Paulo Cesar Souza Dias x Azul Linhas Aereas Brasileiras S/A e outros
Número do Processo:
0007197-06.2021.8.19.0021
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRJ
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Comarca de Duque de Caxias- Cartório da 3ª Vara Cível
Última atualização encontrada em
01 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: Comarca de Duque de Caxias- Cartório da 3ª Vara Cível | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELProcesso 0007197-06.2021.8.19.0021 S E N T E N Ç A PAULO CESAR SOUZA DIAS ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais contra DECOLAR.COM e AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S/A. A parte autora alega ter adquirido passagens aéreas para Lisboa/Portugal, no valor de R$ 6.259,00, que foram canceladas em virtude da pandemia de COVID-19. A parte ré teria oferecido a opção de reagendamento sem custo adicional, porém, o autor sustenta que, apesar de inúmeras tentativas dentro dos prazos estipulados, não obteve sucesso em remarcar a viagem devido a falhas e instabilidade no sistema da companhia, que chegou a reagendar e cancelar um novo voo unilateralmente. Requer: A concessão da Gratuidade de Justiça nos termos da Lei n.º 1.060/50, por não ter condições de arcar com as custas judiciais e honorários advocatícios; a Citação das Rés para querendo contestar o presente pedido no prazo legal, sob pena de aplicação do artigo 319 da lei processual civil; A inversão do ônus da prova; A condenação da parte Ré a proceder ao cancelamento da reserva de passagens de nº 854785115900 e 336680444701; A condenação da parte Ré a proceder à restituição do valor pago de R$ 6.259,00 (seis mil, duzentos e cinquenta e nove reais), com juros e correção monetária desde o seu desembolso; para que seja a parte Ré condenada solidariamente ao pagamento a título de Danos Morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), tendo em vista a aplicação do critério da Razoabilidade e Proporcionalidade, já que a situação econômica da parte Ré enseja dever de indenizar muito superior. A condenação da parte Ré nos ônus sucumbenciais de estilo, na ordem de 20% sobre o valor da causa. Contestação do primeiro réu em fls. 77. Em sua contestação, a parte ré busca, primeiramente, a extinção do processo sem análise de mérito, levantando duas preliminares. A primeira é a de ilegitimidade passiva, na qual sustenta ser mera intermediária na relação de consumo, atuando apenas como uma agência que conecta o consumidor à companhia aérea. A segunda preliminar é a de falta de interesse de agir, argumentando que a parte autora não comprovou ter buscado uma solução pela via administrativa antes de recorrer ao Judiciário. No mérito, defende a excludência de sua responsabilidade, atribuindo a falha na prestação do serviço exclusivamente a um terceiro, no caso, a companhia aérea. Além disso, argumenta a inexistência de dano moral a ser indenizado, pois a situação foi causada por um evento de força maior - a pandemia de COVID-19 -, que, conforme o Código Civil, afasta o dever de reparação. Contestação do segundo réu em fls. 157. A defesa da AZUL levanta, preliminarmente, a ilegitimidade ativa do autor para pedir a restituição dos danos materiais, pois o pagamento das passagens foi feito por um terceiro. Alega também, como tese principal, a culpa exclusiva de terceiro, a pandemia, e da corré, para excluir sua responsabilidade. No mérito, foca na inexistência de dano moral, sustentando que este não é presumido e exige prova de ofensa grave, conforme jurisprudência do STJ. Por fim, opõe-se à inversão do ônus da prova. Pede, assim, o acolhimento da preliminar e a improcedência total dos pedidos. Réplica em fls. 202. Saneamento que não inverteu o ônus da prova e afastou a preliminar de ilegitimidade de ambas as partes em fls. 497. A fls. 259. o juízo de origem considerou encerrada a fase probatória encaminhando o processo ao grupo de sentenças sendo distribuído a esse magistrado signatário em 10 de junho de 2025. É O RELATÓRIO. DECIDO. O feito está a justificar o julgamento na fase que se encontra, visto que a questão de fundo é unicamente de direito e os fatos estão documentalmente comprovados não havendo necessidade de produção de qualquer outra prova. Verifico que falta analisar a preliminar de falta de interesse de agir arguido pela Decolar. De rigor seu indeferimento, a resolução administrativa