Maria Jose De Freitas e outros x Municipio De Sertaozinho e outros
Número do Processo:
0010996-91.2024.5.15.0125
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRT15
Classe:
AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Grau:
1º Grau
Órgão:
CON2 - Ribeirão Preto
Última atualização encontrada em
21 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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23/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara do Trabalho de Sertãozinho | Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIOPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SERTÃOZINHO 0010996-91.2024.5.15.0125 : MARIA JOSE DE FREITAS : RENOVE - SERVICOS DE CONSTRUCOES E LIMPEZAS LTDA E OUTROS (1) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID a4061b1 proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: I – RELATÓRIO MARIA JOSE DE FREITAS, qualificada na inicial, ajuíza ação trabalhista em face de RENOVE - SERVICOS DE CONSTRUCOES E LIMPEZAS LTDA e MUNICIPIO DE SERTAOZINHO e, em razão dos fatos e fundamentos jurídicos expostos na petição inicial, pediu a condenação da parte reclamada, o segundo réu de forma solidária e/ou subsidiária, ao pagamento das verbas discriminadas na exordial. Postulou, ainda, pela concessão dos benefícios da Justiça Gratuita e, à causa, atribuiu o valor de R$ 162.868,60. As reclamadas apresentaram defesas, arguindo preliminar e, no mérito, refutam todas as vindicações da parte autora, pelas razões de fato e jurídicas que expõem em suas peças defensivas. Realizada audiência, rejeitada a proposta conciliatória, foi concedido prazo para apresentação de réplica e determinada a realização de perícia técnica. O laudo pericial veio aos autos, com manifestação das partes. Na audiência em prosseguimento, novamente rejeitada a conciliação, foi colhido o depoimento da autora e ouvidas duas testemunhas, uma a convite da parte demandante e outra a convite da primeira ré. Sem outras provas, encerrou-se a instrução processual. As partes apresentaram memoriais finais. Prejudicada a tentativa de conciliação. É o RELATÓRIO. II – FUNDAMENTAÇÃO 1. Ilegitimidade passiva – segundo reclamado A legitimidade ad causam é a relação de pertinência subjetiva da parte com a causa de pedir. Portanto, as legitimações ativa e passiva pertencem aos titulares em abstrato das relações jurídicas deduzidas no processo. Tendo a inicial veiculado a pretensão em face do segundo demandado ao argumento de que ele foi tomador dos serviços prestados pela autora, este fato, por si só, já é hábil a legitimá-lo a integrar o polo passivo da demanda, porque a apreciação das condições da ação se faz de forma abstrata, à luz do alegado na inicial. A responsabilidade ou não do segundo réu pelos pleitos formulados na inicial é questão vinculada ao mérito e não ao âmbito das preliminares. Assim sendo, rejeita-se a preliminar arguida. 2. Limitação da condenação aos valores indicados A indicação de valor ao pedido estabelecida no art. 840, § 1º, da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017, não equivale à liquidação do título executivo, inexistindo expressa determinação no referido dispositivo de que o valor estimado dos pedidos esteja acompanhado de espelho de cálculo ou ainda que, na liquidação, ele se constitua um limitador para apuração das importâncias das parcelas pleiteadas. Sendo assim, indefere-se o requerimento constante da defesa. 3. Adicional de insalubridade Para apuração da existência ou não de atividade em condições insalubres, na forma descrita na petição inicial, determinou-se a realização de prova pericial técnica, como exigido no art. 195 da CLT. O Expert responsável pela vistoria, baseado no relato das partes e na análise realizada in loco, apresentou a seguinte conclusão (ID d30f7ce): A reclamante, em exercendo a função de auxiliar de limpeza, TEVE as suas atividades enquadradas segundo a Norma Regulamentadora (NR) no 15, Anexos nos 10 e 14 c.c. subitem 15.3 da Portaria no 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego, como INSALUBRES DE GRAU MÁXIMO (40%), já que em seu labor habitual, permanecia exposta aos efeitos nocivos do agente físico umidade e dos agentes biológicos em condições prejudiciais à sua saúde. Verifica-se que ficou caracterizado o trabalho insalubre da autora por contato com agentes biológicos (grau máximo) pelo trabalho em higienização de instalações sanitárias de uso coletivo de grande circulação, na forma da Súmula nº 448, II do TST, in