C. D. C. D. R. C. e outros x G. D. S. e outros
Número do Processo:
0003780-84.2021.8.17.3130
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPE
Classe:
APELAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau
Última atualização encontrada em
28 de
abril
de 2025.
Intimações e Editais
-
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28/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau | Classe: APELAçãO CíVELTribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau RECURSO ESPECIAL NA APELAÇÃO CÍVEL N° 0003780-84.2021.8.17.3130 RECORRENTE: M. D. S. M. E OUTROS RECORRIDO(A): G. D. S. DECISÃO Trata-se de recurso especial (ID 43333190), interposto com fundamento no artigo 105, III, “a”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido em apelação cível. Consta na ementa do acórdão vergastado (ID 41631463): EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA POST MORTEM. LEGITIMIDADE ATIVA DO APELADO. TEORIA DA ASSERÇÃO. RECONHECIMENTO DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PROVA TESTEMUNHAL E DOCUMENTAL. POSSE DE ESTADO DE FILHO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A legitimidade ativa do apelado para postular o reconhecimento de maternidade socioafetiva post mortem é analisada sob a ótica da teoria da asserção, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. A condição de filho afetivo alegada pelo apelado na petição inicial é suficiente para conferir-lhe legitimidade para propor a demanda. Precedente: STJ - AgInt no AREsp 1903607/ES. 2. O reconhecimento da maternidade socioafetiva post mortem é admitido no ordenamento jurídico, conforme o artigo 1.593 do Código Civil e precedentes dos tribunais superiores, incluindo a tese de multiparentalidade fixada pelo Supremo Tribunal Federal (RE 898.060). A posse de estado de filho, demonstrada por prova testemunhal e documental, confere ao apelado os mesmos direitos decorrentes da filiação biológica. 3. O apelado apresentou provas substanciais que evidenciam a posse de estado de filho, caracterizada pelo trato, nome e reputação, consolidando a relação socioafetiva com a falecida. Provas documentais, como a certidão de nascimento e depoimentos de testemunhas, corroboram o vínculo materno-filial. 4. Diante da comprovação da maternidade socioafetiva e da ausência de elementos que infirmem as conclusões da sentença de primeiro grau, o pleito recursal não merece acolhimento. Recurso desprovido. Em suas razões recursais (ID 43978476), a parte recorrente alega violação ao art. 1.605, do Código Civil, bem como à Lei nº 10.406/02, ante a inexistência de qualquer vínculo parentesco entre a genitora dos recorrentes e o recorrido e ausência de documentos acostados aos autos que comprovem a filiação socioafetiva alegada. Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso especial. Contrarrazões não apresentadas (ID 45785370). É o essencial a relatar. Decido. O recurso excepcional em análise atende aos requisitos recursais atinentes à representação processual válida (ID 32080149), a tempestividade e preparo dispensado, ante o deferimento do benefício da justiça gratuita (ID 32080960). APLICAÇÃO DA SÚMULA 284 DO STF Da leitura do recurso interposto, observa-se que a pretensão encontra óbice no enunciado nº 284 da Súmula do STF, aplicável por analogia, o qual estabelece: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”. Compete ao recorrente, sob pena de inadmissão do recurso especial, evidenciar o desacerto da decisão recorrida, demonstrar adequadamente as razões pelas quais sustenta ofensa à norma e, ainda, apontar qual seria a correta interpretação, não bastando a singela declaração de que o acórdão recorrido teria violado o art. 1.605, do Código Civil, bem como a Lei nº 10.406/02, sem demonstrar de maneira pormenorizada a efetiva contrariedade. O recurso especial é de fundamentação vinculada. Nele, não basta a simples alusão ao dispositivo, desacompanhada da necessária argumentação que sustente a indigitada ofensa a lei federal. A insurgência demanda apontar em que consiste a negativa de vigência da lei e qual seria sua correta interpretação ao caso. A deficiência na fundamentação recursal inviabiliza a abertura da instância extraordinária, porquanto não permite a exata compreensão da controvérsia. Nesse sentido, colaciono jurisprudência do STJ: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA CARDÍACA. RECUSA INDEVIDA. INDENIZAÇÃO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA Nº 284/STF. VALOR. DANOS MORAIS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Na hipótese, inviável rever o entendimento firmado pelas instâncias ordinárias sem a análise dos fatos e das provas da causa, o que atrai a incidência da Súmula nº 7/STJ. 2. É inadmissível o inconformismo por deficiência na sua fundamentação quando o recurso especial deixa de indicar especificamente de que forma os dispositivos legais teriam sido violados. Aplicação, por analogia, da Súmula nº 284/STF. (...) 