não é condição de ingresso e demanda judicial. Passo ao mérito. A controvérsia cinge-se à falha na prestação do serviço após o cancelamento do voo original. A pandemia de COVID-19, de fato, constituiu força maior que justificou o cancelamento inicial. Contudo, a falha que fundamenta a presente ação não é o cancelamento em si, mas a subsequente e reiterada falha das rés em prover uma solução adequada ao consumidor, que, por sua vez, tentou insistentemente realizar o reagendamento ofertado. Ademais, as defesas apresentadas se revelam genéricas e não cumprem com o ônus da impugnação específica. As rés alegam ter agido corretamente e que o autor não tentou a via administrativa, mas não apresentam uma única prova de que seus sistemas de reagendamento estavam funcionais, de que prestaram o devido suporte ou de que as informações foram claras. Limitam-se a teses jurídicas sem lastro probatório, enquanto o autor narra uma verdadeira via crucis para exercer um direito que lhe foi ofertado. A simples alegação de cumprimento da Lei 14.034/20 não é suficiente se, na prática, o consumidor é impedido de usufruir das opções que a própria lei lhe confere. Importante destacar que a responsabilidade das fornecedoras é objetiva, fundada na teoria do risco do empreendimento (art. 14 do CDC). A ineficiência dos canais de atendimento, as informações desencontradas e a impossibilidade de remarcação caracterizam o defeito no serviço. O consumidor não pode ser penalizado pela desorganização e falta de estrutura das rés para lidar com as consequências da pandemia, que, embora seja uma excludente para o evento inicial, não serve de escudo para a má gestão crônica do pós-venda. Sendo assim, ambas as rés devem, solidariamente, arcar com os prejuízos de suas condutas. Passo a analisar os pedidos. O autor tem o direito de rescindir o contrato que não pôde ser cumprido nem devidamente reprogramado por culpa das rés. Consequentemente, o valor despendido na aquisição das passagens deve ser restituído de forma integral, devidamente corrigido, para restabelecer o status quo ante. O pedido de cancelamento da reserva e restituição do valor de R$ 6.259,00 (seis mil, duzentos e cinquenta e nove reais) procede e deverá ser restituído. Quanto aos danos morais, A situação vivenciada pelo autor ultrapassa, em muito, o mero dissabor. Não se trata de um simples cancelamento, mas da completa falha das rés em solucionar o problema, deixando o consumidor em um limbo por meses, frustrando a expectativa de uma viagem planejada e causando-lhe angústia, ansiedade e sentimento de impotência. A perda do tempo útil do consumidor, forçado a inúmeras e infrutíferas tentativas de contato e resolução, é passível de compensação. Considerando a capacidade econômica das rés, a gravidade da falha, o caráter pedagógico-punitivo da medida e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, fixo a compensação por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que se mostra adequada para reparar o abalo sofrido sem gerar enriquecimento ilícito. Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para: 1) DECRETAR a rescisão do contrato de transporte aéreo referente às reservas nº 854785115900 e 33668044701. 2) CONDENAR as rés, de forma solidária, a restituírem o valor de R$ 6.259,00 (seis mil, duzentos e cinquenta e nove reais), com juros e correção monetária do desembolso. A correção monetária deverá ser aplicada pelos índices do IPCA e os juros pela taxa Selic deduzido o índice de atualização monetária, nos termos da lei 14.905 de 28/06/2024 e da Resolução CMN 5171 de 29.08.24 3) CONDENAR as rés, de forma solidária, a pagarem à parte autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de compensação por danos morais, valor este que deverá ser corrigido monetariamente a partir da data desta sentença (Súmula 362, STJ) e acrescido de juros de mora desde a citação. A correção monetária deverá ser aplicada pelos índices do IPCA e os juros pela taxa Selic deduzido o índice de atualização monetária, nos termos da lei 14.905 de 28/06/2024 e da Resolução CMN 5171 de 29.08.24; 4) Em razão da sucumbência condeno os réus a pagarem as taxas judiciárias, custas processuais e honorários de sucumbência, estes fixados em 15% do valor da condenação, valor que se justifica em razão da longa marcha processual P.R.I. CUMPRA-SE. Rio de Janeiro, 05 de julho de 2025. MAURO NICOLAU JÚNIOR Juiz de Direito