AUTOR | : THEO GUILHERME LAUFER |
ADVOGADO(A) | : THEO GUILHERME LAUFER (OAB TO012171) |
RÉU | : VICTOR DOURADO SANTANNA |
ADVOGADO(A) | : VICTOR DOURADO SANTANNA (OAB TO04701A) |
RÉU | : CECILIA AUGUSTO DE LIMA DOURADO SANTANA |
ADVOGADO(A) | : CECILIA AUGUSTO DE LIMA DOURADO SANTANA (OAB TO007813) |
SENTENÇA
Trata-se de QUEIXA-CRIME ajuizada por THEO GUILHERME LAUFER em face de VICTOR DOURADO SANTANA e CECÍLIA AUGUSTO DE LIMA DOURADO SANTANA, já qualificados nos autos, imputando-lhes a suposta prática do crime previsto no artigo 138, 139 e 140, todos do Código Penal (eventos 1 e 7).
Audiência de conciliação infrutífera (evento 57).
Queixa recebida em 28 de maio de 2025 (evento 59).
Regularmente citados, os querelantes apresentaram resposta à acusação (evento 68), arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade passiva da querelada CECÍLIA AUGUSTO, a inépcia da inicial e a ausência de justa causa para o exerício da ação penal. No mérito, pugna pela improcedência do pedido inicial.
O querelante, de seu turno, manifestou-se pela rejeição das preliminares (evento 77).
Vieram os autos.
É, em síntese, o relatório.
Decido.
De início, em homenagem ao princípio da primazia do mérito, nos termos do artigo 488, do Código de Processo Civil, aqui aplicado de forma subsidiária, julgo prejudicadas as preliminares suscitadas.
Conforme artigo 397, do Código de Processo Penal, o juiz absolverá sumariamente o réu quando manifesta a existência de qualquer causa excludente de ilicitude do fato ou de culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; o fato narrado evidentemente constitui crime; e evistência de causa que tenha o condão de extinguir a punibilidade do agente.
Consoante se infere, a queixa-crime imputa aos querelados a suposta prática do crime de calúnia, descrito no artigo 138, caput, do Código Penal.
De acordo com entendimento pacífico do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, para configuração do crime de calúnia, urge a imputação falsa a outrem de fato definido como crime. Ou seja, deve ser imputado um fato determinado, devidamente situado no tempo e no espaço, bem como tal fato deve ser definido como crime pela lei penal, além de a imputação ser falsa. Portanto, não configura calúnia, em sentido oposto, a alegação genérica de uma conduta eventualmente delitiva.
No presente caso, a queixa-crime imputa aos querelados o seguinte fato:
a) Pois bem, foi justamente nesse período que o ora Réu deu CONTINUIDADE em suas ações no sentido de dilapidar o patrimônio de seu genitor - inclusive por ostentar a qualidade de procurador do Autor-, sendo possível afirmar-se que tão logo a internação de seu Pai/Reclamado na UTI, o Réu se dirigiu a propriedade denominada FAZENDA SANTA MATILDE I, no Estado do Pará, encarretou e vendeu todo o gado lá existente, em torno de 100 (cem) reses, e uma vez confrontado pelo vaqueiro da Fazenda, teria dito: “Não se preocupe, desta meu Pai não escapa.”
De se ver que, pela descrição fática contida na exordial acusatória, não ficou demonstrada a imputação de um fato determinado, visto que as palavras referidas na peça processual fazem menção a uma conduta genérica, sem qualquer vinculação a um fato criminoso falso e determinado, praticados em determinadas condições de tempo e lugar.
O Superior Tribunal de Justiça possui diversos arestos sobre a temática dos crimes contra a honra, tanto em suas Turmas de competência criminal quanto na própria Corte Especial, cuja essência demonstra a necessidade de que a conduta e sua descrição apontem elementos concretos e detalhados, para que se caracterize, efetivamente, um delito contra a honra punível nos termos do Código Penal (APn n. 990/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/9/2022, DJe de 7/10/2022.).
Nesse sentido, o seguinte julgado:
PROCESSUAL PENAL. QUEIXA-CRIME. DELITOS CONTRA A HONRA. GOVERNADOR DE ESTADO. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. CALÚNIA E DIFAMAÇÃO. AUSÊNCIA DAS ELEMENTARES OBJETIVAS DO TIPO. INJÚRIA. JUSTA CAUSA NÃO CARACTERIZADA. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA.