verbis: II - A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano. O laudo pericial, conquanto impugnado, não foi infirmado por nenhum elemento sério de convicção nos autos. Nenhuma prova foi apresentada que pudesse demonstrar o caráter esporádico e eventual do contado da autora com agentes biológicos, afirmado pela empregadora ré. Ao contrário, a testemunha Francielle Bento de Sousa disse que “trabalhavam em UBSs e os banheiros eram utilizados por todo o público, cerca de bem mais de 70 pessoas por dia”. Desta feita, reconheço o labor em condições insalubres na forma informada pelo Expert. No que tange à base de cálculo, já não restam dúvidas de que o adicional de insalubridade, após a edição da Súmula Vinculante n. 04 do STF, deve ser calculado na forma preconizada no art. 192 da CLT, sobre o salário mínimo, salvo se norma coletiva ou lei expressamente fixarem base de cálculo diversa, o que não é o caso dos autos. Do quanto exposto, condeno a parte reclamada a pagar à reclamante o adicional de insalubridade em grau máximo (40%), adotando-se como base de cálculo o salário mínimo. Os valores pagos a idêntico título deverão ser descontados do importe da condenação. Dada a natureza salarial da parcela e pagamento com habitualidade, são devidos os reflexos em aviso prévio, 13º salários, férias acrescidas de um terço e FGTS + 40%. Os valores alusivos ao FGTS+40% deverão ser depositados em conta vinculada. 4. Jornada de trabalho - horas extras e reflexos – supressão do intervalo para refeição e descanso 4.1 Horas extras e reflexos A parte reclamada trouxe aos autos os controles de jornada da reclamante, que não contêm registros invariáveis de horários de forma a comprometer seu valor probatório, razão pela qual permanece com a parte autora o ônus de comprovar suas alegações. Todavia, a prova oral produzida não lhe favorece, senão vejamos. A testemunha autoral, que trabalhou para a primeira demandada até final de 2022, confirmou que todos os dias laborados eram anotados e que cartão de ponto era registrado ao chegarem para trabalhar e ao fim da jornada. A testemunha de defesa também declarou que o registro de ponto é feito por aplicativo e, segundo ela, o próprio trabalhador, dentro do sistema, tem acesso à folha de ponto. Disse ela também que a autora não trabalhava em sábados e domingos e usufruía uma hora e 15 minutos de intervalo para refeição e descanso. No tocante a eventual alteração dos documentos, com modificação dos registros realizados, tem-se que a prova oral se mostrou dividida, com cada testemunha declarando fatos que favorecem a tese da parte que lhe fez o convite para depor. Destarte, ocorreu o que a doutrina chama de empate de prova ou prova dividida, fenômeno que se resolve com o julgamento desfavorável em face da parte que tinha a incumbência probatória, no caso vertente, a reclamante. Desta feita, não vindo aos autos prova suficiente para infirmar as anotações constantes dos controles de jornada, reconheço que os documentos refletem fielmente a frequência e a jornada cumpridas pela autora. Passa-se à análise da existência de diferenças de horas extras. A reclamante trabalhou em compensação semanal de jornada, quando a sua jornada diária era elastecida de segunda a sexta-feira, para a compensação do sábado não trabalhado. O contrato analisado é posterior à vigência da Lei 13.467/17, sendo aplicável o disposto no parágrafo 6º do artigo 59 da CLT e o parágrafo único do artigo 59-B da CLT, segundo os quais é lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês, e a prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo em questão. Desta forma, válido o acordo de compensação das horas não trabalhadas aos sábados. A parte autora, em réplica, apresentou demonstrativo de diferenças de horas extras. A primeira reclamada manifestou-se sobre o apontamento realizado. Contudo, apenas asseverou, de forma genérica, que os cálculos apresentados são baseados em premissas inconsistentes, sem qualquer comprovação de que a jornada de trabalho superou o limite legal de 44 horas semanais, não indicando objetivamente equívoco na apuração efetuada. Deste modo, por ter apresentado, de forma adequada, o demonstrativo de diferenças, há que se reconhecer a incorreção na quitação das horas extraordinárias. Diante do exposto, condeno a parte reclamada a pagar à reclamante diferenças de horas extras, acrescidas de adicional, em valores a serem apurados em regular liquidação de sentença, por simples cálculos, observando-se