Divonsir Emanoel Ferreira Junior x Fundo De Investimento Em Direitos Creditorios Aloha Ii e outros
Número do Processo:
0012979-67.2023.8.16.0001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPR
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
4ª Vara Cível de Curitiba
Última atualização encontrada em
18 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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10/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 4ª Vara Cível de Curitiba | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - FORO CENTRAL DE CURITIBA 4ª VARA CÍVEL DE CURITIBA - PROJUDI Atendimento Whatsapp (41) 98840-3652 - Av. Cândido de Abreu, 535 - 4º andar - Fórum Cível I - Centro Cívico - Curitiba/PR - CEP: 80.530-906 - Fone: (41) 98840-3652 - E-mail: oficios4vcctba@gmail.com Autos nº. 0012979-67.2023.8.16.0001 Processo: 0012979-67.2023.8.16.0001 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Contratos Bancários Valor da Causa: R$22.334,46 Autor(s): DIVONSIR EMANOEL FERREIRA JUNIOR Réu(s): CREDITAS SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO S.A. FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS ALOHA II 1. RELATÓRIO Trata-se de ação revisional de contrato bancário, ajuizada por DIVONSIR EMANOEL FERREIRA JUNIOR em face de CREDITAS SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO S.A. A parte autora alega que: a) celebrou um contrato de financiamento de veículo com o réu, para a aquisição de um VOLKSWAGEN, Modelo JETTA, ano 2008/2009, mediante o pagamento de uma entrada de R$ 16.500,00 e 48 parcelas de R$ 1.248,77; b) após o início do cumprimento do contrato, constatou a existência de diversas abusividades, como a cobrança de juros remuneratórios no patamar de 3,13% ao mês e 52,20% ao ano, valor que alega ser superior à taxa média de mercado para a época da contratação, que seria de 2,28% ao mês e 27,43% ao ano; c) o contrato viola o dever de informação, previsto nos artigos 6º, III, 46 e 52 do CDC, ao não estipular de forma clara o percentual da capitalização, mencionando apenas a possibilidade de forma genérica; d) a previsão de capitalização diária, sem a informação da respectiva taxa, impede o controle prévio do consumidor sobre os encargos do contrato; e) o contrato prevê a cobrança de tarifas administrativas, especificamente Tarifa de Cadastro no valor de R$ 1.100,00 e Registro de Contrato no valor de R$ 350,00; f) a Tarifa de Cadastro beneficia exclusivamente a instituição financeira, que tem interesse em analisar o crédito, sendo, portanto, uma cobrança indevida por um serviço não prestado em favor do consumidor; g) a despesa com Registro de Contrato é ilegal por não haver comprovação do serviço prestado e por configurar onerosidade excessiva. Com base nisso, requer: i) liminarmente, a autorização para realizar o depósito judicial do valor incontroverso das parcelas, ou, alternativamente, do valor integral; ii) o afastamento da capitalização de juros; iii) a revisão da taxa de juros adotada, a fim de que corresponda à média de mercado publicada pelo Banco Central à época ou, de forma alternativa, ao patamar máximo de 12% ao ano; iv) o expurgo da Tarifa de Cadastro e da Tarifa de Registro de Contrato, com a devolução em dobro dos valores pagos. Indeferido o pedido de depósito do valor incontroverso e concedida a justiça gratuita ao autor (mov. 10.1). Em contestação (mov. 16.1), a ré CREDITAS SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO defende, em suma, as seguintes teses: a) preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, pois o crédito foi transferido por endosso em 03.06.2022 para o FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS ALOHA II, que passou a ser o credor da relação e o responsável pelo atendimento, conforme previsto na cláusula 10.4 do contrato, requerendo a extinção do feito ou a alteração do polo passivo; b) a ausência dos requisitos para a concessão da justiça gratuita, argumentando que a assunção de uma parcela mensal de R$ 1.248,77 para financiar um veículo e a contratação de advogado particular são incompatíveis com a alegação de hipossuficiência; c) a plena validade e legalidade do contrato, que foi celebrado de forma digital com a anuência expressa do autor a todas as cláusulas, após ter tido a oportunidade de simular e analisar as condições, não havendo