Camila Aurea De Souza x Smartfit Escola De Ginastica E Danca S.A e outros

Número do Processo: 0010160-31.2025.5.03.0186

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TRT3
Classe: RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO
Grau: 1º Grau
Órgão: 03ª Turma
Última atualização encontrada em 08 de julho de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 15/04/2025 - Intimação
    Órgão: 48ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE | Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO
    PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 48ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE 0010160-31.2025.5.03.0186 : CAMILA AUREA DE SOUZA : SMARTFIT ESCOLA DE GINASTICA E DANCA S.A. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID adb948b proferida nos autos. SENTENÇA   RELATÓRIO Dispensado, nos termos do art. 852-I da CLT.   FUNDAMENTAÇÃO JUÍZO 100% DIGITAL. DEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO. Requereu o autor o processamento do feito de forma 100% digital. Devidamente intimada para manifestar-se a respeito de tal pedido, a reclamada permaneceu inerte. Diante da ausência de manifestação, defiro o requerimento. GRAVAÇÃO. Considerando que os depoimentos foram integralmente gravados por meio audiovisual, foi determinada a juntada de certidão com transcrição dos depoimentos, de forma resumida. Registro que em caso de eventual divergência entre a gravação e a transcrição, prevalecerá a gravação. NOTIFICAÇÃO/PUBLICAÇÃO EXCLUSIVA. PARTE RÉ. Cumprido o disposto no art. 5º da Resolução 185/2017 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, defiro o requerimento, uma vez que o Dr. JOSÉ GUILHERME CARNEIRO QUEIROZ, inscrito na OAB/SP sob o nº 163.613, advogado da parte ré, se habilitou de forma automática. OBSERVE A SECRETARIA, promovendo retificação de autuação, se for o caso, para que as publicações e intimações sejam realizadas de forma adequada. INÉPCIA. Todos os pedidos deduzidos na inicial foram antecedidos de uma breve exposição fática e possuem estimativa de valor (Precedente: TST RR 011064-23.2014.5.03.0029), o que atende aos requisitos da petição inicial (art. 840, §1º, e art. 852-B, da CLT). Verifica-se, assim, que a causa de pedir se encontra suficientemente narrada e demonstra plena compatibilidade com os pedidos nela declinados, sem qualquer prejuízo ao oferecimento de defesa pela parte reclamada. Rejeito. AUSÊNCIA DE LIQUIDAÇÃO DE VALORES. EXTINÇÃO DO FEITO. A defesa requer a extinção do processo sem resolução de mérito ao argumento de que os valores indicados pelo reclamante seriam genéricos e aleatórios. A leitura da peça de ingresso, no entanto, revela que o autor indicou, como valor da causa, a quantia de R$ 32.143,90 e estimou cada uma das postulações contidas no rol de ID.da0fc5e - f.11 do PDF, atribuindo-lhes valores compatíveis com as suas pretensões. Sabe-se que o artigo 840, § 1º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017, estabelece dentre os requisitos para validade da inicial "a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor" , o que, conforme acima visto, foi regularmente observado pela parte autora, nada cogitando do vício citado pelo reclamado. Lembro, ademais, que a indicação na petição inicial não serve como limitação de valores. Entendimento em sentido contrário implicaria renúncia de direitos por parte do empregado, vedada pelo sistema jurídico-trabalhista brasileiro. Em face de todo o exposto, rejeito a preliminar. IMPUGNAÇÃO AOS DOCUMENTOS. A impugnação genérica e meramente formal dos documentos apresentados pela parte não afasta a presunção de sua legitimidade como meio de prova, decorrente das alegações do respectivo patrono. Lado outro, na análise da prova, estes servirão de base para o convencimento do Juízo e, se houver algum impertinente ao fim que se pretende, certamente será desconsiderado. Rejeito. JUSTA CAUSA. MANUTENÇÃO. DANO MORAL. A dispensa por justa causa é um exercício do poder disciplinar do empregador e é aplicada a partir de certas condutas que vão sendo coibidas por advertência ou suspensão, ou de ato grave o suficiente para ensejar a ruptura imediata do contrato de trabalho. A aplicação da justa causa é a pena máxima que o empregador pode imputar ao empregado. Por essa razão, é imprescindível que haja prova robusta e incontestável de fato que impeça a continuidade da relação de emprego, por quebra do elemento fidúcia, intrínseco ao vínculo formado. Ante às graves consequências que irradiam na vida profissional, funcional, social e pessoal do trabalhador, requer prova sobre a qual não recaia qualquer suspeita, de modo a não deixar dúvidas no espírito do julgador. Assim, é dever do Juiz apurá-la e avaliá-la, com a máxima cautela e serenidade, devendo, ainda, medir e sopesar, adequadamente, todas as circunstâncias e ingredientes que revestem os fatos, visto que o princípio da continuidade da relação de emprego forma presunção favorável ao empregado, sendo ônus do empregador, a comprovação dos elementos justificadores da dispensa por justa causa. Fixadas tais premissas, passo ao exame do caso concreto. No caso, a reclamante foi admitida em 03/05/2021, como profissional de educação física, encerrando-se o vínculo em 27/01/2025. A dispensa foi motivada por denúncia de injúria racial, feita por um colega de trabalho, por meio de um canal de atendimento. A reclamante sustenta que “(...) sempre executou as suas atividades com todo empenho possível, com respeito e assiduidade. A Autora nega a alegação da Ré de que teria praticado qualquer ato