Processo nº 00060567520234058307
Número do Processo:
0006056-75.2023.4.05.8307
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF5
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
26ª Vara Federal PE
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 26ª Vara Federal PE | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU DA 5ª REGIÃO Seção Judiciária de Pernambuco – 26ª Vara Federal – Palmares Quilombo dos Palmares, 555 – Centro – Palmares – Fone (81) 3364 5000 E-mail:direcao26@jfpe.jus.br Processo Nº 0006056-75.2023.4.05.8307 AUTOR: JOSENILTON CAITANO LOUREIRO REU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF SENTENÇA Dispensado o relatório nos termos do art. 38 da Lei nº9.099/95, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais, a teor do preceituado no art. 1º da Lei nº10.259/01. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação proposta por JOSENILTON CAITANO LOUREIRO em face da CEF, objetivando a condenação da ré a reparação de danos materiais e morais em virtude de defeitos construtivos em imóvel adquirido no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida. Requereu, ademais, o pagamento de alugueis pelo período necessário de afastamento do imóvel enquanto durarem as obras de reparação e o ressarcimento de gastos com assistente técnico. Inicialmente, cabe destacar que a autora comprovou a condição de mutuária, no âmbito da “Faixa 1” do PMCMV, através do documento contido no id. 30372964, notificação da CEF para ocupação do imóvel no prazo de trinta dias. De acordo com o documento, o contrato da autora possui o n. 171001062922, sendo o objeto a casa situada na Rua Projetada, 46 4, P3, Q22, CS 04, Palmares/PE. Destaco, neste momento, que diversas questões preliminares ao mérito foram enfrentadas na decisão que promoveu o saneamento e organização do processo (id. 33640546). Desta forma, restaram resolvidas as questões atinentes à legitimidade passiva da CEF, inépcia da petição inicial, interesse processual e denunciação da lide à construtora do empreendimento. Devem ser apreciadas, nesta sentença, as questões relativas à prescrição e decadência. Observo que a demanda veicula pretensão indenizatória. Assim, incide na espécie o prazo de prescrição decenal, previsto no art. 205 do CC, o qual não restou transcorrido entre a entrega dos imóveis, entre os meses finais de 2013 e início de 2014 e o ajuizamento da ação. Vale ressaltar que a questão relativa à natureza (se decadencial ou prescricional) e quantidade do prazo aplicável às ações condenatórias fundamentadas em vícios de construção de imóvel submetido ao CDC já foi enfrentada pelo STJ, tendo a Corte assim decidido: "DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. AUSÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. DEFEITOS APARENTES DA OBRA. METRAGEM A MENOR. PRAZO DECADENCIAL. INAPLICABILIDADE. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. SUJEIÇÃO À PRESCRIÇÃO. PRAZO DECENAL. ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. 1. O propósito recursal é o afastamento da prejudicial de decadência em relação à pretensão de indenização por vícios de qualidade e quantidade no imóvel adquirido pelos consumidores. 2. É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC). 3. No referido prazo decadencial, pode o consumidor exigir qualquer das alternativas previstas no art. 20 do CDC, a saber: a reexecução dos serviços, a restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço. Cuida-se de verdadeiro direito potestativo do consumidor, cuja tutela se dá mediante as denominadas ações constitutivas, positivas ou negativas. 4. Quando, porém, a pretensão do consumidor é de natureza indenizatória (isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo decorrente dos vícios do imóvel) não há incidência de prazo decadencial. A ação, tipicamente condenatória, sujeita-se a prazo de prescrição. 5. À falta de prazo específico no CDC que regule a pretensão de indenização por inadimplemento contratual, deve incidir o prazo geral decenal previsto no art. 205 do CC/02, o qual corresponde ao prazo vintenário de que trata a Súmula 194/STJ, aprovada ainda na vigência do Código Civil de 1916 ("Prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor, indenização por defeitos na obra"). 6. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1717160/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 26/03/2018)” Rejeito, pois, as alegações de prescrição e decadência da CEF. Passo ao exame do mérito. No mérito, consigno que a apuração da responsabilidade civil em razão de dano, seja ele moral ou patrimonial, prende-se à existência dos seguintes requisitos: a ação ou omissão, o dano, e o nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão que o produziu. Convém destacar que o caso narrado, consoante já estabelecido no saneamento e organização do processo, se trata de relação sujeita ao microssistema do Código de Defesa do Consumidor, nos termos de seu artigo 3º, §2º, de modo a ensejar a responsabilidade objetiva do prestador de serviço em caso de vício, consoante o disposto no artigo 14, caput, da Lei nº 8078/90: "Art.3º §2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista". "Art. 14 - O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e risco". Em casos tais, portanto, as instituições financeiras sujeitam-se às normas do CDC e, para fins de responsabilização civil, suficiente a prova da ocorrência do fato danoso e o nexo causal em relação à conduta da instituição financeira, pois prescindível a discussão a respeito da culpa. A despeito do financiamento ser subsidiado com recursos do FAR, pagando os mutuários parcela pequena, ainda se trata de serviço bancário atraindo a incidência do CDC. Não houve, todavia, a inversão do ônus da prova nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, visto que a demora no ajuizamento da ação não indica a ocorrência de prescrição, mas a possibilidade de que não houvessem vícios construtivos, mas apenas desgastes naturais pelo uso do imóvel e modificações introduzidas pelos moradores ao arrepio das instruções recebidas quando da ocupação dos imóveis. No que tange aos vícios construtivos, existirão sempre que a desconformidade entre o oferecido e o entregue implicar em diminuição do valor ou funcionalidade do produto. Por sua vez, os defeitos são vícios mais graves, ou seja, que geram prejuízos ao consumidor. Vale mencionar que não há vício de construção em caso de a baixa qualidade não implicar em inadequação do uso do imóvel. Com efeito, não se pode olvidar de que, tratando-se de contratação de aquisição de imóvel de baixo valor, no caso, entre as menores faixas de financiamento habitacional, não é de se esperar um alto padrão de construção. Nesta toada, a baixa qualidade do material, por si só, não gera direito a reparação. Neste ponto, à vista das observações do parágrafo anterior e do conteúdo do laudo pericial (id. 71484844), a meu sentir, não restou demonstrado o dano extrapatrimonial alegado pela parte autora. Com efeito, o imóvel não apresenta condições insalubres que prejudiquem a habitabilidade. Sequer é necessária a desocupação para realização de reparações, o que conduz à improcedência do pedido de danos morais. O dano moral não advém, como verificado no caso, do mero descumprimento contratual de entregar o imóvel em condições perfeitas de uso sem que comprometida de maneira grave a vida da parte autora. Nada obstante, no campo material, o laudo foi conclusivo ao anotar que, “com base no estudo realizado na diligência pericial conclui-se que no imóvel vistoriado, pertencente a autora, existem vícios construtivos” (Num. 71484844- Pág. 22). Aprofundando o conteúdo do laudo pericial, na página 28, o perito é enfático ao informar o que segue: As manifestações patológicas encontradas na vistoria foram: “1. Pavimentação: Foi encontrado na vistoria o caimento do piso para o ralo completamente invertido ao recomendado pelo NBR 15753. 2. Impermeabilização: Foi encontrado em vistoria manchas de umidade em abundância no interior do imóvel. Indicando infiltrações devido à percolação da água e respingos das chuvas. 3. Instalações hidráulicas: Foi encontrado na vistoria que a distância do fundo do reservatório ao chuveiro não atende a unidade de 1 m.c.a., como recomendado na NBR 5626. Fazendo com que a pressão da água no interior do imóvel seja inferior à recomendada. 4. Instalações Sanitárias e pluviais: Durante a vistoria não foi encontrado nenhum dispositivo que capte e destine águas da chuva, conforme a recomendação da NBR 10844. 5. Instalações Elétricas: Na vistoria foi encontrado tomadas inadequadas ao uso, e supressão de dispositivos elétricos no quadro de energia, como o DR (utilizado para prevenção de fugas de corrente). Além de não existir nenhum circuito específico para os equipamentos utilizados na cozinha, o que também entra em desacordo com a NBR 5410. 