Processo nº 00033907620244058304
Número do Processo:
0003390-76.2024.4.05.8304
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF5
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
20ª Vara Federal PE
Última atualização encontrada em
26 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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26/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 20ª Vara Federal PE | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELJUSTIÇA FEDERAL DA 5ª REGIÃO Processo Judicial Eletrônico 20ª VARA FEDERAL PE PROCESSO: 0003390-76.2024.4.05.8304 - PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: LINDINALVA MARIA DA SILVA REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ASSOCIACAO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL SENTENÇA – TIPO A 1 RELATÓRIO Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização por danos morais, proposta por LINDINALVA MARIA DA SILVA, em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) e da ASSOCIACAO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL (AAPEN). A parte autora alega a ocorrência de descontos indevidos em seu benefício previdenciário, no valor de R$ 26,40 a 28,24 mensais, decorrentes de um contrato que desconhece e que jamais firmou. A parte autora pleiteia a declaração de nulidade/inexistência dos negócios jurídicos, a repetição dos valores descontados em dobro, com fundamento no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), e a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O INSS, em sua contestação, alega ilegitimidade passiva, sustentando ser mero órgão pagador e que não possui ingerência sobre os descontos realizados por entidades como a AAPEN. Defende, ainda, a incompetência da Justiça Federal, em caso de sua exclusão do polo passivo, e a prescrição trienal para a pretensão de reparação civil. No mérito, aponta ausência de ato ilícito e de responsabilidade por parte da autarquia. Em sede de contestação, a ré,Associação dos Aposentados e Pensionistas Nacional, sustentou que não há relação de consumo a justificar a aplicação do CDC e requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita por ser associação sem fins lucrativos. Ainda, alegou inexistir danos morais já que os fatos narrados não passam de mero aborrecimento do cotidiano, bem como que fosse reconhecida a ausência do interesse de agir da parte autora. Por fim, requereu a suspensão processual. A parte autora apresentou réplica, rebatendo os argumentos dos réus e reiterando os pedidos da inicial. Intimada para juntar aos autos o suposto contrato firmado com a parte autora, a associação ré permaneceu inerte. É o relatório. 2 FUNDAMENTAÇÃO 2.1 Da legitimidade passiva do INSS O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento consolidado no sentido de que o INSS possui legitimidade passiva em ações que tratam de descontos indevidos em benefícios previdenciários, ainda que decorrentes de contratos celebrados com entidades de representação, como associações e sindicatos. Isso ocorre porque cabe ao INSS verificar a regularidade dos descontos e garantir a proteção dos direitos do segurado, conforme estabelece a Lei nº 10.820/2003, art. 6º. No mais, tem-se que a legitimidade do INSS se dá de forma subsidiária, conforme decidiu a TNU no Tema 183, caso semelhante ao ora tratado. Sendo assim, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva do INSS. 2.2 Da incompetência da Justiça Federal A competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente demanda está mantida, haja vista que o INSS permanece no polo passivo da ação. Desse modo, também se rejeita a preliminar de incompetência. 2.3 Da prescrição trienal Sustenta a entidade autárquica que a parteautora pretende a anulação e restituição de descontos realizados há mais de três anos do ajuizamento desta ação. In casu, é evidente que se está diante de uma relação de consumo, uma vez que a promovente se enquadra perfeitamente na figura do consumidor, enquanto que o promovido é o fornecedor de produtos e serviços, segundo as definições insertas no Código de Defesa do Consumidor (arts. 2º e 3º). Deve, portanto, o feito ser analisado sob o prisma consumerista. Ora, é cediço que a prescrição é a extinção da ação judicial pelo decurso do lapso de tempo em decorrência da inércia do titular. Tal instituto é norteador de segurança jurídica, já que elide que as relações civis se perpetuem “ad eternun”. Neste ínterim, dispõe o artigo 27 do CDC, in verbis: “Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria”. Exsurge da natureza de trato sucessivo da relação jurídica em análise que o desconto supostamente indevido foi realizado de forma sucessiva no tempo, de maneira que a própria conduta supostamente ilegal protraiu-se no tempo, e não apenas os respectivos efeitos, de maneira a caracterizar a prescrição apenas das parcelas vencidas no lustro anterior à propositura da presente ação judicial (Súmula nº 85 do STJ). No caso dos autos, os descontos iniciaram em outubro/2023 (id. 58525068). Assim, não há o que se falar em prescrição. 