vício de consentimento ou abusividade pelo simples fato de ser um contrato de adesão; d) a inexistência de abusividade na taxa de juros remuneratórios (3,13% a.m. e 44,75% a.a.), pois estava de acordo com a média praticada no mercado na época da contratação, conforme consulta ao site do Banco Central; e) a legalidade da capitalização de juros, pois foi expressamente pactuada e a taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da mensal, o que é suficiente para sua cobrança, conforme entendimento do STJ (REsp 973.827/RS e Súmula 539); f) a legalidade da cobrança da Tarifa de Cadastro, por estar prevista em resolução do BACEN e ser legitimada pelo STJ (Súmula 566), remunerando o serviço de análise de crédito no início do relacionamento, não tendo o autor comprovado a existência de relação anterior; g) a validade da cobrança da Tarifa de Registro de Contrato, pois o serviço de inscrição do gravame junto ao Detran foi efetivamente prestado, sendo uma exigência legal (art. 1.361, §1º, do CC) e amparada pelo STJ em recurso repetitivo (Tema 958); i) a improcedência do pedido de repetição de indébito, pois não houve cobrança indevida e, ainda que houvesse, não ficou demonstrada a má-fé da instituição financeira; h) a necessidade de respeito à boa-fé contratual e ao princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda), uma vez que o autor anuiu livremente com as condições que lhe foram propostas. Em impugnação à contestação (mov. 30.1), a parte autora defende, em suma, as seguintes teses: a) em relação à ilegitimidade passiva, alega que não foi notificada sobre o endosso do crédito e, por essa omissão, a ré (Creditas) deve responder solidariamente à demanda, requerendo a inclusão do FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS ALOHA II no polo passivo em caráter litisconsorcial; b) quanto à impugnação à justiça gratuita, sustenta que o benefício já foi deferido pelo juízo e que os documentos juntados na inicial comprovam sua hipossuficiência, mesmo sendo representado por advogado particular; c) reitera a ilegalidade da Tarifa de Cadastro, pois a cobrança só seria permitida em contratos celebrados até 30.04.2008, e da taxa de Registro de Contrato, pois a ré não comprovou a efetiva prestação do serviço, conforme exige o Tema 958 do STJ; d) defende a validade de sua planilha de cálculos, elaborada por contador habilitado, e a necessidade de o débito ser recalculado pelo "Método Gauss" (juros simples) em oposição à Tabela Price (juros compostos) utilizada pela ré; e) sustenta que o princípio do pacta sunt servanda deve ser mitigado, pois o contrato é de adesão e o consumidor não tem a oportunidade de discutir suas cláusulas, sendo colocado em desvantagem. Indeferida a preliminar de impugnação à justiça gratuita e determinada a citação do Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Aloha II para contestar a ação (mov. 59.1). Em contestação (mov. 62.1), a ré FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS ALOHA II, defende, em suma, as seguintes teses: a) sustenta a legalidade do contrato e a força obrigatória de suas cláusulas (pacta sunt servanda), afirmando que o autor celebrou o negócio em 02.06.2022 de livre e espontânea vontade, sem qualquer vício de consentimento, tratando-se de um ato jurídico perfeito; b) refuta a alegação de que o contrato é de adesão, pois o autor tinha a liberdade de procurar outras instituições financeiras e não foi coagido a contratar, tendo negociado as cláusulas principais como valor, prazo e taxas; c) defende a legalidade dos juros remuneratórios pactuados, afirmando que as instituições financeiras não se submetem aos limites da Lei de Usura (Súmula 596/STF) e que a taxa cobrada não é abusiva quando comparada à média de mercado, sendo justificada também pelo risco da operação, dado o ano de fabricação do veículo (2008/2009); d) assevera a legalidade da capitalização mensal de juros, pois foi expressamente pactuada e é permitida em contratos celebrados após 31.03.2000 (MP 2.170-36/2001), sendo que a previsão de taxa anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para caracterizar tal pacto, conforme tese fixada pelo STJ (REsp 973.827/RS); e) alega a legalidade da Tabela Price como sistema de amortização, argumentando que não implica em anatocismo e que o "Método de Gauss" proposto pelo autor é inadequado para