os seguintes parâmetros: a) a apuração da quantidade de horas extras será feita mês a mês, observando-se a jornada constante dos cartões de ponto e os dias efetivamente laborados; b) serão consideradas extraordinárias as horas que excederem os limites contratuais dispostos nos cabeçalhos dos cartões; divisor 220; c) as horas extras serão remuneradas com o adicional legal, normativo ou o praticado pela reclamada, o que for mais benéfico; d) apuração do salário-hora mês a mês, com base na remuneração da autora, integrando a base de cálculo todas as parcelas de natureza salarial e pagas com habitualidade (art. 457 da CLT e Súmula n. 264 do C. TST), inclusive o adicional de insalubridade (OJ n. 47 da SDI-1 do C. TST); e) desconsideração, para efeito do cálculo da quantidade de horas extraordinárias, das variações de horário no registro de ponto não excedentes a cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários, sendo que a violação do referido limite importa no cômputo da totalidade do lapso como efetiva jornada de trabalho (parágrafo 1o. do artigo 58 da CLT); f) os valores comprovadamente pagos sob tal título serão compensados; g) para os períodos em que eventualmente não tiverem sido juntados os controles de jornada, deverá ser observada a média da jornada cumprida nos dois meses que antecedem ou sucedem a ausência de juntada dos cartões. Por habituais, são devidos os reflexos em aviso prévio, descansos semanais remunerados, férias acrescidas de 1/3, 13º salário e FGTS+40%. Os valores alusivos ao FGTS+40% deverão ser depositados em conta vinculada. Quando dos cálculos das integrações/reflexos das diferenças de horas extras em DSR’s, deverá ser observado o comando contido na OJ 394 da SDI-I do C. TST. 4.2 Supressão do intervalo intrajornada Em réplica, a parte autora apresentou a existência de dia em que não foi concedida a regular fruição do intervalo para refeição e descanso (12/12/2023), quando a autora cumpriu jornada excedente de seis horas diárias sem a concessão do intervalo intrajornada previsto no art. 71 da CLT. Trata-se de norma de ordem pública, a instituir medida de higiene, saúde e segurança do trabalho e a reparação prevista em caso de sua violação visa garantir o direito à saúde, a todos assegurados pela ordem constitucional (art. 6º, caput, da Constituição Federal). Desta feita, diante da redação do § 4º do art. 71 da CLT, condeno a reclamada ao pagamento do valor correspondente ao período suprimido do intervalo intrajornada, conforme anotações apostas nos controles de ponto, com acréscimo de 50%. Tendo em vista a natureza indenizatória da parcela, indevidos os reflexos postulados. 5. Acidente de trabalho – reparação por danos morais Postula a reclamante indenização por danos morais em razão dos acidentes sofridos no desempenho de suas atividades laborativas. Relata que os infortúnios ocorreram em 3/8/2023 e 22/3/2024, ocasiões em que ela foi vítima de perfuração por agulha contaminada (descartada incorretamente em saco de lixo comum), e teve que passar por mais seis meses de tratamento com coquetéis de medicamentos, o que acarretou desgaste emocional e psicológico. A reclamada impugna a pretensão, asserindo que “existem evidências que demonstram um comportamento reiterado da obreira que refutam suas alegações. Em duas ocasiões distintas, a filha da reclamante fez denúncias formais ao Departamento Pessoal da Reclamada, informando que a obreira, de forma intencional, se perfurava com agulhas para justificar a necessidade de atestados médicos e afastamento do trabalho”. Por esses e demais motivos expostos, requer a improcedência do pedido. Pois bem. A documentação apresentada pela empregadora ré (Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT juntadas sob ID 393d1e0) confirma que os acidentes ocorreram nas datas informadas na peça inicial, durante a execução, pela reclamante, do trabalho desenvolvido para a parte reclamada. Desse modo, o ponto fulcral da controvérsia se resume à análise da culpa. Em casos de acidente do trabalho, típico ou equiparado, deveras conturbado é o tema relativo à culpa do empregador, ante a dicotomia existente em nosso ordenamento jurídico, afeta à aplicação da teorização acerca da responsabilidade subjetiva ou objetiva. O sistema geral de responsabilidade em nosso ordenamento jurídico pátrio está fundado na responsabilidade subjetiva do ofensor, ou seja, para que haja o dever de indenizar, é necessária a demonstração da culpa do causador do prejuízo, pretenso