6. Cobertura: Na vistoria foi encontrado um desgaste bem acentuado das madeiras e das telhas, com proliferação de fungos em alguns pontos. Além da projeção do telhado insuficiente às recomendadas. 7. Pintura: Em vistoria foi constatado que devido à presença da umidade acentuada, a pintura ficou bem prejudicada, necessitando ser refeita. 8. Revestimento: Em vistoria, foi constatado que o revestimento do piso, devido o assentamento em substrato não recomendado, deu causa ao desplacamento acelerado.”. Como se vê, o imóvel sob enfoque possui vícios ocultos e foi construído com materiais de vida útil muito baixa (vide quesito 02.20 da caixa). De fato, a CEF, a despeito de refutar veementemente, ao longo do processo, a existência dos vícios apontados no parecer juntado inicialmente pela parte autora, não trouxe documentos básicos que pudessem auxiliar o perito nos trabalhos de campo, inclusive demonstrando a boa execução da obra e a qualidade, dentro da expectativa legítima do valor do imóvel construído na “Faixa 1”, dos materiais empregados. Ao negligenciar tais aspectos de sua defesa, a CEF submete-se ao ônus de que a perícia no imóvel confirme os apontamentos da parte autora. Veja-se, por exemplo, que muitos dos defeitos constatados podem advir do mero decurso do tempo, mas a ausência de elementos técnicos contemporâneos da execução da obra, como o projeto do tipo de residência e os materiais empregados, não permitem trabalho aprofundado do perito. Tais documentos deveriam ser juntados aos autos pela CEF, a despeito do ônus dinâmico da prova. Isto é importante, uma vez que não se está no campo da dúvida sobre a existência dos vícios, conforme apontado pelo laudo pericial, mas sim da origem destes. Havendo dúvida, esta seria resolvida em favor da CEF, todavia, como o perito é expresso ao destacar a existência de vícios construtivos, deve ser realizada a reparação dos danos materiais verificados. A conclusão do laudo pericial poderia ser diferente, acaso juntados os documentos técnicos da obra pela CEF. Partindo da premissa da comprovação dos danos, enquanto produto de vícios de construção, bem como da necessidade de realizar “filtragem” das ocorrências listadas no laudo pericial como decorrentes do mero uso, decurso do tempo, ou emprego de material de menor qualidade, mas dentro do esperado para a faixa de preço do imóvel, não se pode acolher a tabela de custos do laudo pericial com DBI. Com efeito, a reparação, consoante requerido expressamente pela parte autora, deve ser realizada em pecúnia, sendo calculada conforme a tabela apresentada, sem Benefícios e Despesas Indiretas - BDI (id. Num. 71484844- Pág. 36). Tal custo (com BDI) apenas tem pertinência em relação a obras executadas por pessoas jurídicas, em especial para obras de grande monta, visto que presume despesas com administração da empresa, custos financeiros do contrato, seguros, garantia e tributação sobre a receita. Na hipótese, a reparação se destina à realização de obras pela própria parte autora, mediante livre contratação, sem BDI, portanto. Tratando-se de responsabilidade civil contratual, os juros de mora são devidos desde a citação da CEF, conforme índices do manual de cálculos da Justiça federal. A correção monetária deverá ocorrer a partir da data da tabela de custos apresentada pelo perito, pois já reflete os custos atuais dos reparos a serem executados. Analisando o laudo pericial, verifico que não houve participação de assistente técnico da parte autora e o parecer particular, inicialmente colacionado no id. 13953151, não é elemento indispensável à propositura da demanda. Não há, pois, que se falar em ressarcimento de gastos com assistente técnico, seja por pela parte autora, seja por parte da CEF. É importante registrar que, não obstante os argumentos apresentados pela CEF, buscando desqualificar a formação técnica do perito designado, foi esclarecido pelo expert (em diversos casos análogos, que tramitam neste Juizado) que “o trabalho foi realizado por equipe multidisciplinar com participação de Engenheiro Civil com mestrado, cursando doutorado, o Sr, Ianyqui Falcão Costa, CREA 181418520-8, o qual possui habilitação técnica com base no CONFEA/CRE”. Inclusive o Laudo foi também subscrito pelo referido