desrespeitoso ou lesivo contra clientes ou colegas de trabalho. Fato é que a Reclamada sequer apresenta qual o motivo de dispensa da Reclamante, a demitiu sem qualquer justificativa.” Afirma que não teve oportunidade de defesa, que não foi observado o princípio de gradação da pena e acrescenta que não houve observância da imediatidade na punição. Postula: a) A reversão de justa causa, requer seja paga as seguintes verbas rescisórias: i. Aviso Prévio (42 dias) ...............R$ 3.350,00; ii. 13º salário (1/12 avos) ......................R$ 183,67; iii. Férias proporcionais + 1/3 (5/12) .........R$ 1.450,35; iv. Multa dos 40% sobre o FGTS ...........R$ 5.243,20; b) Multa do artigo 477 da CLT ............R$ 2.824,00; c) Indenização substitutiva do Seguro Desemprego..R$ 4.990,00; Em sua defesa, a reclamada afirma que recebeu denúncia de funcionário, sustentando que  “A vítima anexou a denúncia prints do WhatsApp e a transcrição das mensagens, sendo possível verificar que os membros do grupo de fato faziam comentários racistas sobre a vítima o chamando de “cirilo”, “Tizumba”, realizaram até figurinha com o seu rosto no corpo de um macaco. Foi verificado que a Reclamante participava ativamento de grupo enviando fotografias da vítima e a ridicularizando, bem como fazendo comentário de cunho racista sobre ele. (...) quando foi comunicada justa causa pela líder regional foi lhe passado o motivo e em momento algum a Autora negou os fatos ou demonstrou arrependimento.” Analiso. Trata-se de alegação de injúria racial cometida pela reclamante em relação a um colega de trabalho, também profissional da Educação Física, em grupo de whatsapp. Em seu depoimento pessoal, a autora reconheceu que participava do grupo de whatsapp e que, em tal grupo, conversavam, dentre outros assuntos, sobre o colega denunciante. A reclamada juntou aos autos a denúncia (ID.6c22668 - f.237 do PDF), em que consta: Resumo O manifestante denunciou injúria racial na unidade Castelo 2, envolvendo colegas que criaram um grupo no WhatsApp com ofensas raciais e ameaças. Texto final Antes de mais nada gostaria de salientar que o ocorrido foi na unidade castelo 2mas não tem a opção logo acima. Estou sendo vitima de injuria racial por meus colegas de trabalho da mesma unidade. Tinham mais pessoas pertencentes ao grupo mas irei falar os que ainda trabalham para a empresa: Camila Áurea de Souza (professora de musculação 07 as 11 castelo 2), Luiz Guilherme Campos Korenblit (professor que saiu da smart em dezembro de 2024 continua dando personal na unidade em que trabalho) e Raphella Camila dos santos (recepcionista da manhã unidade castelo 2). Criaram um grupo no WhatsApp em fevereiro de 2024 e desde então usam desse app para proferirem ofensas quanto a minha cor e falaram ate em colocarem chumbinho no meu café. Fizeram figurinhas no app colocando minha foto em um corpo de macaco, referiram a mim como zumbi dos palmares , frango de macumba, Tizumba, Kunta Kinte, ave fênix depois de cair no "pinxe", preto velho, Sherek torrado, Demônio, dentre outros que irei colocar no anexo ,tirando fotos minhas sem permissão para criarem figurinhas racistas. Tenho a conversa toda do grupo baixada caso queiram como prova. Desde de já agradeço pela investigação e peço para continuar no meu trabalho cuidando com carinho da saúde dos alunos e que os responsáveis sejam devidamente punidos pela empresa. Os anexos abaixo são tudo que selecionei das conversas em que tive acesso, mas como dito anteriormente tenho a conversa toda baixada caso precisem Também foram apresentados os prints das conversas do grupo no Whatsapp (a partir do ID. 65e583c - f.241 do PDF). Pretende a parte ré a desconsideração dos prints de conversas de aplicativo como meio de prova, alegando que não houve juntada do inteiro teor, tampouco reconhecimento cartorário. Sem razão. Entendo tratar-se de meio lícito de prova. Ademais, a autora reconheceu em seu depoimento pessoal a participação no grupo e, ainda, que falavam sobre o denunciante. No presente caso, entendo necessário o julgamento sob a perspectiva racial, observadas as diretrizes do PROTOCOLO PARA JULGAMENTO COM PERSPECTIVA RACIAL, publicado pelo CNJ, documento elaborado pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria CNJ n. 73, de 23 de fevereiro de 2024. O protocolo, em seu item 5.8.2, trata do conceito de Racismo Recreativo no Ambiente de Trabalho, explicando que: O conceito de racismo recreativo foi abordado na parte conceitual deste Protocolo (Parte II). No ambiente de trabalho, essa prática pode criar um clima hostil e prejudicar a saúde mental e emocional de empregadas e empregados, além de afetar a cooperação e a produtividade da equipe. Manifestações de racismo recreativo incluem piadas, imitações, apelidos e outros comportamentos que banalizam a experiência de discriminação e desumanizam indivíduos com base em suas características raciais. Essas ações são frequentemente minimizadas ou justificadas como inofensivas por serem rotuladas como “brincadeiras”. (...)   