responsável pela reparação. No entanto, junto à responsabilidade subjetiva, em caráter subsidiário, emerge a responsabilidade objetiva, prevista, nas relações privadas, de forma geral, no Código Civil, notadamente no parágrafo único do artigo 927, responsabilidade essa fundada na teoria do risco. Nos estritos termos do artigo do Código Civil em comento, há que se reconhecer a existência de responsabilidade objetiva quando a lei assim determinar ou quando a atividade habitual do agente, por sua própria natureza, implicar riscos para direitos de outrem. Importante frisar, neste ponto, que não há nenhuma antinomia entre a aplicação do artigo 927, § único do Código Civil, arcabouço normativo da teria do risco criado, e o disposto no artigo 7°, XXXVIII, da CF, na medida em que a aplicação da regra civilista aos casos de acidente de trabalho tem o intuito de concretizar os princípios norteadores do Estado Democrático de Direito, notadamente a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. Aliás, o C. STF pacificou o entendimento quanto à possibilidade de responsabilização objetiva do empregador, em caso de danos decorrentes de acidente de trabalho, em sede de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 932. EFETIVA PROTEÇÃO AOS DIREITOS SOCIAIS. POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA DO EMPREGADOR POR DANOS DECORRENTES DE ACIDENTES DE TRABALHO. COMPATIBILIDADE DO ART. 7,XXVIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL COM O ART. 927, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL. APLICABILIDADE PELA JUSTIÇA DO TRABALHO. 1. A responsabilidade civil subjetiva é a regra no Direito brasileiro, exigindo-se a comprovação de dolo ou culpa. Possibilidade, entretanto, de previsões excepcionais de responsabilidade objetiva pelo legislador ordinário em face da necessidade de justiça plena de se indenizar as vítima sem situações perigosas e de risco como acidentes nucleares e desastres ambientais. 2.O legislador constituinte estabeleceu um mínimo protetivo ao trabalhador no art. 7º,XXVIII, do texto constitucional, que não impede sua ampliação razoável por meio de legislação ordinária. Rol exemplificativo de direitos sociais nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal. 3. Plena compatibilidade do art. 927, parágrafo único, do Código Civil com o art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, ao permitir hipótese excepcional deresponsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor implicar, por sua natureza, outros riscos, extraordinários e especiais. Possibilidade de aplicação pela Justiça do Trabalho. 4. Recurso Extraordinário desprovido. TEMA 932. Tese de repercussão geral: "O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade".(STF - RE: 828040 DF 0000438-80.2010.5.24.0002, Relator: ALEXANDRE DE MORAES,Data de Julgamento: 12/03/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 26/06/2020 No que tange à definição do que seria atividade de risco, doutrina e jurisprudência dominantes têm entendido que a cláusula geral de responsabilidade civil objetiva, prevista no Diploma Civilista, é um conceito indeterminado, cujos contornos devem ser fixados de acordo com o caso concreto, pela interpretação do julgador. No presente caso, entendo que não é possível o reconhecimento de responsabilidade objetiva da parte reclamada sob a ótica do artigo 927 do Código Civil, pois a execução das tarefas da reclamante, na função de auxiliar de limpeza, não traz risco potencial na ocorrência de acidentes, de forma a impor à obreira um ônus maior do que aos demais membros da coletividade. Não se tratando de atividade de risco, a responsabilidade civil da reclamada baseia-se na teoria subjetivista, cabendo resultar demonstrada a prática de ato ilícito, antijurídico e culpável do agente causador e o nexo de causalidade respectivo, bem como a culpa da empregadora em face do acidente sofrido pelo trabalhador. Vale trazer à lume os ensinamentos do ilustre SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA sobre a obrigação do empregador de conferir aos seus empregados um meio ambiente de trabalho hígido e seguro: “(...) exige-se um dever fundamental do empregador de observar uma regra genérica de diligência, uma postura de cuidado permanente, a obrigação de adotar todas a precauções para não lesar o empregado. (…) O dever geral de cautela assume maior relevância jurídica na questão do acidente do trabalho, porquanto o exercício da atividade da empresa inevitavelmente