operações financeiras; f) sustenta a legalidade da Tarifa de Cadastro, com base na Resolução 3.518/2007 do BACEN, e da Tarifa de Registro de Contrato (R$ 350,00), por ser uma exigência legal para a constituição da garantia (art. 1.361, CC) e por ter o serviço sido efetivamente prestado, com o devido registro do gravame no Detran-PR; g) impugna o pedido de repetição do indébito, pois não houve cobrança ilegal ou má-fé que justifique a devolução de valores, muito menos em dobro; h) contesta os cálculos apresentados pelo autor, por serem unilaterais e desconsiderarem as cláusulas contratuais livremente pactuadas. Mesmo devidamente intimado, o autor deixou de apresentar impugnação à contestação (mov. 66). Em decisão saneadora (mov. 89.1), foi rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva e determinada a inversão do ônus da prova. As partes deixaram de pugnar pela produção de outras provas (movs. 92, 93 e 94). É o relatório. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Capitalização de juros A autora requer a revisão do empréstimo celebrado com o banco réu, a fim de que seja afastada a capitalização dos juros remuneratórios, sob o argumento de que, embora haja cláusula prevendo a capitalização na forma diária, não houve especificação da taxa aplicável. Sem razão, contudo. A matéria é pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça, que, por meio da Súmula 539, firmou o entendimento de que a capitalização com periodicidade inferior à anual é lícita nos contratos celebrados com instituições do Sistema Financeiro Nacional após 31 de março de 2000, desde que expressamente pactuada: Súmula 539. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. Adicionalmente, a Súmula 541 da mesma Corte esclarece que a pactuação pode ser identificada pela simples indicação de uma taxa anual superior ao duodécuplo da mensal: Súmula 541. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. No caso em apreço, a análise da Cédula de Crédito Bancário AF00059477 (movs. 1.9 e 16.8) evidencia a existência de pactuação expressa quanto à capitalização de juros e ao percentual incidente. Com efeito, o contrato questionado na presente demanda contém previsão expressa, em sua cláusula 2.1, de que “O Emitente pagará à Credora os valores recebidos em razão desta CCB, acrescidos de juros capitalizados à Taxa de Juros e na forma de pagamento descritas no Quadro Resumo” (mov. 1.9, grifou-se). Além disso, a taxa de juros remuneratórios incidente sobre a operação foi especificada no quadro 4, item “l”, do instrumento contratual, no percentual de 44.75% a.a. e 3.13% a.m. Dessa forma, havendo previsão contratual explícita no instrumento questionado, a capitalização de juros é legítima, não havendo que se falar em ilegalidade ou abusividade nesse ponto. 2.2. Abusividade da taxa de juros A autora requer a revisão da taxa de juros adotada, a fim de que corresponda à média de mercado publicada pelo Banco Central à época ou, de forma alternativa, ao patamar máximo de 12% ao ano. Sustenta que o percentual adotado de 3,13% ao mês e 52,20% ao ano é abusivo, por ser significativamente superior à média de mercado para a época da contratação. Com razão. A revisão das taxas de juros remuneratórios em contratos bancários é uma medida excepcional, admitida apenas quando fica cabalmente demonstrada uma abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada, conforme o artigo 51, §1º, III, do Código de Defesa do Consumidor. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, estabeleceu que, embora as instituições financeiras não se submetam à Lei de Usura e a estipulação de juros acima de 12% ao ano não seja, por si só, abusiva, o controle judicial é possível em situações excepcionais: ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (grifou-se) Para essa análise, a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil (BACEN) serve como principal parâmetro. Conforme destacado no voto da Ministra Nancy Andrighi no referido recurso, a aferição da abusividade não é estanque, mas a jurisprudência tem considerado excessivas as taxas que superam "uma vez e meia", o dobro ou o triplo da média: (...) A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (REsp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos [...] (STJ, REsp nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22.10.2008; grifou-se). Seguindo essa orientação, o Tribunal de Justiça do Paraná consolidou o entendimento de que se presumem abusivos os juros que ultrapassam uma vez e meia a taxa média de mercado para operações da mesma natureza e período: PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE QUANTIA INDEVIDA – EMPRÉSTIMOS PESSOAIS – ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PACTUADOS - SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS. [...] 