O racismo recreativo contribui para a criação de um ambiente de trabalho tóxico, no qual as pessoas negras se sentem desvalorizadas e inseguras. Além disso, esse clima hostil fragiliza os demais membros da equipe que, mesmo não participando diretamente da prática, se veem impotentes para adotar ações tendentes a coibi-las, por medo de represálias, o que contribui para aumentar o estresse e a ansiedade, afetando o bem-estar e a saúde mental dos trabalhadores. O cunho racista das mensagens trocadas no grupo é evidente e absurdo. Chegou-se ao ponto de estabelecer-se uma tabela de pontuação negativa (ID. 65e583c - f.260 do PDF) quanto às características dos colaboradores, dentre elas, cor de pele, referindo-se à pele negra como “queimada” e atribuindo a tal característica conotação negativa. Transcrevo: Listinha atualizada da pontuação negativa: Feia - 10 pontos Gorda - 15 pontos (com agravante de 10 pontos a cada 10 kilos acima do peso) Queimada - 5 pontos Fedorenta - 80 pontos Chata - 10 pontos Falida - 5 pontos A questão posta nos autos é gravíssima. Inclusive, perpassa pela tipificação penal no que concerne ao racismo. Em que pese não ter sido de autoria da autora tal tabela, a mesma contribui ativamente no grupo, também com expressões racistas, chamando o denunciante de “Cirilo”, “tizumba”, “demônio” e achando graça do conteúdo racista ali contido. Entendo que a atividade do grupo enquadra-se no conceito de Racismo Recreativo contido no Protocolo para julgamento com perspectiva racial. Importante ressaltar que o fato de ser um grupo criado entre “pessoas com afinidade” como declarou a autora em seu depoimento não afasta a responsabilidade pela conduta, uma vez que o autor tomou ciência das mensagens e todo o conteúdo se relaciona ao ambiente laboral. É dever do empregador a proteção jurídica à saúde e segurança do trabalhador, notadamente em razão do disposto no art. 7º, XXII, da Constituição Federal. Os conceitos de saúde e segurança devem ser entendidos de modo amplo, não restritos à integridade física do empregado, mas alcançando também a esfera mental, moral e emocional. Nesse sentido, cabe ao empregador coibir práticas com potencial ofensivo, pelo que entendo correta a medida adotada, qual seja, a demissão por justa causa. Enfatizo que o Brasil é signatário de convenções internacionais de direitos humanos no qual se obriga a combater a discriminação, especificamente aquelas sofridas no ambiente de trabalho. A Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, , incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, pelo DECRETO Nº 10.932, DE 10 DE JANEIRO DE 2022, estabelece o seguinte: Artigo 1 Para os efeitos desta Convenção: 1. Discriminação racial é qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes. A discriminação racial pode basear-se em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica. (…) 6. Intolerância é um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou contrárias. Pode manifestar-se como a marginalização e a exclusão de grupos em condições de vulnerabilidade da participação em qualquer esfera da vida pública ou privada ou como violência contra esses grupos. Artigo 2 Todo ser humano é igual perante a lei e tem direito à igual proteção contra o racismo, a discriminação racial e formas correlatas de intolerância, em qualquer esfera da vida pública ou privada. (…) Artigo 4 Os Estados comprometem-se a prevenir, eliminar, proibir e punir, de acordo com suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção, todos os atos e manifestações de racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância, inclusive: i. apoio público ou privado a atividades racialmente discriminatórias e racistas ou que promovam a intolerância, incluindo seu financiamento; ii. publicação, circulação ou difusão, por qualquer forma e/ou meio de comunicação, inclusive a internet, de qualquer material racista ou racialmente discriminatório que: a) defenda, promova ou incite o ódio, a discriminação e a intolerância; (…)A Convenção 111 da OIT SOBRE DISCRIMINAÇÃO EM MATÉRIA DE EMPREGO E PROFISSÃO, incorporada ao ordenamento jurídico pelo DECRETO Nº 62.150, DE 19 DE JANEIRO DE 1968 e consolidada no DECRETO Nº 10.088, DE 5 DE NOVEMBRO DE 2019, estabelece: Artigo 1º 1. Para fins da presente convenção, o termo “discriminação” compreende: a) Toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão; b) Qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão, que poderá ser especificada pelo Membro interessado depois de consultadas as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, quando estas existam, e outros organismos adequados. Amparada no princípio da conexão, segundo o qual o juiz pode obter informações em outras fontes fora do processo na busca da verdade real para proferir sua decisão, procedi à consulta junto ao Conselho Federal de Educação Física, a fim de consultar o código que o profissional da área deve observar. A RESOLUÇÃO CONFEF nº 307/2015, que dispõe sobre o Código de Ética dos Profissionais de Educação Física registrados no Sistema CONFEF/CREFs, dispõe que: Art. 4º - O exercício profissional em Educação Física pautar-se-á pelos seguintes princípios: I - o respeito à vida, à dignidade, à integridade e aos direitos do indivíduo; (...) III - a ausência de discriminação ou preconceito de qualquer natureza; IV - o respeito à ética nas diversas atividades profissionais; (...)   Art. 8º - No relacionamento com os colegas de profissão, com outros profissionais nos diversos espaços de atuação profissional, a conduta do Profissional de Educação Física será pautada pelos princípios de consideração, apreço e solidariedade, em consonância com os postulados de harmonia da categoria profissional, sendo-lhe vedado: I - fazer referências prejudiciais ou de qualquer modo desabonadoras a colegas de profissão, ou a outros profissionais nos diversos espaços de atuação profissional; Com efeito, no caso em tela, inclusive à luz do protocolo do CNJ, das convenções sobre o tema e ainda do Código de ética dos profissionais da educação física, a dispensa por justa causa, forma de extinção do contrato de trabalho e pena máxima aplicada para coibir condutas incompatíveis com a relação empregatícia, revela-se proporcional.  