expõe a riscos o trabalhador, o que de antemão já aponta para a necessidade de medidas preventivas, tanto mais severas quanto maior o perigo da atividade”. in Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, São Paulo: LTr, 2005, p. 169/170). Sob o fundamento de que o acidente do trabalho é um dos casos de culpa presumida do réu, vem a jurisprudência trabalhista acolhendo a tese de que a ele cabe o ônus de demonstrar a inexistência de culpa ou a culpa concorrente do autor. Nesse sentido, a decisão que ora se transcreve, demonstrando a adoção da inversão do ônus da prova em favor do empregado: “a apuração da culpa no acidente de trabalho deve adequar-se à especial proteção conferida pelo ordenamento jurídico ao trabalhador. Essa proteção se concretiza, dentre outras formas, pela inversão do ônus da prova, quando verificada a impossibilidade de sua produção pelo empregado e a maior facilidade probatória do empregador. (...) Aqui, vige o princípio da aptidão para a prova, determinando que esta seja produzida pela parte que a ela tem acesso, quando estiver fora do alcance da parte contrária. (...) seria insensato exigir dos Reclamantes a comprovação da existência de culpa da empresa no eventus damni, sob pena de desvestir o instituto da responsabilidade civil de toda sua eficácia e de negar vigência à garantia constitucional do art. 7º, inciso XXVIII. Cabia à empresa, e, não, aos Reclamantes, desvencilhar-se do ônus da prova da inexistência da culpa. Como não se desonerou do ônus que milita em seu desfavor, presume-se a culpa, surgindo o conseqüente dever de indenizar o trabalhador pelo prejuízo sofrido.” (TST RR - 930/2001-010-08-00; DJ - 19/03/2004; Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi). Desse ônus, no entanto, a parte reclamada não se desvencilhou, pois, pelo conjunto probatório existente nos autos, verifica-se que não foi produzida prova suficiente demonstrar que o acidente ocorreu por ato inseguro ou ato voluntário da trabalhadora. A testemunha de defesa confirmou que a reclamante já se acidentou no trabalho, o que aconteceu quando ela foi recolher o lixo e perfurou o dedo com agulha. Os prints de troca mensagens em aplicativo reproduzidos em contestação não são, por si só, hábeis para demonstração da tese de defesa de que a autora perfurou o dedo com agulha de forma intencional, para justificar seu afastamento do trabalho. A autora, em depoimento pessoal, disse que o telefone utilizado na troca de mensagens não é o de sua filha, como sustentado em defesa. Desta feita, há que se concluir que o ambiente de trabalho inseguro concorreu, de forma direta e efetiva, para o resultado lesivo e não supostas atitudes imprudentes ou intencionais da trabalhadora vitimada. Descurou-se a empregadora, assim, de seu dever, descumprindo normas de segurança, especialmente a prevista no art. 157, I, da CLT, não havendo como se afastar a sua culpa no infortúnio laborativo, eis que permitiu que o trabalho fosse realizado em condições inseguras. Dessarte, havendo nexo causal e culpa da reclamada, com fundamento nos arts. 186 e 927 do Código Civil, impõe-se o dever de reparar os danos causados em razão do acidente de trabalho sofrido pela reclamante. 5.1 Danos morais É evidente a angústia, descontentamento e inquietudes várias pelas quais a reclamante passou em razão da investigação de sua condição de saúde em razão das perfurações sofridas, com tratamento de mais de seis meses com coquetéis de medicamentos, já que é cediço que doenças graves, algumas fatais, têm como meio de contaminação essa via. Desta feita, acredito que o dano ao patrimônio imaterial está plenamente caracterizado. Deste modo, com fundamento nos artigos 223-B e seguintes da CLT, observando os critérios da gravidade da conduta praticada, a natureza do bem jurídico tutelado, a extensão do dano causado e sua repercussão no universo jurídico da vítima, a capacidade econômica das partes, os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e investidura fática, bem como o caráter punitivo, pedagógico e compensatório da medida (art. 223-G da CLT c/c art. 944, do CC /02), arbitro a indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A atualização monetária sobre a reparação por dano moral incidirá apenas a partir da data da presente sentença, que estabeleceu o valor da condenação. Nesse sentido, o entendimento da Súmula 439 do TST. 6. Responsabilidade do segundo reclamado A documentação acostada demonstra que foi firmado contrato de natureza