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2253965 MA 2022/0369871-9, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 15/04/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/04/2024) (grifos e omissões nossas) DA APLICAÇÃO DAS SÚMULAS N° 7 E N° 83 DO STJ Observo ainda que, quanto às supostas infringências, o órgão fracionário deste Tribunal conferiu resolução à lide com base na análise dos fatos e provas coligidos aos autos o que encontra óbice no Enunciado nº 7 da Súmula do STJ, o qual estabelece: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial”. Isto porque constato, no voto condutor do acórdão recorrido, que o magistrado pontuou que: “O reconhecimento da maternidade socioafetiva post mortem é uma modalidade de parentesco civil, conforme disposto no art. 1.593 do Código Civil, que admite o parentesco não apenas pela consanguinidade, mas também por outras origens, incluindo a afetiva. Este entendimento é amplamente aceito nos tribunais superiores, conforme exposto pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 898.060, que fixou a importante tese jurídica da multiparentalidade, permitindo a coexistência da filiação biológica e socioafetiva: Recurso Extraordinário. Repercussão Geral reconhecida. Direito Civil e Constitucional. Conflito entre paternidades socioafetiva e biológica. Paradigma do casamento. Superação pela Constituição de 1988. Eixo central do Direito de Família: deslocamento para o plano constitucional. Sobreprincípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CRFB). Superação de óbices legais ao pleno desenvolvimento das famílias. Direito à busca da felicidade. Princípio constitucional implícito. Indivíduo como centro do ordenamento jurídicopolítico. Impossibilidade de redução das realidades familiares a modelos pré-concebidos. Atipicidade constitucional do conceito de entidades familiares. União estável (art. 226, § 3º, CRFB) e família monoparental (art. 226, § 4º, CRFB).Vedação à discriminação e hierarquização entre espécies de filiação (art. 227, § 6º, CRFB). Parentalidade presuntiva, biológica ou afetiva. Necessidade de tutela jurídica ampla. Multiplicidade de vínculos parentais. Reconhecimento concomitante. Possibilidade. Pluriparentalidade. Princípio da paternidade responsável (art. 226, § 7º, CRFB). (...) A compreensão jurídica cosmopolita das famílias exige a ampliação da tutela normativa a todas as formas pelas quais a parentalidade pode se manifestar, a saber: (i) pela presunção decorrente do casamento ou outras hipóteses legais, (ii) pela descendência biológica ou (iii) pela afetividade. (...) 12. A afetividade enquanto critério, por sua vez, gozava de aplicação por doutrina e jurisprudência desde o Código Civil de 1916 para evitar situações de extrema injustiça, reconhecendo-se a posse do estado de filho, e consequentemente o vínculo parental, em favor daquele utilizasse o nome da família (nominatio), fosse tratado como filho pelo pai (tractatio) e gozasse do reconhecimento da sua condição de descendente pela comunidade (reputatio). 13. A paternidade responsável, enunciada expressamente no art. 226, § 7º, da Constituição, na perspectiva da dignidade humana e da busca pela felicidade, impõe o acolhimento, no espectro legal, tanto dos vínculos de filiação construídos pela relação afetiva entre os envolvidos, quanto daqueles originados da ascendência biológica, sem que seja necessário decidir entre um ou outro vínculo quando o melhor interesse do descendente for o reconhecimento jurídico de ambos. 14. A pluriparentalidade, no Direito Comparado, pode ser exemplificada pelo conceito de “dupla paternidade” (dual paternity), construído pela Suprema Corte do Estado da Louisiana, EUA, desde a década de 1980 para atender, ao mesmo tempo, ao melhor interesse da criança e ao direito do genitor à declaração da paternidade. Doutrina. 15. Os arranjos familiares alheios à regulação estatal, por omissão, não podem restar ao desabrigo da proteção a situações de pluriparentalidade, por isso que merecem tutela jurídica concomitante, para todos os fins de direito, os vínculos parentais de origem afetiva e biológica, a fim de prover a mais completa e adequada tutela aos sujeitos envolvidos, ante os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da paternidade responsável (art. 226, § 7º). 