2.4 Do interesse de agir Do mesmo modo, não merece prosperar a preliminar de ausência de interesse de agir suscitada pela associação demandada. Isso porque, no Brasil, prevalece o modelo da jurisdição única, conforme disposto no inciso XXXV do art. 5º da CF/88, podendo o detentor do direito pleiteá-lo diretamente junto ao Poder Judiciário, salvo restritas exceções legais. Nessa linha de raciocínio, não sendo o prévio requerimento administrativo requisito para a propositura da ação em exame, a inobservância deste fato não impede sua solicitação na seara judicial. De mais a mais, embora a parte autora não tenha demonstrado haver impugnado o contrato administrativamente, em sua contestação a instituição financeira defendeu o mérito da demanda, não havendo falar, pois, em ausência de interesse de agir. 2.5 Da responsabilidade civil e dos descontos indevidos A responsabilidade civil objetiva dos réus decorre do fato de terem realizado descontos no benefício previdenciário da parte autora sem a devida autorização, conforme o art. 186 do Código Civil. Ressalta-se que, tanto o INSS quanto a AAPEN, não apresentaram qualquer documento que comprovasse a autorização da parte autora para a realização dos descontos. Tal ausência de prova faz presumir a veracidade das alegações da parte autora, uma vez que lhe seria impossível apresentar prova de fato negativo, qual seja, a inexistência de contrato. A responsabilidade civil objetiva do INSS encontra fundamento no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que adota a teoria do risco administrativo. Isso significa que, para configurar o dever de indenizar, basta que estejam presentes o dano, a ação (ou omissão) e o nexo causal, independentemente de dolo ou culpa. Portanto, resta configurado o ato ilícito, o dano (descontos realizados sem consentimento) e o nexo causal, sendo devida a condenação solidária dos réus à devolução dos valores descontados indevidamente e à reparação pelos danos morais causados. 2.6 Da repetição do indébito em dobro O art. 42, parágrafo único, do CDC estabelece que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, salvo engano justificável. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a repetição em dobro não exige a comprovação de má-fé do fornecedor, bastando a violação à boa-fé objetiva. Diante disso, é cabível a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da parte autora, corrigidos monetariamente a partir de cada desconto e acrescidos de juros legais desde a citação. 2.7 Dos danos morais No caso, tenho como violados os direitos da personalidade da parte autora. Os descontos indevidos realizados no benefício previdenciário, de natureza alimentar, geram o dano moral in re ipsa, uma vez que configuram violação à dignidade e à segurança financeira do segurado. A fixação do valor da indenização deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como o caráter punitivo e pedagógico da medida. No presente caso, considerando as circunstâncias do caso concreto e a finalidade da indenização, entendo que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) se mostra adequado e suficiente para reparar o dano moral sofrido pela parte autora. 3 DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido da parte autora para: a) declarar a nulidade dos descontos realizados em seu benefício previdenciário pelo INSS a favor da AAPEN; b) determinar que o INSS proceda com a imediata suspensão dos descontos, caso ainda não tenha realizado. c) condenar a AAPEN e o INSS, este de forma subsidiária, a restituir à parte autora o valor correspondente ao dobro dos valores indevidamente descontados, corrigidos monetariamente a partir de cada desconto e acrescidos de juros legais desde a citação; d) condenar a AAPEN e o INSS, de forma subsidiária, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigidos monetariamente a partir desta sentença e acrescidos de juros legais desde a citação. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/1995. Publique-se. Registre-se. Intimem-se 20ª Vara Federal SJPE (Documento assinado e datado digitalmente)