1. Queixa-crime na qual se imputa a Governador de Estado a suposta prática dos crimes tipificados nos arts. 138, caput (calúnia), 139, caput (difamação) e 140, caput (injúria), na forma dos arts. 71, caput e 141, III, IV e § 2°, todos do Código Penal.
2. Delitos de calúnia e de difamação não configurados, já que não houve, por parte do querelado, a atribuição de fatos certos e determinados, praticados em determinadas condições de tempo e lugar.
3. A imputação de eventual prática de injúria, principalmente na seara pública, deve ser analisada de forma contextualizada.
4. O jogo político, no Estado de Direito, sujeita as pessoas que exercem ou tenham exercido cargos públicos de natureza política a suportarem maior exposição em certos aspectos, bem como a tolerarem opiniões, ainda que ásperas e rigorosas, quanto à sua atuação na condução da coisa pública. Atipicidade da conduta.
5. À luz do princípio da intervenção mínima, o Direito Penal deve ser adotado como ultima ratio, de forma subsidiária aos demais ramos do Direito.
6. Preliminares afastadas e queixa-crime rejeitada, nos termos do art. 395, I, II e III, do CPP.
(QC n. 11/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 2/10/2024, DJe de 8/10/2024.)
Lado outro, a conduta delineada na queixa-crime melhor se amolda, em tese, ao crime de injúria, já que as assertivas genéricas não consideram fatos específicos, mas simplesmente se referem a afirmações vagas e imprecisas feitas à pessoa do querelante.
Nessa linha de intelecção, colhe-se da doutrina de GUILHERME DE SOUZA NUCCI: “10. Atribuição de fato: costuma confundir-se um mero xingamento com uma calúnia. Dizer que uma pessoa é “estelionatária”, ainda que falso, não significa estar havendo uma calúnia, mas sim uma injúria. (...)” (in, Código penal comentado. 15. ed. rev. atual. e ampl. Forense: Rio de Janeiro, 2015. p. 789).
Desse modo, nos termos do artigo 383, do Código de Processo Penal, sem modificar a descrição fática contida na queixa, tem-se que a conduta ora narrada configura, em tese, crime previsto no artigo 140, caput, do Código Penal.
Além disso, a queixa-crime também narra os seguintes fatos:
a) Em resumo, o Autor por gozar de boa condição financeira propiciou TODO o conforto a seus filhos por anos, e o faz, ainda hoje, via de inúmeras comprovações de seu desprendimento financeiro e auxílio moral para com seus filhos. Prova disso é que o seu primogênito, ora Réu, somente após mais de 15 anos resolveu a trabalhar (agora como advogado), a filha Luísa cursa a Faculdade de Medicina e a caçula (Marcela) é graduada em Odontologia, sendo oportuno destacar que ambos foram graduados ou cursam instituições de ensino superior de natureza PRIVADA, tudo custeado pelo ora Autor.
b) Deve ser pontuado que em razão de inúmeros problemas de ordem pessoal o Autor, há anos, sofre de um quadro de profunda depressão, razão pela qual é, frequentemente, submetido a tratamentos e ingestão de medicamentos controlados, como será demonstrado no curso da presente instrução processual, sendo certo, que tal condição se agravou com a odiosa conduta perpetrada pelo ora Réu. Enfim, Excelência, mesmo sendo um profissional de conduta ilibada e gozando de grande prestígio, o ora Autor, padece, por décadas, com a postura de seu filho, ora Réu, como se verá adiante.
c) Como visto em linhas pretéritas, o ora Réu é o primogênito e o único filho homem do Autor. Pode-se dizer que o Réu nasceu em “berço de ouro”, posto que ainda bebê o seu genitor, ora Autor, já era um profissional de sucesso na medicina. Assim, o Réu desde a mais tenra idade sempre gozou de todos os prazeres e comodidades que o dinheiro pode prover, inclusive, com destacado luxo e acesso a todos os bens materiais, muito acima do padrão médio do cidadão brasileiro, inclusive na moradia DE LUXO, onde sempre habitou até junho de 2020. Talvez em razão disso e acostumado a boa vida, o ora Réu, mesmo sendo bacharel em Direito - graduação esta que levou em torno de 10 (dez) anos para concluir -, somente em 2023 parece ter começado alguma atividade remunerada, dedicando-se, com contumácia ao ócio.