civil entre primeira reclamada e segundo reclamado que tem por objeto a prestação de serviços de limpeza (ID 8b20063). Incontroverso que reclamante prestou serviços ao segundo reclamando. Pois bem. O Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida nos autos da ADC nº 16, declarou que é constitucional o artigo 71, § 4º, da Lei 8.666/93, afirmando que, nos contratos firmados com a administração pública, a inadimplência negocial do contratado não transfere automaticamente ao contratante os encargos trabalhistas, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato. Importante se pontuar que, no referido julgamento, o Supremo Tribunal Federal não excluiu a possibilidade de responsabilização subsidiária do ente público, mas apenas impediu que essa responsabilização fosse calcada no mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do prestador de serviços, sob pena de se negar vigência, ainda que implicitamente, ao art. 71, §1º, da Lei 8.666/93, então vigente. Nesse contexto, a responsabilização do ente público decorre do descumprimento de sua obrigação legal de fiscalizar a execução do contrato de prestação dos serviços. Na mesma linha, a redação da Súmula 331/TST que foi alterada pelo Col. TST, incluindo o item V: “Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada”. Com o advento da nova Lei de Licitações, Lei nº 14.133/2021, que revogou a antiga Lei nº 8.666/93 a partir de 30.12.2023, houve previsão expressa quanto à responsabilidade subsidiária do ente público pelos encargos trabalhistas em casos de contratos de serviços contínuos de mão de obra, se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações pelo contratado, nos termos do art. 121, §2º: Art. 121. Somente o contratado será responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato. § 1º A inadimplência do contratado em relação aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transferirá à Administração a responsabilidade pelo seu pagamento e não poderá onerar o objeto do contrato nem restringir a regularização e o uso das obras e das edificações, inclusive perante o registro de imóveis, ressalvada a hipótese prevista no § 2º deste artigo. § 2º Exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, a Administração responderá solidariamente pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado. Por fim, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 1.298.647 (Tema 1118 de Repercussão Geral) em 13 de fevereiro de 2025, o Supremo Tribunal Federal – STF consolidou o entendimento de que a responsabilização subsidiária da Administração Pública por débitos trabalhistas inadimplidos por empresas terceirizadas exige a comprovação de conduta culposa do ente público na fiscalização do contrato. Ademais, fixou-se que o ônus da prova dessa omissão cabe ao trabalhador terceirizado, que deve demonstrar a falha ou ausência de fiscalização por parte da Administração. Foi fixada a seguinte tese: 1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ele invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. 2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo. 3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º- A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior. No caso em análise, a despeito da documentação acostada, ficou demonstrada a exposição da obreira a ambiente de trabalho inseguro, que concorreu, de forma direta e efetiva, para os acidentes de trabalho noticiados nos autos. Além disso, ficou demonstrado também o labor em condições insalubres em grau acima do quitado ao longo do contrato. O item "3" da Tese acima referida dispõe que "3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974." Sendo assim, há que se concluir que não houve supervisão efetiva do contrato de prestação de serviços firmado entre as reclamadas, vez que não resultou demonstrada a adoção de qualquer medida pelo tomador dos serviços quanto às condições inseguras de labor que resultaram na perfuração do dedo da autora por agulha dentro do posto de saúde do município, em duas ocasiões. Destarte, demonstrado que o ente público tomador dos serviços não cumpriu com seu dever de fiscalização do contrato de prestação de serviços, deverá responder, de forma subsidiária, pelos créditos acolhidos na presente decisão. 