2.3. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DE TAXAS DE JUROS - PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS SEGUNDO AS TAXAS PACTUADAS NOS CONTRATOS – BANCO QUE NÃO COMPROVOU QUE NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO A PARTE MUTUÁRUA SE ENCONTRAVA PROTESTADA OU INSCRITA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES – ABUSIVIDADE CONFIGURADA LIMITAÇÃO É MEDIDA QUE SE IMPÕE EM CASO DE TAXAS PACTUADAS QUE SUPERAM A UMA VEZ E MEIA A MÉDIA APURADA PELO BACEN ENTRE AS INSTITUIÇÕES ATUANTES NO MERCADO DE CRÉDITO – NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. 3. DISPOSITIVO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (TJPR - 16ª Câmara Cível - 0020119-41.2022.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO MASSANEIRO - J. 25.06.2025) – grifei. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO COM PEDIDO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. PEDIDO PARCIALMENTE PROCEDENTE. INSURGÊNCIA DO AUTOR. [...] (B) JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXAS ADEQUADAS À NATUREZA DA OPERAÇÃO, NO MESMO PERÍODO, QUE NÃO ULTRAPASSAM SIGNIFICATIVAMENTE A MÉDIA DE MERCADO, PRATICADAS EM MENOS DE UMA VEZ E MEIA. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. ORIENTAÇÃO DESTA CÂMARA. [...] RECURSO NÃO PROVIDO (TJPR - 15ª Câmara Cível - 0000587-54.2022.8.16.0026 - Campo Largo - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ CEZAR NICOLAU - J. 07.06.2025) – grifei. O caso dos autos trata de um empréstimo pessoal não consignado à pessoa física, destinado ao financiamento de um veículo, de modo que deve ser verificada a taxa de juros média de mercado relativa à série nº 20749 do BACEN (“Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos”), para que se averigue eventual abusividade contratual[1]. Trata-se do contrato nº AF00059477 (movs. 1.9 e 16.8), que contém taxa de juros pactuada de 44,75% ao ano. A celebração se deu em junho/2022 e, nessa época, a média de mercado era de 27,43% ao ano. Ou seja, o contrato adotou uma taxa cerca de 1,63x maior. Da análise acima, constata-se que os juros aplicados são significativamente superiores aos índices usualmente praticados em operações da mesma natureza. Está suficientemente constatada, portanto, a abusividade na taxas de juros contratada, razão pela qual impõe-se a revisão contratual, de modo a adequá-la à taxa média de mercado vigente na época da contratação. Por consequência, a diferença entre as parcelas pagas e as parcelas revisadas deve ser restituída ao autor, com correção monetária pelo IPCA desde a data de cada pagamento indevido, até a citação, momento a partir do qual será aplicada apenas a taxa SELIC, que já engloba tanto a correção monetária quanto os juros moratórios, nos termos dos artigos 389, parágrafo único, e 406, § 1º, do Código Civil. 2.3. Tarifa de cadastro O autor requer o expurgo da Tarifa de Cadastro, sob o argumento de que ela beneficia exclusivamente a instituição financeira, que tem interesse em analisar o crédito, sendo, portanto, uma cobrança indevida por um serviço não prestado em favor do consumidor. Sem razão, contudo. A questão foi definitivamente pacificada no julgamento do Recurso Especial nº 1.251.331/RS (Tema Repetitivo nº 620), que estabeleceu a legalidade da cobrança, desde que realizada uma única vez, no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. O acórdão paradigma reconheceu que a referida tarifa remunera um serviço específico e essencial para o início da relação contratual bancária, cobrindo os custos destinados à "realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao início de relacionamento". Nesse sentido: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIVERGÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. RECURSOS REPETITIVOS. CPC, ART. 543-C. TARIFAS ADMINISTRATIVAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO (TAC), E EMISSÃO DE CARNÊ (TEC). EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL. COBRANÇA. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. MÚTUO ACESSÓRIO PARA PAGAMENTO PARCELADO DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF). POSSIBILIDADE. [...] 7. Permanece legítima a estipulação da Tarifa de Cadastro, a qual remunera o serviço de "realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao inicio de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente" (Tabela anexa à vigente Resolução CMN 3.919/2010, com a redação dada pela Resolução 4.021/2011). [...] - 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. (REsp n. 1.251.331/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 28/8/2013, DJe de 24/10/2013) – grifei. Tal entendimento foi posteriormente cristalizado na Súmula 566 do STJ, que reitera: “Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”. No caso, a referida tarifa está expressamente prevista no quadro 4, item “d1”, do financiamento discutido (movs. 1.9 e 16.8), o qual, segundo o banco réu, se trata do primeiro contrato de crédito firmado entre as partes – o que justificaria a cobrança da Tarifa de Cadastro. Tal informação não foi especificamente infirmada pela parte autora, que se limitou a impugná-la genericamente em réplica à contestação (mov. 30.1), sem apresentar prova da existência de vínculo contratual anterior. Assim, como o autor não se desincumbiu do ônus de demonstrar a preexistência de relação contratual, prevalece a tese de que a cobrança da tarifa ocorreu no início do vínculo, atendendo ao requisito estabelecido pelo STJ. Portanto, impõe-se a manutenção da tarifa impugnada. 2.4. Tarifa de registro de contrato Por fim, o autor requer o expurgo da despesa com Registro de Contrato, sob o argumento de que o banco não comprovou a efetiva prestação do serviço nesse valor e de que se trata de oneração excessiva sobre o consumidor. Sem razão, contudo. A matéria foi objeto de análise pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo (REsp nº 1.578.553/SP - Tema 958), que entendeu pela validade da cobrança, condicionando-a a dois requisitos: a efetiva prestação do serviço e a ausência de onerosidade excessiva. Com efeito, foram fixadas as seguintes teses: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. (grifou-se). No presente caso, ambos os requisitos estão preenchidos. Primeiramente, restou comprovada a efetiva prestação do serviço, consistente no registro do gravame junto ao Detran/PR, conforme demonstram os documentos acostados nos movs. 16.7, 62.3, 62.4 e 62.5. Trata-se, inclusive, de serviço indispensável à formalização do contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária, cuja constituição, por imposição legal, depende do registro do instrumento contratual. A exigência decorre do art. 1.361, § 1º, do Código Civil, que estabelece: Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor. § 1 o Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro. Em segundo lugar, não se verifica onerosidade excessiva. O valor cobrado, de R$ 350,00, é compatível com o previsto pelo próprio Detran/PR no art. 9º do Edital de Credenciamento nº 001/2018, segundo o qual “Para cada contrato registrado no DETRAN-PR, fica estabelecido o PREÇO PÚBLICO com o valor de R$350,00 (trezentos e cinquenta reais) a ser cobrado pelo serviço de registro” (mov. 62.4). Nesse sentido: AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] (D) TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. SERVIÇO EFETIVAMENTE PRESTADO. VALOR MÓDICO. [...] A cobrança da tarifa de registro do contrato, no valor de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), foi expressamente prevista no contrato (mov. 1.8; item B.9). Mediante a análise do documento juntado no mov. 13.11 e a consulta pública no portal eletrônico do DETRAN-PR, comprova-se que o réu promoveu, em momento anterior, o registro do contrato de alienação fiduciária. Não é necessária comprovação por recibo do valor especificamente cobrado pelo órgão de trânsito para o registro, mesmo porque o valor da tarifa é estipulado no momento da contratação, previamente à execução do registro. Basta a demonstração de que o valor da tarifa não é abusivo. Comprovada a prestação do serviço de registro do contrato e não verificada a onerosidade excessiva no valor da tarifa cobrada (R$ 350,00), que corresponde a menos de dois por cento do custo total da operação, há de ser reconhecida a validade da tarifa de registro prevista no contrato (TJPR - 15ª Câmara Cível - 0028115-70.2024.