O que se verifica no caso dos autos é uma conduta inadmissível, na dimensão humana e profissional.  Ressalto que a autora afirma, como uma espécie de justificativa, que também é negra, o que, de algum modo, a eximiria da acusação de ter cometido injúria racial. Tal dado é irrelevante e soa mais como uma espécie de artifício que, em um raciocínio distorcido, autorizaria a autora a atuar livremente, sem responsabilizar-se por ações preconceituosas. Aceitar tal justificativa seria equivalente a dizer que atos de racismo são admitidos em razão de um racismo estrutural no qual certas condutas, expressões e brincadeiras são tidas como naturais. O Judiciário não pode permitir a violação do pacto social, não pode admitir um ato de desumanização, um ato de violência.   Quanto à ausência de imediatidade, reputo razoável o tempo que a parte ré levou para a tomada de decisão. Entre o recebimento da denúncia (14/01/2025) e a dispensa (27/01/2025), houve intervalo de apenas 13 dias, tempo que reputo compatível com a gravidade da situação apresentada. No caso, dada a gravidade do episódio, não há se falar em necessidade de aplicação progressiva de medidas disciplinares, sendo cabível, como exposto, o fim do pacto. Diante do exposto, reputo válida a dispensa motivada da parte reclamante e, por essa razão, indefiro o pedido de conversão da dispensa por justa causa em dispensa sem justa causa. Consequentemente, diante da modalidade rescisória reconhecida e, tendo em vista que houve quitação das verbas devidas, conforme TRCT de ID.559d422 - f.234 do PDF e comprovante de pagamento de ID.67848d0 - f.236 do PDF, julgo improcedentes os pedidos de letras “a”,”b” e “c” do rol da inicial. Ainda, julgo improcedente o pedido de condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral. A autora apresentou como fundamento do pedido, além da questão relativa à aplicação da justa causa, ora mantida, também o fato de ter sido impedida de atuar como personal trainer na rede de academias da reclamada. O primeiro informante arrolado pela reclamada disse que “a reclamante foi proibida de entrar nas academias da Smartfit para trabalhar como personal, assim como outros personal trainers externos;” O segundo afirmou que “ela pode malhar na academia como aluna, mas não trabalhar lá; que esse banimento é em toda a rede Smartfit da América Latina.” Considero que, tratando-se de empreendimento privado, o estabelecimento de requisitos para ingresso à propriedade não é vedado. Os estabelecimentos possuem a prerrogativa de definir as condições para o uso de suas instalações.  No caso, entendo que a proibição de entrada na empresa, para atuar como personal trainer, se deu por motivo plausível, qual seja, comportamento racista, sobretudo considerando-se os princípios da responsabilidade civil relacionados a reparação de danos causados a terceiros (art. 932 do Código Civil.) Ausentes, portanto, os pressupostos para configuração da responsabilidade civil, não havendo que se falar em condenação da parte reclamada à obrigação de indenizar. Julgo improcedente o pedido “d” do rol da inicial. JUSTIÇA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO DA RECLAMADA. Requereu a parte reclamante, nos termos da declaração de ID.b2ebc41 - f.15 do PDF, a concessão da assistência judiciária gratuita. A parte reclamada impugnou o requerimento, sob o argumento de que só poderá ser concedido o benefício àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, o que não seria o caso do autor. Afirmou que deveria o obreiro fazer prova da incapacidade financeira. Entendo que a constatação de insuficiência de recursos se dá por meio de simples declaração, que foi devidamente juntada aos autos. Neste sentido, defiro, à parte obreira, o pálio da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 790, §3º, da CLT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. STF. IMPROCEDENTE. Observadas as disposições contidas no § 2º do art. 791-A da CLT, defiro, em favor dos advogados da parte ré, honorários fixados em 10% sobre o valor da causa, observando-se os moldes fixados na OJ 348 da SDI-I do C. TST e na tese jurídica prevalecente número 4 do TRT da 3ª Região. Indefiro a dedução de créditos decorrentes desta ou de qualquer demanda, diante do que restou decidido pelo STF na ADI 5.766/DF que considerou inconstitucional o art. 791-A, §4º, da CLT. Assim, embora condenado em honorários, o beneficiário da justiça gratuita, não está obrigado a fazê-lo com sacrifício do sustento próprio ou da família. Assim, permanecendo nos autos o benefício da Justiça Gratuita à parte reclamante, não há que se falar em cobrança de honorários, motivo pelo qual após o trânsito em julgado os autos deverão ser remetidos ao arquivo.   DISPOSITIVO Isso posto, decido julgar IMPROCEDENTES os pedidos deduzidos na Ação Trabalhista (0010160-31.2025.5.03.0186) proposta por CAMILA AUREA DE SOUZA em face de SMARTFIT ESCOLA DE GINASTICA E DANCA S.A., nos termos da fundamentação supra. Defiro à parte autora os benefícios da justiça gratuita. Honorários advocatícios, conforme fundamentação. As partes ficam advertidas de que não cabem Embargos de Declaração para rever fatos, provas, a própria decisão ou, simplesmente, para contestar o que já foi decidido (arts. 77 a 81 e 1.026, § 2º, todos do CPC). Custas, pela parte autora, no importe de R$642,88, calculadas sobre R$32.143,90, valor da causa. Isenções na forma do art. 790-A, da CLT. Intimem-se as partes. Nada mais. BELO HORIZONTE/MG, 14 de abril de 2025. JESSICA GRAZIELLE ANDRADE MARTINS Juíza do Trabalho Substituta