d) A afirmação acima de que o Réu NUNCA exerceu nenhuma atividade remunerada, deve ser excetuada, pelo arremedo da suposta relação trabalhista que o mesmo afirmou manter com o Autor, contudo, prontamente, rechaçada pela Justiça do Trabalho, conforme será demonstrado alhures. Nesse ponto, deve ser dito que o Autor, ERROU, pois após inúmeras tentativas de impulsionar/aguçar o ora Réu a assumir uma postura responsável e BUSCAR UMA OCUPAÇÃO, se viu obrigado a incentivar, mais uma vez seu filho, ora Réu, via da noticiada contratação para que o mesmo o auxiliasse na administração de seus imóveis rurais, outorgando-lhe, inclusive, instrumento de procuração com amplos poderes, para gerir também vultuosa quantia em seu nome. Contudo, tal iniciativa se revelou um grande erro, pois o ora Réu, em momento algum, revelou aptidão, interesse ou mesmo motivação pela condução do negócio. Sob esse aspecto deve ser dito que além dos costumeiros prejuízos em desfavor do Autor, o Réu, na prática, pouco auxiliou o Autor, e quando o fez sempre de maneira interessada em se beneficiar do patrimônio de seu Pai, em detrimento das outras herdeiras, ou seja, suas irmãs.
e) Tal situação se agravou com a conclusão do Inventário de Bens da Sr. Tasir, mãe do Réu, e esposa do Autor, pois como se vê dos autos n° 5000067-32.2005.827.2731 que tramitou perante a Vara de Família da Comarca de Paraíso do Tocantins/TO, o ora Reclamante amealhou uma substancial quantia financeira, representada por um imóvel de alto padrão localizado na Rua Tiradentes, 460, Setor Serrano, Paraíso do Tocantins/TO, uma vez que o ora Reclamante permaneceu residindo no dito imóvel até junho de 2020, porém com todas as despesas (energia, agua, impostos, funcionários, piscineiro, jardineiro, etc) custeadas pelo Autor. Ou seja, o fato é que o Réu sempre viveu de forma NABABESCA, as expensas de seu genitor, ora Pai/Autor. Contudo, o que está ruim pode piorar!!! Enfim, Excelência, como será provado, oportunamente, o Réu sempre se entregou a inércia em razão da boa vontade do PAI/Reclamado e da condição financeira deste.
No presente caso, segundo a inicial acusatória, as palavras consideradas ofensivas foram proferidas no processo n.º número 0002870-43.2023.8.27.2731, evento 20.
Conforme artigo 142, inciso I, do Código Penal, não constitui delito de difamação e injúria a ofensa irrogada na discussão da causa, seja pela parte ou por seu procurador.
Na hipótese vertente, trata-se de contestação em processo cível (Ação de Exigir Contas), proposta pelo pai do querelante - JOSÉ GUILHERME LAUFER.
De se ver que as expressões tidas por ofensivas, e que serviram como supedâneo à pretensão punitiva, foram irrogadas em juízo e estão, inquestionavelmente, relacionadas com a causa em discussão, encontrando-se, assim, amparadas pela imunidade judiciária.
A jurisprudência não diverge:
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - QUEIXA-CRIME - CRIMES DE INJÚRIA, CALÚNIA, DIFAMAÇÃO - AUSÊNCIA DE PROVA DA PRÁTICA DOS DELITOS - IMUNIDADE PROFISSIONAL - CRIME DE INJÚRIA - PRESCRITO - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Para que se configure a calúnia é necessário que a se saiba que a imputação feita é falsa, o que não restou configurado nos presentes autos já que há indícios de que possa ter, de fato, ocorrido um crime. 2. os querelados/apelados, embora tenham narrado fatos ofensivos ao querelante/apelante, o fizeram na petição de contestação, no exercício da profissão de advogados, desse modo, estão acobertados pela imunidade profissional nos termos do art. 142, I do CPB. (TJMG - Apelação Criminal 1.0344.08.046122-3/001, Relator(a): Des.(a) Walter Luiz , 1ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 01/07/2014, publicação da súmula em 11/07/2014)
Ante o exposto, com fundamento no artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal, ABSOLVO SUMARIAMENTE os querelados VICTOR DOURADO SANTANA e CECÍLIA AUGUSTO DE LIMA DOURADO SANTANA, já qualificados nos autos, nos termos do artigo 142, inciso I, do Código Penal.
Custas e despesas processuais pelo querelante.
Consectariamente, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, c.c. artigo 3° do Código de Processo Penal, condeno a parte querelante ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em favor do advogado dos querelados, considerado o parâmetro da tabela da OAB e a complexidade da causa (STF, PET 7417 AGR/DF.
Transitada em julgado, ARQUIVE-SE.
Registre-se. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se.
Paraíso do Tocantins, em data certificada pelo sistema.