16. Recurso Extraordinário a que se nega provimento, fixando-se a seguinte tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”. (STF - RE: 898060 SC, Relator: LUIZ FUX, Data de Julgamento: 21/09/2016, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 24/08/2017) grifos nossos No presente caso, o apelado apresentou provas substanciais que demonstram de forma inequívoca a existência de um vínculo materno-filial entre ele e Rosa J. M., o que foi corroborado por documentos, como a certidão de nascimento e, especialmente registros escolares, além de depoimentos testemunhais importantes como o da professora do ensino infantil do apelado e de uma idosa que acompanhou todo o desenvolvimento dos fatos. As provas constantes dos autos demonstram que Rosa Josefa promoveu o registro de nascimento de Gilmar, declarando serem os pais desconhecidos e ter a criança “nascido” em frente à sua casa. O que se percebe é que o recorrido foi por Rosa criando como filho desde a tenra idade, o que configura a chamada posse de estado de filho, caracterizada pelos elementos do tractatus (quando a pessoa é criada, educada e tratada como filho), sendo ainda reconhecido pela sociedade como membro da família (reputatio). Neste sentido, a doutrina de Maria Berenice Dias[1] e as decisões do Superior Tribunal de Justiça[2] confirmam que a posse de estado de filho, quando demonstrada, confere à filiação socioafetiva os mesmos direitos e qualificações da filiação biológica, sem a necessidade de formalização de uma adoção.” (grifos nossos) Consignou ainda que: “[...] no presente caso, a relação afetiva entre a falecida e o apelado foi reconhecida, independentemente de manifestação formal do desejo de adoção. Por fim, o Ministério Público, em seu parecer, opinou pelo desprovimento do recurso, com base nas provas testemunhais e documentais que confirmam a relação socioafetiva entre o apelado e a falecida. O parecer do MP destaca, ainda, que a ausência de uma manifestação formal da falecida em vida não descaracteriza o vínculo afetivo, uma vez que as provas testemunhais são unânimes em demonstrar que o apelado sempre foi tratado como filho pela falecida. Assim, diante do exposto, fica claro que o apelado comprovou a existência de laços afetivos profundos e duradouros com a falecida Rosa J. M., que ultrapassam o vínculo biológico e conferem-lhe o direito de ser reconhecido como filho, com todos os direitos decorrentes dessa filiação, inclusive no âmbito sucessório.” (grifos e omissões nossos) É notório que a reanálise de tais questões demandaria uma nova apreciação de aspectos de caráter fático-probatório já exaustivamente analisados e discutidos pelo órgão julgador, desígnio do qual não se cogita em sede de recurso especial. Saliento ainda, encontrar-se o acórdão proferido em consonância com a jurisprudência do STJ, motivo pelo qual é de rigor a aplicação do Enunciado nº 83, da Súmula do STJ[1]. Veja-se: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE REGISTRO CIVIL CUMULADA COM NEGATÓRIA DE PATERNIDADE E MATERNIDADE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. RECONHECIMENTO, PELO TRIBUNAL DE ORIGEM, DA CONSOLIDAÇÃO DOS LAÇOS FAMILIARES. INCONFORMISMO DOS AUTORES. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. FUNDAMENTO AUTÔNOMO DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO IMPUGNADO NO RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 283/STF. AGRAVO DESPROVIDO. [...] 3. Não se questiona, nos dias atuais, a relevância jurídica das relações de afeto na formação de vínculos familiares. Tanto a doutrina como a jurisprudência, em consonância com os princípios da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002, já reconheceram a socioafetividade como princípio basilar das relações familiares e fonte de consolidação de vínculos de parentesco. 4. O egrégio Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico de repercussão geral ( RE 898.060/SC), reconheceu o valor jurídico da afetividade para a constituição de vínculos de parentesco, admitindo, inclusive, a coexistência da paternidade socioafetiva com a biológica (multiparentalidade) . 5. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1526268 RJ 2014/0258192-0, Data de Julgamento: 28/02/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/03/2023) (grifos e omissões nossos) Com tais considerações, e fundamento no art. 1030, V, do CPC, inadmito o presente recurso especial. Intimem-se, observando eventual pedido de intimação exclusiva. Recife, data da certificação digital Des. Fausto Campos 1º Vice-presidente [1] Súmula 83/STJ: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.