    Intimado(s) / Citado(s)
    - CAMILA AUREA DE SOUZA
  3. 15/04/2025 - Intimação
    Órgão: 48ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE | Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO
    PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 48ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE 0010160-31.2025.5.03.0186 : CAMILA AUREA DE SOUZA : SMARTFIT ESCOLA DE GINASTICA E DANCA S.A. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID adb948b proferida nos autos. SENTENÇA   RELATÓRIO Dispensado, nos termos do art. 852-I da CLT.   FUNDAMENTAÇÃO JUÍZO 100% DIGITAL. DEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO. Requereu o autor o processamento do feito de forma 100% digital. Devidamente intimada para manifestar-se a respeito de tal pedido, a reclamada permaneceu inerte. Diante da ausência de manifestação, defiro o requerimento. GRAVAÇÃO. Considerando que os depoimentos foram integralmente gravados por meio audiovisual, foi determinada a juntada de certidão com transcrição dos depoimentos, de forma resumida. Registro que em caso de eventual divergência entre a gravação e a transcrição, prevalecerá a gravação. NOTIFICAÇÃO/PUBLICAÇÃO EXCLUSIVA. PARTE RÉ. Cumprido o disposto no art. 5º da Resolução 185/2017 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, defiro o requerimento, uma vez que o Dr. JOSÉ GUILHERME CARNEIRO QUEIROZ, inscrito na OAB/SP sob o nº 163.613, advogado da parte ré, se habilitou de forma automática. OBSERVE A SECRETARIA, promovendo retificação de autuação, se for o caso, para que as publicações e intimações sejam realizadas de forma adequada. INÉPCIA. Todos os pedidos deduzidos na inicial foram antecedidos de uma breve exposição fática e possuem estimativa de valor (Precedente: TST RR 011064-23.2014.5.03.0029), o que atende aos requisitos da petição inicial (art. 840, §1º, e art. 852-B, da CLT). Verifica-se, assim, que a causa de pedir se encontra suficientemente narrada e demonstra plena compatibilidade com os pedidos nela declinados, sem qualquer prejuízo ao oferecimento de defesa pela parte reclamada. Rejeito. AUSÊNCIA DE LIQUIDAÇÃO DE VALORES. EXTINÇÃO DO FEITO. A defesa requer a extinção do processo sem resolução de mérito ao argumento de que os valores indicados pelo reclamante seriam genéricos e aleatórios. A leitura da peça de ingresso, no entanto, revela que o autor indicou, como valor da causa, a quantia de R$ 32.143,90 e estimou cada uma das postulações contidas no rol de ID.da0fc5e - f.11 do PDF, atribuindo-lhes valores compatíveis com as suas pretensões. Sabe-se que o artigo 840, § 1º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017, estabelece dentre os requisitos para validade da inicial "a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor" , o que, conforme acima visto, foi regularmente observado pela parte autora, nada cogitando do vício citado pelo reclamado. Lembro, ademais, que a indicação na petição inicial não serve como limitação de valores. Entendimento em sentido contrário implicaria renúncia de direitos por parte do empregado, vedada pelo sistema jurídico-trabalhista brasileiro. Em face de todo o exposto, rejeito a preliminar. IMPUGNAÇÃO AOS DOCUMENTOS. A impugnação genérica e meramente formal dos documentos apresentados pela parte não afasta a presunção de sua legitimidade como meio de prova, decorrente das alegações do respectivo patrono. Lado outro, na análise da prova, estes servirão de base para o convencimento do Juízo e, se houver algum impertinente ao fim que se pretende, certamente será desconsiderado. Rejeito. JUSTA CAUSA. MANUTENÇÃO. DANO MORAL. A dispensa por justa causa é um exercício do poder disciplinar do empregador e é aplicada a partir de certas condutas que vão sendo coibidas por advertência ou suspensão, ou de ato grave o suficiente para ensejar a ruptura imediata do contrato de trabalho. A aplicação da justa causa é a pena máxima que o empregador pode imputar ao empregado. Por essa razão, é imprescindível que haja prova robusta e incontestável de fato que impeça a continuidade da relação de emprego, por quebra do elemento fidúcia, intrínseco ao vínculo formado. Ante às graves consequências que irradiam na vida profissional, funcional, social e pessoal do trabalhador, requer prova sobre a qual não recaia qualquer suspeita, de modo a não deixar dúvidas no espírito do julgador. Assim, é dever do Juiz apurá-la e avaliá-la, com a máxima cautela e serenidade, devendo, ainda, medir e sopesar, adequadamente, todas as circunstâncias e ingredientes que revestem os fatos, visto que o princípio da continuidade da relação de emprego forma presunção favorável ao empregado, sendo ônus do empregador, a comprovação dos elementos justificadores da dispensa por justa causa. Fixadas tais premissas, passo ao exame do caso concreto. No caso, a reclamante foi admitida em 03/05/2021, como profissional de educação física, encerrando-se o vínculo em 27/01/2025. A dispensa foi motivada por denúncia de injúria racial, feita por um colega de trabalho, por meio de um canal de atendimento. A reclamante sustenta que “(...) sempre executou as suas atividades com todo empenho possível, com respeito e assiduidade. A Autora nega a alegação da Ré de que teria praticado qualquer ato desrespeitoso ou lesivo contra clientes ou colegas de trabalho. Fato é que a Reclamada sequer apresenta qual o motivo de dispensa da Reclamante, a demitiu sem qualquer justificativa.” Afirma que não teve oportunidade de