BENILDO DE OLIVEIRA MARINHO Advogado do(a) DO APELADO: WINSTON LUCENA RAMALHO - MT6985/A-S E M E N T A PROCESSO CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MPF. LEI 8.429/92. INOVAÇÕES DA LEI 14.230/21. CONVÊNIO PARA AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. FRAUDE À LICITAÇÃO NÃO COMPROVADA. DANO AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADOS. ART. 11, I e II, DA LIA. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE. DANO MORAL COLETIVO. NÃO OCORRÊNCIA. APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, rejeitou o pedido de condenação dos réus pela suposta prática das condutas descritas nos artigos 9°, incisos I e XI; 10, incisos I e VIII; e 11 incisos I e II, todos da Lei nº 8.429/92. 2. Para as condutas previstas nos arts. 9º e 10 da Lei 8.429/92, ainda que eventualmente comprovado o dolo específico, para a condenação por ato ímprobo se exige também a comprovação de obtenção de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) ou efetivo dano ao erário (art. 10). 3. No caso em exame, tanto o relatório de fiscalização realizado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, quanto o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, da Polícia Federal, não permitem concluir que houve sobrepreço na aquisição da unidade móvel de saúde. A falta de clareza na metodologia utilizada para determinar o valor estimado de mercado do veículo e o prejuízo apontado fragiliza a tese de superfaturamento. Ademais, os laudos da Polícia Federal e do DENASUS/CGU indicaram um suposto sobrepreço na aquisição do veículo, mas essas avaliações consideraram separadamente o veículo e os materiais utilizados, sem levar em conta o valor do veículo já adaptado, o que compromete a conclusão sobre eventual superfaturamento. 4. As discrepâncias encontradas entre o Relatório de Auditoria nº 5074, elaborado pelo DENASUS em conjunto com a CGU, e o Laudo de Exame Contábil nº 0062/2009 – SETEC/SR/DPF/MT, confeccionado pela Polícia Federal, impedem que referidos documentos sejam considerados como provas hábeis a comprovar o alegado sobrepreço. 5. Também não está demonstrado o alegado prejuízo ao erário, considerando que o objeto do Convênio 2364/2002 foi integralmente cumprido, com a entrega dos bens à comunidade de Comodoro/MT, além de não ter sido demonstrado o superfaturamento em sua aquisição. 6. Também não se sustenta a alegação de enriquecimento ilícito, uma vez que o conjunto probatório dos autos não apresenta elementos que permitam concluir que os demandados tenham obtido vantagem indevida. 7. Quanto às demais irregularidades apontadas na auditoria, como a escolha da modalidade carta convite; não aplicação dos recursos no mercado financeiro e a ausência de consulta prévia de preços, embora configurem transgressões ao princípio da legalidade, não caracterizam improbidade administrativa isoladamente. Para tanto, seria necessária a demonstração de má-fé ou do dolo específico, o que não ocorreu no presente caso, evidenciando-se, no máximo, meras irregularidades administrativas. 8. Competia ao MPF comprovar a prática de superfaturamento na aquisição do veículo e/ou dos equipamentos licitados e o enriquecimento ilícito dos réus, o que não ocorreu, devendo ser lembrado que com as inovações trazidas pela Lei 14.230/21 não mais se admite o dano presumido (in re ipsa) para a configuração do ato ímprobo, devendo o prejuízo ao erário ser efetivamente comprovado para configuração de ato de improbidade administrativa. Precedente do TRF1: AC 0005978-88.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, QUARTA TURMA, PJe 18/12/2024; AC 1001233-55.2017.4.01.4300, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO (CONV.), DÉCIMA TURMA, PJe 23/11/2024. 9. Assim, não demonstrado o enriquecimento ilícito dos apelados, nem o dano ao erário, não há como imputar-lhes a prática de atos de improbidade administrativa. Nesse sentido: TRF1, AC 0008294-43.2013.4.01.3000, JUIZ FEDERAL BRUNO HERMES LEAL (Conv.), DÉCIMA TURMA, PJe 27/01/2025. 10. Revogadas as condutas tipificadas nos incisos I e II do artigo 11, não haveria mais substrato jurídico normativo para o prosseguimento da demanda quanto à pretensão condenatória lastreada em tais hipóteses. Nesse sentido: STJ, REsp 2.107.601/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 02/05/2024 e STJ, EDcl nos EDcl no REsp 1.788.624/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22/08/2024. 11. O Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a conduta antes enquadrada no caput de forma genérica, deve persistir se houver enquadramento na nova redação de alguns dos incisos do referido art. 11 da Lei 8.429/92, de acordo com o princípio da continuidade típico-normativa. Precedente do STJ: EDcl no AgInt no AREsp 2.150.580/MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingos, Primeira Turma, DJe 17/06/2024. 12. Revogada a conduta prevista no art. 11, caput e incisos I e II, deve a conduta ser tipificada, s.m.j., no art. 11, V, da Lei 8.429/92, que prevê como ato ímprobo frustrar o caráter concorrencial de procedimento licitatório, na hipótese de constatada a ação dolosa. 13. No caso, apesar de existirem falhas na condução da Carta Convite 047/2002, tais fatos configuram, repita-se, meras irregularidades formais, as quais, por si só, não configuram ato de improbidade administrativa, pois ausente o elemento subjetivo dolo específico. 14. A caracterização do dano moral coletivo reclama prova inequívoca do abalo moral causado pela lesão configurada, este abalo não pode ser presumido. Não basta a mera suposição de que houve frustração da coletividade em razão da lesão aos cofres públicos. Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio TRF1: REO 0002324-80.2001.4.01.4100, JUÍZA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA (Conv.), SEXTA TURMA, e-DJF1 26/11/2020 e AC 0001891-19.2004.4.01.3600, JUIZ FEDERAL TOURINHO NETO, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 09/10/2009 PAG 291. 15. Apelação do MPF a que se nega provimento. A C Ó R D Ã O Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do MPF, nos termos do voto do relator. Brasília/DF, sessão virtual de 13 a 26 de maio de 2025. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES Relator
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10/06/2025 - Documento obtido via DJENAcórdão Baixar (PDF)