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28/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau | Classe: APELAçãO CíVELTribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau RECURSO ESPECIAL NA APELAÇÃO CÍVEL N° 0003780-84.2021.8.17.3130 RECORRENTE: M. D. S. M. E OUTROS RECORRIDO(A): G. D. S. DECISÃO Trata-se de recurso especial (ID 43333190), interposto com fundamento no artigo 105, III, “a”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido em apelação cível. Consta na ementa do acórdão vergastado (ID 41631463): EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA POST MORTEM. LEGITIMIDADE ATIVA DO APELADO. TEORIA DA ASSERÇÃO. RECONHECIMENTO DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PROVA TESTEMUNHAL E DOCUMENTAL. POSSE DE ESTADO DE FILHO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A legitimidade ativa do apelado para postular o reconhecimento de maternidade socioafetiva post mortem é analisada sob a ótica da teoria da asserção, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. A condição de filho afetivo alegada pelo apelado na petição inicial é suficiente para conferir-lhe legitimidade para propor a demanda. Precedente: STJ - AgInt no AREsp 1903607/ES. 2. O reconhecimento da maternidade socioafetiva post mortem é admitido no ordenamento jurídico, conforme o artigo 1.593 do Código Civil e precedentes dos tribunais superiores, incluindo a tese de multiparentalidade fixada pelo Supremo Tribunal Federal (RE 898.060). A posse de estado de filho, demonstrada por prova testemunhal e documental, confere ao apelado os mesmos direitos decorrentes da filiação biológica. 3. O apelado apresentou provas substanciais que evidenciam a posse de estado de filho, caracterizada pelo trato, nome e reputação, consolidando a relação socioafetiva com a falecida. Provas documentais, como a certidão de nascimento e depoimentos de testemunhas, corroboram o vínculo materno-filial. 4. Diante da comprovação da maternidade socioafetiva e da ausência de elementos que infirmem as conclusões da sentença de primeiro grau, o pleito recursal não merece acolhimento. Recurso desprovido. Em suas razões recursais (ID 43978476), a parte recorrente alega violação ao art. 1.605, do Código Civil, bem como à Lei nº 10.406/02, ante a inexistência de qualquer vínculo parentesco entre a genitora dos recorrentes e o recorrido e ausência de documentos acostados aos autos que comprovem a filiação socioafetiva alegada. Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso especial. Contrarrazões não apresentadas (ID 45785370). É o essencial a relatar. Decido. O recurso excepcional em análise atende aos requisitos recursais atinentes à representação processual válida (ID 32080149), a tempestividade e preparo dispensado, ante o deferimento do benefício da justiça gratuita (ID 32080960). APLICAÇÃO DA SÚMULA 284 DO STF Da leitura do recurso interposto, observa-se que a pretensão encontra óbice no enunciado nº 284 da Súmula do STF, aplicável por analogia, o qual estabelece: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”. Compete ao recorrente, sob pena de inadmissão do recurso especial, evidenciar o desacerto da decisão recorrida, demonstrar adequadamente as razões pelas quais sustenta ofensa à norma e, ainda, apontar qual seria a correta interpretação, não bastando a singela declaração de que o acórdão recorrido teria violado o art. 1.605, do Código Civil, bem como a Lei nº 10.406/02, sem demonstrar de maneira pormenorizada a efetiva contrariedade. O recurso especial é de fundamentação vinculada. Nele, não basta a simples alusão ao dispositivo, desacompanhada da necessária argumentação que sustente a indigitada ofensa a lei federal. A insurgência demanda apontar em que consiste a negativa de vigência da lei e qual seria sua correta interpretação ao caso. A deficiência na fundamentação recursal inviabiliza a abertura da instância extraordinária, porquanto não permite a exata compreensão da controvérsia. Nesse sentido, colaciono jurisprudência do STJ: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA CARDÍACA. RECUSA INDEVIDA. INDENIZAÇÃO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA Nº 284/STF. VALOR. DANOS MORAIS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Na hipótese, inviável rever o entendimento firmado pelas instâncias ordinárias sem a análise dos fatos e das provas da causa, o que atrai a incidência da Súmula nº 7/STJ. 2. É inadmissível o inconformismo por deficiência na sua fundamentação quando o recurso especial deixa de indicar especificamente de que forma os dispositivos legais teriam sido violados. Aplicação, por analogia, da Súmula nº 284/STF. (...) 