defesa, que não foi observado o princípio de gradação da pena e acrescenta que não houve observância da imediatidade na punição. Postula: a) A reversão de justa causa, requer seja paga as seguintes verbas rescisórias: i. Aviso Prévio (42 dias) ...............R$ 3.350,00; ii. 13º salário (1/12 avos) ......................R$ 183,67; iii. Férias proporcionais + 1/3 (5/12) .........R$ 1.450,35; iv. Multa dos 40% sobre o FGTS ...........R$ 5.243,20; b) Multa do artigo 477 da CLT ............R$ 2.824,00; c) Indenização substitutiva do Seguro Desemprego..R$ 4.990,00; Em sua defesa, a reclamada afirma que recebeu denúncia de funcionário, sustentando que  “A vítima anexou a denúncia prints do WhatsApp e a transcrição das mensagens, sendo possível verificar que os membros do grupo de fato faziam comentários racistas sobre a vítima o chamando de “cirilo”, “Tizumba”, realizaram até figurinha com o seu rosto no corpo de um macaco. Foi verificado que a Reclamante participava ativamento de grupo enviando fotografias da vítima e a ridicularizando, bem como fazendo comentário de cunho racista sobre ele. (...) quando foi comunicada justa causa pela líder regional foi lhe passado o motivo e em momento algum a Autora negou os fatos ou demonstrou arrependimento.” Analiso. Trata-se de alegação de injúria racial cometida pela reclamante em relação a um colega de trabalho, também profissional da Educação Física, em grupo de whatsapp. Em seu depoimento pessoal, a autora reconheceu que participava do grupo de whatsapp e que, em tal grupo, conversavam, dentre outros assuntos, sobre o colega denunciante. A reclamada juntou aos autos a denúncia (ID.6c22668 - f.237 do PDF), em que consta: Resumo O manifestante denunciou injúria racial na unidade Castelo 2, envolvendo colegas que criaram um grupo no WhatsApp com ofensas raciais e ameaças. Texto final Antes de mais nada gostaria de salientar que o ocorrido foi na unidade castelo 2mas não tem a opção logo acima. Estou sendo vitima de injuria racial por meus colegas de trabalho da mesma unidade. Tinham mais pessoas pertencentes ao grupo mas irei falar os que ainda trabalham para a empresa: Camila Áurea de Souza (professora de musculação 07 as 11 castelo 2), Luiz Guilherme Campos Korenblit (professor que saiu da smart em dezembro de 2024 continua dando personal na unidade em que trabalho) e Raphella Camila dos santos (recepcionista da manhã unidade castelo 2). Criaram um grupo no WhatsApp em fevereiro de 2024 e desde então usam desse app para proferirem ofensas quanto a minha cor e falaram ate em colocarem chumbinho no meu café. Fizeram figurinhas no app colocando minha foto em um corpo de macaco, referiram a mim como zumbi dos palmares , frango de macumba, Tizumba, Kunta Kinte, ave fênix depois de cair no "pinxe", preto velho, Sherek torrado, Demônio, dentre outros que irei colocar no anexo ,tirando fotos minhas sem permissão para criarem figurinhas racistas. Tenho a conversa toda do grupo baixada caso queiram como prova. Desde de já agradeço pela investigação e peço para continuar no meu trabalho cuidando com carinho da saúde dos alunos e que os responsáveis sejam devidamente punidos pela empresa. Os anexos abaixo são tudo que selecionei das conversas em que tive acesso, mas como dito anteriormente tenho a conversa toda baixada caso precisem Também foram apresentados os prints das conversas do grupo no Whatsapp (a partir do ID. 65e583c - f.241 do PDF). Pretende a parte ré a desconsideração dos prints de conversas de aplicativo como meio de prova, alegando que não houve juntada do inteiro teor, tampouco reconhecimento cartorário. Sem razão. Entendo tratar-se de meio lícito de prova. Ademais, a autora reconheceu em seu depoimento pessoal a participação no grupo e, ainda, que falavam sobre o denunciante. No presente caso, entendo necessário o julgamento sob a perspectiva racial, observadas as diretrizes do PROTOCOLO PARA JULGAMENTO COM PERSPECTIVA RACIAL, publicado pelo CNJ, documento elaborado pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria CNJ n. 73, de 23 de fevereiro de 2024. O protocolo, em seu item 5.8.2, trata do conceito de Racismo Recreativo no Ambiente de Trabalho, explicando que: O conceito de racismo recreativo foi abordado na parte conceitual deste Protocolo (Parte II). No ambiente de trabalho, essa prática pode criar um clima hostil e prejudicar a saúde mental e emocional de empregadas e empregados, além de afetar a cooperação e a produtividade da equipe. Manifestações de racismo recreativo incluem piadas, imitações, apelidos e outros comportamentos que banalizam a experiência de discriminação e desumanizam indivíduos com base em suas características raciais. Essas ações são frequentemente minimizadas ou justificadas como inofensivas por serem rotuladas como “brincadeiras”. (...)   