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ CEZAR NICOLAU - J. 07.06.2025) – grifei. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES.RECURSO DA AUTORA. TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. TARIFA EXPRESSAMENTE PACTUADA. PROVA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA. ENTENDIMENTO DO STJ NO RECURSO REPETITIVO RESP Nº 1.578.553. PREVISÃO CONTRATUAL CONFORME ART. 490 DO CÓDIGO CIVIL. [...] No caso dos autos, o valor cobrado à título de tarifa de registro foi de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), valor que não se mostra abusivo, tendo sido expressamente contratada e, no início da relação, entre as partes. Nesse viés, possível a cobrança da Taxa de Registro do Contrato, desde que pactuada, por força do disposto no art. 490 do Código Civil, que dispõe que: “Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição. ” Outrossim, verifico que o serviço de Registro de Contrato foi efetivamente prestado, considerando que o gravame foi registrado no órgão de trânsito, passando a constar no documento do veículo, havendo, também, a modificação de titularidade do bem, conforme se extrai da documentação de mov. 23.4 (TJPR - 13ª Câmara Cível - 0004846-41.2023.8.16.0064 - Castro - Rel.: DESEMBARGADORA ROSANA ANDRIGUETTO DE CARVALHO - J. 30.05.2025) – grifei. Dessa forma, comprovada a indispensável e efetiva prestação do serviço de registro e não sendo o valor cobrado abusivo, a manutenção da tarifa é medida que se impõe. 3. DISPOSITIVO Do exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, a fim de: a) determinar a revisão do contrato nº AF00059477 (movs. 1.9 e 16.8), com a readequação da taxa de juros remuneratórios à média de mercado na época da contratação, correspondente a 27,43% ao ano; b) condenar as rés, solidariamente, à restituição simples da diferença entre os juros originalmente pagos e os valores ajustados conforme a revisão determinada, com correção monetária pelo IPCA desde a data de cada pagamento indevido, até a citação, momento a partir do qual será aplicada apenas a taxa SELIC, que já engloba tanto a correção monetária quanto os juros moratórios, nos termos dos artigos 389, parágrafo único, e 406, § 1º, do Código Civil. Dada a sucumbência recíproca, tanto o autor quanto os réus devem arcar com 50% das custas, despesas processuais e dos honorários de sucumbência, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, tendo em vista os critérios elencados pelo art. 85, § 2º, CPC, especialmente o tempo de duração do processo. Ainda, tendo em vista a pluralidade de réus, esclareço que: i) ambos deverão arcar, de forma solidária, com o pagamento dos honorários sucumbenciais devidos ao advogado da parte autora; ii) caso os réus possuam procuradores distintos, a parte autora deverá pagar os honorários sucumbenciais a que foi condenada de forma rateada igualmente entre os patronos. Observando-se que os honorários foram fixados em percentual que deverá incidir sobre o valor da condenação, não há que se falar em fixação de juros de mora e correção monetária, sob pena de bis in idem, observando-se que o montante principal da condenação já será devidamente atualizado e, sobre tal quantia, incidirá a percentagem ora fixada. No que tange às custas processuais, o termo inicial dos juros é a partir do trânsito em julgado, também com aplicação da Taxa Selic (art. 406, §§1º e 2º, do CC) e a correção pelo índice IPCA incidirá a partir de cada desembolso. Consigno que a exigibilidade das verbas sucumbenciais devidas pela parte autora resta suspensa, por ora, ante a concessão da justiça gratuita (mov. 10.1). 4. Transitado em julgado, intimem-se as partes para se manifestarem no prazo de 15 (quinze) dias. Nada sendo requerido, realizem-se as diligências necessárias e arquivem-se definitivamente os autos com observância das formalidades legais, com baixa no Boletim Unificado, sem prejuízo da possibilidade de seu posterior desarquivamento a pedido da parte interessada. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Curitiba, data do sistema. Débora De Marchi Mendes Juíza de Direito Substituta D [1] Disponível em: www3.bcb.gov.br/sgspub.