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2253965 MA 2022/0369871-9, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 15/04/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/04/2024) (grifos e omissões nossas) DA APLICAÇÃO DAS SÚMULAS N° 7 E N° 83 DO STJ Observo ainda que, quanto às supostas infringências, o órgão fracionário deste Tribunal conferiu resolução à lide com base na análise dos fatos e provas coligidos aos autos o que encontra óbice no Enunciado nº 7 da Súmula do STJ, o qual estabelece: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial”. Isto porque constato, no voto condutor do acórdão recorrido, que o magistrado pontuou que: “O reconhecimento da maternidade socioafetiva post mortem é uma modalidade de parentesco civil, conforme disposto no art. 1.593 do Código Civil, que admite o parentesco não apenas pela consanguinidade, mas também por outras origens, incluindo a afetiva. Este entendimento é amplamente aceito nos tribunais superiores, conforme exposto pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 898.060, que fixou a importante tese jurídica da multiparentalidade, permitindo a coexistência da filiação biológica e socioafetiva: Recurso Extraordinário. Repercussão Geral reconhecida. Direito Civil e Constitucional. Conflito entre paternidades socioafetiva e biológica. Paradigma do casamento. Superação pela Constituição de 1988. Eixo central do Direito de Família: deslocamento para o plano constitucional. Sobreprincípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CRFB). Superação de óbices legais ao pleno desenvolvimento das famílias. Direito à busca da felicidade. Princípio constitucional implícito. Indivíduo como centro do ordenamento jurídicopolítico. Impossibilidade de redução das realidades familiares a modelos pré-concebidos. Atipicidade constitucional do conceito de entidades familiares. União estável (art. 226, § 3º, CRFB) e família monoparental (art. 226, § 4º, CRFB).Vedação à discriminação e hierarquização entre espécies de filiação (art. 227, § 6º, CRFB). Parentalidade presuntiva, biológica ou afetiva. Necessidade de tutela jurídica ampla. Multiplicidade de vínculos parentais. Reconhecimento concomitante. Possibilidade. Pluriparentalidade. Princípio da paternidade responsável (art. 226, § 7º, CRFB). (...) A compreensão jurídica cosmopolita das famílias exige a ampliação da tutela normativa a todas as formas pelas quais a parentalidade pode se manifestar, a saber: (i) pela presunção decorrente do casamento ou outras hipóteses legais, (ii) pela descendência biológica ou (iii) pela afetividade. (...) 12. A afetividade enquanto critério, por sua vez, gozava de aplicação por doutrina e jurisprudência desde o Código Civil de 1916 para evitar situações de extrema injustiça, reconhecendo-se a posse do estado de filho, e consequentemente o vínculo parental, em favor daquele utilizasse o nome da família (nominatio), fosse tratado como filho pelo pai (tractatio) e gozasse do reconhecimento da sua condição de descendente pela comunidade (reputatio). 13. A paternidade responsável, enunciada expressamente no art. 226, § 7º, da Constituição, na perspectiva da dignidade humana e da busca pela felicidade, impõe o acolhimento, no espectro legal, tanto dos vínculos de filiação construídos pela relação afetiva entre os envolvidos, quanto daqueles originados da ascendência biológica, sem que seja necessário decidir entre um ou outro vínculo quando o melhor interesse do descendente for o reconhecimento jurídico de ambos. 14. A pluriparentalidade, no Direito Comparado, pode ser exemplificada pelo conceito de “dupla paternidade” (dual paternity), construído pela Suprema Corte do Estado da Louisiana, EUA, desde a década de 1980 para atender, ao mesmo tempo, ao melhor interesse da criança e ao direito do genitor à declaração da paternidade. Doutrina. 15. Os arranjos familiares alheios à regulação estatal, por omissão, não podem restar ao desabrigo da proteção a situações de pluriparentalidade, por isso que merecem tutela jurídica concomitante, para todos os fins de direito, os vínculos parentais de origem afetiva e biológica, a fim de prover a mais completa e adequada tutela aos sujeitos envolvidos, ante os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da paternidade responsável (art. 226, § 7º). 