O racismo recreativo contribui para a criação de um ambiente de trabalho tóxico, no qual as pessoas negras se sentem desvalorizadas e inseguras. Além disso, esse clima hostil fragiliza os demais membros da equipe que, mesmo não participando diretamente da prática, se veem impotentes para adotar ações tendentes a coibi-las, por medo de represálias, o que contribui para aumentar o estresse e a ansiedade, afetando o bem-estar e a saúde mental dos trabalhadores. O cunho racista das mensagens trocadas no grupo é evidente e absurdo. Chegou-se ao ponto de estabelecer-se uma tabela de pontuação negativa (ID. 65e583c - f.260 do PDF) quanto às características dos colaboradores, dentre elas, cor de pele, referindo-se à pele negra como “queimada” e atribuindo a tal característica conotação negativa. Transcrevo: Listinha atualizada da pontuação negativa: Feia - 10 pontos Gorda - 15 pontos (com agravante de 10 pontos a cada 10 kilos acima do peso) Queimada - 5 pontos Fedorenta - 80 pontos Chata - 10 pontos Falida - 5 pontos A questão posta nos autos é gravíssima. Inclusive, perpassa pela tipificação penal no que concerne ao racismo. Em que pese não ter sido de autoria da autora tal tabela, a mesma contribui ativamente no grupo, também com expressões racistas, chamando o denunciante de “Cirilo”, “tizumba”, “demônio” e achando graça do conteúdo racista ali contido. Entendo que a atividade do grupo enquadra-se no conceito de Racismo Recreativo contido no Protocolo para julgamento com perspectiva racial. Importante ressaltar que o fato de ser um grupo criado entre “pessoas com afinidade” como declarou a autora em seu depoimento não afasta a responsabilidade pela conduta, uma vez que o autor tomou ciência das mensagens e todo o conteúdo se relaciona ao ambiente laboral. É dever do empregador a proteção jurídica à saúde e segurança do trabalhador, notadamente em razão do disposto no art. 7º, XXII, da Constituição Federal. Os conceitos de saúde e segurança devem ser entendidos de modo amplo, não restritos à integridade física do empregado, mas alcançando também a esfera mental, moral e emocional. Nesse sentido, cabe ao empregador coibir práticas com potencial ofensivo, pelo que entendo correta a medida adotada, qual seja, a demissão por justa causa. Enfatizo que o Brasil é signatário de convenções internacionais de direitos humanos no qual se obriga a combater a discriminação, especificamente aquelas sofridas no ambiente de trabalho. A Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, , incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, pelo DECRETO Nº 10.932, DE 10 DE JANEIRO DE 2022, estabelece o seguinte: Artigo 1 Para os efeitos desta Convenção: 1. Discriminação racial é qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes. A discriminação racial pode basear-se em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica. (…) 6. Intolerância é um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou contrárias. Pode manifestar-se como a marginalização e a exclusão de grupos em condições de vulnerabilidade da participação em qualquer esfera da vida pública ou privada ou como violência contra esses grupos. Artigo 2 Todo ser humano é igual perante a lei e tem direito à igual proteção contra o racismo, a discriminação racial e formas correlatas de intolerância, em qualquer esfera da vida pública ou privada. (…) Artigo 4 Os Estados comprometem-se a prevenir, eliminar, proibir e punir, de acordo com suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção, todos os atos e manifestações de racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância, inclusive: i. apoio público ou privado a atividades racialmente discriminatórias e racistas ou que promovam a intolerância, incluindo seu financiamento; ii. publicação, circulação ou difusão, por qualquer forma e/ou meio de comunicação, inclusive a internet, de qualquer material racista ou racialmente discriminatório que: a) defenda, promova ou incite o ódio, a discriminação e a intolerância; (…)A Convenção 111 da OIT SOBRE DISCRIMINAÇÃO EM MATÉRIA DE EMPREGO E PROFISSÃO, incorporada ao ordenamento jurídico pelo DECRETO Nº 62.150, DE 19 DE JANEIRO DE 1968 e consolidada no DECRETO Nº 10.088, DE 5 DE NOVEMBRO DE 2019, estabelece: Artigo 1º 1. Para fins da presente convenção, o termo “discriminação” compreende: a) Toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão; b) Qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão, que poderá ser especificada pelo Membro interessado depois de consultadas as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, quando estas existam, e outros organismos adequados. Amparada no princípio da conexão, segundo o qual o juiz pode obter informações em outras fontes fora do processo na busca da verdade real para proferir sua decisão, procedi à consulta junto ao Conselho Federal de Educação Física, a fim de consultar o código que o profissional da área deve observar. A RESOLUÇÃO CONFEF nº 307/2015, que dispõe sobre o Código de Ética dos Profissionais de Educação Física registrados no Sistema CONFEF/CREFs, dispõe que: Art. 4º - O exercício profissional em Educação Física pautar-se-á pelos seguintes princípios: I - o respeito à vida, à dignidade, à integridade e aos direitos do indivíduo; (...) III - a ausência de discriminação ou preconceito de qualquer natureza; IV - o respeito à ética nas diversas atividades profissionais; (...)   Art. 8º - No relacionamento com os colegas de profissão, com outros profissionais nos diversos espaços de atuação profissional, a conduta do Profissional de Educação Física será pautada pelos princípios de consideração, apreço e solidariedade, em consonância com os postulados de harmonia da categoria profissional, sendo-lhe vedado: I - fazer referências prejudiciais ou de qualquer modo desabonadoras a colegas de profissão, ou a outros profissionais nos diversos espaços de atuação profissional; Com efeito, no caso em tela, inclusive à luz do protocolo do CNJ, das convenções sobre o tema e ainda do Código de ética dos profissionais da educação física, a dispensa por justa causa, forma de extinção do contrato de trabalho e pena máxima aplicada para coibir condutas incompatíveis com a relação empregatícia, revela-se proporcional.  O que se verifica no caso dos autos é uma conduta inadmissível, na dimensão humana e profissional.  