perito assistente. A CAIXA, intimada após o laudo, alegou que o laudo está baseado em projeto arquitetônico do empreendimento errado (mas isso não desqualifica o que foi visto in loco, os vícios constatados); que não há “exigência de dispositivo de captação de águas pluviais” nos projetos (o que também não anula o problema da ausência de captação e destinação de águas pluviais); que seria impossível instalar rufos no imóvel, como proposto; que a execução do imóvel com paredes concreto impossibilita a utilização de alvenaria convencional. Indaga ainda se foi realizado ensaios de permeabilidade, resistência à flexão, absorção de água, dimensionalidade e planicidade ou cargas concentradas e para a estrutura de madeira (quando na verdade tais ensaios eram para terem sido apresentados pela própria CEF [quesito 03.40]). Ora, a tabela orçamentária não traz um script rigoroso, que deve ser seguido com o valor a ser levantado a título de dano material, mas, em verdade, estima tudo que deve ser reparado no imóvel periciado, sem vincular a forma ou o tipo de reparação a ser aplicado no imóvel. Por isso, entendo que tais colocações (elencadas no parágrafo anterior), traduzem apenas o caráter apelatório da impugnação ao laudo pericial. Outrossim, quanto à alegação de que vícios não foram alegados na petição inicial, extrapolando os limites da demanda, este também não merece acolhimento. Isso porque o laudo pericial judicial corroborou os vícios centrais levantados pelos autores, com fundamentação técnica ampliada e ancorada em normas da ABNT, confirmando a origem construtiva das patologias e reforçando o nexo causal. Assim, é patente que a perícia não criou novos pedidos, apenas deu robustez técnica à causa de pedir, o que é permitido e esperado em instrução probatória. É preciso ficar claro que, ainda que o imóvel sub judice tenha sido construído de acordo com o projeto elaborado e diretrizes estabelecidas no programa MCMV; o laudo pericial conduz ao entendimento de que seja por vícios dos próprios projetos ou por falhas na execução e supervisão da obra, o imóvel apresenta vícios que reduzem sua habitabilidade. As informações apontadas pelo perito judicial foram constatadas no próprio imóvel, cujo indigitado laudo faz referência expressa de cada ato normativo da ABNT que fora infringido. No que tange as impugnações da parte autora: não há que se falar em “quebra de imparcialidade do perito” ou "prova produzida unilateralmente”, pois é totalmente legal e troca de informações entre o profissional designado e as partes, sobretudo quando esta detém informações oficiais sobre o objeto do processo. Todos os elementos foram submetidos ao devido contraditório. As demais indagações da parte autora sobre “Sistema de Esgoto e Vasos Sanitários”, “Posicionamento da Caixa d'Água”, “Forro de PVC”, “Instalações Elétricas”, “Impermeabilização” e “Cobertura e Telhado”, também demonstram a sua irresignação com aquilo foi verificado no ato pericial; tratando-se, desta forma, de indagações retóricas, com caráter apelatório. Por fim, considerando a multiplicidade de ações análogas neste Juízo; fica desde já anotado que se as partes não concordam com a valoração da prova pericial ou, mormente a parte demandante, com o indeferimento do pedido de danos morais, deve ativar sua irresignação por meio de recurso de natureza apelatória. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos iniciais para, extinguindo o processo com resolução do mérito, condenar a CEF a reparar os danos materiais verificados no imóvel da “Rua Projetada, 46 4, P3, Q22, CS 04, Palmares/PE”, neste município, no valor de R$ 8.346,03 (conforme tabela pericial, sem BDI), incidindo juros de mora e correção monetária nos termos da fundamentação supra. Defiro o pedido de justiça gratuita constante na inicial, dada a presunção do art. 99, § 3º, do CPC. Sem custas nem honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. Por fim, considerando o aumento dos honorários custeados pela AJG promovido pela Resolução 937/2025/CJF, nos termos do art. 28, § 1º, da Resolução 305/2014/CJF – sopesados por ocasião da Decisão de saneamento do feito – retifico os honorários periciais para R$ 810,00 (oitocentos e dez reais). Intimações na forma da Lei nº 10.259/2001, no prazo de 10 dias. Palmares/PE, data da movimentação. Tarcísio Corrêa Monte Juiz Federal 26ª Vara Federal SJPE FRD