7. Benefícios da justiça gratuita A justiça gratuita, regulada na CLT em seu artigo 790, §§ 3º e 4º (presunção legal absoluta de miserabilidade), possibilita a isenção de despesas processuais (incisos do § 1º do art. 98 do CPC) ao reclamante que comprove perceber salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. A comprovação da hipossuficiência, para o fim de obtenção do benefício, pode também ser realizada mediante afirmação de pobreza, com a declaração de pessoa natural interessada ou mediante afirmação de advogado detentor de poderes específicos, conforme artº.1º, caput, da Lei 7.115/83 e art. 99, §3º, do CPC, normas aplicáveis ao processo do trabalho por força do art. 769 da CLT e do art. 15 do CPC. Contudo, no caso, a presunção que emana da declaração é uma presunção relativa da miserabilidade. Deste modo, apresentada a declaração, como no presente caso, cabe à parte contrária formular as devidas impugnações, acompanhadas de elementos probatórios aptos a elidirem a presunção que decorre da afirmação de pobreza, na medida em que fato obstativo do direito vindicado (CLT, art. 818, II). Na hipótese em apreço, não havendo prova suficiente em contrário, prevalece a declaração apresentada para os efeitos comprovação da hipossuficiência. Assim, defiro os benefícios da justiça gratuita à parte reclamante. 8. Honorários periciais Fixo os honorários periciais em R$ 2.750,00, a cargo da parte reclamada, sucumbente na pretensão objeto da perícia (Art. 790-B da CLT). O pagamento deverá ser efetuado no prazo a ser assinalado pelo Juízo da execução, devidamente atualizado. Eventuais valores depositados a título de honorários prévios deverão ser deduzidos do valor ora fixado. 9. Honorários advocatícios Honorários sucumbenciais ora fixados em 10% sobre o valor de liquidação da sentença (pedidos total ou parcialmente procedentes), devidamente atualizados, em favor da parte autora (artigo 791-A, caput da CLT). 10. Recolhimentos previdenciários e imposto de renda Recolhimentos fiscais e previdenciários nos termos da Súmula 368 do C. TST, com redação dada em 28/09/2017, através da Res. 219/2017. 11. Juros e correção monetária Diante dos parâmetros definidos na ADC 58 e do advento da Lei 14.905/2024, na fase pré-judicial aplica-se o IPCA + TRD, sendo que, na fase judicial, incide apenas a taxa SELIC a partir do ajuizamento e até 29.08.2024. A partir de 30.08.2024, na fase judicial, aplica-se o IPCA (art. 389, parágrafo único, CC/02), mais juros de mora que corresponderão ao resultado da subtração entre a taxa SELIC - IPCA (art. 406, §1°, CC/02), com possibilidade de não incidência (taxa 0), caso a taxa legal apresente resultado negativo, nos termos do art. 406, §3° do CC/02. 12. Dedução Defere-se a amortização requerida pela reclamada, desde que se refira a pagamento dos mesmos títulos deferidos na presente decisão e constantes de recibos de pagamentos juntados com a defesa. III - DISPOSITIVO ISSO POSTO, decide a JUSTIÇA DO TRABALHO, pela 2ª Vara do Trabalho de Sertãozinho/SP, afastar a preliminar arguida e julgar PROCEDENTES EM PARTE os pedidos, para condenar RENOVE - SERVICOS DE CONSTRUCOES E LIMPEZAS LTDA a pagar à reclamante MARIA JOSE DE FREITAS a importância correspondente às seguintes verbas, observados os estritos termos da fundamentação, que integra este dispositivo para todos os efeitos legais: diferenças de adicional de insalubridade e reflexos; diferenças de horas extras, acrescidas de adicional, e reflexos; indenização correspondente ao período suprimido do intervalo intrajornada, conforme anotações apostas nos controles de ponto, com acréscimo de 50%; indenização por danos morais. Honorários advocatícios nos termos da fundamentação. O segundo reclamado, MUNICIPIO DE SERTÃOZINHO, responderá, de forma subsidiária, pelos créditos acolhidos na presente decisão. Os valores deverão ser apurados em regular liquidação de sentença, por simples cálculos e sobre eles incidirão, na forma da lei, correção monetária e juros de mora, nos termos da fundamentação. Recolhimentos fiscais e previdenciários nos termos da Súmula 368 do C. TST, com redação dada em 28/09/2017, através da Res. 219/2017. No prazo a ser assinalado pelo juízo da execução, deverá a parte reclamada efetuar o pagamento dos honorários periciais remanescentes. A natureza jurídica das parcelas deferidas na presente decisão observará o disposto no art. 28 da Lei 8.212/91. Custas, pela reclamada, no importe de R$ 800,00, calculadas sobre o valor de R$ 40.000,00, arbitrado provisoriamente à condenação, devendo ser recolhidas no prazo legal. Intimem-se. MARIA TERESA DE OLIVEIRA SANTOS Juíza do Trabalho Substituta
Intimado(s) / Citado(s)
- RENOVE - SERVICOS DE CONSTRUCOES E LIMPEZAS LTDA