Ressalto que a autora afirma, como uma espécie de justificativa, que também é negra, o que, de algum modo, a eximiria da acusação de ter cometido injúria racial. Tal dado é irrelevante e soa mais como uma espécie de artifício que, em um raciocínio distorcido, autorizaria a autora a atuar livremente, sem responsabilizar-se por ações preconceituosas. Aceitar tal justificativa seria equivalente a dizer que atos de racismo são admitidos em razão de um racismo estrutural no qual certas condutas, expressões e brincadeiras são tidas como naturais. O Judiciário não pode permitir a violação do pacto social, não pode admitir um ato de desumanização, um ato de violência.   Quanto à ausência de imediatidade, reputo razoável o tempo que a parte ré levou para a tomada de decisão. Entre o recebimento da denúncia (14/01/2025) e a dispensa (27/01/2025), houve intervalo de apenas 13 dias, tempo que reputo compatível com a gravidade da situação apresentada. No caso, dada a gravidade do episódio, não há se falar em necessidade de aplicação progressiva de medidas disciplinares, sendo cabível, como exposto, o fim do pacto. Diante do exposto, reputo válida a dispensa motivada da parte reclamante e, por essa razão, indefiro o pedido de conversão da dispensa por justa causa em dispensa sem justa causa. Consequentemente, diante da modalidade rescisória reconhecida e, tendo em vista que houve quitação das verbas devidas, conforme TRCT de ID.559d422 - f.234 do PDF e comprovante de pagamento de ID.67848d0 - f.236 do PDF, julgo improcedentes os pedidos de letras “a”,”b” e “c” do rol da inicial. Ainda, julgo improcedente o pedido de condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral. A autora apresentou como fundamento do pedido, além da questão relativa à aplicação da justa causa, ora mantida, também o fato de ter sido impedida de atuar como personal trainer na rede de academias da reclamada. O primeiro informante arrolado pela reclamada disse que “a reclamante foi proibida de entrar nas academias da Smartfit para trabalhar como personal, assim como outros personal trainers externos;” O segundo afirmou que “ela pode malhar na academia como aluna, mas não trabalhar lá; que esse banimento é em toda a rede Smartfit da América Latina.” Considero que, tratando-se de empreendimento privado, o estabelecimento de requisitos para ingresso à propriedade não é vedado. Os estabelecimentos possuem a prerrogativa de definir as condições para o uso de suas instalações.  No caso, entendo que a proibição de entrada na empresa, para atuar como personal trainer, se deu por motivo plausível, qual seja, comportamento racista, sobretudo considerando-se os princípios da responsabilidade civil relacionados a reparação de danos causados a terceiros (art. 932 do Código Civil.) Ausentes, portanto, os pressupostos para configuração da responsabilidade civil, não havendo que se falar em condenação da parte reclamada à obrigação de indenizar. Julgo improcedente o pedido “d” do rol da inicial. JUSTIÇA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO DA RECLAMADA. Requereu a parte reclamante, nos termos da declaração de ID.b2ebc41 - f.15 do PDF, a concessão da assistência judiciária gratuita. A parte reclamada impugnou o requerimento, sob o argumento de que só poderá ser concedido o benefício àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, o que não seria o caso do autor. Afirmou que deveria o obreiro fazer prova da incapacidade financeira. Entendo que a constatação de insuficiência de recursos se dá por meio de simples declaração, que foi devidamente juntada aos autos. Neste sentido, defiro, à parte obreira, o pálio da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 790, §3º, da CLT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. STF. IMPROCEDENTE. Observadas as disposições contidas no § 2º do art. 791-A da CLT, defiro, em favor dos advogados da parte ré, honorários fixados em 10% sobre o valor da causa, observando-se os moldes fixados na OJ 348 da SDI-I do C. TST e na tese jurídica prevalecente número 4 do TRT da 3ª Região. Indefiro a dedução de créditos decorrentes desta ou de qualquer demanda, diante do que restou decidido pelo STF na ADI 5.766/DF que considerou inconstitucional o art. 791-A, §4º, da CLT. Assim, embora condenado em honorários, o beneficiário da justiça gratuita, não está obrigado a fazê-lo com sacrifício do sustento próprio ou da família. Assim, permanecendo nos autos o benefício da Justiça Gratuita à parte reclamante, não há que se falar em cobrança de honorários, motivo pelo qual após o trânsito em julgado os autos deverão ser remetidos ao arquivo.   DISPOSITIVO Isso posto, decido julgar IMPROCEDENTES os pedidos deduzidos na Ação Trabalhista (0010160-31.2025.5.03.0186) proposta por CAMILA AUREA DE SOUZA em face de SMARTFIT ESCOLA DE GINASTICA E DANCA S.A., nos termos da fundamentação supra. Defiro à parte autora os benefícios da justiça gratuita. Honorários advocatícios, conforme fundamentação. As partes ficam advertidas de que não cabem Embargos de Declaração para rever fatos, provas, a própria decisão ou, simplesmente, para contestar o que já foi decidido (arts. 77 a 81 e 1.026, § 2º, todos do CPC). Custas, pela parte autora, no importe de R$642,88, calculadas sobre R$32.143,90, valor da causa. Isenções na forma do art. 790-A, da CLT. Intimem-se as partes. Nada mais. BELO HORIZONTE/MG, 14 de abril de 2025. JESSICA GRAZIELLE ANDRADE MARTINS Juíza do Trabalho Substituta

    Intimado(s) / Citado(s)
    - SMARTFIT ESCOLA DE GINASTICA E DANCA S.A.
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