16. Recurso Extraordinário a que se nega provimento, fixando-se a seguinte tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”. (STF - RE: 898060 SC, Relator: LUIZ FUX, Data de Julgamento: 21/09/2016, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 24/08/2017) grifos nossos No presente caso, o apelado apresentou provas substanciais que demonstram de forma inequívoca a existência de um vínculo materno-filial entre ele e Rosa J. M., o que foi corroborado por documentos, como a certidão de nascimento e, especialmente registros escolares, além de depoimentos testemunhais importantes como o da professora do ensino infantil do apelado e de uma idosa que acompanhou todo o desenvolvimento dos fatos. As provas constantes dos autos demonstram que Rosa Josefa promoveu o registro de nascimento de Gilmar, declarando serem os pais desconhecidos e ter a criança “nascido” em frente à sua casa. O que se percebe é que o recorrido foi por Rosa criando como filho desde a tenra idade, o que configura a chamada posse de estado de filho, caracterizada pelos elementos do tractatus (quando a pessoa é criada, educada e tratada como filho), sendo ainda reconhecido pela sociedade como membro da família (reputatio). Neste sentido, a doutrina de Maria Berenice Dias[1] e as decisões do Superior Tribunal de Justiça[2] confirmam que a posse de estado de filho, quando demonstrada, confere à filiação socioafetiva os mesmos direitos e qualificações da filiação biológica, sem a necessidade de formalização de uma adoção.” (grifos nossos) Consignou ainda que: “[...] no presente caso, a relação afetiva entre a falecida e o apelado foi reconhecida, independentemente de manifestação formal do desejo de adoção. Por fim, o Ministério Público, em seu parecer, opinou pelo desprovimento do recurso, com base nas provas testemunhais e documentais que confirmam a relação socioafetiva entre o apelado e a falecida. O parecer do MP destaca, ainda, que a ausência de uma manifestação formal da falecida em vida não descaracteriza o vínculo afetivo, uma vez que as provas testemunhais são unânimes em demonstrar que o apelado sempre foi tratado como filho pela falecida. Assim, diante do exposto, fica claro que o apelado comprovou a existência de laços afetivos profundos e duradouros com a falecida Rosa J. M., que ultrapassam o vínculo biológico e conferem-lhe o direito de ser reconhecido como filho, com todos os direitos decorrentes dessa filiação, inclusive no âmbito sucessório.” (grifos e omissões nossos) É notório que a reanálise de tais questões demandaria uma nova apreciação de aspectos de caráter fático-probatório já exaustivamente analisados e discutidos pelo órgão julgador, desígnio do qual não se cogita em sede de recurso especial. Saliento ainda, encontrar-se o acórdão proferido em consonância com a jurisprudência do STJ, motivo pelo qual é de rigor a aplicação do Enunciado nº 83, da Súmula do STJ[1]. Veja-se: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE REGISTRO CIVIL CUMULADA COM NEGATÓRIA DE PATERNIDADE E MATERNIDADE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. RECONHECIMENTO, PELO TRIBUNAL DE ORIGEM, DA CONSOLIDAÇÃO DOS LAÇOS FAMILIARES. INCONFORMISMO DOS AUTORES. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. FUNDAMENTO AUTÔNOMO DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO IMPUGNADO NO RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 283/STF. AGRAVO DESPROVIDO. [...] 3. Não se questiona, nos dias atuais, a relevância jurídica das relações de afeto na formação de vínculos familiares. Tanto a doutrina como a jurisprudência, em consonância com os princípios da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002, já reconheceram a socioafetividade como princípio basilar das relações familiares e fonte de consolidação de vínculos de parentesco. 4. O egrégio Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico de repercussão geral ( RE 898.060/SC), reconheceu o valor jurídico da afetividade para a constituição de vínculos de parentesco, admitindo, inclusive, a coexistência da paternidade socioafetiva com a biológica (multiparentalidade) . 5. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1526268 RJ 2014/0258192-0, Data de Julgamento: 28/02/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/03/2023) (grifos e omissões nossos) Com tais considerações, e fundamento no art. 1030, V, do CPC, inadmito o presente recurso especial. Intimem-se, observando eventual pedido de intimação exclusiva. Recife, data da certificação digital Des. Fausto Campos 1